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Resumo
Os maus tratos vividos pela criança no ambiente familiar são considerados prejudiciais
ao desenvolvimento da criança e fator de risco para o surgimento de problemas com-
portamentais. Este estudo transversal investigou a relação entre maus tratos, autoesti-
ma e problemas de comportamento. Participaram 84 adolescentes divididos em grupo
caso e controle conforme o histórico de maus tratos. Resultados revelaram que adoles-
centes maltratados na infância, tiveram maior sintomatologia de comportamento ex-
ternalizante e pior autoestima do que aqueles que não sofreram essa experiência. Uma
análise de correlação verificou que a externalização e os maus tratos estiveram posi-
tivamente correlacionados, bem como a sintomatologia de ansiedade, retraimento e
depressão e outros problemas de comportamento. A autoestima esteve correlacionada
negativamente com maus tratos e com problemas de comportamento. Esses achados
auxiliam a compreensão dos efeitos dos maus tratos sobre o desenvolvimento e imple-
mentação de intervenções voltadas para crianças e adolescentes.
Palavras-chave: Maus tratos; Comportamento; Autoestima.
Abstract
Maltreatment experienced by children in the family are considered harmful to the
child’s development and a risk factor for the development of behavior problems. This
1
Mestre - (doutoranda) - Porto Alegre - RS - cross-sectional study investigated the relationship between maltreatment, self-esteem
Brasil.
2
Pós Doutora - (Professora UFCSPA).
and behavioral problems. Eighty-four teens participated divided into case and control
groups according to the history of maltreatment. Results showed that adolescents
Correspondência: maltreated in childhood had more symptoms of externalizing behavior and poor self-
Débora Cristina Fava.
Instituição: Elo - Psicologia e esteem than those who did not undergo this experience. A correlation analysis found
Desenvolvimento. that externalizing and maltreatment were positively correlated, as well as symptoms
Rua Maranguape, 72/1301.
Porto Alegre - SP.
of anxiety, withdrawal and depression and other behavior problems. Self-esteem was
CEP: 90.690-380. negatively correlated with maltreatment and behavior problems. These findings help
E-mail: deborafava@gmail.com understand the effects of maltreatment on the development and implementation of
Este artigo foi submetido no SGP (Sistema interventions targeting children and adolescents.
de Gestão de Publicações) da RBTC em 28 de Keywords: Malteratment; Behavior; Self-esteem.
Setembro de 2017. cod. 526.
Artigo aceito em 28 de Abril de 2018.
DOI: 10.5935/1808-5687.20170005
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A literatura sugere que a relação entre a exposição a da rede pública de ensino de Porto Alegre. A descrição dos
maus tratos, problemas de comportamento e autoestima, re- participantes por grupo está apresentada na Tabela 1.
percute em um prejuízo para o desenvolvimento do indivíduo,
manifestado através de dificuldades no relacionamento interpes-
Instrumentos
soal (Jaffee & Maikovich-Fong, 2011), menor eficácia social(Kim Os instrumentos utilizados neste estudo foram:
& Cicchetti, 2003) e déficits em resolução de problemas no Ficha de Dados Sociodemográficos. Esse instrumento
âmbito social(Levendosky, Okun, & Parker, 1995). Lansford investigou informações acerca do gênero e da idade, bem como
et al. (2002), destacam ainda as dificuldades acadêmicas e o nível de escolaridade e o histórico de repetências escolares,
psicológicas também ligadas à exposição a maus tratos em e informações sobre a configuração familiar na moradia.
criança e adolescente (Lansford et al., 2002). Critério de Classificação Econômica Brasil (ABEP, 2008).
Sabe-se que crianças negligenciadas por suas famílias É um instrumento que avalia o nível socioeconômico e o grau
tendem a acreditar que são incapazes de alterar seus ambientes de instrução do chefe da família de acordo com o sistema de
em situações difíceis, acabam se intimidando, não revidando ou pontos do Critério Brasil (ABEP, 2008).
não procurando a ajuda de professores e amigos, o que pode Questionário de Traumas na Infância - QUESI (Grassi-
reforçar os ciclos negativos da impotência (Fosse & Holen, -Oliveira, Stein & Pezzi, 2006) é uma medida de autorrelato
2007) e gerar estratégias comportamentais desadaptativas que avalia a presença de histórico de situações de abuso ou
como a externalização (Donnellan et al., 2005; Tracy&Robins, negligência durante a infância do participante. Cinco subescalas
2003). Estudos nessa área são fundamentais para promover o compõem o instrumento e são analisadas separadamente, são
avanço de novas ações de intervenção em prevenção de maus elas: abuso sexual, abuso físico, abuso emocional, negligência
tratos infantis. Nesse sentido, o objetivo geral desse estudo foi física e negligência emocional. Na análise do instrumento,
comparar adolescentes expostos e não expostos a maus tratos pontuações um ou dois em cada uma das subescalas indicam
quanto às variáveis problemas de comportamento e autoestima. que não houve exposição a maus tratos na infância; pontuações
três ou quatro indicam a exposição do indivíduo a maus tratos.
MÉTODO Youth Self-Report - YSR (Achenbach & Rescorla, 2001)
traduzido e validado por Silvares, Rocha e Equipe Projeto
Enurese (2007) é também um instrumento de autorrelato que
Delineamento
investiga competências e problemas a partir da visão do próprio
Trata-se de um estudo transversal, comparativo e de participante e se dirige a jovens com idade entre 11 e 18 anos. A
correlação. análise do instrumento possibilita a delimitação de nove escalas
de problemas de comportamento. Neste estudo foram analisadas
Participantes
as seguintes subescalas: Ansiedade/Depressão, Retraimento/
A amostra deste estudo foi composta 84 adolescentes, Depressão, Comportamento de Quebrar Regras e Compor-
desses, 66,7% eram do sexo feminino (n=56) e 33,3%, do sexo tamento Agressivo. As escalas são reunidas em três grupos:
masculino (n=28), com idade entre 13 e 17 anos, estudantes Problemas Internalizantes, Externalizantes, e Problemas Totais.
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Inventário de Depressão Infantil – CDI (Kovacs, 1992; A partir da divisão dos grupos feita através dos dados já
adaptado por Gouveia, Barbosa, Almeida & Gaião, 1995). Tem coletados pelo grupo de pesquisa, entrou-se em contato com
como objetivo detectar a presença e a severidade do transtor- a escola dos adolescentes e os mesmos foram convidados
no depressivo na infância. Destina-se a identificar alterações a participar da segunda parte da coleta de dados realizada
afetivas em crianças e adolescentes dos sete aos 17 anos. individualmente em um local indicado pela escola. As pesqui-
Composto por 27 itens, e uma escala Likert de três pontos, sadoras que aplicaram os instrumentos individualmente eram
onde o sujeito deve escolher o que melhor descreve o seu cegas quanto à condição do participante (caso ou controle). A
estado no período atual. redução no número de participantes, considerando a amostra
Escala de Autoestima de Rosenberg. Original de (Ro- inicial do banco de dados do PNPD, deve-se a dois fatores: 1)
senberg, 1965) a versão utilizada parauma amostra brasileira dificuldade no pareamento dos indivíduos dos dois grupos; 2)
foi adaptada por Hutz & Zanon (2013). Trata-se de uma medida perda de adolescentes que não foram localizados ou não foram
unidimensional, tipo Likert, composta por dez afirmações em autorizados pelos responsáveis para participar.
relação à satisfação consigo, com suas próprias qualidades e Dos instrumentos utilizados na análise para o presente
capacidades, bem como sentimento de inutilidade e sensação estudo, o QUESI, o YSR, o CDI, a Ficha de Dados Sociodemo-
de fracasso. gráficos e o Critério de Classificação Econômica Brasil foram
aplicados coletivamente na primeira parte da coleta e a Escala
PROCEDIMENTOS de Autoestima de Rosenberg, exclusivamente aplicada para
esse estudo, foi aplicada individualmente, pois os adolescentes
também responderam a dois sub testes da Escala Weschler de
Coleta dos Dados
Inteligência, em que os resultados estariam sendo avaliados no
Este estudo é derivado de um projeto do Programa Na- estudo de outra integrante do grupo de pesquisa.
cional de Pós-Doutorado (PNPD) desenvolvido pelo Programa
de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Psicologia/ Análise dos Dados
PUCRS, intitulado “Exposição a maus tratos na infância e a Os dados deste estudo foram alocados no software Sta-
relação com a cognição, a adaptação psicológica e a ocorrência tistical Package for Social Science versão 16.0. Com o objetivo
de psicopatologia em adolescentes, adultos e idosos”. O projeto de refinar a análise dos dados desse estudo, realizou-se a uma
do PNPD envolve adolescentes, com idade entre 12 e 18 anos, análise descritiva de frequência que permitiu a identificação de
alunos do ensino fundamental e médio de escolas públicas e indivíduos que foram expostos a apenas um tipo de maus tratos
privadas. Para a seleção dos participantes foi elaborada uma (MT), com 24 participantes, e indivíduos que foram expostos a
lista com todas as escolas que tinham ensino fundamental e maus tratos múltiplos (MTM), com 19 participantes. Indivíduos
médio completos, de Porto Alegre. Posteriormente, foram sele- que pontuaram no QUESI três ou quatro em apenas um subtipo
cionadas, por sorteio, 18 escolas da rede pública e privada. Nas de maus tratos, foram incluídos no grupo MT; indivíduos que
escolas que concordaram em participar, todas públicas, foram obtiveram essa pontuação em dois ou mais subtipos de maus
coletados dados coletivamente em uma turma de cada série, tratos foram incluídos no grupo MTM e, finalmente, o Grupo
da 6ª série do ensino fundamental ao 3º ano do ensino médio. Controle (GCt) foi constituído por 41 participantes que pontu-
Em um segundo momento, a partir do banco de dados aram um ou dois no QUESI, indicando ausência de exposição
formado pela coleta coletiva, foram identificados os indivíduos a maus tratos.
caso e controle. O Grupo Caso (GC) foi constituído por 42 ado- Os dados apresentaram distribuição normal de acordo
lescentes que relataram terem sido expostos a maus tratos a com o teste Kolmogorov-Smirnov. Para a comparação entre os
partir do instrumento QUESI. O Grupo Controle (GCt) foi forma- grupos, utilizou-se a análise de variância simples One WayANO-
do por 42 adolescentes não expostos a maus tratos. Os grupos VA para a comparação entre os três grupos quanto às médias
foram pareados de acordo com sexo, idade e escolaridade. das variáveis sociodemográficas. A avaliação da associação
Os critérios de inclusão para o grupo caso foram: 1) entre as variáveis foi realizada através do teste Qui-Quadrado.
ter obtido escores três ou quatro em uma das sub escalas Para a comparação entre os três grupos quanto às médias
de abuso sexual, abuso físico, abuso emocional, negligência das variáveis utilizou-se a análise de variância simples One
física ou negligência emocional do instrumento QUESI; 2) ter WayANOVA com post hocBonferoni. A Correlação de Pearson
respondido integralmente aos instrumentos utilizados no es- foi utilizada com a finalidade de investigar correlações entre
tudo e 3) concordar em participar do estudo, assim como ter as variáveis.
autorização dos seus responsáveis pelo TCLE. Os critérios de
inclusão para o grupo controle foram: 1) ter obtido escore um Considerações Éticas
ou dois no QUESI; 2) ter respondido integralmente aos demais O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
instrumentos; 3) concordar em participar do estudo, assim como da PUCRS sob o número 93.690. Posteriormente, foi solicitada
ter autorização dos seus responsáveis pelo TCLE. a assinatura aos responsáveis do Termo de Consentimento
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Livre e Esclarecido (TCLE) e aos participantes do Termo de siedade (p≤0,001) e maior índice da mesma sintomatologia do
Assentimento. Aos participantes identificados com histórico de que os indivíduos que sofreram apenas um tipo de violência
maus tratos na infância sugeriu-se para a escola que fizesse (p≤0,05).
seu encaminhamento para o Núcleo de Estudos e Pesquisa O grupo MT e MTM apresentaram maiores escores
em Trauma e Estresse (NEPTE) da PUCRS, que é um serviço depressivos (CDI), quando comparados ao GCt, mas não se
ambulatorial gratuito que se localiza na PUCRS. Além disso, diferenciaram entre si.
foi oferecida uma lista com locais de atendimento psicológico No item retraimento/depressão, sub escala do instru-
gratuito ou de acordo com a renda do paciente para possíveis mento YSR, o grupo MTM também obteve significativamente
encaminhamentos. maior presença de sintomas do que o GCt. Por outro lado, com
relação aos sintomas de ansiedade/depressão, todos os grupos
RESULTADOS diferenciaram-se significativamente entre si. O grupo MTM teve
maior sintomatologia do que o grupo MT, e esse, maior média
A análise através do Qui-Quadrado não demonstrou de sintomas quando comparado a GCt.
diferença significativa na distribuição de sexo entre os grupos Com relação à autoestima, o grupo que sofreu apenas
(X2=1,206;p=0,547). O GCt foi composto por 61% de meninas um tipo de mau trato foi o que apresentou menor média de au-
e 39% de meninos. No grupo MT, 71% eram do sexo feminino toestima comparada aos dois outros grupos, seguido pelo MTM.
e 29% do masculino. Já no grupo MTM, 74% eram meninas e A Correlação de Pearson foi utilizada com a finalidade de
26% meninos. investigar correlação entre as variáveis ansiedade/depressão,
A Tabela 1 apresenta a comparação entre os grupos em retraimento/depressão, violação de regras, agressividade e total
relação às variáveis sociodemográficas. Utilizou-se a análise de de problemas no comportamento, e as variáveis autoestima,
variância simples One WayANOVA para a comparação entre total de experiências de maus tratos (CTQ total) e média de
os três grupos quanto às médias das variáveis. Não houve comportamento externalizante. A Tabela 3 apresenta as correla-
diferenças entre os grupos. Dentro do grupo MT, 33% sofreram ções significativas encontradas entre as variáveis investigadas
negligencia emocional e 17% dos participantes foram vítimas (p≤0,05). Apenas os itens agressividade e violação de regras
de negligência física. Com relação aos abusos, 38% sofreram e externalização não se correlacionaram com a autoestima, as
abuso emocional, 8% físico e 4% do subtipo sexual. No grupo de demais variáveis todas tiveram correlação positiva ou negativa
MTM, 58% dos participantes afirmaram ter sofrido negligência entre si.
emocional e 37% negligência física. Já em relação aos tipos A autoestima esteve negativamente correlacionada com
de abusos, 89% relatam abuso emocional, 47% abuso físico sintomas de ansiedade/depressão, retraimento/depressão, total
e 28% abuso sexual. de problemas e histórico de maus tratos.
Para a comparação entre os três grupos quanto às Quanto ao histórico de maus tratos, a variável se cor-
médias das variáveis sintomas depressivos, autoestima, e relacionou positivamente com todas as demais variáveis ana-
problemas de comportamento, utilizou-se a análise de variância lisadas (ver Tabela 3). Resultados indicam que a presença da
simples One WayANOVA com post hocBonferoni (Tabela 2). experiência de qualquer tipo de violência contra criança está
Conforme pode-se verificar, os grupos apresentaram diferenças associada a problemas de comportamento. Especificamente, a
estatisticamente significativas em todas as variáveis investi- sintomas de externalização (incluindo agressividade e violação
gadas (exceto nos escores de agressividade e de violação de de regras) e a internalização, como sintomas de ansiedade,
regras). retraimento e depressão.
Agressividade e violação de regras são subescalas As variáveis violação de regras e agressividade foram
que compõe a escala comportamento externalizante no YSR. positivamente correlacionadas com a exposição de maus tratos
Isoladamente, cada uma dessas subescalas não apresentou e presença de externalização. Essas duas variáveis são sub
diferenças significativas, porém, quando tomadas em conjunto escalas que compõem o item comportamento externalizante
no item total de externalização, as médias foram diferentes, no instrumento YSR, o que pode justificar a alta correlação
GCt (56,51), MT (59,42) e MTM (62,95), tendo significância na (R=+0,797 e R=+0,895, respectivamente).
relação MTM e GCt (p≤0,05).
Comportamento externalizante e problemas na conduta DISCUSSÃO
apresentaram médias significativamente maiores no grupo em
que os participantes sofreram mais de um tipo de maus tratos, O objetivo desse estudo foi comparar adolescentes
quando comparados ao GCt. Estas diferenças não foram es- expostos e não expostos a maus tratos quanto às variáveis pro-
tatisticamente significativas quando se comparou MTM e MT. blemas de comportamento e autoestima. No instrumento YSR,
De forma significativa, os adolescentes que sofreram a escala de comportamento internalizante é composta por itens
maus tratos múltiplos tiveram médias maiores do que o grupo referentes à ansiedade e depressão (Achenbach & Rescorla,
controle nos itens referentes a sintomas de depressão e an- 2001). Porém, autores consideram que essa sintomatologia tam-
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Tabela 2. Comparação entre os grupos quanto às médias dos sintomas depressivos, autoestima, comportamento externalizante e
outros subtipos de problemas de comportamento.
Controle Um subtipo Múltiplos
F p Post hoc
N=41 N=24 N=19
Média DP Média DP Média DP
CDI Total GCtxMT*** e
6,37 4,76 12,96 6,58 13,95 6,32 16,183 0,000
GCtxMTM***
Nível de Ansiedade GCtxMTM***
60,32 7,94 63,42 9,20 69,84 7,20 8,833 0,000
e Depressão – YSR e MTxMTM*
Nível de Retrai-
mento e Depressão 58,54 7,35 63,46 8,91 65,42 8,58 5,673 0,005 GCtxMTM**
– YSR
Total de Autoestima 30,02 4,50 27,25 3,84 29,95 5,20 3,214 0,045 GCtxMT*
Total de Compor-
tamento Externali- 56,51 9,84 59,42 8,18 62,95 8,77 3,281 0,043 GCtxMTM*
zante
Nível de Agressivi-
59,20 8,55 60,46 7,28 64,68 9,33 2,801 0,067 -----
dade – YSR
Nível de Violação
56,15 6,23 58,46 5,89 59,79 8,03 2,250 0,112 -----
de Regras – YSR
Nivel de problemas
49,49 19,65 57,42 13,89 61,26 9,19 3,978 0,022 GCtxMTM*
na conduta – YSR
Nota. gl = 2; * = p≤0,05; ** = p≤0,01; *** = p≤0,001.
Tabela 3. Correlações significativas encontradas entre as variáveis do YSR, autoestima, escore total do CTQ e nível de externalização.
Autoestima Escore Total de Maus tratos Nível externalização
Ansiedade /Depressão R (força da correlação) -0,284 0,347 0,384
p(significância) 0,009 0,001 0,000
Retraimento/Depressão R -0,209 0,400 0,297
P 0,057 0,000 0,006
Violação de regras R -0,184 0,345 0,797
P 0,093 0,001 0,000
Agressividade R -0,168 0,379 0,895
P 0,127 0,000 0,000
Total de problemas R -0,279 0,455 0,795
P 0,010 0,000 0,000
Nível de Externalização R -0,149 0,389 -----
P 0,177 0,000 -----
Total de Maus tratos R -0,223 ----- -----
P 0,041 ----- -----
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No estudo de McGee, Wolfe e Wilson (1997) e de Jaffee e Outros estudos sugerem que sofrer maus tratos na infância
Maikovich-Fong, (2011) os maus tratos estiveram presentes compromete a autoestima do indivíduo, tornando-a mais baixa
tanto na explicação dos sintomas externalizantes quanto nos do que em indivíduos que não sofreram maus tratos (Kaufman &
internalizantes. Já, Lansford et al. (2007) constatou que ado- Cicchetti, 1989; Shen, 2009). No estudo de Kaufman e Cicchetti,
lescentes que tinham sido abusados fisicamente na infância, (1989), as crianças que sofreram múltiplos maus tratos tiveram
eram mais propensos a terem se envolvido com crimes. Além autoestima mais baixa do que as do grupo controle. Igualmen-
disso, apresentavam mais problemas de comportamento, brigas te, quando os autores compararam por grupos específicos de
nos relacionamentos com pares, e dificuldades ocupacionais, maus tratos também não houve diferença significativa. Shen
como não conseguir terminar a faculdade ou não se manter (2009) comparou grupos de adultos que, na infância, ou foram
em algum emprego. abusados fisicamente, ou presenciaram brigas conjugais dos
Comportamento externalizante e problemas na conduta pais, ou tiveram ambos os tipos de experiência. Neste estudo,
apresentaram médias significativamente maiores no grupo em os indivíduos que sofreram ambos os tipos de experiências
que os participantes sofreram mais de um tipo de maus tratos, tiveram menor autoestima do que os que presenciaram apenas
quando comparados ao GCt. Porém, estas diferenças não foram um tipo ou que não tiveram nenhum desses dois históricos.
estatisticamente significativas quando se comparou MTM e MT, Apesar de alguns estudos demonstrarem que a autoes-
o que sugere que, para essas variáveis, sofrer um tipo ou mais tima está correlacionada negativamente com a externalização,
de um tipo de maus tratos não parece ser significativo. Outros que envolve violação de regras e agressividade (Donellan et
estudos encontraram dados similares nos quais a externaliza- al., 2005; Fergusson & Horwood, 2002), resultados desse
ção também foi mais encontrada em crianças maltratadas do estudo não mostraram qualquer correlação significativa. Tais
que não maltratadas (Jaffee & Maikovich-Fong, 2011; Kim & resultados envolvendo a autoestima não se apresentam de
Cicchetti, 2004; Manly et al., 2001). forma consistente na literatura. Alguns estudiosos tiveram
Achados como os de Manly et al. (2001), em que 64% resultados demonstrando a correlação negativa entre autoes-
da sua amostra foi composta por crianças que sofreram dois tima e externalização, e sugerem que a baixa autoestima está
ou mais tipos de maus tratos, as diferenças também não fo- associada com problemas como a delinquência, por exemplo.
ram significativas para problemas de comportamento quando Tracy e Robins (2003) sugerem que indivíduos se protegem
comparou-se grupos com um tipo e dois tipos de maus tratos. contra sentimentos de inferioridade através de comportamentos
Baseados nesse estudo de Manly et. al. (2001), Kim e Cic- de externalização, movidos pela raiva e hostilidade para com
chetti (2004) optaram por utilizar apenas grupos de crianças outras pessoas. Por outro lado, autores que não encontraram
maltratadas e não maltratadas. Apesar das considerações de correlação entre as variáveis (Kirkpatrick, Waugh, Valencia, &
Manly et. al. (2001) e Kim e Cichetti (2004), o presente estudo Webster, 2002; Twenge & Campbell, 2003), discutem que a au-
identificou que quanto mais tipos de maus tratos o indivíduo toestima poderia ter um papel muito pequeno na agressividade,
experienciou, maior foi a média referente à presença dos diver- mas que o narcisismo do indivíduo e a rejeição social que foi
sos tipos de sintomatologia analisados. De forma significativa, simulada nesses estudos, podem ter um papel mais importante
os adolescentes que sofreram maus tratos múltiplos tiveram do que a baixa autoestima na correlação com comportamentos
médias maiores do que o grupo controle nos itens referentes a agressivos.
sintomas de depressão e ansiedade e maior índice da mesma Donellan et al. (2002) têm razões teóricas para supor que
sintomatologia do que os indivíduos que sofreram apenas um a autoestima não tenha se correlacionado com a externalização
tipo de violência. em seus estudos. Discutem que a boa autoestima pode ser um
O grupo MT e MTM apresentaram maiores escores sentimento altamente duvidoso de superioridade pessoal, que
depressivos (CDI), quando comparados ao GCt, mas não dife- é inflado muito além do que os fatos justificariam e por isso
renciaram entre si. O que sugere que sofrer apenas um tipo de pode estar propenso a flutuar em resposta a eventos diários.
mau trato ou diversos não parece influenciar na sintomatologia Esta heterogeneidade parece minar a utilidade da autoestima
depressiva, mas sim o fato de haver presença de um tipo de por si só para prever a agressão.
mau trato já influenciaria nos sintomas depressivos. Já no que Quanto ao histórico de maus tratos, a variável se correla-
se refere ao conjunto de ansiedade/depressão, todos os grupos cionou positivamente com todas as demais variáveis analisadas.
diferenciaram-se significativamente. Esses dados sugerem que, Resultados do presente estudo indicam que a presença da
para os sintomas ansiosos/depressivos, existe uma diferença experiência de qualquer tipo de violência contra criança está
sobre a presença do histórico de um ou mais tipos de maus associada a problemas de comportamento. Especificamente, os
tratos na infância do indivíduo, tendo maiores prejuízos os sintomas de externalização (incluindo agressividade e violação
indivíduos que sofrem mais de um tipo de maus tratos. de regras) e de internalização, como sintomas de ansiedade,
Com relação à autoestima, o grupo que sofreu apenas retraimento e depressão.
um tipo de mau trato foi o que apresentou menor média de au- Alguns autores citam que, dentro de um quadro depres-
toestima comparada aos dois outros grupos, seguido pelo MTM. sivo na infância, as queixas de sintomas físicos são seguidas
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