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Atualizado e revisado por

MOISÉS STEFANO BAREL


Professor autor/conteudista
LUIZ FELIPPE MATTA RAMOS
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pública, sob pena de responsabilização civil e criminal.
SUMÁRIO
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

As religiões que o mundo esqueceu . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6


Os sumérios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
Os persas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Os celtas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
Os vikings . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
Os albigenses . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
O gnosticismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

Religiões e impérios da Antiguidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24


Os gregos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
Os romanos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
Os egípcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

Religião na cultura indígena . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

Religiões afro-brasileiras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

O islamismo e suas ideias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

O budismo e suas visões de mundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50

O hinduísmo e a sabedoria indiana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

Judaísmo e origens da humanidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57

Cristianismo e o conceito de religião de massa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61

Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68

Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
INTRODUÇÃO
O século XX foi, sem dúvida, caracterizado pela diminuição das fronteiras territoriais nas
diversas regiões do planeta. Tecnologias como o avião, o rádio, a televisão e, finalmente, a internet,
proporcionaram a caracterização do conceito de aldeia global, idealizado pelo pensador canadense
Marshall McLuhan. O século XXI certamente têm dado continuidade a esse processo e continuará a
fazê-lo, em termos de globalização, intercâmbios econômicos e diálogos políticos. Mas, infelizmente,
nem tudo está bem no mundo moderno.

Na esfera da religião, a intolerância ainda prevalece em diversas partes do mundo, tendo


impactos locais, como os verificados no Oriente Médio, sendo que, em casos mais extremos, ganha
proporções continentais. Deste modo, acreditamos que é necessário promover uma discussão
sobre a necessidade de estabelecer compatibilidade entre pensamentos políticos, sociais, culturais
e religiosos.

Cremos que a tolerância e o bom diálogo religioso são, inclusive, fundamentais para o mundo
moderno em termos educacionais, afinal de contas, em nossa opinião, o Deus supremo é o salvador
de todos os seres humanos e, certamente, as religiões não compactuam com o assassinato de
milhões de pessoas, ou com o falso pretexto de serem realizadas em seu nome, visto que a essência
de todas as religiões é o amor e a harmonia.

Nesse sentido, para compreender a excelência e o projeto salvador de Deus, é interessante


observar uma passagem do texto bíblico, registrada no livro de Atos, capítulo 4, versículo 12 (ALMEIDA
NETO, 1997), considerando que para outras religiões que não o cristianismo, outros preceitos são
considerados válidos conforme a crença de cada uma delas. “A salvação só pode ser conseguida por
meio Dele. Pois não há no mundo inteiro nenhum outro que Deus tenha dado aos seres humanos,
por meio do qual possamos ser salvos.”

Com essa compreensão em mente, é necessário observar o quão democrática é a existência


de diversas religiões e formas de manifestar a fé.

Ainda no livro de Atos, capítulo 13, versículo 26, o texto bíblico revela: “Meus irmãos, descendentes
de Abraão, e também vocês não-judeus que temem a Deus, escutem! Essa mensagem de salvação
foi mandada para todos nós” (ALMEIDA NETO, 1997).

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Ou então, podemos recorrer ao livro de Tito, capítulo 2, versículo 11, cujo texto bíblico informa:
“Deus revelou a sua graça para dar a Salvação a todos”.

Em outras palavras, é interessante notar que, conforme a Bíblia, intolerância religiosa é um


contrassenso.

Porém, é propósito deste curso evidenciar como ao longo da história as mais diversas práticas
religiosas deixaram de lado o caráter da harmonia e do amor e rumaram por caminhos sinuosos
com ataques e tentativas de gerar descrédito. Por conta disso, vamos apresentar informações sobre
as mais diversas religiões para que nós, enquanto seres humanos, sejamos capazes de possuir
autonomia em termos de compreensão e profusão da fé.
Sendo este um curso de pós-graduação, é necessário Figura 1 – Religiões e práticas
culturais estão interligadas
entender e inter-relacionar conteúdos históricos, culturais
e sociais, antes de promover sentenças apressadas que
desqualifiquem determinadas práticas religiosas em
detrimento de outras. Por fim, ao compreender isso e mais
uma série de informações históricas que serão passadas nos
próximos capítulos, acreditamos que estaremos auxiliando
os homens a se conhecerem melhor. Isto pode ajudar na
formação de uma sociedade mais democrática e plural, tanto
em termos intelectuais quanto em termos religiosos, bem
como mais respeitosa ao próximo, sem milhares de mortes
Fonte: Shutterstock/Adrian Niederhaeuser
falsamente justificadas por motivos religiosos.

AS RELIGIÕES QUE O MUNDO ESQUECEU


Neste capítulo, vamos tratar das religiões e práticas religiosas de povos e civilizações que
tiveram seu apogeu no passado e deixaram um rico legado para a posteridade, mesmo após terem
declinado e, eventualmente, desaparecido por processos históricos.

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Os sumérios
Figura 2 – Sumérios

Fonte: Fedor Selivanov/Shutterstock

Os sumérios estão muito distanciados de nós, tanto pelo tempo quanto pelo espaço. O tempo que
nos separa dessa antiga civilização pode ser contado em milênios e, geograficamente é necessário
atravessar muitos quilômetros para que possamos chegar até os territórios ocupados por esse
povo no Oriente. Para nós, entretanto, é importante retomar algumas informações acerca deste
povo e de sua profissão de fé, afinal de contas, eles estavam situados numa região que, até hoje,
simboliza e assiste a milhares de acontecimentos de toda ordem, que cumprem profecias bíblicas.

O primeiro fato que chama atenção é o alto número de deuses que faziam parte do cotidiano
daquele povo. Conforme Pedro Paulo Funari, autor da obra As religiões que o mundo esqueceu
(2009, p. 28), “os próprios sumérios registravam cerca de 3.600 deuses”. Deste modo, podemos
acreditar que seja possível compreender religião, cultura e sociedade suméria ao conhecer tais
hábitos em termos de crenças.

Os sumérios não possuíam unidade política nem Estado centralizado. Eles se organizavam
em cidades-estados, cada uma com governo autônomo e soberano próprio. Estavam situados na
região da antiga Mesopotâmia, situada entre os atuais Irã e Arábia Saudita, margeada pelos rios
Tigre e Eufrates. Os sumérios foram reconhecidos por serem grandes construtores e também por
dominarem a escrita e a arte em sua respectiva época.

Para Funari (2009, p. 29), conforme a tradição suméria,

a sociedade humana era padronizada a partir de um plano concebido pelos deuses. Os


deuses eram representados como justos e praticamente todas as maiores divindades
do panteão sumério são elogiadas nos hinos como amantes de bem, da verdade e
da justiça.

A presença desses deuses na mente dos sumérios instilava no povo um sentido de


consciência, reforçado pelos padrões éticos articulados na Lei.

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A distância que nos encontramos dos sumérios não deve nos levar a uma falsa visão desse
povo, pois existia uma série de virtudes que apreciamos agora no século XXI: bondade, verdade,
ordem, liberdade e compaixão, entre outras. Muito possivelmente isso ocorria porque no mundo
antigo, a relação entre deuses e seres humanos era tida como reflexiva, ou seja, o que acontecia
no céu para eles era replicado aqui na terra. Com tantos deuses, não era de se estranhar que os
sumérios estivessem acompanhados por eles em todas as situações.

Por isso, é interessante observar que os sumérios

viam a mão divina em ação nas artes através das quais a cultura e a civilização
humana eram sustentadas. Os deuses se faziam muito próximos e participavam da
criação do cotidiano junto com o próprio povo.

Para se dirigir a esses poderes divinos, agradecer por sua beneficência e apelar para
eles em tempos de necessidade, os sumérios concebiam seus deuses em forma
antropomórfica, ou seja, com olhos para vê-los e ouvidos para ouvir seus hinos e
orações. Além disso, eles também os dotavam de emoções humanas porque os
deuses pareciam compassivos e cruéis. Deuses que experimentavam as mesmas
emoções e ciúmes, e possivelmente, intervinham em assuntos humanos de forma
arbitrária (FUNARI, 2009, p. 30).

A partir dessa concepção, acreditamos que também se possa questionar se os sumérios


acreditavam em poderes ou forças negativas, demoníacas, talvez, afinal de contas, ao longo da
história os povos sempre ligaram seus pensamentos a forças da maldade, mas apenas no imaginário.
Além disso, havia deuses e deusas ligados ao âmbito sexual e prazer carnal, como por exemplo, a
deusa Inanna, simbolizada como deusa da guerra e padroeira dos governos e governantes.
Ainda conforme a religião suméria, cada Figura 3 – Inanna é a deusa de maior disseminação na
religião suméria. Era tida ainda como dona de um apetite
cidade tinha o seu próprio deus ou deusa sexual intenso, que levava seus parceiros à morte
protetora, aos quais eram dedicados templos
como forma de homenagear-lhes e prestar-lhes
culto. A administração desses locais estava à
cargo de sacerdotes, cujo trabalho era pensado
a partir de uma ligação transcendental entre
os desejos do céu e da terra que exerciam a
governança sobre a vida humana, no entender
dos sumérios. Conforme Funari (2009, p. 33)
Fonte: Zvereva Iana/Shutterstock
também é importante considerar que

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o caminho para se tornar um sacerdote não era para todos. Duas eram as condições
essenciais para um jovem se qualificar ao trabalho: proceder de uma boa família e não
possuir qualquer tipo de defeito físico. O treinamento incluía aulas de alfabetização
e um longo período de aprendizagem. Alunos do gênero masculino poderiam seguir
uma carreira seguindo a um deus, ao passo que as alunas serviriam deusas.

Existiam diferentes tipos de sacerdotes que exerciam funções distintas, como


administração, conjuros, exorcismos, augúrios e adivinhação. A maior parte da
informação disponível procede de textos relativos ao palácio e ao templo e, assim,
é pouco o que se conhece sobre a religião do cidadão comum.

Havia celebrações e festas mensais, nas quais oferendas das mais diversas espécies eram
oferecidas aos deuses e deusas. O maior desses eventos era a Festa de Consagração, na qual os
templos eram entregues ao controle espiritual das divindades, o que era motivo de muita alegria por
parte do povo. Outra grande celebração era a dedicada à agricultura, que acontecia imediatamente
após o término das colheitas, geralmente no mês de março. A música também era um elemento
muito presente nestes atos, fosse para alegrar os deuses ou para prestar-lhes homenagens.

Outro ponto interessante a ser observado diz respeito à relação que os sumérios exerciam com
os templos. Contrariamente às nossas definições de igrejas, como locais de adoração e reunião
congregacional, esses locais eram tidos como a residência das divindades. Senão, vejamos: “Em
seu interior encontrava-se a estátua da divindade, bem como o repositório para as ofertas dadas
pelos fiéis. Anexos ao santuário, estavam os quartos dos sacerdotes e das sacerdotisas” (FUNARI,
2009, p. 35).

A prática de culto também era diferente daquilo que estamos habituados a presenciar atualmente.
“A adoração pública, quando ocorria, era realizada fora do templo, numa espécie de pátio. O templo
representava uma espécie de centro de riqueza e poder econômico” (FUNARI, 2009, p. 35). Talvez
você esteja se perguntando: no que diz respeito ao relacionamento entre os fiéis sumérios e suas
divindades, como se dava essa relação? Pois é, digamos que era um relacionamento um tanto
quanto rígido para os padrões atuais.

A crença normal era que existia uma espécie de balança de atitudes e consequências, entre o
sucesso ou o sofrimento de uma pessoa, e os pesos de suas boas obras ou pecados. Entretanto,
cremos que nem sempre este “cálculo” funcionava, afinal de contas, muitas variáveis envolvem
o sucesso ou fracasso de uma pessoa, seja em termos pessoais, familiares, trabalhistas ou de
quaisquer outras áreas da vida privada ou pública.

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Para os sumérios, outro ponto doutrinário importante diz respeito ao papel da culpa. Para eles,
se as pessoas discordassem dos desejos das divindades, caía sobre elas uma espécie de punição
originada na própria consciência.
E os males, como podiam assolar o corpo humano? Como eram Figura 4 – Sumério
encarados pelos sumérios? Será que havia uma força sobrenatural
atuando e regulando nossa matéria carnal? A resposta é sim, e julgava-se,
ainda, que alguns espíritos malignos eram os responsáveis por quaisquer
tipos de desgraças que se abatessem sobre o corpo das pessoas, desde
males de menor intensidade até complicações que levassem ao óbito.
Tudo estava relacionado com a integridade e a quantidade de pecados
que cada indivíduo possuía.

A doença era relacionada a pecados ou à possessão


demoníaca. Por causa disso, especialistas em curas
espirituais eram convocados para assistir o doente a
fim de descobrir qual deus ele tinha ofendido ou ainda
encontrar qual espírito hostil o estava possuindo e,
desta forma, a partir dos ritos apropriados, exorcizá-lo.

Ao mesmo tempo, amuletos eram pendurados nas


paredes ou portas das casas com o objetivo de manter
fora os espíritos maus que tentavam entrar. Os sumérios
não viam os ataques dos demônios como penalidade
pelo pecado. Eles adotavam rituais mágicos como
defesa contra os demônios e nulificação do mal que
eles faziam. O feitiço se tornou a personificação de
demônios, junto com muitas doenças.
Fonte: Fedor Selivanov/
Shutterstock
Um sacerdote era responsável por recitar encantações e conduzir os ritos. Muitos
deles não eram magicamente definidos e consistiam somente de um sacrifício; no
caso do pobre, uma mão cheia de alimentos era o suficiente como oferenda. Muitos
sacerdotes também eram médicos e prescreviam medicamentos (FUNARI, 2009, p. 38).

Em suma, para a religião suméria, os deuses e deusas eram espécies de reis e rainhas que
governavam a vida humana a partir de um palácio celestial. Portanto, o mundo terrestre era
compreendido a partir do mundo das divindades, e os governantes terrenos, além de pessoas
escolhidas, eram representantes diretos desta esfera celestial. Há um provérbio sumério que diz:
“O homem é a sombra de deus, mas o rei é seu reflexo” (WIKISTÓRIA, 2015). Por fim, é interessante
saber que

os soberanos seculares exerciam o poder como representantes dos deuses. Um


dos seus mais importantes deveres consistia em efetuar cerimônias destinadas a
prevenir o mal e a ganhar a boa vontade das divindades.

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Em maior ou menor medida, era o soberano que controlava os recursos do templo
mais importante da cidade.

E não nos esqueçamos de que o templo era a instituição mais rica e o principal
latifundiário da cidade.

Palavras como justiça, compaixão e proteção do mais fraco pertenciam ao vocabulário


e à piedade religiosa dos sumérios.

Todavia, não podemos nos esquecer que, do ponto de vista político, os reis eram o
reflexo dos deuses e, por conta disso, não há como negar a religião como instrumento
de opressão dos mais fracos (FUNARI, 2009, p. 39).

Os persas
Zaratustra foi a primeira entidade divina a conceder ao homem o livre-arbítrio, a responsabilidade
por seus atos e o julgamento individual baseado na ética de cada pessoa. Como resultado desse
processo, argumentavam os persas, poderia se chegar ao céu ou ao inferno, antes mesmo do juízo
final. Voltemos no tempo, para cerca de 1500 a. C, na antiga Pérsia, região que atualmente engloba
o Irã, no Oriente Médio.

Zaratustra Spitama, o fundador da religião conhecida como zoroastrismo, era um sacerdote,


levava uma vida simples e possuía poucos bens, rotina um tanto quanto parecida com o que pregam
outras religiões. Aos 30 anos, em meio a um ritual onde buscava a purificação de seu corpo e sua
alma, teve uma visão. Segundo ressalta a tradição, percebeu que sabedoria, justiça, bondade e
tolerância estavam separadas da fraqueza e da crueldade.

A partir de então, inspirado pelo Ser Supremo, que costumava chamar de Ahura Mazda, Zaratustra
Spitama começou a pregar à comunidade. Segundo Funari (2009, p. 104), o profeta dizia que “o
mundo vivia em meio a uma disputa de forças contrárias e o homem, assim como os espíritos, tinha
o livre-arbítrio para escolher entre o bem e o mal, entre a luz e a escuridão”. Tais práticas entraram
em conflito com o conservadorismo religioso vivenciado naquela época.

Essa doutrina incomodou os seguidores de outras doutrinas indo-iranianas. Em primeiro lugar


porque a proposta do zoroastrismo oferecia salvação a todos que optassem por uma vida justa e
honrada, independentemente da classe social, rompendo com a tradição vivenciada até então, de
que apenas os aristocratas e os sacerdotes teriam direito à salvação eterna. Em segundo lugar,
por conta da proposta de adoração a um único deus (Ahura Mazda) e não mais um culto politeísta.

Conforme Funari (2009, p. 107), o deus Maza era

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um dos maiores ahuras (entidades) do panteão iraniano, era venerado e cultuado
como guardião do asha (ordem da verdade e da justiça). Zaratustra proclamou Ahura
Mazda como o Senhor Supremo; o imortal; o Deus da sabedoria; o Criador de todas
as coisas; aquele a partir de quem emanavam todas as outras criaturas divinas.
Em sua visão, o Criador estava acompanhado por seus dois filhos gêmeos, Spenta
Mainyu (espírito benfeitor) e Angra Mainyu (espírito destruidor, ignorante, maligno,
aquele que originou a morte).

Na teologia da religião do zoroastrismo, o bem e o mal precedem o próprio Criador. O caráter


original desse preceito transformaria as classificações dos deuses existentes, em ahuras e daevas.
Os deuses Ahuras eram considerados como aqueles que optaram pelo bem, enquanto os Daevas
eram aqueles Deuses que se transformaram em forças destrutivas, demônios ou deuses da guerra.
Este mesmo princípio se aplica à compreensão de que as pessoas poderiam escolher, tanto quanto
os deuses, se caminhariam conforme os preceitos do bem ou do mal.

A doutrina do zoroastrismo estava apoiada, antes de Figura 5 – Ahura Mazda sintetizava virtudes
que são valorizadas pela sociedade como
tudo, em uma ética e moralidade que infundia nos homens justiça, ética, bondade e tolerância
a preocupação de viverem sempre segundo os bons
pensamentos, palavras e atos.

Dessa forma, sua fundamentação religiosa inseria na


vida humana a necessidade de os homens entenderem
que tinham muita responsabilidade em relação ao mundo
no qual estavam inseridos, ou seja, não apenas a vida
individual, mas a vida pública e coletiva eram diretamente
afetadas por quaisquer irresponsabilidades. Fonte: Radiokukka/iStock

Ainda conforme esta doutrina religiosa, três dias após a morte física do corpo, o espírito é
conduzido até uma espécie de balança. A alma então é pesada e se o medidor pender para o lado
do bem, a alma é encaminhada ao paraíso e recebida por uma donzela, caso contrário, o espírito é
conduzido ao inferno e recepcionado por uma entidade demoníaca. Nesta doutrina, mesmo tendo
chegado ao paraíso, as boas almas só alcançariam a felicidade plena durante uma espécie de
ressurreição antes do juízo final.

Aos corpos celestiais situados no paraíso, após o último julgamento seria conferido a eles a
imortalidade e, consequentemente, estariam para toda a eternidade livres de maus pensamentos.
Esta doutrina tinha rituais com práticas de oferendas, envolvendo, por exemplo, a morte de animais
ou o ato de beber líquidos alucinógenos. Havia também um ritual diário de oração.

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Grande parte dos rituais enfatiza a purificação da mente e do corpo e a luta contra
o mal. O fogo é visto como o mais alto símbolo de pureza. Por isso, todos os cultos,
são realizados na presença de um fogo sagrado, mantido nos templos (FUNARI,
2009, p. 111).

Zaratustra estabeleceu a realização de cinco orações diárias. Elas deveriam, porém, ser precedidas
pela limpeza do rosto antes de começarem e serem feitas próximas ao fogo eterno.
E quanto aos festejos em homenagens aos deuses, tão Figura 6 – Zaratustra
comuns em outras religiões da Antiguidade, será que existiam no
zoroastrismo? A resposta é sim, e elas estavam profundamente
enraizadas na cultura daquele povo, cuja fé já teve dias de
apogeu, envolvendo milhões de pessoas, mas que atualmente,
praticamente desapareceu do mapa religioso, entrando em
declínio perante outras profissões de fé contemporâneas.
Vejamos:

Anualmente, os zoroastrianos têm a


obrigação de celebrar sete festas dedicadas
aos deuses. A origem desses eventos
remonta aos antigos rituais indo-iranianos
em que os agricultores comemoravam
as passagens das estações do ano. Seis
delas são chamadas de gahanbars ou
gahambars, e seus nomes são preservados
até hoje: Maidhyoi-zaremaya (no meio da
Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/
primavera); Maidhyoi-shema (no meio do
Zaratustra#/media/File:Zoroaster_1.jpg>.
verão); Paitisshaya (trazendo a colheita para casa); Ayathrima (trazendo o rebanho
para casa); Maidhyairya (festa de inverno); Hamaspathmaedaya (todas as almas) e
Nõ Ruz (ano novo) (FUNARI, 2009, p. 112).

A influência do zoroastrismo foi mais forte até o século VII d. C. De lá para cá, árabes, turcos
e mongóis alternaram-se no domínio da Pérsia (depois chamada de Irã) e de outros territórios do
Oriente Médio. O golpe foi ainda maior: livrarias e obras de arte destruídas, imposição da língua
árabe sobre os persas, conversões forçadas e humilhações sociais. No século X, um grupo de
remanescentes partiu do Irã rumo à Índia em busca de refúgio. Hoje, alguns milhares de seguidores
vivem espalhados no Paquistão, Sri Lanka, Irã e na própria Índia.

Os celtas
Este povo acreditava na imortalidade e no renascimento das almas. O mundo dos imortais, para
os celtas, era paralelo ao mundo visível e os espíritos dos parentes mortos circulavam pelo espaço

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de vivência dos seus entes. Acreditavam ainda, na transmigração das almas para formas animais,
especialmente, pássaros e peixes. Porém, não existem muitos registros da religião deste povo que
habitava as regiões da atual Irlanda, Inglaterra, França e partes da Espanha. A religião celta chamava-
se druidismo, e era representada pelos druidas, espécies de sacerdotes e conselheiros espirituais.

A profusão de tribos e nações Celtas ou que tenham adotado o Druidismo no espaço


europeu, constitui certamente, uma grande diversidade de aspectos culturais e
sociais que ainda merecem muita pesquisa e divulgação. O que sabemos atualmente
é pouco, mas é o suficiente para não descartar uma verdade absoluta: os Druidas
representaram, na Europa Ocidental, uma classe de homens que trouxeram dos mais
remotos tempos da humanidade e da civilização uma sabedoria que nasceu com a
investigação das estrelas e com a busca de uma realidade transcendente (FUNARI,
2009, p. 120).

Segundo o druidismo, toda recordação material era uma presença, um elo com o sagrado mundo
das almas imperecíveis. Assim, as cabeças dos inimigos, bem como as dos parentes e entes amados,
eram cultuadas como troféus ou como emblemas de memória. Portanto, percebe-se que para os
celtas o sacrifício humano era um ritual que agradava os deuses. Tais rituais eram presididos pelos
druidas, sem os quais nada poderia ser feito no âmbito do sagrado.

Conforme Funari (2009, p. 124), outra prática conhecida na religião celta era a necromancia,
“que consistia na leitura de sinais interpretados segundo a maneira pela qual o sacrificado caía
depois de um golpe fatal ou através de suas vísceras, dentre outros sinais macabros”. Além disso,
é possível saber que o druidismo se valia ainda de uma série de outras estratégias que misturam
fé e temor junto ao público. “Inúmeras eram as formas de sacrifícios humanos: crucificação, rajada
de flechas, fogueiras de humanos e decapitação” (FUNARI, 2009, p. 124).

Outros elementos significativos na religião druidista são as profecias, por meio da observação
dos astros e de uma numerologia sagrada, e tais componentes somavam-se à crença da imortalidade
da alma e na sua migração para um mundo espiritual paralelo, que transcorre em simultâneo ao
mundo físico. Percebe-se, com isso, o quanto a religião celta envolvia uma espécie de misticismo
com aspectos celestiais, como por exemplo, a indestrutibilidade da alma humana e os atos realizados
na vida terrena.

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Os druidas não deixaram muitos registros escritos, ou seja, Figura 7 – Druida
muitos conhecimentos se perderam ao longo dos séculos. Para
eles, a base de sua religiosidade estava no conhecimento dos
mestres, que através da oralidade, formavam os seus discípulos,
por meio de uma relação íntima. Vejamos:

Para os druidas da Antiguidade, a escrita era


um meio sagrado de comunicação com os
deuses, e eles a usavam como ritual religioso.
Mas o meio de se transmitir o sagrado era
pela oralidade. Assim, os ensinamentos não
foram transcritos e organizados em literatura
escrita. O fundo era oral, a prática era oral.
O interessante é que a interdição da escrita
não ofuscou a memória, ao contrário, tornou
possível a transmissão, durante séculos, na
clandestinidade. Cabe a nós agora tentarmos Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/
entender uma civilização pouco conhecida e Druida#/media/File:Two_Druids.PNG>.
porém tão perto de nós através de heranças
europeias (FUNARI, 2009, p. 128).

Figura 8 – Canção do Amorgem, do druida Bardo Amorgem

Fonte: Funari (2009, p. 129).

Um dos poucos registros escritos da religião druidista é a Canção do Amorgem, do druida Bardo
Amorgem (ver figura 8). O pergaminho no qual ela fora grafada foi conservado por religiosos de
um mosteiro.

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Os vikings
A religiosidade nórdica possuía uma natureza tolerante, sem qualquer espécie de fanatismo
e isto era fruto de uma sociedade pragmática. Essencialmente, as concepções de vida e morte
tinham dois espaços semelhantes aquilo que compreendemos atualmente como céu e inferno. Na
concepção viking, os que morriam em batalhas iam para o palácio do Valholl, o paraíso, e os que
morriam de doenças, velhice ou acidentes iam para o reino de Hel, o inferno.

Os vikings foram um povo de origem germânica que habitou as regiões das atuais Suécia,
Noruega, Dinamarca e Islândia, e tiveram seu ápice entre 790 e 1100 d. C. Não há, porém, uma data
específica que marque a origem da religião viking.

O desenvolvimento das crenças escandinavas, dessa maneira, se formou com base


em um passado pangermânico da Antiguidade, com estruturas próprias e com
influências externas no período medieval (FUNARI, 2009, p. 132).

Além disso, é interessante notar o quanto a religiosidade nórdica não possuía nenhum livro
sagrado e tinha pouca unidade de coerência, ou seja, as variações de certo e errado, bem ou mal,
variavam de local para local. Os atos, gestos e rituais mais significativos da religiosidade nórdica
giravam em torno do sacrifício de animais, bem como a mescla de relatos que envolviam dogmas
e mitos baseados, principalmente, em relatos de tradição oral.

Os escandinavos possuíam mitos de origem e destino do universo e seus componentes.


No início dos tempos teria existido um abismo chamado Ginnungagap. Próximo
dele se estendiam duas regiões, uma gelada e nebulosa com o nome de Niflheimr, e
outra clara e resplandecente, denominada Múspell. Quando o gelo de Niflheimr caiu
no abismo e derreteu, formou um gigante, Ymir, e uma vaca Auoumla, que lambeu o
gelo salgado. Conforme ela lambia, surgiam seres antropofórmicos: os deuses Odin,
Ville e Vé, que mataram o gigante Ymir. A partir desse cadáver, o trio formou toda a
estrutura do universo conhecido, desde a abóboda celeste até os homens. A base
do cosmos seria uma árvore, conhecida como Yggdrasill, que uniria os três níveis do
universo (dos deuses, homens e submundos) e nove mundos (FUNARI, 2009, p. 133).

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Os nórdicos também acreditavam que no futuro (embora Figura 9 – Odin, um dos principais
deuses da religião viking. Considerado o
não tenhamos condições de definir o que significava futuro deus da sabedoria, da guerra e da morte
para eles, nem quantos anos ainda separavam o cotidiano
nórdico deste momento), as principais divindades seriam
destruídas e o universo, bem como suas forças motrizes,
seriam renovados. Odin inclusive seria morto. Após este
período de caos, um novo mundo seria criado. Nesse ponto,
é possível vislumbrarmos alguma semelhança com o livro
bíblico do Apocalipse.

Ainda neste ponto, é interessante observar que Odin era


o deus mais poderoso da religiosidade nórdica. Era uma
espécie de ser supremo e entre seus filhos estava Thor, o
deus do poder, da força, da chuva, dos raios e relâmpagos.
Ele defendia os humanos e outros deuses dos poderes
Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/
destrutivos dos gigantes, armado com um martelo, luvas de Odin#/media/File:Odin-thor.jpg>.

ferro e um cinturão mágico. Thor, juntamente com Odin, são as entidades celestes mais conhecidas
da religião nórdica ao redor do mundo, sendo inclusive personagens de filmes, desenhos e outros
produtos de entretenimento, literatura ou informativos.

Em meio a tantas crenças politeístas, qual seria a relação que os vikings estabeleciam com a
morte? Ou dito de uma outra forma: haveria uma espécie de vácuo entre a passagem da vida do
mundo real para o mundo espiritual? Mais uma vez, iremos recorrer ao estudioso das religiões
antigas, Pedro Paulo Funari (2009, p. 136), para conhecermos detalhes acerca disso. Vejamos.

A noção do “nada” não existia entre os vikings, sendo totalmente estrangeira. A morte
não era jamais um termo absoluto nem mesmo uma ruptura radical. Era considerada
uma simples mudança de estado. Morrer era passar à esfera dos ancestrais, com
o saber e poder tutelar. Pode-se também retornar à vida sob outra forma como a
reencarnação, que era limitada ao clã. Perpetuar um nome era necessariamente
ressuscitar um ancestral, o patrimônio indivisível que se transmite de geração para
geração.

Não ocorria uma demarcação clara entre vivos e mortos. A circulação de um


domínio e outro não era jamais interrompida, os mortos frequentemente vinham
informar os vivos sob a forma de aparições, revelações, sonhos, signos e símbolos.
A mentalidade germânica não possuía uma consciência clara e objetiva de outro
mundo: é o cristianismo que o introduz.

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Os principais cultos religiosos praticados pelos vikings Figura 10 – Thor, ao lado de Odin, forma
a dupla de divindades nórdicas mais
estavam relacionados a ciclos sazonais das estações do conhecida ao redor de todo o mundo
ano, bem como a situações de batismo, sagrações de
terras e templos, funerais, vitórias em batalhas e fertilidade.
Além disso, a religiosidade podia ser sintetizada através da
expressão “dou para que me dês”, ou seja, numa prática
de harmonia e convívio social bastante empirista, sendo
que no plano familiar cabia ao líder do clã uma série de
atributos de ordem religiosa, atribuindo-se a esta pessoa
também a função de sacerdote. Obviamente, porém,
trata-se ainda de uma sociedade baseada na dominação
exercida pela masculinidade.

Os sacerdotes nórdicos não constituíam


uma ordem separada da população
comum, e não havia separação entre o
laico e o sagrado. Não existia sacerdócio
profissional e a responsabilidade cabia
ao rei ou chefe local. Para a maioria
dos especialistas, jamais teria havido
Fonte: Fotokostic/Shutterstock
uma casta de sacerdotes ou servidores
encarregados do sagrado, já que o sacerdócio era circunstancial: não se conheciam
ritos de iniciação ou cerimônias de formação de sacerdotes entre os vikings (FUNARI,
2009, p. 138).

Os templos não eram apenas construções físicas. Bosques, montanhas e mananciais de água
também eram locais de práticas religiosas, pois os escandinavos acreditavam que neles habitavam
os espíritos dos ancestrais que os orientavam ao longo da vida. Os nórdicos também acreditavam
bastante na força da magia, que tinha para eles um caráter divino e, portanto, eram praticadas por
pessoas que viviam à margem da sociedade a maior parte do tempo. Vejamos:

Um tipo específico de magia era o galdr, constituído basicamente de palavras para


curas, cuja performance envolveria uma voz estridente e aguda. Mas a prática mágica
mais utilizada foi o seior (canto), que em muitos casos foi descrito como feitiçaria
para ferver certos objetos imputados de poderes mágicos, sendo utilizado como
um rito advinhatório para assassinato, ou ainda relacionado a quatro ações básicas:
prever o futuro, aprisionar, causar doenças e desgraças ou matar.

Era um tipo de magia extática ou xamântica com transe, êxtase do celebrante e


cantos da assembleia, geralmente realizada durante a noite e praticada sobre uma
plataforma chamada de assento para encantamento. Também compreendia fórmulas
mágicas para chamar tempestades e todos os tipos de injúrias, metamorfoses e
predição de eventos futuros.

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Durante o seior, cria-se que o xamã e os demais envolvidos, deveriam descer ao
mundo dos mortos para relatar os ensinamentos que buscam os vivos e para efetuar
certos malefícios. O seior respondia primariamente a situações de crise e requeria,
neste contexto, uma clientela e a participação de uma assembleia. O ritual apelava
para o auxílio de espíritos, informações divinatórias e o controle da mente (FUNARI,
2009, p. 142).

Em suma, a religião viking perdeu força após o início da cristianização dos países escandinavos
a partir do século XI. Enquanto algumas nações, principalmente a Noruega, foram forçadas a aderir
ao cristianismo de modo violento, outras nações, como a Islândia, tiveram uma transição religiosa
bastante tranquila. Porém, a partir do século XIX, com a formação das nacionalidades modernas,
o culto ao passado e o acesso a livros antigos fez renascer, ainda que de modo mais restrito, o
paganismo entre aqueles povos.

Figura 11 – Vikings e a vida marítima

Fonte: Nejron Photo/Shutterstock

Os vikings eram um povo que tinha como característica a exploração marítima. Muitos os
julgam como bárbaros, porém, é preciso levar em conta o contexto social daquela época, em que
os mais diferentes povos litorâneos tinham desejo de exploração marítima e isto sempre resultava
em descobrir novos territórios.

Os albigenses
O movimento albigense era dualista, ou seja, compreendia o mundo basicamente através de
duas vertentes espirituais: um deus do bem e outro maligno. Suas ideias e a negação de uma série
de práticas da Igreja Católica, bem como da sua hierarquia religiosa, tornaram os seguidores deste

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movimento alvo de uma cruzada entre 1209 e 1212. Para o catolicismo, tal movimento era uma
afronta e tratava-se de uma heresia, que posteriormente resultou na criação da inquisição medieval.

O desejo papal de reprimir a manifestação religiosa dos albigenses combateu os “hereges” com
assassinatos, torturas, envenenamentos e outras práticas abusivas. Para a Igreja, os albigenses
eram cristãos que renegaram os sacramentos, como o batismo e a comunhão, além da autoridade
dos bispos e do papa. Mas, afinal de contas, qual foi a origem deste movimento que afrontou o
tradicionalismo que até então era observado em termos de obediência ao catolicismo? Vejamos:

O movimento albigense ou catarismo é parte de uma cadeia de religiões que se


denominam dualistas. Dualismo é uma concepção religiosa que compreende o mundo
dividindo-o entre dois poderes antagônicos: dois deuses ou entidades espirituais
que se opõem, sendo geralmente um deles o deus do bem e da espiritualidade e, no
contraponto, um deus maligno e inserido no mundo material e carnal.

Esse dualismo é muito antigo e há evidências de que suas origens remontem às


sociedades pré-históricas. Os registros que temos nos indicam que muitos movimentos
dualistas foram contemporâneos ao surgimento do judaísmo e do cristianismo. Entre
os locais onde surgiram essas religiões, se sobressai a região da Mesopotâmia e da
Pérsia (atual Irã).

Nesse espaço de encontro entre as expressões religiosas do Oriente e do Ocidente,


deu-se concepção de inúmeras religiões de caráter dualista. As razões são imprecisas.
Alguns autores acreditam que a tensão entre os espaços contrastantes como o
deserto com sua aridez e os vales alagados pelos rios, e o choque entre as populações
sedentárias e os nômades, possam ser um fator de criação do embate criado no
panteão dos deuses regionais, entre entidades benignas e dotadas de fertilidade por
um lado e outras com potenciais opostos, ou seja, originadas no deserto e sendo
malignas. Isso se altera na sequência, mas prevalece o dualismo (FUNARI, 2009, p.
147).

O termo “albigense” se refere ao povo de uma cidade chamada Albi, situada no sul da França.
Outro termo usado, constantemente, seria “cátaros” ou “catarismo”, e se refere a uma palavra grega
cujo significado é puro. Relaciona-se com a crença dos albigenses, que os líderes espirituais seriam
perfeitos de alma e não contaminados pela matéria maligna. Os preceitos desta religião estavam na
“crítica à riqueza e à ostentação do clero, além do abandono da continência e de muitos elementos
da Igreja” (FUNARI, 2009, p. 150).

Em termos de criação e escatologia, as duas concepções mais difundidas desta religião são a
dualista e a monarquiana. Para esta última, a concepção do mal está atrelada a um anjo caído. Na
primeira, o mal seguiria persistindo através da eternidade. Os mitos da criação também geravam
divisões no seio desta religião. Uns acreditavam que o mundo material teria sido obra do diabo, já
outros entendiam que o diabo fez uso de elementos já existentes antes mesmo da criação do mundo.

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Segundo os albigenses, os seres humanos poderiam Figura 12 – Cruzada albigense
libertar-se da maldade que estava inserida na carne
humana através do arcanjo Miguel e de Jesus Cristo, cujo
aparecimento dava-se pela necessidade da humanidade em
se libertar da prisão corporal para que pudessem retornar
ao mundo espiritual e ao Deus do bem.

Os albigenses também negavam a ressureição da carne


e a existência do inferno, acreditando que a passagem dos
seres humanos pela Terra significava uma espécie de prova,
onde a alma deveria ser lapidada para então, posteriormente,
ganhar o acesso à eternidade. Esse processo buscava uma
espécie de vitória das almas contra a matéria e, ocorrendo,
Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Cruzada_
significava a derrota de Satanás, o que traria as almas para Albigense#/media/File:Cathars_expelled.JPG>.

o reino eterno.
Em relação às Escrituras Sagradas também não havia consenso, mas geralmente, só aproveitavam
o Novo Testamento. “Eram intolerantes em relação a todos os credos que não aceitassem a
malignidade da matéria, acreditando que seus seguidores seriam adeptos do Satã e condenados”
(FUNARI, 2009, p. 153). Parte dos seguidores também negava a divindade de Jesus Cristo, enquanto
outros membros negavam a Trindade Santa e concebiam o próprio Cristo e o Espírito Santo como
entidades derivadas do Criador, e não santidades próprias.

Além disso, é interessante notar outro aspecto da religiosidade albigense: “A sua visão negativa
da vida e do corpo tornava a morte um desejo e o suicídio um gesto bem aceito. Libertar a alma
da prisão do corpo era um gesto benigno” (FUNARI, 2009, p. 153). Por outro lado, a procriação era
vista como algo crítico, afinal de contas, novos nascimentos ajudariam a perpetuar a presença das
almas encarnadas na matéria, por isso, era comum que muitos de seus membros e sacerdotes não
tivessem filhos.

A negação da Igreja Católica, de sua hierarquia e de seus dogmas, dava à religião albigense
dois grupos, basicamente: um de caráter social-religioso e outro de ordem eclesiástica, ou dito de
outra forma: os perfeitos (homens-bons) e a massa de fiéis. Vejamos as principais características
de cada um desses grupos sociais, levando em consideração que, para pertencer a um deles, era
necessário não submeter-se a nenhum tipo de autoridade ligada ao clero católico.

Os perfeitos eram um grupo de elite espiritual. Para pertencer a ele dever-se-ia adotar
uma vida extremamente regrada. Abster-se de riquezas, ser casto e viver dentro de

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rígidas regras de distanciamento da materialidade. O rito de ingresso no grupo dos
perfeitos era o consolamentum. Tratava-se de uma cerimônia que intercalava uma
imposição de mãos e o toque no texto dos Evangelhos que eram aceitos.

Não se encontrou equivalência com um dos sacramentos da Igreja, pois tinha um pouco
de alguns dos sacramentos: resquícios do batismo, da penitência e da comunhão,
sem ser nenhum deles. O novo perfeito deveria assumir compromissos de uma vida
doutrinária: castidade, jejuns prolongados, vegetarianismo e viver na mais absoluta
simplicidade dos atos. Recitavam o Pai-Nosso, a única das orações admitidas pela
comunidade.

Os perfeitos faziam três grandes jejuns anuais: um antes da Páscoa, outro a partir
do domingo de Pentecostes, outro no mês anterior ao Natal. Durante a primeira e a
última semana desse período, o perfeito só se alimentava de pão e água. Em outros
jejuns e nos dias comuns seguiam essa dieta por três dias a cada semana (FUNARI,
2009, p. 154).

E quanto aos fiéis, como construíam o seu dia a dia religioso?

Já os fiéis podiam viver dentro de relativa normalidade, casando-se e adquirindo bens.


Para salvá-los criou-se uma espécie de penitência denominada aparellamentum, e
se acertava em vida que se estivessem diante da morte poder-se-ia realizar antes
o consolamentum para purificá-los, salvar sua alma e libertá-lo do mundo material.
Há notícia de que num período tardio se criou um ritual de passagem para novos
fieis, denominado convenenza, mas grande parte dos fieis não passou por esse
ritual antes de 1244. Somente aos que o faziam a partir dessa data se garantia o
consolamentum nos seus últimos momentos de vida. Os fieis comuns deviam ter
jejuns mais moderados, mas não há registros desses hábitos (FUNARI, 2009, p. 154).

Figura 13 – Inferno segundo a ótica albigense

Fonte: <https://en.wikipedia.org/wiki/Winchester_Psalter#/media/File:Ein_Engel_
versperrt_die_Pforten_der_Unterwelt_mit_einem_Schl%C3%BCsel.jpg>.

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Também vale ressaltar que esta religião penetrou entre as massas mais populares, seja no campo
ou na cidade, por conta de seu posicionamento contra a Igreja Católica e, em razão, no próprio
exibicionismo desta própria, que havia enriquecido e ostentava essa riqueza tanto nos suntuosos
edifícios quanto na vida cotidiana dos seus representantes.

Os clérigos não viviam de maneira exemplar. Não guardavam a castidade, nem tinham
hábitos regrados. Era comum padres terem barregãs, ou seja, um casamento não
permitido ou uma amante, contrariando o celibato obrigatório (FUNARI, 2009, p. 156).

Por fim, o catolicismo romano reagiu. O papa Inocêncio III deflagrou uma Cruzada entre 1202
e 1204, contra os chamados “hereges”. Um exército formado por nobres e pessoas cooptadas foi
formado, e partiu com uma missão: matar. Ceifaram a vida de homens, mulheres e até mesmo
crianças, afinal de contas, era difícil reconhecer quem seria “herege” e quem serviria ao catolicismo.
Por via das dúvidas, Inocêncio sentenciou: “Matem a todos, que Deus saberá distinguir quem são
os seus fiéis” (FUNARI, 2009, p. 158). Então, pouco a pouco, a religião albigense desapareceu da
França e do mundo.

O gnosticismo
O gnosticismo é uma expressão religiosa que merece ser lembrada. Apesar da origem obscura,
um dos seus principais pontos de fascínio junto ao público está em sua linguagem simbólica para
compreender as questões da vida terrestre e da espiritual. O próprio fato dos gnósticos serem
combatidos por bispos e papas romanos deixa evidente que, embora adotassem práticas do
cristianismo, muitas delas iam contra aquilo que defendia a Igreja. É interessante notar que para
os crentes dessa profissão de fé, a espiritualidade

permeia a vida humana. A fantasia serve para levar à sabedoria e a fé. Jesus é tido
como um narrador que conta histórias enigmáticas. O corpo e a matéria parecem
falsos espelhos de um mundo mais profundo. A alma permanece, se eleva a um mundo
superior, imune às agruras da carne, sem as dores e os sofrimentos da fragilidade
humana (FUNARI, 2009, p. 67).

A popularidade dos gnósticos cresceu no Egito e na Pérsia (atual Irã) entre os séculos II a. C. e
I d. C., com o desenvolvimento de manuscritos e formas de expressão humanas para manutenção
de conhecimentos. Entre as literaturas gnósticas disponíveis até hoje, o Evangelho de Tomé é,
talvez, a mais importante pois permite a visualização mental, ou seja, o ato imaginário de tentar
compreender a passagem de crenças de uma espécie de cristianismo primitivo para uma linhagem
mais esotérica. Por outro lado, pode-se dizer que os gnósticos foram odiados na história oficial,

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dado o desprezo que religiões de maior peso político e densidade populacional imprimiram aos
símbolos esotéricos e rituais praticados pelos fiéis desta corrente religiosa.

RELIGIÕES E IMPÉRIOS DA ANTIGUIDADE


Neste tópico, veremos informações relevantes sobre aspectos históricos de religiões de três
importantes impérios do passado: gregos, romanos e egípcios.

Os gregos
Os gregos da Antiguidade nunca foram muito unidos. Falavam dialetos variados, viviam em
diferentes regimes políticos e tinham práticas religiosas um tanto quanto difusas. Na verdade,
os livros começaram a registrar informações sobre a religiosidade grega a partir do ano 1200 a.
C, período em que os povos do Norte chegaram ao território grego e ajudaram na formação de
características daquele povo.

Posteriormente, a religião grega, cujas origens apontam para a região do Mediterrâneo oriental,
expandiu-se para outras localidades como o sul da Itália, França e Espanha, bem como outros
territórios que hoje situam-se na região da Macedônia, a partir de conquistas realizadas por
Alexandre, o Grande entre 356 e 323 a. C. Sabe-se, porém, que os gregos desde o início dos tempos
costumavam erguer templos para celebrar as divindades as quais desejavam prestar culto.

Por outro lado, não havia um livro sagrado que reunisse os princípios religiosos dos gregos, nem
mesmo textos ou sacerdotes que pudessem sintetizar a essência de tais práticas religiosas. Em
função disto, havia várias versões acerca de mitos e crenças, variando de região para região. Porém,
mesmo que de forma não sistematizada, podemos afirmar que havia uma premissa na religiosidade
grega: “Conhece-te a ti mesmo”, ou seja, pregavam que as pessoas deveriam interiorizar-se para
compreender sua essência.

Uma outra reflexão se faz necessária:

Chegamos, aqui, a um segundo aspecto essencial: a mortalidade humana e a


imortalidade divina. Essa divisão era, em princípio, essencial e intransponível. Mas
na prática havia dúvida se um humano poderia tornar-se divino ou qual a porção
de divino que um homem poderia alcançar. Os heróis eram humanos que, mortos e
enterrados, recebiam culto e, de alguma forma, eram deuses. Alguns poucos heróis
foram considerados deuses de verdade. Os deuses tudo podiam, os homens nada,
daí a importância do culto. A morte levaria a uma situação miserável (FUNARI, 2009,
p. 45).

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Mas, se os gregos não possuíam um livro sagrado, como os gregos operavam a transmissão
de sua religiosidade? A resposta era passada por meio da oralidade, tanto na família como em atos
públicos, no teatro e nas ágoras, ou seja, nas praças públicas. Alguns relatos eram muito famosos,
como a Ilíada e a Odisseia, atribuídas ao poeta Homero, e eram conhecidos em todo o mundo grego.
Outros eram conhecidos apenas em determinadas regiões. Hoje, graças à difusão tecnológica,
informações sobre o legado religioso dos gregos formam uma parte considerável do patrimônio
cultural da humanidade.
Nesta representação de Ilíada, de Homero (figura 14), Figura 14 – Corpo de Heitor
sendo levado de volta à Troia
vê-se o corpo de Heitor sendo carregado por conterrâneos
troianos, num ato semelhante ao carregamento de um
mártir, cuja morte foi carregada de dramaticidade.

Na Grécia Antiga, os rituais constituíam a vivência e


davam razão à religiosidade. Isso era tanto mais verdadeiro
para os gregos, pois eles acreditavam que sua sorte dependia
dos rituais praticados. “Em geral, os ritos existentes levavam
os gregos a propor mitos que os explicassem” (FUNARI, Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/
Il%C3%ADada#/media/File:Hector_
2009, p. 46). Os rituais precediam o contato com os deuses brought_back_to_Troy.jpg>.
e deusas e neles, sacrifícios eram oferecidos a essas
divindades e altares eram preparados e decorados.
Os gregos evidenciavam três partes, mais ou menos sagradas, em torno da realização dos cultos
às suas divindades. No centro do templo, ficava o lugar sagrado, o local onde eram praticados os
sacrifícios. No entorno, havia uma área livre que delimitava o campo sagrado. O local mais importante,
porém, era o próprio altar, onde “o sacrificador ficava sobre uma plataforma, onde se cortava o
pescoço do animal. Uma parte da carne era queimada para que o odor agradasse ao deus, sendo
o restante da vítima consumida” (FUNARI, 2009, p. 46).

Como vimos anteriormente, dada a extensão do território grego, havia diversas práticas religiosas.
Porém, conforme Pilagallo Filho (2008, p. 72), duas se destacavam: as práticas religiosas micênicas
e as helenísticas. A religião micênica viveu seu ápice por volta de 1500 a. C. e, ainda hoje, pode ser
encontrada através de vestígios contidos em placas de argilas. Elas apontam para a existência de
sacerdotes e sacerdotisas. Porém, não existem detalhes sobre aspectos da realização dos cultos
e crenças.

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Já a religião helenística, que chegou a ser verificada inclusive em partes da Índia, Egito e
Mesopotâmia, os reis e rainhas eram considerados divindades, tal como na religião egípcia. Era
politeísta e as pessoas costumavam usar amuletos, consultar localidades que eram consideradas
oráculos e também recorriam a magias para que os deuses e deusas pudessem se atentar aos
clamores populares.

Mas os gregos não se comunicavam com suas divindades apenas através dos rituais. As festas
também eram uma expressão deste desejo com as forças espirituais. Quase todas eram ligadas
ao calendário agrícola, como as festas do renascimento da vida e da vegetação. Nelas, também
existiam sacrifícios, que eram acompanhados por cânticos, danças e períodos de abstinência sexual.
Durante tais festejos, se houvesse algum nascimento ou até mesmo mortes, era necessário realizar
uma espécie de ritual de purificação em todos os envolvidos.

Também é curioso observar que os Jogos Olímpicos na Grécia eram parte das festividades
religiosas. Além deles, havia outros três jogos de caráter pan-helênico: os jogos ístmicos, uma festa
em homenagem a Poseidon; os píticos, que homenageavam Apolo; e os nemeus, em honra a Zeus.

Havia várias modalidades de provas. As atléticas constituíam fundamentalmente em


corridas pedestres de velocidade e de fundo. O pentatlo era constituído por cinco
provas combinadas: luta, corrida pedestre, lançamento de disco e de dardo e salto.
Outras provas eram o pugilato (antepassado do atual boxe), luta livre, corridas com
carros e corridas com tochas. O pancrácio, combate ginástico, combinava a luta livre
e o pugilato, e neles eram lícitas as rasteiras e os pontapés para derrubar o oponente.

Não apenas os jogos eram religiosos, mas também as representações teatrais e, em


alguns períodos do ano, até mesmo a alimentação nas quais se comia a carne dos
animais sacrificados ou se abstinham de comer qualquer espécie dela (PILAGALLO
FILHO, 2008, p. 73).

Figura 15 – Poseidon, divindade que os gregos cultuavam como o deus do mar

Fonte: Anders Peter Photography/Shutterstock

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Vejamos a seguir uma relação dos principais deuses e deusas da Grécia Antiga, e as características
de cada um deles, em que se destaca atuação, proteção ou manuseio de influência, conforme crença
dos gregos que vivenciaram a Antiguidade. É interessante observar que há uma clara delimitação
da esfera de atuação de cada uma das divindades citadas a seguir.

Quadro 1 – Deuses e Deusas da Grécia Antiga

Deuses Gregos Principal característica


Afrodite Deusa da beleza e do amor
Apolo Deus da luz
Ares Deus da guerra
Ártemis Deusa da lua
Atena Deusa da sabedoria
Deméter Deus da terra fértil
Dionísio Deus da festa, do vinho e do prazer
Éos Deus do amanhecer
Eros Deus do amor
Hades Deus do submundo
Hélios Deus do sol
Hermes Deus do vento
Hera Deusa dos céus e do matrimônio
Héstia Deusa do fogo
Horas Deusa das estações do ano
Mnemósine Deus da memória
Perséfone Rainha do submundo
Poseidon Deus dos mares
Têmis Deus da guerra
Zeus Deus dos deuses
Fonte: elaborado pelo autor, adaptado de TodaMatéria (2013).

Também pensamos ser importante considerar que os gregos vivenciavam uma relação ambígua
entre poder e religião. Por exemplo: os deuses, tudo podiam, já os homens e mulheres comuns,
estavam sempre diante da possibilidade de extrapolar, serem arrogantes, descontrolados etc.
Quando agissem deste modo, os seres humanos iam contra o preceito do “conhece-te a si mesmo”.
Por fim, é necessário informar, ainda, que os cultos e rituais religiosos gregos eram em sua maioria
realizados por homens, embora houvessem ocasiões em que as mulheres eram as principais
prestadoras do culto.

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Figura 16 – Atena, deusa grega da sabedoria e da guerra estratégica, teria nascido a partir da cabeça de Zeus

Fonte: Dimitrios/Shutterstock

Os romanos
Pensar a religião no antigo Império Romano é uma tarefa relativamente difícil, afinal de contas,
neste espaço, faremos uma síntese de um grupo social que se manteve no poder por mais de dez
séculos e, portanto, quando falamos de religião na Roma Antiga, iremos nos referir a algumas
práticas de relações com o divino, ou seja, cultos politeístas, que foram realizados desde a fundação
da cidade por volta do século VIII a. C.

Ao longo dos tempos, Roma foi habitada por etruscos, vivenciou guerras, períodos ditatoriais,
republicanos e conviveu com uma mescla de sua própria cultura com a grega, de modo que recebeu
uma identidade cultural múltipla. Nos primórdios, os chamados pagani (camponeses – daí a origem
do termo “paganismo”) acreditavam numa espécie de equilíbrio entre os poderes divinos e as ações
realizadas por homens e mulheres. E nesse contexto, outro traço cultural romano se inicia:

A relação com os deuses nunca era individual, mas coletiva e o chefe da família era
o responsável pelo culto aos deuses Lares, ou seja, entidades protetoras das casas.

Nesse momento inicial, os romanos não decoravam seus tempos e também não
possuíam uma mitologia com deuses, mas reverenciavam a força divina como um
ato, tanto na natureza como nas atividades humanas (FUNARI, 2009, p. 56).

Se no princípio a religião romana estava fundamentada na harmonia entre o divino e o povo, a


partir do domínio etrusco, entra em cena a chamada Tríade Capitolina, formada por três deuses:
Júpiter – justiça; Marte – guerra; e Quirino – união do povo romano. Os etruscos controlavam os
cultos públicos para que neles fosse realizado apenas o que era permitido segundo a sua tradição,
e a sua religião contemplava gênios, ninfas e livros sagrados.

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Com o fim da dominação etrusca, a tríade de deuses romana sofre duas modificações. Júpiter
permanece e entram Juno, que simboliza a força guerreira e a fecundidade, e Minerva, protetora
das artes e dos artesãos. “Nesse momento surgem as primeiras estátuas de deuses romanos e os
cultos públicos se modificam” (FUNARI, 2009, p. 58). Por volta de 217 a. C. ocorre outra mudança:
a inserção da religiosidade grega.

Por fim, outra mudança de grande impacto ocorre durante o período de governo do imperador
Augusto. Ele criou uma série de templos, permitiu o culto a deuses gregos como Apolo e possibilitou
o início do culto e santificação da imagem dos próprios imperadores, bem como liberou a adoção
de costumes religiosos judaicos e persas, ou seja, Roma vivenciou um período de pluralidade em
termos de relacionamentos com divindades e prestação de cultos a elas.

Neste sentido, outra percepção é importante:

Como essas tradições eram baseadas em noções de dualidade (bem/mal, luz/


sombra), os contrastes e diferenças entre as tradições religiosas foram marcados
e os conflitos iniciaram, principalmente após o desenvolvimento do cristianismo.
Muitas percepções cristãs, como o valor espiritual dos pobres, os dogmas e a
noção do pecado, eram alheias aos pagãos, pois no interior do paganismo havia a
possibilidade de escolhas e linhas a serem seguidas, mas nada que se comparasse
à noção de dogma ou verdade única. Essas diferenças de percepções, atreladas a
questões políticas, propiciaram muitos confrontos e mortes ao longo do período
imperial, seja de cristãos, seja de pagãos, até que estes últimos foram perseguidos e
tiveram seus templos destruídos ao final do Império Romano (FUNARI, 2009, p. 59).

Figura 17 – Culto a Cesar, o imperador romano

Fonte: <https://revistadehistoria.es/el-culto-privado-en-roma-los-dioses-domesticos/>.

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A partir do período governamental de Augusto (27 a. C. até 14 a. C.), foi iniciado o culto aos
próprios imperadores. Na imagem (figura 17), vê-se o público fazendo oferendas a César, oferecendo-
lhe, inclusive, um pequeno carneiro, e na parte de baixo central da imagem, uma mulher preparando
vinho para também ser oferecido ao “deus-imperador”.

Durante toda a história romana, os cultos públicos eram realizados por sacerdotes que além
de conhecer os rituais e suas necessidades sabiam, ainda, quais eram oferendas e sacrifícios
que mais agradavam aos deuses. Porém, esses homens, controlados pelo governo, também não
podiam inovar em seus rituais a ponto de desagradar o imperador e seus asseclas. Neste sentido,
é interessante observar que

os primeiros templos onde se realizavam os cultos públicos, tinham locais pré-


determinados para serem construídos, eram quase quadrados e possuíam três
compartilhamentos para abrigar a tríade divina. A única exceção era o templo dedicado
a Vesta, protetora do fogo sagrado, que tinha um traçado arredondado. Os primeiros
templos eram de madeira e, mais tarde, passaram a ser de pedra (FUNARI, 2009, p. 60).

Com os passar dos anos e ao avançar com suas conquistas pelo Mediterrâneo, os romanos
entraram em contato com outros deuses e religiões que alcançaram grande popularidade entre seu
povo. O culto à deusa Cibele foi o primeiro a ser assumido pela religião romana. Do Egito importaram
os cultos em homenagem às deusas Ísis e Serápis, e do Irã, os de Mitra, que se difundiram entre os
militares. Todos coincidiam em promover a seus fiéis uma nova vida após a morte.

Porém, com o senso de patriotismo sempre aflorado, os romanos oficializaram uma série de
deuses que eram tidos como cidadãos e supriam necessidades das mais diversas áreas, o que
configurava os romanos como um povo politeísta. Entre os cultos públicos, destacavam-se aqueles
que “sacralizavam os tratados de paz ou guerra, os pedidos de proteção aos campos cultivados
e os ritos de passagem dos novos ciclos anuais, como verão e primavera” (FUNARI, 2009, p. 60).

Vejamos a seguir uma relação dos principais deuses e deusas romanos, e a área em que cada
um se destacava em termos de atuação e/ou proteção conforme o entendimento daquele povo.
Interessante observar a clara delimitação da esfera de atuação de cada uma das divindades.

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Quadro 2 – Deuses Romanos

Deuses Romanos Principais características


Apolo Deus da música, da poesia, da adivinhação (oráculos) e do Sol. É considerado o protetor
das artes.
Baco Deus do vinho, das festas e do delírio místico.
Carmenta Deusa das fontes e da profecia.
Ceres Deusa dos frutos e da terra. Ceres apareceu em Roma quando os Etruscos atacaram a
cidade.
Cibele Mãe dos deuses e deusa da natureza.
Conso Deus protetor do grão enterrado. O rapto das Sabinos aconteceu na sua primeira festa.
Cupido Representa o amor personificado.
Diana Deusa da Lua, da caça, da castidade.
Fauno Deus da fecundidade e dos animais, e ainda, protetor dos rebanhos e dos pastores.
Flora Deusa de tudo o que floresce e esposa de Zéfiro.
Jano Deus da luz que possui dois rostos (um atrás e outro à frente).
Juno Esposa de Júpiter, deusa da mulher, protetora do casamento e dos filhos.
Júpiter Rei dos deuses e grande protetor de Roma. É ainda considerado o deus do céu, da chuva,
da luz e do raio.
Liber Deus da vinha (que muitas vezes é confundido com Baco).
Marte Pai de Rômulo e do povo romano é o deus das colheitas e da guerra.
Mercúrio Mensageiro dos deuses, é o deus do comércio, das estradas, da eloquência.
Minerva Protetora do comércio e da indústria é a deusa dos artistas e da inteligência.
Netuno Deus do mar e das tempestades.
Pales Considerado um gênio, Pales é o deus ou deusa dos rebanhos e dos pastores.
Plutão Deus dos Infernos ou do submundo.
Pomona Divindade dos frutos e das árvores.
Quirino Deus das colheitas, confundido com Rômulo e com Marte.
Saturno Relacionado ao céu, Saturno é o pai de Júpiter e deus das sementeiras.
Telure Deusa da terra ou das colheitas.
Urano Personificação do céu.
Vertumno Deus das estações do ano e do comércio.
Vesta Deusa do lar e do fogo.
Vênus Nascida das ondas do mar, Vênus é a deusa do amor e da beleza.
Vulcano Deus do fogo e marido de Vênus. Com o auxílio dos ciclopes, forjava os raios de Júpiter.
Fonte: elaborado pelo autor, adaptado de TodaMatéria (2018).

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Durante o período imperial também havia fartura, em termos de tipologia, dos cultos que eram
prestados aos deuses e deusas na Roma Antiga. Além de cultuar os imperadores divinizados, os
romanos tinham por hábito prestar muitos cultos à fertilidade, todos dirigidos à deusa Juno. Também
é interessante observar outras práticas festivas que ocorriam, fosse para agradecer as divindades
ou homenagear os próprios cidadãos e cidadãos proeminentes.

Em Roma realizavam-se festas para agradecer às divindades pelas colheitas, pela


semeadura e pelos frutos da terra, mas também pelas vitórias militares e outros
acontecimentos relevantes para o povo romano. Entre as mais importantes estavam
as matronais, as parentais e as saturnais.

As matronais eram festas das matronas ou mães de famílias romanas. No dia 1º de


março, eram elas que tomavam a iniciativa na casa. Pouco depois se celebravam as
parentais, que duravam nove dias, até o começo da primavera em 21 de março. Era
uma festa dedicada aos mortos, e por isso as tumbas dos familiares eram visitadas.

As saturnais, dedicadas a Saturno, eram realizadas em meados de dezembro, quando


acabavam os trabalhos no campo. Durante o período da festa, invertia-se a categoria
pessoal e social, de forma que os amos serviam aos escravos, e os homens às
mulheres (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 86).

Os romanos não pretenderam criar um império com uma única religião. No entanto, aqueles que
queriam alcançar postos de importância na própria Cidade Eterna ou em suas províncias costumavam
adorar os deuses de Roma, especialmente aqueles que exaltavam o poder da cidade. Havia uma
clara diferença entre os governantes de uma província que praticavam a religião romana, e a maioria
da população que mantinha cultos anteriores à consolidação do Império. Nas províncias, os deuses
das guerras locais foram eliminados, exceto aqueles que puderam ser utilizados em favor de Roma.

Figura 18 – Culto a uma divindade feminina. Queima de incensos e


outros produtos aromáticos para agradar os seus deuses

Fonte: <https://antoniocv.wordpress.com/tag/a-religiao-romana/>.

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É importante destacar, ainda, que foi a partir de Augusto, o primeiro imperador romano, que os
governantes passaram a utilizar a religião para reforçar o seu poder e a respectiva imagem pública
de cada um. Os mandatários construíram templos para si e neles colocaram imagens de deuses e
deusas que estavam em espaços públicos romanos, além de mandarem construir estátuas de si
próprios para serem cultuados pelo povo.

Pilagallo Filho (2008, p. 89), ressalta que “a partir de então, os monarcas tiveram caráter divino,
e o culto imperial chegou a ser algo que unia todo o império”. Assim, cultuar o imperador era uma
forma fundamental de manifestação do respeito ao poder de Roma e de seus governantes, e a sua
negação era uma grande ofensa ao Estado romano. Por isso, negar o culto imperial tornou-se um
crime, que poderia inclusive resultar em pena de morte.

No Império Romano muitas pessoas também acreditavam em encantamentos e criam que eles
poderiam realizar os seus desejos, causar danos aos inimigos ou obter o amor de quem desejassem.
E neste ponto, o paganismo também consolidou-se como expressão ritualística. Porém, após o
cristianismo ter sido declarado a religião oficial de Roma, pouco a pouco as práticas pagãs foram
sendo proibidas e os defensores destas práticas começaram a ser perseguidos.

Por fim, é importante refletir sobre alguns aspectos que, muitas vezes, passam despercebidos
em nossa religiosidade contemporânea, embora tenham ligações com antigas práticas pagãs e
romanas. Vejamos:

Muitas procissões cristãs lembravam as antigas destinadas aos deuses pagãos.


Exemplo disso ocorre com as dedicadas a Maria, pois embora o cristianismo fosse
contrário à presença de divindades femininas, as celebrações à figura da mãe de Cristo
foram inspiradas em culto à deusa Diana. Além disso, muitas datas de festividades
cristãs estão intimamente ligadas ao paganismo. Talvez o exemplo mais pujante seja
a celebração do Natal e do Ano Novo. A época do Natal está relacionada ao solstício
de inverno e a chamada Saturnália e, embora a nomenclatura tenha sido esquecida, o
espírito de troca de presentes e comida permaneceu. Por outro lado, o Ano Novo foi
estabelecido pelo calendário cristão no período das festas das Calendas de Janeiro,
ponto de início da vida cívica e social de cada ano romano (FUNARI, 2009, p. 63).

Aconteceu

Na cidade de Roma, os cristãos realizavam reuniões secretas nas catacumbas, uma série de túneis
e cavernas sob a cidade, usados como locais de sepultamento. Nesses túneis antigos, foram
encontradas pinturas e altares cristãos datados do século IV. Esses cristão primitivos também
usavam sinais secretos para mostrar que tinham a mesma fé. Entre eles, estavam o peixe, a âncora e
a pomba.

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Os egípcios
Os egípcios pensavam o mundo e, consequentemente, suas práticas religiosas a partir do
contexto social e geográfico no qual estavam inseridos, ou seja, a partir do deserto e do Nilo, o
importante rio que fertiliza suas terras. Interpretavam o mundo a partir de concepções sobre forças
superiores da natureza e das divindades, tendo o Sol como principal referência, sendo inclusive, a
grande referência dos faraós, e tendo motivado a fundação de Heliópolis, a chamada Cidade do Sol.

Desde a Antiguidade, os egípcios vivem em uma estreita e longa faixa de terra. No passado, cada
região tinha seus próprios deuses, incorporados por outras regiões a partir do início da unificação
do país. Por isso, os egípcios tinham uma grande quantidade de deuses; o que tornava sua religião
politeísta. “Ao longo da história do antigo Egito, os reis que ocuparam o trono tentaram colocar seu
deus favorito no cume do panteão da capital. Uma característica singular em relação aos povos
vizinhos era a forma de animais assumida por esses deuses” (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 54).

Além disso, também é interessante salientar que os egípcios acreditavam muito no poder divino
atribuído aos faraós, pois conta a tradição, que era em razão da divindade deles, que as colheitas
cresciam, o gado sobrevivia, a ordem das estações se mantinha e o Nilo trasbordava no momento
adequado, para irrigar as terras, facilitar a agricultura e dar fertilidade e vida a tudo que estava ao
seu redor. Pensavam que seus reis eram espécies de entidades invencíveis porque tinham poderes
divinos.

Também é interessante notar que os próprios faraós se convertiam em deuses quando morriam.
Neste sentido, Pilagallo Filho (2008, p. 54) salienta que naquela época, os túmulos eram

tão importantes e também serviam como templo para o culto ao rei divinizado que, do
além, continuava cuidando do Egito e de seus habitantes. O poder do faraó, graças à
religião, era muito grande, e era difícil que se duvidasse dele. Apesar da estabilidade
que caracterizou a sociedade egípcia durante mais de três milênios, também houve
revoltas, faraós destronados e épocas com muitos reis, que combatiam entre si.

As práticas religiosas e mágicas também serviam aos faraós, pois legitimavam ações ou desejos
desses homens divinos. Ou seja, eram usadas como formas de controle social e até mesmo de
propaganda pessoal. Desta forma, cada faraó e seus asseclas superiores buscavam modelar a
importância das divindades, ou seja, fazê-los subir ou cair, numa espécie de ranking, principalmente
entre os períodos da 4ª e 6ª dinastias, ou seja, aproximadamente por volta do século XIV a. C.
Vejamos informações sobre tais práticas:

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No período da construção das pirâmides como tumba, o deus Ra era poderosíssimo.
Antes disso o deus Hórus era dominante, mas na maior parte da história do Egito foi
o deus Amon (ou Amon-Ra), que assumiu esse papel e, em curto espaço de tempo,
durante o reinado do faraó Akhenaton, o deus Aton passou a ter a mesma prerrogativa
de deus dinástico. Durante o longo reinado divino de Amon, diversos monarcas
tentaram elevar outros deuses de caráter solar ao mesmo nível de importância, o
que faz pensar em um projeto político-religioso. Podemos exemplificar a relação de
proximidade entre divindade e poder.

O faraó Akhenaton (1353-1335 a. C.), por sua vez, promoveu mudanças fortes envolvendo
política e religião, negando todos os deuses e estabelecendo Aton como único deus
celestial (FUNARI, 2009, p. 22).

Figura 19 – Por volta do ano 2000 a. C., o deus Amon-Rá era a principal divindade do Egito

Fonte: Vladimir Zadvinskii/Shutterstock

Os sacerdotes e sacerdotisas eram os elementos de ligação entre a população e os deuses


e deusas. Estas pessoas estavam inseridas na estrutura de poder, tendo hierarquias definidas
a serviço do faraó, e assumiam funções ritualísticas e administrativas. Durante a regência do
faraó Aquenáton, por volta do século XIV a. C., foi estabelecido um culto único ao deus Aton, que
representava o disco solar. Após a morte deste governante, a prática monoteística foi deixada de
lado e a fé politeísta voltou a ser praticada.

Vejamos a seguir uma relação das principais divindades egípcias ao longo da história.

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Quadro 3 – Deuses Egípcios

Deuses Egípcios Principais características


Amon Seu nome significa “o oculto” e representa os poderes invisíveis do universo.
Anúbis Era o deus da mumificação e dos mumificadores, o guardião das tumbas e das
portas do além. Tinha a cabeça semelhante a de um chacal.
Rá Era a personificação do Sol, o rei do firmamento. Foi um dos deuses mais
importantes ao longo de todas as dinastias.
Hórus Representado por um falcão, era o deus do céu e o protetor da realeza. Os
monarcas eram vistos como a encarnação desse deus.
Ísis Mãe de Hórus e esposa de Osíris. Protegia contra os perigos e curava as
enfermidades.
Osíris Representava os ciclos da morte e a volta à vida. Era o deus dos mortos
que haviam sido bem mumificados e enterrados, já que isso lhes levaria à
ressureição.
Ptah Era o deus dos artesãos, considerado um deus criador de coisas.
Seth Representava as secas, as grandes tormentas, as inclemências do mar, mas
seu papel era necessário, já que permitia que os demais deuses impusessem a
ordem.
Thot Considerado o deus da sabedoria. Foi ele quem inventou a escrita egípcia e era
representado com a cabeça de ave.
Aton O deus do sol Aton ganhou grande notoriedade no reinado de Amenhotep
III, quando ele ainda era retratado como um homem com cabeça de falcão.
Durante o reinado de seu sucessor Amenhotep IV, Aton tornou-se a principal
divindade do Estado Egípcio.
Hathor Deusa guardiã das mulheres e protetora dos amantes. Hathor é esposa de
Hórus, representada com a cabeça ou as orelhas de uma vaca.
Bastet Ligada à fertilidade, Bastet é a deusa da fertilidade, sexualidade e do parto.
Com cabeça de gato e corpo de humano, ela é considerada a protetora das
mulheres.
Sekhmeth Deusa com cabeça de leoa, Sekhmeth é filha de Rá e, por isso, reflete o
aspecto destrutivo do Sol.
Fonte: elaborado pelo autor, adaptado de TodaMatéria (2017).

No Egito antigo, existiam três modos básicos de culto: oficial, popular e funerário. O culto oficial
era realizado pelos próprios faraós nos grandes templos existentes país afora. Este culto também
podia ser “realizado diretamente por um grupo de sacerdotes que possuíam funções específicas
no decorrer da cerimônia, como preparar as oferendas e o cuidado com os materiais ritualísticos”
(FUNARI, 2009, p. 17). Por outro lado, é interessante saber que

o culto popular é mais difícil de ser identificado, já que esse segmento não deixou
artefatos que perdurassem como os da realeza e da nobreza egípcia. De todo modo,

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podemos inferir que o culto era realizado no lar e em capelas nas cidades e pequenas
localidades.

O culto oficial e o popular se encontravam nos grandes festivais e procissões que


aconteciam ao longo do ano egípcio. Nos festivais de caráter oficial, a barca que
continha os deuses e possivelmente o faraó saía em procissão pelo Nilo. Nessas
festividades, a população tinha acesso à parte do cerimonial e aos mitos através de
algum tipo de encenação, pois a maioria não sabia ler e escrever (FUNARI, 2009, p. 18).

Por fim, existiam as práticas funerárias que preparavam a pessoa para a outra vida. Quanto
mais rico fosse o egípcio morto, mais complexo e requintado seria o seu funeral. De um modo geral,
este ato envolvia o processo de mumificação, a tumba, o enxoval funerário e ritos de passagem
para a vida futura, como criam os egípcios, que tinham muito interesse em lutar contra os efeitos
da morte do corpo humano, tanto é que alcançaram grande habilidade nos procedimentos para
conservar cadáveres.

Pilagallo Filho (2008, p. 56) também informa que

junto aos mortos eram enterrados alguns textos que explicavam tudo que deviam
fazer para chegar ao além. No princípio, no Império Egípcio (há mais de 4500 anos),
apenas os faraós, que se convertiam em deuses depois da morte, tinham esses textos
em seus túmulos. Mais adiante esse privilégio foi também concedido aos membros
de sua família. Esses primeiros textos encontram-se escritos nos muros interiores
de suas pirâmides e formam os chamados Textos das pirâmides.

Durante o Império Médio, há 4000 anos, também os altos funcionários reais podiam
ter seus próprios textos funerários escritos em seus caixões, os chamados Textos
dos caixões.

A partir do Império Novo, há 1600 anos, encontram-se nos túmulos rolos de papiro
escritos, conhecidos como Livros dos mortos. Eram muito acessíveis, e por isso
muitas pessoas poderiam dispor desses guias para viajar ao além, segundo crenças
egípcias.

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Figura 20 – Diversos deuses egípcios

Fonte: AlbertBuchatskyy/Shutterstock

No panteão dos deuses egípcios (figura 20) estão entidades cuja representatividade remonta a
uma época em que a mistura de crendices, superstições e forças divinas era utilizada para explicar
fenômenos que ocorriam.

Saiba Mais

Os egípcios acreditavam que, graças ao faraó, as colheitas cresciam, o gado sobrevivia, a ordem
das estações se mantinha e o rio Nilo transbordava no momento adequado, para irrigar as terras
agrícolas, tornando-as férteis. Pensavam que seus reis eram invencíveis porque possuíam poderes
divinos. O faraó, porém, se convertia verdadeiramente em deus quando morria. Por isso seu túmulo
era tão importante e também servia como templo para o culto ao rei divinizado que, do além,
continuava cuidando do Egito e de seus habitantes. Para conhecer mais detalhes sobre essas
informações, recomendamos a leitura da obra Os grandes faraós do antigo Egito, escrita por Luís
Manuel de Araújo, publicada pela editora Esfera dos Livros, de Lisboa, Portugal, em 2011.

RELIGIÃO NA CULTURA INDÍGENA


Quando os europeus chegaram à América, encontraram uma grande e rica variedade de
populações. Muitas desapareceram ou se misturaram entre si ou com os colonizadores, desde o
extremo sul, na região da atual Patagônia até o extremo oposto, onde hoje situa-se o Canadá, na
divisa com o Alasca. Conforme Pilagallo Filho (2008, p. 90), “o continente americano era habitado por
numerosos grupos humanos, chegados da Ásia havia dezenas de milhares de anos, com culturas
muito diferentes”.

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Entre as civilizações da Mesoamérica, parece existir uma série de características comuns, apesar
de terem se desenvolvido em épocas e territórios diversos. Trata-se de culturas como olmeca, maia,
asteca, mapuche e inca, entre outras. “Essas coincidências revelam-se em vários aspectos do modo
de vida, no qual a dependência do milho é fundamental ou a utilização de calendários duplos, de
365 e 260 dias” (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 90).

Por outro lado, o conhecimento que se possui da religião dos astecas e dos maias, povos dos
quais se possuem mais detalhes históricos preservados, é dificultada pelas transformações sociais
e patrimoniais realizadas pelos espanhóis. Imagens muito presentes nas peças e monumentos
preservados até os dias atuais são a serpente e sol. “A serpente representa o céu, a terra, a fertilidade
e encarna o princípio de unidade de mundo” (FUNARI, 2009, p. 164).

Um dos principais elementos da religião maia antiga era o sacrifício, realizado com animais e seres
humanos. A principal forma de sacrificar os animais era por meio da decapitação, e acreditava-se
que o sangue derramado purificaria as pessoas que nele tocassem, e isto era uma forma de agradar
os deuses para que eles fossem misericordiosos em relação ao povo. Já o sacrifício humano era
uma prática mais recorrente.

A ideia do sacrifício humano provém, basicamente, da crença de que o sangue


era primordial para o funcionamento do universo, já que um dos elementos para
a criação do universo é justamente esse líquido vital. Era dever do homem, por
conseguinte, manter essa ordem cósmica. Homens e meninos eram sacrificados,
mas não se encontrou ainda evidência de que as mulheres também fossem. Essas
crianças podiam ser mortas por decapitação ou pela extração do coração. Muitas
escavações evidenciaram os esqueletos decapitados e seus respectivos crânios.
Por exemplo, na pintura mural de Chichen Itzá encontra-se a representação de um
sacrificador que submete a sua vítima agarrando-a pelas mãos e a degola com um
machado de obsidiana.

Da mesma maneira, o auto sacrifício também foi uma prática religiosa muito importante
entre os maias. Há evidências de que essa prática ritual tinha os mesmos fundamentos
do sacrifício humano, mas a diferença está em que somente era realizada pelos reis
em rituais muito mais específicos. O sangue, valioso líquido, podia ser obtido de
várias partes do corpo e gerava graus variáveis de dor (FUNARI, 2009, p. 172).

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As cidades maias eram centros cerimoniais Figura 21 – Sacrifícios humanos mostrados
no Códex Magliabechiano, um dos livros
monumentais, com pirâmides escalonadas e outros escritos pelos astecas pré-colombianos
grandes edifícios para fins religiosos, assim como
observatórios astronômicos e grandes esplanadas
para a realização dos rituais. Com a chegada dos
espanhóis, esses locais foram abandonados, mas
é possível conhecer mais informações sobre a
religião maia por meio da arqueologia. Alguns dos
livros sagrados dos maias também chegaram até a
atualidade como o Popol Vuh, no qual há a narrativa
ancestral dos maias sobre a origem do mundo.

A civilização dos astecas também é bem Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Sacrifícios_


conhecida e no centro de suas cidades construíam- humanos_na_América_pré-colombiana>.

se templos em forma de pirâmides e em seus cumes ficavam os altares nos quais os sacerdotes
realizavam os cultos aos deuses e os sacrifícios, por vezes também de seres humanos. Este povo
foi guiado pelo deus Huitzilopochtli até um vale sagrado de onde conquistariam grande parte da
Mesoamérica. Porém, este deus foi assassinado. Espanhóis colonizadores e tribos inimigas dos
astecas destruíram objetos religiosos desta civilização.

Já o império inca possuía na cidade de Cuzco, localizada no Peru, o seu centro político e
religioso. O rei, conhecido pelo nome de Sapa Inca, era considerado um deus e chamado de Filho
do Sol. Acreditava-se que tudo em que ele tocava transformava-se em sagrado. O rei também era
considerado o centro do mundo e os incas acreditavam que o universo funcionava corretamente
graças a ele. “As principais incumbências do rei eram presidir a celebração dos rituais necessários
para que as colheitas fossem boas, as festas em honra dos deuses e também era responsável pelo
anúncio dos equinócios e dos solstícios” (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 92).

Em termos de prestação de cultos às suas divindades, é interessante observar como maias,


astecas e incas tentavam estabelecer contato e prestar homenagens e adoração a essas forças
superiores. Todos esses povos tinham por hábito o apego a diversos deuses e deusas, sempre em
práticas religiosas politeístas, ora com viés que remetia à natureza, ora aos ciclos anuais, ora aos
momentos de fartura e até mesmo aos tempos de maus agouros. Vejamos algumas informações
sobre tais constatações:

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Os maias cultuavam um grande número de deuses. Seus nomes variaram com o
tempo, e não eram os mesmos em todas as localidades. Entre eles estavam Hunab
Ku, “deus uno”, deus criador que não possui representação e, seu filho, Itzama, deus
do céu, protetor dos reis e primeiro sacerdote, que podia se manifestar como o Sol,
quando era chamado Kinich Ahau, “senhor olho solar”. Ixchel era a deusa da fertilidade,
protetora das mulheres durante o parto; se manifestava como a Lua. Chaac era o
deus da chuva e da fertilidade. Outros deuses maias, dedicados aos seres vivos,
eram Yum Kaax, “senhor da selva” e protetor dos animais, o deus do milho. Bolon
Dzacab, a serpente alada, era o poder protetor do dragão cósmico sobre os homens
e também deus das sementes. Ah Puuch era o deus da morte e das enfermidades,
habitante do subterrâneo.

Os deuses astecas tiveram diversas origens. O calendário, as festividades, os grupos


profissionais e cada um dos povos tinham seus deuses tutores. Quetzacóatl, a “serpente
emplumada”, foi um deus adorado também pelos toltecas e maias, e inicialmente
representava as forças da terra e da vegetação; seu inimigo e deus complementar,
Tezcatlipoca, era o sol no curso noturno. O criador dos seres humanos era Ometeoti,
uma divindade dual. Huitzlopochtli, deus solar, que protegia dos guerreiros, era
cultuado no maior templo de Tenochtitlán, juntamente com Tláloc, divindade da
chuva, a quem se atribuíam as boas colheitas.

Entre os Incas, Inti era o deus do sol, de quem os reis eram considerados descendentes
diretos. Quilla, a lua, mãe do firmamento, era a esposa de Inti. Illapa era o deus do
trovão e da chuva, e Saramama, a deusa do milho (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 94).

Maias, incas e astecas também foram povos que dominaram com grande eficiência a ciência
astronômica, e muitas de suas festas e celebrações coincidiam com os equinócios e os solstícios.
O Inti Raymi, ou festa do sol inca, coincidia com o solstício de inverno. Para eles, a celebração
buscava obter o favor do sol para fecundar a terra e proporcionar o bem-estar dos habitantes. Nessa
cerimônia tomavam parte os principais dirigentes dos exércitos e os sacerdotes destes impérios.
Por fim, antes de encerrarmos este capítulo, Figura 22 – Machu Picchu, a cidade
perdida e sagrada dos incas
julgamos ser interessante falar sobre as práticas
religiosas indígenas que ocorriam no Brasil antes da
chegada dos portugueses. Naquela época, ou seja, antes
de 1500, existiam cerca de 5 milhões de indígenas em
nosso país e cerca de 200 nações diferentes entre eles.
Jocosamente, os portugueses afirmavam que a língua
dos indígenas carecia das letras f, l e r, porque eles, os
índios, não tinham fé, lei ou rei. Também é interessante
Fonte: Anton_Ivanov/Shutterstock
observar que no Brasil, uma das tribos mais conhecidas
era a Tupi-Guarani, que habitava territórios entre as
atuais regiões central e Nordeste do Brasil atual.

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Uma das crenças mais importantes do povo tupi no período imediatamente anterior
à chegada dos portugueses foi a de que, na direção do nascer do sol, haveria uma
terra mágica, de plena felicidade e fartura, um verdadeiro paraíso: era a chamada terra
sem males, uma terra em que ninguém haveria de morrer e a qual todos deveriam
se dirigir.

Em vez da terra tão sonhada, no entanto, os grupos indígenas encontraram os


portugueses e, com eles, as doenças, o cativeiro e outros males. Além disso, ao
serem capturados, foram submetidos ao processo de catequização católica, com o
que se pretendia que abandonassem suas antigas crenças e adotassem a religião
dos colonizadores.

Entre outros efeitos que este processo provocou, houve as reações de indígenas
catequizados, que se rebelaram contra a ordem sócio religiosa que lhes era imposta
e, subvertendo radicalmente a catequese recebida, trataram de refazer o caminho
rumo à “terra sem males” (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 97).

Para os índios que antigamente habitavam o território brasileiro, “cerimônias, festas, rezas, cantos
e proibições, tinham como chão um corpo mítico, inerente ao cotidiano, sem nítida distinção entre
o sagrado e o profano, familiar para todos, embora os pajés detenham um conhecimento profundo”
(FUNARI, 2009, p. 203). Para muitos povos, a morte não existia. As pessoas faleciam fisicamente,
porém, retornavam espiritualmente em corpos de animais.

Figura 23 – Ritual de fumo de um tupinambá

Fonte: Rogerio Cavalheiro/Shutterstock

Atividade Reflexiva

Para melhor compreender a importância que os índios davam às forças espirituais no continente
americano, recomendamos a leitura da obra Enterrem meu coração na curva do rio, do autor Dee
Brown, publicada no Brasil pela editora Círculo do Livro, em 1987. Após a leitura, recomendamos um
exercício mental para imaginar o quanto a relação entre espiritualidade, natureza e livre-arbítrio era
importante para os indígenas que aqui moravam antes da chegada dos colonizadores europeus.

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RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS
Tais preceitos de profissão de fé são originários da mescla de hábitos, costumes e tradições
culturais que chegaram ao Brasil através dos escravos oriundos do continente africano e que, em
nosso país, tiveram a inclusão de aspectos culturais tupiniquins. Entre os séculos XVI e XIX acontece
a consolidação de tais manifestações religiosas graças não apenas à participação de negros, mas
também de brancos, principalmente no candomblé e na umbanda.

É interessante salientar que durante o período da exploração e do tráfico negreiro para as


Américas, o Brasil recebeu quase 4 milhões de homens, mulheres e até mesmo crianças, oriundos
de nações como Nigéria, Angola, Moçambique, Gana, Congo e Camarões. A partir dessa junção de
tradições, costumes e pluralidade de nações, podemos tipificar duas ramificações afro-brasileiras
mais influentes em termos de profusão da fé, conforme atesta Anatol Rosenfeld (1993, p. 56):

As religiões dos negros bantos, vindos do sul e leste da África (Angola, Congo e
Moçambique), que originaram diferentes cerimônias celebradas especialmente no
Rio de Janeiro, como o candomblé bantu e a umbanda. São também elementos
folclóricos bantos, por exemplo, as festas do bumba-meu-boi, lutas de capoeira,
jogos de dança e o samba.

As religiões dos negros iorubás, chamados nagôs, e os daomeanos, chamados jejes,


originados do oeste africano, em especial da Nigéria, cuja influência é predominante
no nordeste brasileiro, com os candomblés baianos, como o candomblé ketu e o
candomblé jeje.

É interessante notar, ainda, que a migração geográfica vivenciada no Brasil ao longo dos séculos
XIX e XX, ou seja, após a libertação definitiva dos escravos em 1888, fez com que os hábitos de
fé oriundos da África se espalhassem pelas mais diversas regiões do Brasil, deixando de serem
restritas a cidades e regiões que, até então, recebiam a maior parte da população escrava, como a
Bahia e o Rio de Janeiro, que ainda figuram entre os estados com maior incidência de tais religiões,
de acordo com o Novo Mapa das Religiões, produzido pela Fundação Getúlio Vargas-FGV em 2017
e disponível neste link: http://www.cps.fgv.br/cps/bd/rel3/REN_texto_FGV_CPS_Neri.pdf

O estudo revelou ainda uma presença relativamente alta de praticantes de religiões afro-brasileiras
no Rio Grande do Sul, estado contraditoriamente marcado por uma forte influência europeia em
termos de colonização, com a presença de imigrantes italianos, alemães, portugueses e suecos.
Tanto que, ainda de acordo com o Novo Mapa das Religiões, o Rio Grande do Sul apresentou a
segunda maior taxa fiéis em cultos afro, com 0,94% de sua população dizendo-se praticante, número
que o coloca atrás somente do Rio de Janeiro.

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Mas em termos de crenças, no que acreditam, por exemplo, Figura 24 – Religião afrodescendente
os fiéis de tais religiões? Se pensarmos especificamente no
candomblé, as pessoas creem que a alma sobrevive após a morte
física do nosso corpo, acreditam, ainda, em espíritos divinizados,
os chamados orixás, e também em espíritos não divinizados.
Boa parte dos fiéis crê que essas divindades se apresentam
apenas em momentos de celebração festiva, justamente para
receberem homenagens por conta de suas características de
guias espirituais. Fonte: Alf Ribeiro/Shutterstock

Por outro lado, a ramificação conhecida como candomblé-caboclo possui como característica
notória o oferecimento de oferendas às entidades espirituais cultuadas. Entre elas estão frutas,
legumes, fumo de rolo, doces e uma bebida conhecida como Jurema, produzida a partir de folhagens e
pequenos frutos de uma árvore conhecida pelo mesmo nome. Tal bebida, num passado mais distante,
já fazia parte dos rituais indígenas e era muito usada por pajés no oferecimento de tratamentos
contra diversos males carnais ou espirituais.

Em termos de iniciação, os cultos africanos possuem rituais que incluem o aprendizado de


rezas, uso de folhas, pinturas, a proficiência em línguas espirituais, consideradas sagradas, e até
mesmo danças para entrar em contato com as entidades espirituais. Os praticantes também são
incentivados a ter total desprendimento material nessas ocasiões, para que estejam perfeitamente
em obediência aos preceitos divinos. Além disso, podemos tipificar um paralelo entre orixás africanos
e santos cultuados pelo catolicismo romano, conforme o quadro a seguir.

Quadro 4 – Orixás africanos e santos cultuados pelo catolicismo

Exú Santo Antônio


Oxalá Jesus Cristo
Ogum São Jorge
Oxóssi São Sebastião
Xangô São Pedro ou São Jerônimo
Omolú São Lázaro ou São Roque
Logum Edé Santo Expedito
Oxum Nossa Senhora Aparecida
Iemanjá Nossa Senhora da Conceição ou Nossa Senhora dos Navegantes
Iansã Santa Bárbara
Nanã Burequê Nossa Senhora Sant´ana

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Ibeji São Cosme e Damião
Obaluaê São Lázaro ou São Roque
Ossaim São Benedito
Euá Santa Luzia
Fonte: elaborado pelo autor adaptado de Astrocentro (2017).

Além do candomblé, as religiões afro-brasileiras possuem, ainda, uma série de outras ramificações,
entre as quais o babaçuê. Trata-se de uma mescla de elementos africanos com indígenas, sendo
mais frequente na região Norte do Brasil. Sua musicalidade é uma das principais marcas, pois
danças, toques de tambores e cânticos são elementos muito usuais para homenagear e invocar
divindades espirituais. Costuma-se cultuar, especialmente, Iansã e Xangô, além de espíritos tidos
como encantados, por se acreditar que sejam ligados aos indígenas que habitavam aquelas terras
centenas de anos atrás.

O batuque é outra religião afro-brasileira que presta culto a orixás. Fruto dos povos oriundos da
Nigéria e do Benim, pode ser encontrada com maior frequência, no Brasil, no estado do Rio Grande
do Sul, e até mesmo nas fronteiras com o Uruguai e a Argentina. Seus cultos são realizados em
templos chamados de casas de batuque, que nada mais são do que terreiros. A primeira entidade
a ser invocada é o orixá Bará, tido como representante da comunicação. Outra tradição é o jogo de
búzios e as oferendas, como pipocas, costelas de boi, velas, maçãs e laranjas.

Figura 25 – No batuque, encontra-se uma das primeiras religiões afro-brasileiras


a se consolidar na região Sul do Brasil, entre os anos de 1830 e 1880

Fonte: <http://portacurtas.org.br/filme/?name=batuque_gaucho>.

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Por fim, neste breve passeio pela história de algumas das principais religiões afro-brasileiras,
destacamos a umbanda, que possui ligações com o candomblé, catolicismo e o espiritismo, e
consolidou-se no Brasil ao longo do século XX. Oriunda de Angola, seu nome remete a expressões
como “a arte de curar”, “o Além, onde moram os espíritos” ou “magia”. Sua primeira ocorrência
registrada no Brasil foi datada em 1907, quando um jovem começou a pronunciar expressões
incompreensíveis por pessoas com as quais convivia. Ele havia incorporado o espírito do Caboclo
Sete Encruzilhadas.

Entre os traços típicos que caracterizam os praticantes de umbanda, podemos destacar a crença
num deus único chamado Olorum, crença em orixás, entidades espirituais e no convívio espiritual
com os antepassados, bem como na imortalidade da alma, na reencarnação, no carma e na lei de
causa e efeito, através do qual, creem os umbandistas, que o bem é retribuído com outras práticas
benéficas e o mal é combatido com a justiça divina. Seu desenvolvimento espiritual também está
baseado em três outros elementos-chave: fraternidade, caridade e respeito ao próximo. Entre os
seus principais momentos de culto, estão as chamadas giras, sessões que costumam receber
a manifestação de espíritos de várias categorias, e as sessões de descarrego, onde os médiuns
praticam a limpeza espiritual dos fiéis.

O ISLAMISMO E SUAS IDEIAS


Sobre o tema princípio, podemos entender o conjunto de normas, paradigmas e embasamentos
teóricos que fundamenta uma doutrina, uma instituição e, até mesmo, uma geração. O islamismo
é constituído de uma fundamentação teórica vastíssima e que requer a nossa análise mais atenta.
A homepage da importante BBC Brasil apresenta seus postulados que passamos a registrar.

Para os muçulmanos, só existe um Deus, cujo nome é Alá. E o último profeta de Alá
foi Maomé. Maomé não é deus, mas um homem por intermédio de quem Alá revelou
sua vontade ao mundo. Maomé é reverenciado pelos islâmicos, mas não adorado.
Tudo e todos dependem de Alá. Todos os islâmicos de qualquer parte do mundo e
de qualquer etnia pertencem à mesma comunidade chamada de “umá”.

Os islâmicos são orientados a seguir a vontade de Deus pelo Corão, o livro sagrado
considerado pelos muçulmanos como a palavra de Deus. Os islâmicos acreditam em
anjos e em profetas, como por exemplo: Abraão ou Ibraim, Moisés ou Musa, Davi ou
Dawu, Jesus ou Isa. Mas de todos estes, Maomé seria o último profeta (BBC, 2003)

Em termos de juízo, o islamismo, nascido no século VI, no árido ambiente do deserto da Arábia,
prega que haverá o retorno de Imam Mahdi, espírito conhecido o “Divinamente guiado”, antes do
retorno de Isa, o equivalente a Jesus, para o catolicismo romano e religiões protestantes. Para os

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muçulmanos, além do julgamento final, também existe predestinação, pois creem que “Alá já decidiu
o que vai acontecer, mas isso não impede que os seres humanos continuem tomando decisões”
(BBC, 2003), e exercendo o chamado livre-arbítrio.

Segundo a crença, Deus é onisciente, onipotente, onipresente e não tem forma. Não pode ser
visto, ouvido e não tem sexo. Por outro lado, o ser humano pode se aproximar de Deus por meio de
orações e recitação do Corão. Para os islâmicos, Deus não tem filho ou parentes, e não há outro
deus superior a Alá (BBC, 2003). Neste aspecto, também podemos considerar que o islamismo está
assentado em cinco pilares centrais, os quais propõem uma vida boa e responsável por parte dos
praticantes. Vejamos:

1-) Afirmar a chahada ou crença em Deus.

2-) Orar cinco vezes por dia. Nas sextas-feiras, os muçulmanos se reúnem na mesquita,
local de culto comunitário.

3-) Durante o mês muçulmano do Ramadã, jejuar durante as horas diurnas.

4-) No fim do Ramadã, dar aos pobres o zacate, a quadragésima parte de sua riqueza.

5-) Tentar fazer o Hadji (peregrinação) a Meca pelo menos uma vez na vida (HAWKINS,
2018, p. 84).

Dando prosseguimento a esses preceitos, a oração deve ser realizada cinco vezes por dia, pois
é a base da fé islâmica, e pode ser feita na mesquita ou em qualquer outro lugar, porém, sempre
que possível, deve ser feita no templo sagrado, para o que o fiel possa ter um momento maior de
conexão espiritual com as entidades divinas para as quais presta culto. Antes das orações da
tarde nas sextas-feiras, o imã da mesquita fala sobre um assunto relevante baseado no Corão ou
na história sobre a vida de Maomé. Esta pessoa não é um sacerdote, mas um islâmico devoto que
conhece bem o Corão e goza de grande respeito na comunidade muçulmana.

A mesquita, em árabe, masjid, além de ser destinada à oração, possui um significado linguístico
muito especial aos muçulmanos: remete a lugar de prostração, ou seja, um lugar de humildade
espiritual em relação aos seres supremos, em especial, ao profeta Maomé. No mundo islâmico,
continuam sendo construídas mesquitas até os dias atuais. No Brasil, a maioria dos templos
religiosos desta concepção de fé é encontrada em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande
do Sul e Mato Grosso do Sul.

Conforme Pilagallo Filho (2008, p. 281), “a primeira mesquita construída no país foi a Mesquita
Brasil, em São Paulo, a partir da iniciativa de sírios e libaneses residentes na cidade. Ela começou a

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ser erguida na década de 1940 e foi inaugurada em 1955, no centro da capital paulista”. Atualmente,
existem cerca de cem mesquitas em solo brasileiro. Um elemento característico em muitas mesquitas
é o chamado maqsura, um espaço delimitado por arcos de concreto decorado com esmero.

Além disso, é interessante notar que


a expansão islâmica contribuiu para Figura 26 – Peregrinos durante
que fossem incorporados às mesquitas as orações do Ramadã
elementos arquitetônicos dos países
que eram conquistados. As mais antigas
recordam as basílicas cristãs. Trata-se
de um modelo que, para os muçulmanos,
resultou muito interessante, porque permitia
dispor de grandes salas de oração nas
quais o espaço não estava hierarquizado
e, portanto, não refletia distinções sociais
(PILAGALLO FILHO, 2008, p. 281).

Do lado de fora de cada mesquita ou até


mesmo na entrada do prédio existe um lugar
onde devem ser depositados os calçados Fonte: Zull Must/Shutterstock
dos fiéis. Também há mesquitas que oferecem possibilidade de banho antes das
orações. Todos se sentam no chão porque diante de Alá, todos têm o mesmo status.
Mulheres podem assistir às orações nas mesquitas, mas têm de sentar separadas
dos homens para não lhes causar nenhuma distração (TERRA, 2003).

Deste modo, é mais comum que as mulheres rezem em casa, o que de certo modo, mantém também
uma estrutura social um tanto quanto machista, se levarmos em consideração o empoderamento
que as mulheres já conquistaram no mundo ocidental.

O Corão, que é considerado a palavra de Deus e contêm os fundamentos da fé islâmica, teria


sido ditado a Maomé pelo Arcanjo Gabriel.

“Recolhe a pregação de Maomé e consta de 114 capítulos que variam em extensão e


que, por sua vez, se dividem em versículos. Por ser uma compilação de discursos, o
Corão não apresenta uma ordem sistemática e os temas podem se repetir ou mudar
de repente” (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 267).

Conforme os estudiosos, ele não foi redigido ordenadamente como um livro, mas como inspirações
divinas sobre preceitos humanos, repassadas para Maomé.

Segundo a tradição, aos 40 anos Maomé teve sua primeira experiência profética, nos arredores
de Meca, uma cidade símbolo para o islamismo, e que no passado era um importante ponto de
confluência de rotas comerciais do Oriente. No passado, esta cidade já era um importante centro

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religioso, e nela encontravam-se guardados, segundo a tradição, estátuas de culto de mais de 300
deuses e deusas de diferentes tribos árabes. “Os fiéis peregrinavam até lá para solicitar favores
aos deuses”, destaca Pilagallo Filho (2008, p. 265).

O deus principal do santuário de Meca era Alá, nome que significa “deus”. Essa
importante divindade garantia o cumprimento dos juramentos, proporcionava a
chuva e era a criadora do mundo.

Em pouco tempo, Maomé conseguiu reformar o politeísmo ancestral e unificar as


tribos árabes em torno de uma religião que conhecia Alá como único deus. Além
disso, sistematizou o islã, que em árabe quer dizer “submissão”, ou seja, uma alusão
ao dever de todo seguir dessa religião em submeter-se a Alá.

Voltando a falar especificamente sobre o Corão, é importante salientar que ele, ao longo dos
últimos 1.400 anos, serviu e ainda serve como uma espécie de guia aos muçulmanos que creem
na palavra de Alá revelada para Maomé, através do Arcanjo Gabriel. Trata-se, portanto, de uma obra
que os fiéis consideram fonte que rege a vida. Além do Corão, existem outros discursos que são
atribuídos ao profeta Maomé, porém que não estão contidos nesta obra. São os chamados Hadices,
espécies de pregações opinativas, semelhantes a textos doutrinários cuja criação é atribuída ao
próprio profeta.

Curiosidade

O profeta Maomé nasceu ao redor da cidade de Meca, por volta do ano 570 d. C., no seio de uma
família aristocrática. Porém, logo ficou órfão. Foi educado por seu tio Abu Talib e viajou pelas rotas de
caravanas do deserto como mercador.

Aos 24 anos, começou a trabalhar para uma viúva rica chamada Jadiya, com a qual se casou e teve
quatro filhas e dois filhos. Fátima, a primogênita, foi a mais conhecida. Casou-se com o tio Ali, filho
de Abu Talib.

Depois da morte de Jadiya, Maomé teve muitas outras esposas. A mais famosa foi Aisha, filha de Abu
Bakr, um dos mais influentes aristocratas de Meca. Maomé era um devoto praticamente da religião,
fazia retiros para orar e meditar, e aos 40 anos começou a ter visões e revelações.

Seus primeiros seguidores foram Jadiya e Ali, e pouco a pouco foi ganhando adeptos, posto que
pregava que Alá não queria as injustiças nem a opressão dos ricos sobre os pobres, e que era
misericordioso, recompensando os justos, mas também implacável, castigando os injustos.

O Corão começa com a seguinte surata, chamada al-fatiha, que em árabe quer dizer “a que abre”,
e que se trata de uma espécie de resumo da religião islâmica: “Em nome de Alá, o compassivo, o
misericordioso! Louvado seja Alá, senhor do universo, o compassivo, o misericordioso, soberano do
dia do juízo. Só a ti adoramos e só a ti imploramos ajuda. Guia-nos pelo caminho reto, a via dos que tu
tens dado teu favor, não dos que incorreram na ira, nem dos extraviados”.

Saiba mais sobre este conteúdo em: <http://www.ligaislamica.org.br/alcorao_sagrado.pdf>.

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O islamismo possui diferenças doutrináriasFigura 27 – Livro Alcorão, também chamado de Corão
entre os seus diversos grupos, porém, o Corão (ou
Alcorão) é tido, por todas essas divisões, como a
fonte sagrada de ensinamentos que Alá, através do
anjo Gabriel, transmitiu para Maomé. Outro ponto
confluente: é costume sussurrar aos ouvidos dos
recém-nascidos ou dos moribundos frases do
Corão para edificar a vida.

Fonte: rugged Studio/Shutterstock


O BUDISMO E SUAS VISÕES DE MUNDO
Uma das maiores religiões do mundo, o budismo surgiu no norte da Índia, cerca de 2.500 anos
atrás, quando um príncipe se transformou em sábio humilde e ensinou ao povo um novo modo de
viver. Ele foi chamado de Buda, que significa, “o Iluminado”. Este nobre chamava-se Sidarta Gautama
(563-483 a. C.). Desde então, desenvolveram-se muitas escolas de budismo, e esta prática religiosa
se espalhou pelo mundo inteiro. Em cada lugar, foi adaptado e fundido com as tradições e crenças
locais, o que o fez passar por uma série de mudanças e desafios.

O início do ministério de Sidarta ocorre quando ele tinha aproximadamente 29 anos. Naquela
oportunidade, em desobediência as ordens do pai, levou sua charrete além das muralhas do palácio.
Lá, viu um velho, um doente e um cadáver, segundo conta a tradição. Ele nunca havia visto tanto
sofrimento. Depois, viu um homem santificado, que levava uma vida itinerante, sem lar ou posses
materiais, mas que era muito feliz. Naquele instante, o príncipe Sidarta resolveu seguir o exemplo
daquele santo.

A partir disso, Hawkins (2018, p. 152) destaca:

Sidarta passou um período com dois mestres religiosos para aprender a meditar.
Depois, morou seis anos na floresta com um grupo de cinco santos. A vida deles era
duríssima, e eles acreditavam que era esse o caminho da sabedoria. Sidarta passou
por uma série de dificuldades.

Finalmente, fraco e exausto, Sidarta deixou seus companheiros e foi até a aldeia de
Bodhi Gaia, no nordeste da Índia. Certa noite, sentou-se embaixo de uma alta árvore
para meditar e prometeu não se mexer até descobrir a verdade. De acordo com a
lenda, durante a noite, Sidarta foi visitado por Mara, “o cruel” que queria tentá-lo a
se afastar da busca. Mas nada que Mara dissesse ou fizesse perturbou a decisão
de Sidarta, que, quando a noite terminou, finalmente encontrou as respostas que
procurava. Ele percebeu a verdadeira causa do sofrimento e o que poderia fazer para
ajudar. Tornou-se Buda, o Iluminado.

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Depois disso, passou vários dias meditando e pensando em suas experiências com
uma profunda sensação de paz e alegrias. Foi nessa época que encontrou seus
primeiros seguidores: dois mercadores de passagem que lhe levaram comida. Ele
decidiu transmitir o que aprendera a seus primeiros mestres da meditação, mas, ao
descobrir que já tinham morrido, foi procurar os cinco santos que lhe tinham feito
companhia na floresta. Os encontrou no parque de veados de Sarnath, no norte da
Índia, e lhes deu seus primeiros ensinamentos, explicando-lhes a causa do sofrimento.

Esses ensinamentos são as chamadas Quatro Nobres Verdades. Buda ensinou que
todos passam por sofrimento na vida e que esse sofrimento é causado pela falta
de contentamento com o que somos. No entanto, há um modo de acabar com o
sofrimento: seguir o Nobre Caminho Óctuplo.

Esses oito passos aos quais Buda se referiu são os seguintes:

1. compreensão correta para vivenciar a vida de modo desapegado, evitando ilusões e


preconceitos;
2. intenção correta do viver, ou seja, libertar-se de características imorais;
3. fala correta, no sentido de abstinência de mentir;
4. ação correta ou dito de outra forma: não roubar, não matar e não fazer nada que possa
prejudicar os outros;
5. vida correta, ou seja, não prejudicar ninguém para crescer socialmente;
6. ser compassivo e paciente;
7. ter consciência dos próprios atos e pensamentos;
8. treinar a mente para ser clara e calma.
Figura 28 – Sidarta, “o Iluminado”

Fonte: Shaun Jeffers/Shutterstock

Sidarta, “o iluminado” (figura 28), morreu aos 80 anos, num bosque perto da cidade de Kushinagar,
ao norte da Índia. Antes de vir a óbito, disse aos seguidores para não se entristecerem, “pois na
vida tudo muda e tudo passa” (HAWKINS, 2018, p. 154).

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Outro ponto interessante a ser notado em relação ao budismo é o preceito doutrinário de que ele
prega, em caráter inescapável, a importância da dor no processo de lapidação dos seres humanos.
Considera que existem diferentes tipos de sofrimento que o ser humano encontra ao longo da
vida. Há situações que produzem inquietude e dor em definitivo, sofrimentos, como por exemplo,
a presença de enfermidades, o medo da velhice e o medo de amar ou até mesmo possuir um mau
caráter que possa produzir rejeição em outras pessoas.

Pilagallo Filho (2008, p. 118), considera que vem daí o fato de o “budismo considerar a dor
universal. Até no prazer maior se esconde a dor, uma vez que em algum momento, ele irá acabar
e a dor novamente voltará. Isso é o que os budistas denominam a primeira nobre verdade”. Além
disso, costuma-se dizer que Buda expôs de modo sistemático o quanto os seres humanos precisam
lapidar a própria vida e o próprio espírito. “A causa da dor é a sede que leva a querer voltar a viver,
a buscar aquilo que nos agrada” (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 118).

Os budistas acreditam que a causa da dor é o desejo de buscar o que se ama. Segundo Buda,
o que desejamos sempre (ou quase sempre) tem um fim egoísta e isso acaba produzindo um
sofrimento maior. Uma solução para dar fim a este sofrimento seria por meio da eliminação da
sede de existir, ou seja, uma transformação dos pontos de vista que regem o viver, por meio de
compreender, atuar e meditar.

Nos séculos que seguiram à morte de Buda, seus seguidores continuaram a espalhar sua filosofia
de vida Índia afora e além dela, principalmente em países asiáticos, onde esta religião consolidou-
se. Um momento muito importante na expansão do budismo se dá a partir do entendimento do
caráter universalista da religião, ao propor uma mensagem aceitável para qualquer ser humano,
independentemente de sua origem ou posição social. Isso levou o budismo ao Japão, Sri Lanka,
China, Indonésia e outros países.

Também é interessante salientar que o budismo, ao chegar

a diferentes povos, fez com que os missionários se adaptassem a costumes e crenças.


É o que denominam “meios hábeis” na propagação da religião. Como a mensagem
central budista é simples e busca principalmente o despertar, puderam, sem deixar
de ser budistas, oferecer, em cada caso, o que mais fácil resultava para que fossem
entendidos e aceitos.

Desse modo, as comunidades budistas foram e ainda hoje são muito diferentes,
comem e vestem de modo distinto, mudam suas festas, as formas de meditar ou os
rituais funerários. Até a ideia que têm de Buda varia: uns o veem como um ser humano
excepcional e exemplar, ao passo que outros creem que ele é um ser sobrenatural
(PILAGALLO FILHO, 2008, p. 121).

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O budismo possui, essencialmente, três subdivisões em termos de escolas doutrinárias e formas
de compreensão. Todas elas, porém, são unânimes no entendimento do papel que o monge Sidarta
possui, enquanto Buda, “o Iluminado”, em termos de necessidade de sacrificar a vida carnal para
santificar-se espiritualmente. A partir disso, vejamos quais são as principais características de
cada uma dessas visões doutrinárias que, popularmente, são conhecidas como budismo do Sul,
do Leste e do Norte.

O Budismo do Sul é aquele que está mais difundido, principalmente, no Sri Lanka e
na Tailândia. Seus seguidores dizem possuir os textos sagrados mais antigos e os
mais próximos ao que Buda pregou. Dão uma grande importância aos monges, que
vestem túnicas cor de açafrão, permanecem solteiros e têm regras de disciplinas muito
estritas, como não fazer mais que uma refeição ao dia, ingerida antes do meio dia.

O Budismo do Leste está presente no Japão e o no leste da China e possui diferentes


escolas. Creem que existem muitos budas e outros seres sobrenaturais. Seu ideal
consiste no fato de que, para esses religiosos, uma pessoa que pode ser ou não
monge, mas que, tendo entrado num estado de transe espiritual ao despertar esta
força interior, decide manter-se no mundo para ajudar os seres vivos, movido por
amor e pela compaixão.

O Budismo do Norte se desenvolveu no Tibete e se expandiu pela Mongólia e parte


da China. Seus seguires creem que certas pessoas com grande desenvolvimento
espiritual podem voltar depois de morrer e escolher sua reencarnação. Eles são
reconhecidos porque se recordam da vida passada e identificam objetos que antes
foram seus (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 123).
Figura 29 – Budistas
Para explicar os diferentes caminhos seguidos pelos seres
humanos, os budistas do Sul, aqueles de túnica açafrão (ver
figura 29), usam o exemplo de dois animais: a via do gato e
a via do macaco. Quando o gato é pequeno, sua mãe o leva
pela nuca com a boca; o gato não tem nada a fazer senão
se deixar levar; pelo contrário, o macaco tem de se agarrar
fortemente a sua mãe para poder ir com ela, ou seja, é ele
que tem de fazer o esforço.
Fonte: Alexander Mazurkevich/Shutterstock

Mas os budistas creem em deuses ou num deus único?

Para o Budismo, Buda é um ser exemplar, que ensinou o caminho para o despertar,
mas não é um deus. Em seus textos sagrados, a questão sobre se os deuses existem
ou não parece interessar pouco, porque não acrescenta nada ao verdadeiro problema
que preocupa os seguidores: como alcançar o despertar. Essa atitude é muito
significativa, já que não creem que haja um deus criador, nem que o universo se
mantenha por sua atuação, nem que o despertar seja seguido por sua intermediação.

À diferença do que ocorre nas religiões ocidentais, como o cristianismo, o judaísmo


ou o islamismo, para os budistas não há nenhuma entidade criadora do mundo
nem necessidade de que ela exista. Dessa forma também se elimina o dogma da

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existência de um Deus todo-poderoso que tenha criado um mundo no qual existe o
mal (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 123).

Por fim, cremos ser interessante destacar que os budistas não podem, conforme sua tradição
religiosa, matar animais. Por isso, muitos são vegetarianos. Tais restrições também estão presentes
em outras doutrinas como no hinduísmo, em que é proibido comer carne de vaca; no islamismo e
no judaísmo, em que não se come carne de porco; e até mesmo em parcelas do cristianismo, como
por exemplo, no catolicismo romano, que na sexta-feira que antecede a Páscoa, a chamada Sexta-
Feira Santa, recomenda-se que os fiéis não comam carne para relembrar o sacrifício de Cristo na
cruz do Calvário.

O HINDUÍSMO E A SABEDORIA INDIANA


O hinduísmo talvez seja a religião mais antiga ainda viva no mundo contemporâneo. É difícil
prospectar com exatidão como ela surgiu. Ao contrário de outros credos, este não possui um
fundador, escrituras, nem ensinamentos com os quais todos os seguidores concordem. Em sua
longa história, diversos líderes ensinaram diferentes filosofias. Suas raízes estão na Índia antiga e
pregavam uma forma de vida baseada no autoconhecimento. O hinduísmo não limita sua ideia de
verdade a uma única fé e incentiva a flexibilidade de pensamentos.

Conforme Hawkins (2018, p. 116), para os hinduístas, “ser uma boa pessoa é muito mais importante
do que aquilo em que se acredita. Apesar disso, a maioria dos hinduístas tem algumas crenças
básicas comuns, como a existência de uma alma eterna que reencarnaria continuamente”. A princípio,
esses ensinamentos foram transmitidos oralmente. De acordo com a tradição, muitos estudiosos
creem que os textos sagrados datem, aproximadamente, do ano 1000 a. C. Mais que uma religião,
o hinduísmo é um conjunto de normas de vida bastante diversas e não raro em contraste umas
com as outras, respeitantes à religião, à filosofia, às ciências naturais, à mitologia e às superstições
populares.

O hinduísmo também professa uma fé viva no Veda como fonte de verdade infalível; uma fé na
karma-sansara que é a reencarnação das almas; uma fé no mukti que é a libertação do homem do
ciclo da reencarnação; é um sistema de castas, como inviolável disposição social imposta pela lei
suprema que regula o universo. A mortificação e a meditação são meios para ascender à condição
divina. Um dos principais livros doutrinários do hinduísmo é o Rig Veda, e conforme seus versos, há
um mundo eterno constituído por brâmanes (espíritos) que habitam a Terra, um dos muitos planetas
que existem nas diversas dimensões concebidas pelo hinduísmo.

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As riquezas espirituais transmitem-se pela vista e pelo ouvido. Isso explica a razão da aproximação
dos personagens religiosos como, por exemplo, Ghandi. O culto é mais uma homenagem do que
um sacrifício e é feito pelo chefe da casa. Em público, o culto é feito pelo sacerdote. A oração tem
caráter sagrado e deve ser pronunciada conforme regras prescritas. Cada templo é consagrado a
uma divindade. À margem do culto, há práticas mágicas confiadas ao brâmane, que faz apelo às
forças invisíveis.

A ética hinduísta consiste em quatro noções. São elas:

1. é preciso aspirar à virtude, mesmo em detrimento de certos bens materiais;


2. a virtude é a prática da não violência;
3. tem de sofrer pelos outros;
4. os vícios conduzem ao destino demoníaco que é a vida transmigrante (a reencarnação).

Finalmente, a vaca representa o último estágio da peregrinação da alma no mundo, antes de


atingir a divindade. Ela é considerada sagrada porque sempre tem acompanhado o povo nas suas
peregrinações, alimentando-o com leite. Ainda conforme sua concepção, a vaca simboliza a plena
doação, afinal de contas, que animal ou qual ser humano que não a própria mãe é capaz de nutrir
os filhos e satisfazer toda uma nação? Nenhum.
Figura 30 – Hindu e a “mãe vaca”
Outro conceito fundamental no hinduísmo é o chamado
(como são popularmente chamadas)
dharma, cujo equivalente em português seria algo como
religião, com preceitos de verdade, dever, ética e direitos.
Digamos que o dharma, no entendimento hindu, é o poder
que sustenta e fundamenta a sociedade e o cosmos. Segui-
lo, portanto, é viver em conformidade com os valores que,
nesta concepção, auxiliam as pessoas a ter uma passagem
terrena bastante satisfatória, baseada em regras relativas
à pureza e ao matrimônio. Para Pilagallo Filho (2008, p.
105), também podemos afirmar que Fonte: Anton Watman/Shutterstock

levando em conta essa explicação, ser hinduísta seria atuar de acordo com o dharma, o
que abarca todos os aspectos, desde a realização de ritos solenes até o comportamento
correto em cada momento com as obrigações que isso traz. Portanto, dharma se
identifica com obrigações entendidas como transcendentes e eternas, mas que se
expressam ou se manifestam os seres humanos em ações concretas.

No hinduísmo, o templo é considerado a casa dos deuses ou deusas cujas imagens estejam
no santuário, o local específico para prestação de cultos. São realizadas cerimônias várias vezes

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ao dia. Nelas, os sacerdotes oferecem às divindades itens agradáveis, como incenso, água, flores
e uma lâmpada. São dois os principais estilos arquitetônicos tradicionais dos templos na Índia: o
do norte e o do sul. As construções do norte têm um santuário central, uma torre principal e arcos
arredondados. No sul, os templos costumam se situar dentro de complexos maiores e são cercados
por muros. Para chegar ao santuário central deles, é preciso atravessar uma área decorada com
imagens de deuses e deusas.

Em termos de adoração, o hinduísmo possui uma variedade considerável de entidades divinas.


E neste sentido, usamos a seguir uma síntese elaborada por Pilagallo Filho (2008, p. 107), que
acreditamos ser bastante didática em termos de compressão.

Os deuses mais importantes são Vishnu, Shiva e Brahma. O primeiro é o que conserva
o mundo e o protege, é guardião do dharma e tem mil nomes. Ele é, por vezes,
representado montando sobre a ave mítica Garuda. Shiva é o deus das ascetas e
dos que buscam a sabedoria transcendental, porque destrói a ignorância, assim
como, em sua dança, destrói o mundo para purificá-lo. Brahma é o deus criador,
representado de vermelho e com quatro cabeças. Outros deuses de importância
são Krishna, favorável aos seres humanos; Rama, grande herói a quem se costuma
representar com grande beleza; e Ganesh, filho de Shiva e Parvati, que tem cabeça
de elefante e representa o deus da inteligência e do êxito.

A palavra devi quer dizer “a deusa” e serve para nomear qualquer deusa. Entre as mais
importantes se encontra Durga, esposa de Shiva, que representa o poder feminino
em seus aspectos tanto destrutivos como benéficos. Costuma ser representada
cavalgando um tigre. Lakshmi é a deusa da beleza e nasce da espuma do mar.
Também é considerada a deusa da fortuna e da abundância.

Saravasti é a esposa de Brahma. É tida como a deusa do conhecimento e dos


estudantes.

Kali é esposa de Shiva, e conhecida como uma deusa aniquiladora da ignorância.


Parvati também é esposa de Shiva, sendo conhecida como a deusa da fecundidade
e da natureza. Ganga é a deusa da água e da pureza.

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Figura 31 – Brahma (tido como o deus da criação no hinduísmo) e Vishnu, sempre
representado com quatro braços, cada um simbolizando um estágio da vida humana: a
busca do conhecimento; vida familiar; introspecção espiritual e renunciação.

Fonte: PSW Gallery/reddees/Shutterstock/

Podemos afirmar, ainda, que de acordo com os preceitos do hinduísmo, há muitos modos de
entender a religião e muitas maneiras de praticá-la, dependendo do caráter de cada um, de seus
deuses preferidos e também da fase da vida em que se esteja. A finalidade principal da vida para
os seguidores desta doutrina religiosa é viver em conformidade com o dharma. Eles creem que
assim podem alcançar a chamada libertação, o que significa um estágio espiritual mais elevado.

Nas casas dos fiéis hindus, há sempre um altar com imagens das divindades protetoras, para
as quais deve-se prestar devoção todos os dias, deixando constantemente um incenso aceso. As
peregrinações populares também são muito corriqueiras e objetivam alcançar lugares sagrados.
Existem fiéis que chegam, inclusive, a viver numa peregrinação eterna, abandonando bens e família.
Muitas pessoas costumam, periodicamente, realizar peregrinações até as montanhas do Himalaia,
onde acreditam estarem reunidos milhares de espíritos que possam lhes prestar ensinamentos.

JUDAÍSMO E ORIGENS DA HUMANIDADE


O judaísmo não é apenas uma religião. Trata-se de uma etnia, de uma raça, de um grupo social.
Consequentemente, sua história reflete a origem do próprio povo, que acredita descender de uma
tribo que vivia na antiga terra de Canaã, na região onde atualmente situam-se Israel, Palestina,
Jordânia e Síria. Os judeus, também chamados de israelitas ou hebreus, se encontram na Torá,
texto sagrado composto pelos cinco primeiros livros bíblicos. De acordo com o Gênesis, o primeiro
livro, o ancestral que deu origem a este povo foi Abraão.

Por volta do ano 1800 a. C., este ancião e seu grupo familiar partiram da cidade de Ur, na
Mesopotâmia (atual Iraque) e foram para Canaã. Abraão tinha um filho chamado Isaque, que por

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sua vez foi pai de Jacó. Os 12 filhos deste deram origem às 12 tribos de Israel descritas pela Bíblia.
Devido a uma grande escassez de alimentos em Canaã, algumas tribos se instalaram no Egito, onde
foram escravizadas. “Várias gerações depois, de acordo com o livro do Êxodo, um líder chamado
Moisés tirou os israelitas da escravidão e os levou para a liberdade em Canaã” (HAWKINS, 2018, p. 16).

Aos poucos, os israelitas formaram uma nação única com princípios religiosos ancorados
na crença em torno de um Deus único, todo-poderoso, e criador do Universo. Os judeus também
acreditam que Moisés recebeu a Torá diretamente das mãos do Deus-Criador e que o seu povo
possui uma aliança permanente com ele, por meio da Torá. O reino de Israel começou por volta
do ano 1000 a. C. e durou até 586 a. C. Seus reis mais notórios foram Saul (o primeiro), Davi (que
esmagou os filisteus, os principais inimigos dos israelitas) e Salomão (que criou um reino poderoso,
dotado de paz e prosperidade).

Podemos afirmar ainda que o judaísmo representa cronologicamente a mais antiga doutrina
monoteísta do Ocidente. É dele que surge o cristianismo e não poderíamos entender este sem
entender o seu antecessor que deu a base ética e doutrinal para que o cristianismo encontrasse
território favorável ao seu nascimento e expansão. Desta forma não podemos entender o Novo
Testamento sem nos referenciarmos ao Antigo Testamento e sua riquíssima contribuição doutrinal.

O judaísmo constitui-se em uma doutrina rica em espiritualidade e é considerado um conjunto


de ensinamentos morais com desdobramentos práticos no dia a dia dos seus seguidores. Surgido
como religião mosaica, ou seja, originada a partir de Moisés, o profeta da libertação, o judaísmo,
apesar de suas ramificações, defende um conjunto de doutrinas que o distingue de outras religiões:
a crença monoteísta e a eleição de Israel como povo escolhido para receber a revelação da Torá,
que seriam os mandamentos deste Deus. Dentro da visão judaica do mundo, Deus é um Criador
ativo no universo e que influencia a sociedade humana.

Há diversas tradições e doutrinas dentro do judaísmo, criadas e desenvolvidas conforme o tempo


e os eventos históricos sobre a comunidade judaica, os quais são seguidos em maior ou em menor
grau pelas diversas ramificações judaicas conforme sua interpretação do judaísmo. Entre as mais
conhecidas encontra-se o uso de objetos religiosos como o quipá, espécie de microboina que os
judeus usam na parte detrás da cabeça, costumes alimentares e culturais.

Ao contrário do que possa parecer, um judeu não precisa seguir necessariamente o judaísmo,
ainda que o judaísmo só possa ser necessariamente praticado por judeus. Da mesma forma, o
judaísmo não é uma religião de conversão, efetivamente respeita a pluralidade religiosa desde que

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tal não venha a ferir os mandamentos do judaísmo. Alguns ramos do judaísmo defendem que no
período messiânico todos os povos reconhecerão Cristo como único Deus e submeter-se-ão a Torá.

Tal como o árabe, o hebraico e a Torá devem ser Figura 32 – Quipá. O uso do quipá é compreendido
como um símbolo do temor judeu perante
lidos da direita para esquerda. Nas letras do alfabeto Deus e como prova de que o Criador possui
hebraico, existem apenas as consoantes. Alguns autoridade sobre a vida da pessoa que o utiliza
símbolos foram criados (massoretas) para dar som
e entendimento às palavras. A única palavra que
não pode ser pronunciada pelos judeus é o nome
de Deus. No qual chamam de “O Eterno”. A palavra
como conhecemos “deus” não existe no alfabeto
hebraico, é um tetragrama, ou seja, junção de quatro
consoantes, não existe pronúncia, portanto o judeu
para não errar o nome do eterno não o pronuncia. Fonte: Stanislav Samoylik/Shutterstock

Chama-o de Adonai. YHWH (Iavé).

A Torá possui cerca de 613 mandamentos, dos quais 248 são positivos e 365 negativos. Para
os judeus, a Palavra se faz Escritura e a Escritura se proclama, se canta. Creem, ainda, que Deus
escolheu homens para que ouvissem suas palavras e a escrevessem. Dando origem então à Escritura,
muitos séculos depois houve os concílios, que seriam a reunião de sábios para que decidissem
sobre a canonicidade, ou a validade desses livros, porque muitos outros livros foram escritos se
intitulando como a revelação de Deus.

O judaísmo é, costumeiramente, dividido nas seguintes ramificações:

1. ortodoxo, uma linha considerada puritana em termos de obediência à lei judaica. Nesta
ramificação, para se ter uma ideia de seus preceitos, judeus não podem casar com pessoas
não pertencentes à esta religião;
2. reformista, adapta preceitos tradicionalistas ao modo de vida contemporâneo, como por
exemplo, os casamentos mistos;
3. reconstrucionistas, creem que o povo judeu está em constante evolução e que suas leis
precisam acompanhar tal movimento. É a ramificação que costuma receber convertidos
de outras religiões.

Para os judeus, assim como para os cristãos e os muçulmanos, Jerusalém é a Cidade Sagrada,
também chamada de Sião. Foi conquistada pelo rei Davi por volta do ano 1000 a. C. e permaneceu
sob domínio hebreu até o ano 587 a. C. quando foi conquistada pelos babilônios. Foi reconquistada

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pelos judeus em 515 a. C., mas em outros períodos, fora novamente tomada por romanos e depois
pelos muçulmanos. “A cidade ficou sob domínio cristão entre os séculos IV e VII e depois sob domínio
muçulmano entre os séculos VII e XX. Mesmo assim, os judeus do mundo inteiro mantiveram seu
apego emocional e espiritual à Cidade Sagrada” (HAWKINS, 2018, p. 21).

No famoso “muro das lamentações”, os judeus oram, especialmente aos sábados e durante as
festividades, pelo reino perdido, tocando os restos desta muralha que cercava um templo construído
durante o reinado de Herodes, por volta de 10 a. C. Segundo Hawkins (2018, p. 43), “os judeus
compõem cerca de quatro quintos da população de Israel”. Apesar disso, atualmente, muitos judeus
já não vivem em total observância em relação aos preceitos primários da religião e, de certo modo,
a partir da globalização vivenciada pelo mundo a partir do século XX, deixaram de lado, inclusive,
aspectos de herança cultural.

Além do estudo da Torá, os judeus possuem outra atividade fundamental em sua vida diária: a
oração. Ela deve ser realizada nas mais diversas circunstâncias: em ambiente familiar, sozinho ou
na sinagoga. A oração da manhã, chamada shajarit é a mais solene; a da tarde, chamada maarib, é
uma preparação para o descanso noturno. Também se realizam orações antes das refeições, para
bendizer a mesa; além de outras ocasiões como nascimento, matrimônio, morte, recuperação de
enfermidades ou quando se vai viajar.

O lugar principal de realização dos cultos é a sinagoga. Além de serem usadas para as orações
diárias, elas são usadas especialmente aos sábados e em determinadas solenidades festivas,
como a celebração do Dia do Juízo, Festival de Luz e a Páscoa, chamada de Pessach. Esta última
dura oito dias, nos quais pode-se comer apenas pão sem fermento, pois rememora a libertação
dos judeus do Egito. Diferentemente de outros templos, das mais diversas religiões, as sinagogas
não costumam ser grandes, nem ricamente decoradas. Além disso, Pilagallo Filho (2008, p. 180),
ressalta que

o lugar principal da sinagoga é onde se localiza a arca que representa a aliança do


povo de Israel com Deus. Usualmente, é um armário com duas portas envidraçadas, em
cujo interior se colocam cópias da Torá. Outro elemento fundamental é a escrivaninha
para leitura da Torá, que usualmente está em um lugar central e visível.

Com o passar do tempo, o figura do rabino adquiriu muita importância no


desenvolvimento do culto. Ele é o oficiante principal, aquele que ajuda o cantor,
que dirige as partes cantadas da cerimônia. O rabino é também o guia espiritual da
comunidade. Costumeiramente, resolve os litígios e dirige a escola religiosa judaica.
Tradicionalmente, o rabino é um homem, mas em algumas comunidades judaicas
mais liberais as mulheres já podem ocupar este posto.

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Por fim, cremos ser importante destacar Figura 33 – A decoração interna das sinagogas apresenta
sobriedade, diferentemente de outros templos religiosos
os principais ritos de passagem presentes na
religião judaica. O nascimento de filhos ou
filhas é uma obrigação no judaísmo. No caso
dos meninos, aos oito dias de vida, é realizada
a circuncisão, que é a remoção do prepúcio do
pênis e marca a aceitação religiosa do indivíduo
na comunidade. Ainda com relação aos meninos,
aos 13 anos de idade, eles participam de uma
Fonte: alredosaz/Shutterstock

cerimônia chamada bar mitzvá, que significa “filho do mandamento”. É o momento em que a
comunidade religiosa o aceita como adulto.

O matrimônio também tem grande importância na religião judaica e, preferencialmente, deve


ser realizado entre homens e mulheres que professem a mesma fé, embora algumas correntes mais
modernas do judaísmo, como vimos anteriormente, reconheçam casamentos mistos. Quando ocorre
um óbito, a família do falecido entoa uma oração fúnebre rápida e, em questão de horas, o corpo
já deve ser enterrado. Os judeus creem que, se a pessoa viveu conforme as escrituras sagradas,
o juízo de Deus será favorável e não há o que temer com a morte. É tradição que um filho homem
feche a boca e os olhos do falecido.

CRISTIANISMO E O CONCEITO DE RELIGIÃO DE MASSA


O cristianismo possui a sua fundamentação teórica e ritualística centrada na pessoa de Jesus
Cristo, daí o seu nome de fundação. O nome “Jesus Cristo” na verdade é constituído de dois termos:
“Jesus” (Yeshua), cujo significado é “Deus salva” e “Cristo” com o significado de escolhido. As bases
epistemológicas do Cristianismo estão assim explicadas, considerando que esta religião começou
a partir do nascimento do filho de Deus.

Cristianismo é a religião monoteísta centrada na vida e nos ensinamentos de Jesus de


Nazaré. É a religião com maior número de seguidores do mundo, aproximadamente 1.5
a 2 bilhões, o que representaria um terço da população humana. A fé cristã compartilha
com o judaísmo a crença na tora, chamada pelos cristãos de “Pentateuco” ou “os
cinco Livros” e também todo o “Antigo Testamento”. Mas revela sua continuidade,
no evangelho ou “Boas Novas” de Jesus Cristo e outros textos de seus discípulos,
conjunto de escritos que chamamos de o “Novo Testamento”, primeiro compêndio
doutrinal e moral do Cristianismo.

O Cristianismo surgiu com o início da pregação dos ensinamentos de Jesus Cristo,


aos 33 anos de idade posteriormente com a expansão e difusão desses ensinamentos

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para todos os povos. Os seguidores desta doutrina, os cristãos, creem em Jesus
como Filho de Deus, o Messias esperado e citado no Antigo Testamento. Jesus
viveu, sofreu, morreu e ressuscitou para salvar a Humanidade do pecado (PILAGALLO
FILHO, 2008, p. 190).

Jesus passou toda a sua vida na Palestina, no Oriente Médio. Os cristãos costumam chamar de
Terra Santa a região onde ele viveu. Hoje, a maior parte dessa área está situada na atual nação de
Israel. Conforme Hawkins (2018, p. 46), “Jesus nasceu por volta do ano 4 a. C. na Judeia. Na época
de seu nascimento, essa antiga terra de judeus fazia parte do Império Romano”. A Bíblia conta que
Jesus nasceu num estábulo, entre as cidades de Nazaré e Belém. Também é interessante observar
outra afirmação:

De acordo com a Bíblia, pouco depois do nascimento, três reis magos chegaram
para adorar Jesus, vindos de países no Oriente, tendo seguido uma estrela muito
brilhante. No entanto, antes de chegar a Belém os três visitaram o rei Herodes em
Jerusalém para lhe perguntar sobre o rei recém-nascido. Herodes se sentiu ameaçado
pela notícia e tentou matar Jesus ordenando a morte de todos os meninos do reino.
Mas num sonho, José foi avisado por um anjo e fugiu com a família para o Egito
(HAWKINS, 2018, p. 48).

Ainda no século I, houve uma decisão muito importante, tomada pelas primeiras comunidades
cristãs, quando se permitiu a abertura do cristianismo para grupos não judeus. Dessa forma, eles não
foram obrigados a cumprir normas judaicas como a circuncisão ou observar regras alimentares e
rituais. Muitos dos aspectos fundamentais das crenças cristãs na atualidade não teriam a relevância
e o desenvolvimento que atingiram se não houvesse esta religião se convertido na religião oficial
do Império Romano no século IV.

Nos tempos de Jesus, havia três grupos religiosos que, de certo modo, dominavam o conhecimento
espiritual. Os saduceus, liderados pelos sumos sacerdotes, eram contrários às interpretações da
Torá feitas por outros grupos tradicionalistas. Os fariseus, que se caracterizavam por interpretar a
Torá e adaptá-la às novas necessidades, diferentemente dos saduceus, acreditavam na ressureição
dos mortos, no juízo final, na vida após a morte, em anjos e demônios. Os essênios eram tidos como
mestres espirituais e tinham fama de curar as enfermidades e purificar os pecadores. Criam que
Yeshua, que viria em breve, iria instaurar um mundo perfeito, onde reinaria a justiça e a harmonia.

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A obra de Bartolomé Murillo (figura 34) recria Figura 34 – A adoração dos pastores,
obra de Bartolomé Murillo
como teria sido o nascimento de Jesus numa
manjedoura. Pouco se sabe da infância de Jesus.
No entanto, o evangelho de Lucas conta que, aos
12 anos, o menino foi encontrado num templo,
discutindo questões religiosas com alguns anciãos
de Jerusalém.

Já na idade adulta, por volta dos 30 anos, Jesus


pregava onde ia. Seu ensinamento mais famoso
é considerado por muitos o chamado Sermão da
Montanha, uma lição ética com base na lei do amor. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/
Ficheiro:Adoración_de_los_pastores_(Murillo).jpg>.
“Os arqueólogos acreditam que isso aconteceu num
morro próximo a Cafarnaum que dava para o Mar da Galileia” (HAWKINS, 2018, p. 50). A mensagem
de Jesus rompia tanto o ponto de vista estrito do cumprimento da Torá, que defendiam os fariseus,
quanto com o papel de máxima importância que os saduceus outorgavam ao templo.

Traído por Judas Iscariotes, um dos apóstolos, Jesus foi feito prisioneiro e levado ao sinédrio, o
conselho religioso judaico. Foi declarado culpado por blasfêmia e entregue às autoridades romanas
para que fosse aplicada a pena de morte. Então o governador romano da Judeia, Pôncio Pilatos,
atendendo à solicitação das autoridades judaicas, condenou Jesus à morte por crucificação. O
corpo de Jesus foi sepultado e o túmulo fechado com uma pedra pesada. Porém,

os seguidores de Jesus afirmaram que ele ressuscitou no terceiro dia de sua morte e
que era o Messias com o qual se cumpriam as profecias. Os 11 apóstolos disseram
que ele lhes apareceu e ordenou que pregassem sua mensagem a todo o mundo.

Ao enfocar que Jesus era o Messias e que havia ressuscitado, os cristãos foram se
separando progressivamente da tradição judaica ao longo das décadas seguintes.
Além disso, depois da destruição do templo de Jerusalém no ano 70 d. C., a religião
judaica foi se tornando cada vez menos variada, tendendo para as interpretações
farisaica e rabínica. Os cristãos terminaram criando uma religião distinta e nova
(PILAGALLO FILHO, 2008, p. 195).

Nos séculos seguintes, a crença numa segunda vinda de Cristo fez com que os seguidores
da religião que ele fundou não organizassem um sistema de líderes ou sacerdotes. Foi somente
por volta do início do século III que os supervisores, denominados episkopos (bispos), adquiram
certa notoriedade entre os fiéis. Esses sacerdotes acabaram assumindo poderes civis, conforme

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o cristianismo ia adquirindo amplitude territorial. Porém, nem tudo seguia bem para os difusores
desta nova fé.

Os cristãos também sofreram perseguições por parte de não-cristãos. As mais


sangrentas foram ordenadas por imperadores romanos como Nero, Décio e Diocleciano.
Os cristãos eram acusados de trair Roma, pois se negavam a realizar o culto imperial
(PILAGALLO FILHO, 2008, p. 201).

Figura 35 – A última prece dos mártires cristãos, de Jean-Léon Gérôme (1883)

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Perseguição_aos_cristãos>.

Muitos cristãos foram mortos em assassinatos públicos realizados no Coliseu, com anuência das
autoridades romanas. As pessoas que não prestavam cultos à Roma eram consideradas traidoras
e indignas da confiança do imperador.

Posteriormente, no século IV, a aproximação dos cristãos em relação ao poder político de


Roma fez com que, durante o período do imperador Constantino, o cristianismo se transformasse
na religião oficial do império.

Esta religião oferecia ao imperador uma fé homogênea organizada e com uma


mensagem que podia servir de fator aglutinante para um império constituído por
muitas culturas e formas de pensar distintas, que necessitavam de uma ideologia
comum que as unificasse (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 203).

Depois da queda de Roma, o Império do Ocidente se dividiu em pequenos reinos. Em muitas


regiões da Europa, o cristianismo quase desapareceu. A Igreja Católica iniciou um longo período de
atividade missionária. O cristianismo também chegou à Síria, à Pérsia e outras regiões orientais.
Na Idade Média, por exemplo, era comum os papas receberem apoio de governantes seculares
poderosos. Um dos grandes patrocinadores da Igreja por volta do ano 800 d. C. foi o imperador
Carlos Magno, criador do Sacro-Império Romano Germânico.

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Na Idade Média, os grupos eclesiais que discordavam dos trâmites e normas da Igreja,
especialmente príncipes e governantes do norte da Europa, deram início à chamada Reforma
Protestante. Os principais protagonistas deste momento foram Martinho Lutero e João Calvino.
Eles criticavam o catolicismo, sua organização e seus dogmas, dizendo que buscavam voltar ao
espírito dos primeiros cristãos tal como era narrado nos Evangelhos. Lutero, por exemplo, pregou
95 teses eclesiais contra a Igreja Católica em 1517, na cidade de Wittenberg, na Alemanha.

Os reformadores eram contrários às mudanças que ocorreram no cristianismo ao longo


dos séculos, pois segundo eles, essas mudanças haviam levado ao distanciamento
da mensagem evangélica. Não aceitavam as decisões dos concílios nem as ordens
das autoridades religiosas que não tivessem respaldo na Bíblia.

A crença dos reformadores centrava-se principalmente em dois aspectos. De um lado,


estabeleceram que a revelação de Deus para o mundo só era encontrada na Bíblia.
Para que todos pudessem ter acesso irrestrito a ela, Lutero realizou sua tradução
para o alemão (e, posteriormente, as traduções se espalharam mundo afora).

Por outro lado, os reformadores acreditavam que apenas Deus podia dar a salvação,
por meio da sua graça. A intercessão do papa, da chamada Virgem Maria ou dos
santos era inútil; assim, não era aceito seu culto e não eram expostas suas imagens
nas igrejas (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 231).

A Igreja Católica respondeu à Reforma em duas frentes. De um lado, recorreu à força, lutando
militarmente contra os territórios que aceitavam as teses reformistas. De outro lado, iniciou uma
reação cultural e intelectual que teve outros dois agentes importantes: a propaganda religiosa, por
meio da massificação de imagens das personalidades tidas como santas pela Igreja, e a doutrinação
religiosa pelas novas terras que eram descobertas por países europeus como Portugal e Espanha.

Durante e após este período de descobertas marítimas, o cristianismo católico reinou praticamente
absoluto enquanto religião de massa. Até que entre os séculos XIX e, principalmente XX, o movimento
protestante ganha força, e surge uma nova forma de prestação de culto cristão: os chamados
evangélicos, grupos religiosos que procuravam viver segundo uma interpretação direta da Bíblica,
assim como faziam os reformadores do século XVI. Na América do Norte, colonizada por ingleses,
estas comunidades já se faziam presentes no século XVII.

Já no século XX, o culto cristão evangélico ganhou nova força com a adoção, além dos sermões,
de hinos e da realização de transmissões de cultos via meios de comunicação de massa, como
televisão e rádio. O principal evangelista daquele século foi o recém-falecido pastor norte-americano
Billy Graham (1918-2018), que percorreu o mundo levando adiante a mensagem de Cristo. Estima-
se que tenha visitado aproximadamente 185 nações e falado para mais de 210 milhões de fiéis ao
longo de seu ministério.

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Atualmente o cristianismo é, sem dúvidas, a maior religião do mundo, e cerca de um terço da
população mundial se intitula cristã. Segundo Hawkins (2018, p. 77), “são mais de dois bilhões de
fiéis no mundo inteiro”. Atualmente, o cristianismo baseado na Igreja Católica pode ser definido
entre tradicional e carismático (com maior presença de músicas nos cultos), enquanto na visão
evangélica existem os fiéis ligados a denominações mais pentecostais (crença na experiência
particular das pessoas com Deus através do Espírito Santo) e os neopentecostais (dão muito valor
à música e a interpretações bíblicas menos literais).

E no Brasil, que embora ainda seja uma nação prioritariamente católica, como seu deu a inserção
do movimento evangélico? Vejamos:

O Cristianismo no Brasil sofre mudanças desde o século XIX, quando os fluxos


migratórios e as missões estrangeiras se encarregaram de estabelecer, no país, as
primeiras comunidades protestantes: alemães luteranos se fixaram na serra capixaba
e nos estados do sul; missionários batistas, presbiterianos e metodistas se instalaram
em vários cantos do país. Com a proclamação da República e a abolição do vínculo
formal entre Igreja Católica e Estado, firmou-se o princípio da liberdade religiosa, de
que esses e outros grupos protestantes logo se serviram, o que suscitou célebres
controvérsias entre católicos e protestantes na primeira metade do século XX. O
Brasil se tornou um campo missionário para luteranos, metodistas, presbiterianos,
batistas, adventistas e outros.

Não seria, porém, esse protestantismo tido como histórico a fincar raízes no povo
brasileiro, mas sim o chamado neo-pentecostal. Este segmento apresenta vertiginoso
crescimento tanto nos centros urbanos e como nas periferias, seja em pequenas,
médias ou grandes cidades do país (PILAGALLO FILHO, 2008, p. 259).

As denominações que se intitulam como pertencentes a esse corrente neopentecostal costumam


enfatizar em seus cultos a cura de doenças, exemplos de prosperidade financeira, promoção de
sessões de descarrego espiritual, para segundo creem, libertar o corpo humano da influência de
demônios e, além disso, comercializar objetos que contém mensagens religiosas ou quaisquer
outras espécies de adereços que remetam à crença que possuem.

CONCLUSÃO
Ao longo desta aula, percorremos dezenas de séculos com o intuito de apresentar a você,
nosso aluno, um esboço das principais correntes e denominações religiosas que existiram e ainda
existem mundo afora, sejam elas praticadas por pequenos grupos ou por multidões de pessoas e
o que, nestes casos, transformam-nas em religiões de massa, como o cristianismo e o islamismo
na parte oriental do globo terrestre.

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Para os fiéis, a religião continua a ser uma força que orienta todos os aspectos da vida. O
conhecimento e a compreensão das diferenças e similaridades entre cada uma delas faz-se
necessário não apenas em termos teológicos, mas também para que possamos compreender a
comunidade global contemporânea, até mesmo em termos de conflitos bélicos e religiosos que
sepultam milhares de pessoas, em nome de uma mentirosa “guerra santa”.

Mas uma coisa é certa: ninguém sabe, com certeza, como a prática religiosa começou e qual é,
se é que existe, a forma ideal para se cultuar a entidade celestial criadora do Universo, pois inclusive
nos é dada a licitude de não acreditar nisto. Alguns acreditam que a religião surgiu para manter
a unidades das sociedades. Outros creem que ela apareceu como uma forma de regulamentar o
comportamento humano. Há ainda quem a considere como a forma de se estabelecer relacionamentos
entre os seres humanos e os seres espirituais.

Conforme Hawkins (2018, p. 3), ao longo dos últimos 5 mil anos, “a noção do controle existencial
a partir da presença de um deus gerou narrativas, símbolos, cultos, sacerdotes, escrituras e templos,
para dialogar com as pessoas”. Ainda conforme este autor, atualmente, a população mundial se
define da seguinte forma, em termos de práticas religiosas: “33% são adeptos do cristianismo;
21% do islamismo; 14% do hinduísmo; 6% creem no budismo; 0,22% no judaísmo; 6% em religiões
africanas e indígenas; enquanto 16% se autointitulam sem religião”.

Além disso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948 pela Organização
das Nações Unidas, promoveu uma série de direitos a todos os seres humanos, entre os quais se
encontra o direito à liberdade religiosa. Por fim, cremos que no mundo atual a relação entre as
religiões deve estar baseada na igualdade perante à lei e no respeito à diversidade de culto e opção
ideológica das pessoas, enquanto indivíduos únicos, e das sociedades enquanto elementos grupais.
Não se trata, portanto, de tolerância, mas da necessária aceitação e respeitabilidade do direito a
crer em algo distinto.

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GLOSSÁRIO

Assecla - Adepto; quem segue ou defende as normas, os preceitos ou as regras de uma religião,
partido ou sociedade.

Antropomórfica – semelhante ao homem; de aspecto ou aparência semelhante ao da espécie


humana; antropomorfo. Com características humanas; que atribui a algo qualidades humanas.

Charrete – é uma espécie de carroça de menor porte, movida à tração animal e que, na maior parte
dos casos, não possui capacidade para armazenar muitos quilos de carga, diferentemente de sua
versão mais estendida (a carroça).

Divindade – qualquer força sobrenatural para a qual se preste alguma espécie de culto; crê-se que
tal força possua poderes superiores aos portados pelos seres humanos.

Doutrina – trata-se de uma coletividade de aspectos técnicos, ou seja, mandamentos, leis ou códigos,
por exemplo, que devam ser seguidos por determinados grupos sociais que estejam sob a sua tutela.

Escatologia – prospecções teológicas acerca daquilo que deve ocorrer no final dos tempos,
independentemente da religião para a qual se produzam tais entendimentos; ciência que estuda o
futuro religioso.

Epistemológicas – 1- Teoria do conhecimento; reflexão sobre a natureza, o conhecimento e


suas relações entre o sujeito e o objeto. 2- Ciência das práticas relacionadas ao conhecimento:
epistemologia política. 3- Teoria da ciência; análise das premissas teóricas e práticas relacionadas
com o conhecimento científico, de acordo com seu avanço histórico no desdobramento de uma
sociedade.

Massas populares – aglomerado formado por milhares ou até mesmo milhões de pessoas que, por
não possuírem capacidade própria de formar concepções intelectuais demasiadamente aperfeiçoadas,
precisam de outras pessoas dotadas de maior inteligência para guiá-las em diversos aspectos da
vida.

Monoteísta – monoteísmo é o sistema doutrinário que admite a existência de apenas uma divindade,
que segue uma única religião.

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Panteão – templo central dedicado a uma coletividade de deuses, deusas e outros seres celestiais,
em antigas religiões, como as praticadas pelos impérios grego e romano; monumento erguido para
receber restos mortais de pessoas tidas como heróis ou heroínas de um determinado povo.

Pergaminho – material que era usado para escrita na Antiguidade e Idade Média, criado a partir
da mistura de peles de animais, restos de tecido, água e cola. Durante muitos anos, foi o principal
suporte para manutenção de informações escritas.

Politeístas – é a crença em muitos deuses ou sua adoração. Resulta de crenças em espíritos,


demônios e forças sobrenaturais, definidas vagamente em crenças como o animismo, totemismo
e culto aos ancestrais.

Provérbio – pensamento curto, construído por meio de analogias, que busca explicar um determinado
conceito ou situação, por meio da construção de uma história cuja linguagem deve ser acessível
em termos de transmissão e compreensão.

Tráfico negreiro – atividade de captura e comercialização ilegal de pessoas negras do sexo masculino
e feminino, tidas como escravos, que ocorreu mundo afora entre os séculos XVI e XIX, para fornecer
mão de obra às nações de maior desenvolvimento econômico.

Trindade Santa – a doutrina cristã da Trindade define Deus como três pessoas consubstanciais,
expressões ou hipóstases: o Pai, o Filho e o Espírito Santo; “um Deus em três pessoas”. As três
pessoas são distintas, mas são uma “substância, essência ou natureza”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA NETO, J. F. DE. Bíblia Sagrada. São Paulo: Casa da Bíblia, 1997.

ASTROCENTRO. Santos católicos na Umbanda. 2017. Disponível em: <https://www.astrocentro.com.br/


blog/umbanda/santos-catolicos-umbanda/>. Acesso em: 6 abr. 2018.

BBC Brasil. Os fundamentos do Islã e os festivais religiosos. BBC Brasil, set. 2003. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/story/2003/09/printable/030910_islamismobase.shtml>. Acesso em:
22 jun. 2018.

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FUNARI, P. P. As religiões que o mundo esqueceu. São Paulo: Contexto, 2009.

HAWKINS, J. A história das religiões. São Paulo: M. Books, 2018.

MCLUHAN, M. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 1979.

PILAGALLO FILHO, O. Religiões e culturas. São Paulo: Moderna, 2008.

ROSENFELD, Anatol. Negro, Macumba e Futebol. São Paulo: Perspectiva, 1993.

TERRA. Os fundamentos do Islã e os festivais religiosos. Terra, 11 ago. 2003. Disponível em: <http://
noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI141891-EI312,00-Os+fundamentos+do+Isla+e+os+festivais+religiosos.
html>. Acesso em: 6 abr. 2018.

TODA MATÉRIA. Deuses gregos. 2013. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/deuses-gregos>.


Acesso em: 4 abr. 2018.

__________. Deuses romanos. 2018. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/deuses-romanos/>.


Acesso em: 3 abr. 2018.

__________.Deus egípcios. 2017. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/deuses-egipcios/>. Acesso


em: 6 abr. 2018.

WIKISTÓRIA. Religião suméria. 2015. Disponível em: <https://sites.google.com/site/lehist13/home/idade-


antiga/civilizacao-sumeria/religiaosumeria>. Acesso em: 21 mar. 2018.

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