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TIROLESA NO RIO DE JANEIRO

Um presente de grego no
centenário do bondinho do Pão
de Açúcar
por Chico Alencar
11 de abril de 2023

Em se falando de Brasil, a tendência observada nos últimos anos em relação


às concessões nas unidades de conservação é de quase privatização dos
parques 

Nas últimas semanas, a notícia da construção de tirolesas entre os morros do Pão de Açúcar e
da Urca surpreendeu os cariocas, especialmente os moradores da região. As obras já
começaram, e a empresa que administra o parque promete inaugurar a atração no segundo
semestre. 

A proposta vem acompanhada ainda de um segundo projeto, que está sendo chamado de
“modernização” das estruturas já existentes no local, mas que na verdade aumenta em cerca de
50% a área construída no cume dos morros do Pão de Açúcar, da Urca e na base da Praia
Vermelha. Em outras palavras, significa a derrubada de vegetação nativa e possível
descaracterização deste que é um dos principais pontos turísticos não só do Rio como de todo
o Brasil, reconhecido pelo Iphan e pela Unesco. 

Nosso mandato já enviou um ofício ao Ministério do Meio Ambiente, ao Ministério do


Turismo, à Secretaria Municipal de Meio Ambiente, à Secretaria Municipal de Turismo, à
GeoRio, ao Iphan, à Embratur e ao Ministério Público do RJ, apresentando questionamentos e
ponderações sobre os empreendimentos. 

A obra da tirolesa foi aprovada pelo Iphan, que vistoria o local a cada quinze dias, segundo
afirmou recentemente à imprensa. No entanto, é evidente que um projeto como esse deveria
ser objeto de maior discussão, com participação de todas as partes interessadas. A empresa se
defende dizendo que consultou sim a sociedade civil, mas a polêmica que foi gerada prova que
o processo não foi suficiente. 

A participação é uma forma de garantir a análise de um projeto por todos seus ângulos, para
que se evite conflitos e impactos futuros e mesmo imprevistos em sua concepção.  
Reprodução da simulação antes e depois do projeto de construção de tirolesa no Parque
Bondinho Pão de Açúcar. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Além da complexidade das obras na rocha, em um monumento geológico como o Morro do


Pão de Açúcar, a área consiste em unidade de conservação (UC), o Monumento Natural dos
Morros do Pão de Açúcar e da Urca, além de afetar – e ser afetada – por outras UCs como o
Parque Natural Municipal Paisagem Carioca. A vocação da natureza não deveria se limitar a
ser um empreendimento. Sua vocação é de só ser. E nos fazer ser. 

Em se falando de Brasil, a tendência observada nos últimos anos em relação às concessões nas
UCs é de quase privatização dos parques, algo que não pode ser ignorado. É evidente que
precisamos de maior aporte de recursos na gestão das áreas protegidas e dos órgãos
ambientais. 

Um caminho para promover a visitação às áreas naturais de forma sustentável e integrada,


junto à manutenção das comunidades locais e dos saberes tradicionais, é a promoção do
ecoturismo de base comunitária. O turismo de base comunitária é uma alternativa na qual
acreditamos e que deve ser levada em consideração na formulação das parcerias público-
privadas para que possam ser também público-comunitárias.  

É evidente que precisamos dar suporte ao turismo de massa que aqui chega, sobretudo na
nossa cidade cartão-postal, mas é importante lembrar que nem tudo é sobre o grande turismo
ou o mega empreendimento. Também pode ser sobre o pequeno, o comunitário, o simples (que
no geral, aliás, gera mais e melhores empregos). Não precisamos, por exemplo, de mais um
resort em Boipeba! Precisamos que todos possam ter acesso à natureza, da qual fazemos
parte. 

Como já disse Manoel de Barros, avião vira sucata, mas não vi nenhuma coisa mais bonita na
cidade do que um passarinho. Seguiremos em luta! 

Chico Alencar é professor de História, mestre e doutorando em Educação e tem 35 livros


publicados. Em 2022 foi eleito para seu quinto mandato como deputado federal, graças ao voto
de 115.023 eleitores e eleitoras. 
Leia mais sobre o tema:

MEIO AMBIENTE   PRIVATIZAÇÃO   RIO DE JANEIRO   TURISMO

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