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6.

Sequências de números reais


6.1. Definição. Uma sequência de números reais é uma função x : N → R
que associa a cada n ∈ N um número xn ∈ R. A sequência x : N → R é
usualmente denotada por (xn )∞
n=1 ou simplesmente (xn ).

6.2. Exemplos.
(a) 1, 2, 3, ...
(b) a, a, a, ...
(c) 1, 1/2, 1/3, ...
(d) 1/2, (1/2)2 , (1/2)3 , ...
(e) 1, −1, 1, −1, ...
(f) Sejam x1 = x2 = 1, e seja xn = xn−2 + xn−1 para cada n ≥ 3. Esta
sequência é conhecida como sequência de Fibonacci.
6.3. Definição. Diremos que uma sequência (xn ) é convergente se existir
um número x ∈ R tal que, para cada  > 0 existe um n0 ∈ N tal que

|xn − x| <  para todo n ≥ n0 .

Neste caso diremos que (xn ) converge a x, e que x é o limite da sequência (xn ).
Escreveremos xn → x ou lim xn = x.
6.4. Exemplo. Se xn = a para cada n ∈ N, então lim xn = a.
De fato seja  > 0 dado. Então é claro que

|xn − a| = 0 <  para todo n ≥ 1.

6.5. Exemplo. Se xn = 1/n para cada n ∈ N, então lim xn = 0.


De fato seja  > 0 dado. Pela propriedade arquimediana existe n0 ∈ N tal
que n0 > 1/, e portanto 1/n0 < . Segue que

1
|xn − 0| = <  para todo n ≥ n0 .
n

6.6. Definição. (a) Uma sequência (xn ) é dita limitada superiormente se


existir b ∈ R tal que
xn ≤ b para todo n ∈ N.
(b) Uma sequência (xn ) é dita limitada inferiormente se existir a ∈ R tal
que
a ≤ xn para todo n ∈ N.
(c) Uma sequência (xn ) é dita limitada se ela for limitada superiormente e
limitada inferiormente. É fácil verificar que uma sequência (xn ) é limitada se e
só se existir c > 0 tal que

|xn | ≤ c para todo n ∈ N.

6.7. Proposição. Cada sequência convergente é limitada.

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Demonstração. Seja (xn ) uma sequência convergente, e seja x = lim xn .
Então existe n0 ∈ N tal que

|xn − x| < 1 para todo n ≥ n0 ,

e portanto
|xn | < |x| + 1 para todo n ≥ n0 .
Seja
c = max{|x1 |, ..., |xn0 −1 |, |x| + 1}.
Então
|xn | ≤ c para todo n ∈ N,
e portanto a sequência (xn ) é limitada.
6.8. Exemplo. A sequência 1, 2, 3, ... não é limitada, e portanto não é
convergente.
6.9. Exemplo. A sequência 1, −1, 1, −1, ... é claramente limitada, mas
não é convergente.
De fato, se esta sequência fosse convergente a x, então existiria n0 ∈ N tal
que
|xn − x| < 1/2 para todo n ≥ n0 .
Assim teriamos que |1 − x| < 1/2 e | − 1 − x| < 1/2, e portanto
1 1
2 = |(1 − x) + (1 + x)| ≤ |1 − x| + |1 + x| < + = 1,
2 2
absurdo.
6.10. Definição. (a) Uma sequência (xn ) é dita crescente se

xn ≤ xn+1 para todo n ∈ N.

(b) Uma sequência (xn ) é dita decrescente se

xn ≥ xn+1 para todo n ∈ N.

6.11. Proposição. (a) Cada sequência crescente e limitada superiormente


é convergente.
(b) Cada sequência decrescente e limitada inferiormente é convergente.
Demonstração. (a) Seja (xn ) uma sequência que é crescente e limitada
superiormente. Seja
b = sup{xn : n ∈ N}.
Provaremos que (xn ) converge a b. Seja  > 0 dado. Como b é a menor cota
superior, existe n0 ∈ N tal que b −  < xn0 . Como a sequência (xn ) é crescente,
segue que
b −  < xn0 ≤ xn para todo n ≥ n0 .

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Segue que
b −  < xn ≤ b < b +  para todo n ≥ n0 .
Logo
|xn − b| <  para todo n ≥ n0 ,
e portanto xn → b.
(b) Se (xn ) é decrescente e limitada inferiormente, e se

a = inf{xn : n ∈ N},

podemos provar de maneira análoga que xn → a.


6.12. Lema. Se xn → x 6= 0, então existe n0 ∈ N tal que
x
xn > > 0 para todo n ≥ n0 , se x > 0,
2
e
x
xn < < 0 para todo n ≥ n0 , se x < 0.
2

Demonstração. Como xn → x 6= 0, existe n0 ∈ N tal que

|x|
|xn − x| < para todo n ≥ n0 ,
2
ou seja
|x| |x|
x− < xn < x + para todo n ≥ n0 .
2 2
Se x > 0, então
x x
xn > x − = para todo n ≥ n0 .
2 2
Se x < 0, então
x x
xn < x − = para todo n ≥ n0 .
2 2

6.13. Proposição. Sejam (xn ) e (yn ) duas sequências convergentes, e


sejam x = lim xn e y = lim yn . Então:
(a) (xn + yn ) é convergente e

lim(xn + yn ) = x + y.

.
(b) (xn yn ) é convergente e

lim(xn yn ) = xy.

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(c) Se y 6= 0, então ( xynn ) é convergente e
xn x
lim = .
yn y

Demonstração. (a) Escrevamos

|(xn + yn ) − (x + y)| = |(xn − x) + (yn − y)| ≤ |xn − x| + |yn − y|.

Seja  > 0 dado. Como xn → x, existe n1 ∈ N tal que

|xn − x| < /2 para todo n ≥ n1 .

Como yn → y, existe n2 ∈ N tal que

|yn − y| < /2 para todo n ≥ n2 .

Seja n0 = max{n1 , n2 }. Segue que


 
|(xn + yn ) − (x + y)| < + =  para todo n ≥ n0 .
2 2
(b) Escrevamos

|xn yn − xy| = |(xn − x)yn + x(yn − y)| ≤ |xn − x||yn | + |x||yn − y|.

Seja  > 0 dado. Como (yn ) é convergente, ela é limitada. Logo existe c > 0 tal
que
|yn | ≤ c para todo n ∈ N.
Como xn → x, existe n1 ∈ N tal que

|xn − x| < para todo n ≥ n1 .
2c
Como yn → y, existe n2 ∈ N tal que

|yn − y| < para todo n ≥ n2 .
2(|x| + 1)
Seja n0 = max{n1 , n2 }. Segue que
 
|xn yn − xy| < c + |x| <  para todo n ≥ n0 .
2c 2(|x| + 1)
(c) Primeiro provaremos que
1 1
lim = .
yn y
Por hipótese yn → y 6= 0. Pelo lema anterior existe n1 ∈ N tal que
|y|
|yn | > para todo n ≥ n1 .
2

25
Então

− 1 = | y − yn | = |yn − y| < 2|yn − y| para todo n ≥ n1 .
1
yn y yn y |yn ||y| |y|2

Seja  > 0 dado. Como yn → y, existe n2 ∈ N tal que

|y|2
|yn − y| < para todo n ≥ n2 .
2
Seja n0 = max{n1 , n2 }. Segue que

1
− 1 <  para todo n ≥ n0 ,

yn y

provando que
1 1
lim = .
yn y
Usando (b) segue que
 
xn 1 1 x
lim = lim xn =x = .
yn yn y y

6.14. Proposição. Se xn → 0 e (yn ) é limitada, então xn yn → 0.


Demonstração. Como (yn ) é limitada, existe c > 0 tal que

|yn | ≤ c para todo n ∈ N.

Seja  > 0 dado. Como xn → 0, existe n0 ∈ N tal que



|xn | < para todo n ≥ n0 .
c
Segue que
|xn yn | = |xn ||yn | <  para todo n ≥ n0 .

6.15. Teorema do sanduı́che. Sejam (xn ), (yn ) e (zn ) três sequências


tais que
xn ≤ yn ≤ zn para todo n ∈ N.
Se xn → L e zn → L, então yn → L.
Demonstração. Seja  > 0 dado. Como xn → L, existe n1 ∈ N tal que

|xn − L| <  para todo n ≥ n1 ,

ou seja
L −  < xn < L +  para todo n ≥ n1 .

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De maneira análoga, como zn → L, existe n2 ∈ N tal que

L −  < zn < L +  para todo n ≥ n2 .

Seja n0 = max{n1 , n2 }. Então

L −  < xn ≤ yn ≤ zn < L +  para todo n ≥ n0 .

Logo yn → L.
6.16. Exemplo. Se |a| < 1, então lim an = 0.
De fato seja b = 1/|a|. Como b > 1, podemos escrever b = 1 + h, com h > 0.
Pelo teorema do binômio de Newton
n
X n!
bn = (1 + h)n = hk .
(n − k)!k!
k=0

Logo bn ≥ nh, e portanto


 n
n 1 11
0 ≤ |a | = ≤ para todo n ∈ N.
b nh

Como  
11 1
lim 0 = 0 e lim =0 = 0,
nh h
o teorema do sanduı́che implica que lim |an | = 0, e portanto lim an = 0.

6.17. Exemplo. Se a > 0, então lim n a = 1.

A conclusão é clara se a = 1. Suponhamos que a > 1. Então n a > 1 e
podemos escrever √
n
a = 1 + hn , com hn > 0.
Pelo teorema do binômio de Newton
n
X n!
a = (1 + hn )n = hk .
(n − k)!k! n
k=0

Segue que a > nhn , e portanto


a
0 < hn < .
n

Segue do teorema do sanduı́che que lim hn = 0, e portanto lim n
a = 1.
Se 0 < a < 1, então 1/a > 1, e portanto
r
1 n 1
lim √ = lim = 1.
n
a a

Segue que lim n a = 1.

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6.18. Definição. Seja (xn )∞n=1 uma sequência de números reais. Chamare-
mos de subsequência de (xn )∞ ∞
n=1 qualquer sequência da forma (xnj )j=1 , onde

(nj )j=1 é uma sequência estritamente crescente em N.
6.19. Exemplo. Seja xn = 1/n para cada n ∈ N. A subsequência
(x2j )∞ ∞
j=1 é a sequência 1/2, 1/4, 1/6..... A subsequência (x2j−1 )j=1 é a sequência
1, 1/3, 1/5, ....
6.20. Exemplo. Seja xn = (−1)n para cada n ∈ N. A subsequência
(x2j )∞ ∞
j=1 é a sequẽncia 1, 1, 1, .... A subsequência (x2j−1 )j=1 é a sequência
−1, −1, −1, ....
6.21. Proposição. Se (xn ) converge a x, então cada subsequência de (xn )
também converge a x.
Demonstração. Seja (xnj )∞ ∞
j=1 uma subsequência de (xn )n=1 . Por hipótese
xn → x. Logo, dado  > 0, existe n0 ∈ N tal que
|xn − x| <  para todo n ≥ n0 .
Como a sequência (nj )∞
j=1 é estritamente crescente, existe j0 ∈ N tal que nj0 ≥
n0 , e portanto
|xnj − x| <  para todo j ≥ j0 .
Logo xnj → x.

Exercı́cios
6.A. Escreva os 10 primeiros termos da sequência de Fibonacci.
6.B. Seja (xn ) uma sequência convergente, e seja x = lim xn .
(a) Se xn ≤ b para cada n, prove que x ≤ b.
(b) Se xn ≥ a para cada n, prove que x ≥ a.
6.C. Prove que uma sequência (xn ) é limitada se e só se existe c > 0 tal que
|xn | ≤ c para todo n ∈ N.
6.D. Prove que se uma sequência é decrescente e limitada inferiormente,
então ela é convergente.
6.E. Prove que a sequência
1 · 3 · 5 · · · (2n − 1)
xn =
2 · 4 · 6 · · · (2n)
é convergente, e que lim xn ≤ 1/2.
6.F. Determine se as seguintes sequências são ou não são convergentes. Em
caso afirmativo, calcule o limite.
 2     
n 1 3n
(a) , (b) n− , (c) ,
n+5 n n + 7n2

28
√ √
   
1 3n
(d) √ (e) √ , (f ) ( n + 1 − n).
n n+7 n

6.G. Se P (x) = ax3 +bx2 +cx+d, com a, b, c, d ∈ R, determine se a sequência


 
P (n + 1)
P (n)

é ou não é convergente. Em caso afirmativo, calcule o limite.


6.H. Se (xn ) converge a x, prove que (|xn |) converge a |x|.
6.I. Prove que (xn ) converge a zero se e só se (|xn |) converge a zero.
6.J. Dê um exemplo de uma sequência (xn ) tal que (|xn |) é convergente,
mas (xn ) não é convergente.

6.K. Prove que lim n n = 1.
6.L. Dê um exemplo de uma sequência (xn )∞
n=1 que não é convergente, mas
que admite uma subsequência convergente (xnj )∞
j=1 .

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