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Menino de Engenho

autor: José Lins do Rego

movimento: Modernismo

Por Natacha Bastos

Graduada em Letras pela UFF

RESUMO

Menino de Engenho possui como narrador e personagem principal Carlinhos, que em sua idade adulta
narra aos leitores um pouco de sua história, que começa no Recife e passa pelos engenhos nordestinos.
Carlinhos, aos quatro anos, estava em casa quando seu pai assassina sua mãe com um tiro. Seu Tio Juca
vai buscá-lo para ir morar com seu avô materno em seu engenho, chamado Santa Rosa. Chegando lá, ao
ter contato com o campo, fica encantado. Logo que chega, recebe cuidados carinhosos de sua tia Maria.
Aos poucos, vai se familiarizando com o ambiente e seus familiares até então desconhecidos. A tristeza
vai dando lugar à curiosidade de um menino diante do desconhecido.

A rotina do engenho com seus costumes e tradições diferentes da cidade, surpreende e encanta o
menino. A chegada de um cangaceiro, histórias contadas pelas negras da viagem até o Brasil, lendas de
lobisomem; tudo vai marcando sua infância. O menino vivencia o sofrimento com as secas e
posteriormente as enchentes, quando seu avô e os outros senhores de engenho perdem tudo. Com isso,
no engenho, o alimento fica escasso, mas mesmo assim os servos não o abandonam, num laço de
fidelidade. José Paulino diz que escravo tem que ser bem alimentado para poder trabalhar mais. Através
dos passeios com seu avô pelo engenho para ver os problemas existentes, aprende como o homem tem
que ser justo, duro, tendo caráter e bondade, ajudando quem precisa e merece, assim como faz Zé
Paulino.

Apaixona-se por sua prima Maria Clara, quando ela vem passar as férias no engenho, e tem com ela seu
primeiro beijo. Ela volta para a cidade, e ele fica muito solitário, chegando a chorar. Na casa, é caçoado
por tanto sentimento. Um dia, chega uma carta do hospício onde seu pai está internado, e Carlinhos fica
ciente da situação. Ele então fica com medo de ficar igual ao seu pai. Carlinhos tinha também muito
medo de morrer. Por ter asma crônica, se sentia como um pássaro preso; não podia tomar banho de rio,
brincar até tarde, pois podia ter uma crise. Era cercado de cuidados até que Tia Maria casa-se e ele se
sente ainda mais sozinho e solitário. Tia Sinhazinha que passa a cuidar dele.

Aos 12 anos tem seu primeiro contato com uma mulher; uma negra chamada Zefa Cajá, e pega uma
“doença de homem”. Quando descobrem o que houve, prendem Zefa e todos fazem piadas com
Carlinhos, tratando-o como menino precoce, assim como seu avô. Carlinhos sente que é um menino
feito para a maldade. Era qualificado como libertino, perdido, e não religioso. Sentia-se mal com tantos
desejos sexuais. Seu avô decide então colocá-lo num internato, como salvação. Carlinhos parte de trem,
já sentindo saudade do engenho onde passou sua infância e aprendeu tanta coisa.

CONTEXTOe um menino.

ANÁLISE

Carlos, além de personagem, é o narrador de O menino de engenho. Através de sentimentos


memorialistas e de recordações saudosistas e fiéis ao que passou, conta aos seus leitores uma parte de
sua infância, desde os quatro anos quando seu pai assassina sua mãe, até os doze anos, quando é
mandado para um internato e o livro tem seu fim. O autor utiliza uma linguagem simples, direta,
verdadeira e própria de um menino; além de ser extremamente espontânea, passando pelos sonhos,
medos, curiosidades e amores. O autor mostra uma despreocupação com moldes estilísticos, já
prenunciando o movimento do modernismo. Através de tal escrita, o autor toca seus leitores com
profundas observações que um menino ingenuamente faz sobre um engenho, onde com tantas
complexidades, parece tão simples aos olhos de uma criança.

Como cenário histórico, é presente no livro o pós-escravidão, mas há a continuidade dos laços de
trabalho, confiança e respeito. Em troca de comida, casa e proteção, os escravos trabalhavam nos
engenhos e nas casas grandes. Com isso, as negras contadoras de estórias, as crianças mulatas, as
negras sedutoras, tudo faz parte do cotidiano do engenho e é retratado pelo menino. A relação entre
negros e brancos é vista sob uma óptica positiva, de ganhos para ambos os lados. O avô de Carlinhos,
sendo um homem justo e protetor, tem a confiança dos negros, chegando a exercer o papel da justiça,
onde muitas vezes castiga àquele que age fora da lei social. Um negro chega a ir para o tronco, mesmo
não sendo mais escravo segundo a lei.
Carlinhos é um menino acanhado, tristonho e melancólico. Após a morte da mãe, se vê sem rumo, com
pessoas até então desconhecidas. Sente-se limitado e diferente das outras crianças, e é assim tratado
por ser o neto do coronel. Não pode brincar como os outros, não pode ficar até tarde no sereno, e sente
inveja da liberdade alheia. Sua liberdade vai acontecer através de sua descoberta sexual aos doze anos.
Como caminho para o menino tornar-se homem, seu avô ao manda-lo para o internato enxerga um
desejo de sua filha. Carlos aceita e vai.

Porém, fazendo uma conexão com "O Ateneu", ele não se vê como Sérgio, que era uma criança ingênua.
Carlos se vê como menino que já descobriu o que, segundo sua ideia, é ser homem; mau, libertino e
incontrolável. Ao ir para o internato, deseja fazer a vontade de sua mãe e seu avô.Espelho, terceiro
romance de Fernando Sabino, foi lançado em 1982. Nesta obra o autor nos conta sobre sua infância em
Belo Horizonte, na década de 20. Com sotaque mineiro, a criança Sabino nos narra de maneira bem
fantasiosa todo o seu mundo imaginário e simples. Conta-nos como Odnanref, sua identidade secreta,
aprendeu a voar como os pássaros, como ensinou uma galinha a falar, sobre sua visita ao Sítio do Pica
Pau Amarelo, sobre seu cachorro Hidenburgo e seu coelho Pastoof. Fernando começa a brincadeira
conversando com seu espelho, aos poucos o reflexo vai tomando forma e vida, tornando-se seu grande
amigo e companheiro de todas as suas peripécias e aventuras de criança.

Fernando Sabino relata em primeira pessoa (a própria estrutura do livro é “memorialística”) prováveis
episódios sucedidos em seus tempos de infância, porém entremeados por boas doses de ficção,
insuflando vida a algumas fantasias próprias da imaginação pueril – o que acaba conferindo ao livro um
certo caráter de realismo fantástico.

Como em Peter Pan, o menino Fernando encarna, através de várias de suas travessuras, sonhos e fértil
imaginário, a vivacidade e a pureza próprias da criança – como na passagem da libertação dos
passarinhos, um libelo metafórico em prol da liberdade e contra a opressão, aliado a uma certa
tonalidade anti-militarista – em contraposição ao universo controlado e algumas vezes bestial dos
adultos. É o eterno “embate” menino x homem, infância x idade adulta, e como a primeira define a
segunda, além de tentar persistir em conservar o máximo possível de sua inocência e imaginação
mesmo depois do “amadurecimento”Através da prosa simples, poética e próxima do coloquial, além de
muitas vezes apresentar-se – sobretudo nas falas do garoto – numa linguagem infantil, Fernando Sabino
reconstrói todo o universo particular e inteligente das crianças – respeitando-as na sua complexidade e
individualidade -, concebendo-as como simplesmente crianças e não adultos em miniatura – todavia
contundentes na formação dos adultos que serão. E para dar mais autenticidade ao texto, é notória a
honestidade com que as peripécias e experiências da infância, com todas as suas idiossincrasias e
“absurdos”, são relatadas. Todo o sabor da infância – e numa época em que a meninada não conhecia o
poder apelativo da Internet e dos videogames - está presente na obra, e com certeza nos fazem recordar
a nossa própria infância.
O modo despojado e leve com que narra fatos aparentemente corriqueiros, também. Entretanto, em se
tratando de um romance de recordações de seus tempos de criança em sua terra natal, é natural que
alguns episódios sejam perceptivelmente fantasiosos. Trata-se sem dúvida de uma daquelas obras de
Sabino, em que a naturalidade da narração não diminui em nada o clímax da história. Pelo contrário. A
ingenuidade dos pensamentos do protagonista Fernando, quando criança, comove espontaneamente o
leitor mais niilista

Sua narração começa em meio a um temporal, que denunciava grosseiramente as goteiras de sua
bucólica residência. Seu pai, sua mãe e irmãos, todos fazem parte da trupe de personagens. Enquanto
brincava com as poças de água, provocadas pela chuva, o mesmo Fernando se depara com um homem
que conversa brevemente com ele, se despedindo em seguida sem revelar o nome. O menino não sabia
quem era aquele misterioso ser. Somente no final do livro é revelado ao leitor o paradeiro do individuo.
Tratava-se do próprio escritor, já adulto, que em meio ao lirismo da prosa de Sabino, trava em
determinado momento, um singelo contato com a sua versão mirim. Mesmo cercado por fatos
prosaicos, tal ocorrido oferta bela dose de emotividade à obra.

Os eventos improváveis e fantasiosos, personificações das quimeras e aventuras imaginárias infantis,


figuram na obra descritas com naturalidade e de forma espantosamente real – sem uma sugestiva
atmosfera onírica -, desde o poder de fazer milagres que o menino adquire até a incrível descoberta no
espelho, episódio que intitula o romance, inclusive de amplitude alegórica – mas que me recuso a
discorrer porque resultaria num desagradável spoiler acerca do livro.

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