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Ernesto Milá

AS TRÊS LINHAS MESTRAS


DA MODERNIDADE

COMO e POR QUÊ o Fórum Económico Mundial, o transumanismo e


os organismos internacionais (ONU, UNESCO, OMS, ETC.)
CONSPIRAM CONTRA TI.

Tradução do Espanhol: Isabel Conde


AS TRÊS LINHAS MESTRAS DA MODERNIDADE
Resumir em 45 minutos um tema como este não é fácil. E fazê-lo na forma escrita, também não.
Há uns meses e em vista de ter que dar várias palestras, optei por elaborar um “guião”, ao qual
nem sempre me ative, mas que, em todo o caso, resume as linhas mestras do que tentava
comunicar. Creio que isto pode interessar como resumo das “megatendências” que estamos a
sofrer nestes anos e que ajudará a compreender os mecanismos da modernidade, os seus
objectivos, as suas tendências e os seus organismos.

* * *

Quando me perguntaram sobre que tema poderia falar, propus imediatamente o


transumanismo. E isto por um motivo: tenho-o fresco por ter dado várias palestras relacionadas
com o cinema. O meu pai já me tinha avisado: “Nunca fales daquilo que não conheces bem”.
Filmes como os clássicos 2001 Odisseia no Espaço, Blade Runner ou os mais recentes Alita: Anjo
de Combate, Ghost in the Shell e, sobretudo, Transcendence com Johnny Deep, etc., abordam
precisamente a temática transumanista.

Mas depois pensei que algumas dessas conferências já estão nas redes sociais, portanto o
essencial do tema era matéria conhecida, pelo que decidi que seria bom reorientar a questão.

Olhem: sempre me preocupei em compreender o meu tempo, a natureza da época em que


estava a viver. E isto, agora que tenho 69 anos, sempre exigiu uma certa necessidade de observar
os principais movimentos da realidade. Esta é mutável: por exemplo, quando alguns dizem “a
maçonaria MOVE o mundo”…, mais valia dizer “a maçonaria MOVIA o mundo”; foi o artífice de
todas as revoluções liberais, mas estas estão já muito longe. Hoje, a maçonaria continua a ter
um pouco de força porque onde houve muito, fica sempre algo, mas é uma organização residual
e arcaica.

Outros dizem “o marxismo cultural domina o cenário na Europa”. Erro. Isso aconteceu noutro
tempo. O que hoje se chama “marxismo cultural” só tem de marxismo o seu aspecto materialista
(que, certamente, é comum a qualquer outra tendência da modernidade). Não acontecia assim
nos anos 60 e especialmente nos 70. Nos anos 80, o marxismo, como ideologia, e o bolchevismo
como a sua prática, passaram para o balde do lixo da história.

Hoje não podemos examinar a realidade com a lógica da guerra fria (como faz a OTAN), nem
sequer com a situação criada após a queda do Muro de Berlin, nem ainda com a perspectiva do
11-S de 2001, nem sequer com a da crise económica de 2007-2011.

Precisamente, quando a crise abrandou, apareceu o quadro em que nos movemos hoje e que é
dominado por três elementos:

- as teorias sobre a Quarta Revolução Industrial [a partir de agora 4RI] lançadas em 2015 por
Klaus Schwab, presidente do Fórum Económico Mundial;

- só que essas ideias não eram suas, mas tinham surgido em meios marginais, no que se chamou
transumanismo. Schwab adaptou-as e tornou-as apresentáveis;

- mas as ideias sobre a 4RI não podiam ser aplicadas pelo Fórum Económico Mundial e, portanto,
foram assumidas pela ONU para serem directrizes de aplicação obrigatória para todos os
governos naquilo que se chamou Agenda 2030.
E aqui, estamos perante um círculo fechado: ideologia da revolução industrial –
transumanismo – Agenda 2030. Se compreendermos o que são estes três conceitos,
compreenderemos por onde circula a modernidade.

E só compreendendo-a é que estaremos em condições de reagir a ela.

Porque este conjunto de ideias marca uma linha divisória: ou se está a favor ou se está contra.
Existem, sem dúvida, como iremos ver, algumas linhas cinzentas, mas o radicalismo deste
conjunto de ideias é tal que se situa por cima de direitas e esquerdas, até ao ponto de aqueles
que estão contra, como nós, devermos considerar que este núcleo duro da modernidade é o
INIMIGO PRINCIPAL E QUE QUALQUER UM QUE NÃO PARTILHE DESTAS TEMÁTICAS É, EM
PRINCÍPIO, MEU “COMPANHEIRO DE VIAGEM”.

Portanto, esta palestra não é só teórica ou expositiva. Conduz necessariamente a tomadas de


posição políticas e procura clarificar tais posições.

Vamos passar revista às três grandes correntes da pós-modernidade para vermos que estão
unidas.

1 - O TRANSUMANISMO, PREVENDO O FUTURO A PARTIR DA FICÇÃO


CIENTÍFICA
Como estava a dizer anteriormente, o meu interesse pelo transumanismo teve a sua origem a
partir do cinema de ficção científica. Filmes como Blade Runner, 2001 Odisseia no Espaço, Ghost
in the Shell, Transcendence, O Passageiro do Futuro, etc., tinham implícita uma mensagem que
é incompreensível se não se tiver em conta este movimento cultural e as suas origens. Matrix,
num certo sentido, está na mesma direcção.

Portanto, um belo dia, através da crítica cinematográfica, deparei-me com o “transumanismo”.


Antes, tinha colaborado com revistas que se interessavam pelas “ciências de vanguarda”. Julgo
ter sido o primeiro que publicou alguma coisa, em Espanha, sobre nanotecnologia e
criogenização de cadáveres e inclusivamente entrevistei os representantes da Alcor em Madrid,
uma empresa dedicada a esta actividade. Depressa me dei conta de que estas “ciências de
vanguarda” e aqueles filmes estranhos e cativantes iam numa direcção convergente. Mas
ainda não era o fim do milénio quando o termo “transumanismo” começou a aparecer entre as
vanguardas culturais.

Hoje é uma “nova religião”, uma espécie de religião inversa que não olha para o céu para
tentar ver um deus, mas para viajar para outros planetas, que só se ajoelha diante das
consecuções da ciência que sempre lhe parecem poucas, que rende culto à inovação e que,
em suma, tem ódio e desconfiança ao humano.

Esta nova religião tem os seus “São João Baptista”, os precursores: os irmãos Huxley, o que
fundou a UNESCO e o que escreveu Admirável Mundo Novo, Julien e Aldous.

Tem o seu “velho testamento”, composto:

- pelos escritos de Francis Galton e dos darwinistas do séc. XIX que idearam a “eugenesia”
inglesa;
- pelo romance gótico estilo May Shelley e o seu Frankenstein ou O Prometeu Moderno,

- por Stoker e o seu Drácula que anseia a imortalidade através do sangue,

- pelos discípulos russos do filósofo Nikolai Fiodorov, fundador do cosmismo,

- por Jekyll e Hyde de Stevenson, que se baseia na procura de uma droga que melhore as
capacidades humanas,

- pelo “evolucionismo cristão” do padre Teilhard de Chardin;

- pela ficção científica dos anos 50-60.

Tem os seus apóstolos:

- Hans Movarec, investigador em robótica e IA. Futurólogo H+. O “paradoxo de Movarec”


salienta a contradição entre o fácil que é transferir a razão para a computação e o difícil que é
imitar as capacidades sensoriais do ser humano. Defende que os robots evoluirão na década
de 2030-40 para novas formas. É o teórico da ligação cérebro-computador e do descarregar
do cérebro na “nuvem”.

- Marvin Minsky, pai da Inteligência Artificial. De origem judaica. Em 1951 criou o primeiro
simulador de redes neuronais artificiais. Foi consultor do 2001: Odisseia no Espaço e do
Jurassic Park. Os seus escritos, que podem ser lidos no seu site na Internet, anteciparam alguns
aspectos do H+. Aborda muitos dos temas que depois foram desenvolvidos pelo resto dos
doutrinários H+. A sua obsessão era substituir o cérebro humano pela IA que viria a ser muito
mais eficiente e assim salvaria da morte.

- FM-2030, Fereidoun M. Esfandiary, persa, futurólogo, foi o primeiro popularizador do H+, filho
de um diplomata iraniano, mudou de nome, em 1970, para FM-2030, para celebrar o seu 100º
aniversário nessa data. E para se libertar das convenções. Morreu em 2000. Vegetariano. A sua
melhor frase: “Tenho nostalgia do futuro”. Está conservado criogenicamente na Alcor. Morreu
de cancro aos 69 anos. Foi o primeiro grande missionário do H+.

- Raymon Kurzweil, judeu nova-iorquino como Minsky, director de engenharia da Google.


Especialista em IA. Em 1999 escreveu “A Era das Máquinas Espirituais” em que a última parte
é de previsões até 2099. Definiu a “singularidade” e o processo de aceleração e mudança
tecnológica. Vegano, toma 250 comprimidos de suplementos vitamínicos por dia. E também
vinho tinto para evitar a oxidação. Acredita que a morte é uma doença e que a vida eterna é o
objectivo do ser humano.

- Max More, filósofo e futurólogo especialista em impacto das tecnologias emergentes.


Fundador do Instituto de Extropia (O que é a extropia? O contrário de entropia. O conceito não
existe na física). Depois de dissolver esta entidade, assumiu a presidência da ALCOR Life
Extension Fundation que criogeniza corpos para os reviver quando for encontrado o remédio
para as suas doenças.

- Nick Bostrom, prémio de filosofia da Escola de Economia de Londres, transumanista, mas que
alerta acerca dos riscos. Digamos que sabe para onde se orienta a tecnologia, estima-a, admira-
a..., mas também a teme, especialmente no campo da inteligência artificial. Fundou, em 2005,
o Instituto para o Futuro da Humanidade. Em 2015 assinou com Stephen Hawking, Elon Musk
e outros, uma carta avisando dos potenciais perigos da IA. Mas foi um dos fundadores da
HUMANITY PLUS, anteriormente “Associação Transumanista Mundial” que fundou com Pierce
em 1998. A sua corrente poderia ser definida como “transumanista moderada”, uma espécie
de ponte entre o movimento H+ e outros ambientes interessados nas novas tecnologias (Klaus
Schwab e o Fórum Económico Mundial).

- David Pierce, filósofo britânico, típico H+. Autor de O Imperativo Hedonista que não está
traduzido. Pertence à tendência “hedonista” do H+: procura a “abolição do sofrimento”, a que
chama “projecto abolicionista” e que é o único “imperativo moral” defensável. Esta abolição
será realizada por meio de drogas e tecnologias de auto-estimulação cranial. É vegano. E
desenvolveu a teoria de que o meio ambiente se deteriora por culpa dos carnívoros.

- José Luis Cordeiro, venezuelano, engenheiro, economista e H+, filho de espanhóis. É um dos
defensores da ideia de que a tecnologia empurra em direcção a uma era “pós-humana”. Afirma
que a morte será “opcional” em 2045.

Tem o seu “novo testamento”: livros escritos por todos estes pensadores e o seu Credo é “A
Declaração Transumanista”, publicada em 2002 e que consta de sete pontos.

Tem os seus dogmas e os seus ritos:

1) A evolução não acabou. A diferença é que antes a evolução dependia de mutações e agora o
ser humano pode tomar a iniciativa e acelerar essa evolução.

2) A biologia condena-nos à morte. A morte tem sido até agora o grande obstáculo ao
progresso. Portanto, é preciso encontrar substitutos para a biologia. Esses substitutos serão
recursos de natureza tecnológica que iniciarão a rota para a derradeira etapa na escala da
evolução.

3) O próximo degrau da evolução é melhorar as capacidades humanas em três âmbitos:


longevidade, inteligência e bem-estar, para alcançar “superinteligência”, “superforça” e
“superbem-estar”.

4) Estas três “melhorias” poderão ser alcançadas por meio do desenvolvimento de novas
tecnologias, especialmente no campo da genética, da Inteligência Artificial, da
nanotecnologia, da robótica, da criogenia, da impressão em 3D.

5) Actualmente já se está a trabalhar em todos estes campos para criara um Ser Humano 2.0,
que não é mais do que um desenvolvimento e um prolongamento das ideias do eugenismo
inglês do séc. XIX, apoiado pelas novas tecnologias.

6) Dentro de pouco tempo será muito difícil distinguir entre “humanos” e “transumanos” à
medida que se forem integrando próteses artificias, tratamentos genéticos, órgãos
impressos em 3D, por um lado, e, pelo outro, e as máquinas que, graças à IA, forem
alcançando – ou até superando – o nível de processamento do cérebro humano.

7) As capacidades do cérebro poderão ser descarregadas na “nuvem” e “recarregadas” em


andróides situados longe para efectuar determinadas gestões, ou então, quando o corpo
biológico for já irreparável, para o substituir por um andróide.

8) O ciborgue, mistura de humano e máquina, será um estádio intermédio entre a “etapa


biológica” da evolução e a “etapa pós-biológica”.
9) O derradeiro fim da evolução, o seu ponto Omega, a “pós-humanidade”, será quando toda a
humanidade tiver deixado para trás a sua “fase biológica” e todos os seus conhecimentos
tiverem sido descarregados na “nuvem” criando uma espécie de “consciência universal”. O
primeiro passo para chegar à “pós-humanidade” é a ligação cérebro-máquina. O segundo é
a “nuvem” transformada em local de residência de cada “consciência” originalmente
individual. O terceiro, a fusão de todas as “consciências individuais" numa “consciência
universal”. O custo de sermos “super-humanos” é, pois, deixarmos de ser humanos. O custo
do progressismo consiste em deixar de “acreditar em Deus”, para “brincar a ser Deus”, isto é,
“passar do Homo Sapiens” para o “Homo Deus”.

As associações internacionais H+ contam com abundante financiamento que excede em muito


as possibilidades dos seus membros. Não é estranho: são apoiadas pela Fundação Rockefeller,
pela Fundação Carnagie e pela Fundación Musk, entre outras.

2 - A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL DE KLAUS SCHWAB


Em 2015, Klaus Schwab publicou um artigo na Foreign Policy no qual aludia à “quarta revolução
industrial”. O artigo, apesar de ter sido escrito pelo presidente do Fórum Económico Mundial,
mal teve repercussão e passou quase despercebido. Schwab voltou à carga no ano seguinte,
publicando um livro com esse nome. A partir desse momento, foi como se essa ideia fosse
adoptada pelo mundo inteiro e inclusive as Nações Unidas fizeram eco das suas propostas. Daí,
e de programas anteriores da ONU (os “Objectivos do Milénio”, os programas para reduzir a
população mundial, a ideia do “aquecimento global”), nasceu a “Agenda 2030”.

A ideia apresentada por Schwab não era fútil de todo. Aludia às três revoluções industriais que
se sucederam desde 1784. A revolução do vapor que deu origem às primeiras sociedades
industriais), a segunda revolução, iniciada em 1870, em que são integradas linhas de produção
movidas a electricidade e motores de explosão. A terceira revolução industrial iniciar-se-ia em
1969 com a automatização, a computação e o aparecimento dos primeiros chips.

A cada uma destas “revoluções” correspondiam determinadas formas de organização da


sociedade:

- com a primeira chegou a hegemonia da burguesia, consolidou-se o liberalismo e apareceram


as nações propriamente ditas;

- com a segunda veio o sindicalismo, a produção em linha, a democracia, a organização do


trabalho e apareceram as formas tecnocráticas;

- com a terceira foi possível impulsionar as sociedade multinacionais, generalizaram-se novos


meios de comunicação, começou o “ocaso das ideologias”, o sindicalismo perdeu o pulso e
formaram-se grandes corporações industriais.

Por esta razão, Schwab prevê a chegada de uma “quarta revolução industrial” baseada no que
chama “tecnologias convergentes”, basicamente, engenharia genética, inteligência artificial e
nanotecnologia. Estas técnicas nasceram isoladas umas das outras, mas a sua própria dinâmica
interna tende a fazê-las convergir num todo que implicará uma revolução até agora inédita.

Esta revolução será caracterizada por algumas ideias-força centrais que tentaremos resumir:
1) A quarta revolução industrial é um desenvolvimento da terceira, com a diferença de que,
enquanto esta demorou 40 anos a chegar ao mundo inteiro, a actual é de aplicação
imediata. Ao mesmo tempo, ao passo que a terceira dizia respeito especialmente ao
desenvolvimento dos microchips, da electrónica e das tecnologias de informação, a actual
tem uma incidência muito superior, afectando praticamente todas as ordens da vida
humana. Schwab lembra que o iPhone foi lançado em 2007, mas em 2015 já havia 2.000
milhões no mundo inteiro.

2) A percepção de que as novas tecnologias gerarão mudanças nos modelos de vida, de


produção e de desfrute de bens e serviços. Schwab, no seu livro, passa revista a todas estas
tecnologias que, basicamente, são as mesmas que o H+ teve em consideração, mas podadas
das suas considerações mais extremas acerca da imortalidade biológica e centradas no seu
campo: as novas possibilidades de negócio e como realizá-lo.

3) Schwab chega a conclusões parecidas às dos H+ quando alude às “tecnologias


convergentes”, que nasceram de modo independente, mas que inevitavelmente acabarão
por confluir: biotecnologias – inteligência artificial – nanotecnologia. Esta convergência
fará inclusivamente com que devamos reconsiderar o que é o ser humano e os seus limites.

4) Ao contrário do H+, Schwab utiliza uma “narrativa amistosa”: em vez de “cyborgs” ou do


fim da evolução biológica, opta por aludir à “fusão de sistemas biológicos, físicos e digitais”,
“necessária para o progresso da humanidade”, fusão graças à qual “todos estaremos
melhor e juntos construiremos um mundo melhor”, “ecologicamente sustentável”... Ao
contrário dos H+ que não se preocupam em refutar aqueles que os criticam, Schwab fá-lo,
sim: no seu livro, a última parte é dedicada a apresentar os “aspectos negativos da
revolução tecnológica” que refuta…, mas somente aqueles que ele escolheu, de maneira
determinante os mais evidentes: a irrupção destas novas tecnologias gerará centenas de
milhões de desempregados em dois ou três anos – quando os carros autónomos
funcionarem no mundo inteiro, 300.000.000 taxistas irão para o desemprego. Milhões de
postos de trabalho mecânico e de baixa formação serão substituídos por robots. E não
haverá nenhuma possibilidade de serem laboralmente reciclados porque os empregos
criados serão poucos e exigirão muita formação técnica e especialização.

5) Schwab define “megatendências”. Três em concreto: físicas, digitais e biológicas. As


primeiras serão caracterizadas pela robótica avançada, os veículos autónomos, a impressão
em 3D e os “novos materiais” a partir do grafeno (200 vezes mais forte que o aço, 1.000
vezes mais fino que um cabelo). As digitais girarão em torno da “internet das coisas, do
blockchain, das aplicações móveis e da inteligência artificial. E, finalmente, menciona, por
entre as biológicas, a engenharia genética e os medicamentos personalizados. Tudo isto
fará com que exista uma economia, uma medicina, uns serviços “a pedido”. Para isso, será
necessário que a tecnologia que nos rodeia não seja algo exterior a nós, mas que faça parte
de nós.

6) Para poder gerir o mundo tecnológico da quarta revolução industrial será necessário que
as corporações proprietárias das novas tecnologias trabalhem com os governos e com as
instituições mundiais para as implementar. Isto, na prática, implica ir um passo mais além
do velho sonho liberal, “mais mercado e menos estado”, é, para dizer a verdade, a
subordinação da política àqueles que controlam as novas tecnologias.

7) Um aspecto muito difundido desta revolução será a “economia colaborativa” (“não temos
nada, mas podemos aceder a tudo”). Umas poucas centrais mundiais de comércio
monopolizarão a venda de bens através de uma logística sofisticada com carros autónomos
e drones. A partir de 2024-25 iremos ver como os robots começam a substituir os empregos
convencionais. Os ofícios da construção desaparecerão em enorme medida, substituídos
pela impressão em 3D de coisas cujo preço embaratecerá. Mudará a dinâmica produtiva:
não estaremos num momento de mudança, mas teremos entrado numa época de mudança
permanente. A universidade deverá adaptar-se a estas mudanças (o estudante receberá
um ensino tecnológico nos primeiros anos de curso que já será obsoleto quando se formar).

8) O modelo industrial mudará radicalmente: a IA fará com que sejam possíveis “fábricas
inteligentes” que elaborem encomendas “a pedido”. Não haverá nem operários, nem
sindicatos, nem staff directivo: a IA não somente controlará o trabalho dos robots, como
tomará decisões imediatas. Noutras áreas, no investimento, por exemplo, os corretores
desaparecerão – estão a desaparecer – sendo o mesmo trabalho feito por um
bot (programa que realiza tarefas repetitivas optimizando riscos) graças à “big data” e ao
cálculo estatístico de probabilidades.

9) Existirão réplicas do mundo físico às quais se acederá por meio de software e hardware
específico. A “realidade natural” foi o património das duas primeiras revoluções industriais.
Durante a terceira, apareceu a “realidade artificial”, em 1980, que se foi desenvolvendo,
especialmente, através da indústria dos videojogos. Apareceram simuladores de realidade
virtual, os avatares (o FB e o VR cria o teu avatar a partir das fotos que tens armazenadas),
a projecção de imagens reais, a “realidade mista” (que se baseia na projecção holográfica,
ecrãs CSI estão a ser trabalhados pela Microsoft Mesh), a “realidade aumentada” (ou
Metaverso) que implica a imersão total num mundo paralelo electrónico e que é
apresentado como a “evolução natural de Internet”: da escrita passou-se para as fotos e
vídeos e agora chega o metaverso.

10) Schwab percebe claramente que existe um problema de capitalização entre as empresas
da segunda e terceira revolução industrial e as da quarta e oferece estes dados: em 1990
as três maiores empresas de Detroit tinham uma capitalização de mercado combinada de
36.000 milhões, rendimentos de 250.000 milhões e 1,2 milhões de empregados. No
entanto, as três maiores empresas de Silicon Valley em 2014 tinham 1,09 biliões de
capitalização, geravam os mesmos rendimentos, mas com apenas 137.000 empregados.

11) Assim como uma empresa tradicional precisa de um grande capital, uma empresa
tecnológica não precisa de depender exclusivamente de grandes investimentos, nem
sequer precisa deles. Depois há outro elemento: a maior empresa de táxis (UBER) não tem
um único táxi, a maior empresa de hospedagem (AirBNB) não é proprietária de um único
imóvel, a maior empresa de conteúdos (FB) não proporciona uma única notícia... o
WhatsApp mal precisou de capital para ser criado. O valor acrescentado de todas estas
empresas é gigantesco. São “empresas disruptivas”: adoptam novos modelos de negócio,
rompendo a oferta tradicional.

12) A aplicação de todas estas tecnologias corre o risco de “gerar desigualdade”, de “gerar
populismos incontroláveis”, de “gerar distúrbios sociais” e “reacções neoluditas”. Schwab
teme os retrocessos porque poriam em perigo o fim último do seu programa, o domínio
dos consórcios sobre os Estados. Portanto, trata-se de acalmar a população e demonstrar
que as vantagens das novas tecnologias e do mundo para o qual nos encaminhamos são
superiores às disfunções que pudessem aparecer.

13) Um relatório do FEM prevê que “ao ritmo actual do progresso, serão precisos mais 118
anos para alcançar a paridade económica de género no mundo inteiro”. Este número
remoto contrasta com o problema imediato: os postos de trabalho que se perderão serão,
por um lado, os que requerem baixos níveis de preparação profissional e, por outro, aqueles
que foram tradicionalmente ocupados por mulheres. Daí o seu interesse em tranquilizar
estes grupos sociais.

14) A “saúde do planeta” exige que as novas empresas sejam “respeitosas para com o meio
ambiente”. Isso só se poderá conseguir, diz-nos ele, com a “economia circular” baseada na
“reciclagem”, em contraposição com a “economia linear” que não tinha em conta o meio
ambiente. Baseia-se no “aproveitamento de recursos” e na “redução de matérias-primas”
para reduzir a “geração de resíduos”, “melhorar a eficiência no uso da água” e “diminuir a
emissão de gases com efeito de estufa”. Faz aqui alusão à “internet das coisas” e ao
“blockchain” que poderia tornar mais transparente, segura e fiável a informação económica
e os dados dos Estados. Neste ponto, o livro já se torna abracadabrante: as medidas
“estrela” são “consumir menos electricidade”, “o consumo colaborativo” e soluções pouco
sólidas.

15) Os governos serão os que deverão realizar maior esforço para se adaptarem a todas estas
mudanças. E diz: “Trata-se de algo particularmente importante dado que acontece num
momento em que os governos devem ser parceiros essenciais na configuração da transição
para novos quadros científicos, tecnológicos, económicos e sociais”. E avisa: “Muitos dos
avanços tecnológicos que actualmente vemos não são correctamente tidos em conta no
quadro actual regulador e poderiam causar uma ruptura do contrato social que os governos
estabeleceram com os cidadãos”.

São páginas antológicas que é preciso ler nas entrelinhas, mas que vão numa só direcção:
a democracia formal deve prosseguir como forma de manter o cidadão tranquilo; mas o
essencial é a convergência entre as corporações e os Estado: “os governos, em
colaboração com a sociedade civil e as empresas, precisam de criar as regras, os controlos
e os equilíbrios necessário para manter a justiça, a competitividade, a equidade e inclusive
a propriedade intelectual, a segurança e a fiabilidade”. Nas linhas para um “governo ágil”
estão as políticas de inclusão.

16) Não esconde que, em princípio, o grande problema da aplicação destas novas tecnologias
será a “desigualdade” e certifica o fim da classe média. Faz alusão a que a técnica gera
duas sensações: a de “empoderamento” do cidadão que faz e chega a coisas a que antes
não podia chegar nem fazer e o “desempoderamento” porque sente que o seu voto e a sua
participação política, as eleições, as instituições, não servem para nada.

17) Esta revolução industrial afectará a maneira de nos comunicarmos, de nos inter-
relacionarmos e também gerará o problema da gestão da informação pública e privada.
Mas, conclui, o “nosso bem-estar melhorará, em vez de ficar prejudicado”.

Até aqui, os conteúdos mais interessantes. A partir do capítulo 4 o livro de Schwab transforma-
se em mero recheio, com algumas interpolações da psicologia transpessoal (Maslov). Quanto ao
anexo, é um conjunto de argumentos a favor das mudanças que se aproximam, acompanhado
por alguns “aspectos negativos” (obviamente, não estão lá todos, nem sequer os mais
estridentes) e por percentagens muito discutíveis sobre a sua origem e a sua realidade. Não há
refutações aos aspectos negativos. É, preferencialmente, um catálogo das vantagens que as
novas tecnologias trarão, sem atender aos seus aspectos negativos.

A introdução da edição espanhola foi escrita por Ana Botín e o capítulo de agradecimentos
ocupa duas páginas. Mas um destes agradecimentos chama a atenção mais do que todos os
outros: “Também agradeço à notável série de líderes na área do pensamento que tão
generosamente contribuíram com o seu tempo e com os seus conhecimentos para este assunto
durante a Cimeira sobre a Agenda Global 2015 realizada em Abu Dhabi”. Porque, com efeito, as
teses que Schwab apresenta são paralelas às exibidas na Agenda 2015. De tal maneira que
pode dizer-se que são filhas da mesma mãe.

3 - A AGENDA 2030 DAS NAÇÕES UNIDAS


Vale a pena fazer uma distinção entre o que as pessoas julgam que as Nações Unidas ou a UNICEF
são e o que na realidade são:

- É habitual pensar que se trata de “fóruns” em que todas as nações estão representadas nas
“assembleias gerais”.

- Mas, na realidade, são organizações vertebradas pelos seus próprios funcionários que, no
seu dia-a-dia, costumam agir com independência das decisões das suas “assembleias gerais”.

E estes “funcionários” têm visões próprias e pontos de vista próprios de seitas pseudo-
religiosas. De facto, vários dos seus fundadores foram membros de seitas teosóficas. Robert
Muller, por exemplo, trabalhou desde 1945 até 1985 na entidade e foi secretário-geral da ONU
durante os mandatos de U’Thant, Waldheim e Pérez de Cuellar. É conhecido como o “filósofo
da ONU”, mas era, na realidade, quem organizava a “agenda”. Aspirou, em 1996, ao cargo de
secretário e foi nomeado várias vezes para o Prémio Nobel da Paz. Era membro do “Lucis Trust”
e da “Boa Vontade Mundial”, organizações criadas por uma teósofa, Alice Ann Bailey. Não é um
caso único. Escreveu um “livro de sonhos para o milénio”, com 7.000 sonhos, no qual se inspirou
a Agenda 2030, e anteriormente, “os objectivos do milénio”.

Quando as Nações Unidas foram fundadas, em 1945, foram ali parar funcionários de
ambientes para-maçónicos minoritários, grupos ocultistas, todos eles movidos pela ideia de
que a criação dessa entidade tinha inaugurado a “nova era da luz”. A organização filial, a
UNESCO, foi por sua vez criada por Julien Huxley, inventor do termo H+ e cujo irmão Aldous
escreveu ‘Admirável Mundo Novo’ no qual descrevia de maneira ambígua esse ideal. Primeiro
com Sean McBride (que favoreceu particularmente ONG’s e, especialmente, a Amnistia
Internacional da qual tinha sido presidente) e depois com Abou Mathar M’Bow (que reduziu as
actividades da entidade à luta contra o “racismo” e às reivindicações do “sul” que pagavam pelo
“norte”). Vários países – primeiro os EUA e depois o Reino Unido, o Japão e outros –
suspenderam a sua afiliação à UNESCO devido a essas orientações. No entanto, a ONU teve uma
experiência mais tranquila e isto permitiu que fosse a sua casta administrativa a “preparar” as
sessões, os estudos e as iniciativas levadas à Assembleia Geral por parte da Secretaria.

É assim que chegamos à Agenda 2030.

Primeiro explicarei um pouco da sua origem e depois passarei a descrever as suas linhas mestras.

Em meados de Novembro de 2015 e quando Schwab já tinha lançado o seu livro sobre A Quarta
Revolução Industrial, enquanto o terrorismo islamista se abatia sobre Paris, os “líderes” do G20
– que reúne as economias mais poderosas do mundo – assinaram na Turquia a agenda intitulada
“Transformando o nosso mundo: Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”. Hoje
vivemos a ressaca desse acordo. A “folha de rota”, avalizada pela ONU, consta de 17 objectivos
“para o desenvolvimento sustentável”, 169 metas, assim como uma enumeração de meios para
os implementar. Isto foi decidido em 2017 e incluía concreções para cada um dos 17 objectivos.
Este programa também é conhecido pelo nome de “Objectivos de Desenvolvimento
Sustentável” que deveriam ser alcançados antes de 2030.

Tendo sido aprovado na “Assembleia Geral da ONU”, o seu conteúdo foi transferido para
todos os Estados membros, que ficaram com o compromisso da sua execução. São a
continuação dos “Objectivos de Desenvolvimento do Milénio”, metas que a ONU fixou no ano
2000 e que caducaram em 2015. O ano decisivo.

É preciso reconhecer que o rumo iniciado no último quarto do séc. XX prefigurava já esses
objectivos: por exemplo, antes de terminar o milénio, o VIH já tinha passado a ser uma doença
crónica e a mortalidade infantil reduzia-se em África, as principais consecuções daquela
campanha. Mas o resto dos objectivos ficaram praticamente por cobrir.

A redução da fome também não foi um resultado daquela campanha, mas de novas vagas da
“revolução verde” e outro tanto se pode dizer do “melhorar a saúde materna”. A pobreza
extrema, não só não foi erradicada, como tende a aumentar inclusive em zonas desenvolvidas.
E quanto a “conseguir o ensino primário universal”, o mesmo acontece: o número de
analfabetos estruturais cresce nos países ocidentais. Insistiu-se, naquela campanha, na
“igualdade dos sexos e no empoderamento da mulher”.

A retórica usada não serviu de muito. Portanto, a partir de 2015, puseram-se em acção os novos
objectivos “globais”, que foram popularizados com o nome de Agenda 2030. Um dos fracassos
dos “objectivos do milénio” foi o desinteresse inicial demonstrado pelas grandes corporações e
pelo mundo do dinheiro. Mas em 2007-2011 deu-se o cataclismo económico mundial e então
as dinastias económicas, “o dinheiro velho”, os fundos de investimento e o “dinheiro novo”
procedente das empresas tecnológicas começaram a preocupar-se.

Nunca se tinham interessado pelo funcionamento da ONU, nem da UNESCO, mas, a partir de
então viram que, se queriam impor “agendas” em todos os Estados para evitar o que mais os
assustava – regressões e marchas-atrás no processo de globalização, aparecimento de
populismos que acompanharam as crises económicas – deviam “aliar-se” à classe
administrativa destes organismos internacionais, garantir a sua sobrevivência económica, a
troco de assumirem alguns dos objectivos debatidos no Fórum de Davos (o Fórum Económico
Mundial, que se reúne desde 1971), uma das organizações que reunia representantes das
dinastias económicas e das corporações multinacionais mais potentes. A princípio, era um fórum
de discussão e informação sobre aquilo a que hoje se chama “megatendências”, mas depressa
descobriram que tinham “poder”. De facto, o que procuravam era um velho objectivo do
neoliberalismo que adscreviam: situar-se acima da política dos Estados, evitar que estes
interferissem no mundo da economia e, portanto, colocar os interesses económicos dos
poderosos acima dos interesses políticos dos Estados e dos cidadãos.

Para isso precisavam do prestígio dos “organismos internacionais”, para os quais transferiram
as suas propostas para que a adaptassem e as oferecessem como “de cumprimento obrigatório”
aos Estados membros.

Não é, portanto, de estranhar que a linguagem usada na Agenda 2030 e no livro A Quarta
Revolução Industrial, seja a mesma. Comparem vocês mesmos:

Encontrarão as mesmas “palavras fetiche”:

a) “Objectivos globais”
b) “Desenvolvimento sustentável” (o termo apareceu na Declaração do Rio de 1992, organizada
pela ONU, sobre o Meio Ambiente e o desenvolvimento).

c) “Alterações climáticas antropogénicas” (que substituiu a ideia de “aquecimento global”).

d) “Perspectiva de género” (que, na Agenda 2030, aparece nos sítios mais insuspeitos).

e) “Diversidade”.

f) “Inclusão” (diferente de “integração”: inclusão implica “fusão” e que o “todo” o considere


absolutamente normal.

g) “Empoderamento”, (acesso ao controlo dos recursos materiais que permitem alcançar os


objectivos de um grupo concreto).

h) “Resiliência” (qualidade dos grupos que se adaptam a situações adversas).

i) “Governação” (definido como “forma de governo baseada na inter-relação do Estado, da


sociedade civil e do mercado para conseguir um desenvolvimento económico, social e
institucional estável”.

Os “17 Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável” diferem dos “objectivos do


milénio”: insiste-se nas “alterações climáticas”, na “reciclagem” e no “consumo responsável”,
na substituição das “agendas nacionais” por uma “agenda global” (na medida em que os
problemas afectam toda a humanidade), a temática “ecologista” está constantemente presente
nas propostas para a “energia não contaminante”; “renovável”, “limpa” e “não contaminante”.

Embora seja certo que alguns dos problemas assinalados são autênticos, o que surpreende são
as “soluções” propostas. O interesse pela ecologia, por exemplo, está presente no “Objetivo 11”
que aspira a conseguir “cidades sustentáveis, inclusivas, seguras e resilientes”. Como? Mediante
meios de transporte não contaminantes, bicicleta e trotinete.

Noutros pontos, o surpreendente é a pirueta com que ligam entre si problemas que não têm
nada a ver. O “Ponto 13” propõe a “luta contra o aquecimento global” e, como se não tivesse
ficado claro, o “Ponto 15” propõe a “protecção do meio ambiente”…, que também é ligado à
Covid: “todas as doenças infecciosas novas em humanos (…) estão estreitamente relacionadas
com a saúde dos ecossistemas”…

Também está presente um elemento novo: “trabalho decente” (“Ponto 8”) que se enuncia
assim: “Um crescimento económico inclusivo e sustentado pode impulsionar o progresso, criar
empregos decentes para todos e melhorar os padrões de vida”. Diz-nos que, “com a Covid”,
“metade de todos os trabalhadores a nível mundial encontra-se em risco de perder os seus meios
de subsistência”. Na realidade, isto está correcto, mas não por culpa da covid e sim por causa
da robotização!

Continua a estar presente o tema da “educação de qualidade” e da “fome zero”, que “resolvem”
com a irrupção brusca do “veganismo”, que se complementa com m “Objectivo 6” sobre a
“água sustentável” e a “temática feminista” no “Objectivo 5” (“Conseguir a igualdade entre os
géneros e empoderar todas as mulheres e meninas”).

Dado que todo o programa parece destinado muito mais ao Terceiro Mundo do que ao
Ocidente, o “Objectivo 17” pede explicitamente um esforço na “ajuda ao desenvolvimento”:
“Revitalizar a Aliança Mundial para o Desenvolvimento Sustentável” ao qual só se pode chegar,
dizem-nos eles, “com instituições sólidas e cooperação”. Se não houver esta “ajuda”, amplas
zonas do planeta ficarão sem assistência.

O “Objectivo 16” é o que alude especificamente a “instituições sólidas”, subentendendo-se que


uma “agenda global” requere um “governo mundial” e que é para isso que existem as Nações
Unidas e as suas filiais!

Mas, sobretudo, o que surpreende é a presença contínua, nas ampliações e no site oficial da
ONU, da temática Covid. Em todos os pontos se destaca que a Covid pôs em risco os “avanços
conseguidos até agora”. É um dogma, nem sequer se dão ao incómodo de o explicar. Se se fala
de “inclusão”, logo se acrescenta que a Covid pôs este objectivo em perigo... Por quê...? Não se
anexa nenhuma explicação.

No “Objectivo 3”, “Garantir uma vida saudável e promover o bem-estar em todas as idades é
essencial para o desenvolvimento sustentável” e também não se explica essa relação entre vida
saudável e desenvolvimento sustentável. E, logo a seguir, promove-se a vacinação global.

Convido-os a ler este “programa” no site da ONU. Comprovarão como o organismo


internacional apresenta dados absolutamente questionáveis ou simplesmente falsos,
estabelece uma dogmática acerca da qual é impossível raciocinar e à margem das categorias
do pensamento lógico e amplia o “buenismo” até transformar o “ecologista” e as ideologias
de género na sua quintessência.

Este é o programa “progressista” transferido para todos os governos. Não se fala em lugar
nenhum dos eixos centrais que Schwab apresenta na sua obra: fala-se, sim, de tudo o resto,
inclui-se a mesma linguagem, os mesmos conceitos, as mesmas categorias, o mesmo ‘buenismo’
que é sempre apreciado por aqueles que acreditam nas bondades do “pensamento positivo”.

Schwab apresenta tudo em face das vantagens que as “novas tecnologias” podem acarretar,
mas quando o próprio programa provém da ONU, esta traduz uma grande parte dos objectivos
de Schwab, centra-se em assuntos de ecologia, meio-ambiente, reciclagem, alterações
climáticas, emissões de CO2, etc., etc. Não se alude à técnica porque o público a que é dirigido
são governos que, em enorme medida, estão instalados no Terceiro Mundo e para eles esta
temática está longe. Além disso, dado que são os governos que devem aplicar estas orientações,
está redigido de tal forma que possa transformar-se em medidas concretas. E há temas face aos
quais não há solução..., portanto, optam por não os mencionar. As novas tecnologias em
primeiro lugar.

As coincidências entre os objectivos do Fórum Económico Mundial e os da Agenda 2030 são:

1) Por um lado, a ideia de que, com a Covid, chegou o “grande reinício”, isto é, a possibilidade
de pôr um travão e reconsiderar dinâmicas económicas.

2) Por outro, a necessidade de anular a soberania dos governos e dos Estados nacionais,
presente já no projecto dos funcionários da ONU que aspira a ser um “governo mundial” e
no projecto dos neoliberais com a sua ladainha do “mais mercado, menos Estado”.

3) O vocabulário utilizado e as “palavras fetiche” são exactamente os mesmos.

4) A ideia de que a empresa privada deve convergir com o Estado para “salvar o planeta”,
“criar uma sociedade mais humanitária” e “administrar melhor a saúde”.
PARA ONDE VAMOS?

1) Encaminhamo-nos para uma sociedade tecnológica avançada, radicalmente diferente a


qualquer outra coisa que tenhamos podido ver na história e que vai implicar uma mudança
ainda mais radical do que qualquer outra revolução histórica.

2) Não vale a pena efectuar um debate sobre aspectos parciais ou em termos habituais até
agora: geopolítica, ideologias, liberalismo, etc. O centro da análise e do debate na
modernidade vai ser o papel da técnica nas mudanças que se estão a produzir.

3) Estes programas ideológicos mostram que neste momento só existem dois campos pelos
quais optar, que já não são nem os de direita ou de esquerda, nem patriotismo ou
internacionalismo, nem PP, nem PSOE: ou se está do lado do FEM e da Agenda 2030, ou se
está contra. Aquele que está contra é meu amigo ou, em todo o caso, meu “companheiro de
viagem”. Aquele que está a favor é meu “inimigo”.

4) Usando desculpas “humanitaristas”, o “pensamento Alice”, o “pensamento soft”, gera


desculpas para ocultar o rosto sinistro do futuro em que a humanidade estará dividida
entre uma pequena camada de “poderosos” e uma grande camada de “plebeus”.

As correlações de forças são:

 Os H+ efectuam análises tecnológicas exóticas e extremas.

 Estas análises são podadas das suas consequências extremas pelo FEM, que as transforma
em “apresentáveis”.

 O FEM passa os seus objectivos à ONU para que esta os traduza e os remeta aos Estados
membros e, ao mesmo tempo, elabore “políticas globais”.

Ora bem, cada um destes grupos tem por trás diferentes interesses:

 Os H+ são os “activistas”, conferências, palestras, debates, etc. Todos os seus membros


procedem da área das “novas tecnologias”.

 O FEM, o mundo do dinheiro, dos negócios, do espectáculo, da imprensa, da política,


partidários da globalização económica.

 As classes administrativas da ONU onde dominam os ideais gerados pela maçanaria do séc.
XIX (que já perdeu toda a força fora destas instâncias), o ocultismo teosófico, os partidários
da “nova era”, isto é, os círculos mundialistas.

Todos estes círculos têm pressa: o seu objectivo é o ano 2030. Mas querem alcançar antes os
seus objectivos; temem que uma crise económica global produza uma reviravolta populista no
eleitorado mundial. Por isso apertam o passo antes que os efeitos sociais gerados pelas novas
tecnologias possam ser percebidos.

As próximas medidas que vamos ver serão:


 Reformas constitucionais que coloquem em primeiro plano as propostas da Agenda 2030.
Exemplo: os primeiros artigos da constituição chilena [que foi amplamente rejeitada pelo
eleitorado].

 Cortes nas liberdades e maior pressão sobre os grupos da oposição. Exemplo: a repressão
contra os camionistas canadianos levada a cabo por Justin Trudeau.

 Estabelecimento de um salário social que evite tumultos sociais face ao aumento de


desemprego gerado pelas novas tecnologias.

 Cortes maiores na liberdade de expressão dentro das redes sociais.

 Aumento deliberado da inflação e da emissão de moeda-lixo para desvalorizar o


património das classes médias e aumentar o das elites económicas. Exemplo: durante a
pandemia foi posto em circulação 1 dólar por cada 2 dos que actualmente circulam no
mundo. As subidas das taxas de juro não são justificadas pelo “reaquecimento da economia”,
a causa da inflação é a subida dos preços do combustível e da electricidade, perante as quais
as políticas monetaristas não servem.

 Aumento da psicose acerca das alterações climáticas, uma série de desculpas para manter
a população entretida com debates absurdos (exemplo: “perspectivas de género”,
“inclusão”, etc.), difusão de fármacos e de drogas sedantes.

 Ataques contra a linha de flutuação do resto das estruturas tradicionais: família, natalidade,
Igreja, educação, coesão social, etc.

Quais são os pontos fracos desta perspectiva?

 A frente FEM-Agenda 2030 não é tão homogénea como parece. Assim como para o FEM a
temática ecológica é uma simples desculpa, para alguns círculos mundialistas é tema capital.

 No interior do FEM há duas tendências: o “dinheiro velho” (procedente das dinastias


económicas, da especulação financeira e das indústrias tradicionais) e o “dinheiro novo”
(as grandes acumulações de capital surgidas no calor das novas tecnologias). O “grande
reinício”, a Agenda 2030, são acordos provisórios entre ambas as tendências. Mas o tempo
e os níveis de capitalização jogam a favor do “dinheiro novo” que, mais cedo ou mais tarde,
entrará em polémica com o outro sector.

 Os niveles de inflação, endividamento e mal-estar social vão aumentar nos próximos dois
anos e podem explodir antes de ser instaurado em todo o planeta o “salário social”, o
metaverso e restantes anestésicos sociais, em especial entre 2024 e 2028. O “lado obscuro”
mostrou as suas cartas demasiado claramente. Tem pressa de atingir os seus objectivos antes
que se produza uma generalizada. A pressa é má companheira.

Sobre que bases pode ser estabelecida uma reacção?

1. Sobre a certeza de que eles são “poucos” e a sua oposição é muito maior do que parece.
Uma vez efectuada a distinção amigo-inimigo só falta pô-la em prática em cada país. As
estruturas tradicionais, embora debilitadas, continuam a existir, é preciso reforça-las:
família, sectores conservadores, confissões religiosas, classes médias.
2. As novas tecnologias permitem criar redes sociais próprias e recursos técnicos que
possibilitam fugir do controlo das empresas do “lado obscuro”: Facebook, Google,
Microsoft...

3. Restabelecimento de valores absolutos, sem os quais é impossível a existências de


sociedade estáveis. É preciso erradicar o “relativismo” gerado pelo “pensamento crítico” da
Escola de Frankfurt, uma das escoras da pós-modernidade.

4. Trata-se de rejeitar a “ciência sem consciência”, de aceitar as consecuções técnicas, mas


aceitar que também acarretam uma carga negativa que deve ser evitada.

5. Reconhecer que o mundo é demasiado diverso e desigual para poder ser gerido por um
“governo mundial”, um “big brother”, ou com as mesmas orientações: os problemas da
Europa e de África não se parecem em nada.

6. Construir relatos alternativos (sobre os aspectos mais significativos do nosso tempo e sobre
a sua direcção) e um meta-relato (que vai mais além, aprofunda as suas raízes na história,
nas nossas tradições e no nosso passado e que se projecta com força em direcção ao futuro
e integra os relatos previamente definidos).

7. Quando for preciso, sair à rua e demonstrar que “chegámos até aqui e dissemos basta”. E
isto implica força, decisão, energia e convicção de que estamos perto da “luta final” e que
isto é como aquela saga dos “imortais” dos anos 80: só um pode sobreviver. H+, Agenda
2030, FEM, são incompatíveis com a vida, com a pessoa, com o pensamento não
alienado (isto é, conscientes de sermos nós próprios).

Ernesto Milá
Apolítico (não indiferente, mas distanciado),
Anarca (à margem do pensamento massificado),
Conservador (consciente de que já não há quase nada que mereça ser conservado) e
Revolucionário (pela revolução da Ordem).

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