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ANÁLISE DO PENSAMENTO DE LÉLIA GONZALEZ:

uma reflexão sobre o racismo e sexismo brasileiro

*Carlos Eduardo da Luz Silva [1]


Débora Dias Guimarães [2]
Gabrielle Marrie Benedita Chaves [3]
Kassandra Aguiar Conceição [4]
Kayke Rhafaell Batista Vieira [5]
Klebson Henrique Gomes dos Santos [6]
Wagner de Morais Costa[7]
 
 
RESUMO

O objetivo deste presente artigo consiste em analisar o pensamento de Lélia Gonzalez de


forma interseccional, principalmente seus ensaios sobre racismo e sexismo no Brasil. O seu
questionamento envolvendo, tanto a raça, como o gênero e a classe traz vários ponderamentos
sobre a sociedade brasileira e a estrutura racista e sexista que possui como base o apoio do
capitalismo para sustentar esse arranjo, tendo um enfoque maior para a mulher negra como
membro desse país. Para embasar sua teoria, Lélia se utiliza do marxismo e da psicanálise, ao
mesmo tempo que conta com as ciências sociais e a história para que em conjunto sirvam um
material ainda mais rico sobre como esses preconceitos continuam se perpetuando nas
comunidades. Assim sendo, ao retomar o pensamento de Gonzalez, nota-se a necessidade e a
contemporaneidade desses estudos para a luta feminista e a luta antirracista, de uma intérprete
nacional que merece o reconhecimento que lhe é atribuído.
Palavras-chave: Lélia Gonzalez. Racismo. Sexismo. Capitalismo. Mulher negra.

___________________________________________
*[1] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: eduardosilvacx16@gmail.com
[2] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: deboradiasbts@gmail.com
[3] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: gabihnara@gmail.com
[4] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: kassandraaguiar2003@gmail.com
[5] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: rhafaellkayke@gmail.com
[6] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: klebsonhenrique03@gmail.com
[7] Graduando em História (Licenciatura) pela UEMA. E-mail: wagnermoraiscosta@hotmail.com
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ANALYSIS OF LÉLIA GONZALEZ’S THOUGHT: a reflection on brazilian racism

and sexism

ABSTRACT

The objective of this article is to analyze the thought of Lélia Gonzalez in an intersectional
way, especially his essays on racism and sexism in Brazil. His questioning involving both
race, gender and class brings various considerations about Brazilian society and the racist and
sexist structure that is based on the support of capitalism to support this arrangement, having a
greater focus on the black woman as a member of this country. To support her theory, Lélia
uses Marxism and psychoanalysis, while relying on the social sciences and history to serve
together an even richer material on how these prejudices continue to be perpetuated in
communities. Thus, when resuming Gonzalez’s thought, one notices the need and
contemporaneity of these studies for the feminist struggle and the anti-racist struggle, of a
national interpreter who deserves the recognition attributed to her. 
Keywords: Lélia Gonzalez. Racism. Sexism. Capitalism. Black woman.

1 INTRODUÇÃO

O objetivo do artigo é analisar o pensamento de Lélia González e refletir sobre o


racismo e sexismo brasileiro sob a sua visão, enquanto traz sua crítica sobre a formação social
e cultural do Brasil. Tomamos como base os artigos presentes no livro “Por um feminismo
afro-latino-americano” (2020), “Racismo e Sexismo na cultura brasileira” e “Cultura,
etnicidade e trabalho: Efeitos linguísticos e políticos da exploração da mulher”, que
pesquisam os discursos sobre raça, classe e gênero, especificamente, sobre a mulher negra no
Brasil. 
Gonzalez traz reflexões sobre a sociedade brasileira e o mito que a estrutura, essa
articulação interdisciplinar passa pelas Ciências Sociais e História, mostrando como o racismo
é um sintoma que caracteriza a neurose cultural brasileira. A autora, no final dos anos 80, traz
uma crítica ao feminismo que vigorava no Brasil, que ia além da discriminação pela
orientação sexual, mas dava voz a outros tipos de discriminação, como a de caráter racial, que
também impactava de forma grave a vida da mulher.
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A partir daí, Lélia investiga ao fundo como o racismo e o sexismo impactam,


perpetuam e oprimem a vida de homens e mulheres negros, partindo não só da raça e do
gênero, mas também da classe ao exteriorizar o conceito de Num (p.122) sobre “massa
marginal” e seu encaixe na vivência da população negra. Dessa forma, o presente artigo tem o
intuito de compreender e se debruçar mais a fundo nas ideias e críticas dessa ativista,
enquanto trazemos a necessidade de conhecermos mais sobre esta antropóloga negra que tanto
contribuiu para a sociedade brasileira.

2 CAPITALISMO

A autora Lélia Gonzalez sempre traz uma interseccionalidade nos seus


pensamentos, ela analisa o racismo e o sexismo de forma muito ampla por levar em conta a
ligação entre o gênero, a etnicidade e o sistema econômico, no qual o Brasil está inserido.
Lélia aponta que mesmo após a abolição, o novo sistema político e econômico que surgiu não
trouxe mudanças para os ex-escravos, que além de serem discriminados pela cor, somaram-se
à população pobre e formaram os indesejados da República. O aumento do número de
desocupados, trabalhadores temporários, mendigos e crianças abandonadas nas ruas redunda
também em aumento da violência, que pode ser verificada pelo maior espaço dedicado ao
tema nas páginas dos jornais da época, era uma estrutura feita para perpetuar e reproduzir a
discriminação.
Nos tempos atuais, a situação não mudou muito, o capitalismo industrial obstrui o
crescimento equilibrado das forças produtivas das regiões subdesenvolvidas o que acaba
gerando um crescimento desigual nas regiões, os principais elementos do capitalismo são o
trabalhador livre e o capital (Marx, K. 1965, p. 1205). Sob a hegemonia do capitalismo
industrial monopolista, Num (p. 122) traz à tona à questão da funcionalidade da
superpopulação, afirma que no nosso caso ela se torna supérflua e passa a constituir uma
“massa marginal” e face do processo de acumulação hegemônico, representado pelas grandes
empresas monopolistas, onde o desemprego e o subdesemprego incidem sobre a população
negra e as mulheres.
Sobre o caráter heurístico do conceito de massa marginal, Num apresenta três
tipos básicos, nos quais a comunidade negra estaria no Tipo A que abrange os diferentes
modos de fixação da mão de obra e se divide em quatro categorias principais: a) rural “por
conta própria”; b) rural “sob patrão”; c) urbano “por conta própria”; d) urbano “sob patrão”. E
no Tipo B que é constituído por mão de obra livre que fracassa, total ou parcialmente, na
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tentativa de se incorporar de forma estável no mercado de trabalho. Outro processo


apresentado pela autora, baseia-se na uma submissão inconsciente, que mostra grupos
colonizados que são a minoria, internalizando o processo de colonização, onde o ponto chave
é o privilégio racial, sendo que o branco está no topo dos grupos sociais. (GONZALEZ, Lélia.
1979, p.7).

3 RACISMO

Lélia aponta o racismo como uma construção ideológica e um conjunto de


práticas, que é perpetuado e reforçado, na medida em que beneficia determinados interesses,
ela se baseia nos estudos dos teóricos que analisam o processo abolicionista, que afirma que
os grupos racionalmente subordinados são as minorias que internalizam o processo de
colonização. Essa abordagem evidencia que em todos os níveis o grupo branco foi o
beneficiário da exploração dos grupos raciais, sendo confirmada ao observar os aspectos
culturais e políticos da sociedade, pois demonstram como o branco afirmou sua
supremacia em presença do negro. (GONZALEZ, Lélia. 2020. p. 24.)
Apesar do desenvolvimento e da modernização, a discriminação ainda continua, e
um dos fatores que impede a criminalização do racismo, como um crime hediondo, é o mito
da democracia racial. A imobilidade social do negro é corroborada por teóricos que analisam
o processo abolicionista, afirmando que o despreparo do ex-escravo para assumir os papéis de
homem livre, principalmente na esfera do trabalho, é responsabilidade unicamente sua,
atribuindo ao branco menor responsabilidade quanto à situação atual do negro (GONZALEZ,
Lélia. 2020. p. 24.). Essa inércia no mercado de trabalho , fez-lhe serem atribuídas características
desagradáveis que continuam no imaginário popular até hoje, como a irresponsabilidade e a
incapacidade intelectual, a mulher negra é a que mais sofre com os estereótipos, é sempre
vista como cozinheira, faxineira ou prostituta, visões que são reforçadas pela mídia brasileira
(GONZALEZ, Lélia. 2020, p. 64.). Então essa igualdade fica somente na imaginação porque
através de séculos foi naturalizado que a população de cor sofresse pelo boicote no mercado
de trabalho e a atribuição de chavões pejorativos, se o negro é considerado malandro e ladrão,
nada mais natural que viva na miséria (GONZALEZ, Lélia. 2020, p.64).
Dessa maneira, a “neurose cultural brasileira” é exposta e o racismo é descrito como
sua sintomática (GONZALEZ, Lélia. 2020. p.64). A neurose é o modo de ocultamento do
sintoma porque isso lhe traz certos benefícios, é uma construção que não mostra
conhecimento sobre si, é assim que a estrutura do racismo age, ela nega o estatuto de sujeito
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humano para o preto, porque quem está no topo desfruta do rebaixamento e da servidão de
quem está embaixo, então vê-lo apenas como uma coisa, torna o sistema mais aceitável
(GONZALEZ, Lélia. 2020, p.69).
4 SEXISMO

A intelectual também aborda o tema sexismo, mas voltado especificamente para a


mulher negra, que além de sofrer por causa da raça, também sofre por causa do gênero. Desde
o período escravocrata ela é vista como um objeto sexual ou uma doméstica, a imagem que
perdura no cotidiano é a da mucama permitida, a da prestação de bens e serviços
(GONZALEZ, Lélia. 2020, p.68.). A melhor constatação desse cotidiano são os casos de
discriminação de mulheres negras da classe média, mesmo sendo “educadas” ou estando
“bem vestidas”, o fato de ser preta, faz com que seja vista como empregada (GONZALEZ,
Lélia. 2020, p.68).
Durante o carnaval a situação muda, ali há o lado do endeusamento carnavalesco,
onde essa mulher do cotidiano deixa de ser vista como doméstica, se transformando na
Cinderela do asfalto, mesmo que ainda seja vista como objeto sexual: “Olha aquele grupo do
carro alegórico ali. Que coxas, rapaz”. “Veja aquela passista que vem vindo; que bunda, meu
Deus! Olha como ela mexe a barriguinha. Vai ser gostosa assim lá em casa, tesão¨
(GONZALEZ, 2020. p.65). É a neurose cultural brasileira no seu estado mais puro com seu
mito da democracia racial, que iguala as raças em um único, enquanto a mulher negra chama
a atenção no lugar escolhido para que ela brilhasse, exercendo uma violência simbólica.
(GONZALEZ, Lélia. 2020, p.66).
Por isso, Lélia Gonzalez, é um símbolo dessa luta, sempre mostrando como a
mulher negra vive na sociedade, sendo considerada um instrumento de prazer e trabalho.
Enquanto ressalta a importância de reivindicar a diferença que o gênero traz quanto aliado à
cor, porque esses marcadores sociais trazem as marcas da exploração econômica e da
subordinação racial e sexual, ao mesmo tempo que trazem com eles a marca da libertação
(GONZALEZ, Lélia, 1982).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Lélia Gonzalez estuda a classe, a raça e o gênero pelas ligações que estes
marcadores sociais possuem um com o outro, o seu olhar interdisciplinar traz análise mais
profundas e perspectivas novas sobre assuntos tão comentados nos dias de hoje, como o
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racismo e o sexismo, mostrando uma perspectiva diferente da sociedade racista e sexista que é
o Brasil.
Ela aborda as mazelas que a população de cor, principalmente a mulher negra,
enfrenta, desde os tempos do Brasil Colônia, como nenhum outro autor faz. Sempre
externando como o capitalismo é um sistema que se beneficia do abuso e da desvalorização
do ser humano de determinada parte da comunidade brasileira, mesmo diante da constante
invisibilização dessas pessoas, tomar consciência dessa estrutura inconsciente, segundo
Gonzalez, é o primeiro passo para uma sociedade mais igualitária.

REFERÊNCIAS

GONZALEZ, Lélia. 2020. Por um Feminismo Afro-Latino-Americano: Ensaios,


Intervenções e Diálogos. Rio Janeiro: Zahar.

GONZALEZ, Lélia, Conselho Nacional de Direitos da Mulher (CNDM), 1985.

GONZALEZ, Lélia. Cultura, Etnicidade e Trabalho: Efeitos Linguísticos e Políticos da


Exploração da Mulher. Comunicação apresentada no 8º Encontro Nacional da Latin
American Studies Association Pittsburgh, 5 a 7 de abril de 1979.

MARX, K. Oeuvres. Vol. I. Paris: Gallimard, 1965.

NUN, J. Superpopulação relativa, exército industrial de reserva e massa marginal. In


Populações “marginais" (Org. Luiz Pereira). São Paulo: Duas Cidades. 1978. p. 73-141.

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