Você está na página 1de 52

UNIVERSIDADE FEDERALDO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO
CURSO DE DIREITO

LARA MARIA AMARAL MATOS

OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO NOS TRIBUNAIS DA AMÉRICA


LATINA

FORTALEZA
2018
LARA MARIA AMARAL MATOS

OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO NOS TRIBUNAIS DA AMÉRICA LATINA

Monografia apresentada ao Curso de Direito


da Universidade Federal do Ceará, como
requisito parcial para obtenção do título de
Bacharela em Direito.

Orientadora: Prof.ª Dra. Germana de Oliveira


Moraes.

FORTALEZA
2018
LARA MARIA AMARAL MATOS

OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO NOS TRIBUNAIS DA AMÉRICA LATINA

Monografia apresentada ao Curso de Direito


da Universidade Federal do Ceará, como
requisito parcial para obtenção do título de
Bacharela em Direito.

Aprovada em: ____/____/_____

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________________
Prof.ª Dra. Germana de Oliveira Moraes (Orientadora)
Universidade Federal do Ceará (UFC)

__________________________________________________________
Prof.ª Dra. Geovana Maria Cartaxo de Arruda Freire
Universidade Federal do Ceará (UFC)

__________________________________________________________
M.ª Luana Adriano Araújo
Universidade Federal do Ceará (UFC)
À minha irmã, Sara Helena.
AGRADECIMENTOS

A Deus, em primeiro lugar, e a Nossa Senhora Auxiliadora, por me guiarem durante


toda a minha vida até o presente momento junto à religiosidade, tão importante para a visão
de mundo que carrego em meu coração.
À minha mãe, Isaura Maria, por me orientar em todos os momentos da minha vida. Ao
meu pai, Cícero, por todo o apoio desde os primórdios da minha vida educacional.
Aos meus familiares que sempre apoiaram todas as minhas decisões e caminharam ao
meu lado. Em especial, à minha avó, Rita Maria, que me ensinou tudo o que sei na vida sobre
paciência, calma e silêncio.
Ao meu modelo matemático perfeito, Armando Dauer, love of my life e fiel escudeiro,
por tudo. Também aos seus familiares, tão importantes em minha trajetória.
Aos professores que me ensinaram a amar os estudos. Agradeço à professora Germana
de Oliveira Moraes por me ensinar que, sim, os Direitos da natureza são possíveis de ser
alcançados.
Aos meus professores de Espanhol, Francês, Inglês, Latim e Português por me
ensinarem que, apesar das mudanças linguísticas, somos um só Planeta.
Aos fiéis amigos de longa data por compreenderem minha personalidade com tanto
carinho.
À natureza, por se renovar todos os dias.
Às pessoas com deficiência e seus familiares, por lutarem um dia de cada vez por seus
direitos incansavelmente.
Aos livros que li, tão importantes em minha formação acadêmica e pessoal.
Aos rios que carregam as águas que integram a Terra.
Aos defensores dos Direitos daqueles que não podem exercê-los por si só.
Às crianças que representam o futuro e ao mesmo tempo são tão incompreendidas pela
sociedade.
“Todo fluye. Todo está en movimiento
y nada dura eternamente. Por eso no podemos
descender dos veces al mismo río, pues cuando
desciendo al río por segunda vez, ni yo ni el
río somos los mismos.” (Heráclito)
RESUMO

Os rios e as águas, em um contexto antropocêntrico, não são sujeitos de Direito. A partir dessa
situação, a natureza sofre constantemente a interferência do homem que, na maioria das
vezes, é negativa: os rios são contaminados, as águas são desperdiçadas de forma arbitrária e
assim por diante, gerando a escassez hídrica e a destruição da natureza. Dessa forma, urge a
necessidade de mudança de parâmetro quanto aos direitos dos rios, suas bacias, seus afluentes
e suas águas para que, de fato, tais direitos sejam protegidos. Objetiva-se com o presente
trabalho, que se propõe a estudar os rios como sujeitos de Direito nos tribunais da América
Latina, a mudança de paradigma e a adoção uma visão ecocêntrica nos ordenamentos
jurídicos. O tema é investigado mediante metodologias descritiva, explicativa e exploratória,
realizando-se pesquisas legislativa, bibliográfica e jurisprudencial, análise de casos bem-
sucedidos como os do rio Vilcabamba, no Equador, e do rio Atrato, na Colômbia. Como
resultado dos estudos elaborados, há, de fato, a possibilidade jurídica do reconhecimento dos
rios como sujeitos de Direito. Destarte, conclui-se, a partir das pesquisas, que os rios, nas
decisões estudadas, são considerados sujeitos de Direito, por intermédio de um representante
legal, em função da sua incapacidade jurídica civil e, nesse contexto, existe a possibilidade de
serem considerados, como provado pelo presente trabalho, sujeitos de Direito.

Palavras-chave: Rios. Sujeitos de Direito. Tribunais da América Latina. Novo Paradigma


Ambiental.
ABSTRACT

Rivers and waters, in an anthropocentric context, are not subjects of right. Due to this factor,
Nature constantly suffers the interference of the man, gloomy in most of cases. This negative
interference results in contaminated rivers, arbitrary dumping of waste on water and so on,
generating water scarcity and the destruction of nature. In this way, it is urgent to change the
parameters of the rights of rivers, their basins, their tributaries and their waters so that, in fact,
these rights are protected. In this way, the present work proposes to study the rivers as
subjects of rights in the courts of Latin America, the paradigm shift and to adopt an ecocentric
vision in the legal systems. The subject is investigated through a descriptive, explanatory and
exploratory methodology, with legislative, bibliographic and jurisprudential research, and the
successful case study in Ecuador, the Vilcabamba River case and in Colombia, the Atrato
River case. As result of the elaborated studies is possible to conclude that, in fact, the legal
possibility of the recognition of the rivers as subjects of right. From the researches, it is
concluded, therefore, that the rivers, in the decisions studied are considered subjects of right,
through a legal representative, due to their civil legal incapacity and in this context, it is
possible to be considered subjects of right.

Keywords: Rivers. Subjects of Right. Courts of Latin America. New Environmental


Paradigm.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 9
2 OS DIREITOS DA NATUREZA, AS ÁGUAS E O NOVO PARADIGMA JURÍDICO-
AMBIENTAL ......................................................................................................................... 11
2.1 Os direitos da natureza e as águas .................................................................................. 11
2.2 A natureza como sujeito de Direitos ............................................................................... 16
2.3 Os direitos da natureza e a Incapacidade Jurídica Civil .............................................. 19

3 OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO E O CASO DO RIO VILCABAMBA .... 22


3.1 O Constitucionalismo do Equador e suas contribuições para o caso .......................... 22
3.2 O Caso, ab initio ................................................................................................................ 25
3.3 O Acórdão e seus Fundamentos ...................................................................................... 27

4 OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO E O CASO DO RIO ATRATO .............. 32


4.1 O Contexto ........................................................................................................................ 32
4.2 Os Motivos ......................................................................................................................... 33
4.3 A sentença de Primeira Instância.................................................................................... 35
4.4 A sentença de Segunda Instância .................................................................................... 35
4.5 A sentença da Corte Constitucional e seus Fundamentos ............................................ 36
4.5.1 Instrumentos Internacionais .......................................................................................... 36
4.5.2 Os impactos da mineração.............................................................................................. 37
4.5.3 A decisão ......................................................................................................................... 39

5 CONCLUSÃO...................................................................................................................... 43
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 45
ANEXO A – IMAGENS DA CONTAMINAÇÃO DO RIO ATRATO ............................. 47
9

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho propõe-se a discutir, no âmbito jurídico, os rios como sujeitos


de Direito, em um contexto de crise ambiental, por intermédio, principalmente, do estudo dos
casos elencados durante a presente pesquisa, quais sejam, o do rio Vilcabamba, no Equador e
do rio Atrato, na Colômbia, destacados nos capítulos dois e três do presente trabalho
acadêmico.
É importante frisar o quão importantes são tais casos para a mudança de
paradigma objetivada na presente pesquisa, já que demonstram, por intermédio de decisões
favoráveis aos direitos da natureza, que existe a possibilidade de os rios serem considerados
sujeitos de Direito.
Além dessa possibilidade arguida durante o trabalho científico, há uma
apresentação inicial quanto aos direitos da natureza e a relação desses direitos com as águas,
importantes para o estudo jurídico dos direitos dos rios, remetendo-se à saúde como elemento
vital para a natureza e as consequências de sua contaminação para os rios e para os demais
seres dependentes da água.
A importância da pesquisa para o universo jurídico decorre da necessidade de uma
mudança de paradigma quanto à natureza e seus direitos, em especial ponto, em relação aos
rios, baseando-se no Novo Constitucionalismo da América Latina e na visão ecocêntrica.
Busca-se a quebra do paradigma histórico antropocentrista, não excluindo as leis existentes
que protegem a natureza e as ações judiciais tais como as ações populares, bem como os
mecanismos do Direito Ambiental e seus princípios, e sim, acrescentam-se aos direitos já
adquiridos os direitos dos rios por si mesmos por intermédio de representantes legais, devido
à incapacidade jurídica dos rios de exercerem seus direitos frente à intervenção do homem.
Dessa forma, eleva-se o patamar da natureza, dos rios, principalmente, a entes
sujeitos de Direitos. Não apenas objetos, propriedade humana ou desprovidos de direitos por
si só, porém segue-se um rumo contrário, junto à visão presente na Constituição do Equador,
em que se celebra a Pachamama e se decide construir uma nova forma de convivência cidadã
em harmonia com a natureza, em respeito integral à existência dos rios, manutenção e
regeneração de seus ciclos vitais, estrutura, funções e processos evolutivos, bem como a
restauração, junto ao reconhecimento da água como elemento vital para a natureza, para que
os rios conquistem uma maior proteção, por intermédio de seus representantes legais.
É necessária uma comunhão fundamental, uma relacionalidade do homem com a
natureza para a defesa da integridade desta. Ao invés de negar a natureza, o homem pode
10

ajudá-la por intermédio de novos mecanismos jurídicos, tais como os apresentados no


trabalho acadêmico, e transformar o objetivo centrado na vida humana para um novo, em
harmonia, em respeito à natureza, da qual somos parte, não proprietários.
11

2 OS DIREITOS DA NATUREZA, AS ÁGUAS E O NOVO PARADIGMA JURÍDICO-


AMBIENTAL

O presente trabalho inicia-se com uma visão geral dos direitos da natureza
relacionados à água, questão indispensável para o entendimento e contextualização com a
matéria, como demonstrado a seguir.

2.1 Os direitos da natureza e as águas

Segundo Moraes (2013), o Planeta Terra, chamado, muitas vezes, de Planeta


Água, é constituído de dois terços só de água e é praticamente todo coberto por águas,
divididas em oceanos, mares, rios e nas águas subterrâneas que não estão visíveis. Deste
montante de dois terços, 97,5% do total é salgada, estando nos mares e oceanos; 2,493% é
doce (potável), mas são encontradas em geleiras e no subterrâneo, e apenas 0,007% é doce e
está disponível nos rios, nos lagos e na atmosfera, sendo possível seu consumo, que
infelizmente é mal distribuído.
De acordo com o relatório mundial das Nações Unidas sobre o desenvolvimento
dos recursos hídricos (ONU, 2018), atualmente, a demanda mundial por água é estimada em
torno de 4.600 km³/ano e calcula-se que essa demanda irá aumentar de 20% a 30%, atingindo
um volume entre 5.500 e 6.000 km³/ano até 2050.
O uso da água aumenta em âmbito mundial em função do crescimento
populacional, do desenvolvimento econômico e das mudanças nos padrões de consumo,
dentre outros fatores. No período de 2017 a 2050, a população mundial deverá aumentar de
7,7 bilhões para 9,4 ou 10,2 bilhões, com dois terços vivendo em cidades. Estima-se que mais
da metade desse crescimento ocorrerá na África (mais 1,3 bilhão), sendo que a Ásia (mais
0,75 bilhão) deverá ocupar o segundo lugar em termos de crescimento populacional. O uso da
água no mundo aumentou em seis vezes ao longo dos últimos 100 anos e continua crescendo
de forma constante, com uma taxa em torno de 1% ao ano.
O uso doméstico da água, que corresponde a aproximadamente 10% do total da
captação hídrica em todo o mundo, deve aumentar de forma significativa no período 2010-
2050, em quase todas as regiões do mundo. Em termos relativos, o aumento da demanda
doméstica será maior em sub-regiões africanas e asiáticas, onde os valores podem mais do que
triplicar. Na América Central e do Sul, a demanda pode ser mais do que o dobro dos valores
12

atuais. Esse crescimento esperado pode ser atribuído principalmente ao aumento já previsto
no que se refere aos serviços de fornecimento de água em assentamentos urbanos.
O uso mundial das águas subterrâneas, principalmente para a agricultura, atingiu
800 km³/ano em 2010, com a Índia, os Estados Unidos da América (EUA), a China, o Irã e o
Paquistão (em ordem decrescente) respondendo por 67% do total de extrações em todo o
mundo. A demanda mundial para a produção agrícola e energética (principalmente alimentos
e eletricidade), atividades estas que envolvem uso intensivo de água, deve crescer por volta de
60% e 80%, respectivamente, até 2025.
Atender aos 60% de aumento estimado da demanda por alimentos exigirá a
expansão das terras cultiváveis, se for mantida a situação usual (business-as-usual). Sob as
práticas de gestão predominantes, a intensificação da produção envolve o aumento das
intervenções mecânicas no solo e do uso de agroquímicos, energia e água. Esses fatores,
associados aos sistemas alimentares, respondem por 70% da estimada perda da biodiversidade
terrestre até 2050.
Contudo, esses impactos, incluindo as exigências por mais terra e mais água,
podem ser amplamente evitados, se a intensificação da produção tiver como base uma
intensificação ecológica que envolva o aperfeiçoamento dos serviços ecossistêmicos para
reduzir os insumos externos1.
As águas estão interligadas, não existem fronteiras para elas. As decisões quanto
ao uso do solo em um determinado lugar podem ter consequências importantes para os
recursos hídricos, as pessoas, a economia e para o meio ambiente em lugares distantes. Muitos
países já estão passando por situações generalizadas de escassez hídrica e, provavelmente,
terão de lidar com uma menor disponibilidade de águas superficiais a partir de 2050.
Na década de 2010, 1,9 bilhão de pessoas (27% da população mundial) vivia em
áreas com potencial de serem gravemente afetadas pela escassez hídrica. Se a variabilidade
mensal for levada em consideração, 3,6 bilhões de pessoas em todo o mundo (quase metade
da população mundial) já vivem em áreas potencialmente escassas de água pelo menos
durante um mês por ano, e esse número pode aumentar de 4,8 para 5,7 bilhões em 2050.
As captações de água para irrigação foram identificadas como a principal causa da
redução dos níveis das águas subterrâneas em todo o mundo. Prevê-se que na década de 2050
ocorrerá um grande aumento das captações de águas subterrâneas, totalizando 1.100 km³/ano,
o que corresponde a um aumento de 39% em relação aos níveis atuais. Um terço dos maiores

1
Relatório Mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hidricos 2018. Disponível em:
<http://unesdoc.unesco.org/images/0026/002615/261579por.pdf> Acesso em 30 mai. 2018.
13

sistemas mundiais de águas subterrâneas já está em situação de perigo. As tendências


mencionadas também pressupõem crescentes captações de águas subterrâneas não renováveis
(fósseis), indiscutivelmente um caminho insustentável.
Estima-se que 80% de todas as águas industriais e residuais sejam lançadas no
meio ambiente sem qualquer tipo de tratamento, o que resulta em uma deterioração crescente
na qualidade da água em geral, com impactos negativos para a saúde humana e para os
ecossistemas.
Apesar de décadas de regulamentação e de grandes investimentos para reduzir
fontes pontuais de poluição hídrica em países desenvolvidos, os desafios relacionados à
qualidade da água perduram, devido às fontes de poluição hídrica difusas e àquelas sem
regulamentação.
A intensificação agrícola aumentou o uso de substâncias químicas em todo o
mundo para aproximadamente dois milhões de toneladas por ano. Os impactos dessa
tendência não foram amplamente quantificados e ainda existem sérias lacunas nos dados. A
agricultura continua sendo a fonte predominante de nitrogênio reativo despejado no meio
ambiente, assim como uma fonte significativa de fósforo.
O desenvolvimento econômico por si só não é uma solução para esse problema.
Quase 15% das estações de monitoramento das águas subterrâneas na Europa registraram que
o nível de nitratos estabelecido pelo padrão da OMS foi excedido na água potável, e as
estações de monitoramento registraram que aproximadamente 30% dos rios e 40% dos lagos
eram eutróficos ou hipertróficos no período 2008 a 2011.
Os maiores aumentos da exposição a poluentes devem ocorrer em países de renda
baixa ou média-baixa, principalmente devido ao aumento populacional e econômico desses
países, em especial os da África, assim como à falta de sistemas de gestão das águas residuais.
Considerando a natureza transfronteiriça da maior parte das bacias hidrográficas, a
cooperação regional será essencial para tratar dos desafios esperados quanto à qualidade da
água, segundo o Relatório mundial das Nações Unidas sobre o desenvolvimento dos recursos
hídricos de 20182.
A partir desses dados, nota-se a necessidade de uma mudança concreta quanto ao
tratamento jurídico da água. Um exemplo dessa mudança, segundo Moraes (2013), ocorre no
vigente Direito Constitucional Boliviano, no qual se positiva a visão da água como fonte de
vida, como ser vivo e sagrado, e como direito de todos os seres humanos. No artigo 163, o

2
Cf. nota 1 deste capítulo.
3
“Artículo 16. I. Toda persona tiene derecho al agua y a la alimentación”.
14

texto constitucional dispõe de que toda pessoa tem direito à água e, no artigo 20, inciso I4,
assegura a todas as pessoas o direito ao acesso universal e equitativo aos serviços de água
potável e saneamento, bem como proíbe que seja objeto de concessão ou de privatização,
sujeitando-o ao regime de licenças e registros, na conformidade da lei.
Ao tratar as políticas públicas do Bem Viver para as águas, na Bolívia, Fernando
Huanacuni esclarece que elas respeitam a cosmovisão dos povos indígenas, segundo a qual, a
água é um elemento articulador de vida e da sobrevivência das culturas, sendo um elemento
vital para toda a natureza e toda a humanidade (MORAES, 2013). Seguindo a mesma visão,
Moraes cita Gudynas (2011) para quem o Bem Viver implica uma nova forma de conceber a
relação com a natureza, de maneira a assegurar simultaneamente o bem estar das pessoas e a
sobrevivência das espécies de plantas, animais e dos ecossistemas.
Outro exemplo bem-sucedido é o do Equador, que ressalta entre os direitos do
Bem Viver, o art. 12 da Constituição da República do Equador de 20085, que o direito
humano à água é fundamental e irrenunciável, e a água constitui patrimônio nacional
estratégico de uso público, inalienável, imprescritível e essencial à vida. Em contrapartida,
atribui-se ao Estado, no artigo 3º, I, o dever primário de garantir a água para seus habitantes6
(MORAES, 2013).
Na mesma linha de raciocínio, James Lovelock (2006), cientista britânico, com a
visão holística da Teoria de Gaia já comprovada cientificamente ao demonstrar ser a Terra um
superorganismo vivo e autorregulável e as relações de interdependência entre os seres vivos,
afirma que “sem água não pode haver vida e sem vida não haveria água” e que “a água na
Terra possibilitou a vida, mas sem a vida a Terra estaria seca.” (LOVELOCK, 2006 apud
MORAES, 2013).
Como elencado, importantes inovações jurídicas no tratamento às águas estreiam
no constitucionalismo do Equador. Além da compreensão da água como direito humano e
como patrimônio comum, outra impactante novidade jurídica decorre da possibilidade de que
a natureza (Pachamama) seja sujeito de Direitos e não mais objeto. As águas, como parte da
natureza, de igual modo, titularizam direitos (MORAES, 2013). Tal qual será ressaltado
adiante no presente trabalho acadêmico.

4
“Artículo 20.I. Toda persona tiene derecho al acceso universal y equitativo a los servicios básicos de agua
potable, alcantarillado, electricidad, gas domiciliario, postal y telecomunicaciones.”
5
“Art. 12. El derecho humano al agua es fundamental e irrenunciable. El agua constituye patrimonio nacional
estratégico de uso público, inalienable, imprescriptible, inembargable y esencial para la vida.”
6
“Art. 3. Son deberes primordiales del Estado: 1.Garantizar sin discriminación alguna el efectivo goce de los
derechos establecidos en la Constitución y en los instrumentos internacionales, en particular la educación, la
salud, la alimentación, la seguridad social y el agua para sus habitantes.”
15

A Assembleia das Nações Unidas, por meio da Resolução A/RES/64/2927, em 28


de julho de 2010, reconheceu que o direito à água potável e ao saneamento é um direito
humano essencial para gozar plenamente a vida e todos os outros direitos humanos.
Na sequência, em 30 de setembro de 2010, o Conselho de Direitos Humanos das
Nações Unidas aprovou a Resolução A/HRC/RES/15/98 afirmando que o direito humano à
água potável e ao saneamento deriva do direito a um nível de vida adequado e está
indissoluvelmente associado ao direito ao mais alto nível possível de saúde física e mental,
assim como ao direito à vida e à dignidade. Assim, confirma que os direitos à água e ao
saneamento fazem parte do direito internacional existente e que esses direitos são legalmente
vinculativos para os Estados.
Também apela aos Estados que desenvolvam as ferramentas e mecanismos
adequados para alcançarem, gradualmente, a concretização integral das obrigações em termos
de direitos humanos relacionadas com o acesso à água potável segura e saneamento, incluindo
em áreas atualmente não servidas ou insuficientemente servidas. A aprovação dessas duas
importantes resoluções pelas Nações Unidas denota preocupação com a situação de quase um
bilhão de pessoas sem acesso a fontes de água limpa, bem como revela o início da expansão
para o mundo das novas bases do constitucionalismo ecocêntrico, projetadas sobre a visão das
águas, adotada nos países andinos, despertando a esperança de que a Humanidade, em suas
diversas latitudes e longitudes, possa se conscientizar acerca da importância da água como
fonte de vida.
Sob a nova visão das águas, em síntese, eleva-se o direito à água a um patamar de
direito humano, indissociável do direito à vida e dos demais direitos humanos; emancipa-o da
concepção econômica da água como recurso ou bem de capital necessário à produção e refém
da lógica do mercado, considerando-a patrimônio comum; proíbe, em consequência, sua
mercantilização e a privatização dos serviços a elas relativos e, finalmente, num passo mais
ousado, no Equador, como citado anteriormente, muda o tratamento jurídico da água que, de
objeto, passa a ser sujeito, a partir da compreensão de que seja componente da natureza
(MORAES, 2013). Seguindo a mesma concepção, e como exemplo dessa mudança de
tratamento jurídico, ressalta-se o caso do Rio Vilcabamba que será tratado em detalhes mais
adiante.

7
Disponível em <http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/64/292>. Acesso em: 10 abr. 2018
8
Disponível em <http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/HRC/RES/15/9&referer=/english/
&Lang=S>. Acesso em: 10 abr. 2018.
16

Esse novo tratamento das águas, de acordo com Moraes (2013), positivada no
Equador e na Bolívia, molda-se à concepção ecocêntrica, superadora do antropocentrismo, a
qual, além de admitir a prevalência da cultura da vida, reconhece a indissociável relação de
interdependência e complementariedade entre os seres vivos, expressa no valor fundamental
da harmonia, desdobrável em valores como unidade, inclusão, solidariedade, reciprocidade,
respeito, complementariedade, equilíbrio.
Em suma, sob essa nova visão ecocêntrica das águas, a água, como parte da
natureza (Pachamama), é considerada indispensável para a vida: “da água depende a
continuidade da vida de outros seres vivos, e da vida em si mesma, depende a continuidade da
existência da água” (MORAES, 2013).
A partir dessa visão das águas, adentra-se em um novo conteúdo, a natureza como
sujeito de Direitos, tal como exposto a seguir.

2.2 A natureza como sujeito de Direitos

A natureza, tal qual possuidora de direitos, ressalta um novo paradigma em que se


afasta da visão antropocêntrica9 e surgem novas visões biocêntricas10 e ecocêntricas11. É
notório ressaltar que tais visões não se excluem, já que a vida está inserida na casa. Os seres
bióticos e abióticos se unem em um só contexto para serem resguardados como um todo e, ao
mesmo tempo, como uma parte desse todo, constituídos em um universo diversificado de
seres animados e inanimados que precisam de proteção e de cuidados. Para isso, surge, ou
melhor, urge uma necessidade de afastamento da visão voltada para a proteção humana
somente e nasce, tal como a vida, a percepção para o que está fora do universo humano, para a
natureza, natura12, como o próprio nome já o diz: qualidade essencial.
Nesse contexto, é importante ressaltar a colocação de Viana (2013) sobre a
afirmação do filósofo francês Michel Serres. Serres (1990) afirma categoricamente que a
natureza se comporta como um sujeito, que os objetos são sujeitos de Direito e não simples
suportes passivos de apropriação e, apenas dessa forma, pode existir o equilíbrio que se
pretende com o contrato natural.
O filósofo francês Serres (1990) adverte que a Terra existiu sem os nossos
antepassados, poderia muito bem existir hoje sem nós e existirá amanhã sem nenhum dos

9
do grego, anthropos, “humano”; kentron, “centro”.
10
do grego, bios, “vida”; kentron, “centro”.
11
do grego, oikos, “casa”; kentron, “centro”. Pronunciado ekosentrizmo.
12
“qualidade essencial, disposição inata, o curso das coisas e o próprio universo”.
17

nossos possíveis descendentes, mas nós não podemos existir sem ela. Nosso domínio, não
regulado, volta-se contra si mesmo.
Partindo dessa premissa de que a natureza se comporta como um sujeito, inicia-se
uma perspectiva distinta da natureza como propriedade, qual seja a natureza como possuidora,
como detentora de direitos por si só. Como bem ressalta Serres, a existência da natureza não
depende dos seres humanos, ela basta a si mesma, porém, nós, seres humanos, não
poderíamos jamais viver sem a água, como ressaltado no presente trabalho acadêmico, sem os
rios, sem os animais, sem o oxigênio que respiramos e demais compostos naturais, ou seja, se
extintos, não findaria a natura; nós, seres humanos é que deixaríamos de existir. A
complexidade de tal situação é urgente, pois nos leva a uma nova questão: a de protegermos a
nós mesmos ao protegermos a nossa casa, a Mãe Terra.
Já que não viveríamos sem a natureza, por que ela não precisaria de uma proteção
maior? E como lhe poderíamos conceder uma proteção maior? Tais questionamentos são
válidos a partir do momento em que os rios são poluídos bem como os mares, junto à
destruição das florestas ainda restantes no Planeta e assim por diante, causando como
consequência a nossa extinção aos poucos e a da natureza e seus espécimes.
Não é uma questão tão somente a se pensar, é uma questão para agir; para não
cunhar apenas uma doutrina teórica, e, sim, uma forma concreta de proteção. Dessa forma,
como dita Viana (2013, p. 14), “a atribuição de subjetividade, dignidade e direitos ao Planeta
auxilia na tomada de consciência sobre a crise ambiental e colabora na tomada de decisões
para suas possíveis soluções”.
Está, portanto, o referido autor refletindo sobre o papel do reconhecimento da
Terra como sujeito de Direitos, como um fator primordial e essencial para que se concretize o
ato de proteção, de valoração ambiental para que não haja uma crise desproporcional ao que
as forças humanas possam suportar, para que não ocorra um efeito tão devastador que não
possa ser controlado pela humanidade e, dessa forma, minimizar a crise. Por fim, buscam-se
soluções tais como aquelas de reconhecimento da natureza como detentora de direitos.
É válido ressaltar o recente caso de proteção da Suprema Corte de Justiça
Colombiana ao reconhecer a Amazônia Colombiana como sujeito de Direitos, conforme narra
Gudynas (2018):
A decisão, aprovada em 5 de abril de 2018, disse que a Amazônia é um
“ecossistema vital para o desenvolvimento global”, e que, a fim de protegê-la,
reconhecem-na “como entidade “sujeito de direitos’, titular da proteção, da
conservação, manutenção e restauração a cargo do Estado e de entidades regionais
que a integram’. A partir disso, a decisão determina que o governo, incluindo
18

ministérios, agências e municípios, iniciem ações diferentes com um objetivo muito


ambicioso: desmatamento zero. (tradução nossa)13

Tal caso serve como exemplo para o reconhecimento da Mãe Terra como sujeito
de Direitos, não se perfaz algo utópico como na visão antropocêntrica e sim, consagra um
momento de rompimento com o passado e busca de atos concretos para que sejam
reconhecidos os Direitos da natureza como primordiais e essenciais para todos.
Partindo desse universo e, em acréscimo, Moraes (2013) dita que até que no
campo jurídico universalizem-se, nos passos da visão ecocêntrica, pioneira no Equador, os
direitos de Pachamama (natureza), e, por via de consequência, as águas sejam vistas, de fato,
como sujeito e não como objeto de Direito, nesta fase de transição, serão inevitáveis
contradições intrínsecas, consequências das tentativas de adaptar essas “novas” visões às
diversas formas geradas sob o anterior paradigma antropocêntrico, e enquadrá-las em
conceitos, categorias, institutos, procedimentos, enfim, ferramentas jurídicas concebidas para
atender à concepção romano-germânica de Direito.
Com o uso de tais ferramentas jurídicas, podemos resguardar os direitos da Terra
e legislar em favor desta, uma vez que são mecanismos necessários para que o percurso da
natureza possa seguir adiante sem a interferência humana destruidora, em um contexto
interdisciplinar, pois não existe um isolamento do Direito, sendo esse ramo de estudos
interligado, no que tange aos direitos da natureza, aos direitos fundamentais e às demais
ramificações de estudos.
Da mesma forma que somos e vivemos em uma casa, em uma natureza una, o
Direito é universal, interligado como as águas, sem fronteiras, de tal maneira que os direitos
precisam ser resguardados onde quer que estejamos e exista um ser vivo ou não-vivo, pois ali
esse direito estará presente, os Estados existindo tão somente como divisores criados por
humanos.
Nesse momento, no entanto, é essencial uma ruptura com a visão antropocêntrica
voltada apenas para uma postura Estatal e centralizada. Assim como aconteceu com o advento
da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão14, em 1789, ocorreu, nessa época, um
rompimento de paradigmas, vivenciou-se um universalismo, na mesma linha de raciocínio, de

13
“La decisión, aprobada el 5 de abril de 2018, dice que la Amazonia es un “ecosistema vital para el devenir
global”, y que en aras de protegerla, se la reconoce “como entidad ‘sujeto de derechos’, titular de la
protección, de la conservación, mantenimiento y restauración a cargo del Estado y la entidades regionales que
la integran”. A partir de ello, la decisión mandata al gobierno, incluyendo ministerios, agencias y municipios, a
iniciar distintas acciones con un objetivo muy ambicioso: cero deforestación.”
14
Disponível em <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%
C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/ declaracao-de-direitos-do-
homem-e-do-cidadao-1789.html>. Acesso em: 10 mai. 2018.
19

que os Direitos da natureza devem ser respeitados em um plano internacional e a mudança de


paradigma para que a natureza seja sujeito de Direitos certamente também demanda um
esforço por parte dos legisladores, do judiciário e do Poder executivo, porém se faz mister a
transição de uma perspectiva anterior para uma nova em um contexto global.

2.3 Os direitos da natureza e a Incapacidade Jurídica Civil

Faz-se necessário, antes de adentrarmos em casos concretos quanto aos rios como
sujeitos de Direitos nos Tribunais da América Latina, ou seja, os referentes aos Rios
Vilcabamba e Atrato, realizar um panorama quanto à incapacidade jurídica civil, não sobre a
capacidade civil, já que cada legislação versa e dita sobre a capacidade civil de forma distinta,
porém é válido ressaltar o que se apresenta como predominante quanto às incapacidades
jurídicas civis nas legislações vigentes em países democráticos, principalmente nos países da
América Latina.
Para tal panorama, se faz como primordial a colocação de Ramiro Ávila
Santamaría (2010):
O importante na figura da incapacidade é o respeito ao status de sujeito de direitos
por intermédio de uma instituição que se denomina “representante legal” ou a
“tutela”.
A pessoa, por mais incapaz que se considere, não deixa de ser titular de direitos; o
problema é que certos direitos se deixam de exercer por si mesmos e os fazem um
terceiro ao que se denomina de representante. Um bebê de cinco meses, no momento
em que seus pais morrem, tem direito à herança, porém, sua administração irá
requerer um representante. Uma pessoa considerada deficiente mental tampouco
deixa de ser proprietária ou deixa de ser pai ou mãe ou cidadã, mas se designará um
representante. Ainda no caso de incapacidade absoluta, não se deixa de exercer
direitos.
Os sujeitos incapazes seguem exercendo a maioria dos direitos tais como viver,
expressar-se, alimentar-se, divertir-se, descansar, relacionar-se... Os direitos que
requerem representação têm a ver com a faculdade de obrigação e de exigir seu
cumprimento. Não se podem assinar contratos nem demandar judicialmente,
dependendo das condições determinadas pela lei.
A incapacidade das pessoas se supre com a representação. O efeito da representação
é que “o que uma pessoa executa em nome de outra, estando facultada por ela ou por
lei para representá-la, surte efeito ao representado iguais efeitos ao que se houvesse
contratado o mesmo”.
Pode se aplicar o mesmo argumento para a natureza? Sim, sem dúvida que sim. A
natureza não necessita dos seres humanos para exercer seu direito a existir e a
regenerar-se. Porém, se os seres humanos a destroem, contaminam-na, depredam-na,
ela necessitará dos seres humanos, como representantes, para exigir a proibição de
assinar um contrato ou acordo pelo qual se queira reduzir uma floresta primária
protegida ou para demandar judicialmente sua reparação ou restauração (tradução
nossa).15

15
SANTAMARÍA, R. l derecho de la naturaleza: fundamentos. 2010. Disponível em:
<http://repositorio.uasb.edu.ec/handle/10644/86>. Acesso em: 07 mai.. 2018.
20

Dessa colocação depreende-se o contexto para o alcance daquilo que se faz


primordial para a natureza, qual seja, a melhor forma concreta de resguardar seus direitos no
âmbito jurídico. Diante desse novo paradigma, a natureza se faz sujeito de Direitos. Para
tanto, coloca-se a figura da incapacidade jurídica desta, já que existe, de fato, uma
incapacidade de exercer ela mesma seus próprios direitos e de resguardá-los, porém a
natureza clama para que seus direitos sejam respeitados pelos homens de todas as nações
existentes, não só em um contexto de América Latina, enfoque do presente trabalho
acadêmico. Assim, surge a figura do representante legal, como bem colocado por Santamaría
(2010).
Dentre os exemplos elencados, nenhum deles deixou de exercer seus direitos, seja
por intermédio de um curador ou de um tutor, e assim por diante. São figuras que existem em
vários ordenamentos jurídicos, em confirmação aos direitos fundamentais presentes nas
Constituições Democráticas em sua maioria.
Viana (2013) sabiamente relembra a colocação no âmbito do Direito de Pontes de
Miranda (1954), que contribui para o trabalho no sentido de afirmar que o sistema jurídico
determina quais são os entes que se têm por sujeitos de direito. Nem sempre todos os homens
tiveram esse status: os escravos ou as mulheres não eram reputados sujeitos em alguns
ordenamentos. Foi a evolução social que impôs o princípio da personalidade de todos os entes
humanos. Assim, a evolução social pode levar à consideração do Planeta como um sujeito de
direitos.
Miranda (1954) expõe que ser sujeito de Direito é estar na posição de titular de
direito. Não importa se esse direito está subjetivado, se é munido de pretensão e ação ou de
exceção. Importa que haja direito. Sobre a discussão sobre quem pode ser sujeito de Direitos,
Miranda (1954) anota que se tem de perguntar que é sujeito de Direito; depois, quem é que,
no sistema jurídico de que se trata, pode ser sujeito de Direito. Se o sistema jurídico, como
sistema lógico, atribui direito a animais e a coisas, tais animais e coisas não são objetos, são
sujeitos (VIANA, 2013).
Viana (2013) reforça esse ponto de vista ao colocar que o ser sujeito é a
titularidade, que não se confunde com o exercício do direito, que pode tocar a outrem pela lei.
Às vezes, o sistema estabelece o exercício por outra pessoa quando o titular não pode exercer
os direitos. Logo, a incapacidade dos sujeitos não-humanos de postular em juízo pode ser
sanada, por exemplo, pela representação por meio de órgãos como o Ministério Público ou
associações criadas com o fim específico de protegê-los. É o que acontece nas ações civis
públicas propostas para proteger o meio ambiente e outros interesses. Portanto, não é inviável
21

a mudança no status jurídico da natureza para sujeito de direito, ressalta. Muito pelo contrário,
seria um meio mais eficaz de cumprimento de Direitos, como acontece com pessoas físicas
que não se encontram aptas para exercer os seus direitos por si mesmas.
A natureza segue o curso de vida sem necessitar da interferência humana, porém,
se essa interferência ocorrer, precisará de cuidado para que seja preservada da ação do próprio
homem. Diante desse cenário, o ser humano figura como representante do rio, dos mares, dos
animais e dos demais entes naturais, bióticos e abióticos para que continuem a seguir o curso
existente anterior à interferência acima citada, pois é de extrema importância para que seus
direitos sejam assegurados e não diminuídos. Ora, os direitos não devem ser diminuídos e,
sim, acrescentados, já que é um dos parâmetros adquiridos ao longo da história e deve
continuar assim.
É de suma importância a coerência em se estender tais direitos para que a
natureza, no caso específico do presente trabalho acadêmico os rios, por intermédio de uma
representação legal, possam ser considerados sujeitos de Direitos diante de um colapso de
escassez das águas e do mau uso de tais águas. Como ressaltado anteriormente no presente
capítulo, a crise hídrica afeta todo o Planeta, o que ocorre em um lugar afeta outro totalmente
distinto daquele.
Ao preservar a natureza e os rios, preserva-se, ao mesmo tempo, a vida como um
todo. Direito, aliás, presente na maioria dos ordenamentos jurídicos e nos principais tratados
internacionais como um direito fundamental de primeira dimensão16. Por qual motivo o
direito à vida seria somente voltado para a vida humana?
A vida existe fora do contexto humano e é imprescindível a sua preservação e a
sua continuidade sem interferências externas. Com a adoção do novo paradigma jurídico-
ambiental proposto, iniciam-se direitos para novos sujeitos detentores de tais direitos por
intermédio de representantes legais, tais quais como nos casos narrados posteriormente nos
capítulos seguintes.

16
Disponível em: <http://www.onu.org.br/img/2014/09/DUDH.pdf> Acesso em: 11 jun. 2018
22

3 OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO E O CASO DO RIO VILCABAMBA

Para compreender o caso do rio Vilcabamba, é essencial a análise do


constitucionalismo do Equador.

3.1 O Constitucionalismo do Equador e suas contribuições para o caso

No pioneiro e vanguardista constitucionalismo ecocêntrico latino-americano, é na


Constituição da República do Equador que se dá o reconhecimento expresso dos direitos da
natureza (Pachamama), nos artigos 71 a 74 da Constituição da República do Equador de
2008, em que se produziram mais avanços, consoante analisa Gudynas (2009), com
prevalência da sensibilidade ambiental proveniente, ora das próprias experiências de vida e da
herança cultural, ora de processos políticos, militância social e reflexão intelectual,
destacando-se como ponto alto exatamente o reconhecimento dos direitos da natureza ou
Pachamama (MALISKA; MOREIRA, 2017).
No Equador, o conceito de Bem Viver ou de Sumak Kawsay trata de uma ideia
central na vida política do país. Foi inserido na Constituição de 2008, com referência à noção
de “viver bem” ou “bem viver” dos povos indígenas (MORAES, 2013). Logo depois, foi
contemplado pelo Plano Nacional para o Bem Viver 2009-2013, incorporando uma proposta
de biossocialismo republicano, conforme a denomina René Ramérez Gallegos, Secretário da
Secretaria Nacional de Planificación y Desarrollo daquele país.
Sobre o “Bem Viver” ou Sumak Kawsay, base de informação da atual
Constituição do Equador, diz ele que se sustenta não apenas no “ter”, mas também no “ser”,
“estar”, “fazer” e “sentir”, entendendo-o como “a satisfação das necessidades, a consecução
de uma qualidade de vida e morte dignas, o amar e ser amado, e o florescimento saudável de
todos, em paz e harmonia com a natureza, para o prolongamento das culturas humanas e da
biodiversidade” (GALLEGOS, 2012 apud MORAES, 2013).
O Bem viver, continua, supõe ter tempo livre para a contemplação e emancipação,
e que as liberdades, oportunidades, capacidades e potencialidades reais dos indivíduos/
coletividades se ampliem e floresçam de modo que permita lograr simultaneamente aquilo
que a sociedade, os territórios, as diversas identidades coletivas e cada um, visto como um ser
humano/ coletivo, universal e particular, por sua vez, valora como objetivo desejável, tanto
material como subjetivamente, sem produzir nenhum tipo de dominação de um sobre o outro
(MORAES, 2013).
23

Entre os direitos do Bem Viver, menciona o art. 12 da Constituição da República


do Equador de 200817 que o direito humano à água é fundamental e irrenunciável e a água
constitui patrimônio nacional estratégico de uso público, inalienável, imprescritível e
essencial para a vida. Em contrapartida, atribui-se ao Estado, no artigo 3º, I, o dever primário
de garantir a água para seus habitantes18 (MORAES, 2013).

A água como um componente fundamental da natureza, com direitos próprios a


existir e manter seus ciclos vitais, é um quatro pontos fundamentais relativos à visão
das águas, aprovados no processo constituinte do Equador, indicados por A COSTA
e MARTINEZ, ao lado das compreensões da água como direito humano; com bem
nacional estratégico de uso público; e como patrimônio da sociedade. (MORAES,
2013, p. 139)

Conforme explica Gudynas (2009), é o reconhecimento dos direitos da natureza e


Pachamama e o direito à sua restauração que colocam a proposta equatoriana dentro da
sustentabilidade superforte, compreendida como aquela em que se defendem os valores
próprios ou intrínsecos da natureza, como os valores das espécies vivas e dos ecossistemas,
independentemente da utilidade ou apreciação humanas.
Os autores Maliska e Moreira (2017), com propriedade, consideram que dentro do
movimento constitucionalista sul-americano, particularmente na Constituição do Equador de
2008, um novo paradigma emergiu no cenário das discussões do direito ambiental, sobretudo
porque foram reconhecidos os direitos da natureza, bem como o direito a um buen vivir, tendo
como pano de fundo a cosmovisão dos povos indígenas andinos que exaltam a convivência
harmônica entre homem e o meio ambiente natural.
Dessa maneira, a Constituição do Equador de 2008, assumindo uma postura
pluralista, em busca de integrar as diversas culturas que formam o povo equatoriano, rompe,
portanto, com os paradigmas de uma visão antropocêntrica ocidental, indo de encontro ao que
amplamente se difunde desde as primeiras constituições ocidentais, ou seja, a natureza como
propriedade, bem de uso exclusivo do ser humano.
Esse paradigma da modernidade antropocêntrica, mecanicista e racionalista
justificará a subjugação da natureza, por meio da qual o homem satisfaz suas necessidades
materiais e existenciais, prevalecendo a ideia de que os elementos naturais (os animais, as
florestas, os oceanos, os rios, as vegetações, as rochas, as montanhas, o ar, o solo, enfim,
todos os componentes bióticos e abióticos do planeta) são meros recursos ou matérias-primas

17
“Art. 12: El derecho humano al agua es fundamental e irrenunciable. El agua constituye patrimonio nacional
estratégico de uso público, inalienable, imprescriptible, inembargable y esencial para la vida.”
18
“Art. 3: Son deberes primordiales del Estado: 1.Garantizar sin discriminación alguna el efectivo goce de los
derechos establecidos en la Constitución y en los instrumentos internacionales, en particular la educación, la
salud, la alimentación, la seguridad social y el agua para sus habitantes.”
24

inseridas no contexto do processo produtivo de bens e serviços, apoiada numa visão de


desenvolvimento econômico independente da preservação e proteção dos ecossistemas
(DUSSEL, 2002).
Entretanto, é válido ressaltar que existem leis que protegem a natureza, inclusive
tratados internacionais, e ações judiciais como as ações populares que também o fazem, bem
como os mecanismos do Direito Ambiental e seus princípios, como o princípio da precaução,
da prevenção, da recuperação, da responsabilidade, dentre outros. Porém, não são suficientes,
em um contexto atual, para a real proteção dos direitos da natureza.
Em contraponto a essa visão, surge a “ecologia profunda”, sustentada pelo seu
precursor, Arne Naess, filósofo e ecologista norueguês, que se destacou na defesa da natureza
como um elemento que, por si só, reclama respeito e que possui direitos diante da espécie
humana. Basicamente, oito pontos sustentam a cosmovisão de Naess: o bem-estar e o
florescimento da vida humana e não humana têm o mesmo valor intrínseco; a riqueza e a
diversidade das formas de vida contribuem para a realização desse valor e também são um
valor em si mesmo; os seres humanos não têm o direito de destruir ou reduzir essa riqueza, a
não ser que seja para satisfazer necessidades vitais; o florescimento de uma vida não humana
requer uma população humana menor; a interferência da vida humana no mundo não humano
é excessiva e piora cada vez mais; a política que afeta a economia básica e as estruturas
tecnológicas e ideológicas devem mudar, e essa mudança será profundamente diferente do
que hoje se presencia; a principal mudança ideológica está em focar na qualidade de vida e
não em um aumento de um alto padrão de vida (acumulação de riqueza ou de bens materiais);
aqueles que subscrevem ou concordam com esses pontos de vista devem direta ou
indiretamente tentar implementar essas mudanças necessárias (NAESS, 2009).
Naess possuía uma visão ampla do significado da “vida”, não se restringindo a
uma compreensão que atribua a tal palavra apenas a realidade dos seres viventes, mas também
abarcando os rios, as paisagens, os ecossistemas. Ou seja, “vida” seria uma realidade que não
se limitaria ao mundo dos seres bióticos, envolvendo também o universo dos entes abióticos
(NAESS, 2009).
Partindo da premissa acima relatada, pode-se afirmar que, no contexto do
ecocentrismo, há uma perspectiva que preconiza não só a existência dos seres humanos, mas
também de todos os outros seres vivos que habitam a Terra (biocentrismo), e outra abordagem
que preconiza a proteção e os direitos da natureza como um todo (fisiocentrismo), englobando
também elementos naturais como a água, o ar, as rochas, o clima (MALISKA; MOREIRA,
2017).
25

Acrescenta o referido autor que Los derechos de la naturaleza e el buen vivir,


consagrados na Constituição do Equador de 2008, surgem, então, como uma alternativa ao
paradigma que hoje prevalece, mostrando-se como uma proposta à sociedade de consumo, a
qual cada vez mais absorve os recursos naturais existentes no planeta e coloca em xeque a
existência da vida, inclusive dos próprios seres humanos (MALISKA; MOREIRA, 2017).
A partir dessa ideia, é válido ressaltar que o presente caso se baseia nos principais
pontos colocados na Constituição Equatoriana, quais sejam: o reconhecimento da natureza
como parte integrante de uma nação, indissociável dos valores albergados por essa, além de
promover a conservação e garantir que a natureza, como ressaltado no caso em destaque, e os
direitos dos rios sejam considerados não propriedades, mas sim, parte integrante do que se
considera casa, de maneira em que se respeitem os diversos povos existentes no Equador e
suas visões, tais como os indígenas, frente principal de referência para a mudança na
Constituição Equatoriana e base da cultura. Aliás, tal cultura deve ser respeitada e incentivada
diante de uma realidade que se sobrepõe à cultura indígena, para que não ocorra como desde
os primórdios ancestrais de desrespeito aos povos indígenas e suas tradições.
Não existe uma visão certa ou errada. Essas visões se unem em Harmonia para
que os fatores bióticos e abióticos sejam respeitados, sejam eles quais forem, humanos ou não
humanos.
Diante dessa perspectiva narrada dos direitos que foram alcançados por
intermédio da Constituição Equatoriana, resta-nos ensejar que tal exemplo seja seguido pelos
demais países da América Latina e, quiçá, além-mar. Para tanto, por hora, inicia-se a narração
do caso bem-sucedido que ocorreu no Equador em respeito aos direitos das águas e dos rios
como exemplo para as demais nações mundiais.

3.2 O Caso, ab initio

O presente caso narrado iniciou-se por conta da obra de alargamento da estrada


Vilcabamba-Quinara, que, devido à sua construção, depositou grande quantidade de pedras e
materiais de escavação no rio Vilcabamba, na Província de Loja. É válido ressaltar que não
houve um estudo prévio de impacto ambiental da obra acima referida.
A obra, tal como mencionada anteriormente, realizou-se durante três anos, sem os
estudos de impacto ambiental, cuja execução estava a cargo do Governo Provincial da região
e violava diretamente os direitos do rio, já que aumentava a corrente fluvial e provocava
riscos de desastres causados pelas enchentes do rio na época das chuvas de inverno.
26

O rio estava sendo assoreado por conta daqueles depósitos de materiais de


construção em grande quantidade, bem maior do que ele poderia suportar. Ao se iniciarem
tais períodos de chuvas, as águas do rio, em uma velocidade acima do esperado anteriormente
em outros períodos semelhantes, alçava um espaço nunca antes atingido pelas águas, o que
surpreendeu os moradores próximos ao rio, principais observadores do que estava
acontecendo com a vida do rio.
Resíduos, pedras, areia, cascalho, dentre outros materiais provenientes da
construção da estrada e árvores atingiam as margens do rio diretamente. Assim, os efeitos
começaram a ser sentidos, pois as inundações afetaram as populações que vivem às margens
do rio e se utilizam da água, como mencionado acima.
Em 30 de março de 2011, os cidadãos estrangeiros Richard Frederick Wheeler e
Eleanor Geer Huddle (Norie)19, decidiram entrar com uma ação e alegaram a violação dos
“derechos de la naturaleza” perante o Poder Judiciário equatoriano20, uma vez que as
medidas prévias – denúncia e inspeções – não surtiram o resultado esperado. Eles entraram
com uma ação de proteção da natureza, particularmente a favor do Rio Vilcabamba,
importante fonte de subsistência para as populações locais, e contra o Governo Provincial de
Loja.
Os fundamentos jurídicos do pedido da ação de proteção que tramitou em
primeira instância invocaram o preâmbulo da Constituição do Equador, que celebra a
Pachamama (Pacha Mama) como uma nova forma de convivência cidadã em sintonia com a
natureza, além de sustentar a existência de um novo regime de desenvolvimento por meio do
qual as pessoas exercem sua responsabilidade e gozam dos seus direitos em harmonia com a
natureza, o respeito integral aos direitos da natureza, bem como a sua restauração,
manutenção e regeneração dos seus ciclos vitais, estrutura, funções e processos evolutivos

19
“Richard Frederick Wheeler y Eleanor Geer Huddle (Norie) son dos ciudadanos extranjeros que llegaron al
Ecuador en el año 2007 y actualmente residen en las afueras de Vilcabamba. Adquirieron una propiedad a la
que llamaron el Jardín del Paraíso que se encuentra a las orillas del río Vilcabamba en la vía a Quinara. Lo
que les atrajo de la propiedad fue justamente el ambiente pacífico y el río que les permitía contar con agua
fresca. Norie y Richard decidieron venir a Ecuador, y vivir en el campo, para lanzar un proyecto modelo que
demuestre cómo es posible crear una vida interesante y sostenible, con la idea de que sirva de paradigma al
resto del mundo; la motivación de este proyecto radica en que, en la actualidad, muchas personas jóvenes están
trasladándose a las ciudades, abandonando los campos. Este es un dilema global, y está causando graves
problemas tanto en las ciudades como en las áreas rurales. Por ello, Richard y Norie al establecerse en
Vilcabamba decidieron crear un proyecto comunitario pacífico y basado en la buena vecindad en donde emerja,
de manera orgánica, un elevado sentido de colaboración e inclusión.” (SUAREZ, 2013, p. 4)
20
Estrutura Jurídica: a) Corte Suprema de Justiça – última instância do Poder Judiciário; b) Tribunais Superiores
– apreciam, em grau de recurso, matérias julgadas pelos tribunais locais; c) Tribunais locais – apreciam matérias
de direito comum em primeira instância; d) Tribunais do Júri. (Justiça Federal do Brasil, 2018).
27

(arts. 10, 71 e 73)21, e o reconhecimento da água como elemento vital para a natureza (art.
318)22 (SUAREZ, 2013).
Na instância inferior, a juíza do Terceiro Juízo Cível de Loja negou a ação por
falta de legitimidade da causa, pois a sentença declarou a falta de legitimação passiva, assim
como a ausência de citação adequada dos demandados e, portanto, a impossibilidade de
defesa adequada, formalidade rechaçada pela Corte Provincial, já que o representante legal de
Loja, seu Prefeito, foi regularmente citado e compareceu em juízo. Dessa forma, a decisão
não satisfez os autores, que interpuseram recurso de apelação à Corte Provincial.

3.3 O Acórdão e seus Fundamentos

O Tribunal aceitou o recurso revogando a sentença desfavorável aos direitos da


natureza e ordenou ao Governo Provincial de Loja iniciar o cumprimento das recomendações
já antes apresentadas ao Subsecretário de Qualidade Ambiental, sob os seguintes
fundamentos:
a) os demandados foram citados adequadamente;
b) a ação de proteção era a única via idônea e eficaz para proteger os direitos da
natureza, em razão da existência de um dano específico; devido à importância
indiscutível, fundamental e irrenunciável da natureza, já que seu processo de
degradação era evidente no caso;
c) a importância da natureza, assim como da sua proteção frente a processos de
degradação, cujos danos acometem gerações do presente e do futuro; anotando
que os danos a ela causados são danos geracionais, ou seja, aqueles cujos
efeitos, por sua magnitude, terão impacto sobre a geração atual e as futuras;
d) atividades que acarretam a probabilidade ou perigo de provocar contaminação
ou danos ambientais sujeitam-se a medidas de precaução, ainda que não exista
certeza da produção desses efeitos negativos; pelo princípio da precaução, até
que haja prova objetiva de que não existe risco ou perigo de danos ambientais
decorrentes de obras executadas em uma determinada área, é dever dos juízes
21
“Art. 10 La naturaleza será sujeto de aquellos derechos que le reconozca la Constitución., art. 71 La
naturaleza o Pacha Mama, donde se reproduce y realiza la vida, tiene derecho a que se respete integralmente su
existencia y el mantenimiento y regeneración de sus ciclos vitales, estructura, funciones y procesos evolutivos.,
art. 7: EI Estado aplicará medidas de precaución y restricción para las actividades que puedan conducir a la
extinción de especies, la destrucción de ecosistemas o la alteración permanente de los ciclos naturales.”
22
“El agua es patrimonio nacional estratégico de uso público, dominio inalienable e imprescriptible del Estado,
y constituye un elemento vital para la naturaleza y para la existencia de los seres humanos. Se prohíbe toda
forma de privatización del agua.”
28

constitucionais salvaguardar de imediato os direitos da natureza e tornar


efetiva sua tutela judicial. Para isso, os magistrados devem efetuar o que seja
necessário para impedir que tais direitos sejam violados, ou para remediar as
violações já existentes. O acórdão considerou inclusive que, em relação ao
meio ambiente, não se trabalha só com a certeza do dano, mas também com a
probabilidade de ele acontecer;
e) inversão do ônus da prova, reconhecido pela Constituição equatoriana,
atribuindo ao Governo Provincial de Loja a obrigação de aportar provas acerca
da inocuidade das ações de abertura da estrada local; os postulantes não teriam
de provar os prejuízos, e sim o Governo Provincial de Loja, como gestor da
atividade, é que tinha de fornecer provas certas de que a abertura da estrada
não afetaria o meio ambiente;
f) consideraram inaceitável o fato de o Governo Provincial de Loja não ter
cumprido a obrigação de obter perante o Ministério do Ambiente equatoriano
uma licença ambiental para a ampliação da via;
g) que a ampliação da estrada poderia ser executada, desde que se respeitassem
os direitos da natureza e em cumprimento às normas ambientais ante a
alegação do Governo de que a população precisa de estradas, respondeu-se
que não há ponderação a se fazer no caso. Não há colisão de direitos
constitucionais, pois não se trata de não alargar a estrada Vilcabamba-Quinara,
mas de respeitar os direitos constitucionais da natureza. O entender do
julgamento é que, apesar da alegação do Governo Provincial de que a
construção da estrada é para o bem coletivo, não se pode ferir de morte os
direitos da natureza para atingir esse propósito. Quando do choque de direitos
coletivos, prevalecem os direitos da natureza, porque abrangem uma
coletividade maior, incluindo as gerações futuras (Trata-se de Ação
Constitucional de Proteção à natureza, julgada, em 30 de março de 2011, na
Corte Provincial de Justiça de Loja, no Equador, Juicio 11121-2011-0010).
De acordo com o acórdão proferido, como narra Viana (2013):

O Tribunal estabeleceu, como medidas de reparação, que o Governo Provincial de


Loja deve cumprir as recomendações da autoridade ambiental e apresentar às
populações afetadas, em 30 dias, um plano de recuperação das áreas danificadas no
rio Vilcabamba, devido ao acúmulo de detritos resultante das obras da estrada. A
reparação envolveu também o dever do Governo de apresentar imediatamente as
licenças ambientais para a construção da estrada ao Ministério do Ambiente do
29

Equador (MAE), além de cumprir todas as recomendações feitas pelo Subsecretário


de Qualidade Ambiental do MAE.
Também devem ser implementadas ações corretivas como diques para evitar
vazamento de combustível na área onde se localizam tanques e máquinas e realizar a
limpeza do solo contaminado pelos vazamentos ocorridos, a fim de evitar uma maior
contaminação; deve-se indicar lugares adequados para depositar o material
resultante da construção, para que não seja despejado no rio causando novas
enchentes; sinalizar o local da construção da estrada, entre outras.
O Tribunal salientou que é aberrante o Governo Provincial, sendo a autoridade
ambiental local, não cumprir com sua obrigação de proteger o meio ambiente,
chegando ao extremo de construir uma estrada sem licença e estudo de impactos
ambientais.
Ademais, a decisão judicial ordenou que a entidade demandada peça desculpas
publicamente, mediante publicação em um jornal local, por iniciar a construção de
uma estrada sem o licenciamento ambiental.
O pedido de desculpas público significa um importante instrumento democrático, já
que funciona como “prestação de contas” das entidades que descumpriram as leis
ambientais e também, no caso, a Constituição. Portanto, a Corte resolveu dar
provimento ao recurso interposto em nome do rio e revogar a sentença impugnada,
declarando que os demandados estão violando o direito que a natureza tem de que se
lhe respeite plenamente sua existência e a manutenção de seus ciclos vitais,
estrutura, funções e processos evolutivos.
Ao que se tem notícia, essa foi a primeira decisão favorável em nome da natureza no
Equador e no mundo. Ela mostra o êxito da instrumentalização dos direitos da
natureza, realizada de forma pioneira pela Constituição equatoriana de 2008.
(VIANA, 2013, p. 31)

Apesar do julgamento favorável na jurisdição de segunda instância do Equador, os


autores da ação de proteção tiveram de ingressar com uma ação de descumprimento em 2012
perante a Corte Constitucional equatoriana, visto que a decisão da Corte Provincial não foi
cumprida integralmente, não havendo notícias, até o momento, do julgamento da referida
“acción de incumplimiento” (SUAREZ, 2013). Como enfatiza Moraes (2013), é evidente aqui
a eficácia de existir na norma constitucional a proteção aos direitos da Mãe Terra. A
existência de uma ação específica para a proteção desses direitos se faz urgente frente ao
ritmo de degradação no qual vivemos.
O juiz da Corte provincial de Loja fundamenta o julgado no artigo 71 da
Constituição equatoriana, que garante os direitos de “La Madre Tierra (Pachamama)” e
reconhece a natureza como sujeito de Direitos, dizendo ser dever dos Juízes constitucionais
atender ao resguardo e fazer efetiva a tutela judicial dos direitos da natureza, efetuando o que
for necessário para que não seja contaminada.
Extremamente necessário é perceber que o texto constitucional equatoriano não
dissocia a natureza do humano, pelo contrário, a natureza é colocada como lugar no qual
vivemos e nos reproduzimos. E, sendo esta nossa Mãe (Pachamama), tem direitos próprios de
existência, manutenção e regeneração. É preciso respeitar seus ciclos. O humano e a natureza
estão fundidos, fazemos todos parte desta grande Terra. Assim, os danos causados a ela serão
30

prejuízos a todos nós e às nossas futuras gerações, sendo este outro ponto enfatizado na
decisão.
Diante do caso judicial abordado, vê-se a importância do reconhecimento
constitucional dos direitos da natureza, aí incluídas as águas. Os direitos humanos hão de ser
exercidos de maneira a que sejam também assegurados os direitos de Pachamama, visto que
os seres vivos, inclusive os humanos, compõem um só ser e, ferindo-se os direitos de um ser
que abrange todos os outros, está por se violar de morte toda a coletividade humana. Somos
todos irmãos e irmãs, filhos e filhas da mesma Mãe Terra. Assim, inaugura-se uma nova fase
em que se repensa do Direito, com novas bases, a partir de uma concepção na qual a natureza
(Pachamama) é o centro, sujeito prioritário de direitos e de dignidade (MORAES, 2013).
Nesse contexto, o rio Vilcabamba, ao ser reconhecido como sujeito de Direitos,
demonstra um grande passo a nível internacional diante das sociedades cada vez mais
afastadas da natureza e das necessidades desta, o que foi decidido por intermédio do acórdão
proferido que demonstra uma mudança de paradigma em um momento inicial. Porém, para
que tal iniciativa ocorresse, foram necessárias conquistas constitucionais como as inicialmente
comentadas e coragem diante das negativas constantes, que, apesar de existirem leis, é
necessária uma persistência por parte dos litigantes, como foi no caso do rio Vilcabamba:
Richard Frederick Wheeler e Eleanor Geer Huddle (Norie), juntos a seu advogado, Carlos
Bravo, não aceitaram a decisão da primeira instância e recorreram para o Tribunal. Os
litigantes, dessa forma, ao apresentarem a Ação de Proteção, em 7 de dezembro de 2010, pela
violação dos direitos da natureza e contra o Governo Provincial de Loja, como narrado acima,
fundamentaram a ação nas seguintes disposições constitucionais:
a) preâmbulo da Constituição em que se celebra a Pachamama e se decide
construir uma nova forma de convivência cidadã em harmonia com a natureza;
b) instituição de um novo regime de desenvolvimento que tem como sua base o
Bem Viver e que requer que as pessoas exerçam suas responsabilidades e
gozem de seus direitos em marco da harmonia com a natureza (Art. 275 inciso
terceiro);
c) direitos da natureza: respeito integral à sua existência; manutenção e
regeneração de seus ciclos vitais, estrutura, funções e processos evolutivos;
restauração (Art. 10, 71-73). - Reconhecimento da água como elemento vital
para a natureza (Art. 318) (SUAREZ, 2013).
31

O rio conquistou, assim, por intermédio de seus representantes legais, uma


proteção para que continuasse a seguir o seu curso sem interferências humanas, tais quais
como a do Governo da província de Loja.
É notório ressaltar que tal alcance foi possível por conta de previsões legais, junto
a uma prática concreta. Não adiantaria a previsão constitucional se não fosse cumprida de fato
e não poderia haver, por suposto, o seu cumprimento se não houvesse uma previsão legal. Por
esse entendimento, legislações internacionais, constitucionais e legislações
infraconstitucionais se fazem necessárias para que as águas, os rios e a natureza em si sejam
protegidos. O dano ambiental atinge a todos, atinge a coletividade e novas legislações se
tornam imprescindíveis para que não ocorram desastres como os do rio Vilcabamba e como
no caso a seguir, do rio Atrato, na Colômbia.
32

4 OS RIOS COMO SUJEITOS DE DIREITO E O CASO DO RIO ATRATO

Para iniciar o estudo do presente caso se faz necessária a análise do contexto


envolvido, como elencado abaixo23.

4.1 O Contexto

O departamento colombiano de Chocó, lugar onde se desencadeiam os casos da


presente ação de tutela, tem uma extensão de 46.530 km², o que equivale a 4,07% do total de
extensão da Colômbia. Em sua organização territorial, é formado por 30 municípios
distribuídos em cinco regiões: Atrato, San Juan, Pacífico Norte, Baudó (Pacífico Sul) e
Darién24.
É um território onde convivem múltiplos grupos raciais, conta com uma
população de cerca de 500.000 habitantes dos quais 87% da população é afrodescendente,
10% indígena e 3% mestiça. Em sua composição, 96% da superfície continental estão
constituídos por territórios coletivos de 600 comunidades negras agrupados em 70 conselhos
comunitários maiores com 2.915.339 hectares e 120 reservas indígenas das etnias Embera-
Dóbida, Embera-Katío, Embera-Chamí, Wounan e Tule, que correspondem a 24 dos 30
municípios de Chocó; os 4% restantes está habitado pela população campesina mestiça.
O Chocó encontra-se em uma das regiões mais biodiversificadas do Planeta
conhecida como o Chocó biogeográfico25. É um dos territórios mais ricos em diversidade
natural, étnica e cultural da Colômbia e alberga quatro regiões de ecossistemas úmidos e

23
O presente capítulo é baseado na decisão do caso do rio Atrato, disponível em
<http://www.corteconstitucional. gov.co/relatoria/2016/T-622-16.htm>, com livre tradução de Lara Matos.
24
Censo General 2005: “Proyecciones Nacionales y departamentales de población 2005-2020”. Departamento
Administrativo Nacional de Estatística, DANE, 2010.
25
“El Chocó biogeográfico es una región biogeográfica neotropical (húmeda) localizada desde la región del
Darién al este de Panamá, a lo largo de la costa pacífica de Colômbia y Ecuador, hasta la esquina
noroccidental de Perú. El Chocó biogeográfico incluye además la región de Urabá, un tramo de litoral caribeño
en el noroeste de Colômbia y noreste de Panamá, y el valle medio del río Magdalena y sus afluentes Cauca-
Nechí y San Jorge. El Chocó biogeográfico cubre 187.400 km2. El terreno es un mosaico de planicies fluvio-
marinas, llanuras aluviales, valles estrechos y empinados y escarpes montañosos, hasta una altitud de
aproximadamente 4.000 msnm en Colômbia y más de 5.000 msnm en Ecuador. Las planicies aluviales son
jóvenes, desarrolladas y muy dinámicas: San Juan, Atrato, San Jorge, Cauca-Nechí y Magdalena. La alta
pluviosidad, la condición tropical y su aislamiento (separación de la cuenca amazónica por la Cordillera de los
Andes) han contribuido para hacer de la región del Chocó biogeográfico una de las más diversas del planeta:
9.000 especies de plantas vasculares, 200 de mamíferos, 600 de aves, 100 de reptiles 120 de anfibios. Hay un
alto nivel de endemismo: aproximadamente el 25% de las especies de plantas y animales.” Disponível em:
<http://www.comunidadambientalcolombia.com/sites/default/files/T-622-16.pdf >. Acesso em: 10 mai. 2018.
33

tropicais, onde 90% do território é zona especial de conservação26 e conta com vários parques
nacionais.
O rio Atrato é o mais abundante em águas da Colômbia e também o terceiro mais
navegável do País, depois do rio Madalena e do rio Cauca. O Atrato nasce no ocidente da
cordilheira dos Andes e desemboca no golfo de Urabá, no mar do Caribe. Sua extensão é de
750 km, dos quais 500 são navegáveis. A parte mais larga do rio tem uma largura de 500
metros e a parte mais profunda se estima em cerca de 40 metros.
Às margens do Atrato vivem múltiplas comunidades afro-colombianas e
indígenas, entre elas as demandantes, onde também existem comunidades mestiças
descendentes de migrantes de diversas regiões do País. Entre as formas tradicionais de vida e
sustento próprias dessas comunidades se destacam o minério artesanal, a agricultura, a caça e
a pesca, com as quais asseguraram por séculos o abastecimento total de suas necessidades
alimentares.
Atualmente, o departamento de Chocó apresenta índices de população segundo os
quais 48.7% vivem em condição de pobreza extrema. A partir dessa visão contextual, na
sequência, seguem os motivos que levaram os demandantes a entrarem com a presente ação
de tutela em estudo.

4.2 Os Motivos

A ação em defesa do rio Atrato foi interposta por uma entidade da Sociedade Civil
denominada Centro de Estudos para a Ciência Social Tierra Digna, representando conselhos
comunitários locais, a saber: Consejo Comunitário Mayor de la Asociación Campesina
Integral del Atrato (Cocomopoca), a Asociacón de Consejos Comunitários de Bajo Atrato
(Asocoba), o Foro Iner-étnico Solidaridad Chocó (FISCH), dentre outros, em face da
Presidência da República e outros órgãos públicos. (CAMARA; FERNANDES, 2018).
Nesse contexto, manifesta-se a representante das comunidades étnicas
demandantes que a ação de tutela se interpõe para deter o uso intensivo e em grande escala de
diversos métodos de extração mineira e de exploração florestal ilegais, que incluem
maquinaria pesada – dragas e retroescavadeiras – e sustâncias altamente tóxicas, como o
mercúrio, no rio Atrato (Chocó), sua bacia e afluentes, que vem se intensificando desde vários

26
Grande parte do departamento de Chocó tem sido declarado reserva florestal de caráter nacional pela lei 2 de
1959.
34

anos e que tem consequências nocivas e irreversíveis no meio ambiente, afetando os direitos
fundamentais das comunidades étnicas e o equilíbrio natural de dos territórios que habitam.
Em igual sentido, afirma-se que entre os fatores de contaminação associados às
atividades de extração mineira ilegal na bacia do rio Atrato, uma das mais graves é o
derramamento de mercúrio, cianeto e outras sustâncias químicas tóxicas relacionadas com a
mineração, o que representa um alto risco para a vida e para a saúde das comunidades toda
vez que a água do rio é utilizada para o consumo direto e é também a principal fonte para a
agricultura, a pesca e para as atividades cotidianas das comunidades. Em consequência,
considera-se que a contaminação do rio Atrato está atentando contra a sobrevivência da
população, dos peixes e o desenvolvimento da agricultura, que são elementos indispensáveis
para as comunidades locais.
Ressalta-se que a situação de crise ambiental que se desencadeou como
consequência das atividades narradas tem efeitos dramáticos como a perda de vidas de
populações infantil, indígena e afrodescendente. Segundo informações da Defensoria do povo,
nas comunidades indígenas de Quiparadó e Juinduur, as quais se situam na sub-região do
baixo Atrato (Riosucio), durante o ano de 2013, constatou-se a morte de três menores de idade
e a intoxicação de mais 64 pela ingestão de água contaminada. Da mesma forma, o povo
indígena Embera-Katío, localizado na bacia do rio Andágueda, afluente do Atrato, no ano de
2014 reportou a morte de 34 crianças por razões similares.
Afirma-se que, como consequência da contaminação produzida por atividades de
exploração mineral e florestal ilegais, vem-se apresentando uma crescente proliferação de
doenças como diarreia, dengue e malária nessas comunidades. À situação anterior, acrescenta-
se que a região não conta com um sistema de saúde adequado para atender essas doenças.
Em adicional, aponta-se que a exploração florestal se caracteriza pela utilização
de maquinaria pesada, ações que põem em perigo de extinção as espécies vivas da zona, tanto
vegetais como animais, e vem modificando o curso natural dos rios, o que implica em graves
consequências às comunidades ali presentes. De fato, dos 18 braços navegáveis que tem o rio,
hoje em dia, só é possível a navegação em um deles por conta da sedimentação e
assoreamento das fontes hídricas produzidos pela inadequada disposição das madeiras e seus
dejetos.
Também se destaca que foram apresentadas várias ações populares, algumas
falhas e outras que se encontram em curso desde muitos anos, sem que com elas se tenha
conseguido articular a ação estatal para salvaguardar as populações e empreender a
recuperação dos rios. Por último, acrescenta-se que tais reclamações judiciais não foram
35

efetivas: com o passar do tempo, esta grave problemática que enfrentam as comunidades,
vinham aumentando de forma exponencial, o que levou a uma vulneração massiva e
sistemática de seus direitos.
Em síntese, solicitou-se ao juiz constitucional que se tutelassem os direitos
fundamentais da vida, da saúde, da água, ao meio ambiente saudável, à cultura e ao território
das comunidades étnicas demandantes, e em consequência se emitisse uma série de medidas
que permitissem articular soluções estruturais diante da grave crise em matérias de saúde,
socioambiental, ecológica e humanitária que se vive na bacia do rio Atrato, seus afluentes e
territórios próximos.
Levando-se em consideração os dados e os motivos narrados, foram proferidas
sentenças em relação à ação de tutela do rio Atrato em primeira e segunda instância conforme
exposto em seguida27.

4.3 A sentença de Primeira Instância

O Tribunal Administrativo de Cundinamarca, Quarta Sessão, Subsessão B,


mediante sentença de 11 de fevereiro de 2015 declarou improcedente o pedido, pois o que se
pretendia com ela era a proteção dos direitos coletivos e não fundamentais. Dessa forma, os
legitimados ativos deveriam utilizar a ação popular e não a de tutela em procura da defesa de
seus interesses.

4.4 A sentença de Segunda Instância

O Conselho de Estado, Segunda Sessão, Subsessão A, confirmou a sentença de


primeira instância proferida pelo Tribunal Administrativo de Cundinamarca que declarou
improcedente a ação de tutela interposta pelos demandantes. A sessão concluiu que não existe
vulnerabilidade dos direitos coletivos alegado pelo Centro de Estudos Para a Justiça Social
(Terra Digna) já que os demandantes não demonstraram o prejuízo irremediável nem a
ineficácia das ações populares para a proteção dos direitos que alegaram vulneráveis. Diante
das negativas anteriores, os demandantes acionaram a Corte Constitucional da Colômbia,
como exposto no item a seguir.

27
Tem como função principal administrar a justiça de acordo com a legislação vigente. Formam o poder judicial
a Corte Suprema de Justiça, o Conselho de Estado, a Corte Constitucional, a Fiscalização Geral da Nação e o
Conselho Superior de Judicatura, os tribunais e os juízes.
36

4.5 A sentença da Corte Constitucional e seus Fundamentos

Por intermédio da ação de tutela proposta por diversas entidades da sociedade


civil organizada, a Corte Constitucional Colombiana proferiu a sentença T-622 relativa ao
Expediente T-5.016.242, em 10 de novembro de 2016, relatada pelo juiz Jorge Iván Palácio
na Sala Sexta de Revisão da Corte Constitucional da República da Colômbia, e acolhida na
íntegra pelos demais membros da Corte.
Dessa forma, ao contrário das decisões das instâncias anteriores acima narradas, a
sentença da Corte Constitucional acolheu o pedido e decidiu em favor do Rio Atrato,
considerando-o um sujeito de Direitos. Como se demonstra a seguir, de acordo com a própria
decisão em análise e de seus argumentos jurídicos. Dentre os argumentos jurídicos
encontram-se os Instrumentos Internacionais, tais como os demonstrados em sequência.

4.5.1 Instrumentos Internacionais

Na atualidade, o conceito e o alcance dos conceitos bioculturais estão sendo


amplamente reconhecidos, não só na Colômbia, como também pelo direito internacional. De
fato, uma série de instrumentos internacionais que integram o ordenamento jurídico
colombiano contribui para fundamentar constitucional e legalmente a relação intrínseca que
existe entre a diversidade biológica e cultural que dá lugar a bioculturalidade e aos direitos
bioculturais.
O primeiro dos tratados ratificados pela Colômbia nesta matéria é a Convenção
169 da OIT sobre os povos indígenas tribais (1989), que estabelece um enfoque biocultural ao
reconhecer o vínculo especial do modo de vida dos povos indígenas e tribais com seus
territórios e seus recursos. Em particular, o artigo 13 impõe aos estados respeitar os valores
espirituais que os povos indígenas têm com suas terras e territórios. Com efeito, a convenção
contém várias exposições que abrigam não só os povos indígenas como também as
comunidades negras como foi reconhecido e interpretado pela Corte Constitucional da
Colômbia em sua jurisprudência. Além disso, essa convenção reconhece um vínculo integral
entre o modo de vida dos povos indígenas e tribais, sua identidade cultural e concepção
espiritual com seus territórios e as diversas formas de vida ou biodiversidade presentes
naqueles habitats.
37

Da mesma forma, outro instrumento é a Declaração das Nações Unidas Sobre o


Direito dos Povos Indígenas (2007) que a Colômbia adotou com algumas restrições. Em
termos gerais, a declaração reconhece o direito dos povos indígenas e sua identidade cultural,
a serem diferentes e a serem respeitados como tais. Entre suas disposições, também reconhece
que o respeito aos conhecimentos, às culturas e às práticas tradicionais indígenas contribuem
para o desenvolvimento sustentável, equitativo e a gestão adequada do meio ambiente. O
reconhecimento que faz a declaração sobre a identidade e integração cultural sustenta a
importância de que os povos indígenas tenham controle sobre suas terras, territórios e
recursos para manter e reforçar suas instituições, culturas e tradições.
No mesmo sentido, a recentemente aprovada Declaração Americana Sobre os
Direitos dos Povos Indígenas (2016) reconhece o direito desses povos à autoidentificação, à
livre determinação, autonomia, organização e autogoverno, à proteção de sua identidade,
integralidade e patrimônio cultural, e ao controle de suas terras, territórios e recursos, dentre
outros, o que enfatiza a garantia de seus direitos coletivos e ao reconhecimento de outros
direitos, dentre eles, os bioculturais.
O conteúdo dos instrumentos internacionais anteriores, assim como as
experiências regionais e globais, evidencia o crescente reconhecimento da necessidade de
proteção e das relações intrínsecas interdependentes dos povos indígenas e das comunidades
étnicas com seus territórios, seus recursos e com a biodiversidade. As relações e os
significados particulares de plantas, animais, montanhas, rios e demais elementos
constitutivos do território em cada cultura são reconhecidos como parte do modo de vida das
comunidades nativas.
Ademais, ressalta-se que o direito à água é um requisito sine qua non para o
exercício de outros direitos, já que a água é necessária para produzir alimentos (direito à
alimentação), para assegurar a higiene ambiental (direito à saúde) e para desfrutar de
determinadas práticas culturais (direito a participar da vida cultural).
Além de tais instrumentos acima narrados, é válido ressaltar os principais
impactos da mineração, como exposto adiante.

4.5.2 Os impactos da mineração

A respeito dos impactos da mineração, são listados alguns como:


a) a destruição das fontes hídricas: por conta da ação da dragagem e devido ao
aporte médio aproximado de 3100 toneladas/ano por mineração, reduz-se a via
38

navegável dos rios e põe-se em risco o abastecimento da água de alimentos,


assim como a comunicação fluvial. Outrossim, como se observou a
Defensoria, pode-se encontrar montanhas de pedras em metade do rio as quais
estão afetando a velocidade dele e a oxigenação da água;
b) os rios nos quais se desenvolve a mineração constituem um risco para a saúde
humana e do ambiente: os rios mudaram sua cor devido à sedimentação, à
presença de materiais sólidos em suspensão na água, de graxas, óleos, resíduos
de combustíveis e de mercúrio, resultados do processo de mineração do ouro.
Cada ponto de mineração aporta aproximadamente 36 quilo/ano de mercúrio.
Além disso, a exploração mineral forma poças de água que propiciam a
proliferação de mosquitos, ocasionando problemas de saúde pública e
salubridade, migração e destruição de fauna e flora;
c) a perda de biodiversidade genética por intervenção e destruição de
ecossistemas frágeis: da mesma forma que as anteriores, essa atividade
acompanhada do desmatamento provoca rápida degradação do ecossistema, a
diminuição das populações das florestas, a extinção das espécies endêmicas e
deslocamento das populações, incidindo de forma negativa na segurança
alimentar das comunidades presentes nas bacias dos rios;
d) as consequências do uso do mercúrio: as consequências a longo prazo são tão
graves para o meio-ambiente quanto para a população que vive nos entornos
das minas. O emprego abusivo do mercúrio, assim como sua combinação com
o cianeto, provocaa um extensa degradação ambiental pela contaminação dos
ecossistemas. Este uso combinado exacerba a metilação do mercúrio que,
“uma vez metilado, o mercúrio pode se mover rapidamente através da cadeia
trófica, provocando impacto nos peixes, na fauna e na flora silvestres, com os
consequentes efeitos na vida de milhares de pessoas, tanto das que participam
diretamente das atividades de minério como das que vivem próximas ou
consomem em outros lugares os produtos destas zonas. Em geral, os rejeitos
que contêm mercúrio são derramados no rio ou próximo a ele. Devido a isso,
os solos, os rios e os lagos são contaminados por longos períodos de tempo.
Estes efeitos negativos podem perdurar durante várias décadas, inclusive
depois de cessadas as atividades mineradoras”28. Acrescenta-se que a

28
IPEN. “Introducción a la contaminación por mercurio y al Convenio de Minamata sobre Mercurio par alas
ONG”, 2014; Rojas, Claudia y Montes, Carolina, “El uso del mercurio en la minería artesanal del oro en
39

exposição ao mercúrio provoca na saúde humana efeitos prejudiciais,


principalmente no sistema nervoso central, e a nível renal, cardiovascular,
cutâneo e respiratório. As mulheres em idade fértil e as crianças são as mais
vulneráveis.
Por fim, faz-se necessário elencar as ordens proferidas na decisão para que haja
um entendimento geral das conquistas positivas para o rio Atrato e a tutela dos seus direitos.

4.5.3 A decisão

Destacam-se os principais pontos da decisão proferida pela Corte Constitucional


da Colômbia:
a) revogar a sentença que negou o amparo na ação de tutela instaurada pelo
Centro de Estudos para a Justiça Social “Tierra Digna” representando várias
comunidades étnicas contra o Ministério do Ambiente e outros, conceder aos
autores da ação o amparo de seus direitos fundamentais à vida, à saúde, à
água, à segurança alimentar, ao meio ambiente saudável, à cultura e ao
território;
b) declarar a existência de uma grave vulnerabilidade dos direitos fundamentais à
vida, à saúde, à água, à segurança alimentar, ao meio ambiente saudável, à
cultura e ao território das comunidades étnicas que habitam a bacia do rio
Atrato, e seus afluentes. Esta grave violação é imputável às entidades do
estado colombiano acionadas por suas condutas omissivas ao não promover
uma resposta institucional idônea articulada e efetiva para enfrentar os
múltiplos problemas históricos, socioculturais, ambientais e humanitários que
afligem a região e que, nos últimos anos, têm-se agravado pela realização de
atividades intensivas de mineração ilegal;
c) reconhecer o rio Atrato, sua bacia e afluentes como entidade sujeita de
Direitos à proteção, conservação, manutenção e restauração a cargo do estado
e as comunidades étnicas;
d) ordenar ao ministério do ambiente, ao ministério da fazenda, ao ministério da
defesa, à Codechocó e Corpouraba, aos governos de Chocó e Antioquia, e aos
municípios demandados, com o apoio do Instituto Humboldt, das

Colômbia”, Serie “Minería y Desarrollo” de la Universidad Externado de Colômbia. Tomo 2. (POULIN, J.;
GIBB, H., 2014).
40

universidades de Antioquia e Cartagena, do Instituto de Investigações


Ambientais do Pacífico, da WWF Colômbia e das demais organizações
nacionais e internacionais, que determine à Procuradoria Geral da Nação, e em
conjunto com as comunidades étnicas demandantes, que dentro de um ano
seguinte à notificação de sentença, se planeje e ponha em prática um plano
para descontaminar a bacia do rio Atrato e seus afluentes, os territórios
ribeirinhos, recuperar seus ecossistemas e evitar danos adicionais ao ambiente
da região. Este plano incluirá medidas como:
— o reestabelecimento da bacia do rio Atrato;
— a eliminação pelos bancos de rejeitos formados pelas atividades
mineradoras;
— o reflorestamento de zonas afetadas por atividades de mineração legais e
ilegais. Adicionalmente, esse plano incluirá uma série de indicadores claros
para medir sua eficácia e deverá planejar-se e executar-se em comum acordo
com os moradores das zonas, assim como garantir a participação das
comunidades étnicas que ali se estabelecem de acordo com a convenção 169
da OIT.
e) ordenar ao Ministério da Agricultura, ao Ministério da Fazenda, ao
Departamento de Planejamento Nacional, ao Departamento para Prosperidade
Social, aos governos de Chocó e Antioquia e aos municípios demandados que,
em comum acordo com as comunidades demandantes, planejem e
implementem dentro dos seis meses seguintes, a partir da notificação da
sentença, um plano de ação integral29 que permita recuperar as formas
tradicionais de subsistência e alimentação;
f) ordenar ao Ministério do Ambiente, ao Ministério da Saúde e ao Instituto
Nacional de Saúde a Codechocó e Carpourabá, com o apoio do Instituto
Humboldt, das universidades de Antioquia e Cartagena, do Instituto de
Investigações Ambientais do Pacífico e da WWF Colômbia, que realizem
estudos toxicológicos e epidemológicos do rio Atrato, seus afluentes e
comunidades, os quais não podem tardar seu início em mais de três meses,

29
“Este plan deberá incluir una estrategia, con planes y programas definidos y con enfoque étnico, de
sustitución de los ingresos para los pobladores de la región que dependan de esta actividad de tal manera que
no terminen aún más afectados. De igual forma, deberá respetar las actividades ancestrales de minería
artesanal que las comunidades étnicas realizan desde hace varios siglos.” Disponível em:
<<http://www.corteconstitucional. gov.co/relatoria/2016/T-622-16.htm>. Acesso em: 10 mai. 2018.
41

nem exceder mais de nove meses para sua conclusão, a partir da notificação da
decisão. Nesses estudos é requerido que se determine o grau de contaminação
por mercúrio e outras substâncias tóxicas, e seu efeito na saúde humana das
populações;
g) ordenar à Procuradoria Geral da Nação, à Defensoria do Povo e à
Controladoria Geral da República que, conforme suas competências legais e
constitucionais, realizem um processo de acompanhamento ao cumprimento e
execução de todas as ordens pronunciadas anteriormente em curto, médio e
longo prazo a partir da notificação da sentença. Dessa forma, a Procuradoria
Geral da Nação terá de convocar, dentro dos três meses seguintes da
notificação da sentença, um grupo de peritos que assessore o processo de
execução, de acordo com sua experiência nos temas específicos sempre com a
participação das comunidades demandantes, com objetivos de estabelecer
cronogramas, metas, indicadores de cumprimento necessários para a efetiva
implementação das ordens proferidas;
h) o Governo Nacional, através do Presidente da República, do Ministério da
Fazenda e do Ministério Nacional de Planejamento deverão adotar as medidas
adequadas e necessárias para assegurar os recursos suficientes e oportunos que
permitam a execução e manutenção de todas as medidas de implementação
para dar cumprimento ao ordenado pela sentença. Para tal efeito, deverão
prever-se anualmente medidas orçamentárias condizentes com a elevada
complexidade e natureza estrutural do caso.
É válido acrescentar a percepção da decisão em relação aos direitos bioculturais,
ressaltando a premissa central sobre a qual se sustentam a concepção da bioculturalidade e
dos direitos bioculturais, ou seja, a relação de profunda unidade entre a natureza e a espécie
humana. Esta relação se expressa em outros elementos complementares como:
a) os múltiplos modos de vida expressados como diversidade cultural estão
intimamente vinculados com a diversidade de ecossistemas e territórios;
b) a riqueza expressada por intermédio da diversidade de culturas, práticas,
crenças e linguagens é o produto da interrelação coevolutiva das comunidades
humanas com seus ambientes que constituem uma resposta adapativa às
mudanças ambientais;
c) as relações das diferentes culturas ancestrais com as plantas, os animais, os
microorganismos e o ambiente contribuem ativamente à biodiversidade;
42

d) os significados espirituais e culturais dos povos indígenas e das comunidades


locais sobre a natureza formam parte integral da diversidade biocultural;
e) a conservação da diversidade cultural conduz à conservação da diversidade
biológica, pelo qual a política, a legislação e jurisprudência devem se basear
com o objetivo da conservação da bioculturalidade.
Em consequência, as políticas públicas sobre a conservação da biodiversidade
devem se adequar e centrar-se na preservação da vida, de suas diversas manifestações, mas
principalmente na preservação das condições para que essa biodiversidade continue
desempenhando seu potencial evolutivo de maneira estável e indefinida. De igual forma, as
obrigações do Estado sobre proteção e conservação do modo de vida dos povos indígenas, das
comunidades negras e campesinas implicam em garantir as condições para que estas formas
de ser, perceber e apreender o mundo possam sobreviver.
A partir de tal decisão e dos pontos elencados por ela, é possível notar a mudança
de paradigma na prática, por intermédio da ação de tutela que, conquanto bem-sucedida,
somente o foi em nível de Corte Constitucional, sendo denegada nas instâncias inferiores
apesar do direito líquido e certo à proteção do rio Atrato, sua bacia e seus afluentes a
seguirem seus cursos sem a interferência humana.
43

5 CONCLUSÃO

A partir do presente trabalho, conclui-se que a água é indispensável para a vida e,


por conta da situação de urgência hídrica em que vivemos, faz-se necessário um novo
paradigma jurídico em relação ao tratamento que se dá às águas do Planeta.
Decorrente desse ponto, o presente trabalho elenca a possibilidade de a natureza
ser possuidora de Direitos, tais como já se defende na Constituição do Equador e em algumas
decisões judiciais, na América Latina e no mundo que reconhecem a natureza como tal.
A natureza possui, portanto, direitos, segundo os argumentos elencados no
presente trabalho e, como possuidora de tais, necessita uma forma de exercê-los, quais sejam
por intermédio de representantes legais e a sua relação com a incapacidade jurídica desta.
Como exemplos dessa visão, estão os casos dos rios Vilcabamba, no Equador, e Atrato, na
Colômbia.
A Constituição do Equador, como principal exemplo da visão ecocêntrica, é
referência por respeitar a cultura indígena e ressaltar o Bem Viver como direito
constitucional, dessa forma, contribuiu para o caso do rio Vilcabamba e demais casos
posteriores.
Com relação ao rio Vilcabamba, ocorre que o rio estava sendo assoreado por
conta de depósitos de materiais de construção em grande quantidade, bem maior do que ele
poderia suportar devido à obra da estrada Vilcabamba-Quinara. Dois estrangeiros, a partir
dessa situação, resolveram ingressar com um processo de tutela em relação ao rio Vilcabamba
para que findasse tal construção e houvesse uma recuperação do rio ao seu estado anterior à
obra. A natureza saiu vitoriosa e foi reconhecido o rio Vilcabamba como sujeito de Direitos a
partir do que se defende a Constituição Equatoriana.
O rio Atrato, devido à mineração ilegal do ouro, sofreu diversas contaminações
por metais pesados tais como o mercúrio e o cianeto, presentes na mineração e contaminando
não apenas o rio, porém toda a comunidade que vive às margens do rio, como indígenas,
afrodescendentes e crianças. Além dos seres humanos, várias espécies da fauna e da flora
também sofreram com a contaminação proveniente da mineração do ouro.
A decisão, baseada em provas concretas do que estava acontecendo como em
instrumentos internacionais e em análise dos impactos que ocorreram devido à mineração,
decidiram em favor do rio Atrato, sua bacia e seus afluentes. Dessa maneira, mais uma vez a
natureza saiu vitoriosa.
44

Por fim, e a partir de tais casos narrados, conclui-se a necessidade de oferecer à


natureza, no caso específico do presente trabalho, aos rios, a possibilidade, por intermédio de
um representante legal, de seus direitos serem protegidos, tal qual ocorre com os
juridicamente incapazes que, não possuindo a plena capacidade jurídica para exercerem por si
mesmos seus direitos, utilizam-se de tutores, curadores, Ministério Público, dentre outras
figuras jurídicas para protegê-los.
45

REFERÊNCIAS

CAMARA, A. S. V. M.; FERNANDES, M. M. S. S. O reconhecimento jurídico do rio Atrato


como sujeito de direitos: reflexões sobre a mudança de paradigma nas relações entre o ser
humano e a natureza. Revista de Estudos e Pesquisas sobre as Américas, v. 12, n.1, p. 221–
240, 2018. Disponível em < http://periodicos.unb.br/index.php/repam/article/view/27788>.
Acesso em: 10 mai. 2018.

Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Penal: Equador. Justiça Federal do Brasil,


[s.l.], 2018. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/sua-protecao/cooperacao-
internacional/cooperacao-juridica-internacional-em-materia-penal/orientacoes-por-
pais/equador>. Acesso em: 03 jun. 2018.

DUSSEL, E. Ética da libertação: na idade da globalização e da exclusão. [s.l.]: Vozes, 2002.

GUDYNAS, E. Colombia reconoce los derechos de la Naturaleza en su Amazonia. 2018.


America Latina en movimento, Equador, 06 abr. 2018. Disponível em:
<https://www.alainet.org/es/articulo/192087>. Acesso em: 06 abr. 2018.

GUDYNAS, E. La dimensión ecológica del buen vivir: entre el fantasma de la modernidad y


el desafío biocéntrico. Revista de Ciencias Sociales OBETS, Alicante, v. 4, p. 49–53, 2009.
Disponível em < http://rua.ua.es/dspace/handle/10045/13393>. Acesso em: 10 mai. 2018.

GUDYNAS, E. Tensiones, contradicciones y oportunidades de la dimension ambiental del


Buen Vivir. La Paz: CIDES - UMSA y Plural, 2011. p. 231–246, 2011. Disponível em: <
http://www.gudynas.com/publicaciones/capitulos/GudynasTensionesAmbienteBVivirCides11
.pdf>. Acesso em: 10 mai. 2018.

LOVELOCK, J. Gaia: cura para um planeta doente. [s.l.]: Cultrix, 2006.

MALISKA, M. A.; MOREIRA, P. D. O caso Vilcabamba e el buen vivir na constituição do


Equador de 2008: pluralismo jurídico e um novo paradigma ecocêntrico. Sequência,
Florianópolis, n.77, p. 149-176, nov. 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S2177-70552017000300149&nrm=iso>. Acesso em: 10 mai. 2018.

MIRANDA, P. Tratado de Direito Privado: Parte geral. [S.l.]: Borsoi, 1954.

MORAES, G. O. O Constitucionalismo Ecocêntrico na América Latina, O Bem Viver e a


Nova Visão das Águas. Revista da Faculdade de Direito, Fortaleza, 2013. v. 34, n. 1, p 123–
155. Disponível em < http://www.revistadireito.ufc.br/index.php/revdir/article/view/11>.
Acesso em 10 mai. 2018.

NAESS, A. The deep ecological movement: some philophical aspects. 2009. Disponível em:
<http://www.uv.mx/personal/jmercon/files/2011/08/Naess_DeepEcology.pdf>. Acesso em: 03
jun. 2018.

Relatório Mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos 2018
(WWDR 2018). [s. l.] ONU. Disponível em:
<http://unesdoc.unesco.org/images/0026/002615/261594por.pdf>. Acesso em: 30 mai. 2018.
46

SANTAMARÍA, R. El derecho de la naturaleza: fundamentos. [s.l.], 2010. Disponível em:


<http://repositorionew.uasb.edu.ec/bitstream/10644/1087/1/%C3%81vila-%20CON001-
El%20derecho%20de%20la%20naturaleza-s.pdf >. Acesso em: 07 out. 2010.

SERRES, M. O contrato natural. Lisboa: Instituto Piaget, 1990.

SUAREZ, S. Defendiendo la naturaleza: Retos y obstáculos en la implementación de los


derechos de la naturaleza Caso río Vilcabamba. 2013. Disponível em:
<http://library.fes.de/pdf-files/bueros/quito/10230.pdf>. Acesso em: 07 out. 2010.

VIANA, M. G. A Terra como sujeito de Direitos. 2013. Monografia (Graduação em


Direito) – Faculdade de Direito, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2013.
47

ANEXO A – IMAGENS DA CONTAMINAÇÃO DO RIO ATRATO

Figura 1 – Folio 2010 del Cuaderno de pruebas Núm. 5. En la gráfica se puede


apreciar un entable o campamento minero ilegal con presencia de dragas y
retroexcavadoras. Enerno 29 de 2016.

Fonte: Corte Constitucional da Colômbia. Disponível em


<http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2016/T-622-16.htm>.
48

Figura 2 – Folio 2014 del Cuaderno de pruebas Núm. 5. Draga o “dragón” – como los
denominan las comunidades locales – realizando actividades de remoción de arena en
el lecho del río Quito (afluente del Atrato). Enerno 29 de 2016.

Fonte: Corte Constitucional da Colômbia. Disponível em


<http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2016/T-622-16.htm>.
49

Figura 3 – Folio 2126 del Cuaderno de pruebas Núm. 5. Imagen de la transformación


que producen las actividades mineras en la selva chocoana. Enero 29 de 2016.

Fonte: Corte Constitucional da Colômbia. Disponível em


<http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2016/T-622-16.htm>.
50

Figura 4 – Folio 2129 del Cuaderno de pruebas Núm. 5. Destrucción del cauce del río
Quito (afluente del Atrato). Enerno 29 de 2016.

Fonte: Corte Constitucional da Colômbia. Disponível em


<http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2016/T-622-16.htm>.

Você também pode gostar