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Coordenadores Científicos:

Paulo Bonavides
Jorge Mlranda
Walber de Moura Agra

Coordenadores Editoriais:
Francisco Bilac Pinto Filho
Otávio Luiz Rodrigues Júnior
Colaboradores:

Adib Kassouf, Adriano Pilatti, Agassiz AlmeidaFilho, Alexandre Auto de Alencar, Alexandre Belmonte, Alexandre
Coutinho Pagliarini, Alexandre José Melo, Alexandre Kehrig Veronese Aguiar, Alexandre Morais da Rosa, Alexandre
Santos de Aragão, Ana Cláudia Redecker, Ana Paula de Barcellos, AndersonSant'Ana Pedra e Adriano Sant'Ana
Pedra, André L. Costa-Corrêa, André Portella, André Ramos Tavares, André Roux, André Vicente Pires Rosa, An­
dreas Joachim Krell, Antonio Jorge Pereira, ArnaldoSampaio de Moraes Godoy, Arnaud Martin, Bertrand Mathieu,
Bonifácio de Andrada, Carlos Alberto Dabus Maluf, Carlos Eduardo Ambiel, Carlos Valder do Nascimento, Chris­
tian Edward Cyril Lynch, Cinthya Nunes Vieira daSilva, Clarisier Azevedo Cavalcante de Moraes, Clarissa Mar­
ques, Cláudio Brandão, Clémerson Merlin Clêve, Cristiana Maria Fortini Pinto eSilva, Cristina M. M. Queiroz, Da­
, . ,

ComentarlOS a
nielSarmento, DaniloFonteneleSampaio, Dimitri Dimoulus, Djalma Pinto, Eduardo Bianca Bittar, Edvaldo Brito,
Fabiano Mendonça, Fabrício Mattos, FernandoFacuryScaff,Fernando Gonzaga Jayme, Flávia Piosevan, Florisbal
deSouza Del' Uomo,Francisco Bilac PintoFilho,Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti,Fredie Didier, Geisa de
r Salomão, Guilherme Braga Pena de Moraes, Helder
Assis Rodrigues, Geraldo Brindeiro, GílbeJ1.OJle rovici, Glauco
Risler de Oliveira, Helena Delgado RamosFíalno Moreira, Hugo de Brito de Machado, Hugo de Brito Machado Constituição Federal de 1988
Segundo, Ibsen Noronha Casas, Ives Gandra da.Silva Martins, Jairú GilbertoSchãfer, Jessé Torres Pereira Júnior,
João Maurício Leitão Adeodato, JorgeFraffid1n Alve� Felipe, Jorge Miranda, José Carlos Francisço, José dosSantos
Carvalho Filho, José Levi Mello do Amaral Junior, José Luiz Quadros de Magalhães, José Ribas Vieira, José Rober­
to Covac Jr., Karina Marzano Franco, Krystian Complak, Larissa Maria de Moraes Leal, Leo van Holthe, Leonardo
José Carneiro da Cunha, Leonardo Nemer Caldeira Brant, Luis Alberto David de Araújo, Luiz Armando Badin, Luiz
Carlos dosSantos Gonçalves, Luiz Guilherme Arcaro Conci, Luiz Guilherme Marinoni, Luma Cavaleiro de Macedo
Scaff, Maitê CecíliaFabbri Moro, Marcelo Casseb Continentino, MarceloFigueiredo, Marcelo Novelino, Marco Au­
rélio Mello, Marcos Nóbrega, Maria Antonieta Lynch de Moraes, Maria Elizabeth Teixeira Rocha, Maria Lúcia de
Paula Oliveira, Maria Vital da Rocha, Martônio Mont'Alverne, Michel Temer, Michele Carducci, Misael Albuquer­
que MontenegroFilho, NagibSlaibiFilho, NarceloFelca, Nelson Nery Costa, Nelson Nery Júnior, Octavio Campos
Fischer, Olavo A. V. A. Ferreira, Otavio Luiz Rodrigues Junior, Patrícia Rosset, Paulo Adib Casseb, Paulo Ferreira
da Cunha, Paulo Lopo Saraiva, Paulo Macedo Garcia Neto, Paulo Napoleão Nogueira daSilva, Pedro Buck, Rafa­
el Peteffi, Raimundo Bezerra Falcão, Raymundo Juliano Rego Feitosa, Regina Quaresma, Ricardo Maurício Freire
Soares, Robério Nunes dos Anjos Filho, Roberta CruzSilva, Rubens Beçak, Samantha Ribeiro Meyer-Ptlug, San­
dra Regina Vial, Sérgio Cruz Arenhart, Sergio Pinto Martins, Soraya Lunardi, Teodomiro Cardozo, Teresa Anco­
na Lopez, Vlad Constantinesco, Vladimir da Rocha França, Walber de Moura Agra, Walter Claudius Rothemburg

Rio de Janeiro
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INTERPRETAÇÃOCONFORMEA CONSrITUIÇÃO E
•. DECLARAÇÃO DÉ'INCONSTITUCI()NA.LlbAOE
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. José Levi Mello. doAmaraljúnior


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.

. ., .. Professor de Dire ito ConstitUcional na.Faculdàde de Direito do-Largo de São Francisco,da USP,

.' .,. . .
.
e no Mestrado em Direito do Centro Universitário déiRrnsilia.Doutor em
'. 'Direito du EStado pela USP. ProcUrador dà Fazenda Nacional.
.

L DECiARAÇÃODE INCONSTl'rUCIONALIDADECOMESEM_�Ó DE TEXTO


C �stavoZagrebelsky ensiriaque a fó �mula "lei" conipÔffil ente�dimento acer­
. '
ca, de duas coisas, çlivei-::;as. tia} d�, um lad(), adisposiçãolegisl �tiva,_ deliberada e
emanada nos modos previstos pelaSo-regras sobreproduçãodo díreita;consistente
em fól'rrttila:s linguísticas
extr!lídápor meio da sua. interpretação, isto é, a disposição ih'tétpretátÍa".l
Portanto, em sede de controle da constitucionâlidade;acompadbilidade de
uma norma em face daConstit-uição pode e deve ser examinada ,sob as seguintes
perspectivas�
(1) quanto ao texto nonnativo em si mesmo: se procedente a arguição deín­
constitucion<tUdade, e çaso de declaração de inconstitucionalidade com redução de
texto, que coiheô próprio texto impugnado em sua literaHdadetextual;
"(2) quanto à interpretação do texto,normativo:seprocedeflte a arguição de
incoristítlicibrialidade, é caso de declaração parcial de íncdnstitutiori_àhdade� sem
redução de textQ,2 que colhe uma Qua}gumas hipótesesde inddêricIifdo texto'con­
..
trolado. No entanto,em sua literalidade,o textoépreserVadQ. -'
.

1 ZAGREBELSKY, Gustavo. La GiuStiziâ C-ostitutiónale.


2 «
É dita parcial " porquepreserva,-ao niênos;o'cómando normativo que deflutdàliteralidade
textual do dispositivo em causa; Adedaração -pardal deínconstitliciolialidatté sem redução de
l
textO' "referê�sê, norma mente, à-casos não 'mencionados expressamenie 'no-iéttó; que, per estar
formulado· de forma ampla ou geral, contém, em verdade, um complexo de riormas" (MENDES,
José Levi Mello do Amaral Júnior Comentários à Constituição Federal de 1988

Estas duas perspectivas de exame têm lugar tanto no controle difuso como no pecífico caso concreto em julgamento. deixa<leser aplicada.6A tlão�aplicaçãófunda­
concentrado. No entanto, os efeitos emanados em um e outro são bastante distintos. se no juízo dedesvalordewrrente do contrasteda.normaJegalerncface daumstitui"
No controle concentrado, a declaração de inconstitucionalidade produz efi­ ção. Juízo �sse.quetempor consequências�{l) 3. dedaraçãode inconstitucionalidade
cácia contra todos (erga omnes), nulificando a norma objeto de controle, norma da norma; e, por isso mesmo, (2) a sua não-aplicação ao caso concreto.7
essa que é efetivamente eliminada do ordenamento jurídico.3 Em regra, dá-se em Em ambas as hipóteses (declaração de inconstitucionalidade com e.sem re­
abstrato.4 . dução de teJ{to}i e em se �ratando de processo submetido a julgam�nto perantectri­
No controle difuso, o juízo de iricÔ'nsti tud
e.nalidade implica tão só a não-aplica­ bunal, é preciso observar a regra do júll bench, ou seja, a inconstitucionalidade sÓ
ção da norma ao caso concreto.5 A norma permanece no mundo jurídico, mas, no es- pode ser pronunciada pela manifestação da maioria absoluta dos membros da cor­
teoudo re spectiv o ôrgâo especial (Constituição, artigo 97). P orta n to; na via difusa,
'

Gilmar Ferreira.ju[isdíÇ.ão,ConstípUcíonal: o controle abstr:ato denoT11?asnoBrasil ena Alemanha. é necessário procede-f'ao incidente de arguição de inconstitucionalidáde: (Cõdigode.
p
São Paulo: Saraiva�í 9�i6; p. 196-t 97}. Neste cas o, ajurzo 'de ínconstitudonaliàafle�olhe, justa­ Processo Civil. artigos 480 a 482). '
mente, uma ou mais destas n.ot!ll�S i lJ1PUCÍtil� .no �ispositivo nprlD31tivo. O dispositivo normativ� O descumprhnerito do artigo 97 da Constituição é prática comum no controle
é preservado em sua Iíteralidáde textual, más é restringindo em suas hipóteses de incidência. E
difuso. Por vezês, ocorre de modo velado. Para prevenir o problema, causa de nu:
. porfsso que Gilmai·Ferreíra Mendes menciona uma i'redução do âmbito de aplicação da norma"
(MENDES, Gilmar Ferreira. ob. cit., p. 199). "Mais ainda: certas decisões chamadas de 'anulação merosos recursos extraordinários, o Supremo Tribu nal Federal - acertadamente
.
parcia l quaHtativa'consistem, sem reduzir o texto, em declarar que a lei é nula na medida em - editou a SúmulaVhlcularitenº10, verbís:
ql.le se apüeaauma dadasituação.� (FAVOREU, Louis. Los Tribunales Constitucionales. Barcelona:
"Viola a cláusula de re serva de plenário (CF, artigo '17) a decisão de
Editorial Arigl, 1994,p.77). Por vezes, a norma a s er co ntrolada deflui não de um dispositivo
textual. mas da cmnbinação de dois ou, até mesmo, mais dispositivos textuais: "Quando se tem órgã() fracionário de trilmnal que, embora não decJareexp'ressamentEl ain�
de proceder à verificação de ser contrário à Constituição, ou não, algum artigo de lei, ou pará­ constitucionalidade de. lei ou at.o nQrmativo do poder público, afasta sua in-,
grafo, ou inciso, ou proposição, não se pode pretender que a unidade da regra jurídica escrita, cidência, no todo ou em. parte::
êómoartigo,pátágrafo, :ou·lntisô; óuproposíção ... portanto, aunidâdé de expressão:'" cÓin<lidâ,
sempre, com a unidade lógica, isto é, a unidade em sistema lógico, como é o sistema juridico. Os
artigos, parágrafos, incisos e proposições, têm,por vêzes, algo que não está neles, e sim noutros 6 BITIENCOURT, Lúcio. o ControleJurisdicional da Constitucionalidade das Leis: 2. ell Rio deJanei­
artigos, párágrafós,inCtsos, proposições; e, não rara, o artigo, parágrafo, inciso, ou proposição, ro: Fo rense, 1968, p.134. Na prática, o controle di fuso também tenrleaeneontrarfonnas pelas
contém mais de Uma regra jurídica, como unidade lógica. A regra jm 'fdi ca qúe se extrai de doisoo quais acaba por produzir efeitos erga omnes: f1} nos Estad os Unidos, desenvolveu-se o stare

mais :artigos, ou de um artigo e parte deQutro,é que é a unid ad e lógíca, que se tem ,deexaminat" decisis; (2) no Brasil, desde 1934, permite-se ao Senadp Federal suspender a execúção da n<mna
logicalll�te, para:s,es;lber se se choca, o.u não se choça çom a C o n stitui çã o, ou com alguma regro declarada inconstitucional íncídenter tantum pelo Supremo TribunalFederal (artigo 91,íV/àa
jurídica);.uperíor. Por outro lado, pode dar-se que somente um inciso, uma proposição, .ou parte Constituição de 1934, que corresponde ao atual artigo 52, X, da Constituição de 1988). No Brasil,
intercàlàldó artigó, ou do parágrafo, seja unidade lógica e fira a Constituição, ou a regra Jurídica o artigo 52, X, d a Constituição de 1988 funciona como sucedâneo normativo aostare didsis:
superior. sem que O artigo ou o parágrafo a fira". (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. mecanismo que fáltoU'à nossa cultura, quando d o transplante do judícia!review, foí prtMdeIr
'

Comentáriosâ Constítuição de 1967; São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967, t. 111, pp.582-5 3). ciado" pela via normativa. "Ao inventar a fórmula, o constituin te de 1934 foi sutit proetirando
No mesmo sentido, ZAGREBELSKY. oh. cit., pp. 279 e S5. salvaguardar a harmonia entre os Poderes. De fato, evitou que o Legislativosesentlsseferidopor
uma decisão do Judíciárto que colhesse d e frente uma lei. Afinal, é um órgâo do Legislativo que
suspende a execução da lei {. .)" (FERREIRA FILHO, Maut:relGonça!\tes.Direítos Humanos Funda­
3 KELSEN,· Han5. "La garanzia giurisdizionale della costituzione". In: La Gi ústízia Costituzio(/ale. mentais. 2. ed.São Paulo: Saraiva, 1998,p.123}. '1\ ausênCia da regra do Staredecisis implica que
Milão: Giuffrê; 1981, p. 191. os juízes não 'estão obrigados a deixar d e aplicar a leideclaradainconstitucional pelo Supremo.
4 "Em regra",c porque a representação intervl'ntiva é me�anismo de controle concentrado da cons­ A soluç ão da Constituição permítiadar e feitos erga omnes a utnadeCisãonocaso concreto" {PO­
tituci()nalidade, mas, no entanto; se dá em concreto: "A Constituição de 11134 institui uma. çã LETII. Ronaldo. A Constituição de 1934. B rasiHa : Centro de ensino à dístância, 1987, p.35}, "Por
direta que, conquanto não inaugure um mecanismo abstrato de fiscalizaçãO da constitucionalidade não haver, no Brasil, a arraigada mentalid ade dorespeítoao. precedente judicial; fôinetessário
(julgamento da ação constítuí pressuposto da decretação da intervenção federal), não se nkonduz criar um instituto furídicoque;de certa forma; constituisse como que' um sacedâneo do príncípio
à configuração da fiscallzação incidentaL Cuida-se de procedimento que fica a melo caminho en dostate decisís" (ALVES/José Carlos Moteirà. "O controle de constitu€ionalidadenoBmSil". in:
a fiscalização da lei in thesi e aquela realizada in casu. Trata-se, pois, de um modelo de fiscalizaç o Revísta da Procuradoria Geral da Repúb lica, nfl9, pp. 134435). .
concreta realizada por meio de ação direta". (CLÊVE, Clemerson Merlin. A Fiscalização Abstrata d 7 "A declaração de inconstitucionalidade de n orllia jurídiCa Íncidf!ntet talttum; e, portanto, por
Constitucionalidade no Dire ito Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. <39). meio do controle difuso de constituc io nal idade, é o pre5sapostopara 'o Juiz, ou o Tribunal, no
S. '!(...)a lei alisiffi censurada não é destruída: sua força moralédiminuída, mas seu efeito material caso concreto, afastar a apl i caçã o da norma tida como'lriconstituciOI'lâI!' (Voto do MinísITfl Mo­
não é, suspenso, Somen te pouco a p ou co e sob os golpes repetidos da jurisprudência é que eJ reira Alves noSTF,Recurso Extraordin ário 179:170-5jCE, Primeira Turma, Relator o Ministro
sucumbe'� (TOCQUEVILLE, Alexis de; A Democracia na América; São Paulo: Martins Rmtes,1998, Moreira Alves, DJ d e 30;10.199S). No mesmo sentidó,STF, RerursoExtraofdihário n�240.096-
p; lr16). 2/RJ, Primeira Turma, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJde 21.05.1999.

1618 1619
......

José Levi Mello do Amaral Júnior Comentários à Constituição Federal de 1988

. Ademais, imp~rta enfatizar que não é a perspectiva de redução de texto no _ da boa, firme e válida, como qualquer outro ato do poder público, ou qualquer ato
m~tivo qu~ requer J~lgamento plenário, mas, sim, a possibilidade de juízo de de~­ jurídico, na órbita privada, até que a sua ineficácia ou nulidade seja reconhecida
vta o r relativamente a norma impugnada, o que pode ou não resultar redu cão de ou declarada pelos tribunais. (.. .). A lei, enquanto não declarada inoperante, não se
exto. >

presume válida: ela é válida, eficaz e obrigatória"Y


No mesmo sentido, Jorge Miranda afirma que a interpretação conforme a
2. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO: CONCEITO E LIMITES Constituição é "um procedimento ou regra própria da fiscalização da constituciona-
lidade, que se justifica em nome de um princípio de economia do ordenamento ou
de máximo aproveitamento dos atos jurídicos - e não de uma presunção de cons-
A interpreta:ão .conforme a Constituição é técnica hermenêutica inerente ao
titucionalidade da norma". 14 Não obstante a interpretação conforme a Constituição
c~ntrole ?a constituciOnalidade. Sempre que possível, a fim de preservar a !e isla-
çao de ongem parlamentar, o julgador deve utilizá-la. g ser "um procedimento ou regra própria da fiscalização da constitucionalidade", o
próprio Jorge Miranda destaca que essa técnica decisória tem por objetivo "discer-
é d Cor~etamente r::anejad.a, a interpretação conforme a Constituição nada mais
nir no limite - na fronteira da inconstitucionalidade - um sentido que, conquanto
~que m_:erpret~~ao da lei. Por isso mesmo (e justamente porque se restringe à
8
não aparente ou não decorrente de outros elementos de interpretação, é o sentido
con ~rn:açao da lei a Con;tituição ), não requer julgamento em fui! bench. Daí a im-
necessário e o que se torna possível por virtude da força conformadora da Lei Fun-
~~rtanCia de compreende-la e diferenciá-la dos métodos decisórios que envolvem
damental".15 No entanto, se "a lei pelos seus termos, permite duas interpretações,
JUIZO de desvalor ~~ consequentemente, declaração de inconstitucionalidade.
uma que a põe na órbita constitucional e outra que a torna incompatível com a lei
Em suma, a ~nterpretaç~o conforme a Constituição é princípio hermenêutica
suprema, deve o juiz preferir aquela e desprezar esta última. Aí, realmente, tem
que rec?m~nda nao declarar Inconstitucional norma que possa ser interpretada em
co~son~n~I~ com a Constituição. 9 Encontra fundamento no princípio da unidade d
10
or .em Jundica. . Busca compatibilizar a norma controlada com a Constituicãoll:
13 BITTENCOURT, ob. cit., pp. 95-96. Apesar da argumentação que lembra Kelsen (La Giustizia Cos-
assl)I~, reverenCI~ a ~rimazia do legislador (cuja vontade se presume constitucio~ tituzionale. Milão: Giuffre, 1981, pp. 164 e ss.), Lúcio Bittencourt não conclui pela desconstituti-
na na concretizaçao da Constituicão vidade da norma inconstitucional, mas, sim, pela declaração da inconstitucionalidade, consoante
d Sustenta L~cio Bitte_ncourt qu~ a .interpretação conforme a Constituição não a doutrina norte-americana. Essa opção tem razão de ser: manter os três Poderes da República
A~~orre de un:~, presunçao de constitucionalidade" a obrigar a aplicação da norma no mesmo nível hierárquico. "Se ocorre uma contradição inconciliável - diz Hamilton - entre a
z que a lei, desde que se apresente formalmente perfeita, há de ser considera~ lei ordinária e a Constituição, é claro que o juiz há de preferir esta àquela, ou seja, a intenção do
povo à intenção de seus representantes. (... ) Essa conclusão - prossegue Hamilton - não signifi-
ca, de modo algum, que o Poder judiciário seja superior ao Legislativo. Significa, apenas, que o
poder do povo é superior a ambos (... )" (BITTENCOURT, ob. cit., pp. 68-69). Por outro lado, há
8 M/ENDEhS, GSi~mar Ferreira. Jurisdição Constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na manifestações no sentido de realmente estar o judiciário acima dos demais poderes ao exercitar
A eman a. ao Paulo: Saratva, 1996, p. 228.
o controle da constitucionalidade das normas. Segundo o Ministro Moreira Alves, "cabe ao Poder
9

.
.
HE~~E,~~om~a:g Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Porto Ale-
~:~t: ~~~rtes 8, p. 71. Na ~outn~a norte-americana, há muito se encontra o mesmo entendi-
amencanas tem retterado a doutrina de que um ato d · · -
judiciário- nos sistemas em que o controle da constitucionalidade lhe é outorgado- impedir que
se desrespeite a Constituição. Na guarda da observância desta, está ele acima dos demais Poderes,
não havendo, pois, que falar-se, a esse respeito, em independência de Poderes. Não fora assim e
de;e ~er j~tlgado ~nconstitucional se, por qualquer razoável interpretaeç~:d~o~~~~;i~~ia:~v~~1~~ não poderia ele exercer a função que a própria Constituição, para a preservação dela, lhe outorga"
proptta let, os d01s puderem ser harmonizados" (WILLOUGHBY w t 1w db ç . (Voto do Ministro Moreira Alves no STF, Mandado de Segurança nº 20.257-2/DF, Tribunal Pleno,
twna/1 ifth u · d ' es e oo ury. The constJtu-
HESSE.ao:.ocit., ~. 7~~e States. 2. ed. Nova York: Baket~ Voorhis anel Company, 1929, vol. I, p. 42). Relator para o Acórdão o Ministro Moreira Alves, Dj de 27.02.1981). "Pode-se comparar este sis-
10
tema com o famoso quarto poder de Benjamin Constant, quem, no início do século XIX, proclamou
11 A interpretaçãodconforme a C~nstituição resulta juízo afirmativo da constitucionalidade da nor- que o rei deveria ser detentor do direito de controle abrangente. Nesse sentido, o Tribunal Federal
~;S~~ ca~sa. e a mterpretaçao adotada (MENDES, Gilmar Ferreira. ob. cit., p. 271). Constitucional é uma espécie de rei. Uma diferença entre essas instituições, entretanto, existe no
12 ' 0 · ctt., P· 73. No mesmo sentido, OTTO, Ignácio de. Derecho Constitucional Sistem que tange ao fato de que o Tribunal Federal Constitucional nunca poderá ser ativo sem que seja so-
Fuentes. 2. ed. Barcelona: Ariel Derecho 1988 p 286 "U . . a de licitado, enquanto que o rei é livre para ter qualquer iniciativa, bem como no que tange aos juízes
Constitui ão não deve _ . ' . ' · · ma vez que o confhto entre a lei e a
tes deven;, se ossível ser~: esumtd~ -_ adta~ta Cooley- segue-se, necessariamente, que as Côr- serem indicados pelo parlamento" (DOEHRING, Karl. "A função do Tribunal Federal Constitucional
.. dp . ; dat a let mtet pt etaçao tal que lhe permite manter-se válida e eficaz ( ) Alemão na qualidade de principal guardião da constituição, nos termos da lei e da democracia': In:
Isto, a ltas, na a mats e do que afin - 'b · ... ·
intencão da legislatura que . ;ai que os dtn unats devem interpretar a lei de acôrdo com a O Federalismo na Alemanha. São Paulo: Fundação Konrad Adenauet~ 1995, pp. 207-208).
'urídi, - ' so po ena ser a e elaborar um diploma capaz de produzir efeito 14 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988, t. 11,
J co enao ~tm que se tornasse inoperante e nulo". (BITTENCOURT. o Controle] -· d' · 1d p. 233.
Constitucwnaiidade das Leis· 2 . ed . Rt'o d e Janetro:
. Forense, 1968, p. 93). l/1/S I CIO na a
15 MIRANDA, Jorge. ob. cit., p. 233.

1620 1621
.
José Levi Mello do Amaral Júnior Comentários à Constituição Federal de 1988

pleno cabimento a presunção de que o legislador deve ter pretendido realizar obra dá à lei um sentido completamente oposto. Em poucas palavras: quando em lugar
18
válida e não um diploma cuja eficácia pudesse ser contestada". 16 do querido pelo legislador, entra uma regulação nova ou distinta". . ,

É fundamental ter em conta que a interpretação conforme a Constituição deve Restringindo-se ao exercício hermenêutica - isto é, não fazendo JUIZO de des-
ficar restrita ao exercício hermenêutica, isto é, dentre as possíveis interpretações valor relativamente à lei ou ato normativo em causa -, a interpretação conforme
do texto - e somente dentre essas - o intérprete deve escolher aquela que mais se a Constituição pode e deve ser utilizada por qualquer órgão jurisdicional, dispen-
conforma ao texto constitucional. Deve fazê-lo sem distorcer o sentido inequívoco sando, nos tribunais, a remessa da questão constitucional para o plenário ou órgão
da norma. Por outro lado, se o sentido inequívoco da norma impossibilita a sua har- especial. .. .
monização com o texto constitucional, a interpretação conforme a Constituição não No entanto, a interpretação conforme a Constituição tem sido ut1hzada, eqUI-
tem espaço, o que torna imperativa a declaração de inconstitucionalidadeY vocadamente, como se fosse espécie de declaração parcial de inconstitucionalidade
A propósito, importa transcrever lição de Klaus Stern: "Encontra seu limite [a sem redução de texto. É o que se passa a examinar.
interpretação conforme a Constituição] ali onde entra em contradição com o teor
literal ou com a vontade claramente reconhecível do legislador, ou quando não se
cumpre o objetivo legislativo em um ponto essencial ou se o falseia, ou quando se 3. DISTINÇÃO ENTRE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO_E
DECLARAÇÃO PARCIAL DE INCONSTITUCIONALIDADE SEM REDUÇAO
DE TEXTO
16 BlTTENCOURT. ob. cit., pp. 118-119. Diversa é a opinião de Elival da Silva Ramos, para quem "a
presunção de constitucionalidade é uma regra associada à imperatividade das normas jurídicas
e permite ao Poder Público executá-las diretamente (autoexecutoriedade ). A alegação de incons- É essencial demarcar a fronteira havida entre a interpretação conforme a
titucionalidade visa destruir a presumida imperatividade da norma legal, mediante o exame do Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto,
ato legislativo no plano da validade, pressuposto de seu ingresso no plano da eficácia, paralisan- dado que, a rigor, apenas a segunda requer, no âmbito dos tribunais, a observância
do-lhe a execução" (RAMOS, Elival da Silva. A Inconstitucionalidade das Leis: vício e sanção. São
Paulo: Saraiva, 1994, p. 205). da regra do full bench. . .
17 "(...) o STF - em sua função de Corte Constitucional - atua como legislador negativo, mas não A declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto 1mphca
tem o poder de agir como legislador positivo, para criar norma jurídica diversa da instituída efetiva censura de pelo menos uma hipótese de incidência do texto impugnado.
pelo Poder Legislativo. Por isso, se a única interpretação possível para compatibilizar a norma Portanto, implica a procedência da argüição de inconstitucionalidade. _
c~m a Constituição contrariar o sentido inequívoco que o Poder Legislativo lhe pretendeu da 1~
Assim, havendo, na declaração parcial de inconstitucionalidade sem reduçao
nao se pode aplicar o princípio da interpretação conforme a Constituição, que implicaria, em
verdade, criação de norma jurídica, o que é privativo do legislador positivo" (STF, Representa- de texto, efetivo juízo de desvalor de norma, e surgindo a quaestio iuris- cuja solu-
ção 1.417-7 /DF, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Moreira Alves, Dj de 15.04.1988). No mesmo ção enseja 0 emprego daquela técnica decisória- incidentalmente~ f~ito sub jud~ce
sentido, STF, Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.344-1/ES, Tribunal em órgão fracionário de tribunal, é inafastável o julgamento plenano da questao.
Pleno, Relator o Ministro Moreira Alves, Dj de 19.04.1996. Da mesma forma Jorge Miranda: "ela Vale afirmar: torna-se necessário o per saltum (ou seja, a prejudicial de inconsti-
[a interpretação conforme a Constituição] terá de se deter aí onde o preceito legal, interpretado
conforme a Constituição, fique privado de função útil ou onde, segundo o entendimento comum, tucionalidade é submetida ao tribunal pleno ou órgão especial). Repita-se: não é a
seja incontestável que o legislador ordinário acolheu critérios e soluções opostos aos critérios e perspectiva de redução de texto normativo que requer julgamento plenário, mas,
soluções do legislador constituinte". (MIRANDA. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. Coimbra: sim, a iminência de juízo de desvalor relativamente à norma impugnada, o que pode
Coimbra Editora, 1988, t. 11, pp. 233-234). Nestes casos, mostra-se inafastável a efetiva decla-
ou não resultar redução de texto.
ração de inconstitucionalidade. É análogo o entendimento de Lúcio Bittencourt: "( ...) quando a
Por sua vez, a interpretação conforme a Constituição, por definição, implica
mens legis é clara e, na sua eloqüência, colide com a lei suprema, não é lícito aos tribunais recor-
rer a uma interpretação forçada ou arbitrária para tornar a lei válida" (BITTENCOURT. ob. cit., _ ou deveria implicar- a improcedência da arguição de inconstitucionalidade, seja
p. 95). Enfim, não é outra a lição que consta dos Artigos Federalistas: "Não se pode dar nenhum incidental, seja direta. Em outras palavras, o juízo emitido é de constitucionalidade
peso à afirmação de que os tribunais podem, a pretexto de uma incompatibilidade, substituir as da norma objeto do controle. É o que demonstram os seguintes julgados:
intenções constitucionais do legislativo por seus próprios desejos. Isto poderia acontecer tanto
no caso de duas leis contraditórias como no caso de toda adjudicação sobre uma única lei. Os
tribunais devem especificar o sentido da lei; e, caso se dispusessem a exercer a vontade em vez
do )ulgamento, isso levaria igualmente à substituição do desejo do corpo legislativo pelo seu
propno. Se esta observação provasse alguma coisa, seria que não deve haver nenhum juiz além
do próprio legislativo". (MADISON, )ames. Os Artigos Federalistas. Rio de janeiro: Nova Fronteira, 18 STERN, Klaus. Derecho de! Estado de la Republica Federal de la A/emana. Madrid: Centro de Estu-
1993, p. 482). dios Constitucionales, 1987, p. 298.

1622 1623
José Levi Mello do Amaral Júnior Comentários à Constituição Federal de 1988

"Em conclusão, e com a interpretação que dou ao caput do art. 1 5 6 da Assim entendendo, o Supremo Tribunal · Federal passou a p roferir juízo de
Constituição do Estado de Sergipe, julgo i mprocedente a presente Repre­ procedência, quanto à questão constitucional, nas ações diretas em que faz inter­
sentação".19 pretação conforme a Constituição ("defiro, em parte", a teor da fórmula empregada
na ADInM C nQ1.719-9/DF) . Ademais, o Supremo tem decidido que a interpretação
"Adotando essa interpretação restritiva de receita bruta - e afasto a ob­
conforme a Constituição especificamente adotada implica a exclusão de todas as
jetiva decorrente do art. 110 do Código Tributário Nacional, pois essa exe­
demais interpretações porventura possíveis.24
gese equipara, no caso, a receita bruta à resultante do faturamento, e assim
Esta leitura da interpretação conforme a Constituição não goza de simpatia
se amolda à Constituição que se refere a este -, acompanho, com a devida uníssona na doutrina. Elival da Silva Ramos, por exemplo, critica o acatamento do
vênia, o eminente M inistro Sepúlveda Pertence".Z() "mito de que só há uma interpretação correta para determinado dispositivo legal, e
No entanto, outros j ulgados do próprio Supremo Tribunal Federal acabam por isso a despeito da advertência kelseniana de que 'todos os métodos de interpreta­

aproximar e, até m esmo, identificar, interpretação conforme a C onstituição e decla­ ção até agora elaborados conduzem sempre a um resultado apenas possível, nunca
a um resultado que seja o único correto"'. 25
ração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto.21
N o mesmo sentido o pensamento de Gilmar Ferreira M e ndes: "A declaração
É o caso dos seguintes j ulgados:
de compatibilidade não corresponde nem a uma censura de outras interpretações
"Em face do exposto, defiro, em parte, o pedido de liminar, para, dàndo nem à fixação de uma única interpretação como válida".26 Em suma, a interpreta­
ao art. 90 da Lei n° 9.099, de 26 de setembro de 1995, interpretação con­ ção conforme a Constituição não elimina do mundo j urídico outras interpretações
forme a C onstituição, suspender, ex tunc, com relação ao sentido de ser ele eventualmente possíveis.
aplicável às normas de conteúdo penal mais favorável contidas n essa Lei".22 Por outro lado, nos casos em que se afigura imperativo o j u ízo de inconstitu­
cionalidade de alguma das normas subjacentes ao dispositivo textual em causa, a
"Ação conhecida em parte, e n ela deferido em parte o pedido de limi­
interpretação conforme a Constituição não tem lugar. Casos tais requerem decla­
nar para, dando-se ao ato normativo atacado - hoje a M edida Provisória n°
ração parcial de inC()J1stitucíonalidade sem redução de texto. Ademais, quando o
1.949-25, de 26 de j unho de 2000 - interpretação conforme a Con stituição,
controle se dá pela via difusa - e estando o feito em tribunal - o j u lgamento deverá
suspender-se, ex n u n c e até o julgamento final desta ação, a eficácia dela fora
ser emfull bench.
dos limites de norma d e transição, e; portanto, no tocante à sua aplicação Diversa é a opinião do Ministro M oreira Alves. Sustenta que o controle difuso
aos empreendimentos e atividades que não existiam anteriormente à entra­ de normas não comporta a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redu­
da em vigor da Lei n° 9 .605/98".23 ção de texto. Explica que o artigo 97 seria relativo apenas aos casos de redução de
textoP No caso de uma inconstitucionalidade sem redução d e texto - confirmada

24 "Nós não podemos dar interpretação 'conforme' contra a lei. A interpretação conforme só se ad­
19 STF, Representação nº 948/SE, Tribunal Pleno, Relator o M ini stro Moreira Alves, Dj de mite quando, dentro do conteúdo significativo de uma lei, há possibilidade d e várias interpreta­
16.0 3 . 1 9 7 7. ções. Então se diz que a ú nica interpretação possível, que é esta, é compatível Com a Constituição.
20 Voto d o M inistro Moreira Alves n o STF, Recurso Extraordinário nº 1 5 0 . 7 5 5 - 1 /PE, Tribunal Pleno, Por isso mesmo é que, nesses casos, em ação direta de i n constitucionalidade se" j ulga p rocedente
Relator para o Acórdão: M i nistro Sepúlveda Pertence, Df de 20.08.1993. No recurso extraordiná­ em parte. Porque se afastam todas as interpretações que se considerem incompatíveis para dizer
rio mencionado, o Supremo Tribunal Federal deu provimento ao recurso para, dando interpreta­ que a única compatível é aquela. Mas é preciso que seja i nterpretação pennitida pela própria
ção conforme a C onstituição, declarar a constitucionalidade do dispositivo legal impugnado. norma" (ALVES, José Carlos Moreira. "Conferência inaugural - XXIV Simpósio Nacional de Direito
21 " Deve-se acentuar, porém, que, em decisão de 9 de novembro d e 1987 [o autor se refere à Repre­ Tributário': In: Direitos Fundamentais do Contribuin te. São Paulo: Centro de Extensão Universitá­
sentação nº 1.41 7-7 IDF], deixou assente o Supremo Tribunal Federal que a interpretação confor­ ria e Revista dos Tribunais, 2000, p. 3 2) .
me a Constituição não deve ser vista como um simples princípio de interpretação, mas sim como 25 RAMOS. A Inconstitucionalidade das Leis: vfcio e sanção. S ã o Paulo: Saraiva, 1994, p. 209.
uma modalidade de decisão do controle de normas, equiparável a uma declaração de inconstitu­ 26 M E N D ES. jurisdição Constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. São
cionalidade sem redução de texto. Assinale-se, porém, que o Tribunal não procedeu, inicialmente, Paulo: Saraiva, 1996, p. 2 2 8.
a qualquer alteração na parte dispositiva da decisão, que continua a afirmar a improcedência da 27 " Note-se q u e no controle d i fuso interpretação q u e restringe a apl icação de u m a n onna a alguns
arguição, desde que adotada determinada interpretação" (MEN DES. ob. cit., p. 267). casos, mantendo-a com relação a outros, não se identifica com a declaração de in constituciona­
22 Voto do M inistro Moreira Alves n o STF, Medida Cautelar na Ação Direta d e Inconstitucionalidade lidade da norma que é a que se refere o artigo 9 7 da Constituição, e isso porque, nesse sistema
nQ 1 . 7 1 9 -9/DF, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Moreira Alves, Dj de 2 7.02.1997. de controle, ao contrário do que ocorre n o controle concentrado, não é utilizável a técnica da
23 STF, Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nQ 2.083-8/ D F, Tribunal Pleno, declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto, por se lhe dar uma interpretação con­
Relator o M inistro Moreira Alves, Dj de 09.02. 2 0 0 1 . forme a Constituição, o que impl ica dizer que inconstitucional é a interpretação da norma de

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José Levi Mello do Amaral Júnior: Comentários à Constifuição Federa l de 1988

pelo Supremo Tribunal Fe<leral .... nãO, .hav�ria o que comunicar ao Senado Federal Ainda assim; a· melhor' solução é distinguir as duas figuras, porquanto, não
para os fíns do ·a(tig.o 52� X) ila Constituição de 1988. , raro, os órgãos fracionários de tribunais, sob o pretexto de proceder a uma inter­
No entanto, como visto, controla-se · não apenas a · constitucionalidade ·. dos pretação qmforme a Constituição, declaram a inconstitucionalid ade - sem a devida
dispositivos textuais, em si mesmos, constantes das; leis ou atos n ormativos; mas" provocação plenária - de uma hipótese de. incidê.llcia de um dispositivo normativo
também, a constitucionalidade das <normas àqueles ;subjacentes. < O importante é (declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto).
determinar não apenas a constitucionalidade do dispositívo normatWo em sua l i:.. .Foi o que ocorreu em decisão cuja Ementa abaixo segue transcrita:
teralidadetextual, mas, também .:. o que é bastante comum - a correção jurídica de
"Processo Civil. Emhargos Declaratórios. Reconhecimento da I ncons­
alguma mfde algumas das diversas normas' que dele defIuem. titucionalidade de Dispositivo de Lei, Sem ReduçãO . d e Texto pela Turma.
Com efeito, () SUpremo Tribunál Federal já lançou mão - no Reéurso Extraor­
Interpretação conforme a Constituição. Art 97 da Constituição.
'

dinário nQ 183.119-1!SC{vaIe dizer, enf contrôle difuso} .... da dedaração- parcial .de
. . 1. O Plenário do nosso Tribunal tem inúmeros precedentes no sentido
inconstitudonalidadesetri redução de téxto.2a ·
de que não se d eve declarar a inconstitucionalid ade da lei quando ela puder
Ademais, a Presidência do. Supremo Tribunal Pederal remeteu, aÔ enadó Fe� � ser consíderada constitucíonal em determinados casos concretos e inçons�
dera!, para o fim dç artigo 52; X, da Constituição de 1988, cópÚlIl0 Á.córdão profe�
_ ,- - _- . _ _ _ _ t_ - - - - '- - - . - - -_ - - - �-
'_
_

titl,lcionais em outros.
rido nos autos d() Recurso Extraordinário imtes citadp.29 Isso pdrque o Senado Fe-� dispositivo uma interpreta­
2. Nesses casps, compete à Turma dar ao
deral tem, sípI, o que suspellder� a 4ipQt�se de incidência juÍgada inconstitució:Q:al
c ção . conforme a C onstituição, . o u seja, declarar. a inconstitucionalidade, sem
pelo S uprelllo Tribunal Federal. É o éaso, por exemplo, dá Resolução nº 52, de 13dt!,

redução de texto"}O
j ulho d e 2 00!)J cuj!) arti&p,lg t�ll} a ,s�guinte. redação:
Daí as seguintes tonsiderações de GilmarPerreira Mendes:
"É pàtcial'mente suspensa; sen1"redução de texto, a execução do art. 1 1
da M edida> Provisõria FederaPnQ 2:225-45, âe' 4 dê junho de 2fiOl, ficando . . "A eguiparação .pura e simples da d �cl
aração deinconstitucionalida de
exduídõ do seú �lcarrc e as hipóteses em quê (} servidofs.e.iecuse, explkita ou sem redução de texto à interpretação conforme a Constituição prepara difí­
tacitamente, a aceitár ó parcelamento previsto' no âisvositívo; em virtUde de· culdades significativas. .
declaração de inCO nstitucionalidade elll deçisão definitiva do Supremo Trii A primeira delas diz respeito à conversão de uma modalidade de in­
bunai Federal, nos ahtós do Recurso Ertraordinário nº 4b1.436;-0 - Goiás". terpretação sistemática, utilizada por todos os tribunais e j u ízes, em técnica
de declaração de inconstitucionalidade. Isso já exigiria uma especial qUéllifi­
Ainda assim, não se pode . negar, a utilização das duas técnic:as d ecisórias não
cação da interpretação conforme à ;C;ol1�tituição, para afirmar que somente
é simples, A p rática demon stra que é bastante tênue a Jronteira havida entre uma e"
teria a carac<terÍstica de uma declaração de inconstitucionalidad e sem r�:
outra, o que ajuda a explicar a confusão jurisprudencial.
dução d e texto aquela interpretação conforme à CoI1stituição desenvolvi.da
pela Corte Constitucional, ou no nosso caso, pelo Supn�mo Tribu nal Federal.
Até porque, do contrário, também as questões que e nvolv�ssem interpreta­
modo que a GOloq�,ern ,choque com a Carta Magna, e não a inconstitucionalidade dela mesma ção conforme a Constituição teriam de ser submetidéls aq Pleno dos Tribu­
que admite interprettlÇão!que a compatibiliza (:Oro esta". (Voto do Ministro Moreira AWes no STF,
nais ou ao seu órgão especial (CE art. 9 7)".31
Recurso ExtraordilllÍJio nl! lS4;093�5/SP, Primeira Turma, Re lator o Ministro M oreira Alves, DJ
de 05,09.1997). Com efeito, no âmbito dos tribunais, aos órgãos fracionários é vedado restrin­
gir, sob o rótulo de uma pretensa "interpretação conforme a Constituição", o campo
de aplicação da norma questionada. A interpretação conforme a Constituição deve
28 A propósito, vide ST F, Recurso Extraordinário nº 183;119",7/SC, Tribunal Pleno; Relatoro Ministro
v
limar Gal ã o; Dj de 14,{)2.1997J .cuja Ementa contém o si!gUinte excerto: "lnconstítucionalidacW ficar restrita ao exercício hermenêutico. Se a conformação da n orma à Constituição
que se declara, sem rooução de texto; por manifesta íncômpatibílidade com o art. 195, § 6°, dá. não for possível pela via interpretativa, torna-se imperativa a declaração da incons-
t
Constituição Federal (princfpio da an erio ri dade mitigada)".
29 Ofícío nQ 02Z/P�MC, de 10 de abril de. 1997, da Presidência do Supremo Tríbunal Federal, endtf.i:.
reçaoo ao .Presidente oo Senado Federal,: com o seguinte teor: "Remeto a Vossa Excelência, para
os fins Previstos n o art.5Z, X, da <::onstitulção Federal, cópia do acórdão transltado em julgado,
proferido no proce sso em epígrafe, e do parecer da Procuradoria -Geral da República emitido nos 30 TRF da 4ª Regiã o, Apelação em Mandado de Segurança nº 96.04.099'OO-0/RS, Segulida: Turma;
mesmos autos. Renovo a Vossa Excelência o testemunhQ do mais alto apreço e elevada conside­ Relatora a Níta Tânia: Escobar, Dfde 11.01.1998.
ração. Ministro Sepúlveda Pertence - Presidenten• 31 MENDES. ob. cit., p . 275.

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José Levi, Mello do ArnaraHúnior

titucionalidade, ainda, que sem ,redução de te{{to" �orrnente n9S cé!sos elll ,que o
preceito objeto déld,ec,isão, nitidallJente, aplica-se à hipótese i mpugnada:

, , "Inclusive respeitando esses limites o instituto da interpretação con-


fonne'a constituição não deixa de criar problemas. Confusão de fuh�õe$ en�
tre o l egislador e o Tribunal ConstitucionaI, entre o TribunaI ConStíttidonal
e os Tribun ai s ordinários 'são prancamente inevitávels: Tendenéiáhnente
podería recomendar7se praticar a moderação e chegar antes a uma nuIida­
de{parcial} de uma lei que a manter a rtificialmente uma norma. Hesse, por
exemp)o, considera 'n esse, sentido que os limites foram , ultrapassados em
ARTIGOS 127 AO 130
muitas sentenças".32

Proceder à declaraçâo de inconstitudonalidaâe em órgão fracionário, sem a Walter Claudius Rothenburg


ação (DSU) em Direito
devida provocação plenária - ainda que por meio de uma defurpada "interpretação Graduação em Direito pela Universidade Federal do Paraná, Pós-gradu
de Paris Mestrado em Direito Público pela Universidade
conforme a Constituição" é ignorar o artigo 97 da Constituição de 1988. i nsista­ Constituc ional pela Universidade 11.
de Federal do Paraná.
-,

se, não é a perspectiva de 'redução de texto normativo que re(fuer seja observada a Federal do Paraná. Doutorado em D i reito do Estado pela Universida
Toledo de Ensino - ITE. Professor convidado do Mestrado
Professor titular da Instituição
regra doftill bench, mas; 's im, a p ossível declaração de incoristitücionalidade de uma Professor
de Direito do N orte Pioneiro (Jacarezin ho-PR),
em Direito da Faculdade
norma (expressa ou implícita), o que pode ou não implicar reduçâo de texto. - U EL, do curso de especialização
eventual da Universid ade Estadual de Londrina
O exposto não i nvalida a idé�a d e que a interpretação.conforme a Constituição ade Metodista de Piracicaba - UNIMEp, do
em Direito Ambienta l da Universid
não é "simples regra de interpretaç�oJJ.33 A interpretação conforme a Con sti tuição, Centro de Extensão Un iversitária - CEU e outros. Procurad or Regional da
por ser especial técnica hetmenêU'tiCa que visá à presetvação da lêi ou ato nonnati­ República em São Paulo,
vo impugnado, pode ,;: e deve - ser l1tilizada por todo e qualquer jUízo, mónoáático
ou colegiado, não requerendo, neste último caso, julgarnento plênário. Isso porque
a interpretação conforme a Constitiüçãô veicula juízo afirrnatívo da constituciona­
Capítulo IV
lidade da norma interpretada, difert=Últem.e nte da d ed�ração p arcialde inconstitu­
cionalidade sem redução de texto, que fu)mina, e(etivarnente: a norma.
Interpretação confúrme a ConstiW'ição e declaração parcial de i nconstitucio­ Das Funções Essenciais à Justiça
nalidade sem reduç�o de texto - métodos decisórios tratados, em geral, tão só sob a
ótica do controle conc�ntrado é em abstrato das normas -' Ilão podem ser negadas Seção I
ao controle difuso, maxime no âmhito dos tribunais, visto qUe; por força da regra
do full bench, o coritrole difuso concentra-se rio pleno do tribunal julgador, Diga-se Do Ministério Público
mais: com 'a remessa da questão cons�i�ucion'a l para <> . plenátió, desencadeia-se tí-
, ,
pico controle em abstrato d a constituCionalidade.
Art. 1 2 7. o Ministério Pzjblico é instituição permanente, essencial à função jurisdicional
do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático
e dos Ín teresses sociais e individuais indispóníveis,

§ 1 º São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibili­


dade e a independência funcional.
,
§ 2º Ao Min istério Público é assegurada a utonomia funcional e administrativa,
. ...:. , :" .

podendo, observado o disposto no art. 1 69, propor ao Poder Legislativo a cria­


ção e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso
público de provas ou de provas e títulos, a política remuneratória e os planos de
carreira; a lei disporá sobre sua organ ização e funcionamento,
32 STERN,. oh,. cit., p. 300.
33 p
STF, Re resentação 1.41 7-7jDF, Tribunal Pleno, Relator o M i n istrQ >Moreira Alves, Df de
§ 3" O Ministério Público elaborará sua proposta orçamen tária dentro dos limi­
tes estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias,
15.04.1 988.

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