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CDU343.9
CDD345
N° DATA
tenho um carinho especial e cada vez que tenho a oportunidade de Destaca-se, ainda, a dimensão dada pela mídia a comissão de determi-
estar com ele aproveito para aprender o máximo as lições desse gran- nados delitos, pois, como se sabe, essa difusão aumenta os anseios da
de mestre. Além disso, tenho que registrar o tratamento de carinho população por mais Direito Penal.
e amizade dispensados à minha família em Málaga, pois só um ho- Essa difusão desmedida do Direito Penal tem relação direta com
mem dessa grandeza pode dimensionar a importância da família nos a experiência cotidiana do povo, que, sem muita reflexão, apoia as
árduos momentos de estudo, e o Ripollés e a Teresa gentilmente nos novas medidas legislativas que tipificam novas condutas ou aumen-
cuidaram em Málaga.
tam as penas das já existentes. De outro lado, com essa urgência em
A obra que agora apresento é uma daquelas que raramente apa- responder os anseios da população e certos de que a. aprovaç~o de
rece tão cedo e precisa de um bom período na história para que surja leis penais mais severas implica diretamente populandade eleitoral
outra que condense tão bem os temas atuais de política criminal. O a classe política rapidamente as aprova, ainda que sem muita discus-
leitor verá que parece que o que está retratado no livro pode perfeita- são técnica, ou seja, temos uma legislação sem qualquer debate por
mente se adequar à nossa realidade, ou, a qualquer realidade contem- uma comissão de juristas, mas, que se justifica porque de forma rápi-
porânea. Assim, essa não é uma obra de política criminal da Espanha, da respondeu, ainda que falsamente, aos problemas de insegurança
mas, uma obra de política criminal universal. do povo.
Os temas tratados aqui já nos fazem refletir sobre os conceitos De forma clara e precisa, a obra trata sobre o debate político-cri-
equivocados sobre a sociedade do risco e a insegurança do cidadão, minal da sociedade do risco. Aqui o leitor poderá ver com clareza as
pois, como veremos, há uma difusão na sensação de insegurança pro- modificações operadas nos últimos anos, pois, como se sabe, houve
pagada pela mídia que parece estar relacionada com a sociedade do um conjunto da realidade social que motivou esse debate. Assim, a
risco, porém, o que se verifica é uma tentativa de aumentar a repres- generalização na sociedade moder:r:a. de novos ris.c?~ que po~~m afe-
são e a utilização do Direito Penal. tar à coletividade, podendo ser quahf1cados de arhf1cla1S; as dlf1culda-
Inicialmente, há uma introdução sobre os novos modelos de in- des de atribuição de responsabilidade por tais riscos a determinadas
tervenção penal, onde o autor perpassa sobre os problemas enfrenta- pessoas individuais ou coletivas e a difusão de um exagerado sen-
dos por todos os modelos dessa crise contemporânea de intervenção timento de insegurança, que necessariamente não guarda exclusiva
e, -chama a atenção o destaque sobre o imobilismo do garantismo para correspondência com esses riscos, caracterizam esse novo conjunto de
responder às novas tendências do Direito Penal, fato esse que já nos fatores que ativam demandas de intervenção estatal.
faz refletir quais seriam as alternativas de resposta ao sistema. As características desse novo modelo de política criminal tam-
Veremos que a utilização de um Direito Penal simbólico mui- bém merecem destaque na obra e, como veremos, refletem-se em
tas vezes ganha carga de efetividade e acaba gerando a utilização de nosso sistema penal. Assim, a criminalização de condutas no estágio
mais Direito Penal. Também há uma crítica sobre a criminalização prévio, antecipação da tutela penal, predomínio de estruturas típicas
dos poderosos, onde haveria uma busca de criminalizar os sujeitos de perigo e modificação os sistemas de imputação e responsabilidade
pertencentes às classes sociais mais elevadas, aumentando-se a pena penal predominam são notas essências dessa nova política criminal.
desses delitos, mas, na prática, o que ocorre é o aumento das penas Diante disso, o autor discorre sobre as posturas doutrinárias dessa
dos delitos tradicionais, pois, como o autor demonstra, sempre há um evolução e aborda as suas principais características.
bom assessoramento para a defesa dos delitos econômicos e, por ou- Por fim, o debate da obra também se centra no polêmico tema
tro lado, afirma-se que a sensação de insegurança decorre da crimina- da expansão securitária do Direito Penal. Nesse aspecto, a obra trata
lidade tradicional. de esclarecer em que sentido se manifesta essa expansão e nos coloca
Como destaquei, o livro transcende a política criminal da Es- diante de fenômenos que estamos vivenciando diariamente no Brasil.
panha e se encaixa perfeitamente à nossa realidade, principalmen- Nesse sentido, o autor expõe que um bloco de comportamentos agora
te quando o autor discorre sobre como os delinquentes são vistos e se encaixa dentro da delínquêncía organízada, conceito que nada diz,
etiquetados pela sociedade, fato esse que nos faz lembrar os aumen- porém, que abarca tudo. Um segundo bloco está identificado pelos
tos de penas quando temos algum delito grave praticado no Brasil. delitos de natureza sexual e violenta, ou seja, destinada aos delitos
tradicionais. Por fim, o terceiro bloco está destinado à criminalidade
dos marginalizados e excluídos socialmente.
Como não poderia deixar de tratar do tema, o autor entra na con-
tr~p~sição entre indivíduo e cidadão no desenho dessa nova política
crI,mmaI, fazen~o .uma abordagem das velocidades do direito penal
ate chegar ao D1reIto Penal do inimigo.
Novament~ ~eixo registrado que se trata de uma obra que abor-
da os temas maIS Importante de política criminal e nos faz refletir so- Sumário
bre o que está acontecendo em termos dos novos rumos do Direito
Pen~l. Em todas as aulas ~m. que re?~timos sobre as ideias de Ripollés,
s~n~Imos ~s mesmas ~ngust1as e dUVidas sobre a política criminal bra- Introdução............................................................................................... .11
slleua, se e qu: ela eXIste. Por tudo isso o livro é de leitura obrigatória
para quem serIamente quer discutir política criminal. Primeira Parte - Os novos modelos de intervenção penal. ............................... .15
.Por fim~ agradeço à Clara Masiero, Raul Marques Linhares e Capítulo I - A crise contemporânea dos modelos de intervenção penal ............ .15
Damela ScarIot, colaboradores na revisão e tradução do livro, pois 1. O modelo penal garantista............................................................... .15
sem eles o trabalho não seria possível. 2. O modelo penal ressocializador........................................................ .18
Capítulo II - O novo modelo penal da segurança cidadã................................ 20
Porto Alegre, outono de 2015. l. Protagonismo da delinquência clássica............................................... 21
2. Prevalência do sentimento coletivo de insegurança cidadã..................... 23
3. Substantividade dos interesses das vítimas......................................... 24
4. Populismo e politização.................................................................. 26
Pro! Dr. André Luís Callegari 5. Revalorização do componente aflitivo da pena.................................... 28
6. Redescobrimento da prisão...............................................................30
7. Ausência de receio ante o poder sancionador estatal ............................ .33
8. Envolvimento da sociedade na luta contra a delinquência.......................35
9. Transformação do pensamento criminológico...................................... .37
Capítulo UI - Estratégias para um modelo penal de bem-estar..........................40
l. Os erros do garantismo....................................................................40
2. O discurso da resistência..................................................................42
3. O reconhecimento do terreno............................................................45
4. As explicações estruturais.................................................................47
5. Os condicionamentos operativos e estratégicos.....................................49
6. A alternativa do modelo penal de bem-estar....................................... .51
7. As estratégias a serem seguidas........................................................ .54
Segunda parte - A teorização do modelo penal da segurança cidadã................. .57
Capítulo IV - O debate sobre a sociedade do risco......................................... .57
l. Introdução.................................................................................... .57
2. O debate político criminal sobre o direito penal da sociedade do risco...... .59
Capítulo V - A vampirização do debate da sociedade do risco pelo modelo
penal da segurança cidadã.......................................................67
l. Integração do fenômeno da insegurança cidadã ao fenômeno
pretensamente mais amplo da sociedade do risco..................................68
2. Transformação da expansão modernizadora do direito penal em uma
expansão securitária........................................................................71
3. A r~laçãAo e~tre indivíduo e sociedade na gênese e abordagem da
delmquencI~..: ...............................................................................76
4. A .co~traposIçao entre indivíduo e cidadão no desenho da política
cnmmal ................................................ 79
Capítulo ~I ~ A recepção .doutrinária do modelo pe~~i' d~' ~~~~;~~~~ '~id'~dã:::::: :83
1. O dIreIto penal do mimigo
2. O direito penal da terceira ~~i~~i'd~d~"""" ........................................ .84
3. A reconstrução do direito da periculo~id~d~ .......................... '" .......... .85
4. Crítica às propostas anteriores ....................................... .88
Introdução
5. O prosseguimento acrítico da ~~d~;~i~~~ã~.·.·.·.· ........................ :::::::::::: ::::: :: :: :: ::~
Terceira Parte - A .di~ensão inclusão/exclusão social como guia da política
, cnmmal comparada............................................................ .99
A obra que apresento agora ao leitor tem um título convencional.
CapItulo VII - A comparação das políticas criminais nacionais.........................99 Temo, entretanto, que reflita com exatidão a atual realidade da polí-
1. O de~a.te s~bre a confluência das políticas criminais nacionais........ .. .... 99
2. A pohhzaçao das políticas criminais nacionais ...
tica criminal em todo o mundo ocidental, pelo menos. O crepúsculo
~.Uma aprox~maçã~ rigo~osa às políticas crimin~'i'~ ~~~i;~~i~:::::::::::::::::: :~~~ do século XX veio acompanhado de dois fenômenos simultâneos, mas
CapItulo VIII - A :nc1us~o. socIal como objetivo político-criminal ................... .104 provavelmente opostos.
1. A ~ode:açao ~urutiva como objetivo............................................... 104 Por um lado, a consolidação de um sistema de exigência de res-
2. A mc1usao socIal como objetivo . ponsabilidade com altas cotas de precisão e segurança jurídica em
~.A inter-relação entre moderaçã~' ~~~i~i~~' ~ '~~l~~'~; '~~~i~i::::::::::::::::::: .~~~ um grande número de países pertencentes ao chamado direito penal
1/
CapItulo IX - Uma ~:oposta de análise tipológica........................................ :114 continental". Este sistema conseguiu acessar a maioria dos Códigos
1. Os
2. Modelo analítico proposto. ..............................................................114
indicadores Penais e, em certos ordenamentos, incorporou-se, inclusive, à prática
.~.: ......................................................................... .116
Os novos modelos
de i ntervenção penal
6 Ver Garland (2001): 6-20 e passim. ída entre a criminalidade dos poderosos, devido ao ambiente socialmente marginal em que se
move e sem prejuízo dos importantes benefícios que certos setores de tal delinquência obtêm.
27 Sobre a limitada aplicação das penas alternativas à prisão nos julgados do penal, ver o ilustra- 28Ver as referências em Garland (2001): 8-9, 175-179, 148-150, 154-165; Silva Sánchez (2001):
tivo estudo empírico coordenado por Cid Moliné/Larrauri Pijoan (2002): passim. 141-147.
29 C~mo no caso da recente regulação da ordem de proteção das vítimas da violência doméstica, 31Dado o protagonismo adquirido pelo ímpeto policial do procedimento, assim como o mcre-
contida na L. 27/2003 de 31 de julho. mento das conformidades. Ver LO 8/2002. Segundo dados fornecidos à imprensa no começo de
30 A partir das LLOO 13/2003 e 15/2003. 2004 pelo Conselho Geral do Poder Judicial, em aproximadamente 50% dos casos tramitados
pelo procedimento de juízo rápido são prolatadas sentenças de procedência.
Isso s,ena especialmente pertinente com respeito ao terrorismo, mas senso comum" à criminalidade, composta substancialmente de
tambem não se pode exlcuir o mesmo em ocasiões referentes a cer- "mão dura" e de amplas doses de incompreensão e incomunicação
tos tipos d~ d~linquência organizada, como determinados segmentos intersubjetivas, é a única receita capôz de frear o iminente caos social,
da economIa Ilegal de drogas ou do tráfico ilegal de mercadorias ou sempre anunciado. Seu desinteresse pelas contribuições de especia-
pessoas, do mundo subdesenvolvido ao desenvolvido. Finalmente à listas neste campo não deriva somente da frequente incompetência
exaltação da inocuização, à cegueira das causas estruturais da delin- desses especialistas, mas, em boa medida, enraíza-se na progressiva
quên~ia e à plen~ i~compreensão da delinquência ideológica, atitu- presunção do povo nas sociedades de massas,47 que o tem levado a
des dIretamente mCldentes sobre os inimigos da sociedade deve-se pensar que é ele quem deve tomar diretamente minuciosas decisões
acrescentar algo mais: os efeitos devastadores que, sobre a p~evenção para a abordagem dos mais diferentes e complexos problemas sociais,
geral ~e comportamentos delitivos dirigida ao conjunto da sociedade, em vez de deixá-los nas mãos dos especialistas e exigir, isso sim, res-
d~v~ra ter a c~nstatação de que se reconhece a qualquer cidadão o ponsabilidade pelos erros cometidos.
dIreIto de se retlrar do ordenamento jurídico, adquirindo um novo sta- Porém, esta situação seria pouco menos que inimaginável se a po-
tus que, somente no ~aso de d~scobri~ento de suas atividades, pode lítica profissional não tivesse abandonado, há algum tempo, uma de
~es~lta~-lhe desfavoravel. Se a ISSO ummos a frequente tendência das suas máximas de atuação irrenunciável: aquela que estabelece que 9S
mstanClas de controle social a poupar-lhe essa decisão ao cidadão, to- políticos são criadores de opinião, e não meros transmissores das opi-
mando-as em seu nome, o quadro se encontra já completo. 45 niões originadas na comunidade. Seus esforços para não permanecer na
oposição levam-nos com demasiada frequência a esquecer ou, ao me-
Reconhecidos nos'sos erros e nossas atitudes de abandono, proce-
nos, a desconsiderar temporariamente suas crenças em vez de suportar
de-se agora a desmasca:-ar um conjunto de agentes sociais que tem se
as consequências eleitorais de manter opiniões, em algum momento,
tornado os porta-bandeIras da nova ideologia da segurança cidadã.
minoritárias. Pouco sobra a dizer-se de um fenômeno tão conhecido.
~m primeiro lugar, os meios de comunicação social: sua avidez
lu.cratIva em alguns casos, seu viés ideológico em outros, a luta por
leItore~ ou pe~a audiê~ci~ em quase todos, fez-lhes apurar ao máxi- 3. O reconhecimento do terreno
mo aSA megavels potenclahdades midiáticas da criminalidade, as quais
mantem.sempre em suas capas. Não importa, a tais efeitos, que a ima- No entanto, se não nos conformamos em resistir e queremos
gem SOCIal que se transmita da delinquência e de sua persecução se avançar na crença de um modelo de intervenção eenal distinto ao da
estabeleça sobre anedotas e acontecimentos isolados descontextuali- segurança cidadã, devemos reconhecer bem o terreno. E, para isso,
zados, que sejam ~ncrementados sem fundamento real a preocupação convém que evitemos desqualificações ideológicas precipitadas, que
e o medo pelo dehto e as consequentes demandas sociais de interven- nos façam acreditar na ilusão de viver em um mundo simples, dividi-
ção, ou q,:e ~e te.nha de ocultar a ignorância e falta de preparação de do entre bons e maus. Citemos algumas:
seu~ profISSIOnaIS no momento de entender os complexos conflitos Um dos fatores determinantes da crise do modelo ressocializador
SOCIaIS que estão narrando. 46 nos países que o tinham assumido de forma consequente foi o deno-
45 Ver, maIS. ampIamente, sobre tudo isso, os capítulos V e VI.
46 V . t
47 Um sugestivo ensaio sociológico sobre o papel da massa como ator social ~as modernas socie-
. er ~.m eressante estudo da campanha midiática desenvolvida entre 2001 e 2003, por um dades está na obra de Sloterdijk (2002): 9-29, 71-99, na qual, entre outras COIsas, sustenta-se que
Jornal tao .mfl~ente como EI País e apoiada logo por numerosos meios de comunicação sobre a sociedade de massas democrática busca, primeiramente, obter a autoestima da própria massa,
o pretendId.o mcremento da criminalidade na Espanha durante esses anos em Soto N'avarro o que exige depreciar as diferenças individuais, somente admissíveis enquanto artificialmente
(2005): passlffi. ' , criadas e revogáveis.
ciais. Somente assim, por outra parte, a expertise político-criminal re- autênticos projetos político-criminais, não respo~de à ~~a na~ur~z~.62
cuperará sua força de convicção e o lugar do qual foi desalojada. Sua função não é elaborar programas de atuaçao pohtIco-crImmals,
Que o debate não possa evitar, ou inclusive deva centrar-se, na mas tornar-se um bastião, uma trincheira, frente ao possível abuso
racionalidade pragmática não quer dizer que devam se afastar im- dos poderes públicos ao desenvolver tais programas.
prescindíveis referências valorativas. Neste sentido, deve-se retomar Esclarecido isso, e em segundo lugar, deve-se fazer crível à so-
com firmeza os esforços a favor da "modernização" do direito penal, ciedade que estes abusos existem e que podem ser increment~dos.
isto é, de uma ampliação da intervenção penal a âmbitos socioeco- Somente quando suficientes setores sociais compreenderem os rISCOS
nômicos e de interesse comunitário até pouco tempo considerados que o desmantelamento do sistema de g~rantias impl~ca, estar-se-á
alheios à política criminal. O caráter essencial dos interesses protegi- em condições de reverter o fenômeno SOCIal antes aludIdo, pelo qual
dos e a exigência constitucional de igualdade de tratamento a todos
os cidadãos obrigam a incorporar a criminalidade dos poderosos ao 62 Sobre este tema, é sintomática a opinião de Ferrajoli (1990): 347-362, 460:465, 5,53-556, 59~-594,
acervo de condutas objeto de consideração do direito penal. Esta é a 908-909, 913-914, ~7-963 (há tradução para o espanhol e para o p~rtu,gues), cu)a concep~ao do
direito penal mínimo parte de que as garantias são somente formulavels no sentldo n~gativ,o: de
forma que sob os postulados de um direito penal mínimo não, se po~e, por exem12lo, ldentlflcar
61 Ao contrário, o modelo da justiça restaurativa, com suas propostas de mediação entre delin- um sistema de proibições positivo legítimo, e o mesmo podena se dlZer ?as sançoes ~u do pr~
quente e vítima, pode constituir uma via promissora, embora limitada por suas insuficiências cesso, Isso justamente o diferencia ante um rejeitável direito penal máxlillo q,:e',ao illtroduzIT
na relação com a delinquência menos grave e a grave, para alcançar uma imediata integração
dos interesses públicos e os particulares das vítimas, além de facilitar a ressocialização do de-
critérios positivos, introduz a discricionarie~ade, E o fato ?~ que o Estado de dIT~l~O coruer,e :0-
bertura a tal direito penal mínimo serve maIS para deslegltimar do que para legItimar declsoes
linquente, dos poderes públicos,
A teorização do modelo
penal da segurança cidadã
1. Introdução
co que viemos considerando tem a ver com uma nova relação que se
de gestão de riscos da reincidência têm obtido em out~os ambIto~ s~
estabelece entre indivíduo e sociedade na hora de explicar a delin-
ciais. Em terceiro lugar, um adequado cálculo dos nscos da .r~mcl
quência e, sobretudo, na hora de afrontar sua prevenção. O veículo
dência aconselha superar o princípio jurídico-penal da .cu~pabIhdade
transmissor dessa nova aproximação analítica pode ser qualificado
pelo fato, de modo a estender as intervenções sobre o remCldente par.a
como a ideologia da distribuição ou divisão de riscos entre indivíduo e
sociedade. além do momento em que tenha cumprido a pena, bem como anteCl-
pá-las a peno/ d / ' a eIa. 111
os prevlOs . . / .
Torna-se quase desnecessário recordar que os riscos de que es-
A ideologia da distribuição de riscos entre mdl:-Iduo ~ socIeda~e
tamos falando já não são os riscos tecnológicos. Já nos encontramos
é, a meu ver, um discurso que se serve de un:a termIr:olo~la tecnocra-
dentro de uma política criminal que, como vimos nos capítulos ante-
tica para ocultar a falta de solidariedade socIal que o mspIra. O ponto
riores, modificou substancialmente os objetos preferenciais de aten-
de referência revelador de sua natureza se encontra no fato de qu~ .a
ção da intervenção penal, ainda que possamos seguir falando de uma
sociedade não admite, ou restringe notavelmente, suas respor:sablh-
sociedade com uma elevada sensibilidade ao risco, mas ao risco da
dades na gênese e abordagem da delinquência. Trata-s~ de malS uma
delinquência comum ou clássica, nos termos já vistos.
mostra da consolidação dos enfoques volitivos em detnmento dos es-
A ideologia a que me refiro parte do pressuposto de que indiví-
duo e sociedade devem compartilhar de forma razoável os riscos do 110 A atual polêmica sobre a procedência de implementar tratamentos para os autores de .c~~du
tas de violência doméstica se move, em boa medida, sob estas coordenadas. Ver Larraun IJoan
109 Ver Silva Sánchez/Felip Saborit/Robles Planas/Pastor Mufioz (2003): 114-115, 118-120; Co- (2004): 359-364, 374. .
missão das Comunidades Europeias (2004): 4-6. Também, com posição claramente crítica, Nieto 111 Uma das melhores descrições deste discurso, a partir de uma atitude, sem dúvIda, co~pre-
Martín (2004): 220, 222; Sáez Valcarcel (2004): 3-4; Mufioz Conde (2004): 177-180. Especialmente . . d tambe'm preocupada diante de suas possibilidades de excessos, encon a-se
enSlVa am a que - b . ue está
convincente, e crítico, sobre a substituição da agenda judicial pela policial e sobre a desjudiciali- em Sil~a Sánchez. (2002):143-146,155-159. Chamam a atençao so re o prot~gorusmo q .
zação a favor de polícias e promotoria, adicionando as ordens de proteção à lista de fenômenos adquirindo a inocuização, entre outros, Maqueda Abreu (2003): 8, 9-10; Gonzalez Cussac (2003).
nessa linha, Sáez Valcarcel (2004): 3-4, 6, 7-8. 24; Nieto Martín (2004): 221.
disposição a cometer delitos, defraudando, assim, persistentemente, que são objeto de atenção preferido dentro da expansão securitária.
as expectativas normativas formuladas pelo direito, por não satis- No entanto, a contribuição fundamental que a distinção entre cidadão
fazerem as garantias mínimas de comportamento de acordo com as e inimigo faz a essa expansão não reside na coincidência dos setores
exigências do contrato social. Tais indivíduos não podem ser consi-
derados pessoas nem cidadãos, são inimigos da sociedade que devem 117 Ver Jakobs (2000): 49-53; (2003): 13-15,23-25,33-43,47,51,55-56.
ser excluídos dela. O direito penal regente para eles deve ser subs- 118 Não pretendo, a seguir, realizar uma crítica dos pressupostos teóricos que fundamentam a
construção de Jakobs. Meu objetivo se limita a analisar criticamente as implicações imediatas
tancialmente distinto do vigente para os cidadãos, deve ser militante, que sua proposta tem na consolidação do modelo penal da segurança cidadã. Ver, recentemente,
na doutrina espanhola, uma abordagem mais básica, com referências bibliográficas adicionais
115 Talvez a formulação mais plena da perspectiva funcional na distinção entre indivíduo e pes- em Cancio Meliá (2003): 78 e ss; Portilla Contreras (2004): 43 e ss., em especial 45-49; Munoz
soa, em termos jurídico-penais, esteja em Jakobs (1996): 19-25,35-38,47-62. Conde (2004): 170-175; Gómez Martín (2004): 84-87.
116 Ver esta fundamentação em Jakobs (2003): 25-33 e confrontar com a que havia feito em (2000): 119 Ver referências nesse sentido de Jakobs, em direta relação com a construção do direito penal
50-54. do inimigo, em (2000): 50, 53.