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Sermão para o sábado da Liberdade Religiosa

Por Ganoune Diop

Diretor de Assuntos Públicos e Liberdade Religiosa da Associação Geral dos


Adventistas do Sétimo Dia e Secretario Geral da Associação Internacional de Liberdade
Religiosa (IRLA).

Por favor, sinta-se livre para usar ou adaptar este sermão para o Sábado da Liberdade
Religiosa, dando o devido crédito ao Dr. Diop.

Defensores da Liberdade e do Amor

I. Jesus e a liberdade religiosa

Este sermão está fundamentado em duas premissas: Primeira, toda fé cristã está
fundamentada sobre o princípio da liberdade. A segunda premissa é que Jesus Cristo é
o modelo a ser imitado em tudo. A leitura da carta aos Gálatas nos revela a essência da
fé cristã. Escreveu Paulo: “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou” (5:1). Toda fé
cristã está fundamentada nessa ideia de liberdade, de ser libertados para a liberdade.

No Antigo Testamento, no livro de Êxodo, quando o Deus da libertação apresentou


os Dez Mandamentos, Ele começa com a ideia de que é um Deus de libertação (20:2).
Na Nova Aliança, vemos claramente que todos os aspectos do ministério de Jesus se
fundamentam na ideia de liberdade. Em Lucas 4:18 e 19, Ele disse: “O Espírito do
Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me
para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em
liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor”.

Jesus fortaleceu ainda mais o conceito da verdadeira liberdade quando afirmou:


“Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres” (João 8:36). Podemos
dizer com toda segurança que a importância e o valor da liberdade religiosa residem
no fato de que ela fez parte central da missão de Cristo e é importante e preciosa para
Deus.

II. Compreendendo a liberdade religiosa

A liberdade religiosa faz parte das liberdades fundamentais reconhecidas pela


humanidade, tendo recebido lugar de destaque nos tratados e leis internacionais.
Porém, hoje em nosso mundo, há muitos mal-entendidos e confusão com respeito ao
que a realmente significa a liberdade religiosa.

Uma ampla variedade de incompreensões sobre a liberdade religiosa ocorre em


cada país. Para nós adventistas do sétimo dia, a liberdade religiosa é uma das dádivas
mais importantes confiadas aos seres humanos. Na verdade, é um dos mais eficazes
antídotos contra a desumanização das pessoas.
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Liberdade religiosa não se limita a tolerar pessoas ou religiões diferentes. Significa


respeitá-los em seu direito de escolher a religião ou crença que adotaram ou mesmo o
direito de não ter nenhuma religião. Todos fomos chamados a respeitar os outros,
mesmo não concordando com suas crenças e visões de mundo. Por isso que não se
trata apenas de tolerância ou concordância irrestrita em tudo o que os demais creem.
Trata-se, acima de tudo, de respeitar as pessoas e suas escolhas.

III. O que é liberdade religiosa?

Então, o que é liberdade religiosa?

i) Liberdade religiosa é um princípio que com frequência tem se tornado um


direito constitucional na maioria dos países do mundo. É um direito humano,
civil, reconhecido internacionalmente e presente na Declaração Universal dos
Direitos Humanos.
ii) Liberdade religiosa é de fato uma dádiva divina e um pré-requisito para todo
relacionamento humano.
iii) Liberdade religiosa é um atributo divino oriundo da absoluta soberania de
Deus.

Podemos reafirmar que a liberdade religiosa é um princípio, uma provisão legal


reconhecida internacionalmente e expressa no artigo 18 da Declaração Universal dos
Direitos Humanos e que faz parte da Constituição da maioria dos países. Esse artigo diz
o seguinte: “Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de
religião; este direito implica na liberdade de mudar de religião ou de crença, assim
como a liberdade de manifestar a religião ou crença, individual ou coletivamente,
tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos”.

Para resumir, liberdade religiosa é na prática, a liberdade para professar, praticar,


propagar ou promover a própria crença; transmiti-la aos filhos ou aos que são
confiados aos seus cuidados sem violar a dignidade deles, impondo ou exigindo que
sigam esses valores. Liberdade religiosa é também a garantia de não ser violentado,
ferido ou maltratado por causa de sua religião ou crença. A verdadeira liberdade se
completa quando toda e qualquer forma de violência é repudiada, denunciada e
combatida. Isso porque a intolerância viola a integridade do ser humano - física,
emocional, intelectual, social e espiritual. Liberdade religiosa é, na verdade, libertar-se
de impor sua fé aos outros; envolve não exercer coerção, manipulação ou força.

IV. Liberdade religiosa para os adventistas

Para os adventistas do sétimo dia, a liberdade religiosa se baseia na compreensão


de que fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Isso significa que os seres
humanos são filhos de Deus, verdade essa claramente afirmada em Gênesis 5:1-3. O
verso 1 declara que “No dia em que Deus criou o homem, à semelhança de Deus o
fez”; e quando Adão e Eva geraram um filho, Sete tinha a imagem e semelhança de
seus pais, significando que Sete era de fato filho deles. Todos nós, seres humanos,
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fomos criados à imagem e semelhança de Deus, com o propósito de manter comunhão


eterna com Ele, num ambiente de total liberdade e amor.

Liberdade religiosa, portanto, é a dádiva de Deus para que o amor floresça. Sem
essa liberdade é impossível manifestar amor, porque o amor não pode ser imposto,
forçado. Como seres humanos não somos apenas filhos de Deus, mas, pelo fato de
termos sido criados à imagem e semelhança de Deus, somos na verdade, templos de
Deus, santuários do Espírito Santo, conforme as palavras do apóstolo Paulo em I
Coríntios 3:16 e 6:19. Isso significa que os seres humanos são sagrados e muito mais
importantes do que edifícios ou objetos sagrados, como catedrais, templos, sinagogas
e mesquitas. E por que é assim? É porque os seres humanos, diferente dos animais,
são dotados de livre arbítrio. A consciência humana desempenha um papel essencial e
muito importante, pois é o espaço sagrado inviolável de cada pessoa, que jamais
deveria ser violada.

De acordo com o mesmo princípio de liberdade religiosa, nenhum ser humano


deveria ser coagido, forçado ou manipulado para crer de forma contrária aos ditames
de sua consciência. De igual forma nenhuma organização religiosa deveria estar sob o
guarda-chuva de outra organização que tenha poder para decidir ou ter uma palavra
final sobre suas crenças e práticas. Esse é o motivo de os adventistas do sétimo dia não
se unirem a organizações ecumênicas que têm uma autoridade central, visto que isso,
efetivamente, usurparia a consciência da igreja.

Esse é um princípio inegociável. A Igreja Adventista do Sétimo Dia nunca poderá se


unir com outra igreja, porque perderia sua identidade. Sempre manteremos nossa
identidade, missão e mensagem distintas e isso também faz parte da liberdade
religiosa. Naturalmente que ainda favorecemos as relações inter-religiosas como
oportunidade para testemunho mútuo. Ser sal e luz inclui a necessidade de se misturar
com os outros.

Isso é o melhor que oferecemos ao mundo quando se trata de liberdade religiosa.


Essa liberdade não se refere apenas a provisões legais, embora sejam muito
significativas. Mas a contribuição mais importante dos adventistas está: 1) na teologia
(a compreensão de quem é Deus); 2) na antropologia (a compreensão de quem somos
como seres humanos); e, 3) na compreensão da salvação (soteriologia), como ocorre a
restauração da imagem de Deus em nós.

Abraçar a liberdade religiosa é mostrar profundo respeito ao santuário interior de


cada pessoa ou à consciência humana, ou seja, o espaço sagrado mais profundo de
cada indivíduo. Compreendemos ainda que crer e viver de acordo com os princípios da
liberdade religiosa é permitir a Deus ser Deus. Isso significa que respeitamos o
relacionamento misterioso entre Deus e outros seres humanos criados à Sua imagem.
Respeitamos os outros porque Deus os criou. Respeitamos os outros porque Deus tem
acesso a um relacionamento especial direto com a consciência das pessoas.

Mas não se trata apenas de respeito. Mas ainda vai além. É interessante notar que
em Gálatas 5, Paulo começa dizendo: “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou”
(verso 1). E então o apóstolo prossegue expandindo essa ideia, convidando-nos a
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“andar no Espírito” (verso 16). A liberdade não pode existir sem o Espírito Santo. E isso
é extremamente importante porque, em seguida, o apóstolo Paulo afirma que aqueles
que são guiados pelo Espírito, produzirão o fruto do Espírito que é amor, a origem de
tudo, sim, ele começa com amor, o começo de tudo, e também alegria, paz,
longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio (versos
22 e 23). Ele começou com a liberdade no início do capítulo e prosseguiu com o fruto
do Espírito, sendo o primeiro fruto o amor.

O alvo da liberdade religiosa é o amor e esta é uma visão distintivamente cristã. O


alvo da liberdade religiosa é o amor e o companheirismo eterno em amor, com Deus e
com os outros seres humanos. Por isso Deus criou os seres humanos livres; por isso Ele
nos deu a liberdade de escolha, para que tivéssemos a liberdade de escolhê-Lo ou até
mesmo de rejeitá-Lo. Isso é precioso, pois sem a liberdade, o amor não poderia se
manifestar.

Conclusão

Por que então somos defensores da liberdade religiosa? Defendemos a liberdade


religiosa porque Deus defende a liberdade religiosa. Cristo defendeu a liberdade
religiosa e o apóstolo Paulo insiste que foi para a liberdade que nós fomos libertos.
Mas Jesus nos lembra de que a essência da lei é amar a Deus de todo o coração, com
toda nossa alma e com toda nossa força, e amar ao próximo como a nós mesmos.

Portanto, o objetivo dessa liberdade é o amor. A mensagem da Bíblia é clara a esse


respeito. A liberdade religiosa não é uma ferramenta para oprimir as pessoas, antes é
um pré-requisito para amar. É um sinal que nos lembra de que as pessoas são
sagradas. Lembra-nos de sermos cuidadosos em como lidar com os outros, visto que
pertencem a Deus. Lembra-nos de que há um caminho sagrado entre Deus e cada
pessoa com quem Ele Se encontra através da consciência individual, e que jamais
deveria ser a violada.

Podemos tentar persuadir a outros de maneira pacífica e respeitosa; isto é o que se


pode chamar de persuasão e testemunho pacíficos. Sim, temos uma mensagem
distintiva a compartilhar, mas ela não deve ser compartilhada pisando na dignidade
das pessoas ou insultando-as. Antes, podemos respeitosamente compartilhar aquilo
que cremos ser a vontade absoluta de Deus para cada ser humano, pois isso também
faz parte da liberdade religiosa. E, é claro, quando amarmos as outras pessoas, nós
também as respeitaremos, mesmo que não aceitem nossa mensagem e discordem de
nós.

E assim fica claro que há muito mais na liberdade religiosa do que podemos
imaginar. Que Deus nos abençoe a compreender a grandeza de Seu amor que se
manifesta em nós e nos move a amar e respeitar a cada ser humano. Amém.

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