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Formação em Teologia

Volume 09

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Formação em Teologia

Ética Cristã - Parte I

l Ética e Moral - Conceito


O primeiro passo para pensar em ética cristã é definir o conceito de ética e
moralidade. Ética é uma construção abstrata. É o que existe no subsolo, é a raiz,
constituída de nossos princípios e valores. A ética fundamenta todo nosso
crescimento. A ética é o princípio que organiza tudo aquilo que a sucede. Enquanto
a moral é uma construção visível. Se a ética é a raiz, a moral é a árvore, o que sobe,
o que rompe o solo e aparece. A moral é demonstrada a partir de nossa conduta
nos relacionamentos em cada área da vida.
Um exemplo complexo e perto de nós, brasileiros, é a criminalização da
moral. Se existe um padrão moral A, e um padrão moral B, obviamente, tudo que
não fizer parte de um padrão será crime no outro. Por mais que discordemos, ética
e moralmente, essa criminalização da moral é muito perigosa em qualquer
sociedade. Falar de ética diz respeito à fundamentação de princípios, isto é, aquilo
que a regula. A moral, por sua vez, é prática; mostra em ações quais são esses
princípios e como surgem em nossas relações cotidianas.

lI Uma Visão Histórica


Houve um momento da história ocidental no qual as leis morais eram
indiscutíveis. Durante muito tempo, o cristianismo serviu como fornecedor de ideias
para que o ocidente se organizasse de tal maneira que, se você perguntasse a um
ladrão o que era certo e errado, ele saberia lhe dizer. Já que as leis morais eram
indiscutíveis, todo mundo se adequa a elas. Hoje a sociedade começa a entender
que, quando acontecem falhas, talvez não seja erro do ser humano, mas dos
sistemas, ou seja, as leis. No momento atual, o pensamento humano não busca
averiguar ou refletir sobre as falhas pessoais, pelo contrário, passa a refletir sobre
a validade das leis, se essas leis são adequadas ou não. Vemos uma divisão clara,
expressa em dois eixos:

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Eixo I
Sendo as leis imutáveis, quando ocorria um erro que causasse sofrimento às
pessoas, caberia a elas buscar algum tipo de adaptação, em outras palavras, não havia
nada de errado com as leis, então não havia motivos para as modificar.

Eixo II
As leis podem mudar. É possível questionar a validade da lei. Quando existem
problemas, as pessoas deixam de buscar a causa em si mesmas e transferem essa
responsabilidade para a lei.

III Evitando extremos


Ao longo das nossas conversas, veremos que os dois sistemas têm falhas
porque (re)pensamos sobre qual a profundidade dessas leis e qual é a relação das
pessoas com a lei. É impossível resolver a questão recorrendo somente a um desses
eixos. É muito simples dizer que o problema está na lei ou que o problema está
somente nas pessoas. A relação é mais complexa do que isso e o estudo da ética
fará com que a (nossa) vida cristã não caia nessas armadilhas.
De certa forma, a ética é o nosso esforço, nosso trabalho para estabelecer
aquilo que é certo e errado, mesmo para quem não é religioso. Não importa se a
pessoa acredita ou não em Deus, todos se esforçam e trabalham por aquilo que
acreditam ser certo. O compromisso ético de cada um se trata de um esforço onde
estabelecemos o que é melhor e desejável.
Contrapondo a lei e a ética, a lei moral tem a ver com a organização, isto é, a
codificação dos interesses do indivíduo no poder. O pensamento atual ensina que
a moral surge quando um grupo de pessoas organiza o que é mais interessante e
estabelece um padrão moral (de conduta). Esse conceito também encontra
algumas dificuldades.

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lV Desafios na Ética
Em nosso caminho, entendemos que o ser humano é desafiado a decidir. O
livro “Ética da Decisão”, de George W. Forell, explica que a questão básica do
porquê precisamos de ética é: o ser humano decide o tempo todo. Antes de tomar
as nossas decisões (com quem casar, que emprego escolher, onde morar) existe
uma ética que normatiza as nossas escolhas. Essa ética pode ser consciente ou
inconsciente. Quanto mais você percebe sua ética, mais fica claro o porquê de
determinada decisão que você toma.
Alguns têm em comum o seguinte pensamento, dizendo que o ocidente é
cristão devido à grande influência da ética cristã. Eu discordo desse pensamento.
Não há como afirmar em absoluto que o ocidente todo foi convertido ao
Cristianismo. É muito incoerente trazer isso como verdade. O que se pode afirmar
com precisão é que a ética cristã organizou e influenciou o ocidente de uma forma
sem precedentes na história da humanidade. A organização de estruturas políticas,
públicas e de família, foram organizadas a partir de uma ética cristã.

V Ética Cristã Hoje


Existe um questionamento dessa ética, do porquê viver subordinado a uma
ética que não é nossa. A sociedade começa a reivindicar outros padrões possíveis
em relação à ética e por qual razão eles decidem. Nesse mesmo aspecto, é muito
comum percebermos que a ética é privada, ou seja, em vez de existir uma única
ética religiosa, a exemplo do judaísmo, do hinduísmo e do budismo, existe um
padrão central, o qual guia e normatiza a ética de uma vida. Atualmente, temos a
fragmentação da ética. Por exemplo: “negócio é negócio”, isso significa que existe
uma ética para ser adotada nos negócios; “política é política”, há uma ética da
política que não cabe em outra área; “educação é educação”; “arte é arte”, etc.

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Então, começamos a criar núcleos, nos quais só vale um sistema de ética. Na


vida privada, por exemplo, quando eu vou para minha casa, reina uma outra lógica,
um outro tipo de perspectiva. Não existe mais um fundamento que guia toda minha
vida, pois em cada lugar que vou, utilizo um tipo de ética que julgo ser mais
conveniente, desenvolvendo assim valores e regras particulares.

➔ Cuidado
A maior diferença entre o período anterior e o período atual é que antes as coisas
boas e ruins tinham essa ética, que era integradora e organizava toda a vida. Agora
possuímos uma ética fragmentada e, consequentemente, uma fé fragmentada. A tendência
atual é separar as coisas em compartimentos. É muito importante entender que a vida
cristã precisa ser uma lente, uma forma com a qual vamos enxergar toda a nossa vida. Ser
cristão significa olhar para todas as coisas a partir de Jesus Cristo, a partir do evangelho
e da mensagem da cruz. Ser cristão significa ser definido por uma lógica ética que trará a
decisão e a defesa de determinadas coisas. Quanto mais frágil for a nossa ética cristã, mais
negativamente serão afetadas as nossas decisões por outros conceitos. Muitas vezes
acabaremos não decidindo como cristãos, mas por qualquer outro meio ou padrão ético. A
questão básica em relação à vida cristã e a ética é, justamente, reconhecer que a ética
organiza e dá significado orientador para saber onde iremos, é nossa bússola.

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VI Fenômenos Modernos

Primeiro fenômeno:
Pessoas que frequentam uma igreja, mas não tem ética cristã, ou seja, não tomam
decisões a partir de valores cristãos. A vida dessas pessoas não está organizada a partir
desse conjunto de significados cristãos. Para ela, esse conjunto de valores não nasce a
partir do Evangelho e da Cruz.

Segundo fenômeno:
Pessoas que não frequentam uma igreja, mas tem uma ética cristã viva. Não é uma
questão de serem cristãos ou não, estamos abordando a ética. Essas pessoas não
frequentam a igreja, mas organizam sua vida a partir de uma raiz de pensamento cristã.
São aquelas pessoas que, ao vermos, comentamos: “Fulano é tão bonzinho, só falta ser
crente”. O que queremos dizer é que o Fulano tem uma ética cristã. Ter uma ética cristã
não é a mesma coisa que ser um cristão, mas é uma matriz de pensamento que organiza a
vida.

Terceiro fenômeno:
A pessoa frequenta igreja, mas tem um sistema ético plural. Hora ele decide como
um ateu, hora ele decide como hindu, hora ele decide como budista e hora ele decide como
cristão. Apesar de muito sincero, a ética dele é fragmentada.
É um prejuízo muito grande não entender a profundidade da ética cristã e o quanto
ela pode organizar a vida de uma maneira simples, lógica e poderosa. De qualquer forma,
o homem não escapa da sua liberdade e, estando condenados a ser livres, somos obrigados
a decidir o tempo todo. Vários autores, em tempos diferentes, irão dizer coisas parecidas,
que não há um dia que possamos escapar da nossa liberdade e da necessidade de
enfrentar inúmeras decisões.

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➔ Nota Pastoral:
Onde estão fundamentadas as suas decisões? No que sente? No que pensa? No
que os outros mandam? Tudo isso revela a raiz das nossas estruturas mais profundas de
pensamento. Sócrates já dizia que muitos cidadãos gentis de Atenas, que pareciam
pessoas cultas e letradas, quando questionadas do porquê agiam dessa forma e não de
outra, quando eram confrontados a ouvir o contraditório, não se furtavam de perseguir e
torturar, e até de matar. Pelo visto, aquelas decisões que pareciam ser muito liberais,
conscientes e benevolentes, quando ameaçadas, revelavam a verdadeira essência ou seu
verdadeiro padrão ético. Espero que ao longo deste estudo, os seus padrões éticos sejam
revelados e que você possa aprender que a ética cristã é segura e saudável.

Bibliografia

George W. Forell, Ética De Decisão.


Peter Singer, Vida Ética. Este livro aborda uma questão mais atual e de forma
contemporânea, que tipo raciocínio está por trás das pessoas, que não representam uma
vida vegana somente com o tipo de alimentação, mas, também o que está por trás do
pensamento para que as pessoas decidam adotar certo estilo de vida.
Eugene H. Peterson, Sombra Da Planta Imprevisível. Uma investigação da santidade
vocacional. Autor muito bom. Quando trabalharmos o livro de Apocalipse, usaremos outro
livro desse mesmo autor que fala sobre ministério, nossa vida cristã e nossa ética enquanto
Ministério.
Jonathan Edwards, As Firmes Resoluções. Um pastor importante no grande avivamento
ocorrido por volta de 1700.
C.S. Lewis, Ética Para Viver Melhor.

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