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O SINTOMA E SUA RELAÇÃO COM A PSICANÁLISE

Autora: Jaqueline Queiroz¹


Professor Orientador: Daniela Teixeira Viola²

RESUMO

O presente trabalho aborda o sintoma e sua relação na psicanálise. São


apresentados dados históricos que possibilitaram compreender como o sintoma
foi descoberto como manifestação do inconsciente e como Freud e Lacan viam
tal fenômeno. O objetivo principal deste artigo é o de apresentar o sintoma e
seus significados e apontar as fala da psicanálise diante deste fenômeno
psíquico. Justifica-se este trabalho pela relevância para a psicologia e
psicanálise, visto que identificar o sintoma para além de qualquer aspecto
fisiológico é dever do terapeuta. O trabalho buscou dialogar com fatos históricos
e também com a prática clínica dentro do consultório. As manifestações do
inconsciente são meios de escape que devem ser percebidos e trabalhados pelo
terapeuta, aquilo que nos escapa aos olhos pode ser o meio pelo qual nosso
sofrimento vem à tona, a escuta apurada e a associação livre dão início ao
processo terapêutico que a partir da transferência instaurada, levam o sujeito a
desenvolver confiança e assim, criar um ambiente propício para uma correta
análise psicológica do sujeito.

PALAVRAS-CHAVE: Sintoma. Psicanálise. Inconsciente.

INTRODUÇÃO

A psicanálise nasceu com Freud quando este estruturou o psíquico do


sujeito. Neurose, psicose e perversão marcaram o modo como o terapeuta
conduzia as sessões e a partir disso, outras formas de fazer psicologia foram
surgindo. A psicologia é uma ciência que busca compreender o funcionamento
da mente humana e assim, fazer intervenções objetivas; para lidar com as
demandas do sujeito, o terapeuta precisa estar atento aos sinais que o paciente
manifesta no setting terapêutico. A fala livre permite que se descubra crenças,
paradigmas e traumas que até então estavam escondidos ou mesmo
despercebidos.
¹ Graduanda em Psicologia, 9° período noturno. Universidade do Estado de Minas Gerais. E-
mail:
² Professora da Universidade do Estado de Minas Gerais. E-mail:
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O sintoma é um fator principal que permite ao terapeuta identificar


nuances que o próprio paciente não percebe ou que quer esconder.
Este trabalho buscou apresentar qual os significados do sintoma e como
a psicanálise o utiliza como via de saber nas sessões de terapia. O objetivo
principal é apresentar o sintoma e seus significados e apontar as fala da
psicanálise diante deste fenômeno psíquico. Objetiva-se também compreender
historicamente como se chegou a tais fatos e como se introduziu o sintoma como
objeto de análise. Trata-se de uma revisão bibliográfica onde foram utilizados
livros, artigos e textos científicos que abordassem o tema proposto.
Justifica-se este trabalho pela relevância para a psicologia e psicanálise,
visto que identificar o sintoma para além de qualquer aspecto fisiológico é dever
do terapeuta. A escuta apurada permitirá ao profissional da psicologia identificar
quando se trata de um sintoma psíquico e o que este traz de prejuízos para o
sujeito. O sintoma foi algo observado por Freud e utilizado para se atingir o
inconsciente do sujeito, tal fato marcou a história da psicologia e da psicanálise.

DESENVOLVIMENTO

Sintoma é uma palavra usada amplamente diante de um contexto com


sentidos diversos, a semiologia da palavra usa termos da medicina e da
linguística, com significados diferentes. O presente ensaio procura apresentar o
sintoma e seus significados e apontar as fala da psicanálise diante deste
fenômeno psíquico. O estudo de signos é algo que vem desde os primórdios, o
homem sempre se interessou pelo uso da semiologia dos signos, houve também
a influência da constituição da linguística como ciência.
Galeno (131-201) apud Pimenta e Ferreira (2019), define a semiologia
como ciência geral dos signos, restringindo o seu sentido da medicina à
descrição dos sinais e sintomas de doença. Já a medicina, define a semiologia
para além e acaba por se confundir em seu método clínico, isso se transforma
em um instrumento com o qual se afirma ou se afasta uma doença e se constrói
um diagnóstico. O método clínico da medicina se baseia em habilidades do
médico em apropriar-se das manifestações da doença do paciente e assim,
chegar a um diagnóstico.
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A semiologia médica, classicamente, estuda os sinais e sintomas das


doenças; os sinais são manifestações objetivas das doenças e devem ser
identificados por diversos meios; os sintomas são o distúrbio subjetivo relatado
pelo paciente, seja um incômodo, uma dor, etc. Isso leva ao médico o
conhecimento sobre como o paciente se sente. De acordo com Pimenta e
Ferreira (2019), o sintoma na medicina é diferente do campo do conhecimento
da psicanálise. A medicina considera o sintoma como algo dotado de sentido,
cabe ao médico dar o significado, decifrar se é ou não uma doença. Na
psicanálise, o sintoma é dotado de sentido, tornando-se algo redefinido, que não
se refere a algo detectável no organismo, mas que permite elaborar o diagnóstico
de uma doença médica.
Podemos dizer que para a psicanálise, o sintoma neurótico leva o sujeito
do inconsciente, o sintoma é algo formado no inconsciente. O sintoma na
psicanálise só é aprendido dentro da história de ada sujeito, sendo decifrado
apenas com a ajuda de um psicanalista e só levará ajuda ao sujeito se o
terapeuta conseguir levar sentido para o próprio paciente (PIMENTA E
FERREIRA, 2019).
Ao longo da histórica da medicina e depois, da psicologia como ciência,
as formas de ver os transtornos da alma foram se modificando, seguiram um
caminho próprio. De acordo com Lorenzer (1987), o mal-estar humano tem sido
trabalhado desde a idade antiga, a medicina já observava a cisão entre espaço
sagrado e natural, a prática médica hoje, ainda permanece mesclada com
questões místicas. Nas ditas perturbações da alma, a psiquiatria se sobressai e
as segregações dominam o cenário dos manicômios. A psiquiatria classifica os
sintomas clínicos e os sistematiza, construindo a psicopatologia. A psiquiatria
adquiriu poder sobre os corpos dos enfermos e cometeu erros bárbaros ligados
à tortura.
A frenética busca por causas orgânicas e terapêuticas somáticas trouxe
inúmeros abusos médicos, o paradigma anatomoclínico e biológico, colocou
outras especialidades médicas em posicionamento inferior, algo enlouquecedor.
Para Freud (1856-1939), a hegemonia da medicina científica também teve seu
fracasso na abordagem dos casos de histeria. Freud (1856-1939), ilustra o
desejo pela psicologia enquanto ciência e captou através da escuta os fatos da
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clínica que levavam a dificuldades de inserção dentro desse campo. Havia uma
preocupação em afastar causas orgânicas nos seus casos clínicos.
A genialidade freudiana está ligada à capacidade de perceber os sintoma
neurótico em sua natureza radical. A anatomia histérica é diversa da anatomia
orgânica. A conceituação das pulsões, do recalque, do inconsciente e seus
destinos, foram inseridos por Freud como condição de elaborar a teoria
psicanalítica, uma dimensão capaz decifrar as mensagens contidas nos
sintomas neuróticos. O sinal de doença deve ser acolhido e decifrado, o que vai
ao contrário do sintoma médico, que sempre resistiu ao discurso sobre o
sofrimento humano, indo em contradição a concepção positivista (PIMENTA E
FERREIRA, 2019).
De acordo com Garcia (1994), o sintoma é o testemunho da ação da
repressão. A pulsão se dirige a ele, o sujeito aliena-se no sentido a fundar o
outro, os significantes, como lugar da falta. O conteúdo reprimido é da ordem
sexual e impõe a repressão. A repressão, por sua vez, está vinculada ao enigma
que cerca a pulsão sexual, constitui ligação com o corpo do sujeito e a falta de
adequação da função orgânica do sexo provocada pela linguagem. Isso recai
sobre os representantes pulsionais e impede que algo inconsciente se torne
consciente. Como disse Freud (1955): "... a repressão deixa sintomas em seu
rastro".
Freud (1916-1917) definiu o sintoma com o conceito de escuta das
queixas de seus pacientes, assim concluiu que o sintoma não é um sinal de
doença, mas sim uma expressão particular de um conflito psíquico. A formação
do inconsciente carrega o sintoma, assim como os sonhos e os esquecimentos,
tudo faz parte de mensagens inconscientes que só são decifradas a partir da
interpretação. Para Freud (1916-1917), o sintoma vem do inconsciente, está
relacionado às experiências da sexualidade e é sustentado pelas fantasias
infantis e vem escondido no desejo.
Ainda sobre Freud (1916-1917), há a substituição da pulsão através do
sintoma, algo paradoxal em sua manifestação. Isso traz sofrimento e satisfação
“Nas neuroses, são as pulsões sexuais que sucumbem ao recalque e constituem
assim a base mais importante para a gênese dos sintomas, que podem, por
conseguinte, ser encarados como substitutos de satisfações sexuais.” (Freud,
1911, p. 102). A pulsão é recalcada juntamente com forças repressoras em sua
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defesa, formando um compromisso, o sintoma surge como uma repetição que


acaba por prender o sujeito. "... a repressão deixa sintomas em seu rastro" (p.
149).
O sintomas se relacionam diretamente com a vida do sujeito que os
produz, na histeria, há a reminiscência, o recalque da ideia e o corpo com um
afeto inconciliável. Freud (1916-1917), diz que o desejo ganha a marca de
insatisfação no conteúdo neurótico obsessivo, os sintomas se relacionam com a
esfera mental. O afeto é recalcado e se desloca para o pensamento, uma
expressão de dúvida e indecisão, algo impossível de ser realizado.
O adoecimento advém das palavras, o tratamento se dá por meio delas
também. O tratamento da angústia e dos sintomas pela via da palavra toca o
corpo e constitui lugar libidinal. "Alguém vem nos apresentar um sintoma e crê
nele. Porque crê que o sintoma é capaz de dizer algo e que tão somente é
necessário decifrá-lo. "(J. Lacan, Sem. XXII-RS.I.).
Lacan apud Garcia (1994), diz que no sintoma há algo irredutível “é como
sintoma que nós identificamos o que se produz no campo do real. A noção de
sintoma foi introduzida muito antes de - Freud por Marx como signo do que não
anda no real. Se somos capazes de operar sobre o sintoma é porque ele é o
efeito do simbólico no real". Freud (1916-1917), vai dizer que o sintoma é um
substituo da satisfação pulsional que permanece jacente, em consequência do
processo da repressão. O sinal acontece para o Eu na emergência de um
sintoma, a expectativa da satisfação pulsional é convocada pelo sintoma
neurótico.
A realização do desejo se situa no sintoma, Lacan (1957-1958, seminário
V) diz que:
... o que Freud descobre essencialmente nos sintomas, quaisquer que
sejam estes... é sempre essencialmente um desejo. Por outro lado
"esse sintoma que anda no sentido do reconhecimento de um desejo...
é um reconhecimento que não aponta a ninguém... ninguém pode lê-
lo. Reconhecimento fechado do desejo, mas não para um outro, porque
é um desejo reprimido.

O sintoma então seria a verdade sobre o que é escondido, ele retorna ao


consciente como uma satisfação pulsional, algo do irrealizado ao inconsciente,
que não cessa de se inscrever. É na ação da repressão que se nota o sintoma,
eis o destino da pulsão que divide o sujeito em alienado e ser faltante.
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O que é reprimido vem da ordem do sexual, o que impede sua repressão.


A repressão está ligada ao enigma da pulsão sexual, a falta de saber sobre o
objeto que a define. A sexualidade se constitui no corpo do sujeito, a falta de
adequação da função orgânica do sexo é provocada pela linguagem e recai
sobre os representantes da pulsão. Para Freud (1915, p. 177): "... a repressão
deixa sintomas em seu rastro".
Assim pode-se dizer que basicamente a repressão tem a função de gerar
sintomas, Lacan (1979, p. 222) diz que: "... o recalque e a volta do recalcado,
são a mesma coisa". Nota-se a dicotomia nos dizeres de Lacan e Freud,
enquanto Freud fala do sintoma como resultado da repressão, Lacan o considera
como a própria repressão. O que se depara com a repressão, retorna em forma
de sintoma, e este condensa a vida sexual do neurótico. O neurótico vai carregar
o sintoma e passar a vida tentando se libertar dele, mas cai em outro e em outro,
sujeito de falta, Freud (1979, p. 121) "peça do mundo interno que é estranha a
ele".

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desde Freud, o sintoma é considerado a aversão ao desejo. Isso significa


que o desejo não cessa de retornar e isso é considerado um fracasso que é
manifestado em forma de sintoma. Quando vem à tona é manifestado pelo
consciente de forma mascarada. A particularidade do sintoma neurótico ganha
forma para a psicanálise e assim é alvo para o terapeuta.
Há divergências entre Lacan e Freud em relação ao que seria o real
significado do sintoma, para Lacan, ele não pode ser interpretado de forma
diretiva, é preciso haver transferência, uma introdução do outro. O sintoma tem
sua fala de forma metafórica, isso possibilita a descoberta da cadeia de
significantes do sujeito, são hiatos da verdade que o sujeito esconde.
O sintoma também está lidado a vida sexual do sujeito neurótico e Freud
diz que ele sofre sem poder falar, pois não consegue dominá-lo de forma
voluntária. Isso torna-se algo estranho ao sujeito, inerente à sua vontade.
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REFERÊNCIAS

FREUD, S. Conferência XVII. O sentido dos sintomas. In S. 1996.

______. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de


Sigmund Freud (J. Salomão, trad., Vol. 16, pp. 265-279). Rio de Janeiro:
Imago. (Trabalho original publicado em 1917[1916-17]

______. Notas psicanalíticas sobre um relato autobiográfico de um caso


de paranóia (Dementia Paranoides) (Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. 12). Rio de Janeiro: Imago.
(Originalmente publicado em 1911). 1969.

______. Repressão. Op.cit. v. XIV, p.177. 1915.

______. Inibições, sintomas e ansiedade. Op. cit., p. 121. 1979.

GARCIA, Ivanir Barp. Sintoma: a fala enigmática do inconsciente. Revista


de Ciências Humanas Florianópolis. v.12 n.16 p.115 – 121. 1994.

LACAN, J. O sinthoma. O seminário, livro 23. 1975-1976. Rio de Janeiro:


Jorge Zahar. 2007.

______. As Formações do Inconsciente. Semindrio. Livro 5. 1957-1958


(Inédito).

PIMENTA, Arlindo Carlos; FERREIRA, Roberto Assis. O sintoma na medicina


e na psicanálise - notas preliminares. HISTÓRIA DA MEDICINA. vol. 13.3.
2019.

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