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Antemanhã

O mostrengo que está no fim do mar


Veio das trevas a procurar
A madrugada do novo dia,
Do novo dia sem acabar;
E disse: "Quem é que dorme a lembrar
Que desvendou o Segundo Mundo,
Nem o Terceiro quer desvendar?

E o som na treva de ele rodar


Faz mau o sono, triste o sonhar,
Rodou-se e foi-se o mostrengo servo
Que seu senhor veio aqui buscar.
Que veio aqui seu senhor chamar -
Chamar Aquele que está dormindo
E foi outrora Senhor do Mar

Assunto
Este poema insere-se na 3ª parte da “Mensagem”, intitulada de “O Encoberto” no
terceiro momento - “Os tempos”. Face ao poema “O Mostrengo”, da 2ª parte da obra
“Mar Português”, conclui-se que Pessoa quer de novo simbolizar o medo do
desconhecido, agora não do mar incógnito, mas da via para o Quinto Império na qual
Portugal ainda não se lançará, sendo que este está adormecido. No entanto, o Mostrengo
que um dia foi soberano, é agora servo de Portugal. Além disso, o título do poema indica
que está a chegar a hora, “a madrugada do novo dia”.

Estrutura externa
Quanto à estrutura externa, o poema é constituído por duas estrofes, cada estrofe é
formada por sete versos octossilábicos ( com exceção do primeiro e do quinto verso da
primeira estrofe, que são decassilábicos). O esquema rimático é aabaaca, estando presente
a rima emparelhada, interpolada e solta.
Podemos verificar a irregularidade métrica e a rima peculiar, com o uso abundante de
terminações em “ar”, sugerindo um espaço sufocante (uma prisão).
Recursos expressivos
Neste poema, estão presentes vários recursos expressivos como a hipérbole (verso 1),a
interrogação retórica (versos 5,6 e 7), a anáfora (versos 11 e 12) e a perífrase (verso 13).

Estrutura interna
Quanto à estrutura interna, na 1ª estrofe, é mencionada a figura do Mostrengo, que é
uma figura criada por Pessoa para fazer a imagem do Encoberto, ou seja tudo para o qual
o Homem não está preparado para saber. Nos versos 2,3 e 4 é anunciado um novo dia,
uma nova era e um novo começo.O Segundo Mundo diz respeito ao mar descoberto pelos
portugueses na época dos Descobrimentos. A coragem e desejo de grandeza destes está
“adormecido”, sendo este o ciclo de decadência, que os impede de avançar para a
descoberta do Terceiro Mundo ( Quinto Império).
Na primeira estrofe, é ponto de referência a Segunda Epístola de S.Pedro, onde o
apóstolo divide os tempos em três:
- O Primeiro Mundo, que durou desde a Criação até ao Dilúvio;
- O Segundo Mundo, em que vivemos, que durará até à segunda vinda de Cristo -
que reinará por mil anos;
- O Terceiro Mundo que se segue e que perdurará eternamente e é, nesta alegoria,
confundido com o Quinto Império.
O Quinto Império ( o Império Espiritual) é referido na primeira estrofe do poema e
nesses versos é explicado que quem dorme na saudade do Segundo Mundo não quer
desvendar o Terceiro.
Já na 2ªestrofe, a existência do Mostrengo incapacita os portugueses de avançar para a
descoberta de um novo “dia” e não permite que estes tenham esperança na recuperação
da grandeza que noutro tempo possuíram. Foi, na época dos Descobrimentos, vencido
por uma entidade superior (povo português) tornando-se assim servo que veio “acordar”
Portugal, sendo que este se encontra num estado de decadência. O desaparecimento do
Mostrengo torna possível o avanço dos portugueses para uma nova era.

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