Você está na página 1de 2

Argumento contra os sentidos

Em sua Primeira Meditação, Descartes anuncia seu objetivo: utilizar a razão, de forma ordenada, através de
um método que possibilite a construção de uma teoria científica válida e bem fundamentada. Para tanto, será
preciso livrar-se de todos aqueles princípios anteriormente apreendidos que não passaram pelo crivo da dúvida
metódica, pois, só assim -através do despir-se de antigas opiniões equivocadas-, será possível chegar ao
fundamento e, a partir disso, estabelecer um princípio basilar sólido para as ciências. Para realizar esse
movimento, o autor fará, inicialmente, uso do ceticismo com intuito de levá-lo à uma dúvida hiperbólica, para
depois, então, negá-lo. Ao utilizar o ceticismo, Descartes traz um antigo argumento cético como primeiro ponto
a ser analisado, esse diz respeito a ilusão de confiar nos sentidos como meios de apreensão de conhecimento
Em primeira análise, se faz necessário enxergar a plausibilidade do questionamento acerca da falibilidade dos
sentidos no que diz respeito à apreensão da realidade. O autor testemunha que, durante toda a sua vida, o
principal meio de apreensão dos conhecimentos vieram dos sentidos ou por intermédio dos sentidos; contudo,
em muitos momentos, os cinco sentidos mentiram e deram uma falsa projeção do real, enganando àquele que
pensa. Quantas vezes pode-se inferir que, ao observar um certo objeto, tomou-se sobre ele errado juízo devido
às más condições do ambiente como, por exemplo, distância ou baixa luminosidade. Portanto, é necessário
não confiar totalmente nos sentidos, afinal, segundo Descartes, aqueles que um dia enganaram podem
facilmente voltar a enganar.
Ademais, o juízo que o Filósofo suspende sobre os sentidos não existe somente por um simples receio, mas,
antes, porque também passa por um método que tem como um de seus fins suspender juízo sobre aquilo que é
dubitável. Em seu Discurso do Método, Descartes propõe três regras que visam auxiliá-lo em seu percurso
meditativo, são essas: regra da evidência, regra da análise, regra da síntese e regra da enumeração. A
primeira diz: “jamais pode-se aceitar uma coisa como verdadeira quando não se pode saber ser evidente como
tal”. Ora, sendo os sentidos não confiáveis pois em diversos momentos enganaram seus donos, o pressuposto de
que através dos sentidos se pode obter algum conhecimento sólido é inválido, pois fere a primeira regra que
auxilia a trajetória do método.
Ao final, Descartes questiona a dúvida cética acerca dos sentidos. Para ele, por exemplo, não é verdadeiro
que em todo momento os sentidos enganam, e seria insensatez duvidar disso. Ele põe-se à prova e se pergunta
se poderia duvidar da sua condição imediata naquele momento: que estava junto ao fogo ou que aquelas mãos e
corpo eram de fato dele. Chega a conclusão que não poderia, ao menos que ele se comparasse àqueles cujos
sentidos e cérebros estivessem sendo distorcidos por fatores externos. Cabe, afinal, o questionamento se seria
possível aceitar a evidência dos sentidos nesses casos.

REFERÊNCIAS
-MEDITAÇÕES Metafísicas. [S. l.]: Abril Cultural, º 2004
-INICIAÇÃO à História da Filosofia: Dos pré-socráticos a Wittgenstein. [S. l.]: Zahar, 2008
-GUIA para a leitura das "Meditações metafísicas" de Descartes. [S. l.]: Edição Loyola, [1997 ou 2003].

Você também pode gostar