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Sonda enteral: tipos, finalidades e práticas


seguras na prevenção de eventos adversos

Fernanda Raphael Escobar Gimenes


Universidade de São Paulo - USP

Seluane Gonçalves Silva


Universidade de São Paulo - USP

Rosana Aparecida Pereira


Universidade de São Paulo - USP

Mayara Carvalho Godinho Rigobello


Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto/Universidade de São Paulo - USP

Laís Facioli Rosa Moreno da Costa


Universidade de São Paulo - USP

Joana Márcia Martins Duarte


Universidade de Franca - UNIFRAN

Aline Eloá Barbosa


Universidade Paulista - UNIP

'10.37885/221111098
RESUMO

Os objetivos deste capítulo são conceituar sonda enteral e apresentar os tipos, as finalida-
des e as práticas seguras para a prevenção de eventos adversos em indivíduos adultos.
Trata-se de uma revisão narrativa com enfoque teórico pautado em publicações nacionais
e internacionais, aliado à experiência das pesquisadoras em segurança do paciente adulto
em uso de sonda enteral. São apresentados os tipos de sondas, suas finalidades e riscos
associados. Também são apresentadas duas vertentes para reduzir o risco de eventos
adversos associados ao mau posicionamento desses tubos. Conclui-se que as sondas en-
terais são comuns na prática clínica e podem estar associadas a eventos adversos graves
e fatais. Outrossim, sonda posicionada em local correto pode ser considerada um indicador
de qualidade da assistência.

Palavras-chave: Intubação Gastrointestinal, Nutrição Enteral, Segurança do Paciente, Sondas


de Alimentação, Eventos Adversos.
INTRODUÇÃO

Pessoas em condições crônicas e com agravos, submetidas a intervenções cirúrgicas,


com desnutrição calórica e proteica e pessoas idosas, geralmente necessitam de nutrição en-
teral (NE) para garantir as necessidades nutricionais diárias (CORREIA et al., 2017). NE con-
siste em administrar nutrientes diretamente no trato gastrointestinal (TGI) por meio de um
dispositivo de acesso enteral, definido como uma sonda, um tubo, um cateter ou um estoma
colocado diretamente no TGI para viabilizar a administração de nutrientes e/ou medicamentos
(BOULLATA et al., 2017; LORD, 2018). Embora a NE não seja considerada tradicionalmen-
te um medicamento, é uma terapia complexa que é prescrita, dispensada, administrada e
monitorada de maneira similar. Ademais, a NE está frequentemente associada à eventos
adversos graves e potencialmente fatais (BOULLATA et al., 2017; METHENY et al., 2019). 
Estudo pregresso conduzido nos Estados Unidos da América (EUA) revelou que, dos
1,6 milhões de idosos residentes em instituições de longa permanência, 5,8% utilizavam
sondas enterais para a NE. Além disso, observou-se que a taxa de mortalidade pós-inser-
ção transnasal de uma sonda de alimentação em posição gástrica ou entérica foi de 64,1%
e que a média de sobrevivência foi de aproximadamente 56 dias (DORNER et al., 2011).
No Brasil, pesquisadores observaram 28 pacientes em uma Unidade de Terapia
Intensiva (UTI) durante três dias consecutivos; destes, um apresentou aspiração bronco-
pulmonar confirmada e outro, suspeita de aspiração. Pesquisa realizada em um hospital
universitário do município de São Paulo com 214 pacientes em um período de um ano revelou
que em 70,5% dos casos houve a perda acidental da sonda de inserção transnasal em po-
sição gástrica, em 19% houve obstrução do tubo e em 13% dos pacientes houve aspiração
broncopulmonar (FIGUEREDO, 2011). 
No contexto nacional, compete ao enfermeiro e ao técnico de enfermagem as atribuições
quanto à administração segura da NE. Em relação ao enfermeiro, é de sua competência
participar da escolha da via de administração, junto à equipe multidisciplinar, fazer a escolha
do calibre da sonda (geralmente, de 8 a 12 French em adultos), inserir o tubo, garantir a
manutenção segura no paciente durante o tempo de permanência com o dispositivo, asse-
gurar a administração correta da NE e prescrever os cuidados de enfermagem. Compete
ao profissional de nível técnico promover os cuidados específicos aos pacientes em uso de
sonda segundo a prescrição de enfermagem e comunicar ao enfermeiro as intercorrências
que acontecerem durante o seu uso (COFEN, 2014).
Diante do exposto, esse capítulo tem objetivos conceituar sonda enteral e apresentar
os tipos, as finalidades e as práticas seguras para a prevenção de eventos adversos em
indivíduos adultos. Trata-se de uma revisão narrativa pautada em publicações nacionais e

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internacionais, aliada à experiência das autoras em segurança do paciente adulto em uso
de sonda enteral.

DESENVOLVIMENTO

O tipo de sonda, bem como sua localização ideal (gástrica versus intestinal), deve
ser determinado considerando-se os riscos inerentes à cada dispositivo. Também devem
ser observados fatores relacionados ao paciente, como gravidade da doença, anatomia
do TGI, motilidade gastrointestinal e duração da NE (BOULLATA et al., 2017; BRASPEN,
2021; LORD, 2018).
As sondas enterais de fino calibre (Figura 1) podem ser utilizadas com a finalidade de
fornecer os nutrientes necessários durante períodos de doenças agudas, traumas ou trata-
mentos médicos. Exemplos incluem: sondas de inserção transnasal em posição gástrica ou
entérica, sondas orogástricas e sondas oroentéricas. Quanto ao local de inserção, as sondas
podem ser introduzidas pela região nasal (Figura 2) ou oral, independentemente do tipo de
material da sonda (BOULLATA et al., 2017; BRASPEN, 2021; LORD, 2018).

Figura 1. Sonda enteral de fino calibre destinada à nutrição enteral.

Fonte: Arquivo pessoal.

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Figura 2. Sonda de alimentação de inserção transnasal.

Fonte: Arquivo pessoal.

As sondas de grosso calibre, são utilizadas por longo prazo e incluem as gastrosto-
mias, jejunostomias e gastrojejunostomias. Tratam-se de dispositivos de acesso enteral
introduzidos cirurgicamente pelo profissional médico, objetivando uma comunicação entre
a cavidade do estômago/jejuno e a parede abdominal. A opção por esta via alternativa de
alimentação depende de diversos fatores, dentre os quais: duração estimada da terapia de
NE, objetivos de longo prazo, disposição e necessidades especiais do usuário, familiares e
cuidadores (CHAYAMITI et al., 2022).
De maneira geral, o acesso gástrico é a primeira opção para a NE e é indicado para
pacientes com estômago funcional, livre de gastroparesia, obstrução ou fístula. Já o aces-
so entérico ou pós-pilórico é mais apropriado para pacientes com diminuição do nível de
consciência, reflexo da tosse ou vômito diminuído, esfíncter esofágico inferior incompeten-
te, déficits neurológicos, doença do refluxo gastroesofágico e gastroparesia grave, níveis
elevados de resíduo gástrico e êmese (BOULLATA et al., 2017; BRASPEN, 2021; JIANG
et al., 2017; LORD, 2018). 
Atualmente, vários modelos de sonda enteral estão disponíveis no mercado: sonda de
lúmen simples com ou sem ogiva distal, macia e de fino calibre (destinada à alimentação
gástrica ou pós-pilórica); sonda enteral sem ogiva com lúmen simples ou duplo (destinada
à descompressão gástrica do íleo e lavagem gástrica); sonda enteral sem ogiva com três
ou quatro lúmens (embora pouco utilizadas, são destinadas a intervenções terapêuticas em
pacientes com hemorragia gastrointestinal) (BOWDEN; GREENBERG, 2013).
A administração bem-sucedida e precoce da NE é um aspecto importante do cuidado
aos pacientes, especialmente aos criticamente doentes, pois aumenta a função imunológica,
diminui as complicações infecciosas e melhora a cicatrização de feridas (JIANG et al., 2018).
Ademais, a NE apresenta vantagens importantes quando iniciada precocemente porque

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proporciona melhor função imunitária intestinal, reduz a produção de hormônios catabólicos,
mantém a integridade do TGI e preserva o estado nutricional (FIGUEREDO, 2011).
As diretrizes da American Society for Parenteral and Enteral Nutrition (ASPEN) reco-
mendam a alimentação pós-pilórica em pacientes gravemente enfermos, com alto risco de
aspiração broncopulmonar ou intolerância à NE via gástrica. Aproximadamente 79% dos
pacientes críticos sofrem de esvaziamento gástrico retardado. Logo, o acesso pós-pilórico
torna-se uma opção viável porque não apenas reduz as complicações gastrointestinais e res-
piratórias, como também garante que os objetivos nutricionais sejam alcançados (BOULLATA
et al., 2017). Pesquisa de prevalência mundial, de sete anos de prática nutricional na UTI,
revelou, entretanto, que apenas 5,5% dos pacientes utilizavam sonda enteral pós-pilórica
para a NE, resultado esse atribuível à falta de métodos efetivos para confirmar a posição
dessas sondas quando inseridas às cegas à beira leito (LV et al., 2017).
No que diz respeito ao tipo de material, as sondas enterais podem ser confeccionadas
em Policloreto de Vinila (PVC), poliuretano ou silicone. A sonda de PVC (Figura 3) é menos
resistente em pH ácido e possui calibre que varia de 4 a 24 French (UNAMUNO; MARCHINI,
2002). Por ser mais calibrosa, é utilizada exclusivamente para lavagem, drenagem e descom-
pressão gástrica. Portanto, este tipo de sonda só deve ser inserido em posição gástrica e não
é indicada para a NE porque causa desconforto para o paciente, além de aumentar o risco de
sinusite e de lesão por pressão relacionada à dispositivo médico (BOULLATA et al., 2017).

Figura 3. Sonda de Policloreto de Vinila destinada exclusivamente à lavagem, drenagem e descompressão gástrica.

Fonte: Arquivo pessoal.

As sondas de fino calibre são manufaturadas em silicone ou poliuretano (Figura 1),


os quais não sofrem alterações físicas em pH ácido. Apresentam calibre que varia de 6
a 12 French e, por esse motivo, permitem o fechamento dos esfíncteres cárdia e piloro
(UNAMUNO; MARCHINI, 2002). Essas sondas podem ser inseridas em posição gástri-
ca ou entérica (pós-pilórica) e possuem maior durabilidade, maleabilidade e flexibilidade
(UNAMUNO; MARCHINI, 2002). São dotadas de um estilete de metal temporário ou fio-guia

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para facilitar sua inserção e progressão através do TGI (UNAMUNO; MARCHINI, 2002). O es-
tilete é removido depois que a extremidade distal da sonda é corretamente posicionada e
não deve ser reinserido. Os riscos dessa prática incluem perfuração da sonda e o avanço
do estilete para além da ponta da sonda, o que pode ocasionar perfuração do esôfago, es-
tômago ou intestino (BOULLATA et al., 2017). Em geral, essas sondas são radiopacas, de
modo que o estilete de metal deve ser removido antes da realização do raio-X (ANZILIERO
et al., 2017), que é considerado o método com o melhor nível de evidência para confirmar
o posicionamento de sondas alimentação de fino calibre recém inseridas às cegas a beira
leito (JIANG et al., 2018). Essas sondas também possuem marcas numéricas ao longo da
extensão que auxiliam o profissional de saúde na verificação do seu posicionamento. Algumas
contém em sua extremidade ogiva distal confeccionada com tungstênio para facilitar a pro-
gressão da sonda e o seu posicionamento no intestino. Contudo, evidências científicas não
confirmaram essa hipótese. Ademais, sondas confeccionadas sem a ogiva são mais fáceis
de serem inseridas através das narinas e demonstraram migrar com mais facilidade para o
intestino delgado, principalmente após a administração de metoclopramida ou de eritromi-
cina intravenosa (JIANG et al., 2018). Em relação ao tempo de uso, recomenda-se que o
paciente permaneça com a mesma sonda por até 30 a 90 dias, sendo indicada a troca do
dispositivo após esse período (ANZILIERO et al., 2017).

Eventos adversos relacionados à inserção de sonda de alimentação

Em revisão integrativa da literatura, a autora identificou 69 artigos que abordaram even-


tos adversos relacionados à inserção de uma sonda de alimentação em posição gástrica ou
entérica. Em 44 artigos, foram reportados eventos adversos respiratórios ocasionados pelo
posicionamento incorreto da sonda no trato respiratório. Os mais comuns foram: pneumotó-
rax, derrame pleural, aspiração broncopulmonar relacionada à administração de NE no trato
respiratório e pneumonia aspirativa. Na maioria dos casos, foi necessária a inserção de dreno
torácico para tratar o evento e, em 10 artigos, houve relato de óbito (MOTTA et al., 2021).
De acordo com relatório publicado pela Food and Drug Administration (FDA), órgão
governamental americano responsável pela saúde pública nos EUA, houve 51 casos de pneu-
motórax associado à inserção de uma sonda de alimentação no período de janeiro de 2012
a julho de 2017. Também informou que, na maioria dos casos, houve necessidade de inter-
venção urgente, incluindo descompressão com agulha ou inserção de dreno torácico. Vários
desses eventos foram associados à parada cardiorrespiratória e morte (BROOKS, 2018). 
Aproximadamente 2% das sondas de fino calibre são inseridas nos pulmões (RESCH
et al., 2014). No Reino Unido, o mal posicionamento dessas sondas é considerado um Never
Event, ou seja, um evento sentinela específico relacionado à segurança do paciente que,

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quando presente, geralmente resulta em dano grave ou óbito, apesar das evidências sobre
estratégias de prevenção (NHS ENGLAND, 2016). Trata-se, portanto, de evento evitável. 
Outros eventos adversos igualmente graves foram reportados na revisão. Os danos ao
esôfago ou faringe resultaram em paralisia das cordas vocais; hemorragia maciça secundária
à perfuração da nasofaringe, artéria carótida anterior e veia jugular interna; e em síndrome
da sonda nasogástrica, a qual consiste na paralisação das cordas vocais, bilateralmente,
acompanhada de edema supraglótico. Houve também relato de perfuração intestinal que
culminou em morte do paciente; perfuração intracraniana; queimadura química de 8% do
corpo ocasionada pela desconexão da sonda; e administração de alto fluxo de oxigênio no
estômago devido ao erro de conexão (MOTTA et al., 2021).
Tais eventos foram relacionados, principalmente, às falhas na confirmação do posicio-
namento da sonda e aos resultados inconclusivos dos métodos utilizados à beira leito para
determinar sua correta posição.
Recente revisão de diretrizes internacionais voltadas para a diferenciação do posiciona-
mento gástrico e pulmonar da sonda de alimentação (METHENY et al., 2019) revelou que a
radiografia é considerada o método de primeira linha para a confirmação do posicionamen-
to da sonda em países como os EUA e Canadá. Segundo as pesquisadoras, na Europa e
Austrália, este exame só é realizado quando o resultado da medição do pH é inconclusivo ou
quando o paciente apresenta elevado risco de aspiração. Ainda, quatro diretrizes apontaram
que pH entre 1 e 5,5 indica posição gástrica e pode substituir o raio-X, que a radiografia é o
método mais acurado para distinguir posição gástrica e pulmonar da sonda de alimentação,
mas que o exame necessita ser interpretado por profissional especializado em radiologia,
já que há relatos na literatura de eventos adversos respiratórios ocasionados por falhas na
interpretação do exame pelo profissional médico. Ainda, o exame está associado a altos
custos, atraso na administração da dieta enteral e exposição do paciente à radiação.
As autoras da revisão também declararam que, dentre os demais métodos não radio-
gráficos existentes, a medição de pH é o mais sensível e o método auscultatório é o menos
desejável. Ainda, a ausência de sinais de dificuldade respiratória não confirma posição
correta da sonda no estômago, visto que alguns pacientes não apresentam sinais de des-
conforto quando a sonda é inadvertidamente inserida no trato respiratório. Concluíram que
a medição do pH é recomendada pela National Patient Safety Agency (NPSA) do Reino
Unido e pela American Association of Critical Care Nurses; que não há evidências de que
outros métodos apresentem a mesma, ou que excedam, precisão do pH ou do raio-X para
confirmar a posição de sonda de alimentação de inserção transnasal em posição gástrica e
que a radiografia não deve ser utilizada rotineiramente em todos os pacientes e serviços de

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saúde, já que o exame pode não ser uma opção no atendimento domiciliar e em instituições
de longa permanência (METHENY et al., 2019).
Quanto à acurácia dos métodos realizados à beira leito para confirmar a posição de uma
sonda de alimentação de inserção transnasal em posição gástrica, estudo demonstrou que
o pH apresentou sensibilidade de 78,4% e especificidade de 85,7%, enquanto que o método
auscultatório apresentou 79% e 61%, respectivamente (BOEYKENS et al., 2014). Estudo
realizado em UTI brasileira também revelou concordância fraca entre a ausculta epigástrica
e o raio-X na localização da sonda recém inserida às cegas à beira leito. Ainda, o raio-X
detectou 70% das sondas enterais no estômago e 1,3%, no esôfago (BEGHETTO et al.,
2015). Pesquisa realizada no Reino Unido (TAYLOR; CLEMENTE, 2005), com o objetivo
de avaliar a acurácia do pH na confirmação do posicionamento de sonda de alimentação
de inserção transnasal em posição gástrica também revelou que em 29% não foi possível
confirmar a posição do tubo por meio da mensuração do pH devido ao uso de inibidores da
bomba de prótons e bloqueadores-H2 pelos pacientes. Segundo os pesquisadores, algumas
fitas reagentes foram imprecisas ou mal interpretadas pelo profissional de saúde.
Devido às limitações de ambos métodos (ausculta epigástrica e mensuração de pH),
a radiografia ainda é considerada o método de referência em diversos países (METHENY
et al., 2019), inclusive no Brasil (BRASPEN, 2021), e é recomendada após a inserção de
uma sonda de alimentação de fino calibre antes de iniciar a administração da dieta enteral
e medicamentos devido a sua elevada acurácia (METHENY et al., 2019). 
Destaca-se que o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo - COREN-SP (2009)
recomenda que, na impossibilidade de realizar a radiografia para confirmar o posicionamento
de sonda de alimentação de inserção transnasal em posição gástrica, o profissional utilize
dois métodos não radiológicos, a saber, mensuração do pH e ausculta epigástrica.
Não há estudos no Brasil que tenham evidenciado os métodos mais empregados por
enfermeiros na confirmação do posicionamento de sondas de alimentação recém inseridas
às cegas à beira leito. Entretanto, observa-se na prática clínica que a ausculta epigástrica
ainda é uma das mais utilizadas, apesar de sua baixa especificidade (BEGHETTO et al.,
2015; TURGAY; KHORSHID, 2010). 
Diante das divergências identificadas nos estudos apontados, nas recomendações
do COREN-SP e na prática clínica, verifica-se a importância dessa revisão narrativa para
a melhoria da qualidade da assistência prestada aos pacientes em uso de sonda enteral,
bem como a importância de serem elaboradas diretrizes nacionais baseadas nas evidências
científicas mais atuais. 

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Práticas seguras na prevenção de eventos adversos relacionados ao mau
posicionamento de sondas de alimentação

Sondas de alimentação de inserção transnasal apresentam vários riscos, incluindo


o posicionamento incorreto no pulmão, esôfago ou intestino. Especialistas afirmaram que
mesmo os profissionais mais experientes podem ter dificuldade em reconhecer a intubação
pulmonar ao inserir uma sonda de fino calibre às cegas à beira leito (LYMAN et al., 2018).
Pesquisa realizada em 2015 mostrou que mais de 88% dos enfermeiros ainda utilizam
práticas não baseadas nas melhores evidências científicas para verificar a posição dessas
sondas, tais como ausculta epigástrica, teste do copo e inspeção do aspirado. Segundo os
pesquisadores, tais métodos aumentam o risco para os eventos adversos e devem ser abo-
lidas da prática clínica. Destaca-se que, no período de 2001 a 2011, prestadores de serviços
médicos de Chicago pagaram mais de US$ 10 milhões em processos movidos por danos
e mortes causadas por sondas de alimentação mal posicionadas (RELIAS MEDIA, 2015).
Reduzir os eventos adversos ocasionados pelo mau posicionamento desses tubos
envolve abordagem em duas vertentes: consistência na interpretação da radiografia e abolir,
da prática clínica, os métodos não baseados nas melhores evidências científicas (LYMAN
et al., 2018). Para confirmar a posição de uma sonda de alimentação de inserção transnasal
em posição gástrica, diretrizes internacionais recomendam sistema de verificação multimodal
(LYMAN et al., 2018), conforme Figura 4:

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Figura 4. Sistema de verificação multimodal de sonda de alimentação recém inserida às cegas à beira leito.

Fonte: Baseado em Lyman, Peyton e Healey (2019).

Entretanto, é importante que a posição da sonda seja monitorada rigorosamente du-


rante todo o tempo de uso, uma vez que o dispositivo pode ser deslocado para um local
diferente da posição ideal, especialmente após episódios de agitação, tosse, náusea e
vômito. Nesses casos, a mensuração do pH deve ser realizada com o paciente em jejum
(METHENY et al., 2019). 
Ainda, as seguintes estratégias de prevenção de eventos adversos associados à NE in-
cluem (BOULLATA et al., 2017; BRASPEN, 2021; BUTCHER et al., 2020):

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• Identificar e monitorar pacientes com elevado risco de aspiração;
• Manter a sonda em posição pós-pilórica em pacientes críticos e com elevado risco
de aspiração;
• Manter a cabeceira do leito elevada entre 30° e 45° e documentar essa posição
pelo menos a cada quatro horas (caso esta ação seja contraindicada, recomenda-
se a posição de Trendelenburg invertida);
• Administrar NE por meio de bomba de infusão contínua em pacientes com alto risco
de aspiração e com esvaziamento gástrico retardado;
• Verificar a posição da extremidade distal da sonda e registrar a medida externa
inicial da sonda a cada 4 horas;
• Verificar a posição da sonda após episódios de vômito, tosse e após tração da
sonda;
• Monitorar alterações gastrointestinais que incluem presença de náusea, vômito, re-
fluxo, sensação de plenitude, distensão, ausência de ruídos intestinais, desconforto
abdominal, dor ou cólicas, em intervalos de 4 horas;
• Manter doses mínimas de sedação;
• Considerar o uso de agentes pró-cinéticos (como por exemplo, metoclopramida),
quando clinicamente viável, em pacientes com elevado risco de aspiração.

Com base no exposto, verifica-se a importância de os profissionais de saúde geren-


ciarem os riscos relacionados ao uso de sondas enterais, particularmente as de fino calibre,
pois os danos causados por esses dispositivos e pela NE podem ser graves e fatais. Aos
enfermeiros, compete conhecer o perfil do paciente sob os seus cuidados e suas atribuições
no planejamento do cuidado seguro e livre de danos no exercício de sua profissão (COFEN,
2017). Aos hospitais, cabe disponibilizar os recursos materiais necessários para garantir
qualidade e segurança na execução dos métodos clínicos empregados para confirmar a
posição das sondas.
O sucesso do gerenciamento dos riscos relacionados às sondas e à NE depende do
desenvolvimento de competências e habilidades pertinentes à gestão dos serviços de saúde
pelo enfermeiro e de sua participação mais efetiva na escolha do dispositivo mais apropriado
para cada paciente. Tais competências são determinadas pelo nível de conhecimento do
profissional, pelas habilidades técnicas e não técnicas e pela atitude proativa. 
É necessário, também, que a equipe de terapia de nutrição enteral envolva o próprio
paciente e o familiar / cuidador no planejamento da assistência, bem como no gerenciamento
dos riscos relacionados à NE, porque essas pessoas têm grande interesse em sua própria
saúde e na de suas comunidades e podem contribuir com a segurança dos cuidados pres-
tados, em todos os níveis de atenção à saúde.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A inserção de sonda de alimentação é uma atividade rotineira dos profissionais de saú-


de, mas que pode resultar em danos graves aos pacientes. Outrossim, sonda posicionada
em local correto pode ser considerada um importante indicador de qualidade da assistência.
Enfermeiros necessitam se envolver nos processos licitatório de aquisição de sondas
enterais, na organização e revisão de protocolos assistenciais relacionados à inserção de
sondas enterais de alimentação e à NE, atuar em conjunto com a equipe multidisciplinar
para tomar decisões assertivas em relação à segurança do paciente e realizar treinamentos
contínuos para garantir a qualidade do cuidado prestado ao paciente em uso desses dispo-
sitivos, em todos os níveis de atenção à saúde. Além disso, cabe ao enfermeiro participar
da escolha do modelo e do local de inserção da sonda enteral e envolver, de modo mais
eficiente, o paciente e seus familiares / cuidadores na tomada de decisão.
 Os enfermeiros atuam como facilitadores na identificação de potenciais riscos porque
estão diretamente ligados aos processos de cuidar. Ademais, esses profissionais assumem
o papel de líder da equipe de enfermagem, medindo os danos e avaliando o impacto desses
eventos na qualidade da assistência e na segurança do paciente em uso de sonda.

REFERÊNCIAS

ANZILIERO, F.; CORRÊA, A.P.A.; SILVA, B.A.; DAL SOLER, B.E.; BATASSINI, E.; BE-
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DOI:10.1590/0034-7167-2016-0222. 

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nejo de sonda naso/orogástrica e nasoentérica. In: BOWDEN, V.R.; GREENBERG,
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