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4ª Aula – Banco Central e Taxa de Juros

Banco Central e Taxa de Juros

Leitura N°1: “Banco Central: Removendo os Limites”, de Murray Rothbard (15 minutos)

O MISTÉRIO DOS BANCOS

Murray Rothbard

Banco Central: Removendo os Limites

Um sistema de pluralidade bancária, devido aos limites que abordamos anteriormente, será
inevitavelmente um regime de moeda forte e sem inflação. Em contraste, o propósito básico
de um sistema de Banco Central é de usar os privilégios do governo para remover os limites
que o sistema de pluralidade bancária impõe à expansão creditícia e monetária.

O Banco Central, ou bem é diretamente operado pelo governo e sua propriedade, ou bem é
um privilégio especial concedido pelo governo. Em ambos os casos o Banco Central recebe do
governo o privilégio exclusivo de emitir cédulas, enquanto o resto dos bancos comerciais só
podem abrir contas correntes na forma de passivos sob demanda.

Exemplo: existe uma variedade de notas em circulação – do Banco da Inglaterra, do Federal


Reserve americano, do Banco Central da República Argentina, do Banco Central do Brasil etc.
Se o cliente de um banco comercial deseja sacar seus depósitos na forma de papel-moeda, um
título ao portador em pequena denominação, ele não pode obter notas do seu banco, porque
este não pode emiti-las. Seu banco deverá obter notas com o Banco Central. A única maneira
de obtê-las será comprando-as e para isso só há dois meios:

1. Vender ativos ao Banco Central que ele deseje comprar;


2. Ter uma conta corrente no Banco Central e sacar dela parte dos fundos.

Sabemos que o Banco Central é um banco de bancos. Assim como as pessoas abrem contas em
bancos comerciais, os bancos comerciais abrem contas no Banco Central. São contas bancárias
no Banco Central ou depósitos à vista. Quando os depositantes do banco comercial desejam
notas em troca de seus depósitos, o banco comercial as retira do Banco Central e as repassa
aos seus clientes.

Por exemplo: o Banco A recebe ouro de seus depositantes leva-o ao Banco Central onde abre
uma conta corrente com R$ 5 milhões; o Banco A então saca R$ 4 milhões em notas de curso
legal e as empresta. O banco detém uma reserva fracionária de R$ 1 milhão na conta corrente
no Banco Central.

1
Banco A
Reservas (depósitos à vista no Banco
1.000.000 Depósitos à vista 5.000.000
Central)
Empréstimos a receber 4.000.000
Ativo total 5.000.000 Passivo total 5.000.000

Banco Central
Depósitos à vista do Banco
Ouro no cofre 5.000.000 1.000.000
A
Meio circulante 1 4.000.000
Ativo total 5.000.000 Passivo total 5.000.000

Se os depositantes do Banco A querem sacar R$ 500 mil em notas, o Banco A deve retirá-los de
sua conta corrente no Banco Central.

Banco A
Reservas (Depósitos à vista no
500.000 Depósitos à vista 4.500.000
Banco Central)
Empréstimos a receber 4.000.000

Ativo total 4.500.000 Passivo total 4.500.000

Banco Central

Ouro no cofre 5.000.000 Depósitos à vista do Banco A 500.000

Meio circulante 4.500.000


Ativo total 5.000.000 Passivo total 5.000.000

Ao fazer isto, o Banco A faz cair sua fração de reservas sobre depósitos. Antes dos depositantes
retirarem o dinheiro, a relação Reservas/Depósitos era 1 milhão/5 milhões = 1/5. Após a
retirada, a relação passa a ser de 500 mil/4,5 milhões = 1/9.

Em um regime de pluralidade bancária, no qual o banco pode emitir suas próprias notas, o
saque de papel-moeda pelos depositantes haveria apenas alterado a forma do passivo do
Banco A. Já em um regime de Banco Central, é o passivo do Banco Central que sofre uma
alteração de forma. Até aí, em ambos os casos, a oferta monetária se mantém inalterada.

No entanto, no regime de Banco Central, a razão Reservas/Depósitos do Banco A foi


severamente reduzida. Bancos, seja por determinação legal ou por práticas usuais de mercado,
em geral mantêm constante seu nível de alavancagem, a razão Reservas/Depósitos. No caso,
com reservas de 500.000 e alavancagem desejada de 1/5, o Banco A irá reduzir seus ativos de
4,5 milhões para 2,5 milhões.

1
Na contabilidade do Banco Central do Brasil, as cédulas em circulação aparecem sob a rubrica de Meio
Circulante.

2
Banco A
Reservas (Depósitos à vista no
500.000 Depósitos à vista 2.500.000
Banco Central)
Empréstimos a receber 2.000.000
Ativo total 2.500.000 Passivo total 2.500.000

Com isso, a contribuição do Banco A para a oferta monetária terá caído em 2,5 milhões. Como
o Banco Central pôs em circulação 500 mil novas cédulas, o efeito final sobre a oferta
monetária foi uma redução de 2 milhões.

Em um sistema de Banco Central, a retirada de dinheiro pelo público e a consequente emissão


de dinheiro novo pelo Banco Central tem o efeito paradoxal de diminuir a oferta monetária.
Isto se deve à necessidade dos bancos de manter uma determinada razão de
Reservas/Depósitos.

Da mesma forma, quando o público deposita seu dinheiro, isto tem um efeito inflacionário
porque aumenta a razão Reservas/Depósitos e os bancos podem então expandir seus
empréstimos. Se forem depositados $ 500 mil no Banco A, o efeito é simétrico à retirada: o
Banco Central retirará de circulação $ 500 mil cédulas, enquanto o Banco A, devido às novas
reservas, expandirá seu balanço em 2,5 milhões, totalizando um incremento na oferta
monetária de 2 milhões.

A oferta monetária não inclui as contas correntes dos bancos comerciais no Banco Central ou o
dinheiro que os bancos guardam em seus cofres simplesmente porque esse dinheiro é uma
reserva respaldando papéis em circulação. Se fossem incluídos, haveria dupla contagem destes
ativos; seria o mesmo que somar o ouro depositado aos certificados de depósito emitidos.

Em um sistema de Banco Central a oferta monetária (M) é igual ao dinheiro nas mãos do
público mais os depósitos em contas correntes detidos pelo público em bancos comerciais. O
dinheiro em espécie consiste por sua vez nas moedas ou lingotes de ouro detidos pelo público
mais as notas emitidas pelo Banco Central detida pelo público.

A oferta monetária é, portanto: M = moedas de ouro nas mãos do público + cédulas do Banco
Central nas mãos do público + depósitos em conta corrente do público nos bancos comerciais.

Quando um país sai do padrão-ouro, as moedas de ouro não são mais aceitas como meio de
pagamento, deixando de fazer parte da oferta monetária, que passa a ser constituída da
seguinte forma:

M = cédulas do Banco Central nas mãos do público


+ depósitos em conta corrente do público nos bancos comerciais.

Em regime de Banco Central, se as pessoas não querem utilizar bancos e deseja apenas ouro, o
potencial inflacionário do sistema diminui. Também diminui este potencial se as pessoas
preferem cédulas consigo a contas correntes nos bancos. Estas preferências afetam
diretamente o potencial do sistema de reserva fracionária. Do mesmo modo, se o público

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prefere possuir saldo em conta corrente a deter dinheiro em espécie na carteira, o potencial
inflacionário do sistema de Banco Central aumenta.

Mas o que ocorre com os outros limites que o sistema de pluralidade bancária possuía, que
impediam os bancos de inflacionar a economia?

Em pluralidade bancária, os bancos correm risco de corrida bancária e de serem levados à


falência. Como fica isto no regime de Banco Central? Em primeiro lugar, se o Banco Central
respeita a convertibilidade do Padrão-Ouro e o público insistir em converter seus saldos em
conta corrente e seus bilhetes por ouro, o Banco Central realmente pode vir a quebrar. No
entanto, como o Banco Central é uma propriedade do Estado, que inclusive o utiliza para
depositar seus fundos, e como o Banco Central detém o monopólio de emissão de papel-
moeda, essa falência é improvável.

Na verdade, quanto aos limites que constrangiam o inflacionismo na pluralidade bancária, o


regime de Banco Central os tem bastante ampliados. Às suas notas ainda se concede em geral
curso forçado na economia, isto é, aceitação compulsória para a liberação de toda forma de
dívida de dinheiro (obrigações pecuniárias). Se uma pessoa assume uma dívida de R$ 10 mil
em dinheiro, seu credor é obrigado a aceitar pagamento em cédulas emitidas pelo Banco
Central pelo seu valor de face (isto é, sem penalizar o devedor com um ágio). O curso forçado
significa que o credor não pode exigir o pagamento em ouro ou moeda estrangeira.

Quanto às corridas bancárias, e em contraste com o que ocorreria em um sistema de


pluralidade bancária, em regime de Banco Central, esta instituição sempre pode converter-se
em “emprestador de última instância”, ao emprestar recursos e prestígio a bancos em
necessidade. O Banco Central auxilia, portanto, os bancos com problemas, proporcionando-
lhes acesso a reservas, comprando seus ativos (seus títulos emitidos), abrindo linhas de crédito
especiais. Desta forma os bancos comerciais suportam quase todas as tormentas, é a “saúde
financeira” do sistema.

E quanto aos limites que o próprio sistema bancário impunha a si mesmo? Se o Banco A
expande seu crédito, não vai imediatamente sofrer saques dos clientes do Banco B e quebrar?
Muito pelo contrário. Com o Banco Central, todos os bancos expandem seu crédito juntos; o
acesso a reservas provém do Banco Central. Nenhum banco perde reservas às custas de outro.
Com a centralização das reservas de ouro e o monopólio da emissão de papel-moeda, o Banco
Central leva os bancos comerciais a inflacionar harmoniosa e uniformemente em conjunto. O
Banco Central, portanto substitui a moeda forte sem inflação pela inflação bancária do crédito
coordenado.

O propósito do Banco Central é justamente este. Sua carta de princípio diz: “Coordenar a
atividade bancária de forma a poder evitar as restrições que o livre mercado e que a
pluralidade bancária impõem, inflando todos juntos uniformemente”. Os bancos comerciais
não se contrapõem ao controle do Banco Central, mas pelo contrário, estimulam sua criação e
a recebem de bom grado. Ela significa seu passaporte para a inflação e para a moeda fácil.

O Banco Central remove do sistema o medo das corridas bancárias e dos saques por clientes
de outros bancos comerciais. Resta apenas uma restrição à inflação do crédito: os

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requerimentos legais mínimos de reserva, isto é, da razão reservas/depósitos. Em geral, os
bancos emprestam no limite máximo.

Juntemos agora todos bancos comerciais do país em um único balanço contábil, e em outro
balanço o Banco Central. Suponhamos que por uma circunstância qualquer as reservas totais
dos bancos comerciais no Banco Central na forma de depósitos em conta corrente se elevem
em 1 bilhão. Suponhamos também que a alavancagem máxima é de 5/1 e que os bancos
operam no limite, emprestando 5 reais para cada 1 real de reserva:

Todos os bancos comerciais


Reservas (depósitos à
1 bilhão Depósitos à vista 1 bilhão
vista no Banco Central)
Ativo total 1 bilhão Passivo total 1 bilhão

Banco Central
Depósitos à vista dos bancos
Ouro no cofre 1 bilhão 1 bilhão
comerciais
Ativo total 1 bilhão Passivo total 1 bilhão

Aqui não nos interessa verificar de que maneira as reservas dos bancos aumentaram, mas sim
o fato de que as reservas aumentaram em 1 bilhão, e que os depósitos aumentaram em 1
bilhão mas podem ir a 5 bilhões. Os bancos poderão expandir seus créditos e elevar os saldos
em conta corrente de seus clientes em 4 bilhões.

Como fazem isso? Abrindo contas correntes e concedendo novos empréstimos. Esse dinheiro
não vem de lugar nenhum, é como que feito de ar. Em troca dele os bancos recebem
promessas de pagamento, títulos a receber.

Todos os bancos comerciais


Reservas 1 bilhões
Títulos a receber 4 bilhão Depósitos à vista 5 bilhões
Ativo total 5 bilhões Passivo total 5 bilhões

O aumento de 1 bilhão nas reservas dos bancos comerciais levou a um incremento de 5


bilhões em seu passivo de depósitos à vista e por conseguinte na oferta monetária do país.

O quanto os bancos inflacionarão a economia? Se emprestam o máximo que podem,


inflacionarão na medida do nível de alavancagem máximo permitido, ou, de outra forma,
mantendo o nível mínimo de reservas requerido na razão Reservas/Depósitos. Se os
requerimentos de reserva legal são de 1/5 eles inflacionarão à taxa de 5/1 sobre as reservas.

A taxa pela qual os bancos podem criar novos depósitos relativamente à quantidade de novas
reservas se chama multiplicador bancário e é a inversa do nível mínimo de reserva legal
requerido.

Multiplicador bancário = 1/(taxa de reserva mínima)

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Se os bancos emprestarem no nível máximo permitido, a oferta monetária será dada por:

M = cédulas em circulação + (reservas bancárias totais * multiplicador bancário)

Se os bancos emprestam menos do que o limite máximo, as reservas que não foram
alavancadas são chamadas de excesso de reservas. Em um sistema de Banco Central, a oferta
monetária é determinada por dois fatores:

1. Os requerimentos legais de reserva


2. O total de reservas

O Banco Central pode controlar o total da oferta monetária a qualquer momento manipulando
tanto os requerimentos de reserva mínima quanto o total de reservas dos bancos comerciais.

Em geral, o nível mínimo de reservas é fixado pelo Banco Central em concordância com o
ministro da Fazenda. Vejamos o que acontece quando este requerimento é alterado.
Suponhamos que o Banco Central reduz o nível mínimo de reservas de 20% para 10%. Os
bancos emprestam o máximo que podem.

Todos os bancos comerciais (20% de reservas compulsórias)


Reservas 10 bilhões
Títulos a receber 40 bilhões Depósitos à vista 50 bilhões
Ativo total 50 bilhões Passivo total 50 bilhões

Banco Central
Depósitos à vista dos bancos
10 bilhões
comerciais
Passivo total 10 bilhões

Agora o nível de reservas compulsórias cai à metade, de 20% para 10%.

Todos os bancos comerciais (10% de reservas compulsórias)


Reservas 10 bilhões
Títulos a receber 90 bilhões Depósitos à vista 100 bilhões
Ativo total 100 bilhões Passivo total 100 bilhões

O balanço do Banco Central não é alterado.

Ao diminuir o nível mínimo de reservas requerido os bancos expandem seus créditos e


investimentos (emitindo títulos) e aumentam seus passivos de depósitos à vista em 50 bilhões.
Os depósitos à vista na economia são agora de 100 bilhões e a oferta monetária aumentou em
50 bilhões.

Desta forma, uma maneira pela qual o Banco Central pode aumentar a oferta monetária é
baixando os requerimentos de reservas compulsórias.

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Quando em 1913 os EUA criaram seu Banco Central (o Federal Reserve System - FED), o nível
de reservas compulsórias era de 20%. Em 1917, durante a Primeira Guerra Mundial, este nível
foi baixado a 10% e o multiplicador bancário duplicou. Em 1937, depois de quatro anos de
altas taxas de inflação, devido à crise de 1929, o FED, desesperado, dobrou o nível de reservas
compulsórias, passando dos 10% para os 20% em plena recessão. A atividade econômica
sofreu uma contração severa a partir de 1938.

O Banco Central, em geral, é cauteloso quanto a alterações no nível de reservas compulsórias


e prefere utilizar outras ferramentas para a execução da sua política monetária, intervindo no
total das reservas bancárias.

Responda às seguintes perguntas:

1. Qual é a principal característica do sistema de Banco Central? Os bancos comerciais


podem emitir notas? Como conseguem dinheiro?
2. Como se pode aumentar ou diminuir a oferta monetária?
3. O nível de reservas compulsórias equivale a:
a) Depósitos/Reservas.
b) Reservas/Depósitos.
c) A quantidade de dinheiro em circulação na economia.
d) Nenhuma das alternativas.
4. Verdadeiro ou Falso: Se o público deposita dinheiro nos bancos, isto tem um efeito
deflacionário. Justifique sua resposta.
5. Como é composta a oferta monetária?

1
PARA RECORDAR: Multiplicador Bancário = 𝑁𝑁í𝑣𝑣𝑣𝑣𝑣𝑣 𝑑𝑑𝑑𝑑 𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟 𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐𝑐 ó𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟𝑟

Exemplo de multiplicador bancário: Suponhamos que os bancos comerciais têm um nível de


reservas compulsórias de 50%. Isso significa que metade do dinheiro depositado pode ser
reemprestado, mas que a outra metade deve ser guardada. Suponhamos também que uma
pessoa deposita R$ 100 no Banco A. Este Banco A terá depósitos de R$ 100 e poderá
reemprestar a metade deles, isto é, R$ 50. O que acontece agora é que os R$ 50 emprestados
pelo Banco A serão depositados pelo devedor no Banco B, que por sua vez repetirá a história,
emprestando R$ 25 e guardando R$ 25. A história se repete ao longo de dez transações, como
podemos ver na tabela abaixo, na qual a coluna de depósitos exibe o total de criação
secundária de moeda (saldos em conta-corrente sacáveis à vista), que tende a R$ 200, isto é,
ao dobro da quantidade de papel-moeda original. Este resultado pode ser encontrado ao
aplicarmos a fórmula que encontramos acima, onde Multiplicador Bancário = 1/0,5 = 2.

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Transação Banco Depósitos Empréstimos

1 A 100 50

2 B 50 25

3 C 25 12,5

4 D 12,5 6,25

5 E 6,25 3,13

6 F 3,13 1,56

7 G 1,56 0,78

8 H 0,78 0,39

9 I 0,39 0,20

10 J 0,20 0,10

199,8

Leitura N° 2: “Banco Central: Determinando o total de reservas”, de Murray Rothbard (20


minutos)

O MISTÉRIO DOS BANCOS

Murray Rothbard

Banco Central: Determinando o total de reservas

Quais os fatores que determinam o nível total de reservas bancárias? Há duas classes de
fatores:

1. Os controlados pela ação do público ou do mercado


2. Os controlados pelo Banco Central

1.1 A demanda por dinheiro em espécie

Dentre as ações do público é esta a que mais influi na determinação do total de reservas. Se o
público quer manter dinheiro em espécie, isto força o banco a contrair seu crédito por
diminuir o total de reservas à sua disposição.

Vejamos o que acontece se as pessoas desejam deter mais dinheiro em espécie e por isso o
sacam de suas contas correntes:

Todos os bancos comerciais


Reservas 10 bilhões
Títulos a receber 40 bilhões Depósitos à vista 50 bilhões
Ativo total 50 bilhões Passivo total 50 bilhões

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Neste sistema bancário o nível de reservas compulsórias é de 20%, e os bancos emprestam o
máximo que lhes é permitido.

M = notas em circulação (15 bilhões) + Depósitos à vista (50 bilhões) = 65 bilhões

Se o público saca 2 bilhões em depósitos à vista para deter mais cédulas do Banco Central, os
bancos devem ir ao Banco Central e sacar 2 bilhões de suas contas correntes no Banco Central.

Todos os bancos comerciais


Reservas 8 bilhões
Títulos a receber 40 bilhões Depósitos à vista 48 bilhões
Ativo total 48 bilhões Passivo total 48 bilhões

Banco Central
Depósitos à vista dos bancos
8 bilhões
comerciais
Meio circulante 17 bilhões
Passivo total 25 bilhões

Até aqui a oferta monetária não foi alterada. O saldo nas contas correntes diminuiu, mas o
papel-moeda em circulação aumentou na mesmo medida. No entanto, os bancos deverão
agora reduzir seus empréstimos e seus depósitos à vista até que o nível de alavancagem
anterior seja reestabelecido. Os empréstimos deverão se contrair em 8 bilhões, e como as
reservas caíram em 2 bilhões, o passivo de depósitos à vista terá sofrido redução de 10
bilhões.

Todos os bancos comerciais


Reservas 8 bilhões
Títulos a receber 32 bilhões Depósitos à vista 40 bilhões
Ativo total 40 bilhões Passivo total 40 bilhões

Ao aumentar a demanda do público por dinheiro em espécie foram sacados 2 bilhões das
reservas dos bancos; os depósitos à vista sofreram uma redução imediata de 2 bilhões e logo a
seguir uma contração de 8 bilhões, totalizando redução de 10 bilhões.

ΔM = ΔCirculante (+2 bilhões) + ΔDepósitos à vista (-10 bilhões) = -8 bilhões

Se a demanda por dinheiro em espécie aumenta, as reservas bancárias se contraem; o


multiplicador bancário faz com que o efeito final sobre a oferta monetária seja muito maior do
que o saque inicial.

Quanto mais dinheiro o público detém consigo, menos estará disponível nas contas correntes
à disposição do banco para emprestar e se alavancar. O dinheiro ou se encontra nas mãos do
público ou está depositado nos bancos.

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Quanto mais dinheiro em espécie estiver nas mãos do público, menor será o efeito
inflacionário. Se o público perde a confiança nos bancos e deseja deter mais papel-moeda, o
processo de saques pode levar os bancos à falência.

Nos EUA as corridas bancárias decorrentes da crise de 1929 apenas foram interrompidas
quando o FED utilizou seu poder ilimitado de emissão e tributação para respaldar os passivos
dos bancos comerciais ameaçados. Foi criada em 1933 a FDIC (Federal Deposit Insurance
Corporation), um sistema de seguro para depósitos. Até um certo limite, um banco em
dificuldades pode requerer acesso a crédito imediato para honrar seus compromissos com os
depositantes. É verdade que isto tornou os depósitos nos bancos comerciais mais seguros, mas
isto também significa que agora os bancos não sofrem um dos mais importantes limites à sua
atividade inflacionária, que eram as corridas bancárias.

A expansão do uso dos cartões de crédito e débito e os sistemas de compensação diminuíram


a necessidade de dinheiro vivo para realizar transações, com o que caiu a demanda por
dinheiro em espécie na economia. Enquanto isso, o crescimento da economia ilegal, que utiliza
dinheiro vivo para evitar tributação e outras regulações governamentais, intensificou a
demanda por papel-moeda.

Na demanda do público também atuam fatores sazonais. Na época de Natal as pessoas sacam
mais de suas contas e, por isso, há deflação no crédito; em janeiro o dinheiro volta aos bancos
e a situação normaliza. Em geral, o Banco Central acompanha estas flutuações e as neutraliza,
através de instrumentos que analisaremos mais adiante.

1.2 A demanda por ouro

Da mesma forma que um aumento na demanda por cédulas do Banco Central, se o público
deseja deter mais ouro, isto diminui as reservas bancárias. O efeito multiplicador provoca uma
contração na oferta monetária ainda maior.

Em um regime de padrão-ouro e Banco Central (por exemplo, nos EUA de 1913 a 1933), quase
todo o ouro encontra-se depositado pelos bancos no Banco Central. Quando o público pede
para sacar ouro do banco, este deve ir retirá-lo do Banco Central, que dá baixa do valor na
conta corrente do banco comercial, o que por sua vez o obriga a contrair seus empréstimos e
investimentos para manter seu nível de alavancagem.

Mesmo hoje quando o papel-moeda não é mais redimível em ouro, o ouro forma parte das
reservas do Banco Central. Um aumento nessas reservas contribui para expandir as atividades
bancárias, enquanto uma diminuição provoca a retração.

2 Instrumentos do Banco Central para determinar as reservas totais do sistema bancário

2.1 Empréstimos aos bancos

Este mecanismo consiste no poder do Banco Central de expandir ou contrair suas linhas de
crédito aos bancos comerciais. Há duas maneiras pelas quais o Banco Central empresta
dinheiro aos bancos:

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a) Descontos: Redesconto de títulos a receber, isto é, compra de promessas de
pagamento que o banco detém, proporcionando liquidez ao banco.
b) Adiantamentos: Créditos concedidos aos bancos quando suas reservas caem abaixo do
nível mínimo requerido; em geral, créditos de curto prazo.

Exemplo de adiantamento de 1 milhão:

Banco A
Empréstimo do Banco
Reservas 1 milhão 1 milhão
Central
Passivo total 1 milhão

Banco Central
Depósitos à vista do
Empréstimo ao Banco A 1 milhão 1 milhão
Banco A
Ativo total 1 milhão Passivo total 1 milhão

Ao quitar a dívida, o Banco Central dá baixa tanto no empréstimo de 1 milhão ao Banco A


quanto no depósito à vista de 1 milhão, que constitui o adiantamento de reserva emprestado.

Pode parecer que, sendo créditos de curto prazo, estes empréstimos não incrementam
substancialmente a oferta monetária. Contudo, por sua renovação constante, seus efeitos são
permanentes.

Em geral estes adiantamentos e descontos perderam sua importância conforme se


expandiram os mercados financeiros. Através destes mercados, os bancos com excessos de
reserva emprestam fundos aos bancos com falta de liquidez.

Hoje em dia, quando um banco necessita de dinheiro ele recorre a estes mercados, em geral
legalizados. Em 1920, os bancos pediam ao FED quatro vezes mais do que pediam aos
mercados financeiros; em 1960 a relação se havia revertido de 1 para 10. Por outro lado, em
1982, o FED possuía 1,5 bilhões em títulos a receber dos bancos, enquanto os bancos
detinham 128 bilhões em bônus do governo.

Se o Banco Central deseja estimular os bancos a tomarem empréstimos ele pode baixar a taxa
de redesconto que cobra de seus créditos concedidos. Este é um mecanismo inflacionário. Em
geral esta política é empregada de maneira inflacionária.

Antes se pensava que a taxa de redesconto deveria ser muito alta para castigar os bancos em
dificuldades; deveria estar acima da prime rate, constituindo portanto uma taxa de redesconto
punitiva. Apenas os bancos desesperados por liquidez utilizariam esta linha de crédito, e esse
uso sinalizaria ao mercado sua situação desesperada determinando sua falência iminente.

As linhas de crédito do Banco Central para redesconto e reservas não são instrumentos
significativos no aumento da oferta monetária.

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2.2 Operações de Mercado Aberto

Este é o método mais importante através do qual o Banco Central determina o total de
reservas bancárias e com isso a oferta total de moeda. A expressão “mercado aberto” se refere
aqui a operações comerciais competitivas, para distingui-las das operações realizadas em
mercados monopolizados. As operações de mercado aberto são as operações de compra e
venda de ativos que o Banco Central realiza no mercado. A compra de qualquer ativo é uma
compra em mercado aberto; a venda de um ativo é uma venda em mercado aberto.

Se o Banco Central decide comprar uma escrivaninha por R$ 100, ele paga com um cheque
sobre o Banco Central. O Banco Central adquire a escrivaninha, mas de onde saiu o dinheiro?
De lugar nenhum: o Banco Central criou R$ 100 ao escrever o cheque com essa soma. É um
novo passivo criado a partir do nada, criado pelo poder do Banco Central de criar moeda sem
lastro (como um falsificador). Se o vendedor quisesse pagamento em espécie, o Banco Central
emitiria notas naquele valor e cancelaria do mesmo modo a dívida.

O vendedor não pode depositar o cheque no próprio Banco Central, nem sacá-lo nesta
instituição. Ele tem de depositá-lo em um banco comercial. Ao depositá-lo no Banco A, o saldo
em sua conta corrente aumenta em R$ 100, enquanto o Banco A aumenta por sua vez o saldo
em sua conta corrente no Banco Central no mesmo valor.

Banco A
Conta corrente no Banco
100 Depósito à vista do vendedor 100
Central
Ativo total 100 Passivo total 100

Banco Central
Escrivaninha 100 Depósito à vista do Banco A 100
Ativo total 100 Passivo total 100

Com esta operação, as reservas do Banco A aumentaram. A oferta monetária, a princípio,


aumentou em R$ 100, mas não podemos esquecer de que aqui intervém o efeito do
multiplicador bancário.

Não importa o tipo de ativo comprado pelo Banco Central, podem ser ações, bônus, moeda
estrangeira etc. Em geral o que mais se compra e vende são títulos da dívida pública.
Comprando e vendendo esses bônus o Banco Central maneja as reservas dos bancos. Se fosse
impedido de comprar e vender ativos em mercado aberto, o Banco Central perderia seu
principal instrumento para inflacionar a economia.

Exemplo: Suponhamos que o Banco Central compra de agentes financeiros privados 1 milhão
em títulos da dívida pública. Os bônus foram emitidos pelo Tesouro Nacional e inicialmente
comprados por corporações, empresas, indivíduos, instituições financeiras. O Banco Central
paga a compra com um cheque de 1 milhão, que é depositado pela Empresa C no Banco
comercial A.

12
Banco A
Reservas 1 milhão Depósito à vista da Empresa C 1 milhão
Ativo total 1 milhão Passivo total 1 milhão

Banco Central
Títulos da dívida pública 1 milhão Depósito à vista do Banco A 1 milhão
Ativo total 1 milhão Passivo total 1 milhão

Podemos ver que as reservas aumentaram em 1 milhão. Sobre estas novas reservas, o Banco A
poderá expandir seu crédito e o saldo das contas correntes de seus clientes. Se os bônus
houvessem sido comprados diretamente do Banco A, o efeito seria o mesmo.

Em resumo, o Banco Central pode aumentar as reservas dos bancos através de duas
ferramentas: operações de mercado aberto e empréstimos aos bancos, sendo as operações de
mercado aberto o fator mais importante. Enquanto isso, o público, ao aumentar sua demanda
por dinheiro em espécie (ou, em padrão-ouro, ao aumentar sua demanda por ouro) pode
reduzir as reservas bancárias na mesma medida.

O processo de expansão do crédito bancário

1. Expansão interbancária

Até aqui vimos como todos os bancos inflacionavam sobre suas reservas de acordo com o
multiplicador bancário. Ainda não vimos, no entanto, como que um banco pode
individualmente se alavancar sobre suas reservas.

Se houvesse apenas um único banco comercial com muitas filiais pelo país, não haveria
problemas. No exemplo que analisamos, o Banco Central compraria títulos da dívida pública
por R$ 1 milhão, as reservas do banco aumentariam em R$ 1 milhão e o banco emprestaria
mais R$ 4 milhões, havendo aumentado seu passivo de depósitos à vista em R$ 5 milhões. Os
R$ 4 milhões são criados a partir do nada, ao abrir contas e permitir que se façam cheques
sobre essas quantias. Não há problemas de corrida bancária ou falta de liquidez porque todos
são clientes deste mesmo banco.

Se este banco monopolista empresta R$ 2 milhões à General Motors, que por sua vez compra
mercadorias de outra companhia, não há problemas porque a outra companhia também tem
conta neste mesmo banco. O banco não precisa converter o cheque em dinheiro, diminuindo
suas reservas; ele precisa apenas transferir o saldo da conta corrente de um de seus clientes (a
GM) para a conta corrente da companhia em questão. Os R$ 1 milhão de reservas podem,
portanto, facilmente sustentar os R$ 5 milhões de empréstimos e depósitos alavancados.

Agora, se o sistema bancário for competitivo e houver vários bancos na economia, como
poderão os bancos expandir seu crédito? De que maneira o sistema de Banco Central evita que
os bancos sejam constrangidos pelas severas restrições que um sistema de pluralidade
bancária imporia à expansão do crédito?

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Vejamos o seguinte exemplo. O Banco Central compra um título de R$ 1 mil da Empresa C, que
por sua vez deposita o pagamento no Banco A.

Banco A
Reservas (no BC) 1.000 Depósitos à vista da Empresa C 1.000
Ativo Total 1.000 Passivo Total 1.000

Banco Central
Títulos da dívida pública 1.000 Depósitos à vista do Banco A 1.000
Ativo Total 1.000 Passivo Total 1.000

Até aqui, aumentaram em R$ 1 mil os depósitos à vista nos bancos comerciais, com o que a
oferta monetária aumentou em R$ 1 mil. Da mesma forma, as reservas do Banco A
aumentaram em R$ 1 mil.

Vamos agora supor que se o Banco A aumentar seu passivo de depósitos à vista em R$ 4 mil e
realizar novos empréstimos, ele terá problemas e não poderá sustentar esta alavancagem.
Imaginemos que a Empresa X recebe o crédito de R$ 4 mil do Banco A e paga seu fornecedor
Pedro com um cheque neste valor. Se Pedro é cliente de outro banco, o Banco B, o cheque da
Empresa X será depositado no Banco B que irá ao Banco A sacá-lo; o Banco A estará falido
porque detém apenas R$ 1 mil em reservas para honrar aquele cheque de R$ 4 mil. Vejamos o
balanço dos bancos, no momento em que o Banco B apenas deposita o cheque recebido em
sua própria conta corrente no Banco A:

Banco A
Reservas (no BC) 1.000 Depósitos à vista da Empresa C 1.000
Empréstimos a receber da Empresa X 4.000 Depósitos à vista do Banco B 4.000
Ativo Total 5.000 Passivo total 1.000

Banco B
Depósitos à vista no Banco A 4.000 Depósitos à vista de Pedro 4.000
Ativo Total 4.000 Passivo Total 4.000

No momento em que o Banco B tentar sacar seus R$ 4 mil, o Banco A está insolvente, pois não
pode cumprir seus compromissos. É por isso que o Banco A não expande seu passivo em 500%
sobre suas reservas. Ele expandirá de acordo com a fórmula a seguir:

Expansão privada = 1 - (nível de reserva mínimo) = 1 - 0,2 = 0,8

O Banco A expandirá em 80% e não em 500%. Veremos que, em um sistema de Banco Central,
se todos os bancos expandem à taxa de 80%, a expansão total do sistema bancário será de
500%.

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Observe o exemplo a seguir, em que o banco empresta R$ 800 à Empresa X após receber um
depósito de R$ 1 mil da Empresa C.

Banco A
Empréstimos a receber da Empresa X 1.000 Depósitos à vista da Empresa C 1.000
Reservas (no BC) 800 Depósitos à vista da Empresa X 800
Ativo Total 1.800 Passivo Total 1.800

A oferta monetária, que havia aumentado em R$ 1 mil com a compra do bônus da Empresa C,
agora aumentou em mais R$ 800; uma expansão adicional de 80% na forma de depósitos à
vista. A Empresa X paga seu fornecedor Pedro, que deposita o cheque no Banco B, que por sua
vez saca o cheque de R$ 800 no Banco A, cujas reservas de R$ 1000 são suficientes para honrar
o cheque.

Banco A
Reservas (no BC) 200 Depósitos à vista da Empresa C 1.000
Empréstimos a receber da Empresa X 800
Ativo Total 1.000 Passivo Total 1.000

Banco B
Reservas (no BC) 800 Depósitos à vista de Pedro 800
Ativo Total 800 Passivo Total 800

Banco Central
Títulos da dívida pública 1.000 Depósitos à vista do Banco A 200
Depósitos à vista do Banco B 800
Ativo Total 1.000 Passivo Total 1.000

O Banco A agora tem uma razão Reservas/Depósitos de 200/1.000 = 1/5, o limite mínimo de
reservas. Ele está portanto no máximo de sua expansão de crédito. Já o Banco B agora possui
um passivo de R$ 800 que está 100% respaldado por reservas; o Banco B possui, portanto,
uma margem para expandir seu crédito. Pelo que vimos, se o Banco B expandir em 1 - (nível
mínimo de reservas) = 1 - 0,2 = 80%, a sua situação final será de equilíbrio como o que sucedeu
ao Banco A.

O Banco B, portanto empresta R$ 800 x 80% = R$ 640 a um Restaurante D:

Banco B
Reservas (no BC) 800 Depósitos à vista de Pedro 800
Empréstimos a receber do
640 Depósitos à vista do Restaurante D 640
Restaurante D
Ativo Total 1.440 Passivo Total 1.440

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O Restaurante D logo passa um cheque de R$ 640 para pagar seu fornecedor João, que o
deposita em sua conta no Banco C. O Banco C saca o cheque de R$ 640 no Banco B e inclui este
valor em suas reservas, respaldando integralmente a conta corrente de seu fornecedor João.

Banco B
Reservas (no BC) 160 Depósitos à vista de Pedro 800
Empréstimos a receber do
640
Restaurante D
Ativo Total 800 Passivo Total 800

Banco C
Reservas (no BC) 640 Depósitos à vista de João 640
Ativo Total 640 Passivo Total 640

Vejamos a situação de todos os bancos (A, B e C) e do Banco Central até agora:

Banco A
Reservas (no BC) 200 Depósitos à vista da Empresa C 1.000
Empréstimos a receber da Empresa X 800
Ativo Total 1.000 Passivo Total 1.000

Banco B
Reservas (no BC) 160 Depósitos à vista de Pedro 800
Empréstimos a receber do
640
Restaurante D
Ativo Total 800 Passivo Total 800

Banco C
Reservas (no BC) 640 Depósitos à vista de João 640
Ativo Total 640 Passivo Total 640

Banco Central
Títulos da dívida pública 1.000 Depósitos à vista do Banco A 200
Depósitos à vista do Banco B 160
Depósitos à vista do Banco C 640
Ativo Total 1.000 Passivo Total 1.000

Em um sistema competitivo de bancos sob um regime de Banco Central, cada banco não pode
se alavancar à taxa do multiplicador bancário (no exemplo, em 500%), mas pode fazê-lo à taxa
de 1 - “nível mínimo de reservas” (no exemplo, 80%). Isto porque o crédito que o banco
concede logo é sacado de suas reservas, e as reservas restantes (no exemplo, 20%)
correspondem ao nível mínimo requerido.

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O efeito agregado da expansão de crédito de cada banco, no entanto, será efetivamente de
500% sobre o aumento inicial na oferta monetária (M). O Banco Central aumentou M em R$
1.000, o Banco A expandiu seu crédito em R$ 800, e o Banco B em R$ 640. O processo
continua, havendo expansões de crédito cada vez menores; a expansão total na oferta
monetária será de 1.000 + 800 + 640 + 512 + 410 + 328 + 262 + .... Se contabilizarmos a
expansão de 14 bancos, a oferta monetária terá aumentado em R$ 4.780; se
contabilizássemos cada vez mais bancos, o aumento se aproximaria assintoticamente do valor
de R$ 5.000, que corresponde à operação do multiplicador bancário (500%) sobre o aumento
inicial da oferta monetária (R$ 1.000). É este o funcionamento do misterioso processo
inflacionário do mundo moderno.

2. O Banco Central e o Tesouro

Vimos que a inflação moderna consiste na emissão constante de dinheiro novo pelo Banco
Central, que por sua vez garante reservas para que o sistema bancário de reservas fracionárias
sustente sobre elas uma pirâmide de moeda contábil com respaldo parcial. Mas em meio a
toda esta criação de moeda, onde entram os déficits orçamentários do governo? Eles são
inflacionários? Em que medida? Qual é a relação entre o governo enquanto banqueiro central
e o governo enquanto entidade fiscal ou orçamentária?

O processo de criação de dinheiro bancário não tem necessariamente contato com as


operações fiscais do governo. Se o Banco Central compra 1 milhão em bônus ou títulos da
dívida pública, isto criará 5 milhões em moeda nova se o limite mínimo de reservas for de 20%.
As operações do Banco Central têm efeito multiplicado sobre a oferta monetária.

Importante notar que o Banco Central não compra títulos somente para ajudar o Tesouro
Nacional. Mesmo que o Tesouro esteja com um balanço equilibrado ou superavitário o Banco
Central pode seguir criando reservas e incrementando a oferta monetária. A inflação
monetária não requer necessariamente um déficit orçamentário que obrigue o Banco Central a
injetar moeda nova no sistema bancário. Do mesmo modo, o governo pode estar correndo
déficit fiscal e mesmo assim não incrementar a oferta monetária, isto é, o déficit orçamentário
não é necessariamente inflacionário.

Em 1981, os economistas do governo de Ronald Reagan, nos EUA, argumentavam justamente


isto, que o déficit fiscal de então não era inflacionário porque não era financiado com emissão
monetária; e com isso desviavam a atenção do público sobre os enormes déficits em que seu
governo estava incorrendo.

Se o déficit fiscal é financiado através da venda de títulos da dívida federal ao público, não há
aumento na oferta monetária nem tampouco inflação. A única consequência é que os agentes
passam a investir sua poupança nestes títulos, movendo o dinheiro de suas contas bancárias
para as contas bancárias do Tesouro que rapidamente gastará os recursos devolvendo o
dinheiro ao setor privado. O movimento se dá dentro de uma mesma oferta monetária, que
não é alterada.

Mas atenção: isto não significa que um grande déficit fiscal financiado voluntariamente pela
poupança privada não tenha efeitos econômicos nocivos. A inflação não é o único dos males

17
econômicos. O déficit fiscal desvia os recursos do setor produtivo e dos investimentos
privados, onde sua alocação e eficiência seria garantida pelos mecanismos de mercado, para
financiar o gasto público muitas vezes improdutivo e ineficiente.

Este processo compromete a produtividade da economia e o seu crescimento, gerando ainda


efeitos de aumentos consideráveis na taxa de juros, ao encarecer o acesso ao crédito. Como
grande parte da oferta de crédito está sendo destinado para financiar o Estado, o crédito
disponível para o setor privado se encontra reduzido, com o que seu custo – a taxa de juros –
aumenta. Além disso, como (em princípio) o governo deverá pagar os empréstimos que tomou
mais os juros da dívida, a carga fiscal futura será ainda mais pesada.

Há outro mecanismo de financiamento do déficit público que hoje em dia está obsoleto no
mundo ocidental, mas que anos atrás era o método padrão. É simplesmente a impressão de
mais dinheiro (através do Tesouro Nacional). Se o déficit é de R$ 100 milhões, o governo
imprime mais R$ 100 milhões; foi assim que os EUA financiaram suas Guerras de
Independência e de Secessão, nos séculos XVIII e XIX, respectivamente.

O terceiro mecanismo de financiamento do déficit público, que é o atualmente utilizado pelos


Bancos Centrais, combina o pior dos dois mecanismos anteriores. O Tesouro vende títulos da
dívida pública aos bancos comerciais. Isto se chama monetizar a dívida (isto é, criar novo
dinheiro para pagar a nova dívida). Por exemplo, o Tesouro vende R$ 100 bilhões em novos
títulos de dívida para os bancos, que por sua vez criam R$ 100 bilhões em depósitos à vista
para pagar por eles. Como no segundo método descrito acima, a oferta monetária aumenta
em R$ 100 bilhões; mas como no primeiro método, os contribuintes, através do Estado,
deverão pagar no futuro o principal da dívida mais juros. Este terceiro método, portanto é
inflacionário (como o segundo) e impõe cargas futuras ao contribuinte (como o primeiro).

Vejamos que privilégios o Banco Central está implicitamente concedendo aos bancos
nacionais. Em primeiro lugar, permite-lhes que criem dinheiro a partir do nada, para que
possam bondosamente emprestá-lo ao governo ao comprar os títulos da dívida pública. Em
seguida, obriga o contribuinte nos próximos anos a pagar a esses bancos com dinheiro real
mais juros, por haverem os bancos tão generosamente criados dinheiro para o governo.

Vejamos mais de perto como se dá essa contabilidade. Os bancos nacionais, por exemplo,
compram R$ 100 bilhões de títulos da dívida pública recém-emitidos, “pagando” o Tesouro ao
criar-lhe saldo em conta corrente nos bancos comerciais:

Bancos comerciais
Depósitos à vista do Tesouro
Títulos da Dívida Pública 100 bilhões 100 bilhões
Nacional
Ativo Total 100 bilhões Passivo Total 100 bilhões

O Tesouro logo gasta esse saldo nos bancos pagando seus credores, que por sua vez
depositam o dinheiro em bancos fazendo-o circular na economia.

18
Mas se os bancos estão sempre alavancados ao máximo, como podem do dia para a noite criar
um novo passivo de R$ 100 bilhões em depósitos à vista? Aqui é onde entra o Banco Central:
ele cria novas reservas bancárias para permitir aos bancos a compra da dívida do governo.

Se o nível de reservas requerido (as reservas compulsórias) é de 20%, para permitir aos bancos
a compra dos R$ 100 bilhões em títulos o Banco Central compra R$ 25 bilhões de títulos da
dívida antigos e aumenta as reservas em R$ 25 bilhões 2. O Tesouro então emite R$ 100 bilhões
em títulos de dívidas que os bancos compram sobre estas novas reservas. O passivo de
depósitos à vista nos bancos aumenta em R$ 125 bilhões, respaldados pelas novas reservas de
R$ 25 bilhões no Banco Central. O Banco Central, comprando R$ 25 bilhões em títulos antigos,
financiou a compra de R$ 100 bilhões em títulos novos; a oferta monetária cresceu em R$ 125
bilhões.

Bancos comerciais
Reservas 25 bilhões Depósitos à vista do Banco Central 25 bilhões
Depósitos à vista do Tesouro
Títulos da dívida pública 100 bilhões 100 bilhões
Nacional
Ativo Total 125 bilhões Passivo Total 125 bilhões

Se o Banco Central financia o Tesouro comprando os títulos de dívida pública diretamente, o


resultado é ainda mais inflacionário. A oferta monetária cresce inicialmente em R$ 100
bilhões, que o Tesouro gasta no mercado aumentando as reservas dos bancos neste mesmo
valor, o que por sua vez provoca uma expansão monetária de R$ 500 bilhões, devido ao
multiplicador bancário.

Banco Central
Depósitos à vista dos bancos
Títulos da dívida pública 100 bilhões 100 bilhões
comerciais
Ativo Total 100 bilhões Passivo Total 100 bilhões

Bancos comerciais
Reservas 100 bilhões Depósitos à vista 500 bilhões
Empréstimos a receber 400 bilhões
Ativo Total 500 bilhões Passivo Total 500 bilhões

O Banco Central detém o monopólio da impressão de papel-moeda, através do qual controla e


estimula o sistema bancário de reserva fracionária a se expandir em função da quantidade de
reservas por ele determinada.

2
Note que o Banco Central compra R$ 25 bilhões, e não R$ 20 bilhões, como poderia parecer à primeira
vista. Isto porque a própria compra do Banco Central cria um passivo de depósitos à vista para os bancos
que precisa ser respaldado por 1/5 de reservas. Assim, dos novos R$ 25 bilhões em reservas nos bancos
comerciais, R$ 5 bilhões servem para respaldar o passivo de R$ 25 bilhões depositados pelos clientes
que venderam os títulos ao Banco Central, enquanto os outros R$ 20 bilhões servem de reserva para
respaldar o passivo de R$ 100 bilhões de saldo do Tesouro Nacional.

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O regime de Banco Central substituiu o sistema de pluralidade bancária. É esta a origem do
problema crônico da inflação que precisa ser combatido e contido permanentemente ou
degenera na destruição irremediável do valor do dinheiro, processo cujo ponto culminante é a
hiperinflação.

Responda às seguintes perguntas:

1. Qual é a diferença entre a demanda por papel-moeda e a demanda por ouro?


2. A diminuição da taxa de redesconto traz consequências inflacionárias ou
deflacionárias? Por quê?
3. Selecione a alternativa correta:
a) Um aumento no nível mínimo de reservas requerido expande a oferta monetária
b) Um aumento no nível mínimo de reservas requerido contrai a oferta monetária
c) Mudanças no nível mínimo de reservas requerido não provocam alterações na
oferta monetária
d) Nenhuma das alternativas
4. Você acredita que existe uma correlação entre o déficit fiscal e a emissão monetária?
A emissão de títulos de dívida pública pode ocorrer independentemente da emissão
monetária? Pode haver déficit fiscal e emissão monetária ao mesmo tempo?
5. Em relação à pergunta anterior, de que mecanismos o governo dispõe para financiar
seu déficit orçamentário? Quais os prós e os contras de cada um?

Discussão N° 1: Mencionamos que o multiplicador bancário equivale a 1/(nível de reservas


compulsórias) e que através dele se pode inferir em quanto será a expansão monetária. Apesar
disso, dessa maneira não sabemos em quanto pode expandir seu crédito cada banco
individualmente. O banco comercial individualmente expande seu crédito de forma mais
cautelosa ou mais acelerada do que a economia em seu conjunto? Compare com a situação de
um país onde haja apenas um único banco comercial na economia. (10 minutos)

Leitura N° 3: “Taxa de juros, expansão do crédito e ciclo econômico”, de Murray Rothbard (15
minutos)

TAXA DE JUROS, EXPANSÃO DO CRÉDITO E CICLO ECONÔMICO

Murray Rothbard

O ciclo econômico é um fenômeno que se apresenta na vida econômica de um país


envolvendo dois momentos sucessivos na atividade econômica geral.

O primeiro momento se caracteriza por uma expansão generalizada da produção; crescem os


investimentos das empresas, os salários, e com eles os preços dos bens e serviços, dos bens de

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capital; a população se entusiasma com as novas perspectivas econômicas e enxerga a
situação com otimismo.

O segundo momento do ciclo é a depressão, se segue inevitavelmente ao momento anterior e


agora a produção e o investimento se contraem bruscamente, muitas empresas quebram,
grandes quantidades de recursos ficam ociosos, os salários declinam e o desemprego impera;
reina a desconfiança, a angústia e o pessimismo entre a população.

A primeira fase é frequentemente chamada de boom, a segunda de depressão. O ponto de


inflexão entre as duas é chamado de crise ou crack. Este fenômeno vem ocorrendo com maior
ou menor frequência nas economias capitalistas desde fins do século XVII até os nossos dias. O
exemplo mais estudado de ciclo econômico é o que culminou na crise de 1929 e na Grande
Depressão dos anos 1930; mais recentemente a crise de 2008 apresenta lógica similar.

Como veremos a seguir, a crise de 1929 foi consequência de uma expansão monetária
explosiva ocorrida na década de 1920 devida aos acordos de Gênova e Bruxelas nos quais foi
abandonado o padrão-ouro.

De acordo com a visão de Karl Marx, no século XIX, o fenômeno do ciclo econômico tem
origem nas contradições intrínsecas do sistema capitalista, em sua busca anárquica pelo lucro:
a necessidade permanente de novos mercados para os bens produzidos e a contínua
pauperização das classes baixas, que também constituem importante mercado consumidor,
levaria necessariamente a crises de superprodução.

Já na primeira metade do século XX, o economista John Maynard Keynes também


responsabilizará pela crise o livre funcionamento do mercado, e apontará como solução a
intervenção estatal na economia. Para Keynes, a sucessão de auges e depressões são um
produto intrínseco do funcionamento dos mercados, pelo que é imprescindível a regulação
governamental das atividades econômicas. A obra de Keynes foi utilizada a partir dos anos
1930 como justificação teórica para o pesado intervencionismo estatal que a partir de então
vigorou como doutrina nos países ocidentais. Apenas nos anos 1970 este paradigma seria
novamente questionado.

Antes de prosseguirmos em nossa discussão, devemos primeiro diferenciar ciclo econômico de


flutuações econômicas.

No transcorrer da atividade econômica normal os preços variam continuamente para se


adaptarem a novas situações. As preferências do público se alteram, novos produtos são
ofertados, novas tecnologias surgem, recursos se esgotam, outros são descobertos e os preços
vão se ajustando a estas variações. As flutuações dos preços, portanto não são um problema,
mas constituem o mecanismo fundamental de adaptação da economia ao contexto. Se em
determinada indústria a demanda se contrai, os preços caem, os lucros diminuem e com eles
os investimentos e os empregos disponíveis na indústria. O capital e a mão de obra serão
redirecionados a outras áreas mais rentáveis, através do próprio funcionamento do mercado.
Em uma economia livre, um investimento que se torne improdutivo tem efeitos limitados e
não arrasta consigo toda a nação.

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No ciclo econômico, por sua vez, toda a nação se move em conjunto. Antes de adentrarmos
no seu funcionamento, repassemos alguns conceitos:

• Os bens de consumo são também chamados de bens de primeira ordem.


• Para produzir um bem de consumo necessitamos de mão de obra, matérias-primas,
maquinário, ferramentas etc.; isto é, necessitamos de fatores de produção ou bens de
ordem superior.

Recordemos que a teoria da imputação sustenta que a demanda por fatores de produção é
função dos preços estimados dos bens de consumo por eles produzidos. Isto é, os preços dos
bens finais determinam os preços dos fatores de produção, seus custos.

O segundo elemento que devemos levar em conta é que a inflação provoca distorções nos
preços relativos. Se o preço de um bem de consumo sobe, mas seus custos demoram a
aumentar de preço, pode parecer proveitoso investir nesta atividade porque rende mais lucros
do que antes; no entanto, quando os preços terminarem de se acomodar, haverá muitos
investimentos improdutivos.

Também pode ocorrer que, em consequência da inflação, os custos subam antes que os preços
de venda. Um bem que sempre foi necessário pode por isso deixar de ser produzido, e o
resultado é um empobrecimento da comunidade. O escasso estoque de capital está sendo mal
empregado e desperdiçado.

A deflação tem efeitos similares, mas invertidos; os preços relativos se distorcem através de
baixas, e não de altas.

O juro

Carl Menger observou que o tempo tem valor para o homem. Consumir no presente e
consumir daqui a 50 anos são coisas bastante diferentes, até porque temos uma vida limitada.
Para que o indivíduo queira realmente adiar seu consumo ele deve atribuir um valor maior a
esse bem no futuro. Por exemplo, um vinho envelhecido vale mais.

Devemos analisar a abstenção do consumo como uma decisão de poupar. A diferença entre o
valor futuro maior e o valor presente do bem é o que chamaremos de juro.

Se a preferência temporal dos agentes aumenta, será mais interessante consumir mais hoje e
guardar menos para amanhã; o juro reserva aumenta. Neste caso, se o banco quer induzir o
agente a depositar seu dinheiro, deverá pagar uma taxa de juros mais elevada.

Outros fatores compõem a taxa de juro no mercado: 1) as expectativas de inflação, isto é, de


mudança no poder aquisitivo da moeda; e 2) o risco do devedor. Sempre existe o risco para o
credor de não recuperar um empréstimo; quanto maior esse risco, mais alta será a taxa de
juros cobrada.

A taxa de juros do mercado é sempre levada em conta pelos agentes antes de realizar
qualquer investimento. Se a taxa de juros é maior ou igual ao rendimento esperado da
atividade econômica em questão, o agente preferirá não realizar esta atividade. A taxa de

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retorno de um investimento deve superar a taxa de juros do mercado, do contrário o
investimento não será realizado.

Uma taxa de juros alta significa que as pessoas poupam pouco, optam por consumir hoje e não
no futuro. Isto também quer dizer que, se eu poupo hoje para vender mais amanhã, não terei
fregueses suficientes porque não há pessoas poupando.

A taxa de juros nos diz em cada momento quanto que se pode investir em função de quanto
que as pessoas estão poupando. Se os agentes não poupam mais é porque a riqueza da
comunidade não lhes permite poupar mais. Os recursos são escassos e é necessário distribui-
los entre consumo e poupança.

Quando os agentes poupam eles consumem menos e isso reduz a estrutura horizontal do
mercado (onde se dispõem a totalidade dos bens de consumo), mas aumenta a sua estrutura
vertical (a totalidade dos fatores de produção). Por exemplo, o investimento em um polo
petroquímico demorará anos a colocar seu produto no mercado e gerar retorno. No longo
prazo, uma economia em bom funcionamento aumenta tanto a estrutura horizontal quanto a
estrutura vertical do mercado.

Quando os agentes poupam, eles consomem menos: isto faz com que os preços caiam.
Enquanto isso, os empresários que tomam empréstimos compram bens de capital – elevando
os preços destes – ainda que os preços dos bens de consumo estejam em queda. O juro baixo
fomenta a acumulação de capital para que se comprem máquinas e se invista em processos de
produção.

O ciclo econômico

O ciclo econômico se inicia quando, por intervenção da autoridade monetária, a expansão do


crédito é maior do que a que o mercado determinaria, com o que a taxa de juros cai
artificialmente.

Os bancos, ao possuírem mais dinheiro disponível para emprestar, diminuem as taxas de juros
cobradas, inundando o mercado com dinheiro. O público agora poupa mais e exige menos
retorno pelos seus depósitos.

O mercado de crédito pode ser inundado através de vários mecanismos (taxa de redesconto,
Operações de Mercado Aberto, menores requerimentos de reserva compulsória etc.).

Seja qual for o caso, o ciclo econômico inicia quando a taxa de juros apresenta uma tendência
declinante. Esta sinalização do mercado está falseada pela ação do governo, fazendo parecer
que na comunidade existe maior capacidade de poupança do que existe realmente. Esta
poupança excedente é na verdade fictícia, porque o que está em jogo é o dinheiro que o Banco
Central criou a partir do nada. Isto é, a “poupança” criada desta forma informa erroneamente
aos empresários que eles podem investir mais do que antes, que podem entrar em projetos de
investimento de maior tempo de maturação, ou seja, em investimentos que requerem maiores
períodos de tempo antes de colocarem bens de consumo no mercado e exibirem retornos
monetários. O resultado é uma expansão da estrutura vertical do mercado. As empresas
aumentam sua demanda por máquinas, ferramentas, equipamentos, mão de obra para suas

23
fábricas, induzindo um aumento artificial nos preços destes fatores de produção. Enquanto
isso, os recursos anteriormente voltados para a produção de bens de consumo são
redirecionados para a produção de bens de capital, devido a sua maior rentabilidade.

Quando o dinheiro criado chega às mãos do público, o público o gasta segundo a proporção
consumo-poupança estabelecida pelas suas preferências temporais. O público, portanto tende
a restituir o nível de taxa de juros que corresponde às suas preferências temporais. Se o
público não modificar suas preferências, o que ocorre é que a taxa de juros tende rapidamente
ao nível que exibia antes da expansão monetária. Com isto se torna evidente que aqueles
investimentos realizados pelos empresários eram equivocados.

Os recursos então abandonam a produção de bens de capital e se dirigem em massa para a


produção dos bens de consumo, que no momento anterior fora negligenciada. Conforme o
público, de acordo com suas preferências temporais, gasta o novo dinheiro disponível na
compra de bens de consumo, estes sofrem aumentos de preço. Torna-se então mais rentável
destinar recursos à produção de bens de consumo do que de bens de capital.

Esta transferência de recursos das indústrias de capital para as de bens de consumo se produz
rapidamente, o que ocasiona quebras generalizadas de empresas, recursos ociosos,
sucateamento de bens de capital; ao mesmo tempo em que a mão de obra se desloca para
outras áreas atrás dos empregos.

Estes efeitos indesejáveis são produzidos pela distorção da taxa de juros. Na primeira fase do
ciclo, quando as empresas investiram em novos projetos cuja rentabilidade parecia garantida,
os salários nestas áreas se elevaram substancialmente. Com a depressão, os trabalhadores
precisarão deslocar-se e aceitar níveis de salário iguais ou menores que os anteriores ao boom.

É importante destacar que a depressão constitui o processo de realocação dos recursos,


sendo, portanto um saneamento da economia daquelas inversões improdutivas. É através
deste reajuste que os recursos da comunidade são destinados à satisfação das necessidades
realmente mais urgentes.

Se o governo pretende aliviar o ajuste recessivo e torna a expandir o crédito, tudo o que
conseguirá é o adiamento da recessão, com seu consequente agravamento.

É importante diferenciarmos recessão de deflação. Se os bancos aumentam seu nível de


reservas sobre depósitos, o resultado é uma deflação do crédito. A depressão por sua vez é o
processo de reajuste que descrevemos acima. A deflação tem efeitos similares à inflação ao
provocar tremendas distorções na estrutura de produção, devidas à ação do Banco Central de
retirada abrupta de dinheiro do mercado.

Um erro de análise comum é o seguinte. No momento em que começa o reajuste e as


empresas que produzem bens de capital sofrem um retrocesso, frequentemente os sindicatos
tratam de impedir que os salários dessas empresas caiam, muitas vezes valendo-se de políticas
de salário mínimo. O que provocam nestes casos é o desemprego ao forçar os salários a estar
acima do nível de mercado.

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Outra situação comum é que as empresas a ponto de quebrar pressionem o governo para que
novamente injete fundos no mercado. Se o governo assim o faz, reduzindo a taxa de juros,
novamente se produz um falseamento dos indicadores fundamentais de funcionamento do
sistema econômico. O problema é apenas adiado e as fases do ciclo se tornam mais
extremadas.

O adiamento do segundo momento do ciclo não pode se dar para sempre. Quando se injeta
mais moeda pela segunda vez, os preços se elevam de maneira ainda mais abrupta e a
alocação dos recursos é distorcida a um grau ainda mais elevado; a demanda por moeda cai, a
produtividade decresce e os preços aumentam mais do que na inflação anterior. O processo
tende a tornar-se uma espiral inflacionária de reajustes ininterruptos nos preços relativos,
culminando numa hiperinflação generalizada. Os assalariados percebem que o custo de vida
sobe mais rápido do que seus salários e começam a antecipar os aumentos futuros; os salários
são ajustados de antemão pela inflação futura. Se a expansão monetária é interrompida ou
simplesmente ralentada, sobrevém o desemprego e a estagnação da economia; coexistem
então inflação e desemprego; é a estagflação.

A única maneira de se evitar este desemprego é injetar no mercado dinheiro suficiente para
pagar os salários mais seus reajustes pelo custo de vida, e por isso a inflação chega a níveis
explosivos.

Conclusões

1. O funcionamento do livre mercado não produz por si só o advento de ciclos


econômicos.
2. O ciclo econômico é resultado da intervenção governamental no mercado, que
aumenta artificialmente a quantidade de dinheiro disponível e derruba a taxa de juros.
3. Os controles de preços e especialmente os controles de salários, da moeda e da taxa
de juros distorcem indicadores essenciais para o funcionamento do mercado e,
portanto produzem efeitos danosos a toda economia. Uma coisa é controlar o preço
de sapatos, outra coisa é controlar um indicador fundamental que afeta o mercado
como um todo.
4. Para evitar a intervenção monetária e na taxa de juros o passo principal seria eliminar
a autoridade monetária, isto é, o Banco Central. Pedir ao Banco Central que proteja o
valor da moeda é como pedir a um gato faminto que proteja um canário indefeso.

Em um sistema de capitalismo de laissez-faire seriam inevitáveis as depressões periódicas?

Frequentemente os inimigos do capitalismo o acusam de cometer perversidades que, na


verdade, não são resultado do capitalismo, mas do estatismo, isto é, que unicamente são
possíveis pela intervenção do governo na economia. Acredita-se que o capitalismo, por sua
própria natureza, leva inevitavelmente a depressões periódicas.

Os estatistas afirmam repetidamente que as depressões (o fenômeno do ciclo de negócios,


apogeu e queda, expansão e colapso) são inerentes ao laissez-faire e que a Grande Depressão
de 1929 foi a prova do fracasso da economia de livre mercado, não regulada. Quanto de
verdade há nisso?

25
Uma depressão é uma diminuição em grande escala da produção e do comércio. Caracteriza-
se por uma acentuada queda no investimento, na produção, no nível de emprego e no valor
dos bens de capital (fábricas, maquinário etc.).

As flutuações normais dos negócios ou um decrescimento temporário na atividade industrial


não constituem uma depressão. Uma depressão é uma contração da atividade dos negócios
em escala nacional e uma queda generalizada no valor dos bens de capital.

Não há nada na natureza do livre mercado que provoque um evento de tal ordem. As
explicações populares de que a depressão é causada por superprodução, subconsumo,
monopólios, sistemas poupadores de mão de obra, má distribuição ou excessiva acumulação
de riqueza; todas estas explicações já foram desconstruídas em suas falácias em inúmeras
oportunidades.

Os reajustes na atividade econômica e a realocação de capitais e mão de obra de uma


indústria para outra, como resultado de condições variantes, são eventos constantes em uma
economia capitalista. Formam o processo que caracteriza o próprio funcionamento do
capitalismo.

Se em determinada indústria a demanda se contrai, a oferta, antes em equilíbrio, passará a


exceder a demanda. Os preços deverão cair para que o mercado chegue a um equilíbrio, os
lucros, portanto cairão, os investimentos serão reduzidos e a quantidade de empregos
disponíveis diminuirá: o capital e a mão de obra deverão deslocar-se para outra área em sua
busca por usos mais proveitosos. Uma indústria sob essas condições atravessará um período
de estagnação como resultado de investimentos que se tornaram antieconômicos, não
proveitosos e improdutivos. Em uma economia livre sob padrão-ouro, um investimento que se
torne improdutivo se finda a si mesmo sem maiores efeitos; não arrasta toda a nação em sua
contração. Em uma economia livre, a quantidade de dinheiro e de crédito disponível e
requerido para financiar novos negócios é determinada por fatores econômicos objetivos, isto
é, reflete custos e valorações reais da economia.

Os princípios que regulam a quantidade de dinheiro disponível trabalham de uma forma que
impossibilita investimentos em grande escala sem justificativa. A maioria dos negócios financia
suas atividades ao menos em parte com os créditos bancários. Os bancos funcionam então
como instituições reguladores dos investimentos, ao investir os recursos poupados pelos seus
clientes naqueles negócios que prometem ser mais bem-sucedidos.

Os bancos não dispõem de fundos ilimitados para emprestar. Eles são limitados pela sua
quantidade de reservas. Para não quebrar, os bancos devem conceder empréstimos apenas
àqueles negócios que potencialmente considerem mais sólidos e mais proveitosos. Se um
banco fracassa repetidamente em seu juízo sobre a rentabilidade e os riscos dos investimentos
a que ele concede créditos, não poderá recuperar o que emprestou e terá de declarar sua
própria falência.

Se, em um período de especulação crescente, os bancos enfrentam um número desordenado


de solicitações de empréstimo, eles podem reagir à declinante quantidade de dinheiro
disponível de duas maneiras: a) aumentando a taxa de juros; e b) tornando-se mais exigentes

26
na concessão de créditos. Será então mais difícil de obter crédito e os investimentos se
limitarão temporalmente. Também serão reduzidos os planos de expansão das empresas. A
compra de ações (ainda que reflita a estimativa dos investidores com relação aos lucros
futuros da companhia aberta em questão) fica limitada; as ações excessivamente valorizadas
caem em sua cotação. Empresas dedicadas a atividades antieconômicas já não podem obter o
dinheiro que necessitam e declaram falência; desta forma o mercado poupa os sempre
escassos fatores de produção, evita os investimentos ruins e o desperdício, liquidando os
equívocos econômicos. No pior dos casos, a economia enfrenta uma leve recessão, isto é, um
declínio suave nos investimentos e na produção.

Em uma economia não regulada os reajustes se produzem rapidamente e, a partir daí, a


produção e o investimento podem novamente crescer. A recessão temporária não é
prejudicial, mas benéfica: a economia está cortando seus ramos podres para retornar à saúde.
O impacto de uma recessão como essa pode ser notado significativamente em algumas
indústrias, mas não leva à quebra generalizada de toda a economia.

Uma depressão em escala nacional só pode ser possível devido a uma intervenção em grande
escala do governo na economia e fundamentalmente através da manipulação da quantidade
de dinheiro disponível e da já discutida diminuição artificial da taxa de juros. Toda a
intervenção governamental na economia se baseia na crença de que as leis econômicas não
devem operar, que os princípios de causa e efeito podem ser suspendidos, que tudo que existe
é flexível ou maleável com exceção do capricho do burocrata onipotente. Não se permite que
a realidade, a lógica ou a economia interfira no raciocínio perfeito. Foi essa a premissa
implícita que levou ao estabelecimento em 1913 do Federal Reserve Bank, o banco central dos
Estados Unidos. No Brasil, a criação dos bancos públicos, em especial o Banco do Brasil – que
durante grande parte do século XX acumulou as funções de banco comercial e de autoridade
emissora – enraizou a cultura do crédito público barato, financiado pela tributação
inflacionária.

A ideia que guiava os funcionários destes bancos era a política de dinheiro barato ou crédito
barato. Os bancos deixariam de estar limitados a conceder empréstimos em função de suas
reservas. Os juros já não subiriam em resposta à crescente especulação ou à crescente
demanda de fundos. O crédito iria ser facilmente obtido. A ideia era controlar o investimento
de maneira a atingir um estado de prosperidade constante. A expansão sem limites.

O desenho deficiente das instituições monetárias brasileiras culminou na hiperinflação dos


anos 1980, e só foi significativamente revertido nos anos 1990, no contexto das reformas do
Plano Real, quando se promoveu o saneamento das finanças públicas e o fechamento de
incontáveis bancos públicos estatais. Ainda assim, os anos vêm mostrando uma perigosa
resistência a aprender com os erros do passado.

Nos EUA, o resultado foi a explosão de 1929; ao longo da maior parte da década de 1920 o
governo americano obrigou os bancos a manter as taxas de juros artificialmente baixas. Como
consequência disso o dinheiro foi destinado a todo tipo de negócio especulativo. Em 1928, os
sinais de alerta eram visíveis: os investimentos injustificados proliferavam e as cotações das
ações alcançavam níveis insustentáveis. O mercado em seu livre funcionamento haveria

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cortado o crédito e o investimento drasticamente e as empresas improdutivas sofreriam, mas
o país como um todo, não. Apesar disso foi permitido que o furor dos negócios e a especulação
desenfreada tivessem lugar. As pessoas investiam em tudo e faziam fortunas da noite para o
dia. O crédito se expandia sem freios.

Quando em 1929 o governo finalmente decidiu aumentar a taxa de juros já era tarde. As
notícias sobre as primeiras quebras de empresas e de bancos trouxeram o pânico a todo o
país. As pessoas começaram a vender suas ações buscando sair do mercado com algum lucro
ou simplesmente para obter o dinheiro que necessitavam para pagar sua enorme quantidade
de dívidas que começavam a ser cobradas de maneira cada vez mais enérgica. A bolsa caiu, os
preços vieram abaixo e com eles os bancos. Os bens de capital caíram abruptamente até que
em 1932 a atividade econômica se paralisou quase que completamente. A lei da causalidade
havia vencido.

A depressão foi ainda prolongada pelo mesmo mal que a havia causado: os controles e as
regulações governamentais.

Antes de responder às perguntas abaixo, repassemos alguns conceitos:

A taxa de juros depende exclusivamente de:

• A Preferência Intertemporal: O homem, ceteris paribus, preferirá um mesmo bem


(valor) no presente do que no futuro. O presente possui, neste sentido, maior valor do
que o futuro já que, se existe uma necessidade, deseja-se sua satisfação o quanto
antes. Se isto não fosse verdade, o homem nunca satisfaria suas necessidades, mas
sempre as adiaria, o que significaria a ausência de ação.
• O Risco: Se refere à confiabilidade de que o que se estima que vá ocorrer efetivamente
ocorra. No risco devem ser levadas em conta as mudanças no poder aquisitivo da
moeda, denominada taxa de juros bruta no contexto do mercado.
• A Inflação: A taxa de juros possui uma relação proporcional ou direta com a inflação.
Se a inflação aumenta, a taxa de juros também será aumentada para compensar esta
perda de poder aquisitivo.

Questões:

1. O que acontece se os preços relativos são distorcidos pela inflação?


2. Por que a intervenção governamental na taxa de juros dos bancos gera uma alocação
de recursos equivocada e consequentemente o desperdício de capital?

Discussão N°2: O trecho a seguir foi extraído do livro “As leis secretas da economia –
Revisitando Roberto Campos e as leis do Kafka”, de Gustavo H.B. Franco, onde se investiga “as
normas secretas do funcionamento da economia brasileira”. Nele está sucintamente resumida
a história da criação do Banco Central do Brasil.

23. [Teorema da História Lenta] A criação ou mudança de instituições destinadas a proteger o


interesse geral em detrimento de interesses particulares, sobretudo as referentes à saúde da moeda,
serão sempre procrastinadas até que sejam inevitáveis.

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Parágrafo único [Corolário de Churchill]. O Brasil encontrará o caminho virtuoso, mas não
sem antes experimentar todos os outros.

O gradualismo é intrínseco à nossa alma conservadora, cordial e patrimonialista, e no campo


das instituições monetárias a lentidão tem sido nada menos do que espetacular. O
aperfeiçoamento das instituições destinadas a proteger o cidadão contra os abusos do Estado
através da moeda foi dos mais longos, tortuosos e importantes capítulos do processo de
combate à inflação no Brasil. Ao se referir à proverbial aversão brasileira às mudanças, em
uma narrativa sobre as raízes históricas do problema da estrutura agrária brasileira, o
sociólogo José de Souza Martins cunhou uma expressão muito própria: “história lenta.”

O Brasil é, talvez, o mais extraordinário dos retardatários quando se trata de banco central.
Enquanto boa parte da América Latina já havia criado os seus nos anos 1920 e 1930, e na
Europa o processo estava terminado já no século XVIII, o Brasil, a contragosto, apenas em
1944, em decorrência dos acordos de que foi parte em Bretton Woods (quando foi criado o
FMI e o Banco Mundial), concordou em criar a Sumoc, uma superintendência dentro do Banco
do Brasil destinada a "preparar" a criação de um Banco Central, prevista para uma data incerta
adiante. Vinte anos se passaram e a sensação foi a de que o Banco do Brasil não estava
propriamente preparando, mas sabotando a criação de uma instituição que ia lhe subtrair
poder. Tampouco nossos parlamentares chegaram a um consenso sobre o assunto,
especialmente diante do desejo de se utilizar a "faculdade emissora" do Banco Central em prol
do desenvolvimento.

Em 1965, quando o regime militar interrompeu esses debates parlamentares, e a própria


democracia, e criou o BCB ao promulgar a Lei n.4.595, o Banco do Brasil não se deixou
atropelar e permaneceu no controle, ou desfrutando da nova instituição por meio da chamada
“conta movimento”, um expediente através do qual o Banco do Brasil podia debitar contra o
BCB qualquer despesa que julgasse que tinha conteúdo de política pública. Nesses anos
também se consolidou a chamada “doutrina Costa e Silva”, pela qual é o Palácio que manda na
política monetária, conforme atestado pela célebre bravata do general presidente, que, a
propósito das funções do BCB e da sugestão de Roberto Campos para que confirmasse no
cargo o seu primeiro presidente, Dênio Nogueira, teria dito: “O guardião da moeda sou eu.”

Apenas em 1986 foi extinta a conta movimento e, em 1997, a três anos de distância do século
XXI, os bancos estaduais e federais passaram a ser tratados como bancos iguais aos outros.
Passados 18 anos do Plano Real, e 12 anos dentro do novo século, ainda não se pode dizer que
o nosso Banco Central seja independente. O país parece temeroso ou inseguro ao falar no
assunto, como se a ideia não estivesse madura e ainda tivéssemos de experimentar
alternativas e qualificações, como a “autonomia operacional” – tudo com o intuito de disfarçar
e enfeitar a obrigatoriedade de obedecer à doutrina Costa e Silva. Ao afirmar, em maio de
2012, que “a ideia de que o BC é independente já acabou”, o ex-czar Delfim Netto mais uma
vez, e não por acaso, assumiu o posto de porta-voz de um passado que teima em não ficar
para trás. Não existe nenhum outro país em que definições tão básicas da organização do
sistema monetário tenham demorado tanto tempo.

O parágrafo único, inspirado na observação clássica de Winston Churchill sobre os


americanos, tem sua validade certificada não apenas pelo histórico exposto, mas pela
sucessão de pacotes econômicos de combate à hiperinflação que precisaram esgotar o
dicionário heterodoxo para que, ao final, fizéssemos um programa de estabilização
baseado em princípios elementares de responsabilidade da gestão da moeda e do
fisco. E para tal tivemos de empreender uma fórmula bastante engenhosa e criativa, a

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URV (Unidade Real de Valor), como reforma monetária. Com a URV veio o ataque aos
“fundamentos”, que todos os outros planos econômicos procuraram ardilosamente
evitar, servindo-se da teoria segundo a qual a inflação não tinha causa, era um
fenômeno inercial que poderia se resolver com um tratamento centrado na indução a
uma espécie de amnésia: sem memória, o paciente não se lembraria de que estava
doente. Antes do Plano Real, todavia, um especialista como Mario Henrique Simonsen,
desencantado com a insistência dos planos heterodoxos nos mesmos erros, chegou a
confrontar abertamente de acordo com o qual “uma experiência que dá errado várias
vezes deve ser repetida até que dê certo”. Felizmente, essa proposição acabou
desmentida pelo advento do Plano Real.

Presidente Artur da Costa e Silva: "O guardião da moeda sou eu."

Perguntas para a discussão:

1. O que provocava a “faculdade emissora” do Banco do Brasil?


2. Por que o Brasil demorou tanto a criar um banco central?
3. A criação do Banco Central do Brasil auxiliou ou coibiu o processo inflacionário
descrito no texto anterior, de Murray Rothbard?
4. Como a visão de banco central de Murray Rothbard se relaciona com a “doutrina Costa
e Silva”?

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