pedagogia no Brasil: do bacharelado à licenciatura – 1939/2015. In: VIDEIRA, HILTER GOMES. FORMAÇÃO DE PROFESSORES E DIVERSIDADE CULTURAL: Uma análise do tratamento da diversidade cultural num curso de pedagogia na fronteira Brasil – Bolívia. Dissertação. Ano: 2018. Programa de Formação de Pesquisadores, Instituto de Pesquisas Educacionais – IPE, 2018.
2.1.3 Implantação e organização do curso de pedagogia no Brasil: do
bacharelado à licenciatura (1939 - 2015)
Os cursos de formação de professores em nível superior no Brasil têm
sua base na incorporação dos Institutos de Educação de São Paulo e do Distrito Federal às Universidade de São e Paulo e do Distrito Federal respectivamente, dando origem em 4 de abril de 1939, à Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, cujo padrão deveria ser seguido pelas demais instituições de ensino superior no país. É no contexto da Faculdade Nacional de Filosofia que nasce o curso de pedagogia (1939) agregado aos cursos de Ciências, Letras e História com a incumbência de promover a formação de Bacharel em Pedagogia e, complementarmente, o docente para atuar no ensino de nível secundário nas Escolas Normais. O curso não tinha vocação curricular para o exercício do magistério, principalmente para atender crianças na escola infantil ou na alfabetização. Formava-se o planejador, o pesquisador, o filósofo da educação para tratar das questões e problemáticas educacionais, somente mais tarde, incluem-se a formação didática para preparar o bacharel para atuar no magistério de nível secundário. A formação do bacharel em pedagogia demandava três (3) anos de estudos, enquanto a formação do licenciado em pedagogia tinha duração de 4 anos, visto que acrescentava-se, ao seu currículo os conhecimentos didáticos, que eram ministrados em um (1) ano letivo. Este procedimento popularizou-se no meio educacional como esquema 3+1. (BRZEZINSKI, 1996; GATTI E BARRETO 2009; SAVIANI, 2004). Assim, pode-se afirmar que todo licenciado em pedagogia era também, um bacharel em pedagogia. A partir de 1969 com a aprovação do Parecer/CFE n°252/1969, para lelamente à habilitação para o magistério do ensino normal, o curso de pedagogia passa a formar especialistas em educação nas habilitações de Administração Escolar, Supervisão Escolar Orientação Educacional e Inspeção Escolar, em um único módulo formativo, findando-se aí a dualidade bacharelado/licenciatura. Warde (1986) critica o Parecer/CFE n ⁰ 252/1969, que no seu entendimento ao promover adequações do curso de pedagogia aos preceitos da lei da reforma universitária, Lei 5.540/1969, este parecer, trouxe o tecnicismo para o âmbito da formação do pedagogo e retirou a docência da centralidade do curso, visto que a partir desta norma, a formação visava também, a habilitação do pedagogo para o desempenho de funções técnicas e administrativas da educação, e não somente para o exercício do magistério. A partir do Parecer/CFE n⁰ 252/1969, o curso de pedagogia dedicou-se quase que exclusivamente a formar pessoal docente para o magistério nos cursos normais e formar especialistas para atuação nas escolas de 1º e 2º graus, situação que só irá se reverter, quase 30 anos depois, com a aprovação da LDB n⁰ 9.394/1996, que determinará que a formação dos professores da educação básica seja feita obrigatoriamente em nível superior. Havia, no entanto, entendimento expresso pelo Parecer n ⁰ 252/1969, que “quem prepara o professor primário tem condições de ser também professor primário”, com base nesta concepção, ano de 1986, o CFE autorizou em carácter excepcional, a inclusão no currículo de formação de pedagogo a habilitação para a docência nas séries iniciais do Ensino de 1 grau, fato que se consolida com a aprovação da LDB n⁰ 9.394/1996. Assim, ocorre a nível nacional uma ampla reformulação curricular do curso de pedagogia, levando as instituições a adotarem a "docência como a base da identidade profissional de todos os profissionais da educação" (SILVA, 2009, p. 68 e 79), tendo a maioria adotado como habilitação, a docência para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, formação até então ofertada no nível de segundo grau, nos institutos de educação. Segundo Gatti (2009) esta experiência serviu para demonstrar que não era essa a vocação essencial deste curso, que não conseguiu integrar a formação disciplinar com a formação educacional e o estágio, desde o início da formação, como preconiza a Resolução RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, de 18 de Fevereiro de 2002, que Instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em Nível Superior, curso de licenciatura, de graduação plena, categorias na qual está incluso o curso de pedagogia. Em 2006, o Conselho Nacional de Educação baixa Diretrizes Curriculares Nacionais específicas para o curso de pedagogia, consolidando o que já vinha sendo praticado curricularmente. Assim, este curso passa ter como base, a formação de professores para exercício do magistério da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental, ficando as outras licenciaturas com a incumbência de formar professores dos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) e ensino médio. (GATTI, 2009). Conforme essas diretrizes normatizadas pela Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de maio de 2006: [...] O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos (p.2).
A determinação trazida por esta Resolução causou transtornos para a
maioria dos cursos de formação de pedagogos, devido à dificuldade de implementação deste dispositivo, pois até então, contavam com quadros de professores habilitados para formar o pedagogo especialista nas áreas de Administração Escolar, Supervisão Escolar, Orientação Educacional etc, e o professor para atuar em disciplinas pedagógicas dos cursos de magistério de 2⁰ grau. Não disponham, portanto, e não teriam como dispor repentinamente de corpo docente com especialidades nas metodologias da alfabetização da leitura, escrita etc., obrigando os cursos a recorrerem a improvisos. Para Mizukami (2013, p. 23 apud Gatti et al., 2013), “a docência é uma profissão complexa e, tal como as demais profissões, é aprendida, não sendo possível a relativização desta profissão”. (p.3) Desta forma, as soluções reiteradamente construídas no intuito de cumprir o que é normativo em detrimento do formativo, têm contribuído para a baixa qualidade da formação docente no Brasil. No ano de 2015, o CNE definiu novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial de professores e pedagogos por intermédio da Resolução nº 2, de 1º de julho de 2015. Essas novas diretrizes definem “princípios, fundamentos, dinâmica formativa e procedimentos a serem observados nas políticas, na gestão e nos programas e cursos de formação, bem como no planejamento, nos processos de avaliação e de regulação das instituições” formadoras de professores. (Ibidem, p. 2-3) No entanto, o conteúdo desta norma não pode ser tomado como iniciativa recente ou isolada, visto que representa a continuidade de um conjunto de reformas deste curso, iniciadas há mais de três décadas, com a finalidade de melhorar a qualidade da formação e programar políticas de valorização da carreira desses profissionais. No entender de Gatti (2017): A constituição de novas perspectivas sobre essa formação poderá tomar força se associada à ideia de formação de um profissional que é de importância fundamental para a vida social nos dias de hoje. Não como discurso, mas sim como prática de política educacional. ( p. 1152)
Em relação ao curso de pedagogia, a expectativa é no sentido de que os
reformuladores tenham considerado primeiramente, que as atuais diretrizes têm por finalidade criar condições estruturais que promovam melhorias na qualidade da formação do pedagogo. Este é o aspecto mais relevante a ser considerado pelas instituições formadoras de professores/pedagogos e pelos NDE ao promoverem a restruturação dos cursos, pois segundo Candau (1997) a formação inicial de professores no Brasil vivencia problemas crônicos como, por exemplo, a falta de articulação entre a formação no conteúdo específico e no pedagógico que segundo esta autora continua sem solução. Desta forma, dentre as diversas questões a serem discutidas, refletidas e por fim desafiadas, fluirão indubitavelmente, temas controversos como a relação teoria e prática e a vinculação da estrutura curricular do curso às práticas sociais, aspectos essenciais na formação do pedagogo, no entanto ignorados pelos paradigmas vigentes. Não se pode prescindir do entrecruzamento entre e teoria e prática, assim como não se pode conceber a transmissão de conhecimentos que não flui da realidade da social, por um processo histórico e permanente de construção-transmissão-reconstrução. A concretização das expectativas geradas pela da Resolução CNE/CP n⁰ 1/2015, depende do significado que se lhe será atribuído no contexto das instituições de Ensino Superior responsáveis pela formação de professores. Assim é indispensável que os atores envolvidos no processo de reformulação curricular para adequação do formato do curso de pedagogia aos ditames da norma vigente, considerem que “as reformas na formação de professores têm buscado traduzir uma preocupação básica a respeito do papel que esse profissional deve desempenhar no mundo de hoje” (MAUÉS, 2003, p. 99). Embora o espírito das novas diretrizes favoreça a construção de mecanismos que viabilizem uma formação de base crítica que considere o conhecimento nas suas dimensões científicas, filosóficas, políticas, sociais, culturais no sentido de disponibilizar ao futuro professor um amplo e diversificado repertório que o capacite e o encoraje ir à escola e outros espaços educativos não formais, tratar das diversas demandas do cotidiano social, estudos de Maués, (2003) apontam que existem reformas que contrariando esta lógica, facilitam:
[...] a formação de indivíduos que respondam como autônomos às
exigências do mercado, mas que não tenham desenvolvido as capacidades críticas que contribuam para buscar a utilização dos conhecimentos como uma forma de emancipação. (p.108)
Para a formação de professores numa perspectiva crítica, Giroux e
McLaren citado por Castells (1996, p. 226) recomendam que a estrutura curricular “deve enfatizar a importância de tomar o social, o cultural, o político e o econômico os principais aspectos de análise e avaliação da escolarização contemporânea” a exemplo das relações sociais na diversidade da sociedade brasileira, e não reduzir tão importante profissão às necessidades e interesses do mercado do trabalho. Para Gatti (2017), a emergência da construção de uma sociedade justa e democrática - compromisso do Estado brasileiro cuja consecução demanda a efetiva e competente contribuição da escola justifica as constantes iniciativas de busca de soluções educacionais, a exemplo das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores publicadas em 2002, 2006 e 2015. No entanto, a norma que proclama direito ou dever, não contém em si o condão de se auto efetivar, dependo que os operadores da educação, em especial as instituições e professores formadores de outros professores, tomem consciência da dimensão do seu papel neste contexto. Desta forma, espera-se que assumam a sua parcela em prol da construção de um sistema educacional capaz de oportunizar a todos os alunos de todos os níveis e modalidade de ensino, o acesso irrestrito a saberes, habilidades e atitudes que oportunizem “condições para o exercício da cidadania, permitindo às pessoas um viver melhor e favorecendo movimentos societários que alavancam as possibilidades humanas em seu conjunto”. (Ibidem, p. 1152)
REFERÊNCIAS
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