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A IMPLEMENTAÇÃO DA BNCC NO IFPI: Um estudo do Projeto

Pedagógico do Curso de Administração

Fernanda Pereira da Silva Moulin 1


Francisca das Chagas da Silva Alves 2
Raqueline Castro de Sousa Sampaio 3

RESUMO
O presente artigo tem como objetivo investigar as mudanças trazidos pela implementação
da Base Nacional Comum Curricular no curso Técnico Integrado em Administração do
Instituto Federal do Piauí – IFPI. Neste viés, investigamos de que modo a BNCC tem
modificado este curso. O estudo utilizou-se do tipo de pesquisa com abordagem
qualitativa a partir de uma análise documental que utiliza como principais documentos os
Projetos Pedagógicos (PPC) do curso de Administração antes e após a BNCC. As principais
mudanças encontradas foi em relação a carga horária e arranjo das disciplinas em cada período
letivo. Além disso, foi possível analisar que estas mudanças afetam de forma geral todos os
aspectos da educação como o livro didático, a formação dos docentes e os currículos. Neste
sentido se faz necessários posicionamentos críticos para que a Base não se torne o currículo, mas
que sua implantação leve em conta a parte diversificada de modo que a educação e a prática
docente não fique engessada.

Palavras-chave: Base Nacional Comum Curricular, Mudanças, Ensino Médio,


Currículo.

INTRODUÇÃO

A Base Nacional Comum Curricular tem se constituído como um documento “polêmico”


em decorrência do modo como foi construído, aprovado e vem sendo implementado.
Alvo de muitas críticas, estas não foram suficientes para barrá-la, mas ao contrário, passa
a vigorar com força sobre a educação, como afirma Cássio, 2018, “A Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) é hoje o centro gravitacional das políticas do Ministério da

1
Mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Nove de Julho -
UNINOVE, fernandasilpe@email.com;
2
Mestre em Educação pelo Programa de Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares da
Universidade de Pernambuco -UPE, franciscadaschagasdasilvaalves@gmail.com;
3
Mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Tecnologia e Gestão em Educação a Distância
da Universidade Federal Rural do Pernambuco - UFRPE, raquelinecastro@ifpi.edu.br.
Educação” (CASSIO, 2018, p. 01), modificando os currículos, instituições e toda uma
cultura de trabalho das instituições educativas.
A partir das mudanças, o Ensino Médio, modalidade utilizada como recorte para
este estudo, passa a ser composto pela Base Nacional Comum Curricular e por itinerários
formativos, que deverão ser organizados por meio da oferta de diferentes arranjos
curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas
de ensino, quais sejam: I – linguagens e suas tecnologias; II – matemática e suas
tecnologias; III – ciências da natureza e suas tecnologias; IV – ciências humanas e sociais
aplicadas; V – formação técnica e profissional (LDB, Art. 36; ênfases adicionadas). A
redação dada pela Lei nº 13.415, de 2017) dar de que,

A § 5º A carga horária destinada ao cumprimento da Base Nacional Comum


Curricular não poderá ser superior a mil e oitocentas horas do total da carga
horária do ensino médio, de acordo com a definição dos sistemas de
ensino. (BRASIL, 2017)

Considerando os impactos trazidos por esta reestruturação do ensino, nosso foco


volta-se para o Ensino Médio Integrado com o objetivo de investigar as nuances trazidos
pela implementação da BNCC para esta modalidade, mais especificamente para o nosso
campo experiencial com o curso de Administração.
A nossa inquietação parte da necessidade de compreender de que modo a Base
Nacional Comum Curricular tem modificado este curso? Como estamos em início de
implementação, visto que esta se deu em 2020, ainda é cedo para averiguar as perdas ou
ganhos na aprendizagem e naquilo que foca a instituição: a permanência e êxito. A
permanência zela pela continuidade do aluno na instituição e seu êxito refere-se a
conclusão dos estudos em tempos e idade certa. Assim como preconizado em lei, o ensino
deverá ser ministrado com base nos princípios da I - igualdade de condições para o
acesso e permanência na escola; [...]". A “ educação deve englobar os processos
formativos e o ensino ser ministrado com base no princípio da vinculação entre a
educação escolar, o trabalho e as práticas sociais" (Lei n. 9.394, de 29/12/96, artigo 1º,
parágrafos 2º e 3º, inciso XI).
Já estamos cientes que a BNCC desencadeará uma série de alterações, em virtude
de sua natureza e intenções. Corroborando com a ideia que,
A BNCC é, antes e acima de tudo, uma política de centralização curricular.
Define os objetivos de aprendizagem – eufemisticamente denominados
“direitos de aprendizagem” – que devem orientar o trabalho pedagógico em
todas as escolas brasileiras e em todas as etapas da educação básica (da
educação infantil ao ensino médio). Obrigatória e com repercussão nacional a
Base tem implicações diretas nas políticas estatais de compra e distribuição de
materiais didáticos e de formação inicial e continuada de professores, além de
influir nas (e de ser influenciada por) avaliações em larga escala (CÁSSIO,
2018, p.01)

É importante ressaltar que trata-se de um documento alicerçado na Lei 13. 415 de


2017, o que torna mais seguro todo este processo de mudanças. Assim, vamos nos
preparando para as consequências destas ao longo dos anos. Resta-nos a inquietação e
militância por uma melhoria na educação, que de fato seja inclusiva, dando tratamento
isonômico às diversas camadas da população, “o que significa tratar igualmente os iguais
e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades” (NERY JUNIOR,
1999, p. 42).
Esta foi a grande justificativa utilizada para a criação de uma base comum para a
educação básica. “Os implementadores da BNCC vendem a ideia de que é possível saber
quais são os botões que, uma vez apertados, garantirão um futuro glorioso para a educação
brasileira. Por suas veleidades de controle, a Base é uma tecnologia causal por excelência”
(CÁSSIO, 2018, p.8). Questionamo-nos, entretanto, se é possível a aquisição deste feito,
visto que os investimentos em educação tornam-se cada vez mais escassos, reforçando a
cada dia a velha ideia de que educação no Brasil não é, e nunca foi, prioridade.

METODOLOGIA

O estudo utilizou-se do tipo de pesquisa com abordagem qualitativa, assim


escolhida por tratar-se de “uma abordagem que vem preencher as lacunas do modelo
positivista. Deste modo, adequa-se à análise dos fenômenos humanos e sociais, devido ao
caráter subjetivista presente nas ações dos sujeitos (ALVES, 2018, p. 53).
Procedeu-se com a análise documental do Projeto Pedagógico dos Curso Técnico
Integrado ao Médio em Administração, buscando verificar o modo como se estruturou a
matriz curricular dos cursos referentes a base comum e a parte técnica com suas
respectivas disciplinas. Como base documental, utilizamos os Projetos Pedagógicos de
Cursos anteriores à implantação da Base e as suas reformulações pós BNCC, bem como
o documento orientador da Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. A
partir desta análise, foi realizado um comparativo entre aspectos como estrutura
curricular, carga horária e avaliação.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os cursos Técnicos Integrados do Instituto Federal do Piauí tem por características


a oferta, em seus currículos, de uma parte voltada para os conhecimentos gerais
humanísticos e uma outra parte voltada para a formação técnica profissional. A ideia é a
formação de um sujeito completo, distanciada desta dimensão de formação única e
exclusiva para o mercado de trabalho. Ressaltamos que esta é a modalidade de oferta
prioritária da instituição. “Como princípio em sua proposta político-pedagógica, o
Instituto Federal do Piauí atua na oferta de educação básica, principalmente em cursos de
ensino médio integrado à educação profissional técnica de nível médio” (PDI, 2020, p.
39)
O ensino integrado é um avanço na perspectiva educacional brasileira pois lança
aos sujeitos participantes de uma sociedade excludente e discriminatória a oportunidade
de edificar-se enquanto cidadãos e ao mesmo tempo reedificar uma sociedade justa e
integradora. É assim que se dá a formação omnilateral4 do homem, sendo ele capaz de
lutar pelos direitos individuiais e sociais.

Portanto, numa sociedade contemporânea, a integração entre ensino


médio e educação profissional é vista como uma prática educativa
essencial ao desenvolvimento integral dos estudantes, principalmente
de suas características intelectuais, éticas, políticas e sociais (ANA,
2018, p. 69)

Em sua práxis, as dificuldades inerentes a prática docentes para uma integração se


fazem presentes dentro das institutições que oferecem o ensino integrdao. O caso dos IFPI
não é diferente. Várias questões necessitam ser superadas para esta efetivação, desde a
vontade do docente, os cursos de formação e até a própria institutição suas normativas e
regulamentos.

Estruturas curriculares

4
Desenvolvimento dos aspectos ontológicos e históricos, uma formação com uma visão holística de
sociedade.
O curso de Administração na forma Integrada do Instituto Federal do Piauí
apresenta como objetivo geral “oferecer a preparação básica para o trabalho e a cidadania
do educando para que o mesmo possa continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se
adaptar a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores possibilitando o
prosseguimento de estudos, bem como, formar profissionais-cidadãos empreendedores,
competentes, com conhecimentos técnicos, eticamente responsáveis e comprometidos
com o bem estar da coletividade e que saibam associar a teoria à prática, fazendo uso das
habilidades e atitudes compatíveis com a área de Gestão e Negócios” (PPC, 2015).
Tendo em vista o objetivo do curso, facilmente podemos verificar que ele transita
entre o viés técnico, científico, se distanciando das características de ser mera formação
de mão de obra. Ao contrário, os alunos são possibilitados a ir além, em busca de uma
formação superior e prosseguimento nos estudos. Trata-se de um curso ofertado em
grande parte dos campi do Instituto Federal do Piauí e com alta procura pelos alunos.

Imagem 1: Matriz do curso Técnico Integrado em Administração de 2015 a 2019.


Fonte: PPC
Ao analisar a matriz curricular anterior, em termos de carga horária total,
podemos observar que, até 2019 o curso possuía uma carga horária total de 3.300 horas,
distribuídas entre as disciplinas de eixo comum e as do eixo técnico. Ambas totalizavam
21 disciplinas distribuídas ao longo dos três anos de duração do curso. A carga horária
das disciplinas variava entre 120 a 30 horas, nas quais as disciplinas que continham cargas
horárias menores eram Educação Física e Inglês, com 30 horas respectivamente.
Fazendo um comparativo com a matriz atualizada pós implantação da base, é
possível verificar as modificações. A carga horária total do curso foi reduzida de 3.300
para 3.100 horas, acarretando à formação dos alunos um déficit de 200 horas. O núcleo
comum, que antes somava 2.400 horas, passou a vigorar com apenas 1800 horas. Em
contrapartida, o núcleo técnico que antes contabilizava 870 horas, passa a ter 900, tendo
um ganho de 30 horas. Embora não seja um tanto significativo, em relação a quantidade
de carga horária, mas, implicitamente, podemos fazer o seguinte questionamento: estaria
aí a intenção de suprimir cada vez mais a formação geral e humanística para dar enfoque
à formação técnica?
Dentro do contexto da necropolítica que vivenciamos não podemos duvidar.
Consideramos, a exemplo da última entrevista do Ministro da Educação Milton Ribeiro
concedida a TV Brasil, na qual não hesita em demonstrar a sua visão de educação para
quê e para quem. Claramente fazendo esta divisão entre formação superior para ricos e
formação técnica para os pobres. Portanto, é conveniente para este tipo de pensamento
aquilo que Sueli Carneiro e Boaventura de Sousa Santos denomina de Epistemicídio.

O colonialismo, para além de todas as dominações por que é conhecido, foi


também uma dominação epistemológica, uma relação extremamente desigual
de saber-poder que conduziu à supressão de muitas formas de saber próprias
dos povos e nações colonizados, relegando muitos outros saberes para um
espaço de subalternidade (SANTOS; MENESES, 2010, p. 7)

Se até determinado momento foi possível avançar, no sentido de fazer vozes


silenciadas adquirir um lugar de fala, as estruturas impostas fazem com que ocorra um
retrocesso. Afinal, o conhecimento que pode dar essa autonomia a estes sujeitos, são
retirados do currículo para dar lugar a uma formação de mão de obra que sirva ao
mercado.
Imagem 2: Matriz do curso Técnico Integrado em Administração 2019 – Núcleo básico
Fonte: PPC

Atentamente observamos que, neste novo arranjo, as disciplinas que tiveram perda
maior foram as da área do conhecimento de Ciências humanas: História, Geografia,
Filosofia e Sociologia, que tiveram uma perda de 80 horas nas suas cargas horárias. Vale
ainda ressaltar que são disciplinas que possibilitam um conhecimento geral humanístico
e reflexivo.
O núcleo tecnológico, que corresponde às disciplinas técnicas do curso, realiza
uma formação focada no mundo do trabalho. São disciplinas que orientam métodos,
técnicas, ferramentas e outros elementos das tecnologias relativas aos cursos. Refere-se
às unidades curriculares específicas da formação profissional, identificadas a partir do
perfil do egresso que instrumentalizam: domínios intelectuais das tecnologias pertinentes
ao eixo tecnológico do curso; fundamentos instrumentais de cada habilitação; e
fundamentos que contemplam as atribuições funcionais previstas nas legislações
específicas referentes à formação profissional (PPC, 2019, p. 15).
Além deste, o PPC complementa sua matriz com as disciplinas de núcleo
integrador e complementar. A ideia do núcleo integrador é fazer uma integração entre as
disciplinas de base comum e as de base técnica.

Imagem 3: Matriz do curso Técnico Integrado em Administração 2019 – Núcleo Integrador e


Complementar
Fonte: PPC 2019

“Tem o objetivo de ser o elo comum entre o Núcleo Tecnológico e o Núcleo


Básico, criando espaços contínuos durante o itinerário formativo para garantir formas de
interação e articulação entre os diferentes campos de saberes específicos” (PPC, 2019, p.
15). Já o núcleo complementar refere-se a parte diversificada do currículo, com uma carga
horária de 220 horas, que tem o objetivo de complementar competências eletivas dos
alunos, tendo ainda um acréscimo de 40 horas que se destinam às disciplinas de Língua
Portuguesa, línguas estrangeiras e libras (PPC, 2019).
É interessante observar que, na organização dos núcleos há uma preocupação em
garantir uma integração dos conhecimentos visando “assegurar na organização curricular
espaço de intersecção dos conhecimentos da formação geral, da formação profissional e
da formação complementar” (PPC, 2019, p. 16). No entanto, também observamos um
enfoque maior em algumas áreas em detrimento de outras, o núcleo integrador, a
exemplo, possui uma carga horária pequena, o que pode ser insuficiente para garantir uma
integração entre os diferentes saberes. Ademais, o enfoque em algumas áreas do
conhecimento denota um distanciamento da perspectiva de formação humana integral,
aspecto que orienta e fundamenta o ensino médio integrado ofertado pela rede federal de
educação profissional.
Com a redução da carga horária das disciplinas, foi necessário modificar também
a forma de oferta, que antes era anual, passou a ser modular e semestral. Ou seja, os alunos
que antes passavam o ano inteiro estudando os conteúdos das disciplinas, passaram a ficar
um semestre inteiro, ou mais, sem ter contato com elas. Mudanças como estas têm
implicação direta no rendimento dos discentes em exames como o ENEM. Além disso,
esta forma de oferta gera implicações para os docentes. Em determinado semestre ficam
abarrotados de carga horária e em outros necessitam fazer um verdadeiro “jogo de
cintura” para fechá-la.
A implicação da BNCC nos livros didáticos parece ser um outro dilema a ser
enfrentado. Antes, disciplinas que vinham de modo separado em seus respectivos livros,
agora passam a vir em um volume único, com conteúdos que, quando não suprimidos,
apresentam-se de forma resumida e superficial.

O livro didático tem sido, desde o século XIX, o principal instrumento


de trabalho de professores e alunos, sendo utilizado nas mais variadas
salas de aula e condições pedagógicas, servindo como mediador entre
a proposta oficial do poder expressa nos programas curriculares e o
conhecimento escolar ensinado pelo professor ((BITTENCOURT,
2010, p. 72)

Embora a questão do livro didático não seja algo causado pelas modificações no
PPC do curso de Administração, contribui para acentuar o caráter de formação aligeirada,
o qual nota-se orientar à BNCC. Desse modo, as mudanças ocorridas na organização do
livro didático servem como mecanismo de apoio à implantação da BNCC e confirmam
suas reais intenções que se distanciam de promover uma formação integral de qualidade
numa perspectiva ampla.

No edital do PNLD 2020, por exemplo, as coleções didáticas voltadas


aos anos finais do Ensino Fundamental que “não contribuírem
adequadamente para o desenvolvimento de todas as competências
gerais e específicas das áreas de conhecimento, constantes na BNCC”
(Brasil, 2018) serão excluídas das escolas brasileiras durante pelo
menos quatro anos. E, a partir do PNLD de 2021 (Brasil, 2019), os
livros didáticos de Geografia deixam de existir nesse nível de ensino,
passando a integrar parte de um conjunto de materiais de Ciências
Humanas e Sociais Aplicadas, divididos em uma obra didática contendo
“projetos integradores” e uma coleção de seis livros (VITELLO, 2021,
p. 17)

Observamos nitidamente que, com este formato, os prejuízos em relação a


conteúdos são evidentes. Sabemos que, o livro não é currículo, mas as escolas brasileiras
infelizmente não estão preparadas para elaborar muitas vezes seus próprios currículos
levando em consideração a parte diversificada trazida pela LDB e BNCC. É comum
vermos escolas que tem seu projeto pedagógico engavetado, muitas vezes construído de
forma unilateral, tornado-se apenas um documento “sem valor” que não é consultado ou
revisado.

Avaliação

Mediante as modificações impostas pela estrutura das disciplinas e suas cargas


horárias, se faz necessário lançar um olhar acerca dos conhecimentos e habilidades que
determina para cada área do conhecimento, a este conjunto o documento denomina de
“aprendizagens essenciais". [...] “as aprendizagens essenciais definidas na BNCC devem
concorrer para assegurar aos estudantes o desenvolvimento de dez competências gerais,
que consubstanciam, no âmbito pedagógico, os direitos de aprendizagem e
desenvolvimento”. (BNCC, 2017, p. 08) As intenções trazidas pela BNCC a respeito do
que os alunos devem aprender para desenvolver tais competências nos sugerem um
direcionamento das práticas pedagógicas e avaliativas para a preparação dos alunos para
os exames de larga escala. O próprio texto enfatiza estes aspectos:
Além disso, desde as décadas finais do século XX e ao longo deste
início do século XXI, o foco no desenvolvimento de competências tem
orientado a maioria dos Estados e Municípios brasileiros e diferentes
países na construção de seus currículos. . É esse também o enfoque
adotado nas avaliações internacionais da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que coordena o
Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em
inglês), e da Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura (Unesco, na sigla em inglês), que instituiu o
Laboratório Latino-americano de Avaliação da Qualidade da Educação
para a América Latina (LLECE, na sigla em espanhol). (BNCC, 2017,
p. 08)

É visível a intenção de ajustar as “competências” da educação aos interesses do


capital, daqueles setores mais ricos da sociedade. Em virtude disso, este interesse em
interferir nos currículos educacionais ajustando as suas necessidades. Colocando-se,
portanto, em evidência no documento o foco em competências em vez de conhecimentos,
engessando assim o processo de ensino e aprendizagem.

Outras questões surgem

Com a implantação de um novo currículo, a partir da orientação da BNCC, vemos


surgindo novos problemas. Podemos mencionar, por exemplo, o modo como ela foi
implantada no IFPI. Não foi fornecido formação necessáira para que a instituição pudesse
está bem orientada neste processo. Isso gerou uma grande difculdade em relação a
organização e adaptação das normativas da instituição ao novo currículo. O fato, por
exemplo de uma tranformação de disciplinas que antes eram anuais e agora passam a ser
semestrais, dificulta no processo de gestão destas disciplinas.
A redução da carga horária de componentes curriculares como Filosofia,
Educação Física, Artes e Sociologia, prejudicam esta concepção de formação integral.
Sabemos que tratam-se de disciplinas que se lançam com uma proposta de
problematização da realidade e consequente de emancipação do homem a partir da
problematização da sua realidade, “Para a educação problematizadora, enquanto um que
fazer humanista e libertador, o importante está, em que os homens submetidos à
dominação, lutem por sua emancipação” (FREIRE, 1968, p.49). A sobreposição de
competências a uma formação integral compromete o desenvolvimento de uma formação
crítica para a cidadania.
Em relação a formação dos professores, à luz da Resolução CNE/CP Nº 1, de 27
de outubro de 2020, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares para a formação
continuada de professores orientada pela BNCC, preconiza, em seu artigo 3º que

As competências profissionais indicadas na BNCC-Formação


Continuada, considerando que é exigido do professor sólido
conhecimento dos saberes constituídos, das metodologias de
ensino, dos processos de aprendizagem e da produção cultural
local e global, objetivando propiciar o pleno desenvolvimento dos
educandos, têm três dimensões que são fundamentais e, de modo
interdependente, se integram e se complementam na ação docente
no âmbito da Educação Básica: I - conhecimento profissional; II
- prática profissional; e III - engajamento profissional (BRASIL,
2020)

Observamos que, a resolução não faz menção a uma formação humanística, mas
foca em dimensões como conhecimento e prática profissional e a terceira dimensão que
diz respeito ao engajamento profissional. Nesta condição, coloca como inteiro
responsável pelo sucesso na educação, o enganjamento dos educadores, disconsiderando
a dimensão humana e as condições dadas para que este profissional seja capaz de formar-
se e exercer suas atividades.

Em meio a esta realidade, surgem o questionamentos: ABNCC não se tornará um


“currículo” por si só e esta parte diversificada não ficará desprezada? Como as escolas
estão sendo preparadas para receber a BNCC? Com uma visão crítica e construtivista ou
com uma visão romantizada de que a unificação de um currículo para o país é a panacéia
para os problemas existentes na educação? No cenário da educação ténica integrada, mais
questões a serem elucidadas:

Frente às reflexões que a história da criação dos Institutos Federais nos


permite, nos vemos em um caminho obscuro, sem saber os rumos e os
impactos que a BNCC pode trazer ao ensino profissional, sobretudo ao
ensino médio integrado. Restam-nos indagações tais como: que
currículo6 teremos? Diante das possibilidades que estão nos sendo
impostas, podemos vislumbrar um futuro para o Ensino Médio
Integrado dos Institutos Federais? Quais impactos na proposta de
verticalização do ensino técnico e tecnológico? (ZITZKE, 2020, p.06)

A nossa visão deve partir de um viés crítico, sempre disponíveis a “desconfiar”,


ela deve partir do contexto, buscar ver além do que está sendo mostrado. Deste modo,
averiguar a quem serve esta educação que nos é imposta. Por fim, ser sempre resistência.
Coadunamos com o pensamento de “Se a opção de agora for empreender uma luta aberta
contra a BNCC, a certeza é de que ela será muito mais dura do que há 20 anos quando
lutávamos contra os Parâmetroc Curriculares Nacionais - PCNS. Mas é preciso começar
por algum lugar. Quando me perguntam o que fazer para lutar contra a Base, tenho
respondido sem pestanejar: vamos começar defendendo as escolas e a nossa profissão”
(CÁSSIO, 2018, p. 15).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, podemos considerar que o Projeto Pedagógico do Curso de


Administração do IFPI passou por muitas mudanças para se adequar a proposta da BNCC.
Embora ainda seja cedo para constatar os reais impactos que isso causará, sobretudo na
questão central que é a formação dos estudantes, já é possível, e necessário, problematizar
a situação.
No que se refere a carga horária das disciplinas, observou-se uma redução,
principalmente no que concerne à formação humana, e aumento da carga horária da
formação técnica, o que evidencia claramente a intenção de priorizar a formação técnica,
direcionada ao mercado de trabalho, em detrimento da formação humana e integral.
De um modo geral, ressaltamos que, a grande preocupação dos gestores públicos
com os problemas educacionais, aos quais a BNCC se sobrepõe, inicialmente deveriam
estar voltados para questões prioritárias como: infra estrutura, material didático,
formação de professores, fechamento de escolas. Com todos estes problemas,
questionamo-nos para reflexão inicial: Porque focar no currículo? O foco está no
currículo porque não existe currículo neutro, ao contrário, ele envolve valores e ideologias
que definem visões de mundo, formas de compreendê-lo e com ele estabelecer relações.
Por esta razão, cabe-nos sempre fazer indagações, movimentos de resistência de
modo a questionar o modelo de educação que é estruturado na BNCC. É este movimento
que possibilita as modificações de estruturas montadas que desfavorecem grupos sociais
minoritários. Aqui desejamos ser instrumentos de questionamentos evidenciando valores
que são colocados ou não e quais as perspectivas que a BNCC trás para melhoria de vida
e continuidade das lutas por direitos à educação.
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