Você está na página 1de 8

LESÕES

ARTICULARES PARTE II:


FATORES GENÉTICOS
E AMBIENTAIS
Liris Kindlein
Médica Veterinária, Dra, Professora e Pesquisadora da UFRGS - Área de
concentração: inspeção e tecnologia de carnes, pescado e derivados; condenações
e qualidade de carcaça, fisiologia animal voltada à produção de carne.

patologia
Na última edição da aviNews
Brasil (julho 2021) demos início à
abordagem sobre a importância de
nos aprofundarmos no tema das lesões
articulares em frangos de corte.
GENÉTICA
No primeiro artigo os fatores
nutricionais e sanitários
relacionados com as lesões
articulares.
AMBIENTAIS
Neste, o enfoque será relacionado
com outros dois alicerces des-
encadeadores de problemas
locomotores, associados ou
isolados:

87
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
GENÉTICA Há hipóteses de que problemas esqueléticos
também podem ocorrer pelo incremento
genético do desenvolvimento do músculo
Do ponto de vista GENÉTICO, o setor peitoral e, consequentemente, a alteração do
avícola investiu na seleção de linhagens eixo gravitacional do esqueleto, ocasionando
que apresentassem maior taxa de deformações ósseas, como:
crescimento e tal prática pode ter
favorecido o surgimento de patologias desvio de coluna (espondilolistese),
estruturais anatômicas, principalmente
dos tecidos ósseo e muscular. defeitos de angulação valgus (Figura 1) e
varus e

O elevado crescimento muscular


rotação da cabeça da tíbia (Oviedo, 2006;
muitas vezes é acompanhado por
Whitehead, 2010).
uma baixa maturidade do esqueleto,
aumentando a incidência de fragilidade
e deformação óssea.
Segundo literatura, 65% dos problemas
patologia

de perna em frangos de corte estão


associados a presença de uma
A tensão biomecâmica desempenhada na deformidade de conformação que
cartilagem epifisária de frangos, cujo tecido incidem principalmente em ossos longos.
ósseo apresenta-se imaturo, proporciona a
ocorrência de microfraturas e fissuras na
cartilagem,

A espondilolistese (kinky back) é considerada


que contribuem para a formação de
uma deformidade que afeta as vértebras
lesões osteocondróticas e, conse-
torácicas de frangos de corte, mais
quentemente, maior prevalência de
frequentemente a quarta vértebra torácica
claudicações, comprometendo o
(Figura 2), entre as terceira e sexta semanas de
comportamento natural do animal
idade.
(restrições ao acesso ao comedouro e
bebedouro) e seu bem-estar.
Resultando em compressão da medula
espinhal e, consequentemente, dificuldade
de locomoção, podendo ocorrer a paralisia
dos membros pélvicos e, neste caso, os
animais ainda devem ser descartados
(refugo) na propriedade rural.

88
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
AMBIENTE

Além dos fatores genéticos e nutricionais,


os fatores AMBIENTAIS também estão
associados a ocorrência de problemas
locomotores e mudanças no padrão da
marcha (mensurado via Gait Score, Raio-X
– Figura 3) em aves domésticas, tais como:

o tipo de piso utilizado

altas temperatura e umidade relativa


do ar somado a umidade excessiva da
cama (HESTER, 1994),

menores períodos de escuro durante o


dia (KNOWLES et al., 2008) e
Figura 1- Desvio angular Valgus.

patologia
lotação (MARCHEWKA et al., 2013).

Figura 2-E spondilolistese. Fonte: https://www.thepoultrysite. Figura 3- Imagem de raios-X de um pintinho com aumento
com/disease-guide/spondylolisthesis-kinky-back de volume nas articulações e destruição dos tecidos moles
(Fonte: Guo et al., 2019).

Sua incidência, que pode atingir 2% na


granja, está relacionada com idade,
taxa de crescimento rápido e genética
(OSBALDISTON & WISE, 1967; WISE, 1973;
RIDDELL, 1973; PAIXÃO et al., 2007).

89
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
FERRAMENTAS PARA AVALIAÇÃO E
MONITORAMENTO A CAMPO

O diagnóstico de artrite a campo


não é fácil de ser assertivo. Existem
ferramentas que podem auxiliar a
determinação da incidência de lesões nos
lotes. Dentre eles, pode-se citar:

Avaliação da marcha através


de Gait Score (GS – “escore da
marcha”)

Critério utilizado como forma de Figura 4- Termografia de articulação de perus.


avaliação geral da saúde das pernas
e de bem-estar (SKINNER-NOBLE; Análises ultrassonográficas
TEETER, 2009); (Figura 5a, 5b)

Termografia de infravermelho Descritas como ferramentas úteis


patologia

(Figura 4) para avaliação de características


ósseas em aves domésticas (FLEMING;
KORVER; McCORMAC; WHITEHEAD,
Técnica não invasiva que permite a
2004). Algumas das variáveis ultras-
visualização do perfil térmico de calor
sonográficas rotineiramente avaliadas
emitido por um objeto (NÄÄS et al.,
nessa espécie é o grau de efusão
2014).
do líquido sinovial e a espessura da
membrana sinovial;
A literatura atual indica que essa
ferramenta pode ser utilizada para o
diagnóstico de estresse térmico e de E, por fim, Necrospia e classificação
condições patológicas subclínicas de escore de lesão por
(GRACIANO et al., 2014). degeneração femoral (Escore de 1
a 3) e discondroplasia tibial (Escore de
1 a 3).
É esperado que em processos
inflamatórios a temperatura superficial
local se eleve (NÓBREGA et al., 2014); por
outro lado, espera-se que a temperatura
superficial diminua em situações de
insuficiente circulação sanguínea local
(JACOB et al., 2016), como as que
ocorrem em processos necróticos;

90
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
Figura 5- ((a) Avaliação de articulação através de ultrassonografia, (b) Imagem ultrassonoráfica com probe
posicionada em direção longitudinal da articulação intertarsal, destacando o diâmetro da cavidade sinovial
(pontilhado). Fonte: própria autora.

patologia
ASPECTO VISUAL DAS LESÕES ARTICULARES VISUALIZADAS NO ABATEDOURO

Considerando que todas as lesões Desta forma, a fim de padronizar a


articulares/pernas em carcaças de avaliação macroscópica e distinguir as
frango visualizadas na Inspeção post lesões articulares inespecíficas que não
mortem estão sendo classificadas no se enquadrem em processo inflamatório,
ábaco como artrites, e que muitas seguem abaixo imagens (Figura 6) de
destas lesões não se enquadram neste categorias de graus de severidade de
conceito e são inespecíficas, podendo lesões da articulação tíbio-társicas
serem classificadas como alterações considerando:
não patológicas e localizadas (sem
caráter inflamatório e infeccioso), é de AUMENTO DE
suma importância: VOLUME

ALTERAÇÃO
COLORAÇÃO
Identificar e classificar macrosco-
picamente as lesões, como também PRESENÇA OU AUSÊNCIA DE
PROCESO INPLAMATÓRIO
o grau de comprometimento VÍSIVEL (ARTRITE)
dos tecidos adjacentes, visando
o diagnósticos das causas e a IDADE DE LASÃO
determinação de estratégias a campo SEGUNDO COLORAÇAO

que possam mitigar tais ocorrências.


ÁREA/REGIÃO
COMPROMETIDA
(FOCAL OU DIFUSA)

91
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
Figura 6- Padrões macroscópicos das lesões da articulação
tíbio-tarsal:

(a) Grau 1 – articulação com discreto aumento


de volume e sem alteração de coloração;
patologia

(e,f) Grau 4 – articulação com significante aumento


de volume, com acentuada alteração de coloração
(arroxeada/esverdeada/azulada - característica de
(b) Grau 2 - articulação com discreto aumento lesão antiga), localizada em área focal;
de volume e leve alteração de coloração (rosada/
avermelhada clara - característica de lesão
recente), localizada em área focal;

(c,d) Grau 3 – articulação com


aumento de volume e acúmulo de
líquido límpido entre a epiderme e
a derme, formando uma “bolha”,
sem alteração de cor;

92
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
(g,h) Grau 5 - articulação com significante aumento de volume, com acentuada alteração de coloração
(arroxeada/esverdeada/azulada - característica de lesão antiga), localizada em área difusa;

patologia
(i) Queimadura de Jarrete - ulceração da pele em
que as áreas afetadas apresentam descoloração
marrom ou preta,

Uma das lesões de grande incidência


na avicultura nacional é chamada de
(j,k) Artrite- articulação com acentuado
Joelho verde e pode ser enquadrada
aumento de volume, com alteração de coloração
no grau de severidade 4 (focal) ou
(amarelada – característica de presença de
5 (difuso), segundo classificação processo inflamatório visível), localizada em
ilustrada na Figura Figuras 6 (e), 6 (h) e 7 (c). área focal ou difusa, podendo apresentar
exsudato amarelado.

93
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares
Embora a literatura cite relação desta
lesão com a positividade de Reovírus, a
causa e o mecanismo fisiológico ainda
não estão bem esclarecidos.

Em estudo a campo, Kindlein


et al. (2021), avaliando mais
minuciosamente a lesão através de
incisão anatômica, sugeriram que a
lesão pode originar do rompimento
da anastomose das veias metatarsal e
tarsal medial por lesão traumática, ou
rompimento de células endoteliais da
túnica íntima, soltura da epiderme e
derme, extravasamento e acúmulo de
sangue nesta região
patologia

O setor avícola vem buscando, além do


acréscimo na produtividade, diminuir
as perdas em todas as etapas da cadeia
sendo,

para isto, fundamental o diagnóstico


específico de cada realidade
para a definição de diretrizes e
implementações de ações de manejo,
monitoramento nutricional e sanitário,
além de adequados programas de
imunização.

Além disto, embora as herdabilidades das


características de saúde de pernas sejam
baixas, a seleção genética deve continuar
considerando este atributo, dentre outros,
para alcançar um progresso equilibrado
Figura 7– (a) Veia tarsal medial íntegra e com alto nas linhagens modernas.
calibre e vascularização; (b) Veia metatarsal medial
íntegra; (c) Lesão de joelho verde unilateral em Lesões Articulares PARTE II: Fatores Genéticos
e Ambientais
frango a campo; (d) Incisão anatômica da lesão de
joelho verde para visualização dos tecidos internos, BAIXAR EM PDF
cm lesão focal e necrosada.
BIBLIOGRAFIA sob consulta junto ao autor.
94
aviNews Brasil Outubro 2021 | Lesões articulares

Você também pode gostar