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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Educação Física

GABRIELA MARTA MARQUES DE OLIVEIRA

Os bancários no futebol paulistano: a experiência de uma categoria profissional no


esporte (1929-1945)

CAMPINAS-SP

2020
GABRIELA MARTA MARQUES DE OLIVEIRA

Os bancários no futebol paulistano: a experiência de uma categoria profissional no


esporte (1929-1945)

Dissertação apresentada à Faculdade de


Educação Física da Universidade
Estadual de Campinas como parte dos
requisitos exigidos para a obtenção do
título de Mestra em Educação Física, na
Àrea de Educação Física e Sociedade

Orientador: Prof. Dr. Edivaldo Góis Junior

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À


VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO
DEFENDIDA PELA ALUNA
GABRIELA MARTA MARQUES DE
OLIVEIRA, E ORIENTADA PELO
PROF. DR. EDIVALDO GÓIS JUNIOR.

CAMPINAS-SP

2020
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca da Faculdade de Educação Física
Dulce Inês Leocádio - CRB 8/4991

Oliveira, Gabriela Marta Marques de, 1995-


OL4b OliOs bancários no futebol paulistano : a experiência de uma categoria
profissional no esporte (1929-1945) / Gabriela Marta Marques de Oliveira. –
Campinas, SP : [s.n.], 2020.

OliOrientador: Edivaldo Góis Junior.


OliDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade
de Educação Física.

Oli1. Futebol-História. 2. Bancários - São Paulo (Estado) - 1923-1944. 3.


Sindicatos - São Paulo (Estado) - História. I. Góis Junior, Edivaldo. II.
Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação Física. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: The banck employees in the state os São Paulo's football: : the
experience of an occupational category in sport (1929-1945)
Palavras-chave em inglês:
Football - History
Banking - São Paulo (State) - 1923-1944
Unions - São Paulo (State) - History
Área de concentração: Educação Física e Sociedade
Titulação: Mestra em Educação Física
Banca examinadora:
Edivaldo Góis Junior [Orientador]
Michel Nicolau Netto
Victor Andrade de Melo
Data de defesa: 11-08-2020
Programa de Pós-Graduação: Educação Física

Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a)


- ORCID do autor: https://orcid.org/0000-0003-1734-3176
- Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/9354731114719267

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)


COMISSÃO EXAMINADORA1

___________________________________________
PROF. DR. EDIVALDO GÓIS JUNIOR
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS – UNICAMP

__________________________________________
PROF. DR. MICHEL NICOLAU NETTO
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS- UNICAMP

_________________________________________
PROF. DR. VICTOR ANDRADE DE MELO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ

1
A ata da defesa, com as respectivas assinaturas dos membros, encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de
Dissertação/Tese e na secretaria do Programa de Pós-Graduação, na Faculdade de Educação Física da Unicamp .
O futebol é aquilo que homens concretos fazem dele em cada momento e local.2

2
JÚNIOR, Hilário Franco, Dando tratos à bola - Ensaios sobre futebol, Edição: 1. São Paulo, Brasil: Companhia
das Letras, 2017, p. 165.
Aos meus pais, Elza e Sergio, por todo o amor.
AGRADECIMENTOS

Essa talvez seja a parte mais difícil desse trabalho. Não porque ache que agradecer
os que estão e estiveram comigo seja difícil, mas por medo de, enganada pela memória, me
esquecer de alguém. De antemão, peço desculpas caso isso ocorra. Deixo claro também que,
apesar de essenciais, essas pessoas nada tem a ver com os problemas desse texto, de inteira
responsabilidade de sua autora.

Muitos foram os amigos que estiveram comigo, nem sempre fisicamente. Ana,
Paula e Alyssa foram, cada uma em um lugar desse país, pessoas que estiveram sempre
disponíveis para mensagens essenciais (e nem tão essenciais assim) quando fosse preciso.
Rafaella, Ruy, Camila, Franco, Caio, Gabi Pratavieira, Menini e Thayde estiveram por perto
em almoços, bares, jogatinas, viagens, na biblioteca e nos corredores do IFCH, prontos para
risadas e discussões sem fim, que passavam em minutos de assuntos sérios a amenidades, e
sempre a postos para o tradicional café das 16h no prédio rosa. Silvia, Rita e Letícia foram,
cada uma a seu tempo, companheiras que fizeram apartamentos vazios se transformarem em
lares, e serei eternamente grata a elas por isso. Talison se tornou amigo querido, com quem falar
de futebol era sempre mais divertido. Agradeço pelas idas aos estádios, por todas as cervejas
divididas, pelas conversas, pelos planos que nem sempre sobreviveram às mesas de bar, pelos
pitacos historiográficos e pela parceria nas frentes de história do Emancipa. Ivan foi
fundamental para essa jornada. Juntos desde o ensino médio, dividimos as salas do curso de
história e as ansiedades do processo de entrada e estada na pós-graduação. A ele agradeço pelas
palavras, sempre precisas, nos momentos em que eu mais precisava. À Henrique, agradeço
pelos treze anos de amizade. Pela disponibilidade, o carinho, a diversão, por ser sempre tão bem
recebida em sua casa, e, principalmente, pelos abraços.

Aos colegas do grupo Corpo e Educação, Samuel, Diego, Léo, Igor e Bruna
agradeço por terem me recebido tão bem e contribuído tanto para essa pesquisa. Um
agradecimento especial deve ser feito ao Igor, que esteve comigo em quase todos os dias de
trabalho no Laboratório Margem. Agradeço a eles pelas críticas, sugestões, pela leitura atenta
do texto e pela amizade.

Agradeço ao meu orientador, professor Edivaldo Góis Junior, por ter acolhido a
ideia de uma aluna de segundo ano e a orientado com tanta paciência. Desde 2015, quando
iniciamos nossa jornada em uma Iniciação Científica, se mostrou um orientador humano,
compreensivo, crítico e instigante, sempre respeitando minhas opiniões. Sem ele, a execução
do projeto teria sido infinitamente mais difícil.

Aos professores Victor Andrade de Melo e Michel Nicolau Netto agradeço pela
leitura cuidadosa do texto. Eles foram críticos certeiros e gentis, e seus comentários e o diálogo
com eles foi essencial para que o trabalho ganhasse corpo.

Alguns professores marcaram minha trajetória acadêmica, e se tornaram um norte


na vida profissional. No ensino médio Fernanda Zucarelli e Adriano Di Nardo, professores
sensíveis, competentes e inspiradores, me apontaram uma forma diferente de ensinar, que ia
muito além de suas respectivas disciplinas. Na graduação, Leila Mezan Algranti me mostrou a
paixão pela história e pelo fazer historiográfico. Seu entusiasmo em ensinar história a alunos
ingressantes e a forma como falava de história foram cativantes. Agradeço a eles, e a todos os
meus professores, pela dedicação.

Agradeço à Veridiana pela acolhida em sua casa para que as pesquisas para esse
trabalho fossem feitas, compartilhando comigo as alegrias e frustrações da pesquisa de campo.
Pesquisas essas que não teriam sido possíveis sem a ajuda de Alexandre, do CEDOC-Bancários,
César, do Satélite Esporte Clube e Marlene, da A.A.B.B. Sua disposição e atenção foram
essenciais para que a coleta das fontes pudesse ser realizada com êxito.

Aos alunos e professores do Cursinho Popular Emancipa -Toninho agradeço pelos


anos de companheirismo e dedicação à educação popular, tão essencial para que as
universidades públicas se encham de povo. Certamente aprendi muito mais do que ensinei nesse
espaço, e sou grata aos que estiveram comigo durante esse tempo.

Agradeço ao tio Vitor pelo universo cultural que me apresentou. Música, cantores,
livros, experiências de vida. Também sou grata por todos os preparativos e enfeites natalinos,
a alegria, as risadas, por fazer tudo virar festa. Tia Dete e tio “Calinho” me receberam em sua
casa enquanto meus pais estavam trabalhando e as escolas de tempo integral ainda não eram o
sucesso que são hoje. Muito obrigada pelo carinho e por terem me transformado na corintiana
que sou.

Dona Gabriela merece agradecimentos especiais, a começar pelo empréstimo do


nome. Obrigada pelas férias em sua casa, por estar sempre por perto, ainda que nem sempre
estivesse presente, pelos cuidados, por torcer para que eu “aprendesse rápido” e enfim
terminasse esse trabalho “tão custoso”. Obrigada, vó, por compartilhar sempre tanto amor.
Por fim, agradeço aos meus pais, sem os quais certamente eu não teria chegado até
aqui. Me faltam palavras para expressar a gratidão e o amor que sinto por eles. Sem eles nada
disso teria disso possível. Muito obrigada por percorrerem esse caminho ao meu lado, por
compreenderem as ausências necessárias para que esse trabalho fosse escrito, e por me
encorajarem a ir deixando sempre as portas abertas para que eu possa voltar.

À sociedade paulista, agradeço pela manutenção da Universidade Estadual de


Campinas onde pude realizar meus estudos desde a graduação. O presente trabalho foi realizado
com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES)
- Código de Financiamento 001, processos de número 1775997 e 88882.434725/2019-01.
RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo olhar para o esporte praticado pelos trabalhadores
bancários em São Paulo, entre os anos de 1929 e 1945, organizado pela Liga Bancária de
Esportes Atléticos, vinculada à Associação dos Funcionários de Bancos do Estado de São
Paulo, para compreender a formação de uma cultura em comum entre os bancários no período.
O olhar para esse objeto nos permitiu compreender como as representações sobre o esporte
veiculadas pela Folha Bancária, órgão oficial da Associação dos Bancários, eram recebidas e
vivenciadas na experiência desses agentes históricos praticantes de esportes, notadamente do
futebol. Olharemos também para dois clubes de funcionários do Banco do Brasil, e através de
suas atas e estatutos refletiremos sobre a heterogeneidade dos bancários e como ela se refletia
no universo esportivo. O diálogo com a história da Associação dos Funcionários de Bancos do
Estado de São Paulo será feito na medida em que, para compreender as diversas representações
sobre o esporte veiculadas no jornal da associação, fonte principal dessa pesquisa, é preciso
perceber as mudanças políticas na organização da associação, decorrentes das alterações
políticas que aconteceram no primeiro governo Vargas.
Palavras-chave: história do esporte; bancários; São Paulo.
ABSTRACT

The present Masters Dissertation aims to look at the sports, which were organized by Liga
Bancária de Esportes Atléticos (Banking League of Athletic Sports), linked to Associação dos
Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo (Association of Bank Employees of the State
of São Paulo) and played by bank workers in São Paulo from 1929 to 1945, to understand the
formation of a shared culture among bank employees in that period. The examination of this
object enabled us to understand how the representations about sports that were published by
Folha Bancária, the official body of Associação dos Bancários (Association of Bank
Employees), were received and felt in the experience of these historical agents who played
sports, notably football. We will also look at two clubs of Banco do Brasil employees, and
through their minutes and statutes, we will reflect on the heterogeneity of bank employees and
how it was reflected in the sports universe. The dialogue with the history of Associação dos
Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo will take place to the extent that, in order to
understand the various representations about sports which the associations newspaper, the main
source of this research, published, it is necessary to understand the political changes in the
organization of the association, which resulted from the political changes that occurred during
the first Vargas government.
Keywords: sports history; bank employees; São Paulo.
LISTA DE IMAGENS

Imagem 1. Gabinete dentário do Dr. João Reis.......................................................................41

Imagem 2. Sala de xadrez da Associação................................................................................42

Imagem 3. Biblioteca da Associação.......................................................................................42

Imagem 4. Sala de ping-pong...................................................................................................43

Imagem 5. Ambulatório Médico...............................................................................................43

Imagem 6. Fachada da sede da associação, na Rua Conselheiro Furtado, 39......................... 44

Imagem 7. Quadro do Clube Banco Noroeste, vencedor do Torneio Início de 1929.................49

Imagem 8. Bancários em frente ao prédio da Gazeta durante a greve de 1934..........................65

Imagem 9. Os campeões bancários de 1934 ............................................................................72

Imagem 10. Equipe da A.A.B.B.-SP que enfrentou a A.A.B.B.-Santos em 1934........................81

Imagem 11. Equipes da A.A.B.B.-São Paulo e A.A.B.B.-Rio durante a excursão à São Paulo,
em 1935.................................................................................................................................... 81

Imagem 12. Torneio de Xadrez.................................................................................................90

Imagem 13. Aspecto dos assistentes e participantes do 6º Campeonato Bancario de Atletismo


...................................................................................................................................................92

Imagem 14. A turma dos bancários paulistas que venceu no Rio..............................................93

Imagem 15. Fundação da Federação Brasileira Bancaria de Esportes......................................95

Imagem 16 – Time do Satelite para o campeonato de 1938....................................................103

Imagem 17. Festa junina no novo bar do Martinelli................................................................105


LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Média salarial nos bancos.........................................................................................32

Tabela 2. Custo de vida na cidade de São Paulo........................................................................34


LISTA DE MAPAS

Mapa 1. Localização das sedes da Associação entre 1930 e 1944............................................45

Mapa 2 – “Triângulo”...............................................................................................................64
LISTA DE ABREVIATURAS

A.C.E.A. – Associação Comercial de Esportes Athleticos

A.P.E.A. – Associação Paulista de Esportes Athleticos

D.E.T. – Departamento Estadual do Trabalho

D.O.P.S. – Delegacia de Ordem Política e Social

F.E.B. – Federação Esportiva dos Bancários

F.P.A. – Federação Paulista de Athletismo

I.A.P.B. – Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários

L.A.F. – Liga Amadora de Futebol

L.B.E.A. – Liga Bancária de Esportes Athleticos

L.P.F. – Liga Paulista de Futebol


SUMÁRIO

Introdução....................................................................................................................................17

1. Os bancários, sua associação e seu universo esportivo...............................................................32


2. Entre os campos e as páginas do jornal.......................................................................................51
3. As cisões no interior da categoria e seus reflexos políticos e esportivos.............................................63
4. A socialização através do esporte...............................................................................................84
Considerações finais..................................................................................................................108
Fontes........................................................................................................................................111
Referências Bibliográficas........................................................................................................117
Apêndice I – Lista de clubes e bancos......................................................................................122
Anexo I – Tabela de conjuntura e ações do sindicato...............................................................123
17

Introdução

Nas últimas duas décadas o futebol como objeto das Ciências Humanas vem
ganhando espaço e consistência, porém, os objetos privilegiados são geralmente os ligados ao
futebol oficial, que constituíram o Brasil como o país do futebol. Outros lugares de prática,
como a várzea ou o futebol praticado pela classe trabalhadora suscitaram pouco interesse até o
momento3.

As pesquisas que tratam do início do desenvolvimento do jogo de bola no Brasil4


comumente dividem a história deste esporte em três momentos: o primeiro diz respeito à sua
chegada no final do século XIX até meados dos anos 1910, no qual ele estaria restrito às elites,
e por isso apenas praticado nos principais clubes das grandes cidades; o segundo é o que vai até
o final dos anos 1920, entendido como um momento de aproximação de outras camadas sociais,
sendo marcado pelo impulso de exclusão de negros e pobres que começavam a se envolver com
o jogo; o terceiro momento alude ao futebol praticado a partir da década de 1930, no qual houve
a efetivação da inclusão dos negros nos campos de futebol, concretizando-se o que Mario Filho
chamou de “ascensão do negro”5. No entanto, essa periodização vem sendo questionada por
trabalhos mais recentes6, pois, centrada nos grandes clubes, nas grandes ligas e associações, e
nos grandes sujeitos, ela não leva em conta “outras possibilidades de percepção desse processo
por parte daqueles que eram alvos”7 da exclusão da prática nesses ambientes.

Ao dedicarem-se especificamente ao segundo e ao terceiro momentos, isto é,


meados dos anos 1920 e anos 1930 – período para o qual nos propomos a olhar neste trabalho

3
ARAÚJO, José Renato de Campos. Prefácio. In: SILVA, Diana Mendes Machado da, Futebol de várzea em
São Paulo: a Associação Atlética Anhanguera (1928-1940), 1. ed. São Paulo: Alameda, 2016.
4
Como exemplo dessas pesquisas podemos citar: DAMATTA, Roberto, Universo do futebol: esporte e
sociedade brasileira, Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1982; ANTUNES, Fatima M. R. F., Futebol de Fábrica em
São Paulo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1992; SOARES, Antônio Jorge, História e invenção de
tradições no campo do futebol., Estudos Históricos, v. 13, n. 23, p. 119–146, 1999; HELAL, Ronaldo; SOARES,
Antônio Jorge; LOVISOLO, Hugo, A invenção do país do futebol: mídia, raça e idolatria, Rio de Janeiro:
Mauad, 2001; LOPES, José Sergio Leite, Classe, etnicidade e cor na formação do futebol brasileiro., in:
BATALHA, Claudio H. M.; SILVA, Fernando Teixeira da (Orgs.), Culturas de Classe, Campinas: Editora da
Unicamp, 2004, p. 121–166; FILHO, Mario, O Negro no Futebol Brasileiro, 5a edição. Rio de Janeiro: Mauad,
2010.
5
FILHO, O Negro no Futebol Brasileiro.
6
Como exemplo dessas pesquisas podemos citar: PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda, Footballmania: uma
história social do futebol no Rio de Janeiro, 1902-1938, Rio de Janeiro, RJ, Brasil: Editora Nova Fronteira,
2000; FONTES, Paulo; HOLLANDA, Bernardo Borges Buarque de (Orgs.), The country of football: politics,
popular culture and the beautiful game in Brazil, London: Hurst, 2014; GAMBETA, Wilson, A bola rolou: o
Velódromo Paulista e os espetáculos de futebol (1895-1916), São Paulo: Editora Sesi-SP, 2015; SILVA,
Futebol de várzea em São Paulo.
7
PEREIRA, Footballmania, p. 15.
18

– a maioria dos autores trata o futebol de forma dicotômica, como sendo “espetáculo ou
estratégia de controle corporal. Um meio de ganhar dinheiro ou uma diversão fortuita para
privilegiados”8. Raramente o jogo é tratado como, por exemplo, um meio de ganhar dinheiro e
uma diversão fortuita não apenas para privilegiados. O que percebemos ao estudar o assunto é
que o alerta de Leonardo Pereira9 de que é necessário “deixar de lado a tentativa de construir
uma história do jogo somente pela lógica daqueles que tentavam utilizá-lo como meio de levar
aos trabalhadores os seus próprios projetos”, apesar de feita há algum tempo, só muito
recentemente vem sendo levada adiante.

Como já dito, os trabalhos geralmente se dedicam ao futebol praticado nos grandes


clubes. Quando se voltam para o jogo praticado longe dos espaços oficiais, tendem a olhar para
ele como uma forma de controle social – imposto pela elite de modo a entreter uma massa
uniforme, ou controlar e disciplinar o tempo de lazer dos trabalhadores, em uma política
paternalista10; como uma forma de propaganda governamental – muito utilizada pelo Estado
Novo, quando o “Conselho Nacional de Desportos ditava os modelos dos estatutos, que deveria
ser acatado por clubes de todo o país”11; como forma de ascensão social12, já que oferecia um
bom emprego aos operários jogadores13; ou ainda como “ópio do povo” - análise muito ligada
às ideias de anarquistas e comunistas dos anos 1920 e 1930 de que o futebol era utilizado pela
elite como forma de controle da classe trabalhadora14.

Por muito tempo as interpretações históricas tenderam a valorizar os homens que


de maneira mais visível haviam feito a história. Depois, voltaram seu olhar para as evoluções
maciças e anônimas, pensando-as como grandes arranjos anônimos, que podiam ser chamados
de Estado, modernização, industrialização etc. Inclinaram-se, então, a procurar indivíduos que
tivessem se oposto às grandes transformações, empenhando-se em se contrapor a elas. Isso
explica por que, nos últimos 40 anos, a intelectualidade foi se entusiasmando “pelos marginais,

8
MELO, Victor Andrade de, Introdução, in: GOMES, Eduardo de Souza; PINHEIRO, Caio Lucas Morais (Orgs.),
Olhares para a profissionalização do futebol: Análises Plurais, Rio de Janeiro: Editora Multifoco, 2015, p. 26.
9
PEREIRA, Footballmania, p. 280.
10
FONTES, Paulo, Futebol de Várzea and the Working Class: Amateur Football in São Paulo, 1940s – 1960s, in:
FONTES, Paulo; HOLLANDA, Bernardo Buarque de (Orgs.), The country of football: politics, popular culture
and the beautiful game in Brazil, London: Hurst & Company, 2014.
11
ANTUNES, Futebol de Fábrica em São Paulo, p. 37.
12
ROSENFELD, Anatol, Negro, Macumba e Futebol, Edição: 1a. Campinas, SP: Perspectiva, 1993 entende que
o futebol abriu possibilidade de ascensão econômica para a primeira geração de praticantes, gerando efeitos sociais
apenas em seus descendentes.
13
JACKSON, Gregory E., Malandros, "Honourable Workers‟ and the Professionalisation of Brazilian Football,
1930-1950, in: FONTES, Paulo; HOLLANDA, Bernardo Buarque de (Orgs.), The Country of Football: politics,
popular culture the beatiful game in Brazil., Londres: Hurst & Company, 2014, p. 41–66.
14
“Esse tipo de abordagem pode ser encontrada em Futebol: Ideologia do poder, de Roberto Ramos, onde o esporte
é analisado como um aparelho ideológico do Estado.” ANTUNES, Futebol de Fábrica em São Paulo, p. 8.
19

pelos rejeitados, pelos alternativos da história, pelos bandidos sociais e as bruxas, os


heterodoxos e os anarquistas, os excluídos de todo tipo”15. No entanto, como alertou Jacques
Revel, esta é ainda uma forma de reconhecer a realidade maciça do poder, “já que apenas uma
minoria dispersa de heróis tinha sido capaz de se levantar contra el[e], a partir de fora e sem
uma esperança verdadeira”16. Os estudos sobre futebol não ficaram alheios a essas tendências.
Muitos dos trabalhos sobre o tema tratam dos “excluídos” do futebol oficial como “grandes
arranjos anônimos” ou como “uma minoria dispersa de heróis”.

Dentre as interpretações já feitas sobre o futebol estão as de que ele teria sido
utilizado pela elite como forma de tentar manter o povo sob controle, ou ainda que teria trazido
para a classe trabalhadora uma nova forma de ascensão social, ainda que restrita, além de ser
uma maneira de a elite se manter como nos velhos tempos da pré-abolição, em que negros e
brancos pobres eram utilizados como “pé de obra” dos clubes de espetáculo, ficando reféns de
um sistema patronal que criou grandes relações de dependência17.

No entanto, à luz das interpretações já feitas sobre o jogo e sua utilização pela e
para a classe popular, achamos necessário compreendê-lo de maneira menos unilateral, olhando
para o modo como esses sujeitos vivenciavam e representavam o esporte, tentando acessar suas
formas de apropriação e ressignificação do jogo. Da mesma forma que se pode afirmar que
“nem todos os futebolistas ricos tinham como sonho jogar nos espetáculos”18, também deve
haver possibilidade de avaliar que alguns dos praticantes da classe trabalhadora também não o
tinham. O futebol poderia ser, para esses sujeitos, apenas uma forma de ocupação do tempo
livre, se mostrando uma boa maneira de socialização entre pares. Talvez nem fosse necessária
a prática do jogo. Apenas a frequência aos campos poderia ser suficiente para que o jogo tivesse
alguma importância na vida daquelas pessoas.

A partir da análise do cotidiano da vida em São Paulo é possível perceber como as


atividades esportivas eram difundidas. As primeiras décadas do século XX apresentam um
aumento substancial no número de colunas esportivas nos jornais, que aos poucos vão ganhando
páginas inteiras dedicadas aos esportes. O futebol era, sem dúvida, o mais difundido deles. Os
cronistas esportivos se utilizavam das páginas dos jornais para noticiar os acontecimentos e
resultados dos jogos, principalmente daqueles realizados pela Liga Amadora de Futebol

15
REVEL, Jacques, Jogos de escalas: a experiencia da microanalise, Rio de Janeiro (RJ): Editora Fundação
Getúlio Vargas, 1998, p. 29.
16
Ibid.
17
JACKSON, Malandros, "Honourable Workers‟ and the Professionalisation of Brazilian Football, 1930-1950.
18
GAMBETA, A bola rolou, p. 190.
20

(L.A.F.), Liga Paulista de Futebol (L.P.F.) e Associação Paulista de Esportes Atléticos


(A.P.E.A.). Os jogos não vinculados a essas associações esportivas tinham maior ou menor
destaque na mídia, a depender do jornal e de quem eram os sujeitos que o praticavam.

Ao buscarmos por um futebol praticado longe das grandes praças esportivas nos
deparamos com a Liga Bancária de Esportes Atléticos (L.B.E.A). Os bancários formavam uma
categoria bastante numerosa nos anos 1930. Em 1931, um levantamento realizado pela
Associação dos Funcionários de Banco do Estado de São Paulo19 mostrou que havia na cidade
2629 bancários20, sendo que 1459 deles faziam parte da Associação21. Em 1943 ela já contava
com 3011 associados22. O modo como se viam, como mais ou menos próximos de outras
categorias de trabalhadores, variou durante os anos de 1929 e 1945 – período que o presente
trabalho aborda – mas durante todo esse tempo eles se viam como trabalhadores. Eram, em suas
palavras, “operários da casaca”, que tinham condições de trabalho ruins e recebiam pouco pelo
trabalho realizado e para a manutenção do padrão de vida que deveriam aparentar ter. Porém,
eram vistos pela sociedade como uma classe privilegiada, já que recebiam mais do que a média
salarial da cidade e pareciam sustentar um bom padrão de vida. Owensby, ao analisar a
formação da classe média no Brasil entre os anos de 1920 e 1950 afirma ter havido um esforço
das associações de classe dos “colarinhos brancos” em frisar uma fronteira entre eles e os
trabalhadores manuais. Teria sido nesse momento, portanto, que essas associações localizaram
esses funcionários em uma nova taxonomia de classe, a classe média23. No entanto, no que se
refere à associação dos bancários, é difícil fixar o momento em que essa fronteira começa a ser
delineada. Ao contrário, o que verificamos é a existência de uma linha bastante tênue entre a
vinculação com trabalhadores manuais e a vinculação com trabalhadores não manuais. Ela
dependia, em muitos casos, de qual era a reivindicação da categoria e de que maneira essa
reivindicação era feita. Um exemplo disso pode ser a realização da greve de 1934, em defesa
da criação do Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários – IAPB (forma de
reivindicação consagrada pelos trabalhadores manuais), e a negociação diretamente com os
bancos pelas duas horas de almoço em 1932. Ambas as reivindicações tiveram êxito, porém

19
A Associação teve diversos nomes durante o período estudado. Trataremos melhor da questão de nomenclatura
no capítulo 1. Nesse momento faz-se necessário apenas dizer que nos referiremos à Associação de maneira
diferente conforme sua nomenclatura se alterava nas fontes no decorrer do tempo.
20
Estatistica dos Bancarios de São Paulo, Vida Bancaria, 81. ed. p. 2, jul. de1931.
21
R.R., Quantos somos?, Vida Bancaria, 83. ed. p. 1, set. de 1931.
22
Quantos somos?, Folha Bancária, 16. ed. p. 2, mar. de 1943.
23
OWENSBY, Brian P., Intimate Ironies: Modernity and the Making of Middle-Class Lives in Brazil, Edição:
1. Stanford, Calif: Stanford University Press, 1999, p. 48.
21

contaram com formas reivindicatórias que colocavam os bancários ora mais próximos dos
trabalhadores manuais, ora mais próximos de trabalhadores não manuais.

Segundo Williams24, a associação entre o termo trabalhador e a “classe


trabalhadora” já era forte na década de 1880, mas a definição incluiria contrato com empregador
e trabalho manual. Porém, com o desenvolvimento das funções de escritório houve uma
ambiguidade no que se refere à posição dos que trabalhavam por salário, mas não realizavam
trabalho manual. Eles poderiam ser – e muitas vezes foram – caracterizados como “classe
média”. O termo, referindo-se àqueles que ganham salários, é “uma expressão de posição social
relativa e, portanto, de distinção social”25. Já o termo “classe trabalhadora”, a partir de uma
noção de classe produtiva, é uma expressão de relações econômicas. Os dois termos, desse
modo, se apoiam em modelos diferentes. Um grupo, ao se definir como classe média, mostra
ter consciência de sua posição social relativa, de certa distinção social, porém, quando esse
mesmo grupo se encontra no interior de uma relação econômica em que depende de seu
trabalho, há um ponto crítico de sobreposição dos termos, podendo haver confusão entre eles.
No entanto, “é absurdo supor que só as classes trabalhadoras trabalham, mas se aqueles que
realizam trabalhos outros que não o manual se descrevem em termos de posição social relativa
(classe média), a confusão é inevitável.”26

Não foram poucos os pesquisadores que se debruçaram sobre o problema de


definição da “classe média”. Ele não é, no entanto, ponto pacífico entre os estudiosos do tema.
Wright Mills27, ao analisar a formação da nova classe média nos Estados Unidos no início do
século XX olha não apenas para questões econômicas, mas também psicológicas e sociais.
Segundo ele, constituem a chamada “nova classe média” americana funcionários que recebem
seu salário por mês, em contraste com os que recebem por hora ou dia trabalhado; que
conseguem algum status social a partir de seu trabalho, e que utilizam roupas de passeio no
local de trabalho. A esses funcionários Mills chamou de “colarinhos brancos”. As três
características apresentadas se complementam para a formação do que ele entende por um
funcionário de “colarinho branco”. O status social que consegue através do trabalho estaria
ligado ao fato de receber por mês, e, portanto, de conseguir se diferenciar de outro tipo de
trabalhador, o que recebe por dia ou hora. Ainda o fato de utilizar roupas de passeio traz a esse

24
WILLIAMS, Raymond, Palavras-chave um vocabulário de cultura e sociedade, São Paulo: Boitempo, 2007,
p. 91.
25
Ibid., p. 92.
26
Ibid.
27
MILLS, C. Wright, A nova classe média (White Collar), 3. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.
22

trabalhador mais status, já que, novamente, não será confundido com o operário. No entanto, a
possibilidade de utilização de vestimenta de passeio só é possível pois se exerce uma profissão
que garante status social. É uma via de mão dupla. Esses trabalhadores de “colarinho branco”
passaram a ser vistos pela sociedade de maneira diversa de outros tipos de trabalhadores, mas
também se enxergavam como diferentes deles. Eles possuíam outros anseios, outras
perspectivas e outro status.

Décio Saes faz observações importantes sobre pontos que podem ser levantados
para a definição de quais indivíduos integrariam a “classe média”. Seriam os que exercem
trabalhos improdutivos, ou seja, trabalhos que não contribuem diretamente com a produção de
mercadorias28. A definição passaria ainda pela execução de trabalhos não-manuais em
contraposição aos que exercem trabalhos manuais. Para o autor a distinção entre esses dois tipos
de trabalho teria criado na sociedade capitalistas grupos médios e uma consciência média,
diferente da consciência operária29.

Jürgen Kocka, por sua vez, afirma que a linha que difere operários de empregados,
o que ele chamou de “collar line” é mais historicamente condicionada e culturalmente variada
do que os estudos sociológicos podem demonstrar. Para ele, a origem da distinção entre
operários e empregados está na origem do sistema capitalista industrial. Por isso, seria preciso
um estudo comparativo entre sociedades em estágios similares de desenvolvimento industrial
para compreender a linha de separação entre eles30. Kocka defende ainda que a inclusão de
grupos tão diferentes no mesmo lugar de “classe média baixa” aconteceu por causa da
necessidade dos contemporâneos de preencher um vazio existente na polarização da sociedade
em dois campos hostis, burguesia e proletariado. Assim, os sujeitos que não pudessem ser
classificados em nenhum dos campos ganhariam o status de “classe média”. No entanto, essa
polarização não teria sido completa e a classificação de grupos tão diversos entre si como num
mesmo estrato social seria errônea31.

Para Owensby a classe média se caracterizaria por um estado mental orientado pela
dinâmica social e pela ordem econômica. Ela seria caracterizada por pessoas que “se
preocupavam com pequenas rendas [e] demandavam um status respeitável e que trabalhavam
duro por uma boa educação para que tivessem sucesso por seu próprio mérito e ainda assim

28
SAES, Décio, Classe méda e sistema político no Brasil, São Paulo: T. A. Queiroz, 1984, p. 8.
29
Ibid., p. 12.
30
POPINIGIS, Fabiane, Proletários de Casaca: Trabalhadores do Comércio Carioca, Edição: 1. Campinas,
SP, Brasil: Editora da Unicamp, 2007, p. 48–49.
31
Ibid., p. 49.
23

procuravam assiduamente por relações de patronagem”32, e formada por trabalhadores dos mais
variados tipos, de literatos chefes de família a guarda-livros e funcionários do comércio,
passando pelos profissionais liberais. Uma das maneiras que essas pessoas adotavam para se
distinguir socialmente dos trabalhadores manuais era a educação. Isso explicaria a profusão de
cursos noturnos e por correspondência em São Paulo e no Rio de Janeiro entre os anos de 1930
e 1940. A ida à escola e a posse do diploma podiam fazer com que os colarinhos brancos se
sentissem “‘civilizados’ de uma forma que os trabalhadores manuais não eram”33. O diploma
seria, assim uma forma de demonstração de qualificação social e status. Esse desejo pela cultura
explica ainda a criação de cursos de humanidades, de bibliotecas, salas de aula e teatros no
interior das associações de classe nesse período34. Em síntese, pode-se dizer que faziam parte
da classe média pessoas “que temiam as classes mais baixas, desconfiavam da elite e ainda
esperavam que a moralidade pudesse ancorar a ordem social.”35

Fabiane Popinigis, ao se debruçar sobre a vida e organização dos trabalhadores do


comércio carioca no início da República, argumenta que eles formavam uma categoria de
empregados cujas funções eram intelectuais e que possuíam uma identidade de classe, ainda
que dentro dos empregados no comércio houvesse desde os caixeiros de botequins até os
empregados em lojas de roupas importadas. Eles construíram sua luta política através de sua
identidade de classe apesar de estarem subdivididos em categorias específicas, que tinha
particularidades de hierarquia, função, sociabilidade e nas escolhas de lazer 36. Ela demonstra
que os trabalhadores do comércio formavam um grupo tão heterogêneo que possuíam diferentes
periódicos e sindicatos para reivindicar suas demandas37.

Assim como os funcionários do comércio analisados por Popinigis, os bancários


também formavam uma categoria com cultura e estilo de vida próprios. Eles tinham gostos
específicos pelo vestir, pela mobília e decoração, uma forma de organização política específica,
preferências por maneiras de se sociabilizar e, é claro, preferências para a ocupação do tempo
livre.

Muitas vezes dentro do material analisado, os bancários se autodenominaram como


“classe dos bancários”. Eles eram, de fato, membros de uma mesma categoria de trabalhadores

32
OWENSBY, Intimate Ironies, p. 9 Tradução nossa.
33
Ibid., p. 52 Tradução nossa.
34
Ibid., p. 59 Tradução nossa.
35
Ibid., p. 9 Tradução nossa.
36
POPINIGIS, Proletários de Casaca, p. 23.
37
Ibid., p. 43.
24

que buscava se definir, ou se classificar, de maneira a encontrar seu lugar na sociedade


paulistana. Começavam, naquele momento, a formar uma identidade e uma cultura de classe.
Se identificavam como pertencentes a uma mesma realidade – a dos trabalhadores bancários –
que tinham em comum condições de vida social, cultural e economicamente parecidas. Isso
significa que além do local de trabalho, essas pessoas compartilhavam outros lugares de
encontro na cidade: o bonde, o café, o estádio de futebol, o salão da associação.
Compartilhavam ainda gostos, seja pela literatura, por artigos importados, pela música da moda,
pelo que fazer durante o tempo livre. Enfim, compartilhavam a experiência, essa categoria que
compreende a resposta mental de grupos ou indivíduos aos acontecimentos que interferem em
seu mundo38. Esse compartilhamento da experiência fazia com que eles formassem uma
identidade e cultura em comum.

Pensando na existência dessa cultura em comum, o que pretendemos é compreender


como o fenômeno esportivo se torna parte dela e de que maneira ajuda a forjá-la. Para responder
a essas questões acreditamos ser necessário olhar para a forma como essa classe representava e
geria o esporte tanto dentro da Associação como nos clubes. Desse modo, o que se pretende
fazer é uma história que encare o esporte como parte integrante da cultura dos trabalhadores
bancários.

*****

A Associação dos Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo foi fundada em


1923, e em 1929 foi criada a Liga Bancária de Esportes Atléticos, que tinha por finalidade
organizar e gerir os esportes praticados pelos bancários, realizando campeonatos esportivos.
Muitas notícias sobre os resultados dos seus jogos e campeonatos eram veiculadas nos jornais
de grande circulação da cidade, o que dá indícios de que ela possuía alguma relevância no meio
esportivo paulista, mesmo não fazendo parte do circuito esportivo oficial.

A fim de compreender o modo como essa classe enxergava, vivenciava e


representava o esporte foram analisados os jornais da Associação entre 1929 e 194539. Através
deles foi possível acompanhar as mudanças na política da Associação e nas suas formas de
atuação, além de permitir perceber as lutas travadas pelos bancários através dela. A partir disso

38
THOMPSON, E. P., A miséria da Teoria ou um planetário de erros - Uma crítica ao pensamento de
Althusser, 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981, p. 15.
39
O jornal muda de nome nesse período. Entre a fundação da Associação, em 1929 e setembro de 1939, se chamou
“Vida Bancária”. Depois disso, por causa da união com o Syn-Dikê (outro sindicato de bancários fundado em São
Paulo em 1935), os órgãos dos dois sindicatos são unificados, e o jornal passa a se chamar “Folha Bancária”. Mais
informações sobre esse acontecimento serão dadas no capítulo 1.
25

conseguimos analisar em que momentos o esporte aparecia com maior ou menor centralidade
dentro de suas políticas, como ela o utilizava, sua relação com a Liga Bancária de Esportes
Atléticos e até mesmo com algumas federações esportivas.

O acesso aos jornais se deu através de uma visita à sede do Sindicato dos Bancários
e Financiários de São Paulo Osasco e Região. O que buscávamos a princípio eram as atas das
reuniões da diretoria da Associação, que foram pesquisadas por Leticia Bicalho Canêdo40 e
Liraucio Girardi Junior41 em seus trabalhos sobre o sindicalismo bancário. Localizado no
Centro de Documentação e Memória dos Bancários (Cedoc-Bancários), o rico acervo do
Sindicato passou por digitalização e sua ordem inicial foi alterada. A empresa responsável pela
digitalização da documentação o deixou sem ordem, e, no momento da visita, devido à falta de
funcionários, ele ainda esperava por organização. A busca foi iniciada nos arquivos
digitalizados, porém, com o arquivo físico tão próximo e à disposição, pareceu mais fácil – e
mais prazeroso – lidar com ele. As visitas ao acervo foram intensas. Uma semana, das 9 horas
às 17 horas, com uma pequena pausa para o almoço. Conforme os dias foram passando, a
desorganização do arquivo e a falta de resultados começou a pesar. As atas buscadas não
poderiam estar ali. Continuando a busca, muitos documentos interessantes foram encontrados.
A história dos bancários se passava diante dos olhos, mas não havia sinal da história dos
esportes bancários. Já sabíamos que eles tinham alguma projeção nos meios esportivos da
cidade através do contato com os periódicos de grande circulação. E tínhamos conhecimento
da seção de esportes no jornal da Associação42. Se havia alguma forma de contar aquela história,
ela era através dos jornais. Eles são, de fato, fontes privilegiadas para dar conta do cotidiano
das pessoas, e são muito utilizados nas pesquisas sobre esporte43.

Porém, não desistimos da busca às atas da diretoria. Entramos em contato com os


pesquisadores que tiveram acesso a elas, e eles confirmaram o acesso. Eram livros
encadernados, escritos a mão, e bastante detalhados. Mas não estavam no acervo do Sindicato.
O bibliotecário responsável pelo Cedoc dizia nunca ter visto os livros, e, apesar dos esforços e

40
CANEDO, Leticia Bicalho, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, Dissertação de Mestrado,
Departamento de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São
Paulo, São Paulo, 1977.
41
GIRARDI JR., Liraucio, Classe média, meritocracia e situação de trabalho: o sindicalismo bancário em
São Paulo (1923-1944), Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e
Ciências Humanas, Campinas, SP, 1995.
42
Os jornais estão todos digitalizados e disponíveis no site do Cedoc-Bancários: https://spbancarios.com.br/cedoc
43
HOLLANDA, Bernardo Borges Buarque de; MELO, Victor Andrade de (Orgs.), O esporte na imprensa e a
imprensa esportiva no Brasil, [Rio de Janeiro, Brazil] : Rio de Janeiro, RJ: FAPERJ ; 7 Letras, 2012.
26

de sua ajuda, não conseguimos localizá-los. Aceitar a perda dessa documentação talvez tenha
sido uma das partes mais difíceis da pesquisa. Mas era preciso seguir adiante.

Entramos em contato com três clubes bancários ainda em atividade em São Paulo.
Na visita à Associação Atlética Banco do Brasil- São Paulo (A.A.B.B.- São Paulo) encontramos
a ata de fundação do clube, em 1935, e o livro de atas da diretoria a partir da década de 1940.
Os primeiros cinco anos de registros haviam sido perdidos pelo clube. Havia ainda dois grandes
livros com fotografias, que davam conta de boa parte da história da associação. Em algum
momento, na ânsia de organizar as fotografias, alguém as colou nos livros, e suas informações,
anotadas no verso, ficaram perdidas. Após contato com o presidente do Satélite Esporte Clube
para pedir autorização para realizar a pesquisa no clube, tivemos acesso a todo o material
disponível na sede de São Paulo, porém, foram encontrados apenas documentos referentes à
história recente do clube. Novamente o sentimento de frustração nos abatia. Em conversas com
o funcionário responsável, ele sempre dizia que havia uma “salinha” na qual poderia ter alguma
coisa, mas o acesso a ela nunca acontecia, até que um dia um funcionário da limpeza a abriu.
Era a sala onde guardava-se materiais de limpeza. Ali, na prateleira de baixo dos desinfetantes,
estavam as caixas com os livros ata do clube. Finalmente um momento de alegria, permeado
pelo pensamento sobre como nossa sociedade lida mal com a gestão da memória histórica. O
contato com o Esporte Clube Banespa, apesar dos esforços envidados, se mostrou
completamente infrutífero. Não teríamos acesso aos seus arquivos. Novamente era preciso
aceitar e seguir com o que tínhamos: os jornais da Associação, os periódicos da grande
imprensa, as poucas atas da A.A.B.B. e as atas do Satélite.

O acesso a essa documentação permitiu que se enxergasse a forma como os clubes,


e não mais a Liga Bancária, entendiam o esporte, ou seja, qual era o significado dos esportes e
da prática esportiva, notadamente do futebol – esporte central de um dos clubes analisados –
para os atletas e dirigentes dos clubes. Entender a organização desses clubes ajudou a perceber
um pouco melhor como os funcionários do Banco do Brasil se utilizavam de seu tempo livre.
Em outras palavras, ajudou-nos a apreender as experiências desses agentes. Mas há algo a mais
que deixa o olhar sobre esses clubes interessante. Eles são compostos por funcionários do
mesmo banco: o Banco do Brasil. Mas por que, então, havia dois clubes que representavam
esse mesmo banco? Esse era um caso isolado na Liga44. Apenas o Banco do Brasil tinha dois

44
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944 afirma que havia outros bancos com mais de
um clube, mas não apresenta seus nomes. Em nossa pesquisa documental não foram encontrados outros casos além
do do Banco do Brasil. Pode ser que, se houvesse outros clubes de mesmo banco, eles não fossem filiados à Liga
Bancária.
27

clubes filiados, que participavam do campeonato e se enfrentavam. O que teria levado os


funcionários desse banco a se dividirem em clubes diferentes, se trabalhavam no mesmo
estabelecimento bancário? Essa questão era instigante. Para respondê-la, seria preciso
compreender o momento histórico no qual o episódio se deu e a organização dos bancários
naquele momento.

*****

O primeiro governo Vargas (1930-1945) foi um período de intensas mudanças


políticas e sociais no Brasil. Esse período teve diversas interpretações historiográficas. A mais
comum talvez seja a de que ele foi marcado pela prática do populismo, resultado da propaganda
política e da repressão social. Segundo essa interpretação a repressão política se dedicou a
eliminar os setores mais combativos da classe, minando as bases de um sindicalismo mais
avançado. De outro lado, a propaganda voltou seus esforços para os trabalhadores que não
tiveram acesso ao movimento sindical, inculcando em suas mentes crenças e valores baseados
na mentira. Nesse cenário os trabalhadores brasileiros do período tiveram acesso à direitos
sociais, mas não a direitos políticos, trocando benefícios de legislação por submissão política.
Aqui, são levadas em conta apenas questões econômicas, olhando-se para os cálculos utilitários
feitos pela classe trabalhadora. Outra interpretação sobre o período é a que destaca o teor
totalitário do regime. Essa interpretação multiplica a capacidade de repressão do Estado e
amplia ao máximo a eficácia da propaganda política, aproximando o governo Vargas dos de
Hitler e Stalin.45

Há ainda uma terceira via interpretativa que deve ser destacada: ela afirma que
a aceitação dos trabalhadores ao novo regime se deu na forma de pacto. Segundo essa
interpretação o governo criou uma série de políticas públicas voltadas para o trabalhador,
iniciando uma nova forma de relação entre Estado e classe trabalhadora. Ela não nega os
cálculos utilitários feitos pela classe trabalhadora, mas inclui no escopo de dimensões a serem
analisadas a política e a cultural. Assim, a simples troca de obediência política por legislação
social não basta para compreender o período. Para Angela de Castro Gomes, o Estado resgatou
os valores e a imagem do trabalhador vigentes durante a Primeira República, deu-lhes novos
significados, e apresentou-os como seus.

A classe trabalhadora, por conseguinte, só “obedecia” se por obediência política ficar


entendido o reconhecimento de interesses e a necessidade de retribuição. Não havia,

45
FERREIRA, Jorge Luiz, Trabalhadores do Brasil: o imaginário popular (1930-1945), Rio de Janeiro:
7Letras, 2011.
28

neste sentido, mera submissão e perda de identidade. Havia pacto, isto é, uma troca
orientada por uma lógica que combinava os ganhos materiais com os ganhos
simbólicos da reciprocidade, sendo que era esta segunda dimensão que funcionava
como instrumento integrador de todo o pacto46.

Ou seja, não havia conformismo com a situação política ou social vivida pela
classe trabalhadora. Jorge Ferreira mostra, através das cartas escritas por pessoas comuns para
Getúlio Vargas, que o aparente conformismo demonstrado nas solicitações feitas por aquelas
pessoas ao presidente era na verdade uma estratégia para alcançarem seus objetivos. Ao
manipularem o “arcabouço doutrinário e prático do Estado varguista, selecionavam aquilo que
poderia beneficiá-los – a legislação, os discursos sobre a família, o trabalho, o progresso, o
bem-estar etc. – e deixavam de lado todo o aparato autoritário, repressivo e excludente”47, mas
isso não significa que desconheciam esse aparato. Porém o limite da crítica era a contestação e
negação das regras autoritárias. Ou seja, aceita-se para poder avançar na conquista de
objetivos48.

É nesse cenário político que o presente trabalho está inserido. O recorte temporal
adotado é composto pelos anos entre 1929 e 1945, abrangendo, então, todo o primeiro governo
Vargas. Contudo não se trata aqui de uma periodização externa ao objeto, com uma delimitação
marcada exclusivamente por uma história política, mas sim a adoção da data inicial a partir do
momento de fundação da Liga Bancária de Esportes Atléticos. A adoção do ano de 1945 como
final se explica pelo fato de ser nesse momento que as tensões entre os clubes analisados
(A.A.B.B.-São Paulo e Satelite) se apaziguam, sendo possível observar como o fenômeno
esportivo ajudou na consolidação de uma cultura comum aos bancários.

Podemos dizer, então, a título de síntese, que a problemática em torno da qual o


presente trabalho gira é a de compreender o modo como o futebol em particular, e os esportes
de maneira geral, se tornaram parte de uma cultura comum dos bancários, ajudando na sua
formação. O que se pretende, dessa forma, é fazer uma história do futebol, que consiga enxergar
e compreender como o jogo se desenvolveu, ao mesmo tempo em que volta seu olhar para a
identidade e a cultura de uma categoria de trabalhadores.

Durante o primeiro governo Vargas houve uma sistemática aproximação entre


Estado e esportes. Foi nesse momento – notadamente durante o Estado Novo – que o Estado
passou a geri-los mais de perto, criando uma série de legislações que incidiam sobre esse objeto.

46
GOMES, Angela de Castro, A Invenção do Trabalhismo, 3. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005, p. 195.
47
FERREIRA, Trabalhadores do Brasil: o imaginário popular (1930-1945), p. 43.
48
FERREIRA, Trabalhadores do Brasil: o imaginário popular (1930-1945).
29

Essa aproximação tem como justificativa adequar as práticas esportivas à ideologia do regime.
Devido à incapacidade do mundo esportivo de conter a indisciplina em campo, houve a
construção de um sistema jurídico esportivo que tinha como base o Direito Penal49. Foi também
nesse momento que o futebol foi utilizado para ajudar na construção da imagem do presidente
Getúlio Vargas, bem como na criação de uma identidade nacional. Vargas utilizava os estádios
de São Januário, no Rio de Janeiro, e do Pacaembu, em São Paulo, como palco de solenidades
oficiais – notadamente as do Dia do Trabalhador – que reuniam milhares de pessoas
promovendo um congraçamento cívico. As tentativas de criação de uma identidade nacional
tinham como grandes propagandistas cronistas esportivos como Mario Filho e Thomaz
Mazzoni50.

*****

O esporte como parte da cultura da classe trabalhadora já foi visitado por diversos
pesquisadores. É possível, a partir desses estudos, afirmar que ele faz parte da cultura dos mais
diversos trabalhadores ao redor do mundo. Uassyr Siqueira51, ao analisar clubes recreativos de
bairros paulistanos com grande presença operária entre os anos de 1890 e 1920 demonstrou que
muitos desses clubes tinham como objetivo, além da organização dos momentos de lazer dos
trabalhadores, fornecer auxílios diversos para seus sócios. Eles mantinham bibliotecas,
proporcionavam espetáculos, diversões lícitas e aulas que pudessem ser úteis a seus associados.
No entanto, a relação entre esses clubes e os Sindicatos e Ligas Operárias não era pacífica. Os
anarquistas acreditavam que as práticas de lazer difundidas nos bairros operários,
principalmente a dança e o futebol, eram prejudiciais aos trabalhadores e suas lutas. Assim, ao
invés de se juntarem ao redor desses passatempos, eles deveriam ingressar nos seus sindicatos.
A crítica aos clubes recreativos tinha ainda como objetivo evitar a separação entre os sócios,
que era promovida nos clubes por meio de sua hierarquização, divididos entre contribuintes,
honorários e beneméritos.

49
Para saber mais sobre a criação da Justiça Desportiva durante o Estado Novo ver: SOARES, Jorge Miguel
Acosta, Justiça desportiva: o Estado Novo entra em campo (1941-1945), Tese de Doutorado, Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2015.
50
DRUMOND, Maurício, Estado novo e esporte: a política e o esporte em Getúlio Vargas e Oliveira Salazar
(1930 - 1945), Rio de Janeiro, RJ: 7Letras, 2014; COUTO, Euclides de Freitas, Da ditadura à ditadura: uma
história política do futebol brasileiro (1930 - 1978), Niterói: Editora da UFF, 2014; SOARES, Justiça
desportiva: o Estado Novo entra em campo (1941-1945).
51
SIQUEIRA, Uassyr de, Entre Sindicatos, Clubes e Botequins: Identidades, associações e lazer dos
trabalhadores paulistanos (1890-1920)., Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas, Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, 2008.
30

Edivaldo Góis Junior e Carmen Lúcia Soares52 ao analisarem as práticas de


educação física por parte da juventude comunista no Rio de Janeiro durante a década de 1930
afirmam que grupos juvenis vinculados a movimento políticos, como comunistas e integralistas,
buscaram legitimar seus objetivos através das práticas de educação física – por eles entendidas
como práticas ligadas aos esportes, jogos e ginásticas – a fim de fazerem crescer sua influência
sobre grupos formais e informais de jovens atletas. A educação física constituiria, então, “um
espaço de interesse para atuação política”53. Por isso, os comunistas, através do jornal A Manhã,
fomentavam a aproximação com clubes do subúrbio carioca. A discussão sobre amadorismo e
profissionalismo também estava presente, uma vez que eles entendiam que o profissionalismo
– e sua consequente mercantilização de jogadores – dificultaria o acesso popular aos esportes.
Em outros contextos nacionais foram identificadas relações diferentes entre
organizações de trabalhadores e esportes. Na Finlândia houve a criação de uma Federação
Finlandesa de Esportes de Trabalhadores (TUL) em 1919. Ela tinha como objetivo fazer uma
luta no campo da cultura e não uma luta partidária, se colocando contra a Federação Finlandesa
de Ginástica e Esportes (SVUL) e tentando alcançar uma cultura esportiva ideal para os
trabalhadores. Utilizava ainda o esporte como forma de aliviar os problemas físicos e mentais
decorrentes de um trabalho monótono. Os clubes a ela filiados estavam ligados a associações e
sindicatos de trabalhadores. Eles viam no esporte uma forma de atrair mais trabalhadores.
Tinham como objetivos representar a cultura da classe trabalhadora, formar novas tradições, se
diferenciar da cultura burguesa e promover a imagem de um corpo saudável.54

Na Inglaterra, entre meados dos anos 1920 e 1930 houve a criação da British
Workers’ Sports Federation (BWSP), dedicada, como o próprio nome indica, a gerir o esporte
operário no país. Criada por apoiadores do Labour Party, em 1928 passa a ser controlada por
comunistas, que logo entendem a importância do esporte para os trabalhadores. Havia incentivo
ao esporte operário, mas o esporte tido como capitalista não era bem visto, ainda que não haja
formalmente nenhum impedimento em um amante de futebol ser engajado no sindicato do qual
faça parte. Havia campeonatos específicos para esses clubes, e o profissionalismo era

52
GÓIS JUNIOR, Edivaldo; SOARES, Carmen Lucia, Os comunistas e as práticas de educação física dos jovens
na década de 1930 no Rio de Janeiro, Educação e Pesquisa, v. 44, p. 1–20, 2018.
53
Ibid., p. 11.
54
KESKINEN, Lauri, Working-class Sports Clubs as Agents of Political Socialisation in Finland, 1903–1923,
The International Journal of the History of Sport, v. 28, n. 6, p. 853–875, 2011.
31

condenado por ser entendido como uma forma de deixar o trabalhador em situação pior do que
a que se encontrava55.

Olhar para esses trabalhos que tratam de contextos diversos em diferentes lugares
do Brasil e do mundo, em momentos históricos próximos nos ajuda a compreender que há
semelhanças e distinções na forma como o esporte voltado aos trabalhadores foi encarado e
organizado nos diferentes locais, não sendo plausível uma interpretação homogênea que
descreva de forma uniforme a experiência que envolveu as práticas esportivas por parte de
diferentes sujeitos, ainda que em um mesmo recorte temporal.

Por isto, em particular, no tratamento e análise das fontes estudadas a partir das
delimitações desta problematização, optamos em organizar este trabalho da seguinte forma: no
primeiro capítulo, trataremos da estrutura da Associação dos Funcionários de Bancos do Estado
de São Paulo, de quem eram os bancários, da periodização adotada e da Liga Bancária. Do
segundo ao quarto capítulo, trataremos da experiência dos bancários com relação aos esportes
em cada um dos períodos estabelecidos. Assim, no capítulo 2, olharemos para os anos entre
1929 e 1932, que tinha uma visão de esporte muito próxima dos ideais higienistas. Nesse
período o esporte vai ganhando espaço no jornal da Associação e passa a ser discutido como
uma forma de manutenção da saúde, desde que praticado com moderação. No capítulo 3, nos
deteremos aos anos de 1933-1935, momento em que os esportes praticamente desaparecem do
órgão oficial da Associação, e que converge com um momento de maior engajamento político
de suas lideranças. Nesses anos, esporte e política se misturaram de maneira indissociável, e os
resultados da greve de 1934 foram a criação de um outro sindicato e deu uma outra organização
esportiva entre os bancários. No capítulo 4, o foco serão os anos entre 1936 e 1945, em que o
esporte foi visto como forma de entretenimento e congraçamento em um sindicato
corporativista. Aqui, olharemos para os clubes para compreender de que maneira os bancários
se utilizavam de seu tempo livre, com práticas que iam além do esporte, em locais teoricamente
dedicados apenas a ele.

55
JONES, Stephen G., Sport, politics and the labour movement: the British workers’ sports federation, 1923–
1935, The International Journal of the History of Sport, v. 2, n. 2, p. 154–178, 1985.
32

1. Os bancários, sua associação e seu universo esportivo


Os bancários formavam uma categoria bastante numerosa nos anos 1930. Eles eram
divididos, de acordo com suas funções, entre escriturários ou funcionários administrativos e
contínuos. Os primeiros trabalhavam na administração do banco. Eram gerentes, subgerentes,
contadores, procuradores, escriturários, caixas, correntistas etc. Suas funções estavam ligadas
às atividades-fim dos bancos. Já os contínuos eram funcionários do quadro de portaria. Eram
porteiros, vigias, ascensoristas, telefonistas etc. e tinham funções ligadas às atividades-meio das
agências. Eles eram trabalhadores subalternos, e não eram considerados parte do quadro de
funcionários bancários. Mesmo trabalhando nas agências56, recebiam salários diferentes, ainda
que não fosse formalizada a divisão salarial por categoria nos bancos, o que só aconteceria em
1945.

Os salários variavam muito de banco para banco e dentro do próprio banco, como
é possível constatar nas tabelas feitas pela Associação, em meados dos anos 193057 e nos
diversos artigos que tratam das condições de vida dos bancários, além dos referentes à
campanha pelo Salário Mínimo, que teve início em 1934. Várias vezes o salário médio dos
bancários, entre 1933 e 1936 foi apresentado pela Vida Bancária como sendo de 300$000
(trezentos mil réis). Em um número de 1942, tratando da composição salarial média dos
bancários em 1935 e 1941, temos as seguintes cifras58:

Tabela 1 – Média salarial nos bancos

Bancos 1935 1941 Acrescimo


Um grande Banco nacional 612$000 934$000 52%
Um pequeno Banco nacional 532$000 631$000 16%
Um grande Banco extrangeiro 950$000 1:398$000 47%
Um pequeno banco extrangeiro 415$000 864$000 108%

Fonte: MEMOLO NETO, P., Folha Bancária, O salário bancário e a carteira predial do instituto, 10. ed.
p. 12, jun. de 1942.

56
KAMARADA, Vida Bancaria, Julgamento indefinido, 141. ed. p. 2, 20 de abr. de 1935; CANEDO, O
Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 22.
57
As tabelas foram feitas de maneira manuscrita, e apresentam cargo inicial e atual, escolaridade, salário inicial,
atual e anual com gratificações, estado civil, idade, tempo de serviço, número de filhos, número de pessoas que
sustenta, instrução e necessidade de subsistência. CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-
1944, p. 27 as apresenta como se fossem de 1935. GIRARDI JR., Liraucio, Classe média, meritocracia e situação
de trabalho: o sindicalismo bancário em São Paulo (1923-1944), Dissertação de Mestrado, Universidade
Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, SP, 1995, p. 83 as apresenta como
enquete realizada pelo sindicato na Campanha pelo Salário Mínimo, em 1934. As tabelas encontradas no Sindicato
tinham apenas uma anotação de que foram produzidas na década de 1930, sem maiores especificações.
58
Essa é uma média que leva em consideração o salário dos chefes e gerentes, e, por isso, segundo o jornal, é mais
alta do que a realidade da maioria dos funcionários de bancos.
33

Nesse mesmo artigo é apresentada uma estatística feita pelo Ministério da Fazenda
sobre o custo de vida no Rio de Janeiro entre 1912 e 1941. Expõem-se como necessário para a
subsistência de uma família de 7 pessoas o orçamento mensal de 1:828$000 (um conto,
oitocentos e vinte e oito mil réis) para o ano de 1935 e de 2:823$000 (dois contos, oitocentos e
vinte e três mil réis) para 1941. O jornal toma por média uma família de 4 pessoas, e apresenta
os índices médios de 1:040$000 (um conto e quarenta mil réis) para 1935 e 1:600$000 (um
conto e seiscentos mil réis) para 1941 tomando esses números como o mesmo que uma família
de 4 pessoas em São Paulo precisaria para sua subsistência. Em outro artigo, esse de 1938, o
jornal afirma que a média de salário dos funcionários do Banco Commercial do Estado de S.
Paulo era de 400$000 (quatrocentos mil réis), enquanto o presidente ganhava 5:000$000 (cinco
contos de réis) e o superintendente 12:000$000 (doze contos de réis)59. Em 1943 o Salário
Mínimo era de 360 cruzeiros60 e em 1944 o ordenado médio dos bancários de 700 cruzeiros61.
Todos esses números demonstram a dificuldade em definir a média salarial dos bancários e qual
o seu padrão de vida – algo bastante subjetivo, uma vez que é preciso levar em consideração
questões como alimentação, saúde, moradia, vida familiar, utilização do tempo livre, educação
etc., tornando a linha entre padrão de vida e modo de vida bastante tênue62 – porém, é possível
perceber a partir dos dados apresentados que se tratava de uma classe de trabalhadores que
ganhava mais do que o Salário Mínimo do Estado de São Paulo, que, aprovado em junho de
1939 era de 200$000 (duzentos mil réis) para a zona da capital e de 140$000 (cento e quarenta
mil réis) para o interior63.

Olhar para os salários dos bancários do Rio Grande do Sul pode dar margem para
uma comparação interessante quanto aos ganhos dessa classe em outro local que não São Paulo.
Escreve um bancário gaúcho para a Vida Bancária, em 1935:

A maioria dos bancarios desta praça percebe um salario variavel de 150$000 a


300$000 mensais, o qual dá escassamente para as despeças forçadas do mês, visto
como a vida nesta cidade é muito cara.
Há bancários que percebem um ordenado de 1500$000, como um irmão meu que
trabalha no Banco Noroeste, que só se mantem com esse ordenado porque papai lhe
dá pensão, ficando a migalha de 150$000 para comprar roupas, calçados, chapéu, etc.

59
A media dos vencimentos do pessoal do Banco Commercial do Estado de S. Paulo, Vida Bancaria, 172. ed.
p. 1, 25 de mai. de 1938.
60
Operários paulistas reclamam contra a alta do custo de vida, Folha Bancária, 23. ed. p. 3, fev. de 1945.
61
Ao lado da multiplicação dos bancos floresce a miséria dos bancários ..., Folha Bancaria, 21. ed. p. 6, jul. de
1944.
62
THOMPSON, E. P., A formação da classe operária inglesa - A maldição de Adão, 2. ed. São Paulo: Paz &
Terra, 2012, p. 43.
63
Fixado o Salario Minimo para o Estado de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, 21384. ed. p. 7, 17 de jun. de 1939.
34

Eu por exemplo percebo 400$, porque fui aumentado em 50$000 em Junho p. passado,
depois de suar quasi um ano com insistentes reclamações, pois minha despesa forçada
é de 100$000 de aluguel de casa; pago agua, 20$; luz 15$000; armazem de 80$ a
100$; lenha (uma carroça apenas dá para um mês) 24$000; leite, 24$000 (1 litro diario
a 800$); açougue, 25$ compreendendo carne e toucinho, que talvez nem mesmo
25$000 dêem para pagar; padaria, 21$000, farmaria (mês em que pago pouco)
10$000, por cima. [...]64

Percebemos que a média salarial dos bancários no Rio Grande do Sul não diferia
muito da média dos paulistanos e o autor insere um dado interessante em sua narrativa: o custo
de vida. Muito se falou sobre o assunto, principalmente durante a campanha pelo Salário
Mínimo. A tabela abaixo mostra o custo de vida na cidade de São Paulo, para uma família de 5
pessoas, nos anos de 1935, 1939 e 1943, em cruzeiros:

Tabela 2 – Custo de vida na cidade de São Paulo65

64
Também o salario fome no Rio Grande do Sul, Vida Bancaria, 155. ed. p. 2, 30 de nov. de 1935.
65
“O gráfico acima, organizado pelo ‘Boletim Semanal’ da Associação Comercial de São Paulo, mostra-nos o
que foi o aumento do custo de vida, na cidade de S. Paulo, para uma família de 5 pessôas de categoria média,
categoria em que se pode enquadrar a classe bancária. Verifica-se de 1935 a Setembro de 1943 um aumento no
custo de vida de quase 60%. De 1939 a Setembro de 1943 esse índice é de cerca de 40%. Note-se que certas
verbas fôram calculadas com grande otimismo, como as que dizem respeito a Alugueis, Indumentária e Escola.
Deve-se também assinalar que de Setembro de 1943 a esta data, maior alta se tem observado no custo de todas as
utilidades.”
35

Custo de vida na cidade de São Paulo


Orçamento mensal para uma familia de 5 pessoas
Aumento
1935 a
1935 1939 1943 1943
Média Média Setembro
Assuntos Unidades %
cruzeiros cruzeiros cruzeiros
HABITAÇÃO
Aluguel mês 300 340 380 26,5
Agua - 8,4 8,4 8,4
Gás ou Carvão - 32 35 47 45,9
Luz - 10,8 10,8 10,8
Porcentagem s. o Total % 351,2 394,2 446,2 27
35,3 33,9 20,3
ALIMENTAÇÃO
Açucar 10 kg 11 13 21 91
Arroz 12 kg 15,6 20,4 28,8 84,6
Batatas 15 kg 12 18 27 125
Café 4 kg 14 16 24,8 75,8
Carne e Linguiça 18 kg 43,2 54 88,2 194,2
Cebolas e condiment. - 10 14 20 100
Farinha de Trigo 4 kg 4 4,8 8 109
Feijão 8 kg 5,6 8 12,8 128,5
Frutas - 12 18 25 108
Legumes e Verduras - 16 20 32 107
Leite 45 ls 36 45 58,5 62,5
Macarrão 4 kg 4,8 6 10 116,6
Manteiga 1 kg 7,5 10,4 16 113,2
Oleo 6 ls 14 15,6 36 150
Ovos e Queijo 5 duz. 15 20 27 80
Pão 45 kg 45 49,5 76,5 70
Divers. Aliment. - 26 30 42 61,5
Porcentagem s. o Total % 292,1 362,7 558,8 89,4
29,3 31,2 35,1
OUTRAS DESPESAS
Indumentária - 140 160 250 78,5
Consertos - Tinturaria - 22 26 36 63,3
Moveis. Utens. Domest. - 60 70 105 75
Médico. Remédios - 16 20 27 68,8
Escola - 40 45 55 37,5
Condução - 40 40 40
Diversos - 35 45 65 63,7
Porcentagem s. o Total % 353 406 578
35,4 34,9 36,5

Total das Despesas 996,2 1162 1579 58,4


Fonte: Premente necessidade de reajuste no salário dos bancários, Folha Bancária, 20. ed. p. 1, abr. de 1944.
36

O total de despesas em setembro de 1943 ficou em Cr$1579,00 (mil quinhentos e


setenta e nove cruzeiros). Levando-se em consideração que o salário mínimo nesse ano era de
360 cruzeiros e que a média salarial em 1944 era de 700 cruzeiros, podemos concluir que os
salários recebidos pelos bancários não eram suficientes para sustentar um padrão de vida médio
para uma família de 5 pessoas. E eles diziam isso correntemente. Se viam como trabalhadores
mal remunerados, como é possível perceber na carta do bancário gaúcho citada acima e na
passagem a seguir, escrita por Americano Meridional em 1934:

[...] D’aí a vida necessitada que passa e que é obrigado a passar, por varias
circunstancias, vejamos: - Custo de vida exorbitante, alta dos generos, artigos de uzo,
casa, locomoção, diversões, etc. em face dos salarios baixissimos, humilhante e
microscopicos que nos são pagos em doses homepaticas…. que obrigam os bancarios
a se tornarem escravos das casas de penhores, dos agiotas, dos titulos, dos protestos,
das dividas insoluveis, das prestações, dos judeus [...]66

Apenas a título de comparação com outra categoria de trabalhadores podemos usar


o exemplo de Antonio Ivo Vieira, guarda de 2ª classe da Estrada de Ferro Central do Brasil
(E.F.B.C), cuja carta à Getúlio Vargas foi utilizada por Jorge Ferreira67 em sua pesquisa. Na
carta, Antonio diz receber 350$000 (trezentos e cinquenta mil réis), sendo que trabalha na E. F.
C. B. há quase 20 anos. Um guarda de Central do Brasil ganhava, após 20 anos de carreira,
quase o mesmo que alguns bancários paulistanos em início de carreira. Logo, se o salário era
pouco para a vida que queriam e precisavam levar, não era tão pequeno se comparado ao de
outros trabalhadores.

Havia uma vigilância constante sobre o modo como se comportavam,


principalmente no que concernia à vida financeira. A relação com agiotas era vista de maneira
extremamente negativa pelos empregadores, e os funcionários que se envolviam com
agiotagem poderiam até mesmo ser demitidos, uma vez que eles deveriam ter uma conduta
exemplar68. Esse era, de fato, um problema grande para os bancários, e a Associação tomou
algumas providências no sentido de evitar o endividamento de bancários com agiotas, como a
Liga Bancária Contra a Agiotagem69. Mas a vigilância não se restringia à esfera financeira. Em
alguns bancos os funcionários precisavam pedir permissão até mesmo para se casar70.

66
AMERICANO MERIDIONAL, Palavras e fatos aos bancários do Brasil, Vida Bancaria, 119. ed. p. 2, 28 de
jun. 1934.
67
FERREIRA, Trabalhadores do Brasil: o imaginário popular (1930-1945).
68
Agiotagem nos meios bancários, Vida Bancaria, 175. ed. p. 4. jan. de 1939; SOFOCLES, Maus companheiros?,
Vida Bancaria, 106. ed. p. 5, 10 de dez. de 1933; Agiotagem entre os bancarios, Vida Bancaria, 157. ed. p. 1, 27
de jan. de 1936.
69
A pedidos, Vida Bancaria, 157. ed. p. 2, 27 de jan. de 1936.
70
De tutela ex fide gerenda!, Vida Bancaria, 106. ed. p. 1, 10 de dez. de1933.
37

Outra exigência constante sobre os funcionários de bancos se referia à sua forma de


vestir, aparência e comportamento.

[...] Obrigados, pela natureza do trabalho e pela sua situação social, a aparentar,
apresentando-se decentemente esses novos martires da sociedade moderna, vivem
num circulo cruel de miserias, de necessidades e de humilhações.
Barba feita, roupa limpa e sem remendos, sorrisos para os clientes, bôas e custosas
amizades, tudo isso teem os companheiros Bancarios que apresentar numa hipocrisia
obrigatória, quando, por traz da mascara dessa felicidade mentirosa, vivem numa luta
torturante, atroz, acabrunhadora, com os agiotas, com o desconforto, com o sacrificio
inevitavel da familia, com credores impacientes e mesmo com a fome. Daí, certas
doenças, e a desmoralização pelas dívidas, culminando no desemprego, porque aos
Bancos não fica bem ter funcionarios doentes ou sem moral. [...]71

Essas exigências contribuíam para que fossem vistos como parte dos setores
privilegiados da sociedade. Tendo sempre que estar muito bem-vestidos, gastavam parte
considerável de seus salários com roupas. Essa era a maior das queixas: a necessidade de uma
aparência sempre impecável, que não condizia com a realidade econômica daqueles
trabalhadores. Empregados no comércio e profissionais liberais também tinham exigência
quanto a seu modo de vestir, o que colocava, como já dissemos, esses profissionais em posição
distinta de trabalhadores uniformizados, ajudando na manutenção de um status diferenciado
parar eles.

Em entrevista concedida por bancários ao Correio Paulistano, reproduzida na


Folha Bancária de 23 de fevereiro de 1945, temos o seguinte:

Aparentemente – disse-nos um bancário – desfrutamos uma boa situação. Quem nos


vê decentemente trajados tem uma idéia inteiramente falsa de nossa classe. Julga que
somos privilegiados, quando na realidade, dispendemos sacrificios enormes para
manter um padrão de vida que nossos salários não permitem. O bancario, na sua
maioria, é o trabalhador que recorre às mesmas fontes que os outros se servem. É o
trabalhador que compra suas roupas e seus sapatos a prestações, que faz uma ginastica
tremenda para pagar as contas ao vendeiro e que em todos os seus balanços mensais,
vê, com tristeza, um “deficit” que aumenta assustadoramente 72.

Até aqui já foi possível observar o modo como os bancários se enxergavam, ou,
pelo menos, como alguns deles se enxergavam. Como trabalhadores. “Operários da casaca” 73,
que ganhavam pouco para o sustento de suas famílias e que, por precisarem manter um padrão
de vida pré-determinado, acabavam por se endividar. No entanto, nem todos os bancários se
viam assim. Há relatos de bancários que se viam como “burgueses ou aristocratas” 74. Daí a

71
K. V. 8, Miseria dourada, Vida Bancaria, 142. ed. p. 1, 14 de mai. de 1935.
72
Salário profissional, velha aspiração dos bancários, Folha Bancária, 23. ed. p. 1 e 2, fev. de 1945.
73
O presidente da Associação dos Funcioarios de Bancos do Estado de São Paulo, Sr. A. Silveira Mello, cocede à
“Vida Bancaria” uma entrevista de grande interesse, Vida Bancaria, 77. ed. p. 1, mar. de 1931.
74
AMERICANO MERIDIONAL, Palavras e fatos aos bancários do Brasil.
38

dificuldade em olhar para essa classe sem debater-se sobre sua heterogeneidade interna. Ela se
dava não apenas nas diferenças salariais, que possibilitariam diferentes modos de vida, mas
também na forma como eles mesmos se enxergavam. É verdade que entre os anos de 1930 e
1945 a forma como eles se viam, mais ou menos próximos de outras classes de trabalhadores,
se alterou. No entanto, durante todo o período se colocavam, de maneira geral, como
trabalhadores, e reivindicavam melhores condições de trabalho. Assim, eles se viam lesados
pelo ambiente pouco higiênicos das agências (causador da tuberculose, mal comum entre os
bancários), pelos baixos salários que ganhavam, e pelas longas jornadas de trabalho.

O modo como eram vistos, se fica implícito nos trechos já apresentados, está
bastante claro no excerto seguinte, que, apesar de longo, é esclarecedor nesse sentido. Ele foi
retirado de uma série de publicações que os Diários Associados, de propriedade de Assis
Chateaubriand, fizeram sobre os bancários e seu modo de vida, afirmando que eles reclamavam
de seus salários, reivindicando remunerações maiores e a instituição do salário mínimo, mas na
verdade recebiam e viviam muito bem. O teor dos artigos publicados era, em linhas gerais, esse:

Os bancarios formam uma classe de trabalhadores especialmente favorecida por um


conjunto de vantagens que nenhuma outra classe usufrue. Não ha termo de
comparação possivel entre o nivel de remuneração que aufere em face dos estipendios
concedidos aos empregados de outra natureza. Ingressam no serviço já em cargos
iniciais bem remunerados. Daí por diante, os acessos se fazem em condições
magnificas, de todo ponto de vista sob que as consideremos.
Bôa remuneração já corresponde, por si só, a uma tão grande vantagem, que torna
descenessario procurar, a latere da profissão, atividades suplementares, para melhorar
os recursos de cada orçamento individual. Não sabemos se existe uma outra classe de
funcionarios colocados nessa posição de verdadeiro privilegio que usufruem os
bancarios, pois que, bem remunerados, encerram o seu labor diario com o regimen de
serviço nos bancos, para se entregarem a um lazer confortavelmente proporcionado
pelo proprio padrão de vida que levam.
De par com isso, ha outras circunstancias de ordem muito valiosa a considerar. De
todas as classes de empregados, formam os bancarios a que trabalha em condições e
ambientes mais confortaveis. [...]”75

A contradição, assim, fica evidente. Se de um lado temos a construção de uma


narrativa sobre os bancários que os coloca como explorados, de outro eles são apresentados
como trabalhadores privilegiados, que têm no seu trabalho e no seu padrão de vida condição
não alcançada por nenhuma outra categoria de trabalhadores.

75
As 6 horas dos Bancarios, Vida Bancaria, 103. ed. p. 1 e 2, 25 de out. de 1933 Grifo original.
39

À modo de síntese da questão sobre como se viam e eram vistos, e, portanto, que
posição ocupavam dentro da sociedade paulistana, podemos usar a entrevista de outro bancário
ao Correio Paulistano:

[...]sentimos mais do que ninguém [...] o eterno problema da classe média. Somos
trabalhadores como quaisquer outros, mas nos vemos obrigados a manter um padrão
de vida que os salários atuais não comportam. Efetivamente estamos bem mal
colocados e essa nossa posição na estrutura das classes sociais não é a que deveriamos
ter em face dos modestos ordenados que percebemos76.

Ou seja: se viam como trabalhadores da classe média, que sustentavam um padrão de vida mais
alto do que poderiam se fosse levado em consideração apenas seus salários e não sua posição
social relativa.

Após caracterizar os bancários, trataremos agora da organização de sua Associação.


Para isso será necessário primeiro uma contextualização geral sobre a forma de organização
sindical no período estudado.

Diversas visões sobre a melhor maneira de se organizar os trabalhadores estiveram


presentes durante a primeira metade do século XX. Os socialistas, em um primeiro momento,
subordinaram suas associações de classe ao partido, e só depois passaram a reconhecer sua
importância como base política. Essa forma de organização, apesar de ter tido relevância, não
obteve sucesso nem no final do século XIX, nem na Primeira República. Os anarquistas, por
sua vez, viam o trabalho e o trabalhador como fundamentais para a organização de uma futura
sociedade anarquista. Para isso, reforçavam a ética do trabalho e tinham grande estima pela
solidariedade entre os trabalhadores. Para eles, o trabalhador deveria ser um homem educado,
com acesso à cultura e ao mundo das letras. Rejeitavam o mutualismo, optando por um sindicato
de resistência, cujo objetivo seria a luta contra o patronato. A visão comunista ganha força
principalmente entre os anos de 1942 a 1945, momento em que conduz o projeto partidário,
ressignificando as propostas dos socialistas. Essa é uma visão que tem sucesso, apesar da
repressão. Por fim, temos a visão corporativista, que teve destaque durante o Estado Novo. Essa
forma de organização aproximava o sindicato de uma associação mutualista, de caráter mais
assistencial. Era radicalmente oposto ao modelo anarquista, porém, apesar de suas caraterísticas
diversas, aqui o sindicato também aparecia como instrumento principal na articulação da classe
trabalhadora. Para os adeptos dessa proposta, ser cidadão significava alcançar um lugar
satisfatório no mercado e na sociedade77.

76
Salário profissional, velha aspiração dos bancários.
77
GOMES, A Invenção do Trabalhismo, p. 28–30.
40

Em 1934, a partir da nova constituição brasileira, ficava permitido o pluralismo e a


autonomia sindicais, vitória de reivindicações da Igreja e do patronato78. O pluralismo
contrariava os interesses do movimento operário e do estado, ambos defensores da unidade
sindical, porém, por motivos diferentes. O primeiro acreditava em uma melhor forma de
organização, e o segundo, esperava uma unidade sindical sob tutela do Estado79. É nesse
momento que é possível perceber de forma mais nítida o perfil do movimento sindical. De um
lado estava o sindicalismo atrelado ao Ministério do Trabalho, “composto por entidades em
parte reais e em parte fictícias”80, e de outro os sindicatos com reconhecimento oficial, mas que
continuavam sob controle das lideranças de esquerda81. O fracasso da Ação Libertadora
Nacional (ALN), a Lei de Segurança Nacional e a Intentona Comunista, todos acontecimentos
de 1935, fizeram aumentar a repressão e tornaram impossível a resistência. Entre 1935 e 1937
tem-se notícia de diversos sindicatos que passaram por períodos de intervenção, tendo afastadas
suas lideranças independentes82. A repressão desse período perdurou até 1942, tornando
inviável qualquer tipo de ação independente gerada no interior da classe trabalhadora.
Posteriormente aos movimentos de combate ao comunismo e fiscalização do cumprimento das
leis que regulamentavam o mercado de trabalho, teve início o projeto trabalhista. Ele consistia
em um pacto entre classe trabalhadora e Estado. Ressignificando as falas operárias da Primeira
República, o Estado passava a apresentar os benefícios sociais não como conquista, mas como
ato de generosidade, que precisava de reciprocidade. Essa reciprocidade se tornava o vínculo
integrador de todo o pacto, uma vez que a partir dessa lógica, “quem recebe o que não solicitou
e não pode retribuir materialmente fica continuamente obrigado em face de quem dá”83.

É nesse contexto que é fundada, em 16 de abril de 1923, por Francisco Silva Pinto,
funcionário do City Bank, a Associação dos Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo.
Seu intuito era o de ser uma associação beneficente para tratar principalmente da saúde dos
bancários. Oferecia então médicos, enfermaria, dentista e serviço de farmácia. Nesse primeiro
momento os sócios foram divididos em três categorias: contadores e funcionários superiores;
funcionários de categorias médias; e contínuos e auxiliares inferiores. Só poderiam fazer parte
da direção, bem como tomar parte nas assembleias, os que se enquadrassem nas duas primeiras
categorias. Assim, contínuos e auxiliares só passaram a tomar parte na Associação a partir de

78
Ibid., p. 175.
79
Ibid.
80
Ibid., p. 176.
81
Ibid.
82
Ibid., p. 177.
83
Ibid., p. 181–182.
41

1930, dando mostras da hierarquização de categorias existente nos bancos84. Com o passar do
tempo vão surgindo na sede da Associação salas de ping-pong, de xadrez, biblioteca etc.

Ela teve seu nome alterado diversas vezes no decorrer do tempo. Nasce como
Associação dos Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo. Em 1931, em respeito ao
decreto nº 19.770 de 09 de março 1931 – a Lei de Sindicalização (que criava normas para o
reconhecimento sindical) – foi assinada a carta sindical, alterando-se a nomenclatura para
Associação dos Bancários de São Paulo – órgão Sindical. Em 1937 há outra mudança de nome,
desta vez em conformidade com o Decreto nº 24.694 de 12 de julho de 1934, conhecido como
nova Lei de Sindicalização – que permitia o pluralismo sindical, garantia maior autonomia para
os sindicatos, porém com a manutenção da necessidade de reconhecimento pelo Ministério do
Trabalho – sendo reconhecida como Sindicato dos Bancários de São Paulo, ainda que já
utilizasse essa denominação desde junho de 1934. Com a assinatura da carta sindical em 15 de
maio de 1941, seguindo o decreto 1.402, que revogou os anteriores, passou a se chamar
Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de São Paulo.

Imagem 1 - Gabinete dentário do Dr. João Reis

Fonte: Associação dos Bancários, Vida Bancaria, 88. ed. p.7, fev. de 1932.

84
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 44.
42

Imagem 2 – Sala de xadrez da Associação

Fonte: Associação dos Bancários, Vida Bancaria, 88. ed. p.11, fev. de 1932.

Imagem 3 – Biblioteca da Associação

Fonte: Associação dos Bancários, Vida Bancaria, 88. ed. p.12, fev. de 1932.
43

Imagem 4 - Sala de ping-pong

Fonte: Associação dos Bancários, Vida Bancaria, 88. ed. p.12, fev. de 1932.

Imagem 5- Ambulatório Médico

Fonte: Associação dos Bancários, Vida Bancaria, 88. ed. p.11, fev. de 1932.
44

Houve diversas mudanças de sede da Associação desde sua fundação. Em 1930 ela
ficava em um sobrado na rua Florêncio de Abreu, 35, em prédio alugado85. Em agosto de 1931
mudou-se para a rua Conselheiro Furtado, 39, a primeira sede própria86. Em 1935 houve nova
mudança, e a sede foi instalada na rua 15 de novembro, 19, 2º andar, em propriedade alugada87.
Em novembro de 1936 mudaram-se para o primeiro andar do número 36 da mesma rua88. Em
1944 a sede foi transferida novamente, desta vez para a rua São Bento, 405, 5º andar89.
Colocamos no Mapa 1 os locais aproximados das sedes durante os anos aqui trabalhados90.

Imagem 6 - Fachada da sede da associação, na Rua Conselheiro Furtado, 39

Fonte: Associação dos Bancários, Vida Bancaria, 88. ed. p.3, fev. de 1932.

85
Marcação em verde no mapa.
86
Marcação em vermelho no mapa.
87
Marcação em cinza no mapa.
88
Marcação em amarelo no mapa.
89
Marcação em azul no mapa.
90
O mapa foi produzido através da plataforma Geosampa
(http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br/PaginasPublicas/_SBC.aspx), da prefeitura de São Paulo, que se utilizou dos
mapas produzidos entre 1928 e 1933 pela empresa italiana Societá Anônima de Rilevamenti Aerofotogrammtrici
– SARA. O levantamento foi feito através da técnica de Aerofotogrametria e produziu cartas em escala de 1:1000
e 1:5000. Usando esse mapa como base, localizamos em um mapa atual da cidade de São Paulo os números dos
endereços nas ruas buscadas, e fizemos a marcação no mapa da SARA.
45

Mapa 1 – Localização das sedes da Associação entre 1930 e 1944

Fonte: http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br/PaginasPublicas/_SBC.aspx
46

Entre os serviços oferecidos pela Associação aos seus sócios estava o curso de
contabilidade bancária, que tinha por finalidade qualificar os bancários para seu serviço;
departamento de colocações, para arrumar novo emprego para um funcionário que por ventura
fosse demitido; serviço jurídico, com advogado que cuidava de problemas trabalhistas;
assistência médica, farmacêutica e odontológica. As pautas que reivindicou nesse período
foram a das duas horas de almoço – conquistada em 1932 através de negociação direta com os
bancos; a Lei das 6 horas – para regular o trabalho no banco em 6 horas diárias, conquistada
pelo Decreto n. 23.322, de 3 de novembro de 1933; a criação de uma caixa de aposentadoria
própria, alcançada através de greve91 nos dias 5 e 6 de julho de 1934 e que conquista o Instituto
de Aposentadoria e Pensões dos Bancários (IAPB); e salário mínimo, com início das
reivindicações em 1934.

A presença na sede era bastante solicitada na Vida Bancária, como é possível


perceber a partir desse pedido de 1934: “Fazemos sentir aos nossos consocios a obrigação de
frequentar a séde social, pelo menos uma vez por semana, porque, assim, ficarão conhecendo
melhor nossos companheiros, resultando daí maior amisade, e consequentemente, maior
UNIÃO”92. Para chamar os sócios para a sede muitas iniciativas foram tomadas. Houve a
tentativa de criação de um Grêmio dos Bancários, com o intuito de “congregar os bancários
num ambiente de união e interesse para as nossas cousas”93; havia a realização de diversas
palestras e conferências; festas de aniversário da Associação; a criação de um Clube Bancário,
para a realização de reuniões dançantes; um Centro de Cultura dos Bancários que, apesar de
ter personalidade jurídica independente, funcionava no sindicato e tinha objetivos bem
definidos: “letras, literatura, arte, esportes e jogos de salão”94; uma discoteca, equipada com
aparelho de som moderno; salão de jogos, com mesas de snooker, ping-pong e xadrez; e a Liga
Bancária.

O órgão oficial da Associação era seu jornal. Desde a fundação ele carregava o
nome de Vida Bancária. Foi assim denominado por 10 anos, até 1939. A alteração de nome se
deu por conta da união do então Sindicato dos Bancários de São Paulo e do Syn-Dikê. Este
último foi outro sindicato que congregava funcionários bancários, criado em 1934 (momento

91
Essa greve foi o estopim para a criação do Syn-Dikê.
92
Relatório dos trabalhos da diretoria da Associação dos Bancarios de S. Paulo - órgão Sindical, correspondente
à sua gestão durante o anno de 1933, e apresentado á Assembleia Geral Ordinária em 14 de março de 1934, Vida
Bancaria, 113. ed. p. 1 a 5, 27 de mar. de 1934. Caixa alta original.
93
Ibid.
94
Relatório da gestão de 1935, apresentado pela diretoria á Assembleia Geral de 14 de dezembro de 1935, Vida
Bancaria, 156. ed. p. 1 a 3, 18 de dez. de 1935.
47

em que havia a possibilidade do pluralismo sindical). Seu nome foi retirado do grego, e
significava “com o direito”95. Seus organizadores tinham como missão acabar com o sectarismo
criado entre trabalhadores de banco e o núcleo patronal. Tinham uma postura de aproximação
e conciliação com os patrões, diminuindo assim o distanciamento entre eles. Propunham como
forma de reivindicação a utilização da estrutura jurídica do país, “deprezando, por conseguinte,
o recurso a tudo quanto choque ou fira a indole conservadora do nosso povo.”96

O Syn-Dikê possuía seu próprio órgão, a Revista Syn-Dikê. Quando houve a


unificação dos dois sindicatos, em setembro de 1939, o órgão oficial mudou de nome, passando
a denominar-se Folha Bancária. Durante os 16 anos que o presente trabalho aborda há
mudanças também na periodicidade do jornal. Por algum tempo ele é mensal, ainda que haja
alguns espaços maiores de tempo sem publicação. Em 1932 houve uma tentativa de transformar
o jornal em revista, sendo publicados 6 números nesse formato. Uma enquete entre os leitores
decidiu pelo retorno ao formato original, de jornal. Depois, entre os anos de 1934 e 1935, ele
passa a ser publicado a cada 15 dias, chegando a ter publicações 3 vezes por mês. A partir de
1936 volta a ser uma publicação mensal. Entre janeiro de 1933 e março de 1936 era apresentada
a tiragem do jornal: 4000 exemplares, ou seja, mais do que dobro de sócios, que em março deste
ano era de 1819 pessoas97. Isso mostra o alcance que a Associação pretendia dar ao seu jornal
e, consequentemente, às suas ideias.

A Liga Bancaria de Esportes Athleticos (L.B.E.A) foi fundada em março 1929, seis
anos depois da fundação da Associação, sob seu patrocínio. Em fevereiro daquele ano haveria
a primeira publicação sobre a possibilidade de criação de uma liga. Ela teria como finalidade
marcar competições e resolver possíveis divergências entre os filiados, se dedicando apenas ao
futebol, “o unico esporte que tem tido um certo incremento entre os bancarios”98.

Em março houve nova publicação tratando de como se deu a fundação da Liga.


Após a posse da nova diretoria o presidente da Associação foi procurado por representantes do
London Bank Club com a proposta de criação de uma liga bancária de esportes. Foram
chamados representantes dos clubes bancários para participarem de uma reunião que trataria da
fundação de tal liga. Porém, os clubes receberam convite igual do Induscomio F. B. C. (clube
de funcionários do Banco Commercio e Industria) para o mesmo dia, demonstrando que havia

95
O nosso Programma, Revista Syn-Dikê, p. 2, maio 1935.
96
Ibid., p. 3.
97
Quantos somos?, Vida Bancaria, 159. ed. p. 8, 20 de mar. 1936.
98
L. C., Futebol Bancario, Vida Bancaria, 52. ed. p. 4, fev. de 1929.
48

interesse de outros clubes pela fundação de uma liga que congregasse os bancários. No dia
marcado representantes dos clubes dos bancos Francez e Italiano, Banco de Minas, British
Bank, London Bank, Banco Commercial, Casa Bancária Conde & Almeida, Royal Bank e
Banco Commercio e Industria compareceram à sede da Associação. A criação da L.B.E.A. foi
aprovada por sete desses clubes, sendo contrário apenas o representante do Banco Commercio
e Industria. O princípio dos estatutos seria o seguinte: todo jogador inscrito na Liga deveria ser
sócio da Associação de Funcionários de Bancos de São Paulo.

Fica, então, marcada para o dia 14 de março uma nova reunião para se decidir sobre
a organização definitiva da L.B.E.A., discussão de estatutos e eleição da Diretoria. Nesse
momento é publicado um novo ofício do Induscomio F. B. C. afirmando que a Associação
obrigava todos os jogadores inscritos na Liga a serem seus sócios. O ofício repercutiu nos
bancos, e logo se pôde ver que os bancários desaprovavam o voto dado por seus representantes
na reunião de fundação da nova liga. A Associação, por sua vez, argumentava que essa cláusula
havia sido aprovada pelos presentes, não podendo-se atribuir a imposição de tal regra a ela.
Decide-se, então, por patrocinar a L.B.E.A. sem a necessidade de filiação dos jogadores à
Associação. Após os desentendimentos, a Liga Bancaria de Esportes Athleticos fica fundada,
sob patrocínio da Associação de Funcionários de Bancos de São Paulo, funcionando em uma
de suas salas, com o concurso dos seguintes clubes: London Bank Club, Sudameris F. B. C.,
Minas Bank F. B. C., Royal Bank F. B. C. e British Bank F. B. C.99

A fundação de uma liga de futebol sob o patrocínio da associação de classe dos


bancários estava em consonância com o pensamento de lideranças comunistas do período, que
apoiavam a chamada “proletarização dos esportes”. O que se pretendia com isso era a tomada
para si, por parte dos sindicatos e associações, da organização do esporte pelos trabalhadores.
Isso porque essas lideranças acreditavam que o futebol, “esporte burguês”, estava desviando as
atenções dos trabalhadores, tirando deles o foco na luta por melhores condições de trabalho e
de vida. Após anos de negação do futebol como parte da cultura dos trabalhadores,
principalmente por parte dos anarquistas, os comunistas passaram a defender a prática do
futebol pelos trabalhadores nos sindicatos. Entendiam que, caso eles não tivessem contato com
esse esporte dentro dos sindicatos, o teriam fora deles, então, seria melhor para a luta operária
que esses trabalhadores pudessem praticar seus esportes sob o patrocínio de seus sindicatos.
Pensou-se até mesmo na fundação de uma federação de clubes proletários, ligados aos

99
MEMOLO NETO, P., Aos clubes bancarios de esportes, Vida Bancaria, 53. ed. p. 4, mar. de 1929.
49

sindicatos, mas ela nunca se concretizou100. Fato é que nesse momento em que lideranças
comunistas começaram a olhar para o futebol como um “mal necessário” a ser cultivado dentro
dos sindicatos, a Associação dos Bancários de São Paulo criou sua própria liga, que congregava
clubes de diversos estabelecimentos bancários. Veremos durante decorrer desse trabalho que o
pensamento sobre a necessidade e importância ou não da prática esportiva, com centralidade
para o futebol, pelos bancários vai variar ao longo desses quinze anos, dando exemplo de como
os trabalhadores de colarinho branco encaravam a questão.

Participaram do Torneio Início daquele ano Minasbank, British Bank, Royal Bank,
Induscomio, London Bank, Sudameris e Clube Banco Noroeste, que se sagrou campeão do
torneio. Do primeiro campeonato, ainda em 1929, tomaram parte o Induscomio, o London Bank
Club, o Sudameris, o Noroeste, o Royal Bank, o Minasbank, o British Bank e o City Bank Club,
sendo campeão o Induscomio, seguido por Sudameris e London Bank.

Imagem 7 - Quadro do Clube Banco Noroeste, vencedor do Torneio Início de


1929

Fonte: MEMOLO NETO, P., Liga Bancaria de Esportes Athleticos – torneio início, Vida
Bancaria, 55. ed. p. 5 e 6, mai. de 1929.

100
ANTUNES, Futebol de Fábrica em São Paulo; DECCA, Maria Auxiliadora Guzzo, A vida fora das fábricas:
Cotidiano em Sao Paulo (1920/1934), Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1987.
50

Durante o período estudado nesse trabalho a Associação passou por três fases
distintas, que têm correspondência com as mudanças ocorridas na política nacional. A primeira
delas, entre a fundação, em 1923, e 1932, teve cunho assistencialista. Nessa fase o objetivo
primordial era criar um local que proporcionasse assistência médica, farmacêutica, ao
desemprego e à invalidez para os associados, além de tentar promover a união entre os
bancários. Tentava-se nesse momento encontrar uma identificação para os trabalhadores
bancários. A segunda fase, entre 1933 e 1935, foi um período de maior militância, em que houve
atuação política de forma organizada e autônoma. Houve uma nova compreensão de qual seria
o papel do Sindicato, e nesse momento aconteceu uma grande cisão no interior da classe
bancária, criando-se o Syn-Dikê. Por fim, o período entre 1936 e 1945, marcado pelo
corporativismo. Aqui, a grande preocupação consistia na legalização do sindicato, que foi para
a ilegalidade no período anterior. Houve concessões à intervenção estatal, mas havia combate
ao que consideravam “negligência do Estado em fazer cumprir as leis trabalhistas”101.
Percebemos que o esporte também está segmentado em três fases na instituição, acompanhando
a divisão anterior, como ficou explicitado no final da introdução deste trabalho. Vamos, agora,
ver como o esporte – notadamente o futebol – era organizado e representado em cada uma
dessas fases.

101
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 72.
51

2. Entre os campos e as páginas do jornal

O ano de 1929 ficou marcado na história da Associação dos Funcionários de


Bancos do Estado de São Paulo pelo início, no âmbito da Câmara Municipal, da busca pelo seu
reconhecimento como sendo uma instituição de utilidade pública. Houve ainda a fundação dos
cursos de contabilidade e línguas, de uma sucursal em Santos e da Liga Bancaria de Esportes
Atheticos. Como já explicitado no capítulo anterior, a L.B.E.A. foi fundada sob patrocínio da
Associação, para organizar o campeonato de futebol de clubes formados por funcionários de
bancos e casas bancárias. Os jogadores não precisavam ser filiados à Associação para tomarem
parte nos campeonatos, o que pode indicar que, ao contrário do que acontecia em outros
contextos – como o da juventude comunista do Rio de Janeiro dos anos 1930102 ou da Inglaterra
com a British Workers’ Sports Federation (BWSP)103 – não havia nesse momento uma tentativa
explícita de arregimentar sócios para a Associação através da prática esportiva.

No plano nacional as transformações políticas ocorridas durante a década de 1920


ajudam a compreender o momento pelo qual o país passava. Era uma fase de transição política
que se concretizaria a partir do movimento de 1930. Aconteceram também ampliações dos
setores urbanos e das camadas médias, que impulsionariam alterações no campo político, como
“o questionamento das bases do sistema oligárquico da Primeira República”104. Isso porque, até
o momento, vivia-se a política de governadores, ou política dos estados. Ela tinha como objetivo
manter os conflitos intraoligárquicos no interior dos estados, de modo que essas disputas não
causassem instabilidade nacional. Tradicionalmente a historiografia produzida sobre a Primeira
República coloca a aliança entre os estados de Minas Gerais e São Paulo como elemento
sustentador dessa política. No entanto, estudos mais recentes apontam para a instabilidade da
aliança entre mineiros e paulistas, além da forte presença do estado do Rio Grande do Sul – que
muitas vezes foi um parceiro comercial preferido pelos mineiros – sugerindo que essa aliança,
conhecida como política do café com leite, não ajudou na diminuição dos conflitos da política
nacional105.

102
GÓIS JUNIOR; SOARES, Os comunistas e as práticas de educação física dos jovens na década de 1930 no Rio
de Janeiro.
103
JONES, Sport, politics and the labour movement.
104
FERREIRA, Marieta de Moraes; PINTO, Surama Conde Sá, A crise dos anos 1920 e a Revolução de 1930, in:
FERREIRA, Jorge Luiz; DE ALMEIDA NEVES DELGADO, Lucilia (Orgs.), O tempo do liberalismo
excludente: da Proclamação da República à Revolução de 1930, 9. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2017, v. 1, p. 390.
105
FERREIRA; PINTO, A crise dos anos 1920 e a Revolução de 1930.
52

Fato é que no ano de 1929 começaram as movimentações pela disputa da


presidência da República, que se daria no ano seguinte. A sucessão presidencial exaltou ânimos
de políticos por todo o território brasileiro, que ambicionavam ocupar o principal posto da
política nacional. São Paulo sofreu ainda mais com essas movimentações, uma vez que era
Washington Luís, um representante seu, que ocupava o posto de presidente naquele momento.
Ao indicar Júlio Prestes para o cargo, Washington Luís quebrou o acordo com Minas Gerais, o
que deu espaço para que conflitos anteriores, não muito bem resolvidos, fossem reavivados.
Nesse contexto Getúlio Vargas, um gaúcho, foi indicado como candidato da oposição,
representando a Aliança Liberal. A situação vence as eleições, mas os líderes da Aliança
Liberal, inconformados com a derrota, se juntam com lideranças do movimento tenentista e a
articulação entre eles faz com que estoure uma conspiração em Minas Gerais e no Rio Grande
do Sul no início de outubro, que logo se alastraria para os estados do Nordeste. Em 24 de
outubro Washington Luís é deposto do cargo de presidente e é instalada uma Junta Governativa,
que não teve sucesso em sua manutenção devido a pressões populares. Foi então, em novembro
de 1930, que Getúlio Vargas foi empossado Presidente da República106, dando início ao que
ficou conhecido na historiografia como Era Vargas, período que vai de 1930 a 1945, e que é
abordado neste trabalho.

No que se refere ao mundo futebolístico paulistano, o ano de 1929 ficou marcado


pela unificação das duas ligas que comandavam o futebol na cidade, a LAF e a APEA. O C. A.
Paulistano – veterano fundador de ambas as ligas – decide por abandonar a LAF e fechar o seu
departamento de futebol quando a discussão sobre a profissionalização desse esporte começa a
ficar mais séria. A partir daí, até meados da década seguinte, a discussão sobre amadorismo e
profissionalismo seria ponto de destaque entre cronistas esportivos que publicavam nos
principais jornais da cidade.

Havia grande resistência dos clubes em regulamentar a profissionalização do jogo,


no entanto, ela passa a ser apoiada por boa parte dos cronistas esportivos da época por diversos
motivos. O primeiro deles seria a necessidade de se impedir a evasão dos bons jogadores
paulistas, que estavam sendo levados por times europeus, principalmente italianos, que já
adotavam o futebol profissional. Os jogadores que mais interessavam a esses clubes eram os
descendentes de imigrantes europeus107. Assim, o futebol era visto como forma de retorno à
pátria de origem, e como forma de ascensão social, pois pagava-se muito pelos direitos do

106
Ibid.
107
LOPES, Classe, etnicidade e cor na formação do futebol brasileiro., p. 142.
53

jogador e pelo seu salário. Outro motivo que fez com que a imprensa apoiasse a
profissionalização foi a prática do falso amadorismo, que consistia no pagamento de
recompensas – conhecido como bicho – aos jogadores pelo seu desempenho e pelo resultado
do time no jogo. A imprensa defendia que, com o profissionalismo institucionalizado, os clubes
teriam que pagar aos jogadores um preço mais justo, pois já era observado o aumento no público
dos estádios, e consequentemente, no lucro do clube108. Apesar disso, muitos dos clubes e
cronistas que se colocavam como contrários à institucionalização do profissionalismo no
futebol paulista o faziam reivindicando questões relacionadas ao espírito esportivo e ao
amadorismo puro, defendendo o esporte apenas como forma de deleite e de treinamento do
corpo, seguindo as visões higienistas que eram importantes no período109.

Com o apoio do governo e dos higienistas, houve a inauguração de diversos


cursos de Educação Física e a organização de livros e periódicos sobre o assunto110. Um dos
cursos de Educação Física fundados nesse momento foi o da Escola Superior de Educação
Physica de S. Paulo, que iniciou suas atividades em 1934. A busca de uma educação que estava
ao mesmo tempo preocupada com a formação da identidade nacional e com a preparação dos
jovens para o mercado de trabalho havia encontrado um aliado no ensino de Educação Física
nas escolas. Ela era vista como forma de regeneração do povo, sempre atrelada ao discurso de
“fortalecimento da raça”. Assim, para transformar os trabalhadores brasileiros “a imprensa
aludia à formação de corpos racionalizados, disciplinados, marcados pela representação de uma
raça forte e saudável.”111 No entanto, era necessário que o esporte fosse bem orientado, caso

108
CALDAS, Waldenyr, O Pontapé Inicial: contribuição à memória do futebol brasileiro (1894-1933)., Tese
de Livre Docência apresentada ao Departamento de Comunicação e Artes da Escola de Comunicação e Artes,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 1988, p. 63.
109
O movimento higienista começou a ter relevância no Brasil entre o final do século XIX e o início do século
XX. Nesse momento, a grande preocupação dos médicos higienistas e dos engenheiros sanitários consistia na
alteração das habitações populares, de maneira que houvesse maiores condições de higiene para a população
trabalhadora que habitava cortiços, estalagens, hospedarias e casas de dormir nas maiores cidades do país. Em um
primeiro momento, o pensamento higienista enfocava questões relacionadas à higiene do ambiente em que as
pessoas moravam e frequentavam, de modo a evitar que doenças fossem contraídas. Esse movimento se constituiu
no Brasil com uma série de correntes de pensamento. Havia os eugenistas, que acreditavam na existência de raças
superiores e inferiores e, influenciados por teorias como o darwinismo social, pregavam que o problema da raça
do Brasil só seria resolvido através da regulamentação do casamento entre pessoas de raça superior. Isso,
juntamente com a alta mortalidade dos negros, faria com que o país conseguisse resolver esse problema de maneira
mais ou menos rápida. Havia ainda outros grupos de intelectuais, que Edivaldo Góis Junior divide entre
deterministas e intervencionistas. Ver: BRESCIANI, Maria Stella, Da cidade e do urbano: experiências,
sensibilidades, projetos, São Paulo: Alameda, 2018, p. 385–388; GÓIS JUNIOR, Edivaldo, Os higienistas e a
Educação Física: a história de seus ideais., Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Educação
Física da Universidade Gama Filho., Rio de Janeiro, 2000.
110
GÓIS JUNIOR, Os higienistas e a Educação Física: a história de seus ideais., p. 154.
111
GÓIS JUNIOR, Edivaldo, A institucionalização da Educação Física na imprensa: a construção da Escola
Superior de Educação Physica de S. Paulo., Movimento (ESEFID/UFRGS), v. 23, n. 2, p. 701–717, 2017, p. 709.
54

contrário, não alcançaria seus objetivos. O valor da boa orientação esportiva pode ser analisado
em uma passagem de Octávio Resende:

Para o adestramneto physico, tomado como meio


de melhor servir à sociedade, devemos, pois, dar preferência aos jogos que
desenvolvam o espírito de corporação, de muito auxilio, bem caracterizado no
vocabulo ‘association’ como que é conhecido, na Inglaterra, o football112.

Esse foi um debate acalorado entre os médicos, educadores e cronistas esportivos


no Rio de Janeiro e em São Paulo, como demonstraram André Dalben e Edivaldo Góis
Junior113. Segundo os autores, as críticas ao esporte vinham de diversos setores da sociedade,
como socialistas, nacionalistas e comunistas. Os contrários à prática esportiva defendiam que o
seu incentivo deixava de lado o estímulo à formação intelectual. Além disso, acreditavam que
os esportes poderiam favorecer o embrutecimento do corpo, aumentando a agressividade e a
competitividade, levando à desintegração social. Fernando de Azevedo, por exemplo, muda de
postura com relação ao esporte entre 1915 e 1920. Primeiramente acreditava que não havia
comprovação de que a prática de exercícios físicos fizesse bem. Porém, seu discurso é alterado
e passa a afirmar que, caso não fossem praticados de maneira abusiva, eles teriam grande valor
moral. O movimento eugênico também contribuiu muito para a mudança na forma como os
esportes eram vistos no país, já que os via como forma de possibilitar o desenvolvimento de
“um vigor moral e uma personalidade forte, afastando os indivíduos de vícios”114.

Apesar dos argumentos contrários, a prática esportiva estava difundida na


população. Assim, os esportes serviram de combustível para os intelectuais que o viam como
benéfico: uma vez que seria impossível combatê-lo, já que se encontrava muito difundido, o
mais certo seria seu controle e regulamentação para que se tornasse utilitário. Dessa forma, as
modalidades esportivas que pudessem de alguma maneira servir para a educação da juventude
passaram a ser aceitas e incentivadas por aqueles que almejavam o controle sobre a ela115.

Meily Assbú Linhales também aponta para as discussões acerca da finalidade do


esporte, visto por muitos intelectuais como forma de “energização do caráter”116. Tentando

112
RESENDE, Octávio. Os sports colletivos como arma de combate aos instinctos egoisticos. In: Revista Educação
Physica. Rio de Janeiro, Cia Brasil Editora, n.5, 1932, p.15, apud GÓIS JUNIOR, Os higienistas e a Educação
Física: a história de seus ideais., p. 158.
113
DALBEN, André; GÓIS JUNIOR, Edivaldo, Embates esportivos: o debate entre médicos, educadores e
cronistas sobre o esportee e a educação da juventude (Rio de Janiero e São Paulo, 1915-1929), Movimento
(ESEFID/UFRGS), v. 24, n. 1, p. 161–172, 2018.
114
Ibid., p. 166.
115
DALBEN; GÓIS JUNIOR, EMBATES ESPORTIVOS.
116
LINHALES, Meily Assbú, A escola, o esporte e a “energização do caráter”: projetos culturais em
circulação na Associação Brasileira de Educação (1925-1935), Tese de Doutorado, Faculdade de Educaação da
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006.
55

compreender o fenômeno da febre esportiva, esses intelectuais realizaram exercícios de


apropriação e recriação de sentidos, estabelecendo “polêmicas, críticas e explicações de
divergências”117.

A partir do panorama sobre a política nacional, a situação do esporte oficial em


São Paulo, e as ideias higienistas em voga no início dos anos 1930, vejamos agora de que
maneira se organizava o esporte bancário nesse contexto.

No início do ano de 1929 a Liga Bancaria de Esportes Athleticos era apenas uma
ideia. Defendendo a importância da existência de uma instância de organização esportiva para
a classe bancária, L. C. escreve:

A mais simpels analyse, resalta que, entre os bancarios, a propensão para os esportes
não é das mais acentuadas. Como que a querer destruir esta asserção, poderiam nos
apontar as muitas esquadras de futebolistas que existem pelos bancos, algumas já de
antiga fundação. [...]
Para os bancarios, a educação physica é uma questão de capital importancia e, como
tal, deve ser encarada. Passando longas horas arcados sobre uma escrivaninha, na
árdua tarefa de enfileirar algarismos, dispendendo com isso grandes reservas de
energia, todo o organismo reclama, depois, a pratica salutar dos esportes, para refazer-
se dessas perdas de vitalidade. [...]
Urge, em nosso meio, mover-se uma intensa propaganda esportiva, concitando os
nossos colegas a aderirem aos clubes internos que, com esse fim, já existem em muitos
de nossos bancos para que possamos, dentro em pouco, contar com um grande
contingente de esportistas. [...]
Julgamos imprescindivel a creação de uma Liga, essencialmente bancaria, á qual os
clubes internos ficassem subordinados. [...]118

Para ele os bancários deveriam se juntar nos clubes já existentes para praticarem
algum exercício físico. Provavelmente ele seria o futebol, o esporte mais popular entre os
bancários do período. E deveriam fazê-lo para recuperação das energias dispendidas no
trabalho. Foi esse o pensamento impulsionador da criação da L.B.E.A.

Criada a Liga, seus diretores foram logo tratando de organizar o Torneio Início.
Ele teve grande sucesso, e, contando com assistência numerosa – composta de funcionários
bancários e suas famílias –, apresentou boa técnica e cavalheirismo por parte dos participantes.
Contrariando as expectativas dos entendidos do esporte bancário, o quadro que levantou a taça
Bancários, oferecida pela Associação dos Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo foi
o do Banco Noroeste do Estado de São Paulo. O vice-campeonato ficou com o time do Esporte
Clube Sudameris, que contava com um quadro com possibilidades de vencer o campeonato da

117
Ibid., p. 50.
118
L. C., Futebol Bancario.
56

Liga. Logo após o final do Torneio Início começou o campeonato. É bem verdade que ele não
foi dos mais disputados. O C.E. Induscomio disparou na frente dos adversários, e, fortes
concorrentes ao título, como London Bank Club, E. C. Sudameris e Clube Banco Noroeste –
campeão do Torneio Início – não tiveram grandes chances de sucesso. Este último, inclusive,
terminou o campeonato em último lugar, com apenas 8 pontos ganhos, contra os 25 do campeão
C. E. Induscomio.

Apesar da pouca competitividade entre os concorrentes, os campos bancários


não ficavam atrás dos campos de oficiais no que se refere às discussões e incidentes. Os “casos”,
como se referiam os cronistas aos desentendimentos no interior dos campos, se avolumavam
rodada após rodada do campeonato. Sobre o assunto P. N. M. escreve: “[...] a educação
esportiva em nossa terra ainda está longe de atingir o grau em que ella merecia estar, atendendo-
se ao nosso progresso techinico”119. Para ele, os desentendimentos que ocorriam entre os
futebolistas bancários tinham ainda menos razão de ser do que os que se davam nos campos do
futebol oficial. Isso porque:

[...] Em primeiro logar, os jogos da Liga não têm renda de bilheteria e, por
conseguinte, não possuem uma assistência numerosa e partidária, capaz de influir no
animo do jogador. Em segundo lugar, os elementos que actuam nos campos da Liga,
são elementos de uma mesma classe, absolutamente homogêneos, e que, nós o
supomos, não são desconhecedores da educação esportiva.120

Por “educação esportiva” o autor provavelmente entendia os preceitos


defendidos pelo amadorismo, que consistiam no cavalheirismo, no respeito ao adversário, no
deleite da prática do jogo e no respeito às regras previamente acordadas. Se era possível supor
que essa “educação esportiva” era dominada pelos bancários, não se pode dizer o mesmo da
“educação do corpo”. Nesse momento havia uma necessidade grande de se ensinar os
trabalhadores bancários sobre os benefícios que a prática de exercícios físicos poderia lhes
trazer. Assim, diversas advertências sobre o assunto foram feitas através das páginas da Vida
Bancária. Yapo escrevia que “deitar cedo, levantar cedo o mais possivel e não usar nunca o
fumo e o minimo possivel as bebidas alcoolicas são as solidas bases de quem deseja ser um
bom athleta”; ou ainda que “todo esportista, á proporção que melhora o seu physico, deve
envidar todos os esforços para que as suas qualidades moraes tambem se elevem e se
nobilitem”121 . Yapo, aliás, era um dos maiores propagadores das práticas que um sujeito

119
PMN, No ardor da contenda, Vida Bancaria, 56. ed. p. 4, jun. de 1929.
120
Ibid.
121
YAPO, Athletismo, Vida Bancaria, 63. ed. p. 11, jan. de 1930.
57

deveria adotar para se tornar um bom atleta. Ele, em outra edição do jornal, afirmava ser
necessário que:

abandonemos e combatamos o álcool, o fumo, o jogo e os excessos viciosos que são


o cancro horrendo que suga as energias moraes e physicas dos nossos jovens patrícios
e portanto consomem as forças da Nação. Cultivemos o esporte sem excessos e pelo
amor ao esporte!122

No entanto, esse discurso adotado pelo órgão oficial da Associação dos


Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo não parece ter muita conexão com a realidade
das disputas futebolísticas. Um exemplo disso é o encontro amistoso que se deu entre C. E.
Induscomio e E. C. Sudameris, em outubro de 1929, como parte de um Convescote Bancário.
O evento reuniu quase 700 pessoas, contando bancários e seus familiares, no parque da Villa
Galvão, e teve como ponto alto o encontro entre os dois times. Antes do início de um jogo
bastante movimentado – com direito a um gol marcado por jogador próximo à linha de fundo,
com a bola resvalando na trave antes de entrar, e outro em que a bola bateu no travessão e entrou
apenas parcialmente, dando a impressão de que o ponto não havia sido marcado – os quadros
se alinharam no gramado para um troca de gentilezas. O Sudameris ofereceu uma corbélia de
flores ao Induscomio, que retribuiu o gesto oferecendo “aos capitães, juízes, representante da
Liga Bancaria e diretores de ambos os clubes, um delicioso cópo de vinho espumante”123. O
consumo de álcool, demonizado por Yapo, esteve presente antes do início do jogo sem nenhuma
cerimônia. Outro caso emblemático para demonstrar o descolamento entre o discurso de ideal
esportivo e a prática da L.B.E.A. é a cerimônia de premiação do campeonato de 1931.

Realizada em 21 de janeiro de 1932, essa cerimônia contou com a presença de um


grande número de bancários reunidos no salão nobre da Associação dos Bancários de São Paulo
– órgão sindical. Havia ainda representantes da imprensa escalados para cobrir a reunião, o que
demonstra certa distinção da Liga Bancaria perante os veículos de imprensa. Na ocasião, o Dr.
Francisco de Paula Reimão Hellmeister, presidente da Liga, fez um discurso de saudação às
equipes vencedoras do campeonato, Induscomio e British Bank. Após os capitães das equipes
terem recebido os respectivos troféus, era hora de começar a festa. “Aos presentes foi offerecido
grande quantidade de ‘crystallino’ chopp Antarctica o que, naturalmente, veio augmentar o seu
enthusiasmo”124.

122
YAPO, Athletismo, Vida Bancaria, 64. ed. p. 5, fev. de 1930.
123
Match amistoso, Vida Bancaria, 61. ed. p. 4, nov. de 1929.
124
A entrega das taças aos campeões de 1931, Vida Bancaria, 87. ed. p. 3, jan. de 1932.
58

Novamente, contrariando a representação de bons atletas veiculada pela Folha


Bancaria, o que a Liga Bancaria faz é oferecer bebida alcoólica, dessa vez em grande
quantidade, aos presentes na solenidade de premiação do campeonato. Veremos ainda, no
quarto capítulo, que o consumo de álcool era comum em um dos clubes analisados, o Satelite
F. C. Essas práticas nos dão indícios de que, ao contrário do que pregava o ideal higienista de
formação de atletas, em que seria preciso cuidar do corpo e da alimentação para se tornar um
ser humano moral e fisicamente mais habilitado, não encontrava eco nas práticas dos esportistas
bancários do período. Ou seja, a experiência desses sujeitos aparecia distante das representações
sobre a prática esportiva vigentes naquele momento. Acreditamos que, para eles, mais do que
se tornarem atletas com bons rendimentos, de corpos sadios e moral elevada, era a utilização
do tempo livre na participação de ambiente de descontração e de congraçamento entre os pares
que fazia com que se vinculassem aos clubes e disputassem campeonatos. Isso, no entanto, não
quer dizer que eles não buscassem a vitória. Porém, essa vitória não estava necessariamente
atrelada a possuir valores atléticos refinados, como se pregava nas páginas da Vida Bancaria.

Mesmo não parecendo surtir efeito, a propaganda do ideal higienista de esporte


continua forte nas páginas do periódico bancário. Tem início uma campanha para expansão dos
horizontes esportivos. Era preciso não parar no futebol. Olhando-se para outras nações era
possível ver o atraso do esporte bancário brasileiro. Nos Estados Unidos e na Inglaterra, por
exemplo, eram praticadas todas as modalidades esportivas, “encaixadas regularmente nas
diversas estações do anno. Lá, raro é o estabelecimento bancario que não tenha a sua praça de
esportes confortavelmente montada [...].” Até mesmo na vizinha Argentina era possível
encontrar estabelecimentos de crédito “[...] com seus estadios magnificamente montados, com
campos de futebol, de athletismo, quadras de tennis, piscinas, etc.” A Liga Bancaria,

com dois anos apenas de vida, arregimenta ella, sob sua bandeira, nada menos que 13
agremiações, representando 15 Bancos. Si no futebol é ella forte, porque não poderá
ser no cestobol, no athletismo, na natação, no remo, etc.? [....] Uma vez que temos
muitos elementos para tal, atraz dos quaes naturalmente acorrerão muitos outros, não
se justifica o facto de permanecermos unicamente nos campeonatos de futebol [...].125

Já havia ocorrido a tentativa de realização de campeonatos de atletismo e


basquete por parte da L.B.E.A. em 1930, porém os planos não saíram do papel. O campeonato
de basquete demorou mais tempo para ser organizado, mas em 1931 o projeto do campeonato
de atletismo finalmente se concretizou. Muitos eram os benefícios que o “esporte base” poderia
trazer. De maneira geral,

125
Não paremos no futebol, Vida Bancaria, 78. ed. p. 6, abr. de 1931.
59

a corrida a pé, que realiza uma gymnastica pulmonar, attrahente e afficaz, é um dos
exercicios melhores e mais completos, porque é essencialmente sthenico, isto é um
exercício, que provoca augmeno de vigor e actividade e deixa depois do repouso uma
respiração facil, profunda e mais lenta, alem de produzir uma sensação sedativa do
systema nervoso e determinar o desenvolvimento thoracico, muscular e osseo126.

Para os bancários, no entanto, os benefícios do atletismo não paravam por aí. O aprimoramento
físico aparecia como tão importante quanto o da raça. Yapo dizia que

[...] à classe de funccionarios de bancos, composta na sua quasi totalidade de rapazes


de bom preparo e instrução, não escapava o valor do esporte basico, quer na formação
das qualidades physicas, quer no enrijecimento das qualidades moraes do
individuo127.

Se os benefícios físicos do esporte eram importantes para os bancários que


passavam horas do dia fechados nas agências, com má iluminação e pouca ventilação, sem
conforto, com pouco espaço e suscetíveis à tuberculose, os benefícios morais não poderiam ser
considerados menos importantes. Era preciso possuir uma moral elevada para ser bancário.
Afinal, a posição social ocupada por esses sujeitos exigia deles uma moralidade bastante
diferente da exigida de outras categorias de trabalhadores. Retidão de caráter, não envolvimento
com ilicitudes ou agiotagem e ter sempre boa aparência eram apenas algumas dessas exigências.
Desse modo, o discurso de que o esporte ajudava na consagração de um indivíduo física e
moralmente melhor cabia tão bem ao meio bancário.

Em meio à efervescência do esporte bancário, clubes eram criados e dissolvidos


com grande rapidez. O ano de 1930, por exemplo, viu nascer o Esporte Clube Banespa e acabar
o Itelbank Futebol Clube. O primeiro, organizado por funcionários do Banco do Estado de São
Paulo, foi fundado em 12 de março daquele ano, em uma reunião no Salão Nobre do próprio
Banco128. Já em 1932 seu time seria campeão do Torneio Início da L.B.E.A., demonstrando a
força do clube. O Itelbank F. C., por sua vez, não teve a mesma sorte. Como todos os clubes
filiados à Liga, era vinculado a um Banco, no caso, o Ítalo-Belga. Tendo iniciado suas
atividades no Brasil em 1911, o banco foi dissolvido no ano de 1930, fazendo com que o clube
a ele vinculado também se dissolvesse. Assim, o campeonato daquele ano precisou contar com
um disputante a menos no segundo turno. Ainda na profusão de novos clubes, há a mudança de
sede do Clube Banco Commercial. Em 1931 ele se instala no 7º andar do prédio do próprio
banco, tendo em sua vasta e confortável sede “mesas de ping-pong, xadrez, secção de leitura
etc”129. O clube contava ainda com a “boa vontade dos Srs. Superiores do Banco”. Essa parece

126
A corrida, Vida Bancaria, 86. ed. p. 4, dez. de 1931.
127
YAPO, O próximo campeonato bancario, Vida Bancaria, 84. ed. p. 5, out. de 1931.
128
Esporte Clube Banespa: 80 anos de história, São Paulo: [s.n.], Esporte Clube Banespa.
129
A nova sede do clube Banco Commercial, Vida Bancaria, 76. ed. p. 2, fev. de 1931.
60

ser uma postura comum entre os dirigentes bancários. Não encontramos em nenhum momento
resistência de algum banco na formação de equipes esportivas dentro de seus quadros de
funcionários. Até mesmo em relação a existência do Satelite e da A.A.B.B.-São Paulo, o que se
percebe é uma resistência na existência de dois clubes na mesma agência, e não o envolvimento
dos funcionários em equipes esportivas.

Isso não era incomum em outros setores. Em artigo veiculado na Vida Bancaria de
outubro de 1931, retirado da Revista Light, intitulado “Aqui os empregados estão á vontade
com os Chefes” podemos perceber que o esporte também era incentivado nessa empresa.

Outro fator de approximação dos empregados é o sport e nós aqui nos esforçamos o
mais possível em desenvolvel-o. [...] [O torneio esportivo] permitirá aos nossos
empregados a satisfação de apparecer deante das suas familias praticando os seus
sports preferidos. E terão também o prazer de mostrar ás suas familias os seus postos
de trabalho, onde encontram a maior segurança130.

Isso porque, além de proporcionar um corpo física e moralmente melhor, a prática


esportiva ainda ajudava na interação entre funcionários. Porém, apenas se praticado com
cautela. Do contrário, poderia gerar conflitos nos locais de trabalho, como demonstrou Fatima
Antunes ao tratar dos operários-jogadores que, para conseguir serviços melhores e mais leves,
se utilizavam de seu capital esportivo, seja para serem jogadores, seja para serem treinadores131.

Outra mudança importante se deu no esporte bancário nesse período: a filiação à


A.P.E.A. A Associação Paulista de Esportes Athleticos era uma das duas associações
responsáveis pelo esporte na cidade de São Paulo naquele momento. A filiação da L.B.E.A. à
A.P.E.A. pode nos dar indícios de pelo menos três coisas: 1 – A Liga Bancaria possuía alguma
relevância, ainda que apenas numérica (poderia ser uma liga grande para o período) nos meios
esportivos paulistanos, uma vez que fora reconhecida pela máxima instituição esportiva do
estado. A Associação Comercial de Esportes Atléticos – A.C.E.A., também era reconhecida pela
A.P.E.A., e inclusive funcionava em uma sala desta instituição, o que por vezes gerou conflitos
com alguns de seus dirigentes132; 2 – Havia por parte dos esportistas bancários uma busca pela
institucionalização de sua prática esportiva, e o respaldo da A.P.E.A. era o primeiro passo a ser
dado nesse sentido. Isso porque, em 1932 não havia ainda, por parte do Estado, um esforço de
organização do universo esportivo; 3 – A A.P.E.A. tinha a intenção de controlar o máximo

130
HERLYCK, J. C., Aqui os empregados estão á vontade com os chefes, Vida Bancaria, 84. ed. p. 3 e 4, out. de
1931.
131
ANTUNES, Futebol de Fábrica em São Paulo.
132
OLIVEIRA, Gabriela Marta Marques; GÓIS JUNIOR, Edivaldo. Os operários, os negros, os cronistas e o
futebol na imprensa de São Paulo (1930-1934). Movimento (ESEFID/UFRGS), Porto Alegre, v.26, e26050, p.
1-14, 2020.
61

possível o esporte paulistano, já que congregava em torno de si outras associações esportivas


menores. Era interessante para essas associações na medida em que conseguiam o respaldo da
principal organizadora do esporte paulistano, e era interessante para a A.P.E.A. que adquiria o
monopólio da organização esportiva, se tornando grande o suficiente para superar sua rival, a
L.P.F.

A presença feminina nesse universo esportivo era bastante restrita. Na


documentação pesquisada, foi possível perceber que elas eram trabalhadoras dos bancos, porém
não tinham espaço na prática esportiva, pelo menos não na organizada pela L.B.E.A. Elas
participaram, por exemplo, do festival de 4º aniversário do Royal Bank F. C., tomando parte na
“corrida de agulhas”, “laço de gravatas” e nos 75 metros rasos133. Esta é a única menção feita
às mulheres entre os anos analisados134, mas permite supor que havia interesse por parte delas
em participar das provas de atletismo, uma vez que correram os 75 metros rasos no festival.

Até aqui foi possível analisar como a Liga Bancaria de Esportes Athleticos
enxergava a prática esportiva nos meios bancários. Para ela, como explicitado, os esportes eram
uma forma de melhorar física e moralmente os trabalhadores bancários, que frequentavam
locais de trabalho pouco higiênicos, com pouca iluminação e ventilação, e tendo grande
contingente de trabalho. A título de síntese dessa visão de esporte, que corroborava o
pensamento higienista em voga no início dos anos 1930, podemos nos utilizar do artigo de
Cordeiro sobre a “finalidade dos esportes”:

[...]O esporte deve ser cultivado para a saude do corpo e do espírito; applicar na vida
pratica os beneficios que ele proporciona.
Não é só cultival-o fanaticamente, vivendo quase que exclusivamente para elle. Que
vivam para elle, e delle, os profissionais, está muito certo. Mas um amadorr? não.
O esporte, cultivado assim cegamente, traz como consequencia o empedernecimento
do cerebro. Conseguem enrijecer os músculos, mas tornam o cerebro embrutecido ou
rustico; conseguem efficiencia e admiração, mas ás vezes, consequencias
desagradáveis.

133
O 4o anniversário do Royal Bank Club, Vida Bancaria, 86. ed. p. 4, dez. de 1931.
134
É sabido que as mulheres faziam parte dos trabalhadores bancários, porém elas aparecem muito pouco nos
jornais da Associação. Dentre as vezes em que são mencionadas, trata-se de seu trabalho como inferior ao dos
homens, sendo suportado apenas por ser mais barato. O baixo preço faria, inclusive, com que competissem em
situação desleal com os homens. Elas têm alguma voz entre os anos de 1934 e 1935, quando há colunas assinadas
por mulheres. Essas colunas tratam, de maneira geral, de feminismo, de sua situação de vida e trabalho e chamam
outras mulheres para participarem da Associação. É nesse momento que há uma tentativa sistemática de filiação
dessas bancárias, porém, ao que parece, ela é logo deixada de lado e a voz feminina desaparece novamente das
páginas do jornal.
62

Um individuo que só cuida de esporte é um indivíduo nullo para a collectividade: já


pelo espirito quase obtuso, já pela indifferença com que encaram os outros magnos
problemas da collectividade, muitas vezes com desconhecimento completo.
Pratique-se o esporte na sua verdadeira finalidade, traduzindo na moral, no caracter,
no trabalho, na vida collectiva o revigoramento que elle dá ao corpo. O esporte é
indispensavel mas, moderado, bem compreendido e melhor applicado.135

Se não é possível afirmar que essa visão higienista de esporte era consensual entre
os esportistas da L.B.E.A., podemos dizer que ela tinha respaldo pelo menos em parte dos seus
dirigentes, uma vez que eles eram os responsáveis pela seção esportiva do jornal Vida Bancaria.
No entanto, mesmo que esse respaldo existisse no discurso sobre como deveria ser incentivado
e praticado o esporte nos meios bancários, a prática esportiva fugia do modelo esperado, e tinha
conivência da diretoria da Liga para isso, como foi possível perceber com os casos de consumo
de bebida alcóolica pelos atletas. Ia se formando, assim, uma cultura esportiva que ia além da
prática esportiva pura e simples. Ela se ligava, também, aos momentos de sociabilidade dos
bancários, promovendo congraçamento e diversão.

135
CORDEIRO, A finalidade do esporte, Vida Bancaria, 85. ed. p. 3 e 4, nov. de 1931.
63

3. As cisões no interior da categoria e seus reflexos políticos e esportivos

Nos primeiros anos do século XX São Paulo já se destacava na busca por se tornar
uma cidade moderna e proporcionar um estilo de vida europeu para alguns de seus habitantes.
Em meados dos anos 1930 ela já era a cidade mais populosa do país, com seus mais de um
milhão de habitantes. Em suas ruas encontravam-se pessoas das mais diversas esferas sociais,
desde o banqueiro até os “vadios” e mendigos – pessoas que, por falta de colocação no mercado
de trabalho, viviam nas ruas, da mendicância ou de pequenos delitos. Por possuir essas
características, São Paulo foi inclusive um “laboratório” de medidas que visavam conter a
mendicância e a vadiagem: o aparelhamento da polícia, a criação de leis de repressão a pobres
e desocupados e até a institucionalização da assistência social136.

Era no centro da cidade que se localizava a maior parte dos serviços dos quais as
pessoas precisavam. Ali os vadios e as pessoas da alta sociedade se encontravam. Ali, ainda,
podia-se encontrar lojas de roupas importadas, ateliês de costura, livrarias, agências de viagens,
barbearias, cabeleireiros, alfaiatarias, camisarias, leiloeiros, joalherias, cafés, hotéis, teatros,
bancos, enfim, tudo o que se precisava para o sustento de uma vida social ativa e respeitável.
Muitos desses estabelecimentos estavam situados no chamado “Triângulo”, área central da
cidade, formado pelas ruas Direita, XV de Novembro e São Bento. As imagens veiculadas nas
revistas do período davam a entender que a vida urbana paulistana se desenrolava no centro da
cidade, principalmente no “Triângulo” e seu entorno, e que tudo o que se procurasse poderia
ser encontrado ali137.

136
ZANIRATO, Silvia Helena, São Paulo1930/1940: novos atores urbanos e a normatização social, História
Social, v. 7, p. 241–264, 2000, p. 244.
137
BRAGLIA, Nádia Christina, Paulicéia de ontem: as revistas ilustradas e o viver urbano nas primeiras
décadas do século XX, Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2011,
p. 41–43.
64

Mapa 2 – “Triângulo”

Fonte: http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br/PaginasPublicas/_SBC.aspx#

Era por esse local que circulava a maioria dos bancários paulistanos nos anos 1930.
Como vimos no capítulo 1 deste trabalho, a localização de sua Associação, apesar de variar ao
longo do tempo, estava sempre próxima ao centro. Os últimos três endereços estavam,
inclusive, dentro do chamado “Triângulo”. Mas além da Associação, muitos bancos também se
localizavam naquele espaço central da cidade. O Banco de São Paulo e o Banque Française &
Italienne pour l’Amerique de Sud estavam situados à rua XV de Novembro; o Banco do Brasil
tinha sede na rua da Quitanda; o Banco Allemão Transatlântico, o Banco Ítalo-Belga e o
National City Bank of New York situavam-se na rua Álvares Penteado, “dentro” do “Triângulo”;
o Banco do Estado de São Paulo inicia a construção de sua sede na praça Antonio Prado em
1939, mas ela só é concluída em 1947.

Os bancários tinham, então, contato direto com a alta sociedade paulistana não
apenas durante o atendimento aos clientes do banco, mas quando saíam nas ruas próximas a
seus locais de trabalho e encontravam essas pessoas, que se encaminhavam para as boutiques,
hotéis e cafés da região. Se eles não moravam na região central da cidade, era ali que passavam
a maior parte de seu tempo, seja no interior dos bancos, no deslocamento entre a casa e o local
de trabalho, ou na sede da Associação. Eles não faziam parte da alta sociedade que consumia
os produtos e serviços disponíveis no centro da cidade, mas estavam misturados a ela durante
boa parte do dia.
65

Foi nesse local central da cidade que ocorreram muitas das manifestações da greve
dos bancários de 1934. A primeira greve nacional da categoria teve início no dia 5 de julho e
durou dois dias. A reivindicação era pela criação do Instituto de Aposentadoria e Previdência
dos Bancários, o I.A.P.B., negado por banqueiros e pelo governo. Participaram da greve oito
dos dez sindicatos bancários existentes no país – não aderiram ao movimento os sindicatos do
Rio Grande do Sul e da Bahia –, e apenas os funcionários de Banco do Brasil não aderiram ao
movimento, uma vez que pretendiam manter sua caixa de aposentadoria privada. Após os dois
dias de greve, com o compromisso do Estado de criar o Instituto e de que nenhum dos grevistas
seria punido, os bancários encerraram a greve vitoriosamente. O I.A.P.B. foi criado por decreto
no dia 9 de julho do mesmo ano, e foi motivo de orgulho para os bancários.

Imagem 8 - Bancários em frente ao prédio da Gazeta durante a greve de 1934138

Fonte: Cedoc-Bancários, caixa 006, pasta 192.

A criação do I.A.P.B. não foi a única consequência do movimento grevista de 1934.


Esse movimento não foi unânime nem homogêneo dentro da categoria. Assim como dentro do
movimento sindical de maneira mais geral, havia entre os bancários os “amarelos”, corrente
que adotava estratégias sindicais opostas às resoluções dos congressos operários brasileiros, e

138
O prédio Gazeta se localizava na rua Libero Badaró, 4-4A, atual número 651. Foto do dia 05/07/1934.
66

que viam a greve, por exemplo, como último recurso a ser adotado como estratégia de luta 139.
Houve, dessa maneira, desunião dentro da categoria, uma vez que nem todos os bancários
participaram da greve, seja por não enxergarem nesse movimento a melhor forma de
reivindicação, seja porque sofriam maiores pressões de seus chefes para a não adesão ao
movimento.

Os funcionários do Banco do Brasil, por exemplo, não aderiram ao movimento,


nem mesmo em solidariedade aos colegas de outros bancos. O Banco do Brasil possuía uma
caixa de aposentadoria própria, e seus trabalhadores já tinham todos os benefícios que
reivindicavam os demais bancários140. No Banco Commercio e Industria – o Indiscomio –
houve grande repressão aos bancários envolvidos no movimento. Alguns foram transferidos
para outras agência, como foi o caso de um funcionário da agência de Santos que foi enviado
para a agência de Marília. Outra forma de coação utilizada foi a adoção de um abaixo-assinado
para receber assinaturas pela manutenção da Caixa de Aposentadoria do Banco –“[...] que não
lhes garante estabilidade, que deixa ao critério do Banco o quantum da aposentadoria, que
recebe esmolas anuais mesquinhas do mesmo” – colocando seus funcionários contrários à
reivindicação do movimento grevista141. Sobre essa forma de coação, que provavelmente foi
utilizada por outros bancos, dado o artigo publicado na Vida Bancaria de 20 de julho de 1934,
a diretoria do Sindicato fazia o seguinte apelo, em uma circular enviada aos bancários cujos
bancos possuíam caixas particulares:

4º) Dar nossa assinatura, ainda que coagidos, significa trairmos a nós mesmos porque
o Instituto que acaba de ser creado nos assegura a estabilidade no emprego a partir de
dois anos, e a não redução de salario, ao passo que, as Caixas mantidas por esses
Bancos apenas nos garantem abertas as portas da rua.

5º) Nas Caixas Particulares a contribuição dos Bancos é facultativa e irrisoria e a nossa
obrigatoria, não acontecendo o mesmo no nosso Instituto onde ela é determinada
taxativamente142.

A circular pedia aos bancários que se inteirassem dos demais benefícios que o decreto nº 24.615,
de 9 de julho de 1934 proporcionava à categoria, solicitando ainda que repelissem qualquer

139
BATALHA, Claudio H. M., Sindicalismo amarelo, in: Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro – Pós-
1930., Rio de Janeiro: CPDOC/FGV, 2010.
140
A greve dos bancarios, Correio Paulistano, p. 12, 07 de jul. de 1934.
141
O Banco do Comercio e Industria de São Paulo e seus meios de coação, Vida Bancaria, n. 120, p. 6, 20 de jul.
de1934.
142
Circular enviada aos companheiros dos Bancos que mantem Caixas particulares, Vida Bancaria, n. 120, p. 11,
20 de jul. de 1934.
67

exigência, de quem quer que partisse, de alteração da lei, uma vez que ela atendia plenamente
aos anseios da categoria.

Em 31 de agosto foi veiculado um outro artigo tratando novamente de um caso de


coação no Induscomio: o banco havia distribuído gratificações em julho aos seus empregados.
Em agosto completou a gratificação, mas apenas aos funcionários que não haviam participado
do movimento grevista. No artigo é apresentada a carta do presidente do sindicato, Alvaro
Cecchino, ao diretor do banco, dr. Euzébio de Queiróz Mattoso. Nela há uma cobrança sobre a
complementação da gratificação aos demais funcionários do banco, uma vez que essa atitude
do estabelecimento era contrária a legislação vigente. Ao que parece, o banco teria pagado o
restante das gratificações, uma vez que o autor do texto, sob o pseudônimo de Freitag,
parabeniza o banco por ter mandado pagar aos funcionários grevistas o restante das
gratificações143.

As acusações de não adesão ou de tentativa de atrapalhar o movimento grevista


não versavam apenas sobre os banqueiros e diretores de banco. Muitos bancários, ao que parece,
não aderiram à greve e, mais do que isso, se colocaram contrários ao movimento na tentativa
de algum ganho pessoal. Houve diversos artigos tratando dos bancários que traíram “o interesse
da própria prole, pela esperança de uma problematica migalha a mais”144.

Foi nesse momento que teve início, por parte dos bancos, a iniciativa de criação de
um Sindicato Católico dos Bancarios. A ideia, que segundo a Vida Bancaria vinha de um grupo
de “malandros que se prestam ao jogo patronal”, teve como primeira iniciativa a criação de uma
Associação Beneficente. Não tendo aceitação, transformou-se em Sindicato Católico, que
também não vingou. Depois disso, “seguindo ordens dos superiores”, fundou-se o Sindicato
dos Funcionários Bancarios, o Syn-Dikê. Sob o pseudônimo de Cincinatus, um bancário
explicita para o restante dos colegas o que ele pensava ser, efetivamente, o novo sindicato:

[...]O Sindicato dos Funcionarios fica, pois, denunciado, por nós, como um REDUTO
PATRONAL, organisado por lacais sem escrupulos, que pretendem nos vender e que
já estão recebendo pagamento por conta do seu trabalho infame e criminoso, qual o
dos antigos traficantes de escravos...

Alerta, bancarios consciêntes, o SINDICATO DOS BANCARIOS DE S. PAULO é o


ÚNICO que luta realmete pelo “BEM DA CLASSE, COM O DIREITO, E EM
HARMONIA sempre que for possivel. Ele, até aqui, perfeitamente apoiado pela nossa

143
FREITAG, O caso do Comercio e Industria, Vida Bancaria, n. 123, p. 6, 31 de ago. de 1934.
144
SOFOCLES, Vantagens e consciências que se vendem, n. 127, p. 1, 12 de nov. de 1934.
68

UNICÃO, pela nossa COESÃO e pela nossa indefectivel SOLIDARIEDADE, tem


defendido, com segurança e galhardia, os nossos mais legítimos interesses![...]”145

Os bancários que mais aderiram ao Syn-Dikê foram aqueles cujos cargos não
possuíam estabilidade, como conferentes, sub-chefes e chefes, além de outros funcionários que
poderiam ser ameaçados de demissão146. Nas páginas de Vida Bancaria houve intensa
manifestação contrária a existência desse novo sindicato, que tinha como finalidade o “trabalho
divisionista da classe”147. Muito se criticou a criação desse órgão dissidente, porém, nenhuma
palavra se escreveu sobre outra dissidência que se fez existir em virtude das desavenças criadas
pelo movimento grevista de 1934: a Federação Esportiva dos Bancarios (F.E.B.).

Nos capítulos anteriores tratamos da formação da L.B.E.A. e de sua primeira fase


de atuação, momento em que houve o estabelecimento do campeonato de futebol e,
posteriormente, a introdução de outros campeonatos, como o de atletismo. A Liga Bancaria já
parecia estabelecida como uma das muitas ligas esportivas organizadas por uma categoria
profissional na São Paulo dos anos 1930, apesar de seu pouco tempo de atuação, quando, em
1934, eclodiu a greve nacional dos bancários. Como vimos, essa greve não teve, por diversos
motivos, adesão de todos os bancários.

Antes de passarmos a tratar efetivamente da criação da Federação Esportiva dos


Bancarios, se faz importante destacar que entre os anos de 1933 e 1935 houve uma mudança
radical na linha de atuação do Sindicato dos Bancarios. Se até 1933 havia, por parte das
diretorias, uma tentativa de atuação que privilegiava o assistencialismo, com o provimento de
assistência médica, farmacêutica, dentária e jurídica, a partir desse momento esses serviços
passaram a ser reponsabilidade do Estado. Houve a adoção de uma atuação mais militante,
mudança na forma de direção do Sindicato, que passou a ter uma Comissão Executiva de no
mínimo 10 membros, que seria eleita em Assembleia Geral Extraordinária, tendo mandato de
três anos, criando-se assim uma plataforma política148 . Foram eliminados sócios beneméritos,
honorários e avulsos, pois se entendia que tais homenagens contribuíam para a entrega do
sindicato aos patrões149. Houve, ainda nesse momento, a descentralização das atividades, com
a criação de uma série de comissões especiais, como a de Propaganda, a de Beneficência, a Pró-

145
CINCINATUS, O Sindicato dos Funcionarios Bancarios de São Paulo, Vida Bancaria, n. 137, p. 4, 1º de mar.
de 1935.
146
HOLTZ, Syn-Dikê, Vida Bancaria, n. 139, p. 2, 28 de mar. de 1935.
147
CINCINATUS, O Sindicato dos Funcionarios Bancarios de São Paulo.
148
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 111.
149
Ibid., p. 112.
69

Banco Modelo dos Bancários e a da Biblioteca150. A Vida Bancaria, antes composta por contos,
poesias, coluna social etc., passou a ter como finalidade orientar a classe, deixando o formato
de revista que havia sido adotado para voltar ao formato de jornal, semanal e com maior
tiragem151. O resultado dessas medidas foi a manutenção da mobilização das massas
bancárias152.

Preocupada com a mobilização da categoria, houve também uma mudança na linha


editorial do seu órgão oficial. Em um aviso publicado em número de 16 de fevereiro de 1935,
e assinado pela Redação do jornal, fica clara a mudança no que seria publicado em suas páginas.
Lia-se: “‘Vida Bancária’ - órgão oficial deste sindicato, é o seu jornal. Devemos assim utilizá-
lo para assúntos vários - mas sempre assuntos de ordem técnica. Essa redação, por tal motivo,
não se compromete a publicar artigos cujo objeto escape à nossa orientação, como imprensa de
classe”153. Com isso, falou-se pouquíssimo sobre esporte nas páginas da Vida Bancaria entre
1933 e 1935. Com exatidão, foram 14 menções em 53 edições do jornal. Porém, isso não
significa que o esporte bancário havia parado, ou que não havia consonância entre o momento
pelo qual passava a categoria dos bancários – momento de maior mobilização política pela
conquista de direitos – e a prática esportiva. Sendo parte da experiência dos bancários, o
universo esportivo aparece como um local em que as disputas relacionadas ao seu mundo são
colocadas em evidência. Se a Vida Bancaria não nos fornece evidências suficientes para
analisar a organização esportiva bancária nesse momento, os jornais de grande circulação da
cidade nos ajudam a perceber como estava se organizando o esporte bancário em um momento
em que, ao que parece, o esporte havia sido deixado de lado pelos diretores do Sindicato. A
consonância entre o universo esportivo e o sindical era tão grande que durante a greve houve a
suspensão dos jogos do campeonato de futebol da L.B.E.A.154, além da fundação de uma outra
entidade para cuidar do esporte.

A primeira menção que encontramos sobre a celeuma do esporte bancário é do dia


17 de julho de 1934 e aparece no Correio de S. Paulo. Sob o título “A Liga Bancaria de Esportes
Athleticos atingida pelo recente movimento grevista”155 dá notícia da repercussão da greve dos
bancários em seu meio esportivo. A crise teria sido motivada pela saída do Clube Esportivo

150
Para saber mais sobre cada uma das comissões especiais ver: Ibid., p. 114–118.
151
Ibid., p. 113.
152
Ibid., p. 119.
153
A REDAÇÃO, Aviso, Vida Bancaria, n. 136, p. 1, 16 de fev. de 1935.
154
Suspensão dos jogos da Liga Bancaria, Correio Paulistano, p. 8, 07 de jul. de 1934.
155
A Liga Bancaria de Esportes Athleticos atingida pelo recente movimento grevista, Correio de S. Paulo, p. 5,
17 de jul. de 1934.
70

Induscomio da L.B.E.A. em solidariedade a alguns de seus diretores que, “durante a greve, não
adheriram ao movimento classista. A diretoria da L.B.E.A. demitiu esses diretores e com essa
resolução não concordam os moços do Induscomio.” Em circular enviada à imprensa, o C. E.
Indiscomio “acentua a differença que há entre o movimento classista e a finalidade da Liga,
destinada à pratica dos esportes”156.

Fica clara a posição de alguns dos jogadores do C. E. Induscomio, de que não se


deveria misturar futebol e política. Posição essa defendida por diversos atores sociais ao longo
do tempo. Mas seria possível em um liga organizada por um sindicato, que reunia colegas de
trabalho de uma mesma categoria, em um momento de furor político, deixar as discussões e
posições sobre o movimento grevista de lado e apenas praticar o esporte escolhido? A diretoria
da Liga achava que não. Os membros do C. E. Induscomio, e de alguns outros clubes achavam
que sim.

Eles iniciaram, então, a fundação de uma entidade para a prática do esporte


bancário. Uma que tivesse como objetivo único a prática esportiva, diferentemente do que
pensavam da L.B.E.A. O desentendimento entre os diferentes grupos de bancários – favoráveis
e contrários ao posicionamento da Liga sobre os que não aderiram à greve – deixa antever a
ligação entre a esfera profissional e a não profissional dessa categoria na formação da
experiência desse grupo de pessoas que formavam, naquele momento, uma cultura em comum.
Dizer que há a formação de uma cultura em comum não significa que não haja discordância
entre as pessoas que a compartilham, e sim que essas discordâncias se dão a cerca de um objeto
ou objetivo que essas pessoas têm em comum. No caso dos bancários paulistanos, a prática
esportiva na Liga vinculada ao Sindicato.

No dia 24 de julho é veiculada outra notícia sobre a possível cisão do esporte


bancário. Dessa vez faz-se referência a uma circular assinada por “três prestigiosos mentores
do esporte bancario, pertencentes ao Clube E. Induscomio, ao City Bank e ao C. A. Banco de
S. Paulo”, convidando os interessados para uma reunião “as 20 horas e meia, à rua 15 de
Novembro nº 53, 1º andar”157 no dia 25 de julho, quando os dissidentes esperavam formar uma
nova associação. A Federação Esportiva dos Bancarios foi fundada nessa reunião.

No início de agosto a nova entidade já estava filiada à Federação Paulista de Bola


ao Cesto e havia conseguido patrocínio da Federação Paulista de Athletismo (F.P.A.) para

156
Ibid.
157
Está em perspectiva uma scisão no esporte bancário, Correio de S. Paulo, p. 4, 24 de jul. de 1934.
71

realizar o campeonato dessa modalidade158. Além dos três clubes que participaram da reunião
de fundação, outro clube se filiou à F.E.B.: a Associação Athletica Banco do Brasil. Os
funcionários do Banco do Brasil, como vimos, não aderiram ao movimento grevista de 1934
por já possuíram uma caixa de aposentadoria própria e desejarem permanecer com ela. Isso foi
motivo de descontentamento por parte de outros bancários, e explicaria por que essa associação,
que acabara de ser fundada, decidiu filiar-se à entidade dissidente.

A F.E.B. tratou logo de organizar um campeonato de futebol, com partidas


disputadas aos sábados entre os clubes filiados. O campeonato de atletismo, organizado com
apoio da Federação Paulista de Athletismo, não seria restrito aos clubes e atletas filiados. Ao
contrário, em entrevista ao Correio de S. Paulo, o presidente da entidade fazia “um appello a
todos os clubes bancarios, sem distinção de cores partidarias, no sentido de contribuirem
também com sua parcella para o maior brilho da competição”159.

Paralelamente ia acontecendo também o campeonato da L.B.E.A. com o concurso


dos seguintes times: Bancaleman F. C., E. C. Banco Noroeste, C. A. Minasbank, E. C. Banespa,
C. A. Ítalo-Brasileiro, Clube Banco Commercial, Royal Bank Club e London Bank Clube160.
Nesse momento o London Bank Clube era preparado pelo “veterano esportista Sylvio
Lagreca”161, que já havia integrado a seleção brasileira de futebol ao lado de Marcos Mendonça
e Freidenreich162. O jogador da A. A. São Bento fora, na ocasião, capitão e treinador da equipe
brasileira em jogo contra o Exeter City, clube da terceira divisão do campeonato inglês163. Após
seus dias de glória na seleção brasileira, em fins dos anos 1910, na década de 1930 Lagreca
havia se tornado funcionário do Banco de Londres e, é claro, comandante da equipe daquele
estabelecimento que foi, em 1934, campeã do campeonato da Liga Bancaria.

158
A novel Federação Esportiva dos Bancários filiou-se a FPBC, Correio de S. Paulo, p. 4, 10 de ago. de 1934.
159
Alexandre Kassab faz importantes declarações sobre as atividades da Federação Esportiva Bancária, Correio
de S. Paulo, p. 5, 10 de out. de 1934.
160
Campeonato da Liga Bancária, Correio Paulistano, p. 8, 09 de ago. de 1934.
161
Campeonato da Liga Bancária, Correio Paulistano, p. 7, 16 de ago. de 1934.
162
Há 104 anos, Seleção Brasileira vencia primeira partida profissional, 12 de jul. de 2018. Disponível em:
https://www.cbf.com.br/selecao-brasileira/torcedor/jogos-inesqueciveis/ha-104-anos-selecao-brasileira-vencia-
primeira-partida-profissional. Acessado em 26 de mar. de 2020.
163
SILVA, Jonathan, Há 102 anos, nascia uma seleção pentacampeã, Lance!, 21 de jul. de 2016. Disponível em
http://blogs.lance.com.br/gol-de-canela-fc/ha-102-anos-nascia-uma-selecao-pentacampea/. Acessado em 26 de
mar. de 2020.
72

Imagem 9 – Os campeões bancários de 1934164

Fonte: Em brilhante reunião realizada na ultima quinta-feira a Liga Bancaria de Esportes


Athleticos procedeu a entrega dos premios aos campeões de 1934, Correio Paulistano, p.12, 27 de jan. de 1935

Sylvio Lagreca já trabalhava em estabelecimento bancário pelo menos desde 1921,


quando era funcionário do Banco Ultramarino165. Essa informação, juntamente com a de que
ele continuou no trabalho bancário posteriormente, pode ainda ser indício de que os saberes
futebolísticos tinham grande valia naquela sociedade quando se procurava um emprego. Fatima
Antunes166 mostrou como isso ocorria com trabalhadores de fábricas. Será que entre os
trabalhadores de colarinho branco o passado de glorias no futebol também poderia ser de
alguma valia? Não sabemos os motivos que levaram Lagreca a deixar o Banco Ultramarino,
onde trabalhava em 1921 e passar ao Banco de Londres, onde era empregado em 1934. Mais
de dez anos haviam se passado e muitas coisas podem ter ocorrido. Sabemos que o fechamento
do Banco Ultramarino – primeiro motivo para a troca de banco que nos veio à mente – só
ocorreu em 1953167 e, portanto, não foi a causa da troca de estabelecimento por Lagreca. É
possível, então, que juntamente com suas habilidades como funcionário bancário, seu passado

164
De pé, da esquerda para a direita, o presidente do clube, srs. Mallet, Sacoman, Warner, Camargo, Lagreca,
Celio e Tavares; de joelhos, Noffs, Monteiro, Beck, Eduardo e Camarguinho.
165
Liga Bancaria e Comercial, O Independente, p. 2, 26 de abr. de 1921.
166
ANTUNES, Futebol de Fábrica em São Paulo.
167
História do Banco Nacional Ultramarino, disponível em: https://www.cgd.pt/Institucional/Patrimonio-
Historico-CGD/Historia/Pages/Historia-BNU.aspx. Acessado em 31 de mar. de 2020.
73

futebolístico tenha o levado ao Banco de Londres, que possuía um time de futebol participante
da L.B.E.A e que, por certo, gostaria de torna-lo mais competitivo. Não pudemos saber quais
foram os motivos que levaram Lagreca a trocar o Banco Ultramarino pelo Banco de Londres e
dirigir sua equipe. Fato é que enquanto ocorriam os campeonatos de futebol e o London Bank
Club se mantinha na liderança do campeonato da L.B.E.A, a tentativa de organização do
campeonato de atletismo se tornou o epicentro das discussões entre as duas entidades.

No dia 10 de outubro de 1934 foi veiculado um comunicado oficial da Liga


Bancaria acerca da realização do 3º campeonato de atletismo dos bancários, que vinha sendo
anunciado para o dia 21. Nele lia-se:

O campeonato bancario de athletismo, que vem sendo annunciado pela imprensa, não
é patrocinado por esta Liga, entidade oficial dos bancarios, filiada á APEA, e sim pela
Federação Esportiva dos Bancarios, recentemente fundada pelos clubes dissidentes
desta Liga, ou sejam: o Induscomio, Banco de São Paulo e City Bank.

Outrosim, comunicamos que o 3º Campeonato Bancário de Athletismo desta Liga,


está em organização e dentro em breve será fixada a data de sua realização168.

O comunicado aparece após a fala de José Moraes Dutra, veterano esportista


bancário e presidente da comissão de futebol, que visitou a sede do Correio Paulistano para
esclarecer o que acontecia em relação ao campeonato. José afirma que diversos jornais vinham
fazendo propaganda do “3º Campeonato Bancario de Athletismo”, patrocinado pela F.E.B. e
que tal propaganda é errônea e “vem prejudicando grandemente os interesses da entidade
bancaria official”. Isso porque o campeonato a que vinham fazendo referência os jornais não
era patrocinado pela L.B.E.A. e sim pela entidade dissidente. José afirma ainda que “está claro
que, uma agremiação, fundada ha cerca de dois mezes, não póde estar realizando o seu terceiro
campeonato.”

Havia, por parte da F.E.B., a tentativa de se utilizar do histórico de campeonatos de


atletismo da L.B.E.A. para alavancar a realização do que seria o primeiro campeonato de
atletismo na nova entidade. A F.E.B. já tinha, inclusive, conseguido o apoio da Federação
Paulista de Athletismo. O tiro, no entanto, saiu pela culatra.

Após a publicação do comunicado oficial da Liga Bancaria, a F.P.A. decidiu por


não mais patrocinar o campeonato da F.E.B. Realizaria sim um campeonato bancário, mas não

168
A Liga Bancária de Esportes Athléticos promoverá, ainda no próximo mez, o seu campeonato de athletismo
desta temporada, Correio Paulistano, p. 8, 1934.
74

aquele que vinha sendo propagandeado pelos jornais da capital. Quando souberam que se
tratava do campeonato de uma entidade dissidente, os diretores da F.P.A. optaram por enviar
aos bancos um representante para informar sua decisão de fazer um outro campeonato de
atletismo. Assim, o senhor Orlando Della Nina estava percorrendo os bancos da capital para
“inteirar os respectivos directores esportivos da resolução tomada pela Federação, procurando,
ao mesmo tempo, a sua participação”. Ele dizia estar satisfeito com

os animadores resultados da minha campanha, e espero contar, dentro de poucos dias,


com a colaboração de todos os grêmios da classe.

Logo de inicio obtive a adesão do Royal Bank Club, E. C. Banespa, E. C. Banco


Noroeste, Clube Banco Commercial, C. A. Banco de São Paulo, C. E. Induscomio e
City Bank Clube, e agora estou procurando entrar em entendimento com os dirigentes
dos demais clubes para podermos fixar a data da realização do torneio.

[...] A Federação Paulista de Athletismo toma para si o encargo de fazer realizar


annualmente o campeonato da classe, e dessa forma não prejudicará os interesses
desta ou daquela entidade.

Poderão inscrever-se os clubes de uma e de outra entidade [...]”169.

A ideia da Federação Paulista de Athletismo era, então, tomar das mãos das
entidades de classe a realização do campeonato, fazendo com que clubes de ambas
participassem juntos do campeonato promovido por ela. Em nota publicada em meados de
novembro a F.P.A. afirmava que tinha como intenção “harmonizar as duas entidades
bancarias”170. Para isso, tomou como sua, pela primeira vez, a responsabilidade de realizar o
campeonato com o concurso de ambas as entidades, que ficou marcado para o dia 18 de
novembro no campo do Clube Athletico Paulistano. No entanto, o campeonato foi um fracasso,
ficando “muito aquém dos realizados pela Liga Bancaria”171.

A criação da entidade dissidente não foi, assim como tudo que envolvia os bancários
e sua organização no período, uma unanimidade entre os esportistas dos bancos que a fundaram.
O próprio C. E. Induscomio, clube que fez surgir a nova entidade, “não pôde disputar o torneio
[de futebol] em vista dos jogadores não estarem de acôrdo com a decisão tomada pela directoria
[de deixar a Liga Bancaria]”172. Com isso restaram apenas três clubes e o campeonato de futebol

169
A federação Paulista de Athletismo deliberou não patrocinar o campeonato bancario, por ser promovido por
uma entidade dissidente., Correio Paulistano, p. 7, 13 de out. de 1934.
170
Campeonato bancário de atletismo, Correio de S. Paulo, p. 4, 20 de nov. de 1934.
171
Antes da pacificação, a morte da dissidencia, Correio Paulistano, p. 7, 19 de jan. de 1935..
172
Ibid.
75

da F.E.B. foi encerrado em duas semanas. Porém, a entidade não se deu por vencida e filiou-se
a algumas federações, como a de atletismo, a de bola ao cesto e a de natação. Nas palavras de
alguém que escrevia no Correio Paulistano sob o pseudônimo de Sprinter, “os seus dirigentes,
como grandes sonhadores adormecidos com narcoticos, desenharam castellos nas suas mais
extravagantes idéas, pensando transformar a novel entidade de uma grande associação
nacional”173. Porém logo no início as dificuldades começaram a aparecer. Houve o fracasso do
campeonato de futebol e a incapacidade de organizar um time de bola ao cesto que pudesse
disputar o campeonato secundário da cidade. A entidade tinha ainda dificuldades de ordem
técnica como, por exemplo, a falta de uma sede própria onde pudesse realizar suas reuniões. O
incidente do campeonato de atletismo se mostrou, então, a gota d’água que fez degringolar a
ideia de manutenção de uma outra entidade esportiva de bancários. “A toda porta que batiam
recebiam logo a dolorosa negativa [de participação na entidade], porém, o capricho obrigava-
os a prosseguir na campanha iniciada”174. Até que o C. E. Induscomio decidiu por retornar às
fileiras da L.B.E.A. e deu-se notícia de que havia sido marcada para o dia 22 de janeiro de 1935
uma assembleia para tratar da dissolução da F.E.B.

Quase três meses se passaram até que houvesse nova menção da F.E.B. nos jornais,
e foi para dizer que estava “pacificado o esporte bancario”175.

[...] A entidade da rua 15 de Novembro [LBEA], logo após a eleição da directoria que
irá oriental-a no decorrer deste anno, procurou aproximar-se o quanto possivel de
todas as agremiações bancarias, sem distincções nem privilegios, com o fito único de
conseguir a unificação dos esportistas que militam nos varios estabelecimentos de
credito da Paulicéa.

Os primeiros passos foram coroados de pleno exito, harmonizando de forma


satisfatoria os desentendimentos creados com a multiplicidade de entidades.

O nucleo oficial, que ora se encontra sob a presidencia do sr. José Vaz dos Santos
Junior, conhecido batalhador do esporte bancario, conta com uma directoria que está
disposta a se empregar a fundo para o reerguimento do esporte da classe. [...]

O Induscomio e o Banco de S. Paulo já retornaram á Liga, dispostos a cooperar pelo


desenvolvimento e engrandecimento da agremiação official, permanecendo alheio á
situação apenas o City Bank Club176.

173
Ibid.
174
Ibid.
175
Está pacificado o esporte bancário, Correio Paulistano, p. 7, 03 de abr. de 1935.
176
Ibid.
76

A pacificação do esporte bancário parece ter se dado não pelo fim dos
desentendimentos acerca da política bancária e das escolhas dos bancários durante a greve, mas
pelo total fracasso da nova entidade em se estabelecer como uma concorrente à altura da
veterana L.B.E.A. Assim voltaram para seu seio os dissidentes, sob uma direção que dizia ter
interesse em pacificar e unir os esportistas bancários em uma só associação. Finda a dissidência,
os campeonatos de 1935 ocorreram de forma unificada e sem grandes ocorrências. Foram
promovidos seis campeonatos (dois de futebol, um de atletismo, um de bola ao cesto, um de
natação e um de xadrez), “todos num ambiente de franco enthusiasmo e camaradagem
esportiva”177. Ocorreram ainda alguns amistosos interestaduais, nos quais a L.B.E.A. foi sempre
campeã. Nesse ano houve um recorde de inscrição de esportistas na Liga, contando 481 pessoas.

A divisão das entidades esportivas durou apenas alguns meses, bem menos do que
a divisão sindical, mas certamente também teve impactos na experiência dos bancários. A
motivação da cisão foi o pensamento de que a entidade esportiva não deveria misturar seus
objetivos – organizar e fazer acontecer a prática esportiva entre os bancários – com objetivos
políticos gerais da categoria. De modo mais grosseiro, o que os esportistas bancários dissidentes
reivindicavam era que esporte e política não deveriam se misturar. Era o mesmo que defendiam
anarquistas e comunistas no final dos anos 1910 e anos 1920. Eles destacavam os perigos da
prática de futebol pelos trabalhadores, que estariam se desviando da luta operária para gastar
tempo com passatempos burgueses178. Pensavam nesse esporte como “ópio do povo”, que
desvirtuava a luta operária e minava a união da classe179. Ao que parece, os bancários
dissidentes pensavam na organização política como impedimento para o bom andamento dos
campeonatos esportivos, uma vez que um time havia sido impedido de participar do
campeonato de futebol por terem os líderes do estabelecimento em que trabalhavam se recusado
a participar do movimento grevista. Se o princípio do pensamento era diferente – uns defendiam
que a política atrapalhava a prática esportiva, outros, que a prática esportiva atrapalhava a
atuação política – o fim era o mesmo: a impossibilidade de se misturar esporte e política.

Os militantes comunistas perceberam, já em meados dos anos 1920, que o futebol


fazia parte da cultura dos trabalhadores. Desse modo, seria benéfico para a luta se eles
incentivassem a prática futebolística dentro dos sindicatos. Isso porque perceberam que se os
trabalhadores não tivessem acesso ao jogo nas fileiras dos sindicatos, o teriam fora delas, o que

177
As atividades da Liga Bancaria, Vida Bancaria, n. 159, p. 8, 20 de mar. de 1936.
178
DECCA, A vida fora das fábricas: Cotidiano em Sao Paulo (1920/1934), p. 119–120.
179
ANTUNES, Fatima M. R. Ferreira, “Com brasileiro, não há quem possa!”: futebol e identidade nacional
em José Lins do Rego, Mário Filho e Nelson Rodrigues, 1a. ed. São Paulo, SP: Editora UNESP, 2004, p. 26.
77

seria prejudicial. Assim, passaram a incentivar a organização de clubes e ligas próprias 180. Foi
nesse momento que se organizou a L.B.E.A. No entanto, não acreditamos, pela forma de
organização da Associação dos Bancários de São Paulo naquele momento, com cunho
essencialmente assistencialista, que a Liga tenha sido fundada por esses motivos. Nos parece
que sua fundação partiu da reivindicação dos próprios bancários, já organizados em clubes, e
que teve acolhimento da Associação da categoria. Baseamo-nos aqui no fato de que não era
preciso ser filiado à Associação para fazer parte dos clubes e disputar o campeonato da L.B.E.A.

No entanto, entre os anos de 1933 e 1935 o Sindicato dos Bancários passava por
um momento de intensa radicalização da luta política, uma fase de descoberta de qual seria a
identidade daquela categoria de trabalhadores. Na presidência do Sindicato estavam militantes
com influências heterogêneas, que variavam do anarco-sindicalismo ao trotskismo181, que
buscavam organizar a luta política dos bancários e que fizeram diversas reivindicações que
versavam sobre a regulamentação do trabalho bancário, tais quais “a lei das seis horas de
trabalho, classificação por categoria, contrato coletivo de trabalho, salário mínimo, além do
movimento grevista de 1934 que visou à estabilidade e à aposentadoria”182. Nessa nova
compreensão do papel do sindicato, “os bancários deveriam unir-se não apenas entre si, mas
também a todos os trabalhadores proletários”183. No entanto, como vimos, houve nesse
momento uma cisão interna no movimento bancário, minando a tão sonhada união e
culminando na criação do Syn-Dikê e da Federação Esportiva dos Bancarios. Esse momento
apresentou mudanças no modo como o jornal era apresentado tanto em forma – deixa de ser
revista e volta a ser jornal – quanto no conteúdo. Tudo o que parecia “supérfluo”, fora dos ideais
de luta reivindicativa, desaparece de suas páginas184.

A confluência desses fatores – a saber, o desagrado de anarquistas e de parte dos


comunistas com a prática do futebol por trabalhadores, pensando nele como desagregador da
luta; a mudança de linha de atuação do Sindicato; e o desaparecimento da coluna esportiva do
periódico bancário nesse momento – nos faz crer que havia, por parte da direção do Sindicato,

180
DECCA, A vida fora das fábricas: Cotidiano em Sao Paulo (1920/1934); GÓIS JUNIOR; SOARES, Os
comunistas e as práticas de educação física dos jovens na década de 1930 no Rio de Janeiro.
181
GIRARDI JR., Classe média, meritocracia e situação de trabalho: o sindicalismo bancário em São Paulo
(1923-1944), p. 62–63 afirma em nota ser bem pouco provável que existisse uma corrente anrco-sindicalista entre
as lideranças bancárias, uma vez que essa corrente já havia perdido força no movimento sindical naquele momento.
“O que se percebe é uma opção individual, baseada pela leitura de algumas obras importantes das várias
concepções anarco-sindicalistas e assimiladas de maneira eclética.” .
182
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 61.
183
Ibid., p. 62.
184
Ibid., p. 65.
78

a intenção de apagar das páginas de seu órgão oficial a prática esportiva. Isso porque, olhando
para os dezesseis anos analisados neste trabalho, foi apenas no momento de maior furor político
que houve o desaparecimento do esporte das páginas de Vida Bancaria. Assim, acreditamos
que um dos motivos que pode ter levado a direção do Sindicato a suprimir das páginas de seu
jornal a prática esportiva foi o entendimento de que o esporte consistia em assunto de menor
importância, já que aquele se apresentava como um momento de engajamento na luta por
melhorias na condição de vida e de trabalho dos bancários.

Fato é que, para alguns, a luta política estava dificultando a prática do futebol. A solução
que parecia mais fácil era a criação de uma outra liga, em que essas questões não se misturariam.
No entanto, a nova entidade apenas conseguiu mobilizar uma minoria dos clubes bancários, o
que nos leva a crer que o pensamento de que política e futebol não deveriam se misturar não
era comum entre os esportistas bancários. Ou seja, eles não viam, na sua experiência, uma
dissonância entre prática esportiva e atuação política. Não estamos dizendo, é claro, que esse
foi o único fator que fez com que a L.B.E.A. não perdesse força para a F.E.B. O fato de ela ser
a liga veterana, que já tinha reconhecimento no meio esportivo paulistano e que era filiada à
A.P.E.A. certamente também teve influência na manutenção da L.B.E.A. como a liga dos
bancários após a celeuma.

Havia então, no interior da categoria dos bancários, duas formas distintas de se pensar
o esporte. Uma delas era a de que, em um momento de maior furor político, não deveria haver
espaço para tratar da prática esportiva no órgão oficial da categoria. Não se negava a prática
esportiva aos bancários, já que os campeonatos da L.B.E.A. continuaram a ser organizados e
disputados normalmente entre os anos de 1933 e 1935. Provavelmente porque, como vimos, os
líderes sindicais já haviam se dado conta da centralidade dos esportes – em especial o futebol –
na vida dos bancários, e perceberam que a supressão dos esportes faria com que mais pessoas
se afastassem das fileiras do sindicato. No entanto, não havia espaço para discussão dos motivos
da prática, da atualização dos resultados dos jogos ou mesmo para avisos pontuais acerca das
decisões da Liga Bancaria. Nesse momento, esse papel era praticamente restrito à grande
imprensa. A outra forma de encarar o esporte era pensá-lo como um fim em si mesmo, e por
isso, não deveria ser misturado com questões políticas alheias a ele. Esse pensamento fez surgir
outra liga esportiva.

Essas duas formas de se pensar o esporte são faces da mesma moeda, já que buscam
separar questões essenciais para os bancários do período. Ambas acreditavam que esporte e
política não deveriam se misturar, porém privilegiavam cada qual um lado da disputa.
79

Nenhuma, no entanto, levava em consideração que a cultura bancária que se formava tinha
entre suas bases a busca por melhores condições de trabalho e de vida – reivindicadas entre os
anos de 1933 e 1935 por um sindicato bastante militante – e também pela prática esportiva, já
estabelecida entre os bancários e que fazia com que se encontrassem em locais fora do ambiente
de trabalho, para tratar de questões alheias ao trabalho, mas que, congregando membros de uma
mesma categoria de trabalhadores, provavelmente provocava conversas e discussões sobre o
trabalho em seus mais variados vieses. A cultura bancária que se formava era tanto fruto das
ações de reivindicação do sindicato quanto da vivência que aquelas pessoas tinham em seu
tempo livre, quando escolhiam as roupas que vestiriam, as músicas que ouviriam, os locais que
frequentariam, os esportes que praticariam e assistiriam. Demonstração disso é a manutenção
da L.B.E.A. e a criação da F.E.B. em um momento em que os dirigentes do Sindicato pareciam
contrários a dar espaço para a vida esportiva dos bancários.

Além da fundação da F.E.B., esse período viu nascer dois clubes de funcionários
do Banco do Brasil que se filiariam à L.B.E.A. A Associação Athletica Banco do Brasil – São
Paulo(A.A.B.B. - São Paulo)185 foi fundada em 28 de setembro de 1934 por um grupo de
funcionários contínuos– funcionários que exerciam funções subalternas – do Banco do Brasil
com o intuito de formar um time de futebol. Teve como primeiro presidente Luís Roberto
Arruda, chefe da portaria da agência Centro186, e seus primeiros estatutos foram aprovados em
07 de junho de 1935. De acordo com eles, tinha como fins:

a – promover entre os seus associados a solidariedade necessaria em favor da


colletividade; b – proporcionar-lhes a pratica da cultura physica, turismo, reuniões
sociaes, bem como incentivar a cultura intelectual por meio de biblioteca, cursos
praticos de linguas, palestras e conferencias literarias187.

Os associados poderiam ser funcionários do Banco do Brasil, de todas as agências e a


mensalidade ficou estipulada em 3$000 (três mil réis).

A fim de chamar mais sócios para o novo clube, Arruda cede seu posto na
presidência a um funcionário do quadro administrativo da agência e nesse momento assume a
presidência Sylvio Barbosa da Silveira. A ideia era a de que, com mais sócios do quadro
administrativo o clube ganharia prestígio o suficiente para receber ajuda financeira do Banco
do Brasil, facilitando a sua organização e gestão. Como vimos, em 1934 a A.A.B.B. participou
do campeonato de futebol da F.E.B. Em abril de 1935 o clube tem seu pedido de filiação junto

185
Havia, como ainda há, diversas A.A.B.B.s espalhadas pelo Brasil.
186
PONTIN, José Afonso, Satélite: A obra dos homens 1935-1991, São Paulo: Satélite Esporte Clube, 1991,
p. 29.
187
Estatutos da Associação Athletica Banco do Brasil - São Paulo, 1936.
80

à Liga Bancaria aceito188 e passa a representar o Banco do Brasil no campeonato de futebol. A


passagem da diretoria para um funcionário administrativo teve êxito em conseguir mais
associados para o clube. Faltava, no entanto, o financiamento do Banco. Para isso, teve-se a
ideia de convidar a A.A.B.B.-Rio para uma visita a São Paulo. Assim, seria possível chamar a
atenção dos visitantes para o novo clube, abrindo caminho para futuras reivindicações.

Os bancários cariocas passaram os dias 6 e 7 de setembro de 1935 em visita a São


Paulo para a disputa de um torneio poliesportivo. A caravana contou com 105 pessoas, com
homens, mulheres e crianças189. Neste torneio foram disputados xadrez, tênis, bola ao cesto,
futebol e snooker. Os paulistas venceram quatro das cinco modalidades, perdendo apenas no
xadrez. Como forma de retribuição à recepção dos paulistas, os cariocas convidaram a A.A.B.B.
- São Paulo para uma visita à Capital Federal. No dia 21 de outubro de 1935, partem, no
segundo noturno, pouco mais de vinte bancários paulistas rumo ao Rio de Janeiro190. No
entanto, o time de futebol é impedido de ir pelo presidente do clube. Os motivos pelos quais
isso aconteceu são bastante obscuros. O livro Satélite: A obra dos homens – 1935-1991191,
produzido pelo clube, afirma que houve uma conversa entre o presidente Sylvio Barbosa e
alguns representantes do time de futebol, mas os presentes contam cada qual uma versão sobre
o ocorrido. Alguns dizem que Sylvio teria alegado não conseguir hospedar todas as pessoas no
Rio de Janeiro, por isso foi preciso prescindir do time de futebol. Outros, no entanto, dizem que
o time não foi levado por ser constituído por contínuos que eram, em grande parte, negros.

188
Liga Bancaria de Esporte Athleticos - Comunicado Oficial, Correio Paulistano, 24255. ed. p. 8, 19 de abr. de
1935.
189
Os bancarios paulistas victoriosos, Correio Paulistano, 24377. ed. p. 8, 1935.
190
PONTIN, Satélite: A obra dos homens 1935-1991, p. 39; Interior - São Paulo, Jornal do Commercio, 28. ed.
p. 3, 1935.
191
PONTIN, Satélite: A obra dos homens 1935-1991.
81

Imagem 10 – Equipe da A.A.B.B.-SP que enfrentou a A.A.B.B.-Santos em 1934192

Fonte: PONTIN, Satélite: A obra dos homens 1935-1991, p. 29

Imagem 11 – Equipes da A.A.B.B.-São Pualo e A.A.B.B.-Rio durante a excursão à São Paulo,


em 1935

Fonte: PONTIN, Satélite: A obra dos homens 1935-1991, p. 36

192
Em pé: Antonio Paes de Barros, Mello, Penha, Ozéas, Compadre, Milton da Silva Rosa e Luis Roberto Arruda.
Agachados: Fabiano Feitosa de Freitas, Queiróz, Victório Foresti, Jaguaré e João Othoni.
82

Fato é que o time de futebol da A.A.B.B.- São Paulo não foi ao Rio. Enquanto seus
representantes estavam fora da cidade, os futebolistas excluídos da viagem se reuniram e
decidiram fundar um novo clube, que teria como principais componentes “continuos, estafetas
e os demais funcionários da portaria do Banco do Brasil”193. Assim, no dia 21 de outubro de
1935 seria fundado o Satelite Futebol Clube. O nome do clube vem do endereço telegráfico do
Banco do Brasil194. A fim de evitar uma nova exclusão do time, logo na segunda reunião “fica
resolvido que na diretoria do Satelite F. C. só poderão fazer parte os funcionários da portaria
do Banco”195. Foi eleito como primeiro presidente Luís Roberto Arruda, que havia sido também
o primeiro presidente da A.A.B.B. - São Paulo. Decidiu-se ainda que o Satelite só praticaria o
futebol em um primeiro momento, sendo que outros esportes seriam iniciados oportunamente.
Muitos dos jogadores da A.A.B.B. migraram para o Satelite. Essa constatação é possível através
da escalação dos times. A A.A.B.B.196 contava com: Walter; Renato e Modesto; Castorino,
Mello e Costa; Feitosa, Militino, Isidoro, Gradin e Sá; já o Satelite197 tinha em seu elenco:
Tércio; Penha e Militino; Castorino; Mello e Compadre; Feitosa, Vital, Gradim, Ottoni e Sá.
Desse modo, a A.A.B.B. acaba por ficar sem um time de futebol, sendo o Satelite o único
representante do Banco do Brasil nos torneios da Liga Bancaria até os anos 1940.

Os anos entre 1933 e 1935 foram conturbados para o sindicalismo bancário. Como
já explicitamos, esse foi o momento em que houve maior engajamento político por parte dos
diretores do Sindicato. No final de 1934 seu presidente, Alvaro Cechino, foi preso junto com
três funcionários do Sindicato. Eles foram acusados pelos grandes jornais de serem
“comunistas”198. Mesmo após a instituição da Lei nº38, de 04 de abril de 1935 – a Lei de
Segurança Nacional – os líderes bancários continuaram conclamando seus colegas a frequentar
as Assembleias Gerais, e mais prisões foram feitas199. Isso, juntamente com a radicalização do
discurso comunista e o aumento da repressão estatal, fez com que o número de sindicalizados
caísse. A demora em aprovar novos estatutos, que estivessem em consonância com as novas
exigências do Estado, e as pressões exercidas pelo Departamento Estadual de Trabalho fizeram

193
Ata de fundação do Satelite Futebol Clube, 21 de out. de 1935.
194
Esse não foi o primeiro clube representante do Banco do Brasil assim batizado. Havia outros Satélites Brasil
afora. O de São Paulo, no entanto, foi o único que não se fundiu à A.A.B.B. em algum momento de sua história.
195
Ata de fundação do Satelite Futebol Clube.
196
Esse foi o time que disputou o torneio contra a A.A.B.B.-Rio. Competição entre bancarios do Rio e de São
Paulo, O Estado de S. Paulo, 20213. ed. p. 10, 7 de set. de 1935.
197
Time que participou do primeiro jogo do Satélite pela Liga Bancária, em maio de 1936, contra o C. A. Banco
de São Paulo. Campeonato Bancario de Futebol, Correio Paulistano, 24591. ed. p. 12, 19 de mai. de 1936.
198
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 67.
199
Ibid., p. 68.
83

com que a diretoria do Sindicato renunciasse no final de 1935200. O medo de que o Sindicato
fosse posto na ilegalidade fez com que os diretores deixassem seus cargos, assumindo o controle
uma Junta Governativa, situação da qual os bancários só sairiam quase dez anos depois.

As desavenças esportivas vividas nesses anos, apesar de completamente


suprimidas das páginas da Vida Bancaria – que naquele momento utilizava seu valioso espaço
para a defesa de ideais políticos como a crítica ao estado burguês, além da defesa melhores
condições de vida e de trabalho para a categoria dos bancários – dão indícios de que o universo
esportivo não estava descolado da realidade política vivida pelos bancários. Ao contrário, as
dificuldades e dilemas enfrentados pelos bancários, como a não adesão de alguns à greve, ou a
segregação baseada em questões de status de trabalho e de raça, fizeram com que
acontecimentos e mudanças importantes ocorressem em seu mundo esportivo, como foi o caso
da fundação de uma entidade dissidente para organizar o esporte bancário e cuidar “apenas” de
questões esportivas, ou a fundação de um outro clube por funcionários subalternos de um dos
mais importantes bancos brasileiros por terem sido excluídos do clube que haviam fundado.
Esses acontecimentos, que contaram com a agência de sujeitos que se sentiram lesados pela
forma como estava se organizando o universo esportivo do qual faziam parte, não nos parecem
ter atuado como fator de alienação para os envolvidos. Fazendo parte da cultura e experiência
daqueles sujeitos, se apresentou como mais um espaço em que eles poderiam se organizar e
reivindicar mudanças que fizessem sentido a eles e ao seu mundo.

200
GIRARDI JR., Classe média, meritocracia e situação de trabalho: o sindicalismo bancário em São Paulo
(1923-1944), p. 70.
84

4. A socialização através do esporte

O ano de 1935 terminou com o pedido de renúncia da diretoria do Sindicato, em


assembleia do dia 14 de dezembro. Em julho daquele ano201 a diretoria havia encaminhado os
novos estatutos, alinhados à nova lei de sindicalização (Lei nº 24.694, de 12 de julho de 1934)
ao Departamento Estadual do Trabalho – D.E.T. –, porém até dezembro os estatutos ainda não
haviam chegado ao Ministério do Trabalho para a aprovação. Isso colocava em xeque a
existência legal do Sindicato, uma vez que era necessária a aprovação dos estatutos pelo
Ministério do Trabalho para que ele permanecesse na legalidade. Os líderes sindicais, então,
cedem às pressões do D.E.T. e deixam a direção.

No pedido de renúncia, dizia-se que há mais de um ano os novos estatutos passavam


pelos processos burocráticos cabíveis e que, apesar dos esforços da diretoria, ainda não haviam
chegado ao Ministério do Trabalho. Por isso, sabendo da impossibilidade de alcançar o
resultado adequado – ou seja, a aprovação dos estatutos – a diretoria apresentava sua renúncia,
e propunha sua substituição por uma Junta Governativa Provisória, “que se coloque a frente dos
negócios do sindicato até que se obtenha o reconhecimento dos seus novos estatutos” 202. Os
membros da Junta Governativa Provisória foram aclamados por unanimidade. Na mesma
edição de Vida Bancaria há um carta “Aos bancarios”203, assinada por alguns membros da Junta
Governativa Provisória, que afirmavam ser sua missão essencial a administração do Sindicato
até que os estatutos fossem regularizados pelo Ministério do Trabalho, o que – eles acreditavam
– seria rápido, e, então, se realizaria uma eleição para a direção sindical.

Porém, em 10 de fevereiro de 1936, a Junta Governativa Provisória apresentou o


seu pedido de demissão coletiva, alegando que, apesar dos esforços envidados na tentativa de
aprovação dos estatutos, nada havia sido conseguido no Ministério do Trabalho, e que foram
informados, após várias tentativas de contato com o Ministério, que sua “permanencia na
direção do Sindicato representava o principal obstaculo á almejada aprovação”204. Assim,
novamente, o comando do Sindicato era passado a uma Junta Governativa Provisória. Dessa
vez, no entanto, a mudança de orientação na administração sindical é explicitada logo na
primeira edição de seu órgão oficial após a assunção da Junta. Em seus termos:

201
Relatório da gestão de 1935, apresentado pela diretoria á Assembleia Geral de 14 de dezembro de 1935, Vida
Bancaria, n. 156, p. 2, 18 de dez. de 1935.
202
O que se passou na nossa assembleia de 14 ultimo, Vida Bancaria, n. 156, p. 3 e 4, 18 de dez. de 1935.
203
A JUNTA GOVERNATIVA, Aos bancarios, Vida Bancaria, n. 156, p. 4, 18 de dez. de 1935.
204
A JUNTA GOVERNATIVA, Explicação necessaria, Vida Bancaria, n. 158, p. 1, 10 de fev. de 1936.
85

[...] a orientação do Syndicato dos Bancarios de São Paulo está completamente


modificada.
As nossas diretrizes, em defesa dos nossos direitos e pela conquista da nossa melhoria,
serão outras bem differentes daquellas que foram e vieram sendo adoptadas ha trez
annos e que redundaram na collocação da nossa instituição na illegalidade,
acarretando para toda a classe, em primeiro logar a desunião que prevíramos, depois
a formação de outra agremiação por elementos que se sentiam mal em nosso meio e
que não podiam combater a orientação vigente, por inefficiencia de meios, dada a
intolerancia, então dominante205.

Fica clara a proposta da nova Junta Governativa Provisória. Modificar a orientação política do
sindicato, sua forma de atuação e de reivindicação, pois avaliavam que fora a maneira como a
antiga diretoria conduzira o Sindicato que havia o levado àquela situação. Em entrevista ao
Diário Popular, reproduzida pela Vida Bancaria, o presidente da Junta Governativa Provisória,
Francisco Reimão Hellmeister, deixa claro o que se pretendia com a nova administração:
conciliação. Para Reimão conciliação seria “o acordo de interesses reciprocos, entre
empregadores e empregados, baseado nos termos insophismaveis das leis”206. Ou seja, apenas
a conciliação de interesses de empregados e empregadores seria capaz de alterar a forma como
o Sindicato vinha sendo conduzido desde 1933 e que o teria levado a situação em que se
encontrava.

A Junta Governativa que assumiu trabalhou para fazer com que os estatutos
convergissem com os interesses do D.E.T. Para isso, havia uma “colaboração com o Estado e a
negação de qualquer antagonismo entre capital e trabalho”207. Ela não media esforços para se
adequar à nova ordem. Para garantir a continuação das atividades do Sindicato, a junta entregou
uma lista de seus associados à Delegacia de Ordem Política e Social – D.O.P.S. – e se calou
diante da demissão sumária de 26 bancários208. Em maio de 1936 foi publicado um artigo,
assinado pela Junta Governativa Provisória, afirmando que o D.E.T. conhecia bem os atuais
dirigentes do Sindicato e que a D.O.P.S. sabia “perfeitamente o que é a classe bancaria e que
ella tendo á frente a actual Junta Governativa não vacillará em dar seu apoio integral para a
manutenção das Instituições vigentes, pregando pela paz e pela ordem, para a grandeza de nossa
Patria”209. No mesmo mês começaram a circular na imprensa notícias de que o Sindicato seria
fechado pois “todos os seus associados professam idéas não condizentes com o Regime”, e que
os elementos “não contaminados do mal se retiraram daquelle Syndicato, para ir fundar um

205
A JUNTA GOVERNATIVA, Nova orientação syndicalista, Vida Bancaria, n. 159, p. 1, 20 de mar. de 1936.
206
Entrevista do Presidente da Junta Governativa Provisoria com o “Diario Popular”, Vida Bancaria, n. 159, p. 4,
20 de mar. de 1936.
207
CANEDO, O Sindicalismo Bancário em São Paulo: 1923-1944, p. 120.
208
GIRARDI JR., Classe média, meritocracia e situação de trabalho: o sindicalismo bancário em São Paulo
(1923-1944), p. 54.
209
A JUNTA GOVERNATIVA, Revidando Ataques, Vida Bancaria, n. 160, p. 1, 15 de maio de 1936.
86

outro, conhecido pelo nome de ‘Syndiké’”. Essas informações são contestadas por outra
publicação, na mesma edição de Vida Bancaria. Nela, afirmava-se que a nova Junta
Governativa “está procedendo a uma verdadeira obra social de saneamento, expurgando de seu
seio os elementos considerados subversivos”210. Além disso, atrelava-se o não fechamento do
Sindicato ao fato de que a Delegacia de Ordem Política e Social conhecia os membros da
“classe bancaria”, e os atuais dirigentes da sua “Associação de Classe”211. Afirmava-se ainda
que os elementos que não estavam dispostos a “combater a orientação errada” do Sindicato
haviam se retirado e fundado outra associação.

O manifesto da Junta Governativa Provisória, explicitava seus principais pontos de


ação. O tom do documento é, novamente, de conciliação. Entre as frentes de ação apontadas
estão a incrementação da seção de cultura física, “entrando em entendimento com a Liga
Bancaria de Esportes Athleticos”, incrementar a seção de cultura intelectual, “com a acquisção
dos melhores livros sobre os mais variados assunptos e realização de palestras e conferencias”,
“proporcionar na séde, jogos de salão, como xadrez, dama, ludo, ping-pong, bilhar, etc” e
fiscalizar o cumprimento das leis sociais já existentes, como “seis horas [,] férias,
syndicalização, aposentadoria, etc...”212. Dentro desse esforço conciliatório, em meados de
1939 houve a união dos dois sindicatos representantes dos bancários em São Paulo, selando-se
a união e conciliação da categoria213. Essa união fez com que o órgão oficial do Sindicato
mudasse de nome, passando a se chamar Folha Bancaria. Em 1941 mais uma alteração é feita
no nome da associação, que passa a se chamar Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos
Bancários214.

É nesse momento de mudança na orientação sindical que o esporte, ou, utilizando


as palavras do manifesto, a cultura física, e os jogos de salão ganham destaque novamente na
política sindical. O que pretendemos nesse capítulo é analisar de que maneira, em um momento
em que há maior adequação da atuação do Sindicato ao projeto governamental, o esporte foi
reinserido nas páginas do seu órgão oficial e como ele fez parte da construção da cultura dos
bancários durante o Estado Novo. Para isso trataremos primeiro, brevemente, do Estado Novo
e de sua política em relação aos esportes.

210
Desfazendo boatos de que o Syndicato dos Bancarios de São Paulo será fechado, Vida Bancaria, n. 160, p. 3,
15 de maio de 1936.
211
Ibid.
212
HELLMEISTER, Francisco P. Reimão, À classe bancaria, Vida Bancaria, n. 159, p. 6, 20 de mar. de 1936.
213
Ainda a fusão dos sindicatos bancarios dessa capital, Vida Bancaria, n. 177, p. 6, 06 de jun. de 1939.
214
Adaptação do Sindicato a Lei 1402, Folha Bancaria, n. 6, p. 2, fev. de 1941.
87

Em 10 de novembro de 1937, sob o comando de Getúlio Vargas e com apoio de


forças antidemocráticas e do Exército, é deflagrado o golpe que daria origem ao Estado Novo.
Havia, a partir daí, a tentativa de romper com um passado atrasado e dar início a um novo
momento da história do país215, consolidando-se uma política de massas que já vinha sendo
ensaiada desde o início da década216. Maria Helena Capelato217 propõe a divisão do período do
Estado Novo em dois momentos distintos. Os anos entre 1937 e 1942, que são caracterizados
pelas reformas e pela tentativa de legitimação do novo regime, e os anos entre 1942 e 1945, que
mostram as contradições de um regime que, ao entrar na 2ª Guerra Mundial contra as potências
do Eixo, se encontrava na necessidade de romper com algumas práticas até então utilizadas,
como a centralização política e a aproximação, ainda que negada, às políticas fascistas. Nesse
segundo momento, houve uma tentativa mais direta de aproximação com as classes
trabalhadoras em busca de apoio.

Após o golpe de 1937, foram abolidos os partidos políticos e o Parlamento,


colocando-se fim aos intermediários entre o governo e povo. Houve intervenção direta nos
estados, através da nomeação de interventores da confiança de Getúlio Vargas 218. A fim de
assegurar a legitimidade do novo governo, foram utilizadas a propaganda política
governamental e a repressão aos opositores219. Foi nesse momento que a legislação trabalhista
ganhou destaque. Inspirada na “Carta Del Lavoro”, da Itália fascista, ela visava a
regulamentação de conflitos entre empregadores e empregados, além de controlar as atividades
sindicais que, até aqui, eram independentes.

O ano de 1942 viu nascer uma lei que visava a sistematização de diversas leis
referentes ao mundo do trabalho, como a do “salário mínimo, férias, limitação de horas de
trabalho, segurança, carteira de trabalho, justiça do trabalho, tutela dos sindicatos ao Ministério
do Trabalho”220: a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Ela representava, “de um lado,
o atendimento das reivindicações operárias que foram objeto de intensa luta da categoria por
diversas décadas, e, de outro, o controle, através do Estado, das atividades independentes da
classe trabalhadora, que acabou perdendo autonomia através do controle estatal”221.

215
DRUMOND, Estado novo e esporte, p. 104.
216
CAPELATO, Maria Helena, O Estado Novo: o que trouxe de novo?, in: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila
de Almeida Neves (Orgs.), O tempo do nacional-estatismo: do início da década de 1930 ao apogeu do Estado
Novo., 7. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015, p. 110.
217
Ibid., p. 113.
218
Ibid., p. 116.
219
Ibid., p. 117.
220
Ibid., p. 121.
221
Ibid.
88

Em 31 de agosto de 1942, como já dito, o Brasil declara guerra contra Alemanha e


Itália, posicionando-se a favor dos Aliados. Nesse momento intensifica-se o apoio ao líder do
Estado Novo, e até mesmo o Partido Comunista “definiu-se pela ‘união nacional’ em torno do
chefe de governo”222. Porém, com o final da guerra, a derrota das potências do Eixo colocou
em evidência as contradições do regime instalado no Brasil em 1937. Internamente, havia
atitudes e propostas políticas semelhantes às dos regimes autoritários derrotados. Externamente,
a defesa da democracia. Isso fez enfraquecer a figura de Vargas, que ganhara prestígio nos anos
anteriores, deixando explícita a oposição ao regime. Os getulistas, ao perceberem a
impossibilidade de manutenção do regime, passaram a tentar fazer parecer que a
redemocratização passava pelas mãos desse Estado. A partir de 1943 as manifestações
contrárias ao regime e favoráveis à liberdade começaram a acontecer223. Em 1945 se contradizia
abertamente o Estado Novo, como é possível perceber na entrevista concedida à Folha
Bancaria pelo senhor Abeleio Bittencourt Dias, ex-presidente do Sindicato dos Bancarios de
Santos, na qual ele afirma que “os bancarios nada devem ao Estado Novo”224.

Uma das estratégias utilizadas pelo Estado Novo na tentativa de aproximação com
o povo foi a utilização do esporte. Os estádios de São Januário, no Rio de Janeiro e do
Pacaembu, em São Paulo foram utilizados diversas vezes por Vargas em aparições públicas,
principalmente nas comemorações de 1º de Maio. Porém, essa não foi a única forma de
apropriação do esporte pelo Estado Novo. O esporte era visto como “escola de qualidades
essenciais”225 para a formação de bom cidadão, afastando seus praticantes de hábitos nocivos e
os conduzindo para o caminho do caráter e do corpo são. Esse não era um discurso novo. Vimos
no capítulo 2 que esse era o pensamento vigente no início dos anos 1930, e que sustentava, pelo
menos de maneira teórica – uma vez que vimos que as formas de prática esportiva não estavam
necessariamente pautadas pela teoria defendida pela L.B.E.A. –, a prática esportiva dos
bancários. A novidade aqui é a utilização dessa visão de esporte como parte do projeto político
do país. Houve ainda a tentativa de tutelar a prática esportiva dos trabalhadores, como mostrou
Ângela Bretas226 ao analisa o Serviço de Recreação Operária – S.R.O., criado em 1943, sob
responsabilidade do Estado, com o objetivo de coordenar a recreação e prestar assistência aos
sindicatos. Ou seja: pretendia-se aumentar o controle do Estado sobre os trabalhadores. O

222
Ibid., p. 135.
223
Ibid., p. 136–138.
224
Os bancarios nada devem..., Folha Bancaria, n. 24, p. 7, maio de 1945.
225
DRUMOND, Estado novo e esporte, p. 119.
226
BRÊTAS, Ângela, O Serviço de Recreação Operária - 1943-1945: uma experiência do governo Vargas no
campo do não-trabalho, Cadernos AEL, 2010.
89

esporte seria, assim, “o meio pelo qual se daria não apenas o aperfeiçoamento físico, mas
também o processo de socialização fundamental para o trabalho em equipe nas oficinas e
empresas”227. Mauricio Drumond228 nos mostra que as tentativas de tutela do esporte,
principalmente a partir da educação física da juventude e da organização do universo esportivo
dos trabalhadores pelo Estado Novo brasileiro foram menos bem sucedidas do que a do Estado
Novo português, onde a criação da Mocidade Portuguesa e da Fundação Nacional para a Alegria
no Trabalho tiveram maior centralidade no regime. No entanto, o autor demonstra pontos de
contato importantes entre as políticas esportivas de Vargas e Salazar. Porém, para além das
tentativas institucionais de efetivação das práticas esportivas, os trabalhadores possuíam um
universo esportivo próprio, que tinha, evidentemente, relação com o universo esportivo geral,
mas que, defendemos, guardava algumas especificidades. Aqui, viemos tentando analisá-las a
partir do caso dos bancários paulistanos. Vamos a eles, então.

Esses foram anos marcados por um aumento no incentivo dos chamados “jogos de
salão”: xadrez, snooker e ping-pong. Era preciso frequentar a sede, “tomar parte nas diversões
nela existentes, estreitando assim os laços de camaradagem que devem existir entre nossos
colegas”229. Passam a ser realizados campeonatos dessas modalidades, que parecem ter grande
aderência dos bancários, incentivando a compra de mesas pelo Sindicato. No entanto, o carro
chefe do esporte bancário continuava sendo o futebol.

227
DRUMOND, Estado novo e esporte, p. 144.
228
DRUMOND, Estado novo e esporte.
229
[sem título], Vida Bancaria, n. 163, p. 4, 30 de set. de 1936.
90

Imagem 12 – Torneio de Xadrez230

Fonte: Torneio de Xadrez, Vida Bancaria, p.13, jun. de 1940

Os campeonatos de futebol da L.B.E.A. continuavam sendo bastante disputados, e,


nesse momento, voltam a ter atenção do órgão oficial do Sindicato. Em 1941 a seção esportiva
do jornal passa a se chamar Folha Esportiva, e chega a conter até 3 páginas, nas quais eram
descritos com detalhes os próximos passos dos campeonatos – sempre com destaque para o
futebol – e os acontecimentos das rodadas anteriores. Entre 1936 e 1945 participaram do
campeonato, não todos ao mesmo tempo, os seguintes clubes: A. A. Banco do Brasil (que
disputou o campeonato pela primeira vez em 1942), A. A. Banco Nacional do Commercio,
Bancaleman F. C., Banco Português do Brasil A. C., C. A. Banco de São Paulo, C. A.
Minasbank, C. E. Banco Nacional Ultramarino, C.A. Germanico, City Bank Club, E. C. Banco
Italo Brasileiro, E. C. Banco Mercantil, E. C. Banco Noroeste, E. C. Bancolanda, E. C.
Banespa, London Bank Club, Satelite F.C. e E. C. Sudameris.

O atletismo também contava com boa participação dos bancários paulistanos. É


possível perceber um crescimento no interesse por essa modalidade. Em 1931, primeiro ano do
campeonato de atletismo, havia 6 clubes na disputa, com 54 atletas. O vencedor nesse ano foi

230
Flagrante da partida simultanea dirigida pelo bravo representante do Clube Xadrez São Paulo, Snr. Arrigo
Prodoscini, e entrega da taça ao E. C. Banespa, vencedor do torneio instituido pela Liga Bancaria.
91

o Clube Banco Commercial. Em 1933, na segunda edição do Campeonato, havia 71 atletas na


disputa, sendo vencido pelo Induscomio. 1934, como vimos, foi o ano da celeuma bancária, que
atingiu o Sindicato e a L.B.E.A. fazendo com que o Campeonato de Atletismo daquele ano fosse
organizado pela F.P.A., tendo tido pouca aderência dos bancários. Esse campeonato teve o C.
A. Banco de São Paulo como campeão. No ano seguinte o Campeonato também teve pouca
aderência, contando apenas com 43 atletas na disputa, ficando muito aquém das expectativas
da L.B.E.A. Novamente, o campeão foi o C. A. Banco de São Paulo. Os dois anos que seguem
não viram a realização do Campeonato de Atletismo, por “motivos de força maior”231, que não
foram explicitados nas páginas da Vida Bancaria. Em 1939, já no final de seu mandato, a
diretoria da Liga organizou a quinta edição do Campeonato, que foi realizado em 1940, com o
concurso de 86 homens tendo sido vencido novamente pelo C. A. Banco de São Paulo. Foi
lançada nesse ano a taça XVI de abril – data da fundação do Sindicato – que seria concedida ao
clube que vencesse o campeonato por duas vezes consecutivas ou por 3 vezes alternadas. O
troféu ficou em posse do C. A. Banco de São Paulo, vencedor das duas últimas edições do
campeonato. No VI Campeonato de Atletismo, em 1941, puderam tomar parte todos os
funcionários de Bancos, Casas Bancárias e Caixas Econômicas, desde que contribuíssem com
o I.A.P.B. Assim, atletas de clubes filiados ou não à L.B.E.A. poderiam participar da disputa.
Nessa edição, seis recordes bancários foram batidos, demonstrando que “os bancarios
consideram o esporte uma cousa bastante séria”232. Houve grande número de pessoas nas
arquibancadas233, como é possível constatar pela fotografia a seguir.

231
Atletismo, Folha Bancaria, n. 4, p. 11, jun. de 1940.
232
O C. A. Banco de São Paulo venceu o 6o Campeonato Bancario de Atletismo, Folha Bancaria, n. 7, p. 12, jun.
de 1941.
233
É provável que esse campeonato tenha ocorrido na pista de atletismo do Clube Esperia, na Ponte Grande. O
que será o sexto Campeonato Bancario de Atletismo, Folha Bancaria, n. 6, p. 13, 1941.
92

Imagem 13 – Aspecto dos assistentes e participantes do 6º Campeonato Bancario de


Atletismo

Fonte: O C. A. Banco de São Paulo venceu o 6o Campeonato Bancario de Atletismo, Folha


Bancaria, n. 7, p. 12, jun. de 1941.

O Campeonato de 1942, último realizado dentro do nosso período de estudo, contou


com a inscrição de cinco novos clubes, o do Banco Mercantil, London Bank, Bancolanda, Italo-
Brasilero e Satelite F.C.234. Esse último, apesar do pouco tempo de treino que teve, se destacou,
tendo até mesmo vencido alguns clubes veteranos, servindo “de exemplo para os demais
filiados”235.

Mas mais importante aqui do que a descrição de cada um desses campeonatos, são
os encontros entre paulistas e cariocas. A Liga Bancaria de Esportes – L.B.E., entidade

234
O 7o campeonato bancario de atletismo, Folha Bancaria, n. 9, p. 8, maio de 1942.
235
O 7o Campeonato Bancario de Atletismo, Folha Bancaria, n. 10, p. 6, jun. de 1942.
93

organizadora do esporte bancário no Rio de Janeiro, foi fundada em 05 de abril de 1936, oito
anos após a sua coirmã paulista, mas vinha tendo grande êxito até então236.

Os encontros foram iniciados em outubro de 1938, quando os selecionados de


bola ao cesto e futebol de São Paulo foram ao Rio de Janeiro disputar com os selecionados
cariocas dessas modalidades. A Vida Bancaria não aponta o vencedor das disputas, dando a
entender que essa informação é a menos relevante, uma vez que o encontro esportivo serviria
para a boa amizade entre os bancários. Uma retribuição da visita é feita pelos cariocas em
dezembro do mesmo ano, novamente contando com selecionados de futebol e bola ao cesto.
Dessa vez nos são apresentados os resultados dos jogos: a seleção carioca saiu na frente no jogo
de futebol, disputado no estádio do E. C. Corinthians Paulista, mas os paulistas viraram o jogo,
que terminou em 3x1, dando a eles a taça “Paulo Tavares”. Houve nesse jogo “uma das maiores
assistencias dos ultimos tempos, a qual não poupou aplausos fervorosos a ambos os quadros”237.
No jogo de bola ao cesto, realizado na sede do E. C. Banespa, foram os cariocas os campeões,
por 39x28. O autor do texto, sob o pseudônimo de El-Maestro, fazia votos para que os próximos
encontros não ficassem restritos a essas duas modalidades, já que o esporte “além de ser
propulsor e entrelaçador da sã amizade, é também salutar e aperfeiçoador da coletividade”238.

Imagem 14 – A turma dos bancários paulistas que venceu no Rio

Fonte: Jogam hoje, no campo do Parque S. Jorge, os bancarios do Rio e de São Paulo, Correio Paulistano, p.12,
17 de dez. de 1938.

236
MELLO, Waldemar Ferreira, O 5o aniversário da “Liga Bancária de Esportes Metropolitana”, Folha Bancaria,
n. 7, p. 13, jun. de 1941.
237
EL MAESTRO, Esporte, Vida Bancaria, n. 175, p. 2, jan. de 1939.
238
Ibid.
94

No ano seguinte, novamente, paulista e cariocas se encontram, em ambas as


cidades, para a disputa de mais jogos. Dessa vez foram disputados futebol, bola ao cesto e tênis.
Na notícia sobre a ida dos paulistas ao Rio fica explicitado que os integrantes da L.B.E.A.
chegariam a São Paulo de manhã, “de modo a evitar que os componentes da embaixada percam
o horário de serviço nos bancos”239, deixando claro que a adesão à prática esportiva não traria
nenhum tipo de prejuízo para trabalhador e empregador. Aproveitou-se a ida dos paulistas ao
Rio também para fundar-se Federação Bancaria Brasileira de Esportes – F.B.B.E., uma
entidade bancária nacional para a organização dos esportes da categoria. Em um primeiro
momento tomariam parte da nova entidade cariocas, paulistas e fluminenses. A ideia era a de
que, em um segundo momento, mais estados pudessem aderir, formando-se assim um
campeonato nacional. Tentar-se-ia, ainda, um intercâmbio com os bancários platinos, para a
realização de um campeonato sul-americano240. Aproveitando a ida à Argentina para
acompanhar a delegação de bola ao cesto que participou do Campeonato Sul-Americano de
Cestobol em Mendoza, Adolpho Scherman, alto funcionário do Banco do Brasil no Rio de
Janeiro e presidente da L.B.E. e da F.B.B.E. se reuniu com o presidente da Asociación Bancaria
Argentina de Desportes – A.B.A.D241 – com quem tratou da possibilidade de se fazer realizar
em outubro um campeonato sul-americano de esportes bancários, uma vez que os argentinos
pensavam em convidar esportistas bancários do Brasil, Uruguai, Chile, Bolívia e Peru para
participar das comemorações dos 50 anos do Banco de la Nación. Nesse encontro ficou ainda
acertado um campeonato de lances livres por correspondência entre brasileiros, argentinos e
uruguaios242.

239
Esporte, Folha Bancaria, n. 5, p. 13, ago. de 1940.
240
Ibid.
241
Essa associação foi fundada em Buenos Aires em 1913.
242
A regulamentação dos esportes trouxe um grande impulso á vida esportiva dos bancarios, Correio Paulistano,
p. 3, 18 de mai. de 1941.
95

Imagem 15 – Fundação da Federação Brasileira Bancaria de Esportes243

Fonte: Velha aspiração dos bancarios realizada, Correio Paulistano, p.16, 20 de out. de 1940.

O primeiro campeonato brasileiro fica, então, marcado para os dias 15 e 16 de


novembro de 1941, no Rio de Janeiro, e esperava-se que seguisse o que já vinha acontecendo
com outros encontros entre os representantes das duas cidades, tendo “pleno exito em todos os
setores – esporte e trabalho – dentro de um salutar principio de cooperativismo”244. A criação
do Conselho Nacional de Desportos – C.N.D., a partir do Decreto-Lei nº3.199 de 1941,
estabelecia as bases para a organização dos esportes no país. A partir dele determinou-se que
as confederações nacionais de todos os esportes teriam 90 dias para apresentar um projeto de
estatuto. Caso não apresentassem, as confederações poderiam deixar de existir. O C.N.D. tinha
ainda a incumbência de criar uma comissão para a regulamentação do esporte amador no
país245. Os jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo avaliavam como benéficas para o esporte
bancário as bases impostas pelo Conselho. Segundo o Diário de Notícias, tanto a F.B.B.E.
quanto a L.B.E. gozariam de “grandes vantagens com a oficialização”, pois, “a controladora do
esporte bancario nacional tomará um grande impulso, tendo-se em vista a obrigatoriedade de
serem filiadas à mesma todas as Federações estaduais e a estas, todas as Ligas municipais”246.
José Ribeiro, presidente da L.B.E.A., em entrevista ao Correio Paulistano, afirmou que as
dificuldades para a realização dos campeonatos estaduais e nacionais seriam afastadas, pois a
“regulamentação favorece grandemente as entidades que, como nós, são cem por cento
amadoras, mas que sofriam grandes córtes econômicos em sua já diminuta renda geral com a

243
Aspecto apanhado na séde da Associação Athletica Banco do Brasil, no Rio, por accasião da fundação da
Federação Brasileira Bancaria de Esportes, vendo-se congregados representantes das entidades e clubes das duas
capitaes do paiz.
244
O intercambio dos bancários do Brasil, Folha Bancaria, n. 6, p. 14, fev. de 1941.
245
SOARES, Justiça desportiva: o Estado Novo entra em campo (1941-1945), p. 98.
246
Os bancarios e a oficialização dos esportes, Diário de Notícias, p. 10, 18 de maio de 1941.
96

realização de certames puramente amadoristas”247. Quase um ano depois de se comemorar a


criação do C.N.D. e a oficialização dos esportes no Brasil, a F.B.B.E. recebe a notícia de que,
segundo os estatutos da Confederação Brasileira de Desportes – C.B.D., ela não poderia se
filiar a esta última, apenas ser reconhecida. O reconhecimento dava à instituição bancária o
direito de se relacionar com todas as entidades filiadas à C.B.D., mas certamente foi um golpe
nas perspectivas dos esportistas bancários de se verem plenamente reconhecidos pelo órgão
máximo do esporte nacional248. As adequações necessárias para enquadrar-se na nova
organização do esporte nacional fizeram com que a L.B.E.A. mudasse de nome em 1944,
passando a chamar-se Centro Paulista de Desportos Bancarios249.

Na data marcada, paulistas e juiz-foranos se juntaram aos bancários cariocas para


a disputa do I Campeonato Bancario Brasileiro de Esportes, sob o patrocínio da F.B.B.E. Os
esportes disputados foram futebol, atletismo, bola ao cesto, snooker, ping-pong, xadrez, tênis e
lance livre. A disputa se deu “num ambiente de franca camaradagem e disciplina”250. Os
paulistas, com 65 representantes251, conquistaram vitórias no atletismo, lance livre e ping-pong.
Dividiram, com os cariocas, devido a um empate, o prêmio do torneio de xadrez. Os donos da
casa obtiveram os títulos de tênis, bola ao cesto e snooker. O título de futebol, o mais cobiçado,
ficou com os mineiros.

Ficou combinado, após sorteio, que o próximo campeonato seria realizado em


Minas Gerais. Porém, com a desistência dos mineiros, coube a São Paulo a organização do II
Campeonato Bancario Brasileiro de Esportes252. As datas foram definidas para 12 e 13 de
dezembro de 1942, e os paulistas esperavam, com a anuência do prefeito Prestes Maia, poder
realizar pelo menos o desfile de abertura e os jogos de futebol no estádio do Pacaembu253. As
modalidades a serem disputadas seriam as mesmas do campeonato anterior. Dias antes do início
do campeonato, no entanto, os mineiros telegrafaram desistindo da participação do torneio,
fazendo com que apenas paulistas e cariocas disputassem esse segundo campeonato. Além dos
50 atletas cariocas, embarcou para São Paulo uma grande delegação, fazendo com que

247
A regulamentação dos esportes trouxe um grande impulso á vida esportiva dos bancarios.
248
Não pode ser filiada à C.B.D. a Federação Bancaria, Diário de Notícias, p. 12, 25 de abr. de 1942.
249
Os esportes bancarios continuarão sua rota progressista, Correio Paulistano, p. 14, 06 de fev. de 1944.
250 o
1 Campeonato Bancário Brasileiro de Esportes, Folha Bancaria, n. 8, p. 7, abr. de 1942.
251
[sem título], Correio Paulistano, p. 10, 18 de nov. de 1941.
252
LOMENZO, Renato, 2o Campeonato Bancario Brasileiro, Folha Bancaria, n. 14, p. 5, nov. de 1942.
253
“Vamos promover no proximo mês o segundo campeonato brasileiro bancario de esportes”, Correio
Paulistano, p. 8, 19 de nov. de 1942.
97

somassem mais de 100 pessoas254. Elpídio de Oliveira, do Satélite F. C., era o técnico da
delegação bandeirante.

O pedido dos bancários para a utilização do estádio do Pacaembu parece ter sido
negado, já que o desfile e os jogos de futebol ocorreram no estádio do C. A. Juventus, na rua
Javari. Os outros encontros ocorreram em diversos clubes espalhados pela cidade. O de tênis
de mesa255 ocorreu na sede do São Paulo Railway Athletic Club – S.P.R., na avenida Rangel
Pestana, 2060; o de bola ao cesto, no ginásio da Associação Cristã de Moços, na rua Santo
Antônio, 201; o xadrez foi disputado no Clube de Xadrez de São Paulo, no prédio Martinelli; o
atletismo, na pista do Clube de Regatas Tietê, na Ponte Grande; e o tênis, no E. C. Banespa, na
Parada Petrópolis. Para disputar o campeonato, os bancários paulistas e cariocas precisaram se
deslocar por boa parte da cidade. Isso pode nos dar indícios sobre o trânsito de pessoas pela
cidade para que pudessem acompanhar e praticar esportes256. Os paulistas foram os grandes
campeões do 2º Campeonato Brasileiro Bancario, obtendo vitórias em bola ao cesto, lance
livre, tênis de mesa, atletismo e snooker. O xadrez, novamente, terminou com um empate. Os
cariocas ficaram com os títulos de tênis e futebol.

A L.B.E.A. ia crescendo e se estruturando mais com o passar dos anos 1940. Ao


assumirem a presidência, em 1940, José Ribeiro, Mario Della Rosa e Aurélio Sinieghi,
contavam com oito clubes filiados à Liga que dirigiam. Em 1943 já eram mais que o dobro,
somando dezessete. Vários departamentos esportivos foram criados dentro da Liga, cada um
para tratar das questões de um esporte. O campeonato de futebol de 1943 seria disputado por
catorze clubes, um recorde257. Enquanto isso, bancários paulistas, cariocas e mineiros se
preparavam para a disputa do III Campeonato Bancario Brasileiro de Esportes, em Belo
Horizonte. Além das modalidades costumeiramente disputadas, nesse ano houve a inserção do
voleibol. Houve ainda a participação de João Lira Filho, representante do Conselho Nacional
de Desportos, no desfile de abertura do certame258. Segundo a Folha Bancaria e o Correio
Paulistano259 “a presença de altas autoridades esportivas nacionais e bancarias, [...], é uma

254
Inicia-se hoje o 2o campeonato brasileiro bancario de desportos, Correio Paulistano, p. 6, 12 de dez. de 1942.
255
Eles passam a chamar ping-pong de tênis de mesa entre 1941 e 1942.
256
Tratar mais profundamente dessa questão nos levaria para longe dos objetivos desse trabalho, mas acreditamos
ser possível compreender melhor as dinâmicas de mobilidade na cidade de São Paulo a partir das andanças de
esportistas.
257
LOMENZO, Renato, O esporte Bancario em 1943, Folha Bancaria, n. 16, p. 6, mar. de 1943.
258
Terceiro campeonato brasileiro bancario de desportos, Correio Paulistano, p. 8, 17 de set. de 1943.
259
Os textos presentes na Folha Bancaria de novembro de 1943, páginas 10 e 11 e no Correio Paulistano de 26 e
29 de setembro de 1943, páginas 11 e 16, e 8, respectivamente, são praticamente idênticos.
98

evidente manifestação de unidade espiritual da classe e de suas preocupações no sentido da


arregimentação esportiva”260.

Os campeonatos brasileiros de 1944 e 1945 devem ter tido proporções bem menores
do que as três edições anteriores, já que não foram mencionados na Folha Bancaria e
encontramos apenas pequenas notas sobre eles na grande imprensa de São Paulo e do Rio de
Janeiro. Na realidade, o de 1944 parece ter sido o que contou com menor atenção. Só foi
possível descobrir que estava marcado para os dias 7 a 10 de setembro261 e que aconteceu no
Rio de Janeiro262. O IV Campeonato deve ter ocorrido normalmente, pois no ano seguinte tem-
se notícia do V Campeonato Bancario Brasileiro de Esportes, que aconteceu em São Paulo.
Dessa vez, o desfile dos atletas e a maioria das modalidades esportivas foi disputada no Estádio
do Pacaembu263, concretizando o desejo antigo dos bancários paulistanos.

Esses campeonatos brasileiros, que poderiam ter sido chamados de campeonatos do


sudeste, uma vez que não conseguiram reunir bancários de outras regiões do país, parecem ter
pedido força com o passar dos anos, fazendo fracassar a ideia dos bancários de união a partir
do esporte. Eles tinham, no entanto, um objetivo muito claro: a criação de um ambiente de
amizade entre os trabalhadores dessa categoria. Seus organizadores, alinhados ao regime
instalado no Brasil em 1937, enxergavam a prática esportiva como uma forma de unir os
bancários sob um mesmo ideal de pertencimento à “classe bancária”. É provável que os atletas
disputantes do campeonato conversassem com seus pares de outros estados sobre a sua situação
de vida e de trabalho, e sobre o modo como se organizava seu sindicato e o estabelecimento
bancário em que trabalhavam. Isso porque, como viemos defendendo ao longo desse trabalho,
a formação de uma cultura em comum está permeada pela reflexão sobre os acontecimentos
referentes ao seu mundo. É o que se chama experiência. A experiência dos bancários
paulistanos, no que se refere às práticas esportivas, esteve ligada à participação de alguns
elementos aos campeonatos brasileiros, que ajudavam a construir o sentimento de
pertencimento a uma categoria de trabalhadores que estava espalhada pelos diversos cantos do
país. Apesar disso, não podemos dizer de que maneira e em que termos essas conversas sobre
a situação dos bancários se dava, uma vez que as fontes acessadas não dão conta dessa parte da
história. O que podemos fazer é mudar a lente de observação e olhar para dois clubes que faziam

260
LOMENZO, Renato, Terceiro Campeonato Brasileiro Brancario de Desporto, Folha Bancaria, n. 18, p. 10,
nov. de 1943.
261
Correio esportivo, Correio da Manhã, p. 5, 10 de ago. de 1944.
262
Correio esportivo, Correio da Manhã, p. 6, 09 de set. de 1944.
263
Teremos hoje uma fase empolgante do V Campeonato Brasileiro Bancario de Desportos, Correio Paulistano,
p. 10, 07 de set. de 1945.
99

parte da L.B.E.A. e que emprestaram elementos para os campeonatos brasileiros e ver como se
davam essas discussões naqueles locais.

Já contamos aqui, no capítulo anterior, como se deu a formação da Associação


Athletica Banco do Brasil – São Paulo e do Satelite Futebol Clube, dois clubes de funcionários
do Banco do Brasil. A título de síntese, a A.A.B.B.-São Paulo foi fundada por funcionários
contínuos do Banco do Brasil que pretendiam formar um time de futebol para disputar o
campeonato da L.B.E.A. Para chamar a atenção da direção do banco, a presidência do clube é
cedida a um funcionário de carreira, que exclui o time de futebol de uma viagem ao Rio de
Janeiro em que se disputariam uma série de modalidades esportivas contra a A.A.B.B.-Rio.
Enquanto os colegas estavam no Rio, os contínuos que formavam o time de futebol do clube
decidem formar uma nova agremiação, que seria restrita aos contínuos, nascendo assim o
Satelite F. C.

A relação entre os dois clubes, no início, se não era pacífica, era constante. Na
terceira reunião da diretoria do Satelite F. C. fica registrado em ata que a A.A.B.B. doou diversos
artigos esportivos ao novo clube, que faria os agradecimentos oportunamente264. Quase um ano
após a fundação do Satelite F.C., em agosto de 1936, a diretoria do clube tratava da
possibilidade de fusão dos dois clubes. Em uma reunião com 20 presentes, debateu-se o assunto.
Alfredo Bortolato expôs o conteúdo de uma conversa que teve com o presidente da A.A.B.B.-
São Paulo, na qual ele afirmava que essa associação não tinha nenhum problema com o Satelite,
e que acreditava que o sentimento era recíproco. Após o exposto, foi colocada em discussão a
possibilidade de fusão dos clubes, que reunia sócios favoráveis e contrários. Feitosa era um dos
contrários à fusão, mas seus motivos não estão explicitados nas atas. Já Mario Barbosa se
colocava favorável, desde que se exigisse “igualdade na diretoria, foot-ball como esporte basico
etc”265. Decide-se, então, pela realização de uma reunião no dia seguinte em que seria votada a
união. O resultado foi taxativo: dos 56 votos, 6 foram favoráveis, 43 contrários e 7 nulos. Após
uma discussão sobre como o Banco do Brasil seria comunicado da decisão, decidem escrever
dizendo não ser possível a realização da fusão “devido differença de classe, por estar o Satellite
inscrito na Liga Bancaria, etc”266.

A resposta à direção do Banco do Brasil é certeira e nos dá demonstrações da


existência de uma divisão no interior da classe bancária. As fontes pesquisadas permitiram

264
Ata da reunião da diretoria de 05 de novembro de 1935.
265
Ata da reunião da diretoria de 18 de agosto de 1936.
266
Ata da reunião de 19 de agosto de 1936. Grifo nosso.
100

constatar que havia uma diferença salarial entre os trabalhadores do Banco do Brasil e os dos
demais bancos em São Paulo. A partir disso, podemos dizer que não se tratava nem mesmo de
uma questão de poder aquisitivo puramente, uma vez que os contínuos desse banco ganhavam
mais do que alguns funcionários do quadro administrativo de outros bancos. Trava-se de um
problema de hierarquia. Uma divisão entre quem era e quem não era considerado funcionário
bancário. Assim, a questão estava muito mais ligada ao status que esses setores poderiam ter
ou deixar de ter jogando futebol com subalternos. Aqui a heterogeneidade dos bancários
paulistanos dá mostras de sua existência. Havia ainda um problema de raça. O time dos
contínuos era composto de jogadores negros, o que poderia ser usado pelos funcionários
administrativos brancos como outra forma de estratificação com base em discriminação racial.

Apesar de a discriminação racial não estar apontada na letra da lei, o que dificultava
que ela fosse identificada e combatida, os problemas raciais eram latentes na São Paulo dos
anos 1930. A possibilidade de mobilidade social ascendente, saindo dos trabalhos braçais e
passando para os de colarinho branco, se era difícil para os brancos pobres, era quase impossível
para os negros267. Quando tal ascensão era alcançada esses trabalhadores geralmente ficavam
colocados em posições subalternas, como telefonistas, porteiros e vigias. O trabalho realizado
pelos contínuos dos bancos.

Uma das respostas dos negros para a discriminação foi a criação de seus próprios
clubes sociais e esportivos. Não sendo bem vistos nos clubes de dança dos brancos, mas não
querendo se juntar aos grupos de carnaval, organizados pela classe operária, lhes restava a
criação de seus próprios clubes. Não foi diferente com o caso dos clubes esportivos. Houve, no
início do século XX, a criação de diversos clubes esportivos destinados a negros na cidade de
São Paulo. Alguns conseguiram até mesmo alguma projeção nos meios esportivos da cidade.
Assim, essas pessoas criavam seus próprios clubes com o intuito de poderem se organizar e
praticar o esporte da moda – o futebol. No entanto, apesar de terem surgido como reação à
discriminação e à segregação, essas associações não tinham como propósito combater
ativamente a discriminação. Muitas delas deixaram em seus registros evidências sobre a
"infelicidade e inquietação entre seus membros com respeito à desigualdade social e às barreiras
de côr em São Paulo, [mas] nenhuma delas parece ter realizado qualquer esforço coletivo para
protestar, reduzir ou eliminar esses males"268.

267
ANDREWS, George Reid, Negros e brancos em São Paulo: 1888-1988, Bauru: EDUSC, 1998, p. 193.
268
Ibid., p. 222.
101

Esse parece ter sido o caso do Satelite F.C. Claramente havia uma inquietação com
o fato de os futebolistas da A.A.B.B. São Paulo não terem sido levados ao Rio de Janeiro naquela
excursão de 1935. E, apesar de nada ter sido explicitamente dito a eles, compreenderam que o
"problema" com o qual se deparavam era de cor. No entanto, nos registros do clube, nenhuma
menção a protestos ou tentativas de organização para reivindicar igualdade racial no clube, no
banco, ou na sociedade paulistana foi encontrada. Tanto é assim que nos primeiros estatutos
registrados em cartório, em 1942, não há menção de restrição de cargo para ocupar a presidência
do clube, como ficou decidido quando de sua fundação em 1935. Essa alteração deve ter sido
realizada na reforma pela qual passaram os estatutos em 25 de abril de 1939, mas não é possível
a constatação, já que, apesar dos primeiros estatutos terem sido confeccionados na data de
fundação do clube, eles passaram por 3 alterações até seu primeiro registro em cartório, em 25
de abril de 1942.

Em janeiro de 1937, novamente, é colocada em discussão a possibilidade de fusão


dos clubes. Dessa vez o presidente do Satelite, Luiz Roberto Arruda, faz a proposta devido à
“atual situação do clube”269, dando a entender que eles passavam por dificuldades para a sua
manutenção. Após discussões, a proposta é posta em votação e vetada, sendo que os presentes
argumentavam que deveriam “continuar lutando como até agora viemos, embora com grandes
dificuldades, acobertada ainda, pela [ilegível] de nossa Direção Geral em nos ter negado o
auxílio mensal, solicitado varias vezes”270. A direção do banco deixava claro, em carta enviada
ao Satelite em março do mesmo ano, que não seria possível contribuir financeiramente com o
clube, uma vez que naquela agência existiam dois clubes e que não era possível contribuir com
ambos. Nessa carta, sugere-se a instituição de uma mensalidade para que o Satelite pudesse se
manter271. Novamente fica evidente a predileção da diretoria do banco por um dos clubes, o dos
escriturários. Essa predileção, que encontrava abrigo no argumento de que não havia
necessidade de dois clubes para a representação do mesmo banco, parece ter, de fundo, uma
questão que, apesar de pouco tratada, nos parece ser central para os bancários do período: a
divisão entre os que eram e os que não eram considerados funcionários bancários. Já tratamos
aqui da divisão instalada no interior da categoria bancária, que fazia com que fossem
considerados bancários apenas as pessoas que tivessem cargos de escriturários. Os contínuos,
como eram chamados os funcionários de funções subalternas, só passaram a ser reconhecidos
como bancários em 1938, quando uma consulta ao I.A.P.B. feita pelos dirigentes do Banco de

269
Ata da reunião da diretoria de 28 de janeiro de 1937.
270
Ibid.
271
Ata da reunião da diretoria de 31 de março de 1937.
102

São Paulo sobre a inscrição de empregados da limpeza e para elevadores no Instituto teve como
resposta que esses funcionários deveriam ser considerados bancários para todos os efeitos.
Ainda que não tivesse força de lei, a resolução do presidente do I.A.P.B. dava respaldo aos
contínuos e possibilitava sua consideração como bancários. Isso pode parecer pouco, mas em
uma categoria de trabalhadores tão heterogênea quando a dos bancários, mas que sustentava
padrões de status bastante rígidos, o fato de ser considerado parte dessa categoria certamente
tinha um significado positivo grande. Afinal, ser bancário significava, no mínimo, possuir
alguma distinção social em uma sociedade composta por grupos que tentavam se diferenciar
uns dos outros.

Os sócios viam o Satelite como constantemente colocado em posição de


inferioridade por outros clubes, apesar de ele ter sido campeão em 1938 e várias vezes vice-
campeão do campeonato de futebol da L.B.E.A. Isso fica nítido quando de uma discussão sobre
um sujeito, não sócio do clube, que votou na eleição para a nova diretoria em 1937. Houve
pedido de cancelamento da eleição, mas os sócios optaram pela exclusão daquele voto e a
manutenção do pleito, uma vez que seu cancelamento significaria a desmoralização do clube,
servindo como “opportunidade para que certos elementos despeitados intensificarem a sua
campanha para colocar o nosso club em posição humilhante perante os demais, quando que nós
fazemos juz ao mais alto conceito que se possa desfrutar nos meios esportivos bancarios e
alhures”272. Ao que parece, o clube não era bem visto por seus congêneres, o que pode ser
explicado pelo fato de ser composto por funcionários do quadro de portaria do Banco do Brasil.
Outro fator que aponta nessa direção é o fato de que os funcionários contratados, ou seja, os
que não eram funcionários de carreira, estarem privados de inscrição na L.B.E.A., o que fazia
com que muitos dos jogadores do Satelite não estivessem inscritos na Liga273.

Mas nem só de discussões sobre sua posição em relação aos outros clubes vivia o
Satelite F. C. Festas eram organizadas pelo clube sob os mais diversos pretextos. A primeira a
ser registrada foi uma “singela homenagem” a um de seus sócios, José Felipe da Costa,
considerado “optimo defensor do club”. Nessa homenagem organizariam um jogo entre casados
e solteiros, que contaria com 50 litros de chopp e 150 sanduíches financiados pelos diretores do
clube e pelo próprio clube274. Em março de 1939, sem nenhum evento que motivasse
comemoração, é registrada em ata a intenção de se realizar uma choppada, sendo apresentado

272
Ata da reunião da diretoria de 21 de outubro de 1937.
273
Ata da reunião da diretoria de 05 de dezembro de 1939; Ata da reunião da diretoria de 14 de janeiro de 1940.
274
Ata da reunião da diretoria de 11 de novembro de 1937.
103

o orçamento do clube para que se discutisse essa possibilidade. Dois anos depois, novamente,
discutiu-se a organização de uma choppada a ser oferecida a jogadores e sócios para realizar a
entrega das medalhas aos campeões 1938275. Acreditamos que essa confraternização foi
realizada com atraso por causa da situação econômica do clube. Mais bem estabelecidos, eles
já poderiam se dar ao luxo de organizar uma cerimônia para festejar o feito.

Imagem 16 – Time do Satelite para o campeonato de 1938

Fonte: Satellite e Bancaleman medem-se, hoje, na segunda “melhor de tres”, Correio Paulistano,
p.8, 11 de mar. de 1939.

O clube, enfrentando a resistência da diretoria do Banco do Brasil, foi se


estabelecendo e em pouco tempo passou de reuniões da diretoria realizadas no próprio banco,
para uma sede na Praça Carlos Gomes, 18. Em 1941 mudam-se para o número 100 do mesmo
endereço. Um ano depois conquistam uma sala no 25º andar do Edifício Martinelli, onde
também se localizava a sede do Sindicato, bem mais próxima ao banco do que as anteriores, a
menos de 100 metros, e passam a realizar todas as suas reuniões ali. Antes disso, as reuniões
aconteciam algumas vezes na sede, e outras vezes no próprio banco. Esse fato nos faz pensar
que por vezes a diretoria do clube achava mais fácil se reunir no banco, onde já estavam todos,

275
Ata da reunião da diretoria de 13 de março de 1941; Ata da reunião da diretoria de 01 de abril de 1941.
104

ao invés de precisar se locomover cerca de um quilometro, já tarde da noite – as reuniões


costumavam ocorrer por volta das 21 horas – para se reunirem em outro lugar. Após a conquista
da sede no Martinelli, todas as reuniões passam a ocorrer na sede do clube, o que corrobora
nossa hipótese da dificuldade de locomoção pela cidade.

A sede no Edifício Martinelli contava com dois grandes salões, “sendo um para
jogos de ‘snoocker’, pingue-pongue, xadrez e damas e o outro destinado aos saraus
dansantes”276. Possuía ainda uma “ótima biblioteca, bem fornecida de livros, para deleite e
instrução de seus frequentadores”277. Essa foi uma imposição da diretoria do banco. Em janeiro
de 1942 houve a exigência de alteração dos estatutos do clube, fazendo com que 20% da
subvenção fosse destinado à organização de uma biblioteca “adequada aos funcionários do
Banco do Brasil”278 e que houvesse a criação do cargo de bibliotecário. Essa imposição dá
indícios de que nesse momento a diretoria do banco já ajudava financeiramente o Satelite,
porém em nenhum momento isso ficou lavrado em ata.

Foi na sala do Martinelli que o clube inaugurou um bar, que era frequentado não
apenas pelos associados. Ele era, na verdade, cedido a uma pessoa que o administrava. Primeiro
foi cedido a um associado que já havia feito parte da direção do clube anteriormente, e depois
foi gerido por uma junta de pessoas. O bar era responsável, naturalmente, por abastecer a sede
de bebidas. Elas eram fornecidas todos os dias a partir das 19 horas 30 minutos, e aos domingos
a partir das 13 horas, sempre com encerramento às 24 horas279. É interessante notar que há uma
alteração na ata que trata da questão das bebidas alcoólicas280 feita na ata da reunião seguinte281
em que se troca “bebida alcoólica” por “cachaça”. A alteração nos parece significativa, uma
vez que a cachaça é uma bebida tradicionalmente preterida pelas elites, sendo uma marca social
bastante intensa282. Para além disso, tratava-se da sede de um clube esportivo, cuja finalidade
era – ou alguns dirigentes esportivos pensavam ser – exclusivamente o incentivo à prática
esportiva. Desse modo, a possibilidade de consumo de bebidas alcoólicas em sua sede, com a
instalação de um bar, e o incentivo dado ao consumo por parte da diretoria, que organizava
choppadas nas comemorações, mostram que o clube tinha também outros objetivos. A

276
Será inaugurada hoje a nova sede do Satelite F. C., Correio Paulistano, p. 6, 28 de nov. de 1942.
277
Ibid.
278
Ata da reunião da diretoria de 28 de janeiro de 1942.
279
Ata da reunião da diretoria de 22 de setembro de 1942.
280
Ibid.
281
Ata da reunião da diretoria de 06 de outubro de 1942.
282
ALGRANTI, Leila Mezan, Aguardente de cana e outras aguardentes: por uma história da produção e do
consumo de licores na América portuguesa, in: VENÂNCIO, Renato Pinto; CARNEIRO, Henrique (Orgs.), Álcool
e Drogas na História do Brasil, São Paulo : Belo Horizonte, MG, Brasil: Alameda Editorial, 2005.
105

possibilidade de socialização entre colegas de banco, em um ambiente de descontração, parecia


estar na ordem do dia da política do clube. Organizavam-se bailes, festejos, festas juninas,
“domingueiras”, matinês, enfim, uma infinidade de encontros não esportivos que promoviam a
sociabilidade entre os sócios. Realizavam-se ainda cursos preparatórios para concursos
bancários, em uma referência aos seus fundadores e primeiros sócios, contínuos, que gostariam
de galgar degraus na carreira e se tornarem efetivamente funcionários bancários. Já em meados
dos anos 1940 o clube não era mais composto apenas por esses funcionários subalternos,
recendo indistintamente todos os funcionários da agência de São Paulo.

Imagem 17 – Festa junina no novo bar do Martinelli

Fonte: Revista Satélite, outubro/novembro de 2010, nº355, ano XLIII, Edição especial de 75 anos,
p. s/n

Porém, nem todos eram bem vindos como sócios do clube. Em uma discussão na
reunião da diretoria em maio de 1943, propõe-se a criação de um quadro extra de associados,
do qual fariam parte as famílias dos associados. Conclui-se, após larga discussão, que “tal classe
de associados não se enquadra perfeitamente dentro das finalidades sociais do Satelite Futebol
Club”283, dando a entender que a finalidade social do clube era mesmo a socialização entre
pares.

283
Ata da reunião da diretoria de 20 de maio de 1943.
106

A A.A.B.B.- São Paulo teve sua primeira sede no Edifício Del Prette, na rua
Formosa. Após alguns anos284, em 1940, mudou-se para algumas salas no primeiro andar de
um edifício na rua da Quitanda, 150, e em 1944 mudou-se novamente, dessa vez para a o
Edifício Conde Luiz Eduardo Matarazzo, na rua XV de novembro. As duas últimas sedes
ficavam, então, no chamado “triângulo”, bem no centro da cidade, próximas ao Banco do
Brasil, facilitando a chegada de sócios. Havia na sede um bar, que deveria vender as bebidas
com o preço igual ao do comércio285, porém, em 1944 decide-se por fechá-lo já que ele não
estaria “atingindo as finalidades para que foi criado”. Em seu lugar, seria instalada uma “sala
de espera, guarda roupa, etc.”286 sendo mais útil para os associados. Durante o período analisado
foram realizados alguns poucos festejos. Apenas um churrasco287 e uma choppada288.

Mas se a sociabilidade buscada pelo clube não se encontrava na prática do futebol


– em 1941 eles ainda não haviam decidido como praticar o esporte289– nem na organização de
eventos de confraternização, outras formas foram eleitas. A compra de um piano para a sede,
em 1944290 dá mostras de como aqueles sócios gostariam de organizar sua sociabilidade. Com
maior distinção. Outro fato interessante sobre a A.A.B.B.-São Paulo é o de que um dos esportes
praticados era o bridge. Ele é um jogo de cartas jogado com as 52 cartas de um baralho e dois
pares de jogadores. Na A.A.B.B.-São Paulo era jogado a dinheiro, com um limite de $005 (cinco
réis) por ponto, o que faz crer que as pessoas que o praticavam tinham algum dinheiro para
destinar a apostas. Essa não era uma modalidade disputada na L.B.E.A., o que fazia com que
não houvesse um campeonato de bancários291, ficando os praticantes restritos ao convívio com
seus pares mais imediatos.

O bridge é tradicionalmente vinculado às elites, e, apesar de ser um jogo de cartas


que qualquer pessoa é capaz de aprender, foi muito utilizado como forma de distinção social
por seus praticantes. Isso implica em dizer que nem todos os bancários tinham acesso a ele. Isso
porque era preciso que alguém ensinasse a jogar, e para que isso ocorresse, a pessoa a ser
ensinada deveria estar na mesma posição social do “mestre”. Além disso, é um jogo de duplas,

284
Não foi possível saber o que aconteceu com na A.A.B.B. entre os anos de 1935 e 1940, uma vez que as atas de
reunião da diretoria desse período se perderam, restando apenas a ata de fundação do clube.
285
Ata da reunião da diretoria de 29 de julho de 1941.
286
Ata da reunião da diretoria de 11 de abril de 1944.
287
Ata da reunião da diretoria de 11 de setembro de 1941.
288
Ata da reunião da diretoria de 29 de dezembro de 1941.
289
Ata da reunião da diretoria de 17 de novembro de 1941.
290
Ata da reunião da diretoria de 11 de abril de 1944.
291
Pode ser que um campeonato desse tipo tenha existido, mas entre 1929 e 1945 ele não foi organizado pela
L.B.E.A. e nas atas do clube não encontramos nenhuma menção a uma disputa de campeonato fora da Associação.
107

ou seja, é preciso ser aceito como parceiro de alguém, o que geralmente só acontece com
pessoas de um mesmo status social.

Os dois clubes tinham, inicialmente, públicos diferentes, e lidavam com as questões


esportivas e de sociabilidade de maneiras muito distintas. Enquanto no Satelite presava-se pela
prática do futebol, sendo apenas iniciadas outras modalidades nos anos 1940, na A.A.B.B.-São
Paulo o bridge parecia o carro chefe, e outras modalidades esportivas, como vôlei, basquete e
futebol, foram inseridas nos anos 1940. A forma de sociabilização escolhida pelos clubes
também era bastante diversa. Percebemos na A.A.B.B.-São Paulo uma tendência menor a
realização de festas e festivais, fazendo parecer que se buscava um local de tranquilidade e
ordem nos momentos de não trabalho. Apesar da bebida alcoólica também ser consumia ali,
parece o ter sido em quantidade bem menor, tanto que o bar do clube é fechado para dar lugar
a uma sala de estar. Já no Satelite, percebemos uma tendência maior a festividades. A sensação
é a de que tudo era muito comemorado, com grandes quantidades de álcool, música e dança.
Ali, o tempo de não trabalho parece ser destinado à descontração total, à sociabilização com os
pares, mas não apenas com eles, já que o bar do clube era frequentado por não sócios, e à prática
do esporte mais popular do período: o futebol.

Apesar de suas diferenças, os problemas entre os clubes, decorrentes da celeuma


que deu origem ao Satelite, foram se apaziguando com o passar dos anos. Em meados dos anos
1940 ambos já recebiam reconhecimento e verba do Banco do Brasil para funcionar, e
provavelmente passaram a compartilhar sócios – uma vez que ambos os clubes tinham mais de
cem associados cada um. O olhar para eles nos permitiu ver mais de perto a heterogeneidade
da categoria dos bancários, que dava suas mostras tanto na política sindical quanto nos
momentos de não trabalho permeados pelo universo esportivo. Escriturários e funcionários de
nível mais alto buscavam um tipo de associação, contínuos e funcionários de nível mais baixo,
outro. No entanto, todos estavam sob o comando da Liga Bancaria de Esportes Athleticos,
entidade organizadora do esporte bancário e que queria, no final das contas, promover um
ambiente de camaradagem e diversão aos seus associados, fazendo aumentar o valor da “classe
bancária”.
108

Considerações Finais

Os bancários formavam uma categoria de trabalhadores bastante numerosa e


heterogênea na São Paulo dos anos 1930 e meados dos anos 1940. Eles eram escriturários e
contínuos, e tinham como local de trabalho as agências de bancos e casas bancárias da capital
do estado. Eram trabalhadores de colarinho branco, e tentavam de diversas maneiras se
diferenciarem de outras categorias de trabalhadores. Uma das formas de distinção era a
utilização de roupas de passeio no local de trabalho, que marcava fortemente a diferença entre
eles e os operários – pessoas que trabalhavam uniformizadas. Outra forma de distinção era a
criação de bibliotecas e cursos noturnos por parte dos sindicatos e associações de classe desses
trabalhadores, em uma tentativa de se sentirem “civilizados”. É importante lembrar, no entanto,
que não se pode colocar todos os empregados de colarinho branco em uma mesma posição e
chamá-los de “classe média”, uma vez que eles possuíam diferenças importante entre si. O que
tentamos fazer ao longo desse trabalho foi refletir sobre essas diferenças no interior da categoria
dos bancários, olhando para o modo como eles organizavam e vivenciavam a prática esportiva.
Para tratar de nosso assunto – a organização e vivência do universo esportivo bancário em São
Paulo – precisamos olhar também para a organização de seu sindicato. Vimos que, durante o
período analisado, ele passou por três fases distintas, que acarretaram mudanças importantes
nas formas de gerir, compreender e vivenciar o esporte.

Na primeira delas, que consiste nos anos de 1929 a 1932, encontramos uma
Associação de cunho assistencial, que visava conquistar alguma união entre os bancários. Em
um segundo momento, compreendido entre 1933 e 1935, houve uma maior militância por parte
dos diretores do Sindicato, que buscavam conquistar suas reivindicações de melhores condições
de trabalho e não viam problemas em utilizar recursos consagrados pelos operários, como a
greve. Foi nesse momento que houve a organização de um outro sindicato para congregar
bancários em São Paulo, o Sin-Dikê, de cunho patronal. Por fim, o período entre 1936 e 1945
esteve permeado pela necessidade de enquadramento do Sindicato às normas do Estado Novo,
ficando marcado pelas tentativas de conciliação entre empregados e empregadores.

No universo esportivo tivemos, em um primeiro momento, os valores do higienismo


sendo pregados pelos dirigentes da Liga Bancaria de Esportes Athleticos. A moderação na
prática, o não consumo de bebidas alcoólicas, a exaltação ao amadorismo e a necessidade de
práticas esportivas como forma de melhorar a saúde eram algumas das práticas defendidas por
esses dirigentes. No entanto, esses valores não eram compartilhados pelos atletas, que, como
vimos, não viam problemas em consumir bebidas alcoólicas durante os jogos e nas festividades
109

da L.B.E.A., e não seguiam as recomendações da Vida Bancaria de como ser um bom esportista.
Havia uma busca pela institucionalização das práticas esportivas dos bancários, que foi iniciada
com a filiação à A.P.E.A. e, por fim, conquistada com o reconhecimento da Liga pela C.B.D. e
a organização dos campeonatos brasileiros.

Em um segundo momento, que converge com o de maior furor político no


Sindicato, encontramos uma Vida Bancaria que suprimia de suas páginas as questões referentes
aos esportes. Acreditamos que isso tenha ocorrido pelo fato de os dirigentes sindicais
acreditarem que eles eram assunto menos relevante no momento, sendo que as páginas do órgão
oficial do Sindicato deveriam ser destinadas à luta por melhores condições de trabalho e de
vida. Essa posição, adotada por líderes sindicais, não é nova, sendo utilizada desde meados dos
anos 1910. Foi nesse momento que houve a criação de uma outra entidade para organizar os
esportes bancários, a F.E.B., que tentava desvincular esporte e política sindical, mas que teve
um fim prematuro, dando mostras da solidez da L.B.E.A. e da discordância dos bancários de
que política e esporte não deveriam se misturar.

Por fim, temos um momento de tentativa de união dos bancários através dos
esportes. A criação do campeonato nacional e a possibilidade de realização de um campeonato
sul-americano dão mostras de qual era o projeto das lideranças bancárias para o esporte, que
deixa de ser preterido e passa a ter relevância nas páginas do órgão oficial da instituição. A
tentativa de criação de um ambiente de camaradagem deixa claro que o que se pretendia era a
socialização entre pares. Essa socialização era buscada no interior dos clubes filiados à Liga,
que, com suas especificidades decorrentes da heterogeneidade da categoria dos bancários,
organizavam formas de sociabilização entre os sócios. O Satelite, clube fundado e gerido no
seu início pelos contínuos do Banco do Brasil, tinha momentos de congraçamento e festejos
mais frequentes, com o consumo de bebidas alcoólicas, a realização de bailes e, é claro, a prática
do futebol, esporte mais popular do período. Já a A.A.B.B.-São Paulo, cujos sócios eram
funcionários de mais alto escalão do banco, organizavam esses momentos ao redor do piano ou
jogando bridge, jogo que era marca de distinção social.

Se em outros contextos o futebol era incentivado pelos industriais para domesticar


o corpo dos funcionários, promover a identificação clube-empresa na formação de uma grande
família e para servir como veículo publicitário, o caso da Liga Bancaria, parece ter sido
diferente. Ela parece não ter sido incentivada pelos banqueiros ou altos funcionários dos bancos.
Ao contrário, foi uma reivindicação dos funcionários, que viam a necessidade de se exercitarem
para se livrarem dos males gerados pelo trabalho nas agências e pela vontade de encontrar um
110

ambiente em que fosse possível a socialização entre pares. Nesse sentido, os motivos do início
da prática parecem ter sido diferentes entre operários e esses trabalhadores de colarinho branco.
No entanto é possível inferir, a partir da trajetória de Silvio Lagreca, que os dotes futebolísticos
ajudavam na manutenção do emprego e até em uma possível promoção, como acontecia com
os operários. Mesmo tendo sido uma iniciativa dos trabalhadores, era preciso recursos dos
bancos para o sustento dos clubes, o que faziam com que, no final das contas, eles decidissem
se e quais clubes iriam funcionar, dificultando a existência de alguns clubes, que precisavam
lutar para continuar existindo.
111

Fontes:

[sem título]. Correio Paulistano, p. 10, 18 de nov. de 1941.


[sem título]. Revista Satélite, v. 355, n. XLIII, out/nov de 2010..
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A JUNTA GOVERNATIVA. Aos bancarios. Vida Bancaria, n. 156, p. 4, 18 de dez. de 1935.
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Alexandre Kassab faz importantes declarações sobre as atividades da Federação Esportiva
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Ao lado da multiplicação dos bancos floresce a miséria dos bancários ... Folha Bancaria,
21. ed. p. 6, jul. 1944.
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Associação dos Bancarios. Vida Bancaria, n. 88, p. 7, fev. de 1932.
Ata da reunião da diretoria de 01 de abril de 1941.
Ata da reunião da diretoria de 05 de dezembro de 1939.
Ata da reunião da diretoria de 05 de novembro de 1935.
Ata da reunião da diretoria de 06 de outubro de 1942.
Ata da reunião da diretoria de 11 de abril de 1944.
112

Ata da reunião da diretoria de 11 de novembro de 1937.


Ata da reunião da diretoria de 11 de setembro de 1941.
Ata da reunião da diretoria de 13 de março de 1941.
Ata da reunião da diretoria de 14 de janeiro de 1940.
Ata da reunião da diretoria de 17 de novembro de 1941.
Ata da reunião da diretoria de 18 de agosto de 1936.
Ata da reunião da diretoria de 20 de maio de 1943.
Ata da reunião da diretoria de 21 de outubro de 1937.
Ata da reunião da diretoria de 22 de setembro de 1942.
Ata da reunião da diretoria de 28 de janeiro de 1937.
Ata da reunião da diretoria de 28 de janeiro de 1942.
Ata da reunião da diretoria de 29 de dezembro de 1941.
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113

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Em brilhante reunião realizada na ultima quinta-feira a Liga Bancaria de Esportes Athleticos
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Entrevista do Presidente da Junta Governativa Provisoria com o “Diario Popular”. Vida
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Está em perspectiva uma scisão no esporte bancário. Correio de S. Paulo, p. 4, 24 de jul. de
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O que será o sexto Campeonato Bancario de Atletismo. Folha Bancaria, n. 6, p. 13, fev. de
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Os bancarios paulistas victoriosos. Correio Paulistano, p. 8, 10 de set. de 1935.
Os esportes bancarios continuarão sua rota progressista. Correio Paulistano, p. 14, 06 de fev.
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PONTIN, José Afonso. Satélite: A obra dos homens 1935-1991. São Paulo: Satélite Esporte
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Premente necessidade de reajuste no salário dos bancários. Folha Bancária, 20. ed. p. 1, abr.
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Quantos somos? Vida Bancaria, 159. ed. p. 8, 20 de mar. de 1936.
R.R. Quantos somos? Vida Bancaria, 83. ed. p. 1, set. de 1931.
Relatório da gestão de 1935, apresentado pela diretoria á Assembleia Geral de 14 de dezembro
de 1935. Vida Bancaria, 156. ed. p. 1 a 3, 18 de dez. de 1935.
Relatório dos trabalhos da diretoria da Associação dos Bancarios de S. Paulo - órgão Sindical,
correspondente à sua gestão durante o anno de 1933, e apresentado á Assembleia Geral
Ordinária em 14 de março de 1934. Vida Bancaria, 113. ed. p. 1 a 5, 27 de mar. de 1934.
Salário profissional, velha aspiração dos bancários. Folha Bancária, 23. ed. p. 1 e 2, fev. de
1945.
Satellite e Bancaleman medem-se, hoje, na segunda “melhor de tres”. Correio Paulistano, p. 8,
11 de mar. de 1939.
116

Será inaugurada hoje a nova sede do Satelite F. C. Correio Paulistano, p. 6, 28 de nov. de


1942.
SOFOCLES. Maus companheiros? Vida Bancaria, 106. ed. p. 5, 10 de dez. de 1933.
SOFOCLES. Vantagens e consciências que se vendem. n. 127, p. 1, 12 de nov. de 1934.
Suspensão dos jogos da Liga Bancaria. Correio Paulistano, p. 8, 07 de jul. de 1934.
Também o salario fome no Rio Grande do Sul. Vida Bancaria, 155. ed. p. 2, 30 de nov. de
1935.
Terceiro campeonato brasileiro bancario de desportos. Correio Paulistano, p. 8, 17 de set. de
1943.
Teremos hoje uma fase empolgante do V Campeonato Brasileiro Bancario de Desportos.
Correio Paulistano, p. 10, 07 de set. de 1945.
Torneio de xadrez. Vida Bancaria, n. 4, p. 13, jun. de 1940.
Vamos promover no proximo mês o segundo campeonato brasileiro bancario de esportes.
Correio Paulistano, p. 8, 19 de nov. de 1942.
Velha aspiração dos bancarios realizada. Correio Paulistano, p. 16, 20 de out. de 1940.

YAPO. Athletismo. Vida Bancaria, 63. ed. p. 11, jan. de 1930.


YAPO. Athletismo. Vida Bancaria, 64. ed. p. 5, fev. de 1930.
YAPO. O próximo campeonato bancario. Vida Bancaria, 84. ed. p. 5, out. de 1931.
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Apêndice I - Lista de clubes e bancos

Associação Athletica Banco Nacional do Commercio – Banco Nacional do Comércio


Associação Athletica Banco do Brasil - São Paulo (A.A.B.B. - São Paulo) - Banco do Brasil
Bancaleman Futebol Clube – Banco Allemão Transatlântico
Banco Português do Brasil A. C. – Banco Português do Brasil
British Brazilian Sporting Association/ British Bank F. B. C. – British Bank of South America
Limited
City Bank Club/ City Bank F. B. C.- National City Bank of New York
Club Athletico Germânico – Banco Germânico da América do Sul
Clube Athletico Banco Commercial – Banco Commercial do Estado de São Paulo
Clube Athletico Banco de S. Paulo – Banco de São Paulo
Clube Athletico Minasbank/ Minasbank F. B. C. - Banco Hypotecario e Agricola do Estado de
Minas Geraes.
Clube Banco Noroeste - Banco Noroeste do Estado de São Paulo
Clube Esportivo Banco Nacional Ultramarino – Banco Nacional Ultramarino
Clube Esportivo Induscomio/ Induscomio F. B. C. - Banco do Commercio e Industria de São
Paulo
Esporte Clube Banco Italo-Brasileiro – Banco Italo-Brasileiro
Esporte Clube Banco Mercantil – Banco Mercantil
Esporte Clube Bancolanda - Hollandsche Bank voor Zuid-Amerika
Esporte Clube Banespa – Banco do Estado de São Paulo
Esporte Clube Sudameris/ Sudameris F. B. C. - Banque Française & Italienne pour l’Amerique
de Sud
Itelbank Futebol Clube – Banco Ítalo-Belga
London Bank Club/ London Bank F. B. C. - Bank of London & South America
Royal Bank Club/ Royal Bank F. B. C. - Royal Bank of Canada
Satelite Futebol Clube - Banco do Brasil
123

Anexo I – Tabela de conjuntura e ações do sindicato 292

Conjuntura Ano Reivindicações Negociação Reivindicações


Fundação da Liga
"Crash" na bolsa de Bancária de Esportes
Nova Iorque. Atléticos.
Getúlio inicia a Busca na Câmara
Curso de Contabilidade e
campanha da Municipal do
Línguas.
Aliança Liberal em 1929 reconhecimento da
Fundação da Sucursal em
São Paulo. Cai a Associação como sendo
Santos.
cotação do café de utilidade pública
Verba para a biblioteca.
Deixa de circular o
Boletim Informativo.
Fechamento da sucursal
de Santos.
Organização doo
regulamento interno para
Cotação do café cai
reger a assistência
vertiginosamente.
médica. Extensão da
Revolução depõe
assistência médica às
Washington Luiz.
famílias dos bancários.
Getúlio assume. 1930
Comissão para elaborar
Criação o Ministério
Projeto de Lei de
do Trabalho,
Aposentadoria e Caixa de
Indústria e
Pensões.
Comércio
Ofício a Lindolfo Collor
expondo os motivos para
a fundação da Caixa de
Aposentadorias.
Festival em homenagem
ao Ministro do Trabalho.
Compra da Sede Própria
(Rua Conselheiro
Furtado).
Inauguração de um
Grêmio Bancário.
Comissão para estudos
1931 sobre a Lei de
Aposentadoria;
União com sindicalistas
do Rio a fim de
estudarem a possibilidade
de algumas
reivindicações em
conjunto.
Reforma dos estatutos.
Êxito na reivindicação.
Greve envolvendo
Comissão para tratar de
cerca de 200.000
uma Cooperativa de
trabalhadores
bancários.
paulistas, reprimida
Solicitação de audiência
com violência.
1932 2 horas de almoço Direto com os Bancos ao Ministério do
Estoura a Revolução
Trabalho. (Visita de
Constitucionalista
Salgado Filho ao
em julho. Em
Sindicato).
outubro a revolta
Entrega de documento ao
fracassa.
Ministro do Trabalho.

292
Cedoc-Bancários, pasta 3007.
124

Reforma do estatuto,
eliminação do voto por
procuração;
Fundação do Grêmio dos
Bancários.
Êxito na reivindicação;
Idealização e fundação da
coligação dos Sindicatos
Proletários de São Paulo.
Comissão para estudar a
fundação de uma
Federação Nacional dos
Sindicatos de Bancários
do Brasil.
Através do Estado
1933 Lei das 6 horas Reforma do estatuto.
Projeto de Lei
Organização do Comitê
para fundação da
Federação Estadual dos
Sindicatos de Bancários
de São Paulo.
Mudança do nome
“Grêmio dos Bancários”
para Departamento de
Cultura Inelectual.
Greve vitoriosa. Êxito
nas reivindicações.
Eleições para a primeira
diretoria da Cooperativa
Constituinte.
Caixa de Aposentadorias dos Bancários de São
Choque entre
e Pensões (IAPB) Greve Paulo.
antifascistas e 1934
Estabilidade Dias 5 e 6 de Julho Colaboração na Frente
integralistas na Sé,
Salário Mínimo Única Sindical.
em 7 de outubro
Ajuda Financeira aos
Movimentos Grevistas.
Criação do racha SYN-
DIKÊ
Jornal passa a se semanal.
Centro de Cultura dos
Criação da ANL Bancários.
Criação da Lei de Publicação da Revista
Projeto de Lei (sem
Segurança Nacional 1935 Salário Mínimo Cultura.
êxito)
Estado de sítio em Participação na fundação
todo o país da Confederação.
Colaboração na Frente
Libertadora Nacional
Reabertura do Clube
Bancário.
Negociação como Banco
Ultramarino sobre
Criação do Tribunal
contratos ilegais.
de Segurança
Salário Mínimo Ministério do Libertação de 2 bancários
Nacional. 1936
Salário Profissional Trabalho (sem êxito) presos.
Milhares de prisões
Negociação com o Royal
por todo o ano.
Bank Canadá;
Mudança na linha do
jornal Vida Bancária.
Negociação com o British
Implantação do Homenagem a Getúlio
1937
Estado Novo Vargas.
125

Incentivo ao Depto,
Jurídico
Campeonato de Bola ao
1º Congresso da Classificação por
Projeto de Lei (sem Cesto
UNE 1938 categoria em colaboração
êxito) Proposta de Reforma do
Golpe integralista com Sind. Do RJ.
Regulamento do IAPB
II Guerra Mundial Unificação do Sindicato
1939
Criação do DIP com o SYN-DIKÊ
Organização da discoteca
Criação do Imposto
1940 2º Congresso Brasileiro
sindical
de Bancários
Substituição do
mobiliário do mobiliário
do Salão Principal.
Nomeação de comissões
para estudar a
implantação de Farmácia,
Gabinete dentário e
Escola Técnica
Profissional.
Incentivo e cooperação
Criação da Justiça Min. Do Trabalho para a organização de
1941 Aumento de salários
do Trabalho (concedido) comissão de 2 pessoas de
cada banco do Eixo para
entrega de memorial ao
Min. do Trabalho
pedindo amparo para os
empregados dos bancos
eixistas.
Participação na
Campanha Nacional de
Aviação Civil. Compra
de 1 avião.
Inauguração da Farmácia
e Gabinete Dentário.
Fundação da Escola
Técnica Bancária.
Articulação com demais
Manifestação sindicatos do país para
antifascista no Rio. estudo em conjunto de
Declaração de 1942 “problemas de interesse
Guerra à Alemanha coletivo”.
e Itália Contato com Comissão
de Reemprego nomeada
pelo Min. do Trabalho
para resolução da
situação dos bancários de
bancos do Eixo.
Contra a abolição da Campanha junto a
estabilidade aos 2 anos. Presidência da
Pelo pagamento de República.
extraordinários. Apoio e cooperação à
Criação da CLT 1943 Min. Trabalho
Salário completo de 30 iniciática da Fundação de
dias para trabalhadores uma comissão de
afastados por doença. Assistência ao Bancário
Aumento salarial convocado.
FEB 1944
Eleições p/
Dissídio impetrado
presidente da 1945 Campanha Salarial Êxito na campanha.
pelos bancários
República.

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