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Jacque Spotto17/08/2022

Imagine você sonhar com pessoas que não conhece, e depois de um tempo conhecê-las
pessoalmente, ou ainda, conseguir invadir os sonhos de outras pessoas enquanto você está
dormindo e não lembrar de nada. Pois é isso que acontece com dois dos personagens de ?A
Sociedade dos Sonhadores Involuntários''.

Todo o cenário ligado aos sonhos no livro vai muito além de acontecimentos fantásticos, aqui
o escritor usa dessa alegoria para demonstrar como os conflitos na Angola e seu contexto
político maltratou uma população que de 1975 (Independência da Angola de Portugal) até
2002, foi cenário de uma longa guerra civil. Sabemos que todas as guerras são ruins, mas a
civil tem um cunho íntimo de discórdia entre uma população-irmã, são família, amigos, lutando
entre si de lados opostos.

O jornalista Daniel Benchimol (que sonha com pessoas que ainda não conhece) e sua esposa
se divorciaram por uma discordância entre lados partidários. O hoteleiro Hossi (que consegue
invadir os sonhos de várias pessoas) tem uma rixa com seu irmão gêmeo por lutarem em
lados opostos na guerra. Como os dois, milhares de pessoas passaram pelo mesmo problema
em seu país.

Algo evidente também em sua obra é a falta de esperança de uma sociedade que já não vê
perspectiva de mudança, e os jovens que renovam essa busca utópica por uma sociedade
mais igualitária. Aqui, Agualusa apresenta o ? Revus?, um grupo de jovens revolucionários
que realmente existiu em 2015, reivindicavam a queda da corrupção, denunciavam a
inexistência de distribuição de riqueza e a falta de liberdade de expressão. Na obra, uma das
líderes do grupo é a filha de Daniel, Karinguiri.

Com a prisão do grupo há uma comoção nacional, e Hossi consegue adentrar nos sonhos da
população com um único objetivo: reviver a chama da busca pela igualdade. Nessa mistura de
irrealidade e acontecimentos políticos, o escritor planta uma semente na mente dos leitores
que me lembra muito o trecho da música ?Prelúdio? do Rauzito: ?Sonho que se sonha só, é
só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade?.

?O medo destrói as pessoas. Corrompe mais do que o dinheiro? O medo não é uma escolha.
Não há como evitar sentir medo. Contudo podemos escolher não nos rendermos a ele?. (p.
208)

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