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Disciplinarum Scientia. Série: Naturais e Tecnológicas, Santa Maria, v. 19, n. 1, p. 177-189, 2018.

Recebido em: 11.07.2018. Aprovado em: 20.08.2018.


ISSN 2176-462X

RESISTÊNCIA À EROSÃO NA TEMPERATURA AMBIENTE DE


CERÂMICAS DE ENGENHARIA (Al 2O 3, ZrO 2, Si 3N 4) E SUA
RELAÇÃO COM AS PROPRIEDADES MECÂNICAS DE
DUREZA E TENACIDADE À FRATURA 1
EROSION RESISTANCE AT ROOM TEMPERATURE OF ENGINEERING
CERAMICS (Al 2O 3, ZrO 2, Si 3N 4) AND THE RELATION TO MECHANICAL
PROPERTIES OF HARDNESS AND FRACTURE TOUGHNESS

Cássio Dauber2, Annelise Kopp Alves3 e Carlos Pérez Bergmann4

RESUMO

O desgaste por erosão provoca a progressiva perda de material a partir da superfície da peça, e é um dos limitan-
tes da vida útil dos componentes. A taxa de erosão de três tipos de cerâmicas de Engenharia comerciais, Al2O3
(alumina), ZrO2 (zircônia) e Si3N4 (nitreto de silício), foram relacionadas com suas propriedades mecânicas de
tenacidade à fratura e dureza, quando submetidos às mesmas condições de desgaste por erosão à temperatura
ambiente. As superfícies submetidas ao ensaio foram analisadas em microscópio eletrônico de varredura. O Si3N4
apresentou a menor taxa de erosão dos materiais ensaiados, seguido da ZrO2 e da Al2O3. A taxa de erosão desses
materiais mostrou-se diretamente relacionada com a tenacidade à fratura, mas não com a dureza.

Palavras-chave: desgaste, impacto, superfície.

ABSTRACT

Erosion wear causes a progressive loss of material from the surface and it restricts the components useful life.
The erosion rate of three types of Engineering ceramics: Al2O3 (alumina), ZrO2 (zirconia) and Si3N4 (silicon
nitride) was related with their mechanical properties of fracture, toughness and hardness, when submitted to
the same conditions of erosion wear at room temperature. The surfaces submitted to erosion were analyzed
by scanning electron microscope. The Si3N4 presented the lowest erosion rate of tested materials, followed
by ZrO2 and Al2O3. The erosion rates of these materials demonstrate a direct relation with the fracture
toughness, but not with the hardness.

Keywords: wear, impact, surface.

1
Artigo Técnico.
2
Engenheiro Mecânico. Aluno do Mestrado em Ciência e Tecnologia dos Materiais - UFRGS. E-mail: cassiodauber@
ifsul.edu.br
3
Coorientadora. Engenheira de Materiais. Profa. Dra. do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Minas, Metalúrgica
e de Materiais - UFRGS. E-mail: annelise.alves@ufrgs.br
4
Orientador. Engenheiro Metalúrgico. Prof. Dr. do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Minas, Metalúrgica e
de Materiais - UFRGS. E-mail: bergmann@ufrgs.br
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INTRODUÇÃO

A erosão é um processo de degradação do material quando em serviço e submetido ao cho-


que sucessivo de partículas erosivas contra sua superfície. Diversos fatores concorrem para definir
o quanto um material pode resistir a esses esforços, como: i) o meio em que ocorre a erosão; ii) as
propriedades das partículas erosivas; iii) as propriedades superficiais do material que sofre o ataque.
O conjunto destes fatores constitui o sistema tribológico no qual o material está inserido.
Existe diferença no comportamento dos materiais dúcteis e frágeis quanto ao processo de
erosão, prevalecendo, nos materiais dúcteis a deformação plástica e a remoção por cisalhamento; e
nos materiais frágeis, a susceptibilidade à formação e propagação de trincas, sendo o material remo-
vido da superfície pela interligação das trincas causadas pelo impacto das partículas. O processo de
erosão nestes materiais é cumulativo, pois o choque de uma partícula poderá não produzir a remoção
imediata do material, mas a repetição do processo sim. Portanto, quando uma partícula erosiva atinge
a superfície do material, poderá surgir uma trinca, e esta, ao se encontrar com outras formadas an-
teriormente, promoverá o desprendimento de uma pequena parcela do material, ou seja, o dano por
erosão (FANG, 2015).
A erosão de materiais frágeis, entendida como formação e interconexão de trincas, levando à
perda de material pela superfície, dependeria tanto da resistência à propagação das trincas (tenacidade à
fratura) quanto da resistência à deformação plástica (dureza) do material (HOCKEY; WIEDERHORN;
JOHNSON, 1977).
É possível descrever a tenacidade à fratura do material (K Ic) como a resistência que o material
apresenta à propagação da trinca: é uma propriedade do material e apresenta variações conforme o
processo de fabricação e microestrutura (CALLISTER; RETHWISCH, 2016). A dureza é um parâ-
metro normalmente utilizado para avaliar a resistência da superfície do material à deformação plásti-
ca causada pela penetração de outro material duro.
A tenacidade à fratura e a dureza do material são reconhecidas por diversos autores (HOCKEY;
WIEDERHORN; JOHNSON, 1977; AQUARO; FONTANI, 2001; EVANS; GULDEN; ROSENBLATT,
1978; WADA; WATANABE, 1987) como as principais propriedades mecânicas dos materiais que
influenciam na taxa de erosão.
Dentre os materiais, as cerâmicas têm se destacado pela resistência à erosão. Trata-se de mate-
riais que apresentam átomos com ligações iônicas e/ou covalentes, que conferem a esses materiais, via
de regra, elevado módulo de elasticidade e dureza. A cerâmica de Engenharia é uma classe de cerâ-
micas que apresenta rígido controle das matérias-primas e dos parâmetros processuais, o que resulta
em cerâmicas com propriedades controladas. Para o uso estrutural das cerâmicas de Engenharia, um
dos requisitos mais importantes é uma elevada tenacidade à fratura (KIC).
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Este trabalho visa então avaliar a resistência ao desgaste erosivo à temperatura ambiente de
três cerâmicas técnicas muito empregadas em situação de desgaste (Al2O3, ZrO2 e Si3N4), tendo como
base de análise propriedades do seu comportamento mecânico (tenacidade à fratura e dureza).

MATERIAL E MÉTODOS

A metodologia utilizada para realização desse trabalho seguiu o fluxograma da figura 1.

Figura 1 - Fluxograma da metodologia usada para a realização do trabalho.

As cerâmicas utilizadas neste trabalho foram a Al2O3 (alumina A-479), ZrO2 (zircônia Z201N)
e Si3N4 (nitreto de silício SN-220). Todos os materiais são comerciais, produzidos pela empresa Kyo-
cera Group - Fine Ceramics (Japão) (KYOCERA, 2017). Os corpos de prova foram cortados nas
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dimensões de 20X20X5 mm, e o acabamento da superfície não foi alterado, mantendo-se conforme
o fornecido pelo fabricante. Na tabela 1 são apresentadas as características dos materiais cerâmico
investigados, sendo os dados fornecidos pelo fabricante.
O material erodente utilizado foi a alumina eletrofundida marrom, produzida pela empresa
Elfusa, de granulação 180, com o tamanho médio das partículas de 98 µm, valor obtido em teste de
granulometria em equipamento por difração de laser Cilas 1180L.

Tabela 1 - Características mecânicas das cerâmicas Al2O3 (alumina A-479),


ZrO2 (zircônia Z201N) e Si3N4 (nitreto de silício SN-220) (dados do fabricante).

Características Al2O3 ZrO2 Si3N4


Identificação Kyocera A-479 Z-201N SN-220
Densidade (g/cm3) 3,8 6,0 3,2
Dureza Vickers (HV) 1600 1230 1450
Resistência à flexão a 3 pontos (MPa) 310 1000 590
Módulo de elasticidade (GPa) 360 200 294
Coeficiente de Poisson 0,23 0,31 0,28
Tenacidade à fratura (MPa.m1/2) 3-4 4-5 6-7

A análise microestrutural foi realizada por microscopia ótica (MO) (equipamento: Olympus,
modelo BXS1M), difração de raios X (equipamento: Phillips, modelo X’Pert) e microscopia eletrônica
de varredura (MEV) com um equipamento ZEISS, modelo EVO.
O equipamento utilizado para os ensaios de desgaste erosivo está baseado na norma ASTM
G76 - 13, que normatiza o ensaio de erosão pelo impacto de partículas sólidas por meio da utilização de
jato de gás (Figura 2). A tabela 2 sumariza os parâmetros adotados na realização dos ensaios de erosão.
A erosão foi realizada com os ângulos de impacto das partículas foi de 90°, 60° e 30° na temperatura
ambiente. Para cada condição, o ensaio foi repetido três vezes e utilizados corpos-de-prova distintos.

Figura 2 - Desenho esquemático do forno de ensaios, tubo acelerador e sistema de medição da velocidade (VICENZI, 2007).
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Tabela 2 - Parâmetros adotados na realização dos ensaios de erosão.

Tempo de ensaio (min) 30


Fluxo de partículas (g/s) 0,167
Tamanho médio das partículas (µm) 98
Velocidade das partículas (m/s) 50

A erosão foi determinada pela perda de volume, a partir da perda de massa, considerando a den-
sidade dos materiais ensaiados. A taxa de erosão foi determinada pela razão entre o volume perdido pelo
corpo de prova no ensaio dividido pela massa de erodente utilizada no ensaio, conforme a equação 1:

(Equação 1)

sendo:
Tvol = Taxa de erosão volumétrica (cm3alvo/gerodente);
mi = massa inicial do corpo-de-prova (g);
mf = massa final do corpo-de-prova (g);
ρa = densidade do material do corpo-de-prova (g/cm3);
me = massa de erodente utilizado (g).

A velocidade das partículas erodentes foi medida com base no método que preconiza a utili-
zação de dois discos giratórios coaxiais, os quais são posicionados no sentido do fluxo das partículas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na figura 3 apresenta-se os resultados da taxa de erosão, como média de 3 amostras ensaiadas,


obtidos para a Al2O3, ZrO2 e Si3N4 à temperatura ambiente, nos ângulos de impacto de 30, 60 e 90°.

Figura 3 - Taxa de erosão da Al2O3, da ZrO2 e do Si3N4 em função do


ângulo de impacto (30°, 60° e 90°) à temperatura ambiente (25°C).
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Pelos resultados obtidos, é possível verificar que, para qualquer ângulo de impacto, o material
que apresentou menor taxa de erosão foi o Si3N4, seguido pela ZrO2 e Al2O3. A taxa de erosão do Si3N4
foi praticamente desprezível, se comparada à da Al2O3 e à da ZrO2.
Verifica-se também que a taxa de erosão da Al2O3 cresceu significativamente com o aumento
do ângulo de impacto, atingindo um máximo a 90°. De fato, vários trabalhos, como o de Wellmann
e Allen (1995), relatam o mesmo, que aluminas sofrem maiores desgaste erosivo a elevados ângulos
de impacto, entre 60 e 90°. Esse comportamento da Al2O3 diferiu do desempenho da ZrO2 e do Si3N4,
pois não foi possível constatar um significativo aumento da taxa de desgaste, comparando-se as taxas
de desgaste para os ângulos de 30° e 90°.
As imagens por MEV da superfície da Al2O3, ZrO2 e Si3N4 antes do ensaio de erosão são apre-
sentadas na figura 4. Essas imagens podem ser comparadas com as imagens por MEV apresentadas
na figura 5, figura 6 e figura 7, respectivamente para a Al2O3, ZrO2 e Si3N4 de suas superfícies após
desgaste com os ângulos de ataque de 30°, 60°, 90°.

Figura 4 - Imagens por MEV da superfície das amostras antes dos ensaios de erosão:
Al2O3 (a); ZrO2 (b); e Si3N4 (c). MEV 3000X.

Figura 5 - Imagens por MEV da superfície da Al2O3, após ensaio de erosão à


temperatura ambiente com ângulo de impacto de a) 30°; b) 60°; c) 90°. MEV: 3000X.

Figura 6 - Imagens por MEV da superfície da ZrO2, após ensaio de erosão à


temperatura ambiente com ângulo de impacto de a) 30°; b) 60°; c) 90°. MEV 3000X.
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Figura 7 - Imagens por MEV da superfície do Si3N4, após ensaio de erosão à
temperatura ambiente com ângulo de impacto de a) 30°; b) 60°; c) 90°. MEV 3000X.

Nas imagens obtidas por MEV da Al2O3 após erosão, a superfície erodida apresenta ir-
regularidades que sugerem um desprendimento de material pela múltipla remoção de grãos, em
fraturas intergranulares (Figura 5). A fratura intergranular caracteriza-se pela formação de trincas
ao longo dos contornos de grãos, que vão propagando-se até ocasionar o desprendimento do grão.
Esse processo é sucessivo, levando à perda de volume do material. A presença de “crateras” nas
imagens por MEV da figura 5, em maiores quantidades para maiores ângulos de impacto do ero-
dente, corresponde à maior severidade do desgaste erosivo. Esta análise está em consonância com
o formulado por alguns autores, como Schwartz (1992), que Al2O3 fratura primariamente via modo
intergranular. Outros materiais podem apresentar fratura primariamente transgranular ou a combi-
nação destes dois processos primários de fratura.
Ao analisar o comportamento do desgaste erosivo da ZrO2 (Figura 6), chama a atenção o
fato da menor taxa de erosão ter ocorrido para o ângulo de impacto de 90°. A explicação para o
fato pode ser o efeito de ricochete das partículas erodentes, que depois de atingirem a superfície da
zircônia são projetadas de volta e atingem outras partículas que estão se dirigindo contra a super-
fície, fazendo que ocorra uma perda de eficiência do processo erosivo. Este fenômeno também foi
verificado para o Si3N4.
Assim, para a Al2O3, que tem resistência mecânica menor, a maior parte energia da partícula
erodente é absorvida pelo material na forma de trincas, enquanto que a ZrO2 e o Si3N4, a maior parte
da energia da partícula é absorvida na forma de deformação elástica e devolvida à partícula, o fará
com que esta ricocheteie.
Nas imagens por MEV da superfície da ZrO2, ficaram mais evidentes as trincas laterais clás-
sicas das fraturas frágeis (Figura 8). Quando a partícula erodente atinge a superfície do material,
provoca uma remoção de parte do material, fraturas radiais e laterais, ou ambas as situações.
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Figura 8 - Imagem por MEV da superfície da ZrO2. Em detalhe, o dano do impacto de
uma partícula e as fraturas laterais a partir do ponto de impacto. Aumento MEV: 3000X.

A ZrO2 é um material cerâmico que à pressão atmosférica pode formar 3 cristais distintos,
dependendo da temperatura: monoclínica, tetragonal e cúbica. Somente a fase monoclínica é estável
à temperatura ambiente, sendo que esta fase é a que apresenta maior volume. Durante as transforma-
ções de fase desse material, por exemplo, no resfriamento após processamento, ocorrem variações de
volume, notadamente a que surge por volta 1.100°C. Essas transformações podem provocar tensões
internas e até a fratura do material.
A ZrO2 investigada é uma zircônia parcialmente estabilizada (PSZ), que apresenta a fase tetra-
gonal à temperatura ambiente, obtido com o uso de aditivos de estabilização desta estrutura cristalina.
Ocorre que, na temperatura ambiente, quando uma trinca se desenvolve na superfície de uma peça
de zircônia com a fase metaestável tetragonal, esta é sujeita a um estresse de tensão macroscópico.
Essa concentração de tensão de tração na ponta da trinca causa a transformação da fase metaestável
tetragonal para a fase cristalina monoclínica. O consequente aumento de volume dos cristais, compri-
midos pelos demais ao redor, resulta em uma tensão de compressão favorável, que age na superfície
da trinca, e, assim, impede sua propagação (KELLY; DENRY, 2008).
A análise por difração de raios X das amostras de zircônia investigada (Figura 9), sugere que
após os ensaios de erosão houve aumento da fase cristalina monoclínica.
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Figura 9 - a) Análise por difração de raios X da zircônia antes do ensaio de erosão. Difratograma conforme ficha CIF
9309161. b) Análise por difração de raios X da zircônia após ensaio de erosão, com ângulo de impacto de 90° e tempe-
ratura ambiente. Verifica-se pequena alteração nas fases, se comparado a análise do material antes do ensaio.

Quanto ao Si3N4, as imagens por MEV (Figura 5) sugerem que sua menor taxa de erosão,
se comparada com os resultados da Al2O3 e da ZrO2 em todas as condições investigadas, pode estar
supostamente associada ao seu menor tamanho de grão, que leva a um menor desprendimento de
material quando da interseção das trincas. Além disso, a maior tenacidade à fratura do Si3N4 também
atuaria contra a propagação e intersecção de trincas, levando a menor taxa de erosão principalmente
para os ângulos de impacto de 30° e 60°.
A maior tenacidade à fratura do Si3N4, segundo Choi et al. (2003), estaria baseada na sua mi-
croestrutura formada tipicamente por grãos aciculares. As trincas propagam-se pelo contorno dos grãos
menores até encontrar um grão maior e, para continuarem a propagar-se, terão de contornar o grão
maior ou provocar uma fratura transgranular. A figura 10 apresenta detalhe que sugere interseção de
trincas, que levariam ao despreendimento de material da superfície durante o processo erosivo do Si3N4.

Figura 10 - Imagem por MEV da superfície do Si3N4 após erosão. Detalhe que sugere interseção de trincas,
que levariam ao desprendimento de material da superfície durante o processo erosivo. MEV 3000X.
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Pode-se constatar que a Al2O3, em ângulos de impacto maiores, o efeito do ataque erosivo tor-
na-se acentuado, o que não só evidenciado pela formação de crateras na superfície após erosão, mas
até mesmo por imagens de MEV, como as apresentadas na figura 11. Antes do ensaio de erosão, era
possível distinguir o contorno de grãos; após o ensaio, a superfície perde uma mais clara definição.

Figura 11 - Imagens por MEV da superfície da Al2O3 antes do ensaio (a) e após
ensaio de erosão a 90° à temperatura ambiente (b). Aumento MEV: 3000X.

ANÁLISE DA RELAÇÃO COM AS PROPRIEDADES MECÂNICAS DE DUREZA E


TENACIDADE À FRATURA

Ao analisar a taxa de erosão e a tenacidade à fratura da Al2O3, ZrO2 e Si3N4 (Figura 12) em todas
as condições investigadas de desgaste erosivo. O Si3N4 apresentou menor taxa de erosão e possui o maior
valor de tenacidade à fratura; já a Al2O3 apresentou maior taxa de erosão e menor valor de tenacidade à
fratura, e a ZrO2, cuja tenacidade à fratura situa-se intermediariamente a dos dois outros materiais, tam-
bém apresentou taxa de erosão intermediária a desses materiais. Portanto, obteve-se uma excelente re-
lação entre a tenacidade à fratura e o dano sofrido pelo material cerâmico submetido ao ataque erosivo.

Figura 12 - Taxa de erosão em função da tenacidade à fratura para os materiais


ensaiados à temperatura ambiente e com ângulo de impacto de 30°, 60° e 90°.
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A figura 13 apresenta a variação da taxa de erosão, em perda de volume por massa de ero-
dente impactada sobre os corpos cerâmicos, em função da dureza dos materiais cerâmicos. Não foi
possível observar uma relação direta entre a taxa de erosão e a de dureza, pois o Si3N4, que foi o
material que apresentou menor taxa de erosão, possui dureza intermediária entre a da ZrO2 e a da
Al2O3. Também, foi verificado que a Al2O3, o material de maior dureza, foi o que apresentou a maior
taxa de erosão nos testes realizados.
A dureza é propriedade considerada de importância no desgaste de materiais, mas a sua re-
lação ainda é ambígua. Segundo Wiederhorn e Hockey (1983) a quantidade de lascas desprendidas
da superfície de um material no desgaste erosivo é proporcional à máxima carga durante o impacto:
a relação entre a carga e a dureza sugere que a taxa de erosão aumenta com o aumento da dureza.
A penetração (dureza) seria também relevante porque determina a profundidade abaixo da superfície
onde as trincas laterais se formam: maior a penetração (menor dureza), maior a taxa de erosão.

Figura 13 - Taxa de erosão em função da dureza para os materiais ensaiados em


temperatura à ambiente e com ângulo de impacto de 30°, 60° e 90°.

CONCLUSÕES

Os resultados experimentais obtidos no desenvolvimento deste trabalho evidenciaram a


dependência da resistência à erosão dos materiais cerâmicos a suas propriedades mecânicas. Os maio-
res valores da taxa de erosão foram obtidos nos ângulos de 60° e 90°, mostrando que os materiais
cerâmicos são mais resistentes à erosão em ângulos de impacto menores.
O Si3N4, que tem o maior valor de tenacidade à fratura (7 MPa.m1/2), apresentou a menor taxa
de erosão dos materiais ensaiados, seguido da ZrO2 (5 MPa.m1/2) e da Al2O3 (4 MPa.m1/2). Assim foi
possível verificar que a relação entre as propriedades mecânicas e a resistência ao desgaste dos mate-
riais cerâmicos sugerem uma maior influência da tenacidade à fratura do que a da dureza, para defi-
nir o comportamento do material em resposta às solicitações erosivas. Assim, a tenacidade à fratura
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seria um excelente indicativo, e melhor, em relação à dureza, de desempenho dos materiais cerâmicos
quando submetido ao desgaste por erosão.

REFERÊNCIAS

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