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FILOSOFIA MODERNA O homem passaria a olhar o mundo desde


então, não mais a partir de Deus, mas a partir de si
1. RENASCIMENTO – ROMPIMENTO COM O mesmo. O centro das coisas agora era o homem
ANTIGO E O NASCIMENTO DO (MUNDO) (antropocentrismo). Por isso que os pensadores desse
MODERNO tempo ficaram conhecidos como humanistas.
Eles estavam no século XIII, onde poderiam
A ruptura com o sistema feudal não aconteceu encontrar fundamentos para essas suas ideias? Isso
da noite para o dia. Foi um processo lento e gradual de mesmo, eles tiveram que recuar mais de 1.000 anos para
transformações no mundo e no pensamento que encontrar nos gregos antigos algo parecido com o que
aconteciam ainda na (baixa) Idade Média. Se ainda hoje estava acontecendo com eles. E não foi muito difícil
existem resquícios desse tempo, imagine durante essa fazer isso, já que eles estavam, onde mesmo?
passagem. Exatamente, no centro do que fora o maior império do
A ponte entre esses dois mundos foi o mundo, o mesmo que conquistou os gregos e mesclou
Renascimento, que começou ainda no século XIV e se a cultura deles com a sua, preservando vários de seus
estendeu até o século XVI. Foi ele o combustível escritos.
intelectual que justificou o abandono de uma forma Os homens do renascimento foram buscar nos
(ultra)passada de ver a si mesmo e ao mundo, e deu gregos e romanos antigos inspiração para louvarem o
novas cores, formas e respostas ao que já estava ser humano. Isso mesmo, “inspiração”. Eles não
acontecendo e ao que ainda estava por vir. Por isso, é estavam querendo simplesmente copiá-los, prova disso
ele que passaremos a estudar agora. é que diferentemente dos antigos que contemplavam a
Enquanto os grandes reinos estavam sendo natureza, os renascentistas queriam conhecê-la para
criados, porque a situação estava um caos e precisava- dominá-la.
se de um poder forte para controlá-la, na Península Não bastava um pensamento contemplativo,
Itálica, onde se encontravam as principais rotas eles queriam um saber ativo que lhes permitissem criar
comerciais, cidades muito ricas ficavam cada vez mais coisas. O homem renascentista que rompeu com as
ricas devido ao intenso comércio com o oriente. imposições da sociedade feudal, agora queria romper
As mais ricas cidades foram Gênova, Veneza e também com as imposições que a natureza lhe
Florença, comandadas por ricas famílias de impunha. Descobrir seus mistérios para usá-los a seu
comerciantes e banqueiros, e onde um grande número favor era algo muito rentável e promissor.
de pessoas de todos os lugares passavam por lá e, além Pergunte aos navegadores que tinham que
de comerciarem, trocavam ideias e experiências de vida, desbravar os mares, aos mineradores que tinham que
ampliando os horizontes de seus habitantes. encontrar metais preciosos para cunhar moedas.
Nessas cidades, uma nova ordem social era Pergunte aos estudantes de medicina que queriam
criada. Lá os homens faziam seus destinos por conta conhecer melhor o corpo humano para trata-lo melhor,
própria, eram senhores de si, construtores de seu novo e aos engenheiros que queriam descobrir novas formas
mundo. Este, era muito diferente daquele existente no de construir armas para guerrear com mais facilidade.
campo, onde imperavam as regras sociais feudais Essa vontade de obter um conhecimento que os
sustentadas pela visão teocêntrica (Deus no centro de ajudassem em questões práticas (o embrião do
tudo) imposta pela Igreja. conhecimento científico), se refletiu em todos os ramos
Esses homens não aceitavam a imobilidade da cultura, desde a política até as artes. Mas havia algo
social, em que um servo morreria servo, quando que os impedia em progredir, e que infelizmente
homens pobres podiam ficar ricos e melhorar de via. também estava lá junto deles na Península Itálica.
Eles não aceitavam ter uma vida de penitências quando Era a Igreja com seus ensinamentos
se poderia aproveitar os prazeres que a vida tem a escolásticos, principalmente Santo Tomas de Aquino e
oferecer. Eles não aceitavam que a busca pelo lucro Aristóteles, que ensinavam um conhecimento baseado
fosse um pecado mortal, enquanto que esse lucro lhes na pura contemplação e que vinha sendo transmitido às
proporcionava mudar para uma vida melhor, na medida gerações pela tradição, que era indiscutível.
de seu próprio esforço pessoal. Para a Igreja, esses desgraçados que já haviam
Percebam que nessas ricas cidades a visão de rompido com a organização social que ela havia dito
mundo feudal (teocêntrica) fundamentada pela Igreja que era a única correta, pois reflexo da vontade de
não tinha muito espaço. Não é que todo mundo ficou Deus, agora querem descobrir os segredos do corpo
ateu nas cidades, mas é que a interpretação de mundo humano, da natureza, e do universo. Mas ela já havia
passa a se dar a partir do homem, já que ele, realmente dito tudo que tinha para ser dito.
era um pecador, mas também fora feito à imagem e Essa vontade de conhecer era uma blasfêmia
semelhança de Deus, do criador. E por ter algo de tamanha que só poderia ser purificada pelo fogo da
divino, a criatura mais perfeita criada por Deus, ele Inquisição do Santo Ofício. “Ousem questionar o que
poderia também criar maravilhas.
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dissemos e sofrerão as consequências”, era o aviso que Rafael Sanzio (1483 – 1520) – o “pintor da
a Igreja havia dado. madonas”. Veja só uma de suas obras mais famosas. A
Mas as famílias ricas ousaram, e, conhecidos Escola de Atenas representa os maiores pensadores da
como mecenas, financiaram vários artistas e cientistas, grécia antiga, tendo Platão e Aristótels ao centro.
que com sua arte e invenções iam firmando os valores
burgueses na nova sociedade.
Nas artes eram usados conhecimentos
científicos e matemáticos, e nelas se destacaram grandes
nomes na Península Itálica, tais como:
Leonardo da Vince (1452 – 1519) – grande
gênio da época interessou-se por tudo, engenharia,

No campo da anatomia, juntamente com


Leonardo da Vince, o médico Andreas
Vesalius causou grande revolução ao apresentar uma
astronomia, pintura, escultura, filosofia, física, música, nova maneira de conceber e analisar o corpo humano.
etc. Seus traços sempre valorizaram as formas humanas Ele foi ousado ao criticar e indicar erros cometidos por
e suas invenções militares ajudaram os homens daquela Galeno de Pérgamo, um proeminente médico e filósofo
época a se matarem com mais eficiência. Ele também romano de origem grega que era tido como o mais
dissecava corpos nas horas vagas, e seus desenhos conceituado anatomista até então. Deferentemente de
ajudaram a entender melhor o funcionamento do corpo seus contemporâneos, que acreditavam piamente nos
humano. estudos de Galeno, Vesalius ia a fundo e dissecava
Michelangelo Buonaroti (1475 – 1564) – foi corpos humanos por ele mesmo, havia até mesmo
considerado o gigante do renascimento. As suas duas dissecações públicas.
maiores obras, o teto da Capela Sistina e o Davi, foram Com as mãos constantemente ensanguentadas,
relacionadas a temas cristãos. Mas olhe só a imagem que pregava incansavelmente o conceito de que para
há por trás de Deus no momento da criação. Você conhecer o corpo humano era necessário dissecá-lo.
consegue reconhecer? E o Davi, qual a diferença com
as esculturas dos deuses e heróis gregos?

Nas ciências como a biologia, física,


matemática, astronomia, tivemos grandes nomes que
enfrentaram os dogmas (verdades indiscutíveis) da
Igreja. Nicolau Copérnico (1473 – 1543) desafiou a
teoria geocênctrica (terra no centro do universo)
defendida por Aristóteles e pela Igreja, e propôs o
modelo heliocentrico (sol no centro).

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QUESTÕES de que Michelangelo fez parte inspirava-se nos valores


da cultura e da arte criada pelos gregos na época
1. (ENEM 2011) Acompanhando a intenção da clássica. Que nome foi dado a esse movimento de
burguesia renascentista de ampliar seu domínio sobre a
renovação cultural e artística de que Michelangelo fez
natureza e sobre o espaço geográfico, através de
pesquisa científica e da invenção tecnológica, os parte?
cientistas também iriam se atirar nessa aventura, a) Iluminismo
tentando conquistar a forma, o movimento, o espaço, a b) Romantismo
luz, a cor e mesmo a expressão e o sentimento. c) Modernismo
SEVCENKO, N. O Renascimento. Campinas: Unicamp, 1984. d) Renascentismo
O texto apresenta um espírito de época que afetou e) Naturalismo
também a produção artística, marcada pela constante
relação entre 4. (UEM 2009) O Renascimento é considerado um
a) fé e misticismo. marco da Idade Moderna. Uma das características desse
b) ciência e arte. período é o processo de secularização do universo, da
c) cultura e comércio. sociedade, da cultura: muitos princípios e práticas que
d) política e economia. tinham uma fundamentação teológica e religiosa
e) astronomia e religião. adquirem um caráter laico. É possível constatar isso,
inclusive, na nova concepção que o corpo adquire
2. Durante o Renascimento, houve uma revolução durante o Renascimento.
tecnológica fundamental, em máquinas e Sobre o Renascimento e a Idade Moderna, assinale o
equipamentos, cujo impacto para o progresso das que for correto.
01) Os estudos de anatomia, praticados pelo médico
ciências equipara-se ao advento da internet no final do
belga Vesalius (1514 – 1564) e por Leonardo da Vinci
século XX. Essa revolução se deveu (1452 – 1519), não só alteram várias concepções
A) à imprensa dos tipos móveis que agilizou a troca de inadequadas da anatomia tradicional, baseadas nas
ideias e a divulgação de inventos. obras de Galeno (séc. II), como também alteram a
B) às Reformas religiosas, a partir das quais as pessoas representação religiosa do corpo humano e lhe dão uma
deixaram de ser crentes e místicas. conotação física, naturalista e biológica.
02) Por considerar o corpo humano apenas matéria, a
C) à expansão marítima, cujos lucros contribuíram para
Igreja da Idade Média não se importava com a
o desenvolvimento científico e comercial autônomo das exumação de cadáveres para a prática de experiências
colônias. científicas.
D) ao Moderno Estado Europeu, que priorizou as áreas 04) A Idade Moderna desenvolve uma concepção
exatas e tecnológicas nas universidades. mecanicista do corpo que pode, inclusive, ser
E) ao intercâmbio de informações entre as civilizações encontrada na obra de René Descartes.
europeia, chinesa e islâmica. 08) A secularização da concepção do corpo apresenta-
se durante o Renascimento na expressão artística,
como, por exemplo, na arte pictórica de Rembrandt,
3. Observe as duas imagens a seguir. A primeira é a foto
que reproduz a experiência de Vesalius no seu quadro
de uma estátua grega do século V a.C., a segunda é da
A lição de anatomia.
estátua de Davi, feita por Michelangelo, no século XVI.
16) A exumação dos cadáveres, sua dissecação e as
experiências neles exercidas eram, no início da Idade
Moderna, rigorosamente submetidas aos princípios da
bioética e fiscalizadas por um conselho composto por
membros da Igreja e magistrados.

A semelhança de estilos entre as mesmas não é


coincidência, porque o movimento artístico e cultural

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4. GALILEU GALILEI E O INÍCIO DA disputa de opiniões, a palavra de Galileu contra a de


CIÊNCIA EXPERIMENTAL Aristóteles. Qualquer pessoa podeira ver isso pelo
telescópio e atestar que Galileu estava com a razão.
Na Itália, Galileu Mediante a luneta, se podem ver, além das
Galilei (1564 – 1642) estrelas fixas, "outras inumeráveis estrelas jamais
conseguiu se impor como divisadas antes de agora"; o universo, em suma, torna-
um grande matemático e se maior; constata-se que a lua não é um corpo
inventor. Ele era perfeitamente esférico, como até então se acreditava,
estudante de medicina e mas é escabrosa e desigual como a terra (este é um
abandonou o curso, para resultado que destrói uma coluna da cosmologia
desgosto da família, no aristotélico-ptolomaica, isto é, a ideia da clara distinção
intuito de se aprofundar entre a terra e os outros corpos celestes); vê-se que a
nos estudos de matemática, que era sua grande paixão. Galáxia não é “nada mais que um monte de inumeráveis
Galileu, contrariando os ensinamentos formais estrelas, disseminadas em amontoados"; observa-se que
da Igreja predominantes nas escolas e universidades de as nebulosas são "rebanhos de pequenas estrelas";
seu tempo, acreditava que era possível explicar o veem-se os satélites de Júpiter (e esta descoberta
universo através da matemática, e dedicou sua vida a oferecia a Galileu a inesperada visão no céu de um
provar que estava certo. modelo menor do que o modelo copernicano).
Não fosse por Galileu, talvez você não teria que
responder 45 questões de matemática, um quarto da Confirmando Copérnico
prova. Mas também se não fosse por ele, talvez você
não estivesse lendo esse mateiral agora, pois Dia 12 de março de 1610 Galileu publica em
provavelmente não haveria a tecnologia necessária por Veneza o Sidereus Nuncius, obra que inicia com estas
fazer ele chegar até você. palavras:

A fé na luneta

Na primavera de 1609
Galileu vem a saber que um
certo flamengo havia fabricado
uma lente mediante a qual os
objetos visíveis, por mais
distantes que estivessem dos
olhos do observador, eram
vistos distintamente como se
estivessem próximos.
A mesma noticia lhe é confirmada por seu ex- "Grandes na verdade são as coisas que neste breve
discípulo Jacques Badouere. Justamente com base tratado proponho a visão e contemplação dos estudiosos da
nestas notícias Galileu construiu a luneta. E a coisa natureza. Grandes, digo, tanto pela excelência da matéria em si
realmente interessante é que ele a tenha levado para mesma, como pela novidade delas jamais ouvida em todos os
dentro da ciência, como instrumento científico a ser tempos passados, como também pelo instrumento em virtude do
utilizado como potencialização de nossos sentidos. qual as próprias coisas se tornaram manifestas a nosso sentido".
Esse foi o grande passo para o conhecimento Nessa obra ele corrobora o sistema copernicano
experimental. Veja que um indivíduo, por meios dos e desmente o sistema defendido pela Igreja, que era o
sentidos, pôde sozinho desafiar os conhecimentos geocentrismo. Atraves de seus estudos de astronomia
contemplativos sustentados por todo o clero da Igreja. ele chegou às mesmas conclusões de Copérnico sobre a
Além de desbancar Aristóteles com relação à posição da terra no sistema solar, sustentano um
queda dos corpos, por meio de seus cálculos sistema heliocentrico (sol no centro), contrariando a
matemáticos e suas experiencias na torre de Pisa, ele posição geocentrica (terra no centro) da Igreja.
também provou que as esferas celestes não eram Daqui as raízes do desencontro entre Galileu e
perfeitas como o filosofo grego sustentava. a Igreja. Copérnico afirmara que "todas as esferas giram
Esse foi o grande passo para o conhecimento em torno do sol como seu ponto central e, portanto, o
experimental. Veja que um indivíduo, por meios dos centro do universo está dentro do sol". E ele pensava
sentidos, pôde sozinho desafiar os conhecimentos que sua própria teoria fosse uma representação
contemplativos sustentados por todo o clero da Igreja. verdadeira do pressuposto universo. Deste parecer era
Ele viu com seu telescópio as crateras lunares, e também Galileu. Para ele, a teoria copernicana descreve
o extraordinário era que não se tratava apenas de uma o sistema do mundo.

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Tal tese realista devia necessariamente aparecer proposições. A sentença do Santo Oficio é transmitida
perigosa a todos - católicos e protestantes - pois à Congregação do Índex, que no dia 3 de março de 1616
pensavam que a Bíblia em sua versão literal não podia emana a condenação do Copernicanismo.
errar. No Eclesiastes (1,4-5) lemos que "a terra No dia 26 de fevereiro, o papa tinha alertado
permanece sempre em seu lugar" e que "o sol surge e se Galileu a abandonar a ideia copernicana e lhe ordenava,
põe voltando ao lugar de onde surgiu"; e por Josué sob pena de prisão, “não ensiná-la e não defendê-la de
(10,13) somos informados de que Josué ordena ao sol nenhum modo, nem com as palavras nem com os
que pare. Com base nestas passagens da Escritura escritos”. Galileu concordou e prometeu obedecer.
Lutero e Calvino se opuseram ferrenhamente à teoria Em 1623 sobe ao trono pontifício, com o nome
copernicana. de Urbano VIII, o cardeal Maffeo Barberini, amigo e
Nesse ano, também, obtém da parte do grão- admirador de Galileu. Encorajado por este evento,
duque Cosme II o rendoso posto de "matemático Galileu retoma sua batalha cultural; e em 1632 publica
extraordinário do estúdio de Pisa". Era como se fosse o a obra Dialogo de Galileu Galilei Linceu, onde se discorre
título de “o” filósofo-cientista da sua época, o pensador sobre os dois máximos sistemas do mundo ptolomaico
mais notável e respeitado da Europa e, por conseguinte, e copernicano, fazendo uma defesa cerrada do sistema
do mundo. copernicano. O Diálogo sobre os dois máximos sistemas do
mundo aparece em 1632.
Ciência e fé Urbano VIII foi convencido pelos adversários
de Galileu de que o Dialogo constituía um descrédito
Entre 1613 e 1615 Galileu escreve as famosas da autoridade e talvez também do prestigio do papa, o
quatro cartas copernicanas sobre as relações entre qual estaria sendo ridicularizado.
ciência e fé. Uma a seu discípulo, o beneditino Foi assim que iniciou o segundo processo
Benedetto Castelli, duas a dom Piero Dini; e uma a contra Galileu em 1633, que o condenou a negar o que
senhora Cristina de Lorena, grã-duquesa de Toscana. havia dito. A prisão perpetua lhe é logo comutada em
Galileu teoriza a incomensurabilidade entre confinamento, em sua casa.
saber cientifico e fé religiosa, os conhecimentos Na prisão domiciliar escreve os Discursos e
científicos são autônomos em relação à fé, pois demonstrações matemáticas sobre duas novas ciências, que
pretendem descrever o mundo; os dogmas da fé, as aparecerão em 1638.
proposições religiosas, de sua parte, não são e não Essas ciências são a estática e a dinâmica. Tais
querem ser um tratado de astronomia, mas uma discursos são propostos em forma de diálogo onde
mensagem de salvação. discute-se sobre a resistência dos materiais, sobre
Galileu fixa o princípio da distinção entre sistemas de alavanca, e está presente a celebre
ciência e fé, segundo o qual “a intenção do Espirito experiência sobre planos inclinados. Nesta obra
Santo seria ensinar-nos como se vai ao céu e não como apresenta-se a contribuição mais original de Galileu à
vai o céu”. história das ideias cientificas.
Para Galileu, portanto, ciência e fé são Assistido por seus discípulos Vicente Viviani e
compatíveis porque incomensuráveis, não se trata de Evangelista Torricelli, Galileu morre no dia 8 de janeiro
um “ou-ou”, e sim de um “e-e”; o discurso cientifico é de 1642.
um discurso factualmente controlável, destinado a
fazer-nos ver como funciona o mundo; o discurso A nova ciência
religioso é um discurso de "salvação" que não se ocupa
de descrever o mundo, e sim do "sentido" do universo, Explicitando mais detalhadamente a imagem
da vida dos indivíduos e de toda a humanidade. galileana da ciência é preciso salientar que, para Galileu,
Denunciado ao Santo Oficio, Galileu é a ciência não e mais um saber a serviço da fé, não
processado em Roma em 1616, ele é proibido de depende da fé, tem um escopo diferente do da fé,
ensinar ou defender com palavra ou com os escritos a aceita-se e encontra fundamentos diferentes dos da fé.
teoria copernicana. Autônoma em relação à fé, a ciência está desvinculada
No dia 19 de fevereiro de 1616 o Santo Oficio também do autoritarismo da tradição aristotélica que
passou a seus teólogos as duas proposições não aceitas bloqueia a pesquisa cientifica.
pela Igreja e que resumiam o núcleo da questão: E contra os aristotélicos dogmáticos e livrescos,
a) "Que o sol esteja no centro do mundo, e por Galileu recorre justamente a Aristóteles, o qual
conseguinte imóvel de movimento local". "antepõe [...] as experiências sensatas a todos os
b) "Que a terra não está no centro do mundo discursos"; de modo que "não duvido nada de que se
nem imóvel, mas se move segundo si mesma inteira, Aristóteles vive-se em nosso tempo, mudaria de
também com movimento diurno". opinião". Com isso Galileu faz "o funeral [...] da
Cinco dias depois, dia 24 de fevereiro, todos os pseudofilosofia", mas não o funeral da tradição
teólogos do Santo Oficio condenaram as duas enquanto tal.
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Com as devidas cautelas se pode dizer que barata dos livros já produzidos e dos que estavam sendo
Galileu é platônico em filosofia (o livro da natureza está escritos.
escrito em linguagem matemática) e aristotélico no Ela foi também um importante instrumento
método (Aristóteles "teria [...] anteposto, como contra a centralização do saber com o clero, já que antes
convém, a sensata experiência ao discurso natural"). dela os livros eram copiados pelos monges de capa a
A ciência de Galileu é a ciência de um realista, capa. Imagine quanto tempo levaria para copiar a
ou seja, a ciência de um cientista convicto de que as
teorias cientificas alcancem e descrevam a realidade; a
ciência e descrição verdadeira da realidade, e nos diz
“como vai o céu”; e é objetiva porque descreve as
qualidades objetivas e mensuráveis (qualidades
primarias) e não as qualidades subjetivas (qualidades
secundarias) dos corpos.
E esta ciência, descritiva de realidades objetivas
e mensuráveis, é possível porque é o próprio livro da
natureza que "está escrito em linguagem matemática".
A ciência, portanto, é objetiva porque não se embrenha
nas qualidades subjetivas e secundarias nem se propõe
à busca das "essências".
Do que foi dito segue-se que a pesquisa quantidade de livros que circulou pela Europa nesse
qualitativa é suplantada pela quantitativa, e são tempo.
eliminadas as causas finais em favor total das mecânicas. Essas foram grandes realizações dos homens,
O universo de Galileu é um universo que ainda continuaram no campo da política com a
determinista e mecanicista; não é mais o universo criação dos Estados Nacionais. Diferentemente dos reis
antropocêntrico de Aristóteles e da tradição, não é mais feudais, esses novos Reis teriam tanto poder que alguns
hierarquizado, ordenado e finalizado em função do deles desafiaram até o representante de deus na terra, o
homem. Papa.
E perdem todo valor os discursos vazios e os
ensinamentos de certa tradição filosófica privada de QUESTÕES
contato com a experiência. Enquanto sobre o mundo
nos dão informações as teorias construídas sobre 1. (UFU) Certos pensadores foram capazes de
"sensatas experiências" e "necessárias demonstrações". sintetizar grande parte do pensamento de um período
A experiência cientifica de Galileu e o experimento, que em uma única frase. A época de Galileu Galilei foi
se faz para ver se uma suposição corresponde ou não à
marcada por inúmeras diatribes com a Igreja Católica e
realidade.
Óbivio que a Igreja não ficou parada de braços pelo surgimento de uma nova maneira de pensar. A
cruzados. A inquisição caiu em cima de Galileu e ele frase "o livro da natureza está escrito em linguagem
teve de dizer que suas teorias eram apenas suposições matemática" sintetiza
(hipóteses). A) o desprezo de Galileu por Deus e por qualquer
Apesar de tudo, a Igreja não conseguiu conter a explicação de caráter metafísico embasada em entidades
Revolução Científica que Galileu havia começado, e supranaturais.
muitos foram os estudiosos que deram prosseguimento
B) a defesa do heliocentrismo, tese introduzida por
a seus estudos, sendo Isaac Newton quem aperfeiçou o
sistema. Nicolau Copérnico.
C) a superação da filosofia platônica com seu apreço
E as mudanças continuaram excessivo pela construção lógica.
D) a inversão entre religião e ciência com relação à
E o movimento renascentista não ficou só na prioridade sobre a enunciação da verdade.
Peninsula Itálica, ele se espalhou por toda a Europa. Na
2. A filosofia está escrita neste imenso livro que
França tivemos também Rabelais (1490 – 1553), na
Inglaterra, Willian Sheakespeare (1564 – 1616), na continuamente está aberto diante de nossos olhos
Espanha, Miguel de Cervantes (1547 – 1616), nos (estou falando do universo), mas que não se pode
Paises Baixos, Erasmo de Rotterdam (1466 – 1536). entender se primeiro não se aprende a entender sua
É importante destacar que talvez a principal língua e conhecer os caracteres em que está escrito. Ele
invenção dessa época, sem a qual nada disso poderia ter está escrito em linguagem matemática e seus caracteres
acontecido, tenha sido a imprensa (1454) do alemão são círculos, triângulos e outras figuras geométricas,
Gutemberg. Ela possibilitou a reprodução rápida e
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meios sem os quais é impossível entender ( ) O abandono da especulação levou Galileu a adotar
humanamente suas palavras: sem tais meios, vagamos pressupostos da filosofia de Aristóteles, pois esse
inutilmente por um escuro labirinto. pensador possuía uma concepção de experimentação
(GALILEI, G. Il saggiatore. Apud REALE, G. & ANTISERI, D. similar à sua.
História da filosofia. São Paulo: Paulinas, 1990, v. 2, p. 281.) ( ) O método de investigação da natureza restringia-se
Tendo em mente o texto acima e os conhecimentos àquilo que podia ser apreendido imediatamente pelos
sobre o pensamento de Galileu acerca do método sentidos, uma vez que o que está além dos sentidos é
científico, considere as seguintes afirmativas. mera especulação.
I. Galileu defende o desenvolvimento de uma ciência ( ) Uma das razões mais fortes para a condenação de
voltada para os aspectos objetivos e mensuráveis da Galileu foi sua identificação da imperfeição dos corpos
natureza, em oposição à física qualitativa de Aristóteles. celestes, o que contrariava os dogmas da igreja.
II. Para Galileu, é possível obter conhecimento Assinale a alternativa que contém, de cima para baixo,
científico sobre objetos matemáticos, tais como círculos a sequência correta.
e triângulos, mas não sobre objetos do mundo sensível. a) V, V, V, F, F.
III. Galileu pensa que uma ciência quantitativa da b) V, V, F, V, F.
natureza é possível graças ao fato de que a própria c) V, F, V, F, V.
natureza está configurada de modo a exibir ordem e d) F, V, F, F, V.
simetrias matemáticas. e) F, F, V, F, V.
IV. Galileu considera que a observação não faz parte do
método científico proposto por ele, uma vez que todo 4. (ENEM 2014) A filosofia encontra-se escrita neste
o conhecimento científico pode ser obtido por meio de grande livro que continuamente se abre perante nossos
demonstrações matemáticas. olhos (isto é, o universo) que não se pode compreender
Assinale a alternativa que contém todas as afirmativas antes de entender a língua e conhecer os caracteres com
corretas, mencionadas anteriormente. os quais está escrito. Ele está escrito em língua
matemática, os caracteres são triângulos,
a) I e III.
circunferências e outras figuras geométricas, sem cujos
b) II e III. meios é impossível entender humanamente as palavras;
c) III e IV. sem eles vagamos perdidos dentro de um obscuro
d) I, II e IV. labirinto.
e) II, III e IV. GALILEI, G. O ensaiador. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
No contexto da revolução científica do século XVII,
3. Em 2012, o Vaticano permitiu o acesso do público a assumir a posição de Galileu significava defender a
vários documentos, entre eles o Sumário do julgamento A) continuidade do vínculo entre ciência e fé dominante
de Giordano Bruno e os Atos do processo de Galileu. na Idade Média.
B) necessidade de o estudo linguístico ser
As teorias desses estudiosos, juntamente com o
acompanhado do exame matemático.
Homem Vitruviano, são exemplos de uma profunda C) oposição da nova física quantitativa aos
transformação no modo de conceber e explicar o pressupostos da filosofia escolástica.
conhecimento da natureza. Com base nos D) importância da independência da investigação
conhecimentos sobre a investigação da natureza no científica pretendida pela Igreja.
início da ciência moderna, particularmente em Galileu, E) inadequação da matemática para elaborar uma
explicação racional da natureza.
atribua V (verdadeiro) ou F (falso) às afirmativas a
seguir. 5. (UNICENTRO 2010) “A filosofia encontra-se
( ) A nova atitude de investigação rendeu-se ao poder escrita neste grande livro que continuamente se abre
de convencimento argumentativo da Igreja, a ponto de perante nossos olhos (isto é, o Universo). Ele está
o próprio Galileu, ao abjurar suas teses, ter se escrito em língua matemática, os caracteres são
convencido dos equívocos da sua teoria. triângulos, circunferências e outras figuras geométricas.
( ) A observação dos fenômenos, a experimentação e a Sem estes meios, é impossível entender humanamente
as palavras; sem eles nós vagamos perdidos dentro de
noção de regularidade matemática da natureza abalaram
um obscuro labirinto.”
as concepções que fundamentavam a visão medieval de (GALILEU. Apud. COTRIM. Fundamentos da filosofia: história e
mundo. grandes temas. 16ª Ed., São Paulo: Saraiva, 2006 - p.133.)

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De acordo com o texto acima, e com seus 5. MAQUIAVEL E O DILEMA DO PRÍNCIPE


conhecimentos sobre a ciência da natureza em Galileu,
assinale a alternativa correta. “Como é meu intento
a) De acordo com os princípios de sua ciência, Galileu escrever coisa útil para os
depositava grande crédito no método indutivo, pois que se interessarem, pareceu-
este possuiria melhor alcance nos resultados da me mais conveniente
investigação da natureza. procurar a verdade pelo
b) O passo decisivo da física galileana concentrava-se efeito das coisas, do que pelo
na realização de experimentos para comprovar uma que delas se possa imaginar.
tese, sem a necessidade de recorrer às elaborações do E muita gente imaginou
raciocínio matemático. repúblicas e principados que
c) Quanto ao “movimento”, Galileu seguiu as teorias de nunca se viram nem jamais
Aristóteles que distinguia o movimento qualitativo do foram reconhecidos como
movimento quantitativo, para considerar toda mudança verdadeiros. ” (Maquiavel)
apenas do ponto de vista qualitativo (corpos pesados ou As transformações sofridas pelo poder político
leves). não passaram despercebidas pelos renascentistas, e a
d) Um dos aspectos centrais da ciência da natureza em principal, e mais significativa personalidade nesse
Galileu está na realização de experimentos com o campo foi o florentino Nicolau Maquiavel (1469 –
auxílio indispensável da matemática, pois, para ele, a 1527).
matemática é o meio instrumental capaz de enunciar e Ele assumiu um cargo importante no governo
traduzir as regularidades observadas nos fenômenos de Florença depois que a família Médici foi afastada do
naturais. controle da cidade. Trabalhava como diplomata
e) O que dá validade científica aos processos fazendo várias viagens aos grandes reinos que haviam
intelectuais de Galileu é que os resultados de suas se unificado, e não se conformava com o estado de
pesquisas jamais precisariam ser submetidos à guerra que se encontrava a Península Itálica.
comprovação empírica, bastando, apenas, se Maquiavel é considerado o pai da ciência
localizarem no campo da abstração. política moderna porque não escreveu um tratado
teórico de como deveria ser o governo ideal. Desde os
06. Assentado, portanto, que a Escritura, em muitas gregos até sua época, todos fizeram isso.
passagens, não apenas admite, mas necessita de Sua preocupação não era como deveria ser a
exposições diferentes do significado aparente das política, mas sim em como ela é realmente praticada.
palavras, parece-me que, nas discussões naturais, Com isso em mente, tendo como fundamento
deveria ser deixada em último lugar. empírico as lições que a história havia dado e como se
GALILEI, G. Carta a Dom Benedetto Castelli. In: Ciência e fé: cartas de Galileu comportavam os grandes políticos de sua época, ele
sobre o acordo do sistema copernicano com a Bíblia. São Paulo: Unesp, 2009
(adaptado). escreveu um manual de como construir um estado
O texto, extraído da carta escrita por Galileu (1564- forte e como se manter no poder para governá-lo.
1642) cerca de trinta anos antes de sua condenação pelo
Tribunal do Santo Ofício, discute a relação entre ciência Formação do Estado nacional
e fé, problemática cara no século XVII. A declaração de
Galileu defende que Durante a Idade Média, como vimos, o poder
A) a bíblia, por registrar literalmente a palavra divina, do rei era sempre confrontado com os poderes da Igreja
apresenta a verdade dos fatos naturais, tornando-se guia ou da nobreza.
para a ciência. As monarquias nacionais surgem com o
B) o significado aparente daquilo que é lido acerca da fortalecimento do rei, e, portanto, com a centralização
natureza na bíblia constitui uma referência primeira. do poder, fenômeno este que se desenvolve desde o
C) as diferentes exposições quanto ao significado das final do século XIV (Portugal) e durante o século XV
palavras bíblicas devem evitar confrontos com os (França, Espanha, Inglaterra).
dogmas da Igreja. Dessa forma surge o Estado moderno, que
D) a bíblia deve receber uma interpretação literal apresenta características específicas, tais como o
porque, desse modo, não será desviada a verdade monopólio de fazer e aplicar as leis, recolher impostos,
natural. cunhar moeda, ter um exército. A novidade é que tudo
E) os intérpretes precisam propor, para as passagens isso se torna prerrogativa do governo central, o único
bíblicas, sentidos que ultrapassem o significado que passa a ter o aparato administrativo para prestação
imediato das palavras. dos serviços públicos bem como o monopólio legítimo
da força.
É em função desse contexto que se torna
possível compreender o pensamento de Maquiavel.
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A Itália dividida tradicionalmente sob a influência da família Médici,


encontrava-se por uma década governada pelo
Na época de Maquiavel as cidades mais republicano Soderini.
expressivas da Península Itálica eram: a sua Florença, Nessa época Maquiavel ocupa a Segunda
Milão, Nápoles e Veneza. Apesar de seu forte comércio Chancelaria do governo, função que o obriga a
elas eram frágeis politicamente e totalmente vulneráveis desempenhar inúmeras missões diplomáticas na
a ataques externos. Na época dele era a coisa mais França, Alemanha e pelos diversos Estados italianos.
comum uma cidade invadir e dominar outra, por isso a Tem oportunidade de entrar em contato direto
sua preocupação. com reis, papas e nobres, e também com o condottiere
Além disso, Maquiavel acreditava que a região César Bórgia, que estava empenhado na ampliação dos
italiana só teria a ganhar se fosse unificada. Mas como Estados Pontifícios.
fazer isso? Essa é a pergunta central de O Príncipe (1515), Observando a
a sua grande obra prima que iria mudar totalmente o maneira de Bórgia agir,
modo dos homens ocidentais enxergarem a política. Maquiavel o considera o
Enquanto as demais nações europeias modelo de príncipe que a Itália
conseguem a centralização do poder, a região onde precisava para ser unificada.
futuramente será a Alemanha e a Itália se acham Quando Soderini é
fragmentadas em inúmeros Estados sujeitos a disputas deposto e os Médicis voltam à
internas e a hostilidades entre cidades vizinhas. cena política, Maquiavel cai em
No caso da Itália, a ausência de unificação a desgraça e recolhe-se para
expõe à ganância de outros países como Espanha e escrever as obras que o
França, que reivindicam territórios e assolam a consagraram. Entre peças de
península com ocupações intermináveis. teatro (como a famosa
Mandrágora), poesia, ensaios diversos, destacam-se O
príncipe e Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio.

Controvérsias sobre O príncipe

Escrito em 1515 e
dedicado a Lourenço de Médici,
O príncipe tem provocado
inúmeras interpretações e
controvérsias.
Uma primeira leitura nos
dá uma visão da defesa do
absolutismo e do mais completo
imoralismo: "É necessário a um
príncipe, para se manter, que
aprenda a poder ser mau e que se
valha ou deixe de valer-se disso segundo a necessidade".
Essa primeira leitura apressada da obra levou à
criação do mito do maquiavelismo, que tem atravessado
os séculos. Esse mito não só representa a figura do
político maquiavélico, mas se estende até à avaliação das
atividades corriqueiras de qualquer pessoa.
Na linguagem comum, chamamos
É nessa Itália dividida que vive Nicolau pejorativamente de maquiavélica a pessoa sem
Maquiavel (1469-1527) na república de Florença. escrúpulos, traiçoeira, astuciosa que, para atingir seus
Observa com apreensão a falta de estabilidade política fins, usa da mentira e da má-fé, sendo capaz de enganar
da Itália, dividida em principados e repúblicas onde tão sutilmente que pode nos fazer pensar que agimos
cada um possui sua própria milícia, geralmente formada livremente quando na verdade somos por ela
por mercenários. Nem mesmo os Estados Pontifícios manipulados.
deixavam de formar os seus exércitos. Como expressão dessa amoralidade, costuma-se
Maquiavel não foi apenas um intelectual que vulgarmente atribuir a Maquiavel a famosa máxima:
refletiu a respeito de política, pois viveu intensamente a "Os fins justificam os meios". Ora, essa interpretação
luta de poder no período em que Florença, se mostra excessivamente simplista e deformadora do

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pensamento maquiaveliano e, para superá-la, é preciso O príncipe deve usar de todas as artimanhas
analisar com mais atenção o impacto das inovações do possíveis, mentir, ludibriar, enganar. É o homem astuto,
seu pensamento político. esperto o suficiente para conseguir o que deseja. Desse
Contrapondo-se à análise pejorativa do modo, para conseguir o poder ele tem que possuir a
maquiavelismo, Rousseau, no século XVIII, defende o virtú, ou seja, qualidades especiais que o diferencie dos
florentino afirmando que O príncipe era na verdade uma outros homens. É ela que vai possibilitá-lo a reconhecer
sátira, e a intenção verdadeira de Maquiavel seria o as circunstâncias certas (fortuna) para agir como se
desmascaramento das práticas despóticas, ensinando, deve no momento certo. A fortuna é o que muitos
portanto, o povo a se defender dos tiranos. Tal hipótese chamam de sorte, mas só a aproveita quem estiver
se sustentaria a partir da leitura dos Comentários sobre a preparado.
primeira década de Tito Lívio, onde são desenvolvidas as Esse é o elemento característico do pensamento
ideias do Maquiavel republicano. renascentista nos seus ensinamentos. Maquiavel sabe
Modernamente, no entanto, rejeita-se a visão que existem forças independentes da vontade do
romântica de Rousseau, e a aparente contradição entre homem agindo sobre ele. Mas o homem como um ser
as duas obras é interpretada como fruto de dois racional, dotado de inteligência, não é uma simples
momentos diferentes da ação política. Em um primeiro marionete jogada de um lado a outro ao sabor do acaso.
estágio, representado pela ação do príncipe, o poder Ele pode usar sua racionalidade para decidir os rumos
deve ser conquistado e mantido, e para tanto justifica- de sua vida.
se o poder absoluto. Posteriormente, alcançada a Chegado ao poder, é preciso saber como se
estabilidade, é possível e desejável a instalação do manter nele. Para isso, é melhor ser temido do que
governo republicano. amado. Maquiavel tinha uma visão pessimista sobre o
Além disso, as ideias democráticas aparecem homem, acreditava que ele é um bicho escroto, que
veladamente também no capítulo IX de O príncipe, quando tá tudo bem, todo mundo é seu amigo, mas “na
quando Maquiavel se refere à necessidade de o hora do vamos ver” todo mundo lhe vira as costas.
governante ter o apoio do povo, sempre melhor do que Não existe essa de bem comum. Os indivíduos
o apoio dos grandes, que podem ser traiçoeiros. O que vivem em constante conflito em sociedade, e não dá
está sendo timidamente esboçado é a ideia de consenso, para agradar todo mundo. Para manter a lealdade de
que terá importância fundamental nos séculos todos é melhor que eles o temam, pois assim é mais fácil
seguintes. de obedecerem e se manterem fiéis. É até bom de vez
em quando esfolar um infeliz para que todos vejam que
O príncipe virtuoso o príncipe não está para brincadeira.
Maquiavel escreveu essa obra, quando os
Para descrever a ação do príncipe, Maquiavel Médici retornaram ao poder e ele foi posto para fora da
usa as expressões italianas virtú e fortuna. Virtú significa cena política. Ele a dedicou a Lorenzo de Médici, o
virtude, no sentido grego de força, valor, qualidade de único homem que poderia, aos olhos dele, unificar a
lutador e guerreiro viril. Homens de virtú são homens Itália e lhe trazer de volta o brilho e esplendor da Roma
especiais, capazes de realizar grandes obras e provocar republicana anterior à ditadura de Júlio César. É
mudanças na história. necessário a um príncipe, para se manter, que aprenda
Não se trata do príncipe virtuoso no sentido a poder ser mau e que se valha ou deixe de valer-se disso
medieval, enquanto bom e justo segundo os preceitos segundo a necessidade.
da moral cristã, mas sim daquele que tem a capacidade
de perceber o jogo de forças que caracteriza a política Ética e política
para agir com energia a fim de conquistar e manter o
poder. A novidade do pensamento maquiaveliano,
O príncipe de virtú não deve se valer das normas justamente a que causou maior escândalo e críticas, está
preestabelecidas da moral cristã, pois isso geralmente na reavaliação das relações entre ética e política. Por um
pode significar a sua ruina. lado, Maquiavel apresenta uma moral laica, secular, de
Implícita nessa afirmação se acha a noção de base naturalista, diferente da moral cristã; por outro,
fortuna, aqui entendida como ocasião, acaso. O príncipe estabelece a autonomia da política, negando a
não deve deixar escapar a fortuna, isto é, a ocasião. anterioridade das questões morais na avaliação da ação
De nada adiantaria um príncipe virtuoso, se não política.
souber ser precavido ou ousado, aguardando a ocasião Para a moral cristã, predominante na Idade
propícia, aproveitando o acaso ou a sorte das Média, há valores espirituais superiores aos políticos,
circunstâncias, como observador atento do curso da além de que o bem comum da cidade deve se
história. No entanto, a fortuna não deve existir sem a subordinar ao bem supremo da salvação da alma.
virtú, sob pena de se transformar em mero oportunismo. A moral cristã se apoia em uma concepção do
bem e do mal; do justo e do injusto, que ao mesmo
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tempo preexiste e transcende a autoridade do Estado, política visa a sobrevivência do grupo e não apenas de
cuja organização político-jurídica não deve contradizer indivíduos isolados.
ou violar as formas éticas fundamentais, implícitas no Por isso Maquiavel não pode ser considerado
direito natural. um cínico apologista da violência. O que ele enfatiza é
O indivíduo está subordinado ao Estado, mas a que os critérios da ética política precisam ser revistos
ação deste último se acha limitada pela lei natural ou conforme as circunstâncias e sempre tendo em vista os
moral que constitui uma instância superior à qual todo fins coletivos.
membro da comunidade pode recorrer sempre que o No entanto, é bom lembrar que o pensamento
poder temporal atentar contra seus direitos essenciais de Maquiavel tem um sentido próprio, na medida em
inalienáveis. que ele expressa a tendência fundamental da sua época,
A nova ética analisa as ações não mais em ou seja, a defesa do Estado absoluto e a valorização da
função de uma hierarquia de valores dada a priori, mas política secular, não atrelada à religião. Talvez por isso
sim em vista das consequências, dos resultados da ação o extremo politicismo, ou seja, a hipertrofia do valor
política. político, de cujas consequências últimas talvez nem ele
Não se trata de um amoralismo, mas de uma próprio pudesse suspeitar.
nova moral centrada nos critérios da avaliação do que é Embora Maquiavel não tivesse usado o
útil à comunidade. O critério para definir o que é moral conceito de razão de Estado, é considerado o pensador
é o bem da comunidade, e nesse sentido às vezes é que começa a esboçar a doutrina que vigorará no século
legítimo o recurso ao mal (o emprego da força seguinte, quando o governante absoluto, em
coercitiva do Estado, a guerra, a prática da espionagem, circunstâncias críticas e extremamente graves, a ela
o emprego da violência). Estamos diante de uma moral recorre permitindo-se violar normas jurídicas, morais,
imanente, mundana, que vive do relacionamento entre políticas e econômicas.
os homens. E se há a possibilidade de os homens serem Sintetizando, podemos dizer que ele entendia
corruptos, constitui dever do príncipe manter-se no que o príncipe deveria ser guiado pelos resultados a
poder a qualquer custo. serem alcançados, podendo tudo fazer. Não deveria
Maquiavel distingue entre o bom governante, ficar preocupado com questões morais, o importante
que é forçado pela necessidade a usar da violência era conseguir o poder e mantê-lo. Para Maquiavel,
visando o bem coletivo, e o tirano, que age por capricho portanto, a política não é atrelada à moral, pois os
ou interesse próprio. “fins justificam os meios”.
O pensamento de Maquiavel nos leva à reflexão A experiência pessoal de Maquiavel se baseava
sobre a situação dramática e ambivalente do homem de nas pequenas tiranias italianas do século XVI, que não
ação: se o indivíduo aplicar de forma inflexível o código podem ser comparadas às monarquias absolutas do
moral que rege sua vida pessoal à vida política, sem século XVII nem as nossas ditaduras modernas, o que
dúvida colherá fracassos sucessivos, tornando-se um nos faz ver hoje o maquiavelismo através de uma lente
político incompetente. de aumento.
Tal afirmação pode levar as pessoas a considerar
que Maquiavel estaria defendendo o político imoral, os A autonomia da política
corruptos e os tiranos. Não se trata disso. A leitura
maquiaveliana sugere a superação dos escrúpulos Maquiavel subverte a abordagem tradicional da
imobilistas da moral individual, mas não rejeita a moral teoria política feita pelos gregos e medievais e é
própria da ação política: considerado o fundador da ciência política, ao
"Se o indivíduo, na sua existência privada, tem o direito enveredar por novos caminhos "ainda não trilhados".
de sacrificar o seu bem pessoal imediato e até sua própria vida a Pode-se dizer que a política de Maquiavel é
um valor moral superior, ditado pela sua consciência, pois em tal realista, pois procura a verdade efetiva, ou seja, "como
hipótese estará empenhando apenas seu destino particular, o o homem age de fato". As observações das ações dos
mesmo não acontece com o homem de Estado, sobre o qual pesam homens do seu tempo e dos estudos dos antigos,
a pressão e a responsabilidade dos interesses coletivos; este, de fato, sobretudo da Roma Antiga, levam-nos à constatação de
não terá o direito de tomar uma decisão que envolva o bem-estar que os homens sempre agiram pelas vias da corrupção
ou a segurança da comunidade, levando em conta tão somente as e da violência.
exigências da moral privada; casos haverá em que terá o dever de Partindo do pressuposto da natureza humana
violá-la para defender as instituições que representa ou garantir a capaz do mal e do erro, analisa a ação política sem se
própria sobrevivência da nação". preocupar em ocultar “o que se faz e não se costuma dizer”.
Isso significa que a avaliação moral não deve ser A esse realismo alia-se a tendência utilitarista,
feita antes da ação política, segundo normas gerais e pela qual Maquiavel pretende desenvolver uma teoria
abstratas, mas a partir de uma situação específica que é voltada para a ação eficaz e imediata. A ciência política
avaliada em função do resultado dela, já que toda ação só tem sentido se propiciar o melhor exercício da arte
política. Trata-se do começo da ciência política: da
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teoria e da técnica da política, entendida como disciplina Estado fosse criado, e que isso teria de ocorrer sob a
autônoma. liderança de um único homem.
Maquiavel torna a política autônoma porque a No entanto, alcançada a estabilidade, um regime
desvincula da ética e da religião, procurando examiná-la republicano deveria ser instalado para que o interesse
na sua especificidade própria. coletivo pudesse guiar o destino de todos, e os rumos
Em relação ao pensamento medieval, do Estado.
Maquiavel procede à secularização da política, É claro que não encontramos isso em O Príncipe,
rejeitando o legado ético-cristão. Além da que, como já dissemos, é um manual de como conseguir
desvinculação, da religião, a ética política se distingue da o poder e se manter nele. Esse perfil republicano de
moral privada, uma vez que a ação política deve ser Maquiavel é percebido em outra obra sua, qual seja,
julgada a partir das circunstâncias vividas, tendo em Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio.
vista os resultados alcançados na busca do bem comum. Vejamos um trecho dessa obra em que isso fica
Com isso, Maquiavel se distancia da política bem evidente:
normativa dos gregos e medievais, pois não mais busca “Percebe-se facilmente de onde nasce o amor à liberdade
as normas que definem o bom regime, nem explicita dos povos; a experiência nos mostra que as cidades crescem em
quais devem ser as virtudes do bom governante. Em poder e em riqueza enquanto são livres. É maravilhoso, por
alguns casos, como o de Platão, a preocupação em exemplo, como cresceu a grandeza de Atenas durante os cem anos
definir como deve ser o bom governo leva à construção que sucederam à ditadura de Pisístrato. Contudo, mais admirável
de utopias, o que mereceu a crítica de Maquiavel. ainda é a grandeza alcançada pela república romana depois que
Talvez alguém inadvertidamente se pergunte se foi liberta dos seus reis. Compreende-se a razão disto: não é o
o próprio Maquiavel não estaria à procura do príncipe interesse particular que faz a grandeza dos
ideal, indicando as normas para conquistar e não perder Estados, mas o interesse coletivo. E é evidente que o
o poder. interesse comum só é respeitado nas repúblicas: tudo que pode
No entanto, há, de fato, diferenças trazer vantagem geral é nelas conseguido sem obstáculos. Se uma
fundamentais entre o "dever ser" da política clássica e certa medida prejudica um ou outro indivíduo, são tantos o que
aquele a que se refere Maquiavel. Na nova perspectiva, ela favorece, que se chega sempre a fazê-la prevalecer, a despeito
para fazer política é preciso compreender o sistema de das resistências, devido ao pequeno número de pessoas
forças existentes e calcular a alteração do equilíbrio prejudicadas”
provocada pela interferência de sua própria ação nesse Essas palavras não parecem ser de um homem
sistema. que defenda um governo absolutista, que deseja ver um
rei governar por toda a eternidade. Parecem mais o
Maquiavel republicano alerta de alguém que sabe a importância da liberdade
para a grandeza e prosperidade de um povo.
Quando estava no ostracismo político,
Maquiavel se ocupa com a elaboração dos Comentários QUESTÕES
sobre a primeira década de Tito Lívio, interrompendo esse
trabalho por alguns meses para escrever O príncipe. 1. (UFU 2011) A Itália do tempo de Nicolau Maquiavel
À medida que escreve os Comentários, lê (1469 – 1527) não era um Estado unificado como hoje,
trechos nas reuniões realizadas por jovens republicanos, mas fragmentada em reinos e repúblicas. Na obra O
a quem dedica a obra. Aí desenvolve ideias Príncipe, declara seu sonho de ver a península unificada.
democráticas, admitindo que o conflito é inerente à Para tanto, entre outros conceitos, forjou as concepções
atividade política e que esta se faz a partir da conciliação de virtú e de fortuna. A primeira representa a capacidade
de interesses divergentes. de governar, agir para conquistar e manter o poder; a
Defende a proposta do governo misto: “Se o segunda é relativa aos “acasos da sorte” aos quais todos
príncipe, os aristocratas e o povo governam em estão submetidos, inclusive os governantes. Afinal,
conjunto o Estado, podem com facilidade controlar-se como registrado na famosa ópera de Carl Orff: Fortuna
mutuamente”. imperatrix mundi (A Fortuna governa o mundo).
Considera importante que as monarquias ou “Por isso, um príncipe prudente não pode nem deve
repúblicas sejam governadas pelas leis e acusa aqueles guardar a palavra dada quando isso se lhe torne
que, no uso da violência, abusaram da crueldade, ou a prejudicial e quando as causas que o determinaram
usaram para interesses menores. cessem de existir.”
Maquiavel era um republicano, e não escreveu MAQUIAVEL, N. O príncipe. Coleção os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura,
uma obra para um governante que quisesse se perpetuar 1973, p. 79 - 80.
no poder de forma absoluta e despótica. Ele tinha um Com base nas informações acima, assinale a alternativa
sonho, mas não era um ingênuo. Sabia que teria de que melhor interpreta o pensamento de Maquiavel.
haver derramamento de sangue para que um grande A) Trata-se da fortuna, quando Maquiavel diz que “as
causas que o determinaram cessem de existir”; e de virtú,
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quando Maquiavel diz que o príncipe deve ser A) É a violência indiscriminada e dirigida ao corpo dos
“prudente”. cidadãos, somente o emprego da força das armas é
B) Trata-se da virtú, quando Maquiavel diz que as capaz de submeter as vontades humanas sob a
“causas mudaram”; e de fortuna quando se refere ao
autoridade impiedosa e avara do príncipe moderno.
príncipe prudente, pois um príncipe com tal qualidade
saberia acumular grande quantidade de riquezas. B) São os valores espirituais que se sobrepõem aos
C) Apesar de ser uma frase de Maquiavel, conforme o interesses meramente materiais, somente a virtude da
texto introdutório, ela não guarda qualquer relação com humildade permite a realização do bem comum, que é
as noções de virtú e fortuna. a fonte inesgotável da paz e harmonia entre súditos e
D) O fragmento de Maquiavel expressa bem a noção de governante.
virtú, ao dizer que o príncipe deve ser prudente, mas não C) É a prática da bondade, qualidade indispensável que
se relaciona com a noção de fortuna, pois em nenhum
permite o discernimento da idéia de bem como
momento afirma que as “circunstâncias” podem mudar.
norteadora das ações políticas, de maneira
2. (UFU 2013) Em seus estudos sobre o Estado, desinteressada e sempre voltada para a realização dos
Maquiavel busca decifrar o que diz ser uma verità princípios supremos da religião.
effettuale, a ―verdade efetiva‖ das coisas que permeiam D) É o poder, a virilidade humana, capaz de agir e
os movimentos da multifacetada história dominar o curso das coisas humanas, imprimindo nos
humana/política através dos tempos. Segundo ele, há acontecimentos as mudanças necessárias à realização de
certos traços humanos comuns e imutáveis no decorrer
grandes obras para a conquista e conservação do poder.
daquela história. Afirma, por exemplo, que os homens
são ―ingratos, volúveis, simuladores, covardes ante os
perigos, ávidos de lucro‖. 4. (UFU 2009) Maquiavel esteve empenhado na
(O Príncipe, cap. XVII) renovação da política em um período ainda dominado
Para Maquiavel: pela teologia cristã com os seus valores que atribuíam
A) A “verdade efetiva” das coisas encontra-se em plano ao poder divino a responsabilidade sobre os propósitos
especulativo e, portanto, no “dever-ser”. humanos. Em sua obra mestra, O príncipe, escreveu:
B) Fazer política só é possível por meio de um
moralismo piedoso, que redime o homem em âmbito “Deus não quer fazer tudo, para não nos tolher o livre
estatal. arbítrio e parte da glória que nos cabe”.
C) A Virtù possibilita o domínio sobre a Fortuna. Esta é MAQUIAVEL, N. O príncipe. Tradução Lívio Xavier. São Paulo: Nova Cultural,
atraída pela coragem do homem que possui Virtù. 1987. Coleção Os Pensadores. p. 108.
D) Fortuna é poder cego, inabalável, fechado a qualquer Assinale a alternativa que fundamenta essa afirmação de
influência, que distribui bens de forma indiscriminada. Maquiavel.
A) Deus faz o mais importante, conduz o príncipe até
3. Não me é desconhecido que muitos têm tido e têm a o trono, garantindo-lhe a conquista e a posse. Depois,
opinião de que as coisas do mundo são governadas pela cabe ao soberano fazer um bom governo submetendo-
fortuna e por Deus, de sorte que a prudência dos homens se aos dogmas da fé.
B) A conquista e a posse do poder político não é uma
não pode corrigi-las, e mesmo não lhes traz remédio
dádiva de Deus. É preciso que o príncipe saiba agir,
algum. [...] Às vezes, pensando nisso, me tenho valendo-se das oportunidades que lhe são favoráveis, e
inclinado a aceitá-la. Não obstante, e porque o nosso com firmeza alcance a sua finalidade.
livre arbítrio não desapareça, penso poder ser verdade C) Os milagres de Deus sempre socorreram os homens
que a fortuna seja árbitra de metade de nossas ações, mas piedosos. Para ser digno do auxílio divino e alcançar a
que, ainda assim, ela nos deixa governar quase outra glória terrena é preciso ser obediente à fé cristã e
metade. submeter-se à autoridade do papa.
(MAQUIAVEL. O príncipe. São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. D) Nem Deus, nem o soberano são capazes de
109.) conquistar o Estado. Tudo que ocorre na História é
O pensamento apresentado acima abre caminho para o obra do capricho, do acaso cego, que não distingue nem
o cristão nem o gentio.
conceito de virtú, qualidade indispensável para o êxito
do príncipe, pois a fortuna oferece as ocasiões para as 5. (UFU 2010) A finalidade da política não é, como
ações do governante, que terá de agir com virtú. diziam os pensadores gregos, romanos e cristãos, a
Assinale a alternativa que oferece a definição de virtú tal justiça e o bem comum, mas, como sempre souberam
como Maquiavel a concebeu. os políticos, a tomada e manutenção do poder. O
verdadeiro príncipe é aquele que sabe tomar e conservar
o poder [...].
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(CHAUÍ, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2000, p. 396.) B) A finalidade da política não é, como diziam os
A respeito das qualidades necessárias ao príncipe pensadores gregos, romanos e cristãos, a justiça e o bem
maquiaveliano, é correto afirmar: comum, mas, como sempre souberam os políticos, a
A) O príncipe precisa ter fé, ser solidário e caridoso, tomada e a manutenção do poder.
almejando a realização da virtude cristã. C) Maquiavel não aceita a divisão clássica dos três
B) O príncipe deve ser flexível às circunstâncias, regimes políticos (monarquia, aristocracia, democracia)
mudando com elas para dominar a sorte ou fortuna. e suas formas corruptas ou ilegítimas (tirania, oligarquia,
C) O príncipe precisa unificar, em todas as suas ações, demagogia/ anarquia), como não aceita que o regime
as virtudes clássicas, como a moderação, a temperança legítimo seja o hereditário e o ilegítimo, o usurpado por
e a justiça. conquista.
D) O príncipe deve ser bondoso e gentil, angariando D) Para Maquiavel, o poder do príncipe deve ser
exclusivamente o amor e, jamais, o temor do seu povo. superior ao dos grandes e estar a serviço do povo.
E) Maquiavel admite a figura do bom governo
6. (UNICENTRO 2010) Em sua obra O Príncipe, encarnada no príncipe virtuoso, portador das virtudes
Nicolau Maquiavel (1496-1527) assim se expressa em
morais e cristãs. O príncipe precisa ter virtu, isto é,
relação à fortuna: “Não me é desconhecido que muitos
têm tido e têm a opinião de que as coisas do mundo são precisa ser amado e respeitado pelos governados.
governadas pela fortuna e por Deus, de sorte que a
prudência dos homens não poderia corrigi-las, e mesmo 8. (UNICENTRO 2013) Assinale a alternativa
não lhes traz remédio algum. (...) Às vezes, pensando INCORRETA.
nisso, me tenho inclinado a aceitá-la. Não obstante, e A) Pode-se dizer que a política de Maquiavel é realista,
para que o nosso livre-arbítrio não desapareça, penso pois procura a verdade efetiva, ou seja, “como o
ser verdade que a fortuna seja árbitra de nossas ações, homem age de fato”. A esse realismo alia-se a tendência
mas que, ainda assim, ela nos deixa governar a outra utilitarista, pela qual Maquiavel pretende desenvolver
metade”. uma teoria voltada para a ação eficaz e imediata.
MAQUIAVEL. O Príncipe. São Paulo: Abril Cultural, 1973 - p.109. B) Em relação ao pensamento medieval, Maquiavel
Com base na leitura deste trecho e considerando outras procede à secularização da política, rejeitando o legado
informações presentes na obra de Maquiavel, analise as ético-cristão.
assertivas e assinale a alternativa que aponta as corretas. C) Maquiavel se distancia da política normativa dos
I. De acordo com Maquiavel, somente a ação da fortuna gregos e medievais, pois não mais busca as normas que
pode reduzir os prejuízos causados pela própria fortuna. definem o bom regime, nem explicita quais devem ser
II. A reflexão apresentada acima pressupõe a presença as virtudes do bom governante.
do conceito de virtú, qualidade indispensável para o D) Maquiavel está à procura do príncipe ideal,
bom êxito do governo do príncipe em uma república, indicando as normas para conquistar e não perder o
pois a fortuna pode, sim, oferecer ocasiões para as ações poder. Nesta perspectiva, não há diferenças entre o
do governante, o qual terá que agir fazendo bom uso da “dever ser” da política clássica e aquele a que se refere
virtú que lhe é própria. Maquiavel na obra O príncipe.
III. A virtú humana é capaz de agir e dominar, no E) Embora Maquiavel não tivesse usado o conceito de
momento certo, o curso natural das coisas, imprimindo razão de Estado, é considerado o pensador que começa a
as mudanças necessárias em relação à realização de esboçar a doutrina que vigorará no século seguinte,
grandes feitos e à conservação do poder. quando o governo absoluto, em circunstâncias críticas
IV. A fortuna não depende em nada da ação humana
e extremamente graves, a ela recorre permitindo-se
para seguir seu curso natural.
a) Apenas I e IV estão corretas. violar normas jurídicas, morais, políticas e econômicas.
b) Apenas II, III e IV estão corretas.
c) Apenas I e II estão corretas. 9. (UNICENTRO 2014) Com base nos
d) Apenas I, II e III estão corretas. conhecimentos sobre Maquiavel, assinale a alternativa
e) Apenas I e III estão corretas. que apresenta, corretamente, os principais fundamentos
do Estado.
7. (UNICENTRO 2013) Assinale a alternativa a) Boas leis e boas armas, desde que sejam próprias.
INCORRETA. b) Armas mercenárias e bons soldos aos combatentes.
A) Maquiavel não admite um fundamento anterior e c) Exércitos auxiliares e súditos desarmados nos
exterior à política (Deus, Natureza ou razão). Toda Estados novos.
Cidade, diz ele em O Príncipe, está originalmente dividida d) Culto dos refinamentos e governante com as
em dois desejos opostos: o desejo dos grandes de qualidades consideradas boas.
oprimir e comandar e o desejo do povo de não ser e) Príncipe clemente e apoio exclusivo na fortuna.
oprimido nem comandado.

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10. (UEM 2008) Maquiavel inaugura o pensamento 16) Maquiavel propõe um discurso político que se volte
político moderno. Seculariza a política, rejeitando o para o comportamento do governante, para sua atuação
legado ético-cristão. Maquiavel tem uma visão do e para o modo como ele deve se comportar no governo.
homem e da política como elas são e não como
deveriam ser. A política deve ater-se ao real, deve 12. (UEM 2012) O filósofo italiano Nicolau Maquiavel
preocupar-se com a eficiência da ação e não teorizar, (1469-1527) afirma: “Porque em toda cidade se
como fazia Platão, sobre a forma ideal de governo. encontram estes dois humores diversos: e nasce, disto,
Assinale o que for correto. que o povo deseja não ser nem comandado nem
01) Para Maquiavel, o príncipe virtuoso é aquele que oprimido pelos grandes e os grandes desejam comandar
governa com justiça, estabelecendo, entre seus súditos, e oprimir o povo; e desses dois apetites diversos nasce
a igualdade social e uma participação político- na cidade de um desses três efeitos: ou o principado, ou
democrática. a liberdade, ou a licença”
02) Maquiavel redefine as relações entre ética e política, MAQUIAVEL, O Príncipe. São Paulo: Hedra, 2009, p.109.
não julga mais as ações políticas em função de uma A partir do trecho citado, assinale a(s) alternativa(s)
hierarquia de valores dada de antemão, mas em função correta(s).
da necessidade dos resultados que as ações políticas 01) O povo, ao não querer ser comandado, deseja
devem alcançar. comandar.
04) Maquiavel faz a apologia da tirania, pois considera 02) É da natureza dos grandes, no caso os ricos, o
ser a forma mais eficiente de o príncipe manter-se no desejo de dominar o povo, no caso os pobres.
poder e garantir a segurança da ordem social e política 04) Povo e grandes formam dois grupos políticos
para seus súditos. distintos e antagônicos em toda cidade.
08) Na concepção política de Maquiavel, não há uma 08) Os grandes se unem politicamente para se
exclusão entre ética e política, todavia a primeira deve defenderem do desejo de dominação do povo.
ser entendida a partir da segunda. Para ele, as exigências 16) O fenômeno descrito era restrito às cidades italianas
da ação política implicam uma ética cujo caráter é do período histórico do filósofo.
diferente da ética praticada pelos indivíduos na vida
privada. 13. (ENEM 2010) O príncipe, portanto, não deve se
16) Para Maquiavel, a sociedade é dividida entre os incomodar com a reputação de cruel, se seu propósito
grandes, isto é, os que possuem o poder político e é manter o povo unido e leal. De fato, com uns poucos
econômico, e o povo oprimido. A sociedade é cindida exemplos duros poderá ser mais clemente do que
por lutas sociais, não pode, portanto, ser vista como outros que, por muita piedade, permitem os distúrbios
uma comunidade homogênea voltada para o bem que levem ao assassínio e ao roubo.
comum. MAQUIAVEL, N. O Príncipe. São Paulo: Martin Claret, 2009.
No século XVI, Maquiavel escreveu O Príncipe,
11. (UEM 2012) “Resta agora ver quais devem ser os reflexão sobre a Monarquia e a função do governante.
modos e os atos de governo de um príncipe para com A manutenção da ordem social, segundo esse autor,
os súditos ou para com os amigos. E porque sei que baseava-se na
muitos escreveram sobre isso, temo, escrevendo eu A) inércia do julgamento de crimes polêmicos.
também, ser considerado presunçoso, sobretudo B) bondade em relação ao comportamento dos
porque, ao debater esta matéria, afasto-me do modo de mercenários.
raciocinar dos outros. Mas, sendo a minha intenção C) compaixão quanto à condenação dos servos
escrever coisa útil a quem a escute, pareceu-me mais D) neutralidade diante da condenação dos servos.
convincente ir direto à verdade efetiva da coisa do que E) conveniência entre o poder tirânico e a moral do
à imaginação dessa. E muitos imaginaram repúblicas e príncipe.
principados que nunca foram vistos, nem conhecidos
de verdade.” 14. (ENEM 2012) Não ignoro a opinião antiga e muito
MAQUIAVEL, N. O Príncipe. SP: Hedra, 2009, p. 159. difundida e que o que acontece no mundo é decidido
A partir do texto citado assinale o que for correto. por Deus e pelo acaso. Essa opinião é muito aceita em
01) Maquiavel defende uma teoria imaginária de nossos dias, devido às grandes transformações
governo, e não uma proposta real e factível. ocorridas, e que ocorrem diariamente, as quais escapam
02) Maquiavel afirma que as repúblicas e os principados à conjectura humana. Não obstante, para não ignorar
nunca foram conhecidos de verdade. inteiramente o nosso livre arbítrio, creio que se pode
04) Maquiavel se considera presunçoso por conhecer aceitar que a sorte decida metade dos nossos atos, mas
demais o tema. [o livre-arbítrio] nos permite o controle sobre a outra
08) Maquiavel propõe um discurso político que trate de metade.
MAQUIAVEL, N. O Príncipe. Brasília: EdUnB, 1979 (adaptado).
coisas reais e possíveis no mundo da política.

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Em O Príncipe, Maquiavel refletiu sobre o exercício do FORMAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DO ESTADO


poder em seu tempo. No trecho citado, o autor
demonstra o vínculo entre o seu pensamento político e O Estado foi o artifício criado pela nobreza e
o humanismo renascentista ao burguesia para a manutenção de seus interesses e
a) valorizar a interferência divina nos acontecimentos privilégios, respectivamente. No momento de seu
definidores do seu tempo. nascimento ele tinha que vir ao mundo como uma
b) rejeitar a intervenção do acaso nos processos Monarquia Absolutista, pois era preciso a
políticos. concentração de poder nas mãos de alguém que
c) afirmar a confiança na razão autônoma como personalizasse essa transformação que ocorria para
fundamento da ação humana. fazer nascer uma nova ordem social.
d) romper com a tradição que valorizava o passado Os burgueses, pagavam impostos, mas
como fonte de aprendizagem. ganhavam com:
e) redefinir a ação política com base na unidade entre fé ✓ Leis unificadas;
e razão. ✓ Sistemas de medidas e pesos unificados;
✓ Moeda única que facilitava o comércio;
15. (ENEM 2013) Nasce daqui uma questão: se vale ✓ Segurança pública e jurídica;
mais ser amado que temido ou temido que amado. Os nobres também ganhavam porque os reis
Responde-se que ambas as coisas seriam de desejar; mas eram nobres, e todo o corpo burocrático necessário
porque é difícil juntá-las, é muito mais seguro ser para o funcionamento do estado era composto de
temido que amado, quando haja de faltar uma das duas. nobres. Além disso, eles tinham leis diferenciadas que
Porque dos homens se pode dizer, duma maneira geral, os beneficiavam de diversas formas, como por
que são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e exemplo, a isenção do pagamento de tributos. Ou seja,
ávidos de lucro, e enquanto lhes fazes bem são seu status estava garantido.
inteiramente teus, oferecem-te o sangue, os bens, a vida Algumas medidas foram tomadas pelos Reis
e os filhos, quando, como acima disse, o perigo está para que centralizassem o poder. Dentre elas podemos
longe; mas quando ele chega, revoltam-se. citar:
MAQUIAVEL, N. O principe. Rio de Janeiro: Bertrand, 1991.
✓ Somente o Rei poderia ter um exército;
A partir da análise histórica do comportamento ✓ A resolução dos conflitos e aplicação da justiça
humano em suas relações sociais e políticas, Maquiavel seria tarefa real. Acabaram-se os tribunais
define o homem como um ser feudais e a Igreja passa a julgar casos que
a) munido de virtude, com disposição nata a praticar o envolvam somente questões de fé;
bem a si e aos outros. ✓ O rei poderia criar leis que valeriam para todo o
b) possuidor de fortuna, valendo-se de riquezas para reino, sempre objetivando o bem comum;
alcançar êxito na política. As características que marcaram o sistema
c) guiado por interesses, de modo que suas ações são absolutista foram:
imprevisíveis e inconstantes. ✓ Centralização de poderes nas mãos do Rei;
d) naturalmente racional, vivendo em um estado pré- ✓ Construção de um idioma nacional que pudesse
social e portando seus direitos naturais. dar unidade e identidade ao povo;
e) sociável por natureza, mantendo relações pacíficas ✓ Unificação de moedas e de sistemas de pesos e
com seus pares. medidas;
✓ Demarcação do território do reino;
✓ Ordenamento jurídico único que valesse para
todo o território.
Os ibéricos saíram na frente na formação dos
grandes reinos, enquanto Inglaterra e França ainda se
matavam na guerra dos cem anos.
Somente depois, quando Portugal e Espanha já
haviam até começado o processo de exploração de suas
colônias americanas, é que aqueles dois países
começavam a se fortalecer e emergir como monarquias
absolutistas.
Na França, os conflitos religiosos entre a
nobreza católica e a burguesia calvinista (huguenote)
formaram, juntamente com a Guerra dos Cem Anos, o
cenário que propiciou a formação e consolidação do
absolutismo francês.

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Distante tanto dos tolerância religiosa e é imaginado desenvolver-se em


excessos do realismo de Veneza entre sete seguidores de religiões diferentes:
Maquiavel como do utopismo 1) um católico,
de Morus, surgiu também Jean 2) um seguidor de Lutero,
Bodin (1530-96), defendendo 3) um seguidor de Calvino,
o direito absoluto do 4) um judeu,
governante, que para ele tinha 5) um maometano,
que ser um rei. A monarquia 6) um pagão e
seria a melhor forma de 7) um defensor da religião natural.
governo, pois estaria em A tese da obra é a de que (como sustentara o
conformidade com a natureza humanismo florentino) existe um fundamento natural
das coisas e dos homens. Só existe um Deus, um Sol, e que é comum a todas as religiões. Com essa base
um chefe de família, por isso apenas um deve governar. comum, seria possível um acordo religioso geral, sem
Suas ideias foram expostas em sua obra Os seis sacrificar as diferenças (ou seja, aquele plus) próprias
Livros da República, publicada em 1576, e é nela que das religiões positivas.
encontramos a formulação moderna do conceito de Havendo, portanto, esse fundamento natural
soberania como sendo o poder supremo de governar, implícito nas diferentes religiões, aquilo que as une
ou seja, é o poder que está acima de todos os outros revela-se mais forte do que aquilo que as separa.
poderes, não se sujeitando a nada. “Por soberania se entende A consolidação do absolutismo na França se dá
o poder absoluto e perpétuo que é próprio do Estado” (Livro I, com o cardeal Richelieu, que foi primeiro ministro de
capitulo III). Luís XIII. Esse cardeal enfraqueceu o poder dos
Um poder tão grande como esse só poderia vir nobres, e atribuiu grande autoridade aos funcionários
de Deus, cujo poder seria o único acima do poder do rei. Para ele, as necessidades do Estado estavam
soberano do rei. O rei possui um direito divino de acima de tudo e de todos, podendo o mesmo fazer tudo
governar. É por essa razão que Bodin não entende o para alcançar seus objetivos.
poder soberano como absoluto no sentido de ilimitado, E realmente fez. Para desbancar a Espanha
tirânico, porque ele não deve confrontar os direitos como potência mundial, a França, num ato
naturais divinos, dentre eles o direito à liberdade e contraditório, apoiou os protestantes, a quem sempre
propriedade dos súditos. perseguiu, no conflito que ficou conhecido como
Para existir o Estado, é preciso uma forte Guerra dos Trinta Anos (1618-48). Na metade do
soberania, que mantenha unidos os vários membros século XVII a França se tornou o Estado mais
sociais, ligando-os como em um só corpo. Mas essa poderoso da Europa.
forte soberania não se obtém com os métodos Foi essa potência que Luiz XIV governou de
recomendados por Maquiavel, que pecam por 1643 a 1715. Ele aprendeu direitinho com o Richelieu,
imoralismo e por ateísmo, e sim instaurando a justiça e se tornou o todo poderoso Rei-Sol. O ápice do
recorrendo à razão. absolutismo monárquico se dá no seu reinado.
Eis a célebre definição de Estado dada por No plano teórico, depois de Bodin, e ao tempo
Bodin: "Por Estado se entende o governo justo, que se de Luiz XIV, apareceu outro pensador francês para
exerce com poder soberano sobre diversas famílias e justificar o direito do rei de governar absolutamente. O
em tudo aquilo que elas têm em comum entre si; "[...] o bispo católico Jacques Bossuet (1627–1704) escreveu
Estado já não seria tal sem aquele poder soberano que a obra Política tirada da Sagrada Escritura, onde também
mantém unidos todos os membros e partes dele, defendeu o direito divino de governar do rei. Este
fazendo de todas as famílias e de todos os círculos um deve obediência somente a Deus, que legitima o seu
só corpo. [...] Em suma, a soberania é o verdadeiro poder, e todos devem obediência ao rei.
fundamento, o ponto cardeal sobre o qual se apoia toda Para fortalecer seu poder, Luiz XIV diminuiu
a estrutura do Estado e do qual dependem todas as influência política da aristocracia, enquanto fortalecia
magistraturas, leis e normas. economicamente o Estado com as ações de seu
Ela é o único laço e o único vinculo que faz de ministro das finanças Jean-Baptiste Colbert, cujas
famílias, corporações, colegiados e indivíduos um único medidas mercantilistas ficaram conhecidas como
corpo perfeito, que é precisamente o Estado". colbertismo.
Como já dissemos, o absolutismo de Bodin tem Tais medidas foram basicamente:
limites objetivos precisos nas normas Éticas (a justiça), ✓ O aperfeiçoamento do sistema de cobrança de
nas leis da natureza e nas leis divinas - e esses limites impostos;
constituem também sua força. A soberania que não ✓ Incentivo às manufaturas;
respeitasse essas leis não seria soberania, e sim tirania. ✓ Estímulo ao comércio internacional de seus
Também se destaca o escrito de Bodin artigos de luxo e produtos bélicos.
intitulado Colóquio entre sete pessoas, que tem por tema a
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✓ Fortalecimento da marinha para entrar na mandar uma mensagem ao mundo: “Aqui é a casa/sede
disputa por colônias; do homem/estado mais poderoso do mundo”.
Luiz XIV governou com o consentimento da Mas Versalhes, e todo luxo em que viviam o rei
aristocracia e o apoio da Igreja. Os primeiros, apesar de e sua corte, além de guerras constantes em que o estado
terem reduzida influência política, mantinham seu estava envolvido, tiveram um custo, que certamente
status de “amiguinhos” do rei, e detinham uma série de não era pago com o trabalho suado do rei. A bomba
privilégios, como não pagar impostos. Já a Igreja, estava se armando, e ela ia explodir na forma de uma
adorou ver o rei abolir o Édito de Nantes e tornar o das maiores revoluções do mundo ocidental.
catolicismo a única religião a ser praticada em território Na Inglaterra, Henrique VIII ganhou amplo
francês. apoio da burguesia e de setores da nobreza ao romper
Além desse apoio, um grande marketing com a Igreja Católica e fundar, como seu chefe, a
político contribuiu para associar a imagem do rei à do religião anglicana (essencialmente calvinista, mas
próprio Estado, fazendo com que ele mesmo afirmasse: católico na forma), governando esse país de 1509 a
“O Estado sou eu”. A sensação que ele passa de ser o 1547.
todo-poderoso, um homem perfeito que simboliza o É nessa época e nesse contexto social de lutas
próprio estado francês em sua grandeza. religiosas e início de implementação do capitalismo na
Inglaterra que Tomás Morus (1478-1535), amigo e
conselheiro do Rei, publicou a UTOPIA, obra que lhe
deu fama imortal.
Tomas Morus nasceu em
Londres em 1478. Foi amigo e
discípulo de Erasmo e humanista
de estilo elegante. Participou
ativamente da vida política,
exercendo altos cargos. Firme em
sua fé católica, recusou-se a
reconhecer Henrique VIII como
chefe da Igreja, sendo por isso
condenado a morte em 1535. Somente em 1935 foi
proclamado santo por Pio IX.
A Utopia além de ser um marco na literatura e
filosofia ocidental, influenciou com suas ideias os
socialistas do século XIX devido a radicalidade de sua
crítica à sociedade que valorizava mais o dinheiro do
que o humano.
A obra que levou fama imortal a Morus foi
Sua imagem foi cuidadosamente construída Utopia, título elevado a denominação de um gênero
para representar a magnificência, a perfeição e o caráter literário antiguíssimo, muito usado antes e depois de
divino do reino francês. Morus, representando uma dimensão do espírito
Ele ia morar em qualquer lugar? Claro que não. humano que, através da representação mais ou menos
Teria que ser um palácio digno se um rei Sol. Luiz XIV, imaginária daquilo que não existe, apresenta aquilo que
então, manda construir um palácio que represente sua deveria ser ou como o homem gostaria que a realidade
realeza. E claro, tinha que ser o maior da Europa. Nesse fosse.
sentido, o Palácio de Versalhes foi construído para O temo “utopia” (do grego ou = não e topos =
lugar) indica um lugar que não existe em nenhum lugar.
Platão já se aproximara muito dessa indicação,
escrevendo que a cidade perfeita por ele descrita na
República não existe em nenhuma parte sobre a terra.
Mas foi necessária a criação semântica de Morus para
preencher essa lacuna linguística.
Deve-se notar como Morus reafirma essa
dimensão do “não existir em nenhum lugar”. A capital
de Utopia chama-se Amauroto (do grego amaurós =
evanecente), que quer dizer “cidade que se esvanece
como miragem"; o rio de Utopia chama-se Anidro (do
grego anydros = privado de água), ou seja, um rio que
não é rio de água, mas rio sem água; já o príncipe
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chama-se Ademo (formado por um alfa privativo e demos, apresentavam os males da época e indicavam os
que significa "povo"), que significa o chefe que não tem critérios com os quais deveriam ser curados.
povo. Além disso, em Utopia todos os cidadãos são
Todo esse jogo linguístico utilizado pelo autor é iguais entre si. Desaparecem as diferenças de renda,
para demonstrar a tensão entre o ideal e o real, como os desaparecendo então as diferenças de status social. E
homens deveriam se comportar em contraposição ao mais, os habitantes de Utopia se substituem de modo
que estava realmente acontecendo na Inglaterra. O equilibrado nos trabalhos da agricultura e do artesanato,
enorme sucesso do termo mostra o quanto o espírito de modo que não renasçam, em virtude da divisão do
humano dele necessitava. trabalho, também as divisões sociais.
A fonte em que Morus bebeu foi, naturalmente, O trabalho não é massacrante e não dura toda a
Platão, com amplas infiltrações de doutrinas estóicas, jornada (como durava naquela época), e sim seis horas
tomistas e erasmianas. diárias, para deixar espago ao lazer e a outras atividades.
Na contraluz está a Inglaterra, com sua história, Em Utopia também existem sacerdotes dedicados ao
suas tradições e seus dramas sociais de então (a culto e um lugar especial é garantido aos "literatos", ou
reestruturação do sistema agrícola, que privava de terra seja, àqueles que, nascendo com dotes e inclinações
e trabalho grande quantidade de camponeses; as lutas especiais, pretendem dedicar-se ao estudo.
religiosas e a intolerância; a insaciável sede de riquezas) Os habitantes de Utopia são pacifistas, seguem
Essa obra é dividida em duas partes onde na prazeres sadios, admitem cultos diferentes, honram a
primeira o autor faz uma severa crítica à Inglaterra que Deus de diferentes modos e sabem se compreender e
se formara como uma nação de intolerância religiosa, se aceitar reciprocamente nessas diversidades.
que expulsa os seus cidadãos de seus lares no campo Por fim, os habitantes de Utopia eliminam, com
para dar lugar a grandes propriedades que beneficiam a abolição do dinheiro e de seu uso, todas as
apenas poucas pessoas, tornando-a assim uma nação calamidades que a avidez do mesmo produz entre os
avarenta que coloca a busca pelo lucro acima da justiça homens. E em uma das páginas conclusivas Morus põe
e bem-estar de seus súditos. em primeiro plano este belíssimo pensamento em
Na segunda parte o filósofo formula um modo forma de paradoxo:
de vida ideal em que todos são iguais, não existe “seria tão mais fácil procurar-se o de que viver, caso não
propriedade privada, todos contribuem para o bem o impedisse justamente a busca do dinheiro, que nas intenções de
comum com o seu trabalho, mas não de forma quem o inventou teria devido servir-nos precisamente para o fim
exploradora, apenas com uma jornada diária de seis de agilizar a vida, quando na realidade ocorre exatamente o
horas, o suficiente para que todos pudessem trabalhar e contrário.”
também ter tempo para o lazer e estudos. Na Inglaterra do mundo real, apesar das
Além disso, nessa Utopia haveria algo, na visão modificações implementadas pelo rei Henrique VIII,
do autor, fundamental para toda e qualquer nação tanto no campo social como no econômico, foi sua filha
civilizada que é a tolerância religiosa. Coisa que há Elizabeth I que tornou a Inglaterra uma potência ao
muito havia se perdido na Inglaterra. governá-la de 1558 a 1603.
E como crítica ao espírito burguês em que a Atrasados na corrida para exploração das
avareza e a falta de compaixão ao próximo tomaram o américas, Elizabeth quis recuperar o tempo perdido a
lugar nos corações dos ingleses, Tomás Morus descreve todo custo. Ela incentivou a construção de navios para
a sociedade que vive na Utopia como uma sociedade a formação de uma poderosa frota que pudesse invadir
que abolira o dinheiro. e explorar territórios, fossem eles já dominados por
outros países, ou não.
Princípios morais

Os princípios basilares que regem o relato (que


é imaginado como narrado por Rafael Itlodeo, que,
tendo participado de uma das viagens de Américo
Vespúcio, teria visto a ilha de Utopia) são muito
simples. Morus estava profundamente convencido
(influenciado nisso pelo otimismo humanista) de que
bastaria seguir a sã razão e as mais elementares leis da
natureza, que estão em perfeita harmonia com a razão,
para acabar com os males que afligem a sociedade.
Utopia não apresentava um programa social a
ser realizado, e sim princípios destinados a terem
função normativa que, com hábeis jogos de alusões,

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Foi nessa época que começou a ocupação da A fim de tirar um rei absolutista do poder,
américa inglesa, que não dava muito lucro porque não Oliver Cromwell lidera as tropas do parlamento, corta
havia muito o que explorar, pois as terras que a cabeça do rei e assume como ditador com o apoio do
produziam especiarias e tinham metais preciosos já exército, instaurando uma republica ditatorial
estavam há muito tempo ocupadas pelos espanhóis. conhecida como protetorado, e governa de 1649 a 1658.
Diante disso, esses navios serviam também para Forma em 1651 a Comunidade Britânica com a união
saquear outros, de preferência os espanhóis, que da Inglaterra, Irlanda e Escócia.
vinham abarrotados de metais preciosos.
Não tardou muito para os espanhóis THOMAS HOBBES E A MECÂNICA DO
responderem, e a Invencível Armada (a maior frota de ESTADO
navios do planeta) do rei Felipe II atacou os ingleses, Thomas Hobbes
mas estes saíram vitoriosos. A partir de então, os mares (1588-1679), inglês de
passaram a ter outros donos. família pobre, conviveu
Mas as transformações econômicas ocorridas com a nobreza, de quem
na terra da rainha não ocorreram só nos mares, o modo recebeu apoio e condições
de produzir na terra também se modificou. As para estudar, e defendeu
propriedades rurais que antes eram usadas em proveito ferrenhamente o poder
coletivo, passaram a ser exploradas por um único dono, absoluto, ameaçado pelas
principalmente na criação de ovelhas que forneciam a novas tendências liberais.
lã que impulsionava a nascente manufatura de tecidos Teve contato com
nas cidades. Esse processo contribuiu para a criação de Descartes, Francis Bacon
uma classe aristocrática aburguesada, e mais forte e Galileu.
economicamente, os gentry. Preocupou-se, entre outras coisas, com o
Nesse processo houve a intensificação do que problema do conhecimento, tema básico das reflexões
ficou conhecido como cercamentos, onde os do século XVII, representando a tendência empirista.
camponeses foram praticamente expulsos do campo Também escreveu sobre política: as obras De Cive (Do
para viver uma vida miserável na cidade. Isso forçou um Cidadão) e Leviatã.
descontrolado êxodo rural para as cidades que não O que acontece no século XVII, época em que
estavam preparadas para receber todo esse contingente Hobbes viveu? O absolutismo, atingindo o apogeu,
populacional que se tornou mão de obra barata e encontra -se em vias de ser ultrapassado, e enfrenta
fortaleceu o mercado consumidor interno. Esse inúmeros movimentos de oposição baseados em ideias
processo contribuiu para a consolidação do capitalismo liberais.
na Inglaterra. Hobbes nasceu na era de ouro elisabetana, mas
A “rainha virgem” morreu sem deixar sua vida adulta foi marcada por esses conflitos entre reis
herdeiros, sendo sucedida pelo seu primo escocês, e e o parlamento. Ele era crítico da democracia e por
católico, Jaime. Este uniu Inglaterra e Escócia e conseguinte, da monarquia parlamentar inglesa.
governou de 1603 a 1625, iniciando a dinastia dos Quando estourou a guerra entre rei e
Stuart como Jaime I. parlamento ele se manteve a favor do rei, e teve que se
O cara mal chegou e já queria ter seus poderes exilar na França em 1640. Um país onde todo aquele
reais aumentados. E quem dava a fundamentação para que quisesse defender o absolutismo era bem-vindo.
a legitimidade do poder ser ilimitado? Exatamente, o Hobbes encarou a questão da legitimidade do
catolicismo. Então ele começou a enfatizar o caráter poder absoluto e da fundamentação da criação do
católico do anglicanismo. Mas não colou muito não. O estado em sua grande obra Leviatã, que publicou na
parlamento, composto pela aristocracia rural França em 1651, dois anos depois da vitória de
aburguesada (gentry) e pelos burgueses fiéis aos Cromwell, e quando seu governo ditatorial começava a
ensinamentos calvinistas (puritanos), se manifestou se consolidar.
contrário a essa jogada do rei, aumentando as tensões Por que deve existir o Estado e de onde vem o
entre os poderes. seu poder absoluto? Essa é a pergunta central da obra
Já no reinado do sucessor de Jaime, Carlos I, o magna de Hobbes. Na França, havia a teoria do direito
parlamento apresentou em 1628 uma Petição de divino dos reis de governar, mas nosso filósofo era um
Direitos limitando os poderes reais. O rei ficou doido, homem racional demais para abraçar tal teoria.
mandou fechar o parlamento e prender todo mundo. A Hobbes inova no pensamento político da época
situação só piorou, e em 1640 desencadeou-se uma ao defender que a organização social deve ser entendida
guerra civil (1642-48) entre os “cavaleiros” e explicada não como uma teia de jogo de interesses
(bajuladores do rei) e os “cabeças redondas” partidários entre classes sociais diferentes, mas do mesmo modo
do parlamento. Tem-se início a Revolução Puritana. como a ciência explica o movimento dos corpos através
de suas relações de causa e efeito, tendo como princípio
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básico o entendimento do movimento como um cientificas à moral e à política, ela poderá evitar as
fenômeno natural. Filosofia, para ele, era física dos guerras civis e as calamidades e, portanto, poderá
corpos. garantir a paz.
Trata-se, portanto, de ideias que representam
A nova filosofia uma clara antítese das que foram tornadas clássicas
sobretudo por Aristóteles, que, na Metafísica, escrevia
Hobbes tinha um notável conhecimento de que a filosofia “não tende a realizar alguma coisa”, e que
línguas clássicas. Entretanto, essas línguas serviram-lhe nós não a procuramos “por nenhuma vantagem que
para se aproximar de poetas e historiadores e não para seja estranha a ela”, mas por puro amor ao saber, isto é,
revisitar e meditar os filósofos antigos. por objetivos “contemplativos”.
Tinha decidida aversão por Aristóteles e mais
ainda pela filosofia escolástica (que então era A tripartição da filosofia
interpretada de modo inteiramente inadequado).
Entretanto, ficou entusiasmado pelos Elementos Com essas premissas, fica clara a nova definição
de Euclides, com sua rigorosíssima construção de filosofia: ela tem por objeto os “corpos” as suas
dedutiva, que ele considerou modelo de método para o causas e suas propriedades. Não se ocupa de Deus e da
filosofar. teologia, que cabem à fé, nem daquilo que implica
Também exerceram notável influência sobre inspiração ou revelação divina, nem se ocupa da
Hobbes o racionalismo cartesiano, com suas instâncias história, nem de tudo aquilo que não seja bem fundado
derivadas da revolução cientifica, e Bacon, com sua ou conjuntural.
concepção utilitarista do saber. Ora, como os corpos são a) naturais
Mas talvez a influência mais poderosa tenha inanimados, b) naturais animados (como o homem) ou
sido exercida por Galileu com sua física, tanto que, em então c) artificiais (como o Estado), a filosofia,
várias partes da obra de Hobbes, fica evidente a intenção consequentemente, deve ser tripartida.
de ser o Galileu da filosofia, em especial o Galileu da ciência Ela deve tratar:
política. Entendida como estudo do movimento a física a) do corpo em geral,
não remonta a antes de Galileu, diz expressamente b) do homem e
Hobbes, ao passo que a filosofia civil não remonta a c) do cidadão e do Estado.
antes de sua própria obra Do cidadão (1642). Foi com base nessa tripartição que Hobbes
No De corpore, Hobbes concebeu e elaborou sua célebre trilogia De corpore, De
expressa muito eficazmente a homine e De cive.
nova tempera espiritual e (como A divisão da filosofia também pode se articular
já haviam feito muitas páginas do seguinte modo:
de Descartes e de Bacon) 1) ciência dos corpos naturais;
sanciona o fim de uma época do 2) ciência do corpo artificial, com o primeiro
filosofar e o início de urna nova, ramo subdividido como mostra o esquema a seguir.
que fecha as portas ao Tudo aquilo que é essência espiritual ou que não é
pensamento antigo e medieval, corpóreo está excluído da filosofia. Hobbes, inclusive,
sem possibilidades de apelo por afirma drasticamente que aquele que deseja outra forma
muito tempo. de filosofia que não esteja ligada à dimensão do
Em particular, Hobbes destaca o seguinte: corpóreo deverá procurá-la em outros livros, não nos
a) o grande mérito de Galileu; seus.
b) a necessidade de fundar urna nova ciência do
Estado com base no modelo galileano; Os “nomes”, sua gênese e seu significado
c) a vacuidade e inconsistência da filosofia
grega; Hobbes precede a abordagem dos corpos de
d) a perniciosidade da mistura operada pela uma “logica” (em surpreendente analogia com o
filosofia veteromedieval cristã entre a Bíblia e a filosofia esquema das filosofias helenísticas, que faziam a lógica
platônica e especialmente a aristotélica, que Hobbes preceder a física e a ética, corno, por exemplo, a
considera uma traição da fé cristã; filosofia epicurista). Essa lógica retoma a tradição
e) a necessidade de expulsar o monstro nominalista da filosofia inglesa tardio-escolástica,
metafísico e de distinguir a filosofia da religião e das assumindo, porém, também alguns elementos de
Escrituras. origem cartesiana.
Falávamos, acima, das influencias de Bacon. A lógica elabora as regras do modo correto de
Com efeito, também Hobbes afirma que “o fim da pensar. Mas, em um contexto nominalista como o de
ciência é a potência”. E precisa que a filosofia é da Hobbes, o interesse volta-se mais para o “nome” do
máxima “utilidade”, uma vez que, aplicando as normas que para o pensamento como tal.
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Com efeito, Hobbes diz que os pensamentos arbítrio daqueles que falam e daqueles que escutam
são fluidos e, sendo assim, devem ser fixados com [...].”
“sinais” sensíveis, capazes de reconduzir à mente Raciocinar é conectar (ou desconectar) nomes,
pensamentos passados, bem como “registrá-los” e definições e proposições em conformidade com as
“sistematizá-los” e, posteriormente, transmiti-los aos regras, fixadas por convenção.
outros. Diz Hobbes que raciocinar é “calcular” e
Foi assim que nasceram os “nomes”, que foram “computar”, aliás, mais propriamente, é um somar e
forjados pelo arbítrio humano. subtrair. “Por raciocínio entendo o cálculo. Calcular é
Eis as afirmações significativas do nosso colher a soma de mais coisas, uma ligada a outra, ou conhecer
filósofo: “O nome é um som humano usado por o restante, subtraída uma coisa à outra".
arbítrio do homem para ser sinal com o qua1 se possa Por exemplo:
suscitar na mente um pensamento semelhante a um
pensamento passado e que, disposto no discurso e homem = animal + racional
proferido a outros, seja para eles sinal daquele animal = homem - racional
pensamento que tenha ou não ocorrido antes na própria
pessoa que fala.” O fato de que os nomes nasçam do Hobbes não exclui que o raciocinar seja
arbítrio está provado pelo continuo surgimento de também um multiplicar e dividir; entretanto, a
novas palavras e pela abolição das velhas. multiplicação é redutível à soma, ao passo que a divisão
Hobbes fala de nomes “positivos”, como, por é redutível à subtração.
exemplo, “homem” e “planta”, e de nomes Essa concepção do raciocínio, entendido como
“negativos”, como, por exemplo, “não-homem” e “compor”, “decompor” e “recompor” é baseado em
“não-planta”. Os nomes positivos e os correspondentes semantemas ou sinais linguísticos, bem como o
negativos não podem ser atribuídos à mesma coisa respectivo pano de fundo convencionalístico,
pensada em um mesmo tempo e a propósito do mesmo surpreendem pela modernidade e pela ousadia
dado. Essa é uma transformação significativa do extraordinária, já que contém pressentimentos da
princípio da não-contradição em termos nominalistas. cibernética contemporânea (pressentimentos, note-se
Os nomes comuns não indicam conceitos bem, mais do que antecipações).
universais, porque só existem indivíduos e conceitos Essa concepção do raciocinar como calcular,
(que, para Hobbes, nada mais são que imagens) de como decompor e recompor, inspira-se além do mais
indivíduos, mas trata-se apenas de nomes de nomes, não também em Descartes, mas com notáveis diferenças.
tendo, portanto, referência a realidade e não Com efeito, Descartes partia de verdades primeiras,
significando a natureza das coisas, mas somente aquilo que, em virtude de sua evidencia intuitiva, tinham
que nós pensamos dela. precisa garantia de objetividade, ao passo que Hobbes
se desloca para o plano do convencionalismo,
As definições, as proposições e o raciocínio como esvaziando dessa forma o discurso sobre a objetividade.
cálculo
O empirismo hobbesiano
A definição não expressa (como queriam
Aristóteles e toda a 1ógica clássica e medieval) a Entretanto, para concluir este tema, devemos
“essência” da coisa, mas simplesmente “o significado destacar que o nominalismo de Hobbes não se funda
dos vocábulos”. Dar uma definição nada mais é do que em bases céticas, mas muito mais empíricas, sensistas e
“fornecer o significado do termo usado”. Portanto, as fenomênicas.
definições são arbitrarias, assim como o são os Com efeito, por um lado, ele admite que os
vocábulos. nossos pensamentos (que são designados e expressos
Da conexão de nomes nasce a proposição, por nomes) são “representações ou aparências” dos
normalmente constituída por um nome concreto que objetos que estão fora de nós, sendo em nós produzidos
tem função de sujeito e por um nome abstrato que tem através da experiência dos sentidos.
função de predicado, ambos ligados pela copulativa. Hobbes diz textualmente: “A origem de todos
Assim como os nomes, também as proposições [os pensamentos] é aquilo que nós chamamos sentido
primeiras e os axiomas (que são as proposições (pois não há nenhuma concepção da mente humana
fundamentais) são fruto do arbítrio daqueles que foram que não tenha sido inicialmente, no todo ou em parte,
os primeiros a estabelecer os nomes ou a acolhê-los: gerada pelos 6rgiios do sentido). O resto é derivado
“[...] por exemplo, é verdade que o homem é animal, já que daquela origem”.
se decidiu impor esses dois nomes à mesma coisa”; as Ele chega a dizer que a causa do sentido é “O
proposições primeiras [...] nada mais são que definições, corpo externo ou objeto”.
ou partes de definição e somente elas são princípios de Além disso, quando Hobbes diz que a definição
demonstração, isto é, verdades estabelecidas pelo não expressa a essência da coisa, as “aquilo que nós
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concebemos da essência da coisa”, não enuncia uma tanto que tende a entender até Deus em termos
negação cética, e sim opera uma redução fenomênica corporeístas. O que não deixou de suscitar fortes
(só conhecemos da essência aquilo que dela nos objeções e acusações, das quais se defendeu.
aparece). Assim, corpo e movimento local explicam todas
Em suma, ele caminha sobre uma linha que é as coisas.
típica do pensamento inglês e que se imporia de modo As qualidades são “fantasmas do sensível”, ou
sempre mais acentuado. seja, efeitos dos corpos e do movimento. Todas as
chamadas qualidades sensíveis nada mais são que
Corpo e movimento movimentos variados. E as alterações qualitativas e os
próprios processos de geração e corrupção são
Dissemos que, para Hobbes, a filosofia é reduzidos a movimento (local).
ciência/física dos “corpos” e, podemos acrescentar,
mais precisamente, ciência das causas dos corpos. Os processos cognitivos e os sentimentos são
Os modelos dessa ciência (como também já “movimentos”
vimos) são a geometria de Euclides e a física de Galileu.
Mas a diferença entre geometria e física é notável. Consequentemente, também os processos
As premissas da geometria são postulados cognoscitivos não podem ter outro tipo de explicação
fixados por nós (postulados que nós estabelecemos) e a senão o mecanicista. Na verdade, em certos momentos,
geração das figuras é produzida por nós mediante as Hobbes parece reconhecer aos fenômenos do
linhas que traçamos, de modo que elas “dependem do conhecimento certo estatuto privilegiado.
nosso arbítrio”. Hobbes precisa: “Exatamente pelo fato Depois, contudo, ele deixa de lado essa ordem
de que somos nós mesmos a criar as figuras é que há uma de considerações e passa a explicar a própria sensação
geometria e que ela é demonstrável”. com base no movimento, mais precisamente com base
Conhecemos perfeitamente aquilo que nós no movimento gerado pelo sujeito sensível que, por seu
mesmos estabelecemos, fazemos e construímos. Mas já turno, reage com outro movimento, do qual,
não podemos com tanta certeza conhecer as coisas precisamente, surge a imagem ou representação.
naturais, porque não somos nós que as construímos. Também são “movimentos” os sentimentos de
E conclui Hobbes: “Entretanto, a partir das prazer e de dor, o apetite e o desejo, o amor e o ódio, e
próprias propriedades que vemos, deduzindo as até o próprio querer.
consequências até onde nos é dado fazê-lo, podemos Consequentemente, Hobbes nega a liberdade,
demonstrar que suas causas podem ter sido estas ou pois os movimentos e os nexos mecânicos que derivam
aquelas.” E, como as coisas naturais nascem do sio rigorosamente necessários. Escreve ele no De corpore:
movimento, fica assim identificada a sua causa principal. “A liberdade de querer ou não querer não é maior no
Naturalmente, não se trata do movimento homem do que nos outros seres animados. Com efeito,
concebido aristotelicamente, mas sim do movimento o desejo foi precedido pela causa própria do desejo e,
quantitativamente determinado, ou seja, medido por isso, o próprio ato do desejo [...] não podia deixar
matemática e geometricamente (o movimento de seguir-se, ou seja, segue-se necessariamente”.
galileano).
Assim, Hobbes tenta explicar toda a realidade Liberdade e valores absolutos
com base em apenas dois elementos:
É evidente que, estabelecendo-se dado
1) do corpo entendido como aquilo que não movimento como causa “antecedente”, daí deve
depende de nosso pensamento e que “coincide e se co- necessariamente brotar um movimento “consequente”.
estende com uma parte do espaço”; A liberdade romperia esse nexo e, por conseguinte,
2) do movimento entendido do modo que infringiria a lógica do corporeísmo e do mecanicismo.
indicamos. Nos horizontes do materialismo, não ha espaço para a
É esse o seu materialismo, ou melhor, seu liberdade.
corporeísmo mecanicista, que tantas polêmicas suscitou Nesse horizonte, porém, não pode haver
em sua época. também espaço para o “bem” (e o “mal”) objetivo e,
portanto, para os “valores morais”. Com efeito, para
A qualidades das coisas são movimentos variados Hobbes, “bem” é aquilo a que tendemos e “mal” aquilo
de que fugimos. Mas, como alguns homens desejam
Aliás, é verdade que, por vezes, Hobbes parece algumas coisas e outros não e como alguns fogem de
apresentar seu “corporeísmo” quase que como uma algumas coisas e outros não, daí decorre que bens e
“hipótese” e não como um dogma. Mas também é males são relativos.
verdade que, na maior parte dos seus textos, ele Não se pode dizer sequer de Deus que seja o
desenvolve essa sua concepção como tese sem reservas, bem em absoluto, porque “Deus é bom para todos
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aqueles que invocam seu nome, mas não para aqueles b) o bem de cada animal que vive em sociedade
que blasfemam seu nome”. Portanto, o bem é relativo não difere do bem comum, ao passo que no homem o
à pessoa, ao local, ao tempo e às circunstâncias, como bem privado difere do bem público;
o sofista Protágoras já havia sustentado na antiguidade. c) os animais não percebem defeitos em sua
Mas, se o bem é relativo, não havendo, sociedade, ao passo que o homem os percebe, querendo
portanto, valores absolutos, como é possível construir introduzir continuas novidades, que constituem causas
uma moral e uma vida social? Como é possível a de discórdias e guerras;
convivência dos homens em uma sociedade? d) os animais não têm a palavra, que nos
As duas obras-primas de Hobbes, o Do cidadão homens é frequentemente uma “trombeta de guerra e
e o Leviatã, são dedicadas precisamente à resposta a de sedição”;
esses problemas. e) os animais não se censuram uns aos outros,
ao passo que os homens sim;
Egoísmo e convencionalismo f) nos animais o consenso é natural, enquanto
nos homens não o é.
Os pressupostos que constituem a base da O Estado, portanto, não é natural, e sim
construção da sociedade e do Estado de Hobbes são artificial.
fundamentalmente dois.
1) Em primeiro lugar, nosso filosofo admite O nascimento do Estado
que, embora todos os bens sejam relativos, ha, porém,
entre eles um bem primeiro e originário, que é a vida e sua Por que e como nasce o Estado?
conservação (e, portanto, um mal primeiro, que é a morte). A partir da tendência de secularização do
2) Em segundo lugar, ele nega que existam uma pensamento político, os filósofos do século XVII estão
justiça e uma injustiça naturais, já que, como vimos, não preocupados em justificar racionalmente e legitimar o
existem “valores” absolutos. Hobbes sustenta que poder do Estado sem recorrer à intervenção divina ou
justiça e injustiça são fruto de “convenções” a qualquer explicação religiosa. Daí a preocupação com
estabelecidas por nós mesmos e que, portanto, são a origem do Estado.
cognoscíveis de modo perfeito e a priori, juntamente Para descobrir a origem e o fundamento do
com tudo aquilo que delas deriva. Estado e de seu poder soberano absoluto, Hobbes não
1) “Egoísmo” e 2) “convencionalismo” são os faz uma investigação histórica sobre as primeiras
pontos cardeais da nova ciência politica, que, segundo sociedades. Seria ingenuidade concluir que a "origem"
Hobbes, pode se desdobrar como sistema dedutivo do Estado se refere à preocupação com o seu
perfeito, assim como o da geometria euclidiana. "começo". O termo deve ser entendido no sentido
lógico, e não cronológico, como "princípio" do Estado,
A política não tem um fundamento natural ou seja, sua razão de ser. O ponto crucial não é a
história, mas a validade da ordem social e política, a base
Para compreender adequadamente a nova legal do Estado.
concepção política de Hobbes é oportuno recordar que As teorias contratualistas representam a busca
ela constitui a mais radical subversão da clássica posição da legitimidade do poder que os novos pensadores
aristotélica. Com efeito, o estagirita sustentava que o políticos esperam encontrar na representatividade do
homem é “animal político”, ou seja, é constituído de tal poder e no consenso. Essa temática já existe em
modo que, por sua própria natureza, é feito para viver Hobbes, embora a partir de outros pressupostos e com
com os outros em sociedade politicamente estruturada. resultados e propostas diferentes daquelas dos liberais.
Ademais, ele identificava essa condição de “animal Tal como na ciência, ele começa com uma
político” do homem com o estado próprio também de hipótese, a de que os homens viviam inicialmente
outros animais, como as abelhas e as formigas, que isolados, livres e iguais, em um estado anterior à
desejando e evitando as mesmas coisas e voltando suas sociedade, no qual tudo era possível, não existiam leis e
ações para fins comuns, se agregam espontaneamente. muito menos justiça, onde havia a pura e simples
Hobbes contesta vivamente a proposição barbárie, um momento a que ele chamou de Estado de
aristotélica e a comparação. Para ele, cada homem é Natureza.
profundamente diferente dos outros homens e, A condição em que os homens se encontram
portanto, deles separado (é um átomo de egoísmo). naturalmente é uma condição de guerra de todos
Portanto, cada homem não é de modo nenhum ligado contra todos. Cada qual tende a se apropriar de tudo
aos outros homens por um consenso espontâneo como aquilo de que necessita para a sua própria sobrevivência
o dos animais, que se baseia em um “apetite natural”, e conservação. E como cada qual tem direito sobre
pelas seguintes razões: tudo, não havendo limite imposto pela natureza, nasce
a) em primeiro lugar, existem entre os homens então a inevitável predominância de uns sobre os
motivos de contendas que não existem entre os animais; outros.
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No estado de natureza, o homem tem direito havia excluído, sem os quais não se pode construir
a tudo: “O direito de natureza, a que os autores geralmente nenhuma sociedade.
chamam jus naturale, é a liberdade que cada homem possui de 1) A regra primeira e fundamental ordena que o
usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação homem se esforce por buscar a paz.
de sua própria natureza, ou seja, de sua vida; e, consequentemente, 2) A segunda regra impõe que se renuncie ao
de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe direito sobre tudo, ou seja, aquele direito que se tem no
indiquem como meios adequados a esse fim’. estado natural, que é precisamente o direito que
Ora, enquanto perdurar esse estado de coisas, desencadeia todas as contendas.
não haverá segurança nem paz alguma. A situação dos A regra, portanto, prescreve “que um homem,
homens deixados a si próprios é de anarquia, geradora quando os outros também estiverem, esteja disposto, se
de insegurança, angústia e medo. Os interesses egoístas o julgar necessário para a sua própria paz e defesa, a
predominam e o homem se torna um lobo para o outro abdicar desse direito a todas as coisas, e que se contente
homem (homo homini lupus). em ter tanta liberdade contra os outros homens quanta
É nesse contexto que Hobbes usa a frase de ele concederia aos outros homens contra si”.
Plauto homo homini lupus, “o homem é um lobo para o Essa, comenta o nosso filósofo, “é a lei do
homem”, que, no entanto, não tem o significado de Evangelho: tudo aquilo que exiges que os outros te
sinistro e radical pessimismo moral que muitos nela façam, faze-o a eles. Essa é a lei de todos os homens”.
viram, porque pretende ser pura constatação estrutural, 3) A terceira lei impõe, uma vez que se tenha
indicando uma situação à qual se deve dar remédio. renunciado ao direito a tudo, “que se cumpram os
Nessa situação, o homem está arriscado a acordos feitos”. E daí nascem a justiça e a injustiça
perder o bem primeiro, que é a vida, ficando a cada (justiça é manter os acordos feitos, injustiça é
instante exposto ao perigo de morte violenta. Ademais, transgredi-los).
também não pode dedicar-se a alguma atividade A essas três leis básicas seguem-se outras
industrial ou comercial, cujos frutos permaneceriam dezesseis, que resumimos brevemente a seguir:
sempre incertos, nem pode cultivar as artes e tudo 4) A quarta lei prescreve que se restituam os
aquilo que é agradável - em suma, cada homem benefícios recebidos, de modo que os outros não se
permanece só, com o terror de perder a vida de modo arrependam de tê-los feito. Daí nascem a gratidão e a
violento. ingratidão.
Mas o homem escapa dessa situação recorrendo 5) A quinta prescreve que cada homem deve
a dois elementos básicos: a) a alguns instintos; b) à tender a se adaptar aos outros. Daí nascem a
razão. sociabilidade e seu contrário.
a) Os instintos são o desejo de evitar a guerra 6) A sexta lei prescreve que, quando se tiver as
contínua, para salvar a vida, e a necessidade de devidas garantias, deve-se perdoar aqueles que,
conseguir aquilo que é necessário para a sobrevivência. arrependendo-se, o desejem.
b) A razão, aqui, é entendida não tanto como 7) A sétima prescreve que, nus vinganças (ou
valor em si, mas muito mais como instrumento capaz punições), não se deve olhar para o mal passado
de realizar aqueles desejos de fundo. recebido, mas sim para o bem futuro. A não-
observância desta lei dá lugar à crueldade.
As “leis de natureza” 8) A oitava lei prescreve que não se deve
declarar ódio ou desprezo pelos outros com palavras,
Desse modo, nascem as “leis de natureza”, que gestos ou atos. A infração a essa lei chama-se “injuria”.
nada mais são do que a racionalização do egoísmo, as 9) A nona lei prescreve que cada homem deve
normas que permitem concretizar o instinto de reconhecer o outro como igual a si por natureza. A
autoconservação. infração a essa lei é o orgulho.
Escreve Hobbes: “Uma lei de natureza (lex 10) A décima lei prescreve que ninguém deve
naturalis) é um preceito ou regra geral, descoberta pela pretender que seja reservado para si qualquer direito
razão, que veta ao homem fazer aquilo que é lesivo à que não lhe agradaria que fosse reservado a outro
sua vida ou que lhe tolhe os meios para preservá-la, e homem. Daí nascem a modéstia e a arrogância.
omitir aquilo com que ele pensa que sua vida possa ser 11) A décima primeira lei prescreve a quem é
mais bem preservada”. confiada a função de julgar entre um homem e outro
Habitualmente, recordam-se as primeiras três, que se comporte com equidade entre os dois. Daí
que são as principais. Mas, no Leviatã, Hobbes nascem a equidade e a parcialidade.
relaciona dezenove. O modo como ele as propõe e As oito leis restantes prescrevem o uso comum
deduz dá ideia perfeita de como se serviu do método das coisas indivisíveis, a regra de confiar à sorte (natural
geométrico aplicado à ética e de como pretendia, sob ou estabelecida por convenção) a fruição dos bens
essa nova roupagem, reintroduzir os valores morais que indivisíveis, o salvo-conduto para os mediadores da paz,

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a arbitragem, as condições de idoneidade para julgar Aqui nós devemos observar que o poder do
com equidade a validade dos testemunhos. Estado, ou seja, sua soberania, advém não mais do
direito divino do rei, mas do pacto feito entre os
O pacto social e a teorização do absolutismo cidadãos de renunciar parte do seu poder de governar-
se.
Entretanto, em si mesmas, essas leis não bastam Também devemos desfazer o mal-entendido
para constituir a sociedade, já que também é preciso um comum pelo qual Hobbes é identificado como defensor
poder que obrigue os homens a respeitá-las: “sem a do absolutismo real. Na verdade, o Estado pode ser
espada que lhes imponha o respeito”, os acordos não monárquico (quando constituído por apenas um
servem para atingir o objetivo a que se propõem. Por governante), ou pode ser formado por alguns ou
conseguinte, segundo Hobbes, é preciso que todos os muitos, por exemplo, por uma assembléia, O
homens deleguem a um único homem (ou a uma importante é que, uma vez instituído, o Estado não
assembléia) o poder de representá-los. pode ser contestado: é absoluto.
Mas note-se bem um pormenor: esse “pacto Além disso, Hobbes parte da constatação de
social” não é firmado pelos súditos com o soberano, que as disputas entre rei e parlamento inglês teriam
mas sim pelos súditos entre si. (Totalmente diferente seria levado à guerra civil, o que o faz concluir que o poder
o pacto social de que falará Rousseau). do soberano deve ser indivisível.
O soberano permanece fora do pacto, restando Cabe ao soberano julgar sobre o bem e o mal,
como o único depositário das renuncias dos direitos dos sobre o justo e o injusto; ninguém pode discordar, pois
súditos e, portanto, único a manter todos os direitos tudo o que o soberano faz é resultado do investimento
originários. Se também o soberano entrasse no acordo, da autoridade consentida pelo súdito.
não se eliminariam as guerras civis, porque nasceriam Em resumo, o homem abdica da liberdade
contrastes diversos na gestão do poder. O poder do dando plenos poderes ao Estado absoluto a fim de
soberano (ou da assembléia) é indivisível e proteger a sua própria vida. Além disso, o Estado deve
absoluto. garantir que o que é meu me pertença exclusivamente,
Para Hobbes, o poder do soberano deve ser garantindo o sistema da propriedade individual. Aliás,
absoluto, isto é, ilimitado. Essa é a natureza do poder para Hobbes, a propriedade privada não existia no
legítimo resultante do consenso. estado de natureza, onde todos têm direito a tudo e na
A transmissão do poder dos indivíduos ao verdade ninguém tem direito a nada.
soberano deve ser total, caso contrário, um pouco que O poder do Estado se exerce pela força, pois só
seja conservado da liberdade natural do homem, a iminência do castigo pode atemorizar os homens. "Os
instaura-se de novo a guerra. E se não há limites para a pactos sem a espada (sword) não são mais que palavras
ação do governante, não é sequer possível ao súdito (words)."
julgar se o soberano é justo ou injusto, tirano ou não, Investido de poder, o soberano não pode ser
pois é contraditório dizer que o governante abusa do destituído, punido ou morto. Tem o poder de
poder: não há abuso quando o poder é ilimitado! prescrever as leis, escolher os conselheiros, julgar, fazer
Essa é a mais radical teorização do Estado a guerra e a paz, recompensar e punir. Hobbes
absolutista, deduzida não do “direito divino” (como preconiza ainda a censura, já que o soberano é juiz das
ocorrera no passado), e sim do “pacto social” que opiniões e doutrinas contrárias à paz.
descrevemos. E quando, afinal, o próprio Hobbes pergunta se
Como o soberano não participa do pacto, uma não é muito miserável a condição de súdito diante de
vez recebidos em suas mãos todos os direitos dos tantas restrições, conclui que nada se compara à
cidadãos, ele os detém irrevogavelmente. Ele está acima da condição dissoluta de homens sem senhor ou às
justiça (porque a terceira regra, como as outras, vale misérias que acompanham a guerra civil.
para os cidadãos, mas não para o soberano). Ele Hobbes usa a figura bíblica do Leviatã, animal
também pode interferir em matéria de opiniões, julgar, monstruoso e cruel, mas que de certa forma defende os
aprovar ou proibir determinadas ideias. Todos os peixes menores de serem engolidos pelos mais fortes.
poderes devem se concentrar em suas mãos. No desenho, seu corpo é constituído de inúmeras
A própria Igreja deve-se sujeitar a ele. O Estado, cabeças e ele empunha os símbolos dos dois poderes, o
portanto, também pode interferir em matéria de civil e o religioso.
religião. E, como Hobbes crê na revelação divina e, Perceba que o homem só consegue viver em
portanto, na Bíblia, o Estado que ele concebe, em sua sociedade, para Hobbes, quando cria o Estado.
opinião, também deverá ser árbitro em matéria de Portanto, diferentemente dos gregos que viviam numa
interpretação das Escrituras e de dogmática religiosa, instituição que era o reflexo do seu instinto natural de
impedindo dessa forma todo motivo de discórdia. sociabilidade (pólis), o Estado é um ente criado
O absolutismo desse Estado é verdadeiramente artificialmente para que os homens consigam viver em
total. sociedade.
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corporeísta, contra suas próprias intenções e


afirmações, se levada as extremas consequências,
acabava por levar à negação de Deus ou, pelo menos,
tornar sua existência problemática.
O ponto culminante das várias dificuldades do
pensamento de Hobbes consiste em ter tomado a
ciência (geometria e física) como modelo a ser imitado
em filosofia.
Acontece que os métodos das ciências
matemáticas e naturais não podem ser transferidos para
a filosofia sem provocar drásticas reduções, que geram
uma série de aporias indesejáveis, como, em parte, já
havia ocorrido com Descartes, e como acontecerá com
Kant de modo paradigmático.
Contudo, é precisamente essa a marca que
caracteriza grande parte da filosofia moderna, por
influência da revolução cientifica galileana.

Uma interpretação

Embora Hobbes defenda o Estado absoluto, e


(Gravura) Frontispício da edição de 1651 de Leviatã. sob esse aspecto esteja distante dos interesses da
burguesia que aspira ao poder e luta contra o
A sociabilidade humana é algo criado e não natural. absolutismo dos reis, é possível descobrir no
A função principal do estado, portanto, é pensamento hobbesiano alguns elementos que
garantir a vida e a segurança de seus cidadãos. Quando denotam os interesses burgueses.
ele não consegue garantir tais direitos a um indivíduo, a Por exemplo, a doutrina do direito natural do
subordinação acaba, mas somente entre o estado e homem é uma arma apropriada para ser utilizada contra
aquele cidadão em específico. os direitos tradicionais da classe dominante, ou seja, a
nobreza. Da mesma forma, a defesa da
O leviatã representatividade baseada no consenso significa a
aspiração de que o poder não seja privilégio de classe.
Na Bíblia, o livro de Jó (caps. 40-41) descreve o Além disso, o Estado surge de um contrato, o que
“Leviatã” (que, literalmente, significa "crocodilo") revela o caráter mercantil, comercial, das relações
como monstro invencível. sociais burguesas.
Hobbes adota o nome “Leviatã” para designar O contrato surge a partir de uma visão
o Estado e também como título simbólico da obra que individualista do homem, pois, de acordo com essa
sintetiza todo o seu pensamento. Mas, ao mesmo concepção, o indivíduo preexiste ao Estado (se não
tempo, ele também o designa como “deus mortal”, cronológica, pelo menos logicamente), e o pacto visa
porque a ele (abaixo do Deus imortal) devemos a paz e garantir os interesses dos indivíduos, sua conservação e
a defesa de nossa vida. sua propriedade.
Mas a dupla denominação é extremamente Se no estado de natureza “não há propriedade,
significativa: o Estado absolutista por ele concebido é nem domínio, nem distinção entre o meu e o teu”, no
verdadeiramente metade monstro e metade deus mortal. Estado de soberania perfeita a liberdade dos súditos
Hobbes foi acusado de ter escrito o Leviatã para está naquelas coisas que o soberano permitiu, "como a
granjear as simpatias de Cromwell, legitimando liberdade de comprar e vender, ou de outro modo
teoricamente sua ditadura, para poder assim voltar a sua realizar contratos mútuos; de cada um escolher sua
pátria. Mas essa acusação é largamente infundada, residência, sua alimentação, sua profissão, e instruir
porque as raízes da construção política do nosso seus filhos conforme achar melhor, e coisas
filosofo estão nas mesmas premissas do corporeísmo semelhantes". Portanto, o Estado se reduz à garantia do
ontológico, que nega a dimensão espiritual e, portanto, conjunto dos interesses particulares.
a liberdade e os valores morais objetivos e absolutos, Nessa linha de raciocínio, o contrato surge
bem como no seu “convencionalismo” lógico. como decorrência da atribuição de uma qualidade
Hobbes também foi acusado de ateísmo. Mas possessiva ao homem que, por natureza, tem medo da
certamente não era ateu. Metade do seu Leviatã se ocupa morte, anseia pelo viver confortável e pela segurança e
de temas nos quais a religião e o cristianismo estão em é movido pelo instinto de posse e desejo de
primeiro plano. No entanto, é verdade que sua posição acumulação.
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A qualidade possessiva do individualismo do O objetivo da punição para as infrações aos


século XVII se encontra na sua concepção do indivíduo direitos deve ser corretivo: não se pune quem errou
como sendo essencialmente o proprietário de sua porque errou, mas para que não erre mais (no futuro).
própria pessoa e de suas próprias capacidades, nada E a punição deve ser, ao mesmo tempo, proporcional
devendo à sociedade por elas. (...) A sociedade torna-se tanto à natureza do erro como à conveniência e à
uma porção de indivíduos livres e iguais, relacionados utilidade que se pretende tirar da própria punição.
entre si como proprietários de suas próprias
capacidades e do que adquiriram mediante a prática QUESTÕES
dessas capacidades. A sociedade consiste de relações de
troca entre proprietários. A sociedade política torna -se 1. “...o príncipe, que trabalha para o seu Estado,
um artifício calculado para a proteção dessa trabalha para os seus filhos, e o amor que tem pelo seu
propriedade e para a manutenção de um ordeiro reino, confundindo com o que tem pela sua família,
relacionamento de trocas
torna-se-lhe natural... O rei vê de mais longe e de mais
Como vemos, mesmo que Hobbes defenda o
Estado absoluto, já são perceptíveis em seu discurso alto; deve acreditar-se que ele vê melhor...”
alguns dos elementos que marcarão o pensamento (BOSSUET, Jacques de. Política tirada da sagrada escritura. Livro
II, 10ª proposição e Livro VI, artigo 1º)
burguês e liberal daí em diante: o individualismo, a
garantia da propriedade e a preservação da paz e
segurança indispensáveis para os negócios. O trecho anterior se refere ao absolutismo monárquico,
que se constituiu no próprio modelo dos regimes
HUGO GROTIUS políticos dos Estados europeus do antigo regime.
Entre os séculos XVI e Apresentou variáveis locais conforme se expandia na
XVII formou-se e se consolidou Europa, entre os séculos XVI e XVIII. Entretanto,
a teoria do direito natural,
sobretudo, por obra do podemos identificar no absolutismo monárquico
holandês Hugo Grotius (1583- características comuns que o distinguiam, dentre as
1645) no escrito O direito da quais destacamos corretamente a (s)
guerra e da paz de 1625. A) unificações de diversas atribuições de Estado e de
Ainda se podem sentir as governo na figura dos monarcas, tais como a
raízes humanistas de Grotius, prerrogativa de legislar e a administração da justiça real.
mas ele já está encaminhado na
B) substituição de um tipo de administração baseada na
estrada que levará ao moderno
racionalismo, ainda que só a tenha percorrido em parte. distribuição de privilégios e concessões régias por uma
Os fundamentos da convivência dos homens organização burocrática profissional que atuava em
são a razão e a natureza, que coincidem entre si. O atividades desvinculadas do Estado.
“direito natural”, que regula a convivência humana, C) implementação de práticas econômicas liberais
possui esse fundamento racional-natural. como forma de consolidar a aliança política e
Todavia, notemos a consistência ontológica que econômica dos reis absolutos com as burguesias
Grotius dá ao direito natural, este se revela tão estável e
nacionais.
alicerçado que o próprio Deus não poderia mudá-lo.
Isso significa que o direito natural reflete a D) submissão política dos governos reais absolutistas à
racionalidade, que é o próprio critério com que Deus hierarquia eclesiástica, conforme definido pela doutrina
criou o mundo e que, como tal, Deus não poderia do Direito Divino dos Reis.
alterar, a não ser se contradizendo, o que é impensável. E) definição da autoridade dos monarcas absolutos e
Diferente do direito natural é o "direito civil", seus limites de poder, através da atuação dos
que depende das decisões dos homens, e que é parlamentos nacionais constitucionalistas, controlados
promulgado pelo poder civil. Este tem como objetivo a
utilidade e é sustentado pelo consentimento dos por segmentos burgueses.
cidadãos.
A vida, a dignidade da pessoa e a propriedade 2. (...) O trono real não é o trono de um homem, mas o
pertencem ao âmbito dos direitos naturais. trono do próprio Deus. Os reis são deuses e participam
O direito internacional baseia-se na identidade de alguma maneira da independência divina. O rei vê de
de natureza entre os homens. Portanto, os tratados mais longe e de mais alto; deve-se acreditar que ele vê
internacionais têm valor mesmo quando estipulados melhor, e deve obedecer-se-lhe sem murmurar, pois o
por homens de confissões diferentes, já que o fato de murmúrio é uma disposição para a sedição.
pertencer a fés diversas não modifica a natureza (Jacques Bossuet (1627-1704), Política tirada da Sagrada Escritura)
humana.
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Com base no texto, assinale a alternativa correta. a um único soberano para subtrair-se ao medo da morte
a) O autor critica o absolutismo do rei e afirma que seu e, por sua vez, garantir a autopreservação.
poder e autoridade tem limites em relação aos homens. e) Segundo Hobbes, à propensão natural dos homens a
b) Para Bossuet, o poder real é um poder divino e não
se ferirem uns aos outros se soma o direito de todos a
admite nenhum tipo de oposição dos homens. Rebelar-
se contra o Rei é rebelar-se contra Deus. tudo, resultando, pela igualdade natural, em uma guerra
c) Os princípios de Bossuet defendem que os homens perpétua de todos contra todos.
tem mais poderes divinos do que o próprio Rei.
e) O autor reconhece o direito humano de revolta 4. (UFU 2010) Segundo Thomas Hobbes, o estado de
contra o Rei que não se mostre digno de sua função. natureza é caracterizado pela “guerra de todos contra
todos”, porque, não havendo nenhuma regra ou limite,
3. (UEL 2009) A maior parte daqueles que escreveram todos têm direito a tudo o que significa que ninguém
alguma coisa a propósito das repúblicas o supõe, ou nos terá segurança de seus bens e de sua vida. A saída desta
pede ou requer que acreditemos que o homem é uma situação é o pacto ou contrato social, “uma
transferência mútua de direitos”.
criatura que nasce apta para a sociedade. Os gregos HOBBES, T. Leviatã. Coleção Os Pensadores. Trad. João P. Monteiro e Maria B. N.
da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1988, p. 78-80.
chamam-no zoon politikon: e sobre este alicerce eles
Com base nestas informações e nos seus
erigem a doutrina da sociedade civil [...] aqueles que
conhecimentos sobre a obra de Hobbes, assinale a
perscrutarem com maior precisão as causas pelas quais alternativa que caracteriza o pacto social.
os homens se reúnem, e se deleitam uns na companhia A) Pelo pacto social, cria-se o Estado, que continua
dos outros, facilmente hão de notar que isto não sendo uma mera reunião de indivíduos somente com
acontece porque naturalmente não poderia suceder de laços de sangue.
outro modo, mas por acidente. B) Pelo pacto social, a multidão de indivíduos passa a
[...] constituir um corpo político, uma pessoa artificial: o
Estado.
Toda associação [...] ou é para o ganho ou para a C) Pelo pacto social, cria-se o Estado, mas os indivíduos
glória — isto é, não tanto para o amor de nossos que o compõem continuam senhores de sua liberdade
próximos quanto pelo amor de nós mesmos. [...] se e de suas propriedades.
fosse removido todo o medo, a natureza humana D) O pacto social pressupõe que o Estado deverá
tenderia com muito mais avidez à dominação do que garantir a segurança dos cidadãos, mas em nenhum
construir uma sociedade. Devemos, portanto, concluir momento fará uso da força pública para isso.
que a origem de todas as grandes e duradouras
5. (UFU 2009) Leia o texto abaixo e assinale a
sociedades não provém da boa vontade recíproca que alternativa correta.
os homens tivessem uns para com os outros, mas do “É evidente que, durante o tempo em que os homens
medo recíproco que uns tinham dos outros. vivem sem um poder comum que os mantenha
(HOBBES, T. Do Cidadão. São Paulo: Martins Fontes, 1992. p subjugados, eles se encontram naquela condição que é
28-29; 31-32.) chamada de guerra; e essa guerra é uma guerra de cada
Com base no texto e nos conhecimentos sobre o homem contra cada outro homem.”
Hobbes in BOBBIO, Norberto. Thomas Hobbes. Rio de Janeiro: Ed. Campus,
pensamento político hobbesiano, é correto afirmar. 1991. p. 35.
a) Hobbes reafirma o postulado aristotélico de que os A) Para Hobbes, a guerra é uma situação anterior ao
homens tendem naturalmente à vida em sociedade, mas estado de natureza.
que, obcecados pelas paixões, decaíram num estado B) Em Hobbes, a guerra de todos contra todos é
generalizado de guerra de todos contra todos. compatível com um poder comum.
C) Um poder comum, segundo Hobbes, mantém os
b) O estado de guerra generalizada entre os homens
homens no estado de natureza.
emerge, segundo Hobbes, da desigualdade promovida
D) Hobbes associa, em suas reflexões, a situação de
pela lei civil e pelo desejo de poder de uns sobre os
guerra e o estado de natureza.
outros.
c) A ideia de que o estado de guerra generalizada ocorre
6. (UFU 2013) Porque as leis de natureza (como a
com o desaparecimento do estado de natureza, onde justiça, a equidade, a modéstia, a piedade, ou, em
todos os homens vivem em harmonia, constitui o resumo, fazer aos outros o que queremos que nos
fundamento da teoria política de Hobbes. façam) por si mesmas, na ausência do temor de algum
d) Segundo Hobbes, para restaurar a paz que existia no poder capaz de levá-las a ser respeitadas, são contrárias
estado de natureza, os homens sujeitam-se, pelo pacto, a nossas paixões naturais, as quais nos fazem tender

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para a parcialidade, o orgulho, a vingança e coisas 8. (UFU 2011) Com base em seus conhecimentos e no
semelhantes. texto abaixo, assinale a alternativa correta, segundo
HOBBES, Thomas. Leviatã. Cap. XVII. Tradução de João Paulo Monteiro e Hobbes.
Maria Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1988, p. 103.
Em relação ao papel do Estado, Hobbes considera que:
A) O seu poder deve ser parcial. O soberano que nasce [...] a condição dos homens fora da sociedade civil
com o advento do contrato social deve assiná-lo, para (condição esta que podemos adequadamente chamar de
submeter-se aos compromissos ali firmados. estado de natureza) nada mais é do que uma simples
B) A condição natural do homem é de guerra de todos guerra de todos contra todos na qual todos os homens
contra todos. Resolver tal condição é possível apenas têm igual direito a todas as coisas; [...] e que todos os
com um poder estatal pleno. homens, tão cedo chegam a compreender essa odiosa
C) Os homens são, por natureza, desiguais. Por isso, a condição, desejam [...] libertar-se de tal miséria.
HOBBES, Thomas, Do Cidadão, Ed. Martins Fontes, 1992.
criação do Estado deve servir como instrumento de A) O estado de natureza não se confunde com o estado
realização da isonomia entre tais homens. de guerra, pois este é apenas circunstancial ao passo que
D) A guerra de todos contra todos surge com o Estado o estado de natureza é uma condição da existência
repressor. O homem não deve se submeter de bom humana.
grado à violência estatal. B) A condição de miséria a que se refere o texto é o
estado de natureza ou, tal como se pode compreender,
7. (UFU 2011) O desenvolvimento das ciências o estado de guerra.
naturais na era moderna influenciou a corrente C) O direito dos homens a todas as coisas não tem
filosófica denominada empirismo que tem por como consequência necessária a guerra de todos contra
característica fundamental a ênfase do papel da todos.
experiência sensível no conhecimento. Dentre os D) A origem do poder nada tem a ver com as noções
representantes do empirismo inglês podemos destacar, de estado de guerra e estado de natureza.
entre outros nomes, Thomas Hobbes, John Locke e
David Hume. 9. (UFU 2012) [...] a condição dos homens fora da
Hobbes, apesar de receber também outras sociedade civil (condição esta que podemos
influências filosóficas como o nominalismo, é adequadamente chamar de estado de natureza) nada
influenciado pelas ideias empiristas, tanto que a mais é do que uma simples guerra de todos contra todos
primeira parte de seu livro O Leviatã ou Forma e na qual todos os homens têm igual direito a todas as
matéria do Estado é composta por uma teoria do coisas; [...].
conhecimento baseada nas ideias desta corrente. Um HOBBES, Thomas. Do Cidadão. Campinas: Martins Fontes, 1992.
dos resultados desta influência é a concepção de pacto De acordo com o trecho acima e com o pensamento de
social: para Hobbes, observando o comportamento dos Hobbes, assinale a alternativa correta.
homens podemos conhecer sua natureza, assim, A) Segundo Hobbes, o estado de natureza se confunde
conclui: os pactos sem a espada não passam de palavras. com o estado de guerra, pois ambos são uma condição
original da existência humana.
Com base no texto acima e em seus conhecimentos B) Para Hobbes, o direito dos homens a todas as coisas
sobre a filosofia hobbesiana, assinale a alternativa que está desvinculado da guerra de todos contra todos.
descreve o significado da expressão: os pactos sem a C) Segundo Hobbes, é necessário que a condição
espada não passam de palavras. humana seja analisada sempre como se os homens
vivessem em sociedade.
A) O poder do Estado deriva da natureza humana: uma D) Segundo Hobbes, não há vínculo entre o estado de
vez que os homens concordem em obedecer a lei, natureza e a sociedade civil.
cumprirão integralmente a palavra dada.
B) O poder do Estado se consolida com o uso 10. (UFU 2015) A maior parte daqueles que escreveram
simbólico da espada no poder legislativo; a expressão alguma coisa a propósito das repúblicas ou supõe, ou
palavras representa a lei. nos pede, ou requer que acreditemos que o homem é
C) A única forma de os homens cumprirem suas uma criatura que nasce apta para a sociedade.
promessas é pelo medo da punição caso fujam do HOBBES, T. Do Cidadão. Tradução de Renato Janine Ribeiro.
compromisso de manter a palavra dada. São Paulo: Martins FontES, 2002 . P.25.
D) A frase de Hobbes aplica-se somente ao estado de Hobbes refutava a pretensa sociabilidade natural do
natureza, sendo desnecessário o uso da força no estado homem. Assinale a alternativa que, segundo Hobbes,
civil, depois do Estado constituído. justifica a associação dos homens em uma comunidade
política.
A) O sentimento de igualdade garante o convívio
humano, portanto, essa certeza atesta a inexistência do

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medo no estado de natureza e revela que a diz que lhe pertencem. Mesmo o Vietnã desconfia mais
camaradagem é o alicerce da sociedade civil. da China do que dos Estados Unidos. As autoridades
B) O pacto social confirma a ideia inatista da de Hanói gostam de lembrar que o gigante americano
sociabilidade humana, os afetos que estão em cada
invadiu o México uma vez. O gigante chinês invadiu o
indivíduo e os impelem à vida em comunidade,
independentemente das vantagens que esse modo de Vietnã dezessete.
André Petry. O Século do Pacífico. Veja, 24.04.2013. Adaptado.
vida acarreta.
C) O amor é o sentimento que une os homens, pois A persistência histórica dos conflitos geopolíticos
nisso consiste a verdadeira igualdade entre os homens, descritos na reportagem pode ser filosoficamente
e a comunidade política se origina desse laço afetivo compreendida pela teoria
capaz de materializar o pacto social. a) iluminista, que preconiza a possibilidade de um
D) O homem não é naturalmente levado a viver em estado de emancipação racional da humanidade.
sociedade, a ordem civil é acidental, a união não é
b) maquiavélica, que postula o encontro da virtude com
movida pela busca de companhia, mas pelo proveito
que essa união poderá proporcionar. a fortuna como princípios básicos da geopolítica.
c) política de Rousseau, para quem a submissão à
11. (UEL 2008) Para Hobbes, vontade geral é condição para experiências de
[...] o poder soberano, quer resida num homem, liberdade.
como numa monarquia, quer numa assembleia, como d) teológica de Santo Agostinho, que considera que o
nos estados populares e aristocráticos, é o maior que é processo de iluminação divina afasta os homens do
possível imaginar que os homens possam criar. E, pecado.
embora seja possível imaginar muitas más e) política de Hobbes, que conceitua a competição e a
consequências de um poder tão ilimitado, apesar disso desconfiança como condições básicas da natureza
as consequências da falta dele, isto é, a guerra perpétua humana.
de todos homens com os seus vizinhos, são muito
piores. 13. (ENEM 2012)
(HOBBES, T. Leviatã. Tradução de João Paulo Monteiro e Maria
Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1988. capítulo
XX, p. 127.)
Com base na citação e nos conhecimentos sobre a
filosofia política de Hobbes, assinale a alternativa
correta.
a) Os Estados populares se equiparam ao estado
natural, pois neles reinam as confusões das
assembleias.
b) Nos Estados aristocráticos, o poder é limitado
devido à ausência de um monarca.
c) O poder soberano traz más consequências, Na França, o rei Luís XIV teve sua imagem fabricada
justificando-se assim a resistência dos súditos. por um conjunto de estratégias que visavam sedimentar
d) As vantagens do estado civil são expressivamente uma determinada noção de soberania. Neste sentido, a
charge apresentada demonstra
superiores às imagináveis vantagens de um estado de
A) a humanidade do rei, pois retrata um homem
natureza. comum, sem os adornos próprios à vestimenta real.
e) As consequências do poder soberano são B) a unidade entre o público e o privado, pois a figura
indesejáveis, pois é possível a sociabilidade sem do rei com a vestimenta real representa o público e sem
Estado. a vestimenta real, o privado.
C) o vínculo entre monarquia e povo, pois leva ao
12. A China é a segunda maior economia do mundo. conhecimento do público a figura de um rei
despretensioso e distante do poder político.
Quer garantir a hegemonia no seu quintal, como
D) o gosto estético refinado do rei, pois evidencia a
fizeram os Estados Unidos no Caribe depois da guerra elegância dos trajes reais em relação aos de outros
civil. As Filipinas temem por um atol de rochas membros da corte.
desabitado que disputam com a China. O Japão está de
plantão por umas ilhotas de pedra e vento, que a China

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E) a importância da vestimenta para a constituição maioria o direito de representar a pessoa de todos eles
simbólica do rei, pois o corpo político adornado (ou seja, de ser seu representante), todos sem exceção,
esconde os defeitos do corpo pessoal. tanto os que votaram a favor dele como os que votaram
contra ele, deverão autorizar todos os atos e decisões
14. (ENEM 2012) desse homem ou assembléia de homens, tal como se
Que é ilegal a faculdade que se atribui à fossem seus próprios atos e decisões, a fim de viverem
autoridade real para suspender as leis ou seu em paz uns com os outros e serem protegidos dos
cumprimento. restantes homens. É desta instituição do Estado que
Que é ilegal toda cobrança de impostos para a derivam todos os direitos e faculdades daquele ou
Coroa sem o concurso do Parlamento, sob pretexto de daqueles a quem o poder soberano é conferido
prerrogativa, ou em época e modo diferentes dos mediante o consentimento do povo reunido”
designados por ele próprio. HOBBES. Leviatã. Cap. XVIII.
Que é indispensável convocar com frequência Considerando as duas passagens da obra O Leviatã, é
os Parlamentos para satisfazer os agravos, assim como CORRETO afirmar.
para corrigir, afirmar e conservar leis. A) Os homens já nascem em sociedade onde vivem de
modo harmonioso, na medida em que cooperam uns
Declaração de Direitos. Disponível em: http://disciplinas.stoa.usp.br.
Acesso em: 20 dez. 2011 (adaptado). em relação aos outros.
No documento de 1689, identifica-se uma B) Os homens vivem em estado de natureza e é preciso
particularidade da Inglaterra diante dos demais Estados estabelecer um pacto social para a formação do Estado.
europeus na Época Moderna. A peculiaridade inglesa e C) O estado de natureza é um estado pacífico, em que
o regime político que predominavam na Europa reina a harmonia entre os homens e nenhum deles está
continental estão indicados, respectivamente, em: preocupado com aquilo que é do outro.
a) Redução da influência do papa - Teocracia. D) Para ascender ao Estado civil, é necessária a
b) Limitação do poder do soberano - Absolutismo. constituição de um partido revolucionário que se
c) Ampliação da dominação da nobreza - República. oponha à exploração que é própria das sociedades
d) Expansão da força do presidente - Parlamentarismo. capitalistas.
e) Restrição da competência do congresso - E) O estado de natureza, conforme o caracteriza
Presidencialismo. Hobbes, é marcado pelo medo do Leviatã.

15. (ENEM 2015) A natureza fez os homens tão iguais, 17. (UEL 2010) [...] Os homens não podem esperar
quanto às faculdades do corpo e do espírito, que, uma conservação duradoura se continuarem no estado
embora por vezes se encontre um homem de natureza, ou seja, de guerra, e isso devido à igualdade
manifestadamente mais forte de corpo, ou de espírito de poder que entre eles há, e a outras faculdades com
mais vivo do que outro, mesmo assim, quando se que estão dotados. A lei da natureza primeira, e
considera tudo isto em conjunto, a diferença entre um fundamental, é que devemos procurar a paz, quando
e outro homem não é suficientemente considerável para possa ser encontrada [...]. Uma das leis naturais inferidas
que um deles possa com base nela reclamar algum desta primeira e fundamental é a seguinte: que os
benefício a que outro não possa igualmente aspirar. homens não devem conservar o direito que têm, todos,
HOBBES. T. Leviatã. São Paulo: Martins Fontes, 2003. a todas as coisas.
Para Hobbes, antes da constituição da sociedade civil, (HOBBES, T. Do Cidadão. São Paulo: Martins Fontes, 1992, pp.
quando dois homens desejavam o mesmo objeto, eles 40 - 41; 45 - 46).
a) entravam em conflito. [...] aquele que submete sua vontade à vontade outrem
b) recorriam aos clérigos. transfere a este último o direito sobre sua força e suas
c) consultavam os anciãos. faculdades - de tal modo que, quando todos os outros
d) apelavam aos governantes. tiverem feito o mesmo, aquele a quem se submeteram
e) exerciam a solidariedade. terá tanto poder que, pelo terror que este suscita, poderá
conformar as vontades particulares à unidade e à
16. (UNIOESTE 2016) “(...) Durante o tempo em que concórdia. [...] A união assim feita diz-se uma cidade,
os homens vivem sem um poder comum capaz de os ou uma sociedade civil.
manter a todos em respeito, eles se encontram naquela (HOBBES, T. Do Cidadão. São Paulo: Martins Fontes, p. 1992, p.
109).
condição a que se chama guerra; e uma guerra que é de Para os jusnaturalistas o problema da legitimidade do
todos os homens contra todos os homens” poder político comporta uma questão de fato e uma
HOBBES. Leviatã. Cap. XIII.
“Diz-se que um Estado foi instituído quando uma questão de direito, isto é, o problema da instituição da
multidão de homens concordam e pactuam, cada um sociedade civil e o problema do fundamento da
com cada um dos outros, que a qualquer homem ou autoridade política. Com base nos textos e nos
assembléia de homens a quem seja atribuído pela

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conhecimentos sobre o pensamento jusnaturalista de daqueles que com ele administram o pacto, criado e
Hobbes, considere as afirmativas a seguir: mantido pelo consentimento.
I. A instituição da sociedade civil fundamenta-se na c) da criação de magistraturas que nascem os direitos e
sociabilidade natural do ser humano, pela qual os
os deveres do soberano, sustentados pelo pacto
indivíduos hipoteticamente livres e iguais decidem
submeter-se à autoridade comum de um só homem ou alcançado por uma vontade geral.
de uma assembléia. d) da instituição do Estado que derivam todos os
II. Além do pacto de associação para união de todos em direitos e faculdades daquele ou daquelas a quem o
um só corpo, é preciso que ao mesmo tempo se poder soberano é conferido mediante o consentimento
estabeleça o pacto de submissão de todos a um poder do povo reunido.
comum para a preservação da segurança e da paz civil.
III. A soberania do povo encontra sua origem e seus
20. Que seja portanto ele a considerar-se a si mesmo,
princípios fundamentais no ato do contrato social
constituído pelas vontades particulares dos indivíduos a que quando empreende uma viagem se arma e procura
fim de edificar uma vontade geral indivisível e ir bem acompanhado; que quando vai dormir fecha suas
inalienável. portas; que mesmo quando está em casa tranca seus
IV. O estado de guerra decorre em última instância da cofres; e isso mesmo sabendo que existem leis e
necessidade fundamental dos homens, naturalmente funcionários públicos armados, prontos a vingar
iguais entre si, por sua preservação que faz com que qualquer injúria que lhe possa ser feita.
cada um tenha direito a tudo. (HOBBES. Leviatã. Trad. J. P. Monteiro e M. B. N. da Silva. São
Assinale a alternativa correta. Paulo: Abril Cultural, 1974. p. 80.)
a) Somente as afirmativas I e IV são corretas.
O texto de Hobbes diverge de uma ideia central da
b) Somente as afirmativas II e III são corretas.
c) Somente as afirmativas II e IV são corretas. filosofia política de Aristóteles. Assinale a alternativa
d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. que identifica essa ideia aristotélica.
e) Somente as afirmativas I, III e IV são corretas. a) É inerente à condição humana viver segundo as
condições adversas do estado de natureza.
18. (UFSJ 2013) Thomas Hobbes afirma que “Lei b) A sociabilidade se configura como natural aos seres
Civil”, para todo súdito, é humanos.
a) “construída por aquelas regras que o Estado lhe c) Os homens, no estado civil, perdem a bondade
impõe, oralmente ou por escrito, ou por outro sinal originária do homem natural.
suficiente de sua vontade, para usar como critério de d) A insociável sociabilidade é característica imanente
distinção entre o bem e o mal”. às ações humanas.
b) “a lei que o deixa livre para caminhar para qualquer e) O Estado é incapaz de prover a segurança dos
direção, pois há um conjunto de leis naturais que súditos.
estabelece os limites para uma vida em sociedade”.
c) “reguladora e protetora dos direitos humanos, e faz
intervenção na ordem social para legitimar as relações
externas da vida do homem em sociedade”.
d) “calcada na arbitrariedade individual, em que as
pessoas buscam entrar num Estado Civil, em
consonância com o direito natural, no qual ele – o
súdito – tem direito sobre a sua vida, a sua liberdade e
os seus bens”.

19. (UFSJ 2010) Em Hobbes, é CORRETO afirmar


que derivação dos direitos do soberano por instituição,
é
a) do poder das assembleias democráticas de caráter
participativo popular que nasce o poder do soberano,
dado que seus participantes são obrigados pelo pacto a
reconhecer a legitimidade do Estado absolutista.
b) por meio da instituição do Parlamento, que deriva
todo o poder do soberano, bem como todas as funções
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GABARITO 3. e
4. b
QUESTÕES RENASCIMENTO 5. d
1. b 6. b
2. a 7. c
3. d 8. b
4. 1/8 9. a
10. d
QUESTÕES GALILEU 11. d
1. d 12. e
2. a 13. e
3. d 14. b
4. c 15. a
5. d 16. b
6. e 17. c
18. a
QUESTÕES MAQUIAVEL 19. d
20. b
1. a
2. c
3. d
4. b
5. b
6. b
7. e
8. d
9. a
10. 2/8/16
11. 8/16
12. 2/4
13. e
14. c
15. c

FORMAÇÃO DO ESTADO

1. a
2. b

34

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