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Bonomo, Mariana, Souza, Lídio de, Epifanio, Paola Zanotti, & Trindade, Zeidi Araujo. (2017). Social
Representations and Rural Sociability Among Farmers of a Rural Community. Psico-USF, Vol. 22(2), 235-
248. Consultado em Outubro, 21, 2019, em https://dx.doi.org/10.1590/1413-82712017220204
Objetivos de estudo
Ao considerar o rural como fenômeno psicossocial, o objetivo do estudo foi investigar as representações
sociais dos indivíduos de uma comunidade rural no Espírito Santo (Brasil) num contexto comunitário, o
que significou, neste estudo, práticas de atividades integrativas, senso de pertencimento e existência de
laços sociais entre os membros (p. 236). A partir da perspectiva de que o pensamento hegemônico tem
uma representação negativa do que é ser rural, os investigadores buscaram compreender como uma
comunidade desenvolve suas próprias representações sociais, o que é para seus membros ser “uma
pessoa rural".
Metodologia
A pesquisa foi conduzida numa comunidade de agricultores familiares específica, como estratégia para
investigar as representações sociais num contexto comunitário e intergeracional, o que favorece a análise
dos processos de identificação representacional e social, segundo os autores. Eles salientam que
"comunidade", no trabalho realizado, implica atividades de integração, vínculos e pertencimento.
A Teoria das Representações Sociais, de Moscovici, é o suporte teórico e metodológico chave do estudo,
por compreender, entre outras coisas, que o modo como se define a realidade e se interpreta o mundo,
produz e reproduz representações. Das três grandes abordagens geradas por esta teoria – cultural,
estrutural e social – a última (da Escola de Genebra) foi o referencial principal da investigação, com
enfoques sociológicos nas análises, pois coloca a integração social (indivíduo conectado ao coletivo e
como nele opera) como origem das variações nas representações sociais. O modelo escolhido pelos
autores inspira-se em Doise, 2002; Clémence, Doise e Lorenzi-Cioldi, 1994, com 3 hipóteses para cada
etapa da análise: 1) crenças compartilhadas; 2) diferenças de posicionamento quanto a um objeto; 3)
representações pelas ancoragens de posicionamento (psicológica, social e psicossocial)1.
As hipóteses levantadas para esta pesquisa em questão foram: "(a) um campo representacional
compartilhado que inclui os dois elementos presentes nas representações sociais hegemônicas da
ruralidade e os significados que sustentam a identidade rural para guiar o processo de identificação nas
diferentes gerações da comunidade; (b) organização de princípios baseados no universo temático da
sociabilidade rural, guiados pela relação com a natureza, modo de produção agrícola, valores
comunitários e elementos de comparação campo-cidade; (c) processos de ancoragem de pertences de
gênero e geração influenciando a modulação de diferentes representações" (p.237).
Os sujeitos da pesquisa foram 200 indivíduos entre 7 e 81 anos (34,84% da população da comunidade,
que possui 167 famílias da produção agrícola familiar), divididos em 4 gerações com 50 indivíduos cada
(25 o sexo feminino, 25 do sexo masculino). As escolas funcionam sob a pedagogia da alternância, onde
os estudantes permanecem por 1 semana na escola e por 1 semana com a família em casa, no dia a
dia da lavoura. Esta integração também favorece o estudo de representações sociais, segundo os autores.
As quatro gerações investigadas assim se distribuíram: 4ª geração, com crianças de 7 a 12 anos (média
de 9,88 anos e DP = 1,62); 3ª geração, com indivíduos jovens e solteiros, de 15 a 25 anos (M = 17,72;
1
Ancoragem psicológica: representações individuais; ancoragem social: reunião de representações sociais semelhantes
pelas experiências partilhadas; ancoragem social: elo simbólico entre o indivíduo e a sociedade em suas crenças e valores.
O senso de pertencimento é investigado a partir destas perspectivas (Bonomo et al, 2017).
DP = 2,54). Todos nascimdos na comunidade. A 2ª geração foi representada por adultos ou chefes de
família entre 35 e 45 anos (M = 39,06; DP = 2,73), casados e trabalhadores rurais. A 4ª geração
compreendeu sujeitos de 60 anos ou mais (M = 67,56; DP = 5,63). Dados de escolaridade foram
coletados, com apenas 6% cursando ensino superior (membros da 3ª geração apenas).
O uso das variáveis de gênero e geração são úteis ao modelo trifásico adotado para elaboração das
hipóteses, visto que auxilia a compreender o campo representacional de acordo com o pertencimento a
um gênero e/ou a uma geração (Bonomo et al, 2017).
O instrumento de coleta de dados foi a entrevista individual, em locais, datas e horários escolhidos pelos
entrevistados. Foram tomadas as providências quanto a ética do trabalho, por meio de termos de
consentimento para a participação em pesquisas, com assinatura dos pais nos termos das crianças. O
trabalho de campo durou 12 meses, e ocorreu em escolas, casa e plantações.
A entrevista deu-se por meio de 3 seções: a) questionamento sobre os valores do ambiente rural que o
entrevistado considera os mais importantes para a sua vida - o que permitiu identificar valores sociais
rurais; b) ideade, sexo, estado civil, educação, local de nascimento e profissão - para caracterizar as
amostras; c) evocações gratuitas (Abric, 2003; De Rosa, 2003; Doise et al, 1995), com os termos
indutores "pessoa rural" ou "rural", para identificação do campo semântico.
Para o processamento dos dados: uso da análise de conteúdo de Bardin (2002, 2003), com critério
semântico de agrupamento/distinção para limpar os dados relacionados ao objeto da pesquisa. Em
seguida, os elementos analisados foram levados ao SPAD-T que selecionou os termos na primeira
posição e suprimiu nas demais. Pela análise de correspondência fatorial e formação de agrupamentos,
identificaram os valores associados ao "rural" e "pessoas do meio rural/pessoas rurais". Foram definidas
variáveis para análise das ancoragens das representações. A descrição e a análise dos resultados se
referiu ao posicionamento dos sujeitos no campo representacional a partir do seu sentimento de pertença
nos grupos.
Conclusões
De um modo geral a vida no campo não é vista como algo ruim pelos sujeitos, apesar de não esconderem
aspectos quanto a precariedade e a pobreza. A questão em torno da relação com a cidade ainda se dá
por meio da visão pejorativa ainda propagada a respeito do morador do campo. A sociabilidade, os valores
e crenças partilhadas e as práticas são valorizadas e contribuem com a resistência da ruralidade em
tempos de urbanização acelerada e difusão global de valores hegemônicos e urbanos.
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