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Artigo de Revisão
Resumo
A ultra-sonografia é um método eficaz na avaliação de afecções agudas acometendo o sistema
músculo-esquelético, constituindo importante arma propedêutica nos serviços de atendimento de
urgência. O ultra-som permite a avaliação de ampla variedade de lesões de origem não-traumática,
tais como lesões infecciosas articulares ou extra-articulares, e a avaliação de lesões não-infeccio-
sas, tais como doenças bursais e tendíneas agudas ou agudizadas. Será apresentada breve revi-
são das principais indicações do exame ultra-sonográfico, ilustrada com casos típicos provenien-
tes de arquivo digital, sendo discutidos os achados fundamentais para a caracterização e o diag-
Descritores: nóstico das afecções não-traumáticas mais freqüentes. Todos os casos apresentados procuraram
Ultra-som; Sistema músculo-esquelético;
Artrite infecciosa; Celulite; Tendinopatia; o serviço de pronto-atendimento do nosso hospital devido a queixas agudas relacionadas ao siste-
Bursite. ma músculo-esquelético.
no atendimento de urgências. O objetivo deste trabalho Abscessos – São caracterizados por áreas de lique-
será explorar as principais indicações da US na avalia- fação com conteúdo de aspecto variável[4]. Habitualmente
ção das afecções músculo-esqueléticas agudas, ilustra- se observam paredes irregulares e septações, apresen-
das com casos típicos do cotidiano. Devido à ampla va- tando hiperemia ao Doppler[5,9] (Figs. 1C a 1E). Devido
riedade de aplicações, a discussão será dividida em duas ao conteúdo de ecogenicidade variável, não é incomum
seções. Neste número serão contempladas as lesões não- haver dúvida na caracterização do componente lique-
traumáticas agudas. No próximo número serão discu- feito. Nestes casos, a presença de reforço acústico pos-
tidas as afecções de origem traumática e a realização de terior e a caracterização de material fluido durante a
procedimentos orientados por ultra-som. compressão (quando tolerada) podem trazer auxílio
diagnóstico[4,5].
LESÕES NÃO-TRAUMÁTICAS Osteomielite – Pode ser identificada de modo for-
Compõem as indicações mais consagradas da US. tuito[4], sendo caracterizada por irregularidades da su-
Destacam-se a avaliação de afecções infecciosas articu- perfície óssea cortical, espessamento periosteal e cole-
lares ou extra-articulares e a avaliação de lesões infla- ções (subperiosteais ou em partes moles), eventualmente
matórias não-infecciosas, tais como as bursopatias e ten- apresentando comunicação com a cavidade medular
dinopatias. através de roturas corticais[5,9] (fístulas).
Piomiosite – Acomete comumente grandes grupa-
a) Lesões infecciosas mentos musculares dos membros inferiores. É caracte-
Infecção de partes moles superficiais – A celulite rizada por aumento volumétrico do ventre muscular,
é muito comum na prática hospitalar[5]. Acomete indis- hiperecogenicidade difusa (edema) e hiperemia[5] (Fig. 2).
criminadamente qualquer grupo etário, sendo facilitada Nos casos avançados se identificam focos hipoecogêni-
por fatores como estase, má higiene, lesões da pele e cos irregulares, caracterizando edema acentuado ou
imunocomprometimento. O quadro ultra-sonográfico áreas de necrose[4]. O coalescimento destes focos pode
é caracterizado por espessamento e hiperecogenicidade resultar na formação de abscessos.
de partes moles superficiais, com borramento e padrão Pioartrite – A artrite séptica é uma condição grave,
em “mosaico” do subcutâneo (Fig. 1A). Este aspecto é resultando em seqüelas limitantes quando não diagnos-
inespecífico, indistinguível do edema não-infeccioso, a ticada e tratada precocemente[4–6]. Acomete indivíduos
não ser que achados associados como aumento da vas- de todos os grupos etários, porém é mais freqüente e
cularização ou complicações infecciosas estejam presen- deletéria na faixa pediátrica. As articulações mais comu-
tes[4,5,9] (Fig. 1B). Atenção especial deve ser dedicada a mente acometidas são o quadril, joelho, ombro, cotovelo
pesquisa de condições predisponentes, extensão do aco- e tornozelo[4,5]. Qualquer paciente com sintomas infec-
metimento e presença de complicações associadas, es- ciosos, dor periarticular e derrame articular deve ser
pecialmente abscessos, fístulas viscerais e extensão a encarado com portador de pioartrite. A US é um mé-
compartimentos específicos (osteomielite, pioartrite, todo altamente sensível na detecção de derrame articu-
piomiosite, bursite ou tenossinovite supurativas)[4,5]. lar[4,6,7,10], cujo valor preditivo negativo confere ao clínico
Fig. 1 – (A) Celulite: espessamento e hiperecogenicidade da pele e do subcutâneo, com borramento e aspecto em “mosaico” da gordura, indis-
tinguível do edema por estase ou traumático. (B) Aumento da vascularização sugerindo acometimento inflamatório, associado a pequena área
de liquefação central.
Fig. 1 – (C) Celulite e abscesso: área de liquefação geográfica, com paredes irregulares e conteúdo
hipoecogênico (+...+). (D) A extensa coleção isoecogênica no dorso do pé (setas) foi identificada mais
facilmente durante a compressão dinâmica. (E) Abscesso no mento (seta), com extensão profunda,
em contato com a superfície óssea mandibular (***), sem sinais francos de osteomielite associada.
Fig. 3 – (A) Pioartrite do ombro (pós-operatório): derrame articular gleno-umeral com material particulado (**) e espessamento sinovial (seta).
(B) Pioartrite do quadril: derrame articular (**) com aumento da vascularização capsular e periarticular. (C) Derrame inflamatório no recesso
articular anterior do cotovelo (**).
Fig. 5 – (A) Tendinopatia do supra-espinhal: tendão heterogêneo, espessado e hipoecogênico, apresentando foco de descontinuidade de fibras
preenchido por líquido, caracterizando rotura parcial (seta). (B) Lesão aguda por hipersolicitação dos tendões do II compartimento sinovial
extensor do punho: distensão da bainha por líquido anecogênico, sem espessamento sinovial significativo. (C) Tenossinovite infecciosa acome-
tendo o tendão tibial anterior: distensão da bainha sinovial por líquido espesso (seta) associada a hipertrofia sinovial.
Fig. 6 – Paciente jovem, referindo dor aguda no ombro. Calcificação compacta no tendão subescapular (A) e calcificação amorfa protruindo
junto à superfície bursal do tendão supra-espinhal (B), com discreto espessamento das paredes da bursa subacromial-subdeltóidea associado.
Estes achados são compatíveis com tendinopatia calcária, provavelmente relacionada a migração ou reabsorção dos depósitos cristalinos loca-
lizados no tendão supra-espinhal. Radiografia simples (C) demonstrando facilmente a densa calcificação no subescapular (seta). A calcificação
do supra-espinhal é tênue, sendo de difícil detecção radiográfica (cabeça de seta).