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LICEO SCIENTIFICO
22/23 2 LSC A/B
PVBLIVS TERENTIVS AFER
Públio Terêncio Africano
Temos poucas informações sobre a vida de Terêncio, que derivam
de uma biografia escrita por Suetônio, no século I d.C., que nos
chegou através do gramático Élio Donato (século IV d.C.).
Terêncio nasceu no norte da África, provavelmente em Cartago,
por volta do ano 185 a.C. Em circunstâncias obscuras, ele foi
levado a Roma na condição de escravo do senador Terêncio
Lucano. Esse senador admirava os dotes intelectuais de Terêncio,
e o educou com mestres gregos e, por fim, lhe concedeu a
liberdade. De acordo com o costume, Terêncio então adotou o
Terêncio: vida e obra (em italiano) nome do seu patrono. O cognome Afer indicava sua origem.
https://www.youtube.com/watch?v
=Z9MFN5Sl1Bw
Terêncio esteve próximo à vários patrícios romanos, como o próprio
Terêncio Lucano, Gaio Lélio e Cipião Emiliano. Os Cipiões eram uma das
famílias patrícias mais antigas e prestigiosas da Roma Antiga, e eram
profundamente filohelênicos; portanto, eles promoviam a cultura e a
literatura latina inspirada pela cultura grega, através do Círculo dos Cipiões.
Terêncio, embora fosse próximo aos Cipiões, não foi poupado de críticas e
comentários maldosos. Muitos diziam que o comediógrafo africano não era
o verdadeiro autor das peças, mas sim os patrícios (pelos costumes da
época, os patrícios não podiam escrever composições dramáticas).
Por volta do ano 160 a.C., Terêncio fez uma viagem à Grécia, possivelmente
para buscar material útil para a composição de suas comédias. Terêncio
também foi acusado de simplesmente traduzir peças gregas para o latim.
Ele nunca voltou dessa viagem. Uma versão diz que ele morreu em um
naufrágio; outra diz que ele morreu de desgosto, ao ter perdido a preciosa
bagagem com inúmeras peças inéditas.
As comédias de Terêncio
*No livro Res et Fabula, v. 1, p. 134-135 temos um resumo do conteúdo de cada uma das peças de
Terêncio.
Tradição e inovação na comédia terenciana
Depois da Batalha de Pidna (168 a.C.) e da vitória dos romanos sobre Perseu e os
macedônicos, temos um aprofundamento da contaminatio da cultura e literatura
latina com a cultura e literatura grega, quando esses dois mundos passaram a ter um
contato mais próximo e mais intenso. Esse fenômeno recebe o nome de helenização,
e foi largamente promovido pelos membros do Círculo dos Cipiões.
Por meio dessa elite intelectual, foi difundido em Roma o conceito de humanitas: em
sentido primitivo, humanitas simplesmente designava o que era próprio do homem, a
sua humanidade. Com a influência helênica da paideia, o termo humanitas passou a
designar a atenção do homem para consigo mesmo, para as suas necessidades e
interesses, e sua psicologia (algo até então desconhecido em Roma). Por sua
proximidade com os Cipiões, Terêncio foi um dos primeiros autores que trouxe essa
nova mentalidade e sensibilidade para seus textos.
O teatro de Terêncio, portanto, atende a um preciso projeto cultural: ele mantém vivo os
modelos tradicionais da literatura grega, mas introduz conteúdos novos para os romanos,
conteúdos esses que levam a refletir sobre o próprio ser humano. Provavelmente por este
motivo, os personagens terencianos são considerados anticonvencionais; isto é, eles não
seguem os clichês da tradição cômica. Por exemplo a sogra, da peça homônima, não possui
os traços característicos desse tipo cômico: ela não é uma megera, nem é mal-humorada e
ranzinza com sua nora. Pelo contrário: a sogra se mostra preocupada com a felicidade do
casal e tem uma sensibilidade que jamais foi vista em comédias anteriores.
O aprofundamento psicológico dos personagens de Terêncio acarretou em uma redução na
comicidade de suas peças. Por esse motivo, as comédias de Terêncio tiveram um sucesso
menor do que as de Plauto. Para Terêncio, o mais importante não era fazer seu público rir,
mas sim provocar uma reflexão por meio dos acontecimentos que se desenrolavam na
trama. De fato, esses acontecimentos retratavam situações com as quais a plateia poderia
facilmente se identificar. Por isso, as peças de Terêncio possuem um caráter pedagógico.
As comédias de Terêncio, portanto, foram chamadas de statariae, ou
seja, estáticas, mais baseadas em diálogos do que em movimentos, ao
contrário das comédias plautinas, chamadas de motoriae.
Além disso, Terêncio deu mais verossimilhança às situações e
personagens, além de ter mais atenção para com as consequências
lógicas e cronológicas dos acontecimentos. Ele também privilegiou os
diálogos em detrimento do monólogo, já que eles favoreciam o confronto
de ideias. Nesse sentido, Terêncio se aproximou muito de Menandro, daí
o fato de ele ser acusado como mero plagiador do comediante
helenístico.
Ao contrário de Plauto, Terêncio efetuou uma drástica redução dos
cantica, limitou a presença de apenas um personagem em cena, e
ampliou o número dos personagens em uma comédia, para melhor
estudar os vários tipos de personalidades humanas.
Os prólogos das comédias terencianas assumem uma nova função em
relação aos prólogos plautinos: eles não possuem mais função
informativa, mas sim apologética. Os prólogos permitiam a Terêncio se
defender dos ataques que ele sofria. Como exemplos, destacamos o
prólogo de Os Adelfos, em que Terêncio se defende da acusação de não
ser o verdadeiro autor da peça. Os críticos da época diziam que essa
peça tinha sido escrita por um dos Cipiões.
O estilo das comédias de Terêncio é simples, pacato, elegante, sóbrio, e
tende a destacar o lado interior dos personagens.
Embora tenha sido muito criticado em vida pelo grande público, Terêncio
foi apreciado por seus contemporâneos e por autores posteriores, tendo
inspirado nomes como Michel de Montaigne, Molière, etc.*
DIOTTI, Angelo; DOSSI, Sergio; SIGNORACCI, Franco. Res et fabula: dalle origine alla fine della
Repubblica. Torino: SEI, 2012, v.1, p. 132 e seguintes.
PLAUTO e TERÊNCIO. A Comédia Latina (Anfitrião, Aulularia, Os Cativos, O Gorgulho, Os Adelfos, O
Eunuco). Tradução de Agostinho da Silva. Rio de Janeiro: Ediouro, 1982.