Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo
Este trabalho apresenta estudo que visa substanciar a hipótese de que o atual modelo
econômico da Zona Franca de Manaus, primariamente baseado em incentivos fiscais e
fortemente voltado à indústria, não será sustentável a longo prazo frente a uma nova
conjuntura onde o valor agregado por atividades eminentemente manufatureiras tende a ser
cada vez mais minimizado em favor de atividades de Pesquisa e Desenvolvimento que
busquem adicionar valor através do desenvolvimento de novas tecnologias que possam ser
posteriormente “embarcadas” (embedded) em produtos dos mais diversos segmentos.
Palavras chave: Pesquisa, Desenvolvimento, Indústria.
1. Introdução
A Zona Franca de Manaus foi instituída pelo governo federal em 1967 com o objetivo de
estabelecer um pólo de desenvolvimento industrial, comercial e agropecuário. Para compensar
as desvantagens geográficas da Amazônia, o decreto que instituiu a ZFM também a definia
como área de livre comércio de importação e exportação, além de contar com incentivos
fiscais especiais.
O modelo inicialmente proposto vem sofrendo deste então ajustes de forma a consolidar a
implantação da ZFM e tentando adequar o pólo às mudanças conjunturais dos mercados
nacional e internacional. Apesar dos diversos reveses macro-econômicos sofridos pelo país e
pela região desde a sua criação é inegável que a ZFM consolidou um parque industrial
bastante robusto na região, fortemente ancorado na indústria de eletrônica de consumo, duas
rodas e, mais recentemente, indústria de telefonia celular.
A viabilidade da permanência da ZFM está hoje totalmente atrelada a manutenção dos
incentivos fiscais federais e estaduais definidos em lei e com prazo definido para expirar.
Dessa forma, de tempos em tempos vemos a bancada de parlamentares do estado do
Amazonas defender a prorrogação do prazo de vigência da lei que estabelece os incentivos à
Zona Franca de Manaus.
No entanto, apesar do entusiasmo e competência dos parlamentares locais que tem
sistematicamente perseguido, e conseguido, a prorrogação de prazo para os incentivos, não
existe um debate mais aprofundado em torno do tema da viabilidade, à longo prazo, do atual
modelo econômico da Zona Franca de Manaus, visto que o mesmo tem um foco claramente
voltado ao incentivo industrial.
No atual cenário mundial os países ricos e empresas transnacionais buscam ser cada vez mais
competitivos em um mercado global e sem fronteiras, e procuram cada vez mais deter a
propriedade intelectual das tecnologias embutidas nos mais variados produtos, de forma a
auferir o recebimento de “royalties” pela “inteligência” embutida nestes equipamentos.
Atualmente os países e empresas que investem em tecnologia se concentram em aspectos de
projeto, desenvolvimento e marketing, que são as etapas que efetivamente agregam valor à
1
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
empresa e/ou país, relegando à manufatura a algumas poucas empresas cuja grande escala de
produção justifica ter o negócio fabril como um fim em si, ou ainda países não desenvolvidos,
cuja ausência de domínio tecnológico não lhes deixa alternativa além de participar apenas da
etapa de produção dentro do ciclo de vida de um determinado produto. Dentro deste contexto
é emblemática a frase do presidente da Sun Microsystems, líder mundial de hardware e
software para sistemas de grande porte, Scott McNeally, que disse, referindo-se a participação
da Sun no ciclo de vida de seus produtos: “We just want to design, market and make
money...”.
A Zona Franca de Manaus tem efetivamente cumprido alguns de seus principais objetivos
definidos quando de sua criação, entre eles trazer uma alternativa de desenvolvimento
econômico para o coração da Amazônia ocidental, gerando dezenas de milhares de empregos
diretos e indiretos na região, sendo inegável a sua contribuição social para a economia e a
comunidade local. É também notório que muitas das indústrias instaladas na ZFM atingiram
um nível de excelência em seus processos fabris equiparável, e em alguns casos superior, aos
principais centros manufatureiros mundiais, sendo bastante comum que muitas empresas
multinacionais instaladas em Manaus tenham os melhores indicadores de produtividade em
nível mundial, superando inclusive suas matrizes.
Não obstante a significativa contribuição da ZFM à economia da região até o presente
momento, faz-se necessária uma análise aprofundada da viabilidade deste modelo,
basicamente industrial, no longo prazo, à luz de uma nova realidade mundial onde as
empresas/países, suportados por um alto capital intelectual humano, migraram ou estão
rapidamente migrando para um modelo que privilegia a inovação tecnológica, a propriedade
intelectual, os ganhos através do licenciamento de patentes, a “inteligência embarcada”, em
detrimento de uma atividade basicamente industrial onde os ganhos e o valor agregado são
significativamente menores.
A principal justificativa para este projeto é contribuir para essa discussão através de um
estudo que demonstre de forma não empírica, mas através de dados científicos e estudos de
caso, que o atual modelo econômico no qual se sustenta o pólo industrial da Zona Franca de
Manaus necessita rever o seu foco eminentemente industrial para um foco de geração de
tecnologia e incrementação do valor agregado em seus produtos, sob pena de se tornar
inviável, a despeito de todos os incrementos de incentivos fiscais ou da prorrogação da lei que
os regulamenta.
A Zona Franca de Manaus foi idealizada e criada como Porto Livre em 1957. Dez anos
depois, o Governo Federal, através de decreto federal de 1967 ampliou essa legislação e
reformulou o modelo, estabelecendo incentivos fiscais por 30 anos para implantação de um
pólo industrial, comercial e agropecuário. Instituindo, assim, o atual modelo de
desenvolvimento, tendo como centro a cidade de Manaus. O modelo de desenvolvimento da
ZFM está assentado em Incentivos Fiscais e Extra-Fiscais, que propiciaram condições para
alavancar um processo de crescimento e desenvolvimento da área incentivada (MELO, 1997).
A dinâmica da ZFM pode ser configurada em 3 fases distintas: A primeira fase, de 1967 a
1976 constituiu o período de liberdade plena de importações, apresentando predominância da
atividade comercial. A segunda fase estendeu-se até o final de 1990 e foi caracterizada
principalmente pelo estabelecimento de Índices Mínimos de Nacionalização para produtos
industrializados na ZFM e comercializados nas demais localidades do território nacional. A
terceira fase iniciou-se em 1991 com a abertura do mercado Brasileiro às importações. A
2
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
exposição do modelo ZFM à nova ordem exigiu profundas modificações na legislação, como
a substituição do critério dos Índices Mínimos de Nacionalização pela prática de Processo
Produtivo Básico – PPB (SUFRAMA, 2004).
O modelo econômico desenhado para a ZFM incentiva primariamente a produção industrial.
Isso contribuiu decisivamente para que segmentos industriais específicos se estabelecessem
na região, passando com o tempo a ganhar relativa importância nacional, com alguns de seus
produtos e setores passando a ter significativa representatividade em relação ao conjunto da
produção industrial do país. Acordos de cessão tecnológica, joint ventures, associados à
evolução constante de seus processos fabris permitiu uma especialização setorial que resultou,
para alguns produtos, na hegemonia da produção da ZFM em termos nacional, e para outros,
em menor número, competitividade no mercado internacioanl (SALAZAR, 2004).
No entanto, o modelo econômico atual se sustenta basicamente em uma malha de incentivos
fiscais inerente ao Decreto-Lei Nr. 288, de forma que a retirada de tais incentivos acarretaria
uma diminuição drástica da competitividade dos produtos produzidos na ZFM e conseqüente
migração das principais indústrias para regiões do país onde aspectos como proximidade dos
principais centros consumidores e facilidade logística seriam mais favoráveis às suas
atividades (BOTELHO, 1996).
3
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
O produto telefone celular encabeça a lista de produtos mais exportados (US$ 135,10 milhões
no período totalizando 20,65% de participação), permanecendo estável na posição em que
ocupa seguido de motocicletas 50cc (10%) e televisores (9,25%). Até dezembro/03, os
telefones celulares participavam com 48% do total das vendas externas.
Os países que mais exportam para o Amazonas são: China (20,18%), Japão (18,41%), Coréia
do Sul (12%), Estados Unidos (8,93%), Taiwan (4,78%) e Alemanha com 4,7%. As
exportações do Pólo Industrial de Manaus totalizam até o mês de agosto montante de US$
607,28 milhões, enquanto que o resultado de igual período de 2003 foi de US$ 771,99
milhões, uma redução de 21,3%.
4. Análise setorial
As grandes mudanças que delimitaram etapas no processo de evolução da humanidade sempre
tiveram o suporte da tecnologia, em que pese estarem calcadas no empirismo, gerando
conhecimento posterior. No mundo atual, o conhecimento antecede ao fato, ao investimento, à
criação de uma empresa ou mesmo aos grandes negócios internacionais. Robert Kurz, no seu
livro "Colapso da Modernização", destaca que a concorrência no mercado mundial torna
obrigatório um novo padrão de produtividade e qualidade, definido pela combinação de
4
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
5
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
O sucesso de uma política industrial depende do volume dos investimentos direcionados pelo
Estado para a inovação tecnológica no país (COUTINHO, 1994). Esse esforço de gerar
estímulos às atividades de pesquisa e desenvolvimento, especialmente no âmbito das
empresas, é uma medida indispensável, visto que os investimentos feitos nesse setor são
caracterizados pelo elevado grau de risco. Observa-se, com base nos referenciais
internacionais, que o Brasil possui uma base de pesquisa acadêmica competitiva. A base de
pesquisa empresarial, entretanto, é bastante frágil. Dessa forma, o grande obstáculo a ser
superado é a geração de estímulos para que as empresas do Brasil possam empregar cientistas
e engenheiros para fazer desenvolvimento tecnológico nas empresas (BRITO CRUZ, 2004).
Isso explica, em parte, porque os investimentos em P&D das empresas brasileiras é tão
reduzido. Observa-se que, uma elevada prioridade dada pelo país nessa área produz reflexos
positivos no campo das inovações tecnológicas. Quando isso ocorre, o país também aumenta a
sua participação no volume de patenteamento no mundo.
Neste contexto observa-se que nos países hoje desenvolvidos os pólos antes eminentemente
manufatureiros vieram a tornar-se centros voltados às atividades de pesquisa e
desenvolvimento, mantendo localmente apenas a manufatura de produtos de alta tecnologia e,
consequentemente, alto valor agregado, além, evidentemente das instituições voltadas à
pesquisa e desenvolvimento. Esse movimento pode ser claramente percebido a partir dos anos
setenta quando o Japão começou a transferir às suas indústrias de produtos de consumo
eletrônicos “commodities” para os então emergentes triges asiáticos: Coréia do Sul, Taiwan,
Hong Kong e Cingapura. Na década seguinte os chamados tigres começaram essa
transferência em direção a paises como Tailândia, Indonésia, Filipinas, depois China,
Vietnam, etc. Tal movimentação, indubitavelmente, se deve a diversos fatores, como por
exemplo a busca por mão-de-obra barata, mas também deve-se claramente ao fato desses
países/corporações estarem buscando focar na fase do ciclo de vida dos produtos cujo valor
agregado é consideralvemente maior em termos de retorno, que é a fase de pesquisa e
desenvolvimento, relegando a manufatura propriamente dita a locais que ofereçam condições
adequadas à atividade fabril, quais sejam: custo de mão-de-obra, condições logísticas,
incentivos fiscais, etc.
5. Conclusão
A minimização da forte dependência atual da política de incentivos será efetiva quando a
contribuição do pólo industrial do Manaus ao ciclo de vida do produto for além da simples
manufatura do mesmo. O alargamento do escopo de pólo manufatureiro para uma abordagem
mais ampla envolvendo as etapas de pesquisa e desenvolvimento, de forma a incrementar
consideravelmente o valor agregado à cadeia do produto, pode vir a ser um diferencial
determinante para a competitividade das empresas instaladas em Manaus, independentemente
da diminuição dos incentivos fiscais .
A criação das bases necessárias para o estabelecimento de um ambiente voltado à pesquisa e
desenvolvimento de novos processos e produtos está fortemente ligada à formação de uma
massa crítica de cientistas e pesquisadores que, nas empresas, virão ser os transformadores
da ciência, gerada no centros acadêmicos, em inovação tecnológica e que posteriormente se
traduzirão em novos produtos e processos.
Destaca-se o fato de que certos países - sobretudo os chamados tigres asiáticos: Coréia do Sul,
Taiwan, Hong Kong e Cingapura, e os tigres da segunda geração: Malásia, Filipinas e
Indonésia - iniciaram o caminho ascendente de suas indústrias de tecnologia, entre as quais a
de bens de eletrônica de consumo (BEC), a partir de funções menos qualificadas. O que
ocorreu foi a atração de investimentos estrangeiros de forma generalizada, sobretudo em
6
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
Referências
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E ENGENHARIA DAS EMPRESAS
INOVADORAS. Documento Internet URL http: //www.anpei.org.br. Acesso em 03/04/2004.
BOTELHO, José Antônio. “ Redesenhando o projeto ZFM: Um estado de alerta”. Editora Sebrae, 1996.
COUTINHO, L.; FERRAZ, J.C. “Estudo da competitividade da indústria brasileira”. Editora Papirus, 1994.
FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DO AMAZONAS. “Indicadores industriais”. Assessora de
dados estatísticos, 2004.
MELO, Paulo R. S.; ROSA, Sérgio E. S. “A indústria eletrônica na Zona Franca de Manaus”. BNDES, 1997.
PEREIRA, José M. “Economia brasileira”. Editora Atlas, 2003.
SALAZAR, Admilton P. “Amazônia – Globalização e sustentabilidade”. Editora Valer, 2004.
SUPERINTENDÊNCIA DA ZONA FRANCA DE MANAUS. Documento Internet URL http:
//www.suframa.gov.br/mzfm_historia.cfm. Acesso em 02/04/2004.
7
XXIV ENEGEP Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de novembro de 2004
ANEXO