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4º CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO DE

MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEIS


9-11 de novembro de 2022
Salvador, Bahia, Brasil

ACOMPANHAMENTO DA HIDRATAÇÃO DE PASTAS DE CIMENTO COM FÍLER


CALCÁRIO POR ESPECTROSCOPIA DE INFRAVERMELHO COM
TRANSFORMADA DE FOURIER (FTIR)

PEDRO H. M. DO NASCIMENTO1*; BRUNA L. BRITO2; FABRICIO C. VITORINO3;


MAYARA AMARIO4; CAMILA A. A. ROCHA5; ROMILDO D. TOLEDO FILHO 4

1. Eng. Civil, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


p-mello@poli.ufrj.br
2. Engenheira Química, candidata ao doutorado no Programa de Eng. de Processos Químicos e Bioquímicos -
EPQB/UFRJ
brunaluizafer@eq.ufrj.br
3 Doutor em Eng. Civil, Departamento de Eng. Química e Petróleo, Universidad e Federal Fluminense (UFF)
fabriciovitorino@id.uff.br
5. Professor Doutor em Eng. Civil, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
mayara_amario@poli.ufrj.br; toledo@coc.ufrj.br
5. Professora Doutora em Eng. Civil, Departamento de Eng. Civil, Universidade Federal Fluminense (UFF)
camilaabelha@id.uff.br
*Av. Athos da Silveira Ramos 149, CEP 21941-611 – Cidade Universitária, Rio de Janeiro – RJ, Brasil

Resumo O presente trabalho estudou a hidratação de pastas de cimento com a adição de fíler calcário
por meio da técnica da espectroscopia de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR). É sabido
que a adição de fíler calcário aumenta a resistência em idades iniciais, além de acelerar as reações de
hidratação devido aos efeitos de nucleação e diluição e melhoria do empacotamento, mas pouco se
sabe sobre seu efeito químico. A escolha pelo ensaio FTIR se deu por ser uma técnica de
caracterização muito eficiente, e principalmente por emitir seus resultados com rapidez. Para o estudo
foram confeccionadas pastas com substituição do cimento por fíler calcário nos teores de 0, 10, 15, 25
e 35% e relação água-sólidos de 0,48. A evolução das reações de hidratação das pastas foi
acompanhada por FTIR nas idades de 1, 3, 7 e 28 dias. A hidratação foi interrompida utilizando a
técnica de liofilização. Os resultados obtidos por FTIR mostraram que dentre os produtos da reação de
hidratação das pastas com adição de fíler calcário, além da etringita, também foi encontrado
carboaluminato. Isso demonstra que a adição de fíler calcário altera os produtos de hidratação e que a
técnica de FTIR foi eficiente para detectar essas mudanças.
Palavras-chave: Fíler calcário; Hidratação do cimento; FTIR, Pasta de cimento, Material cimentício
suplementar.

Abstract This work studied the cement hydration reaction with addiction of limestone filler by means of
Fourier-transform infrared spectroscopy (FTIR) technique. It is known that addiction of limestone filler
increases the resistance in early ages besides accelerate the hydration reactions due to nucleation and
dilution effects and improvement of packing, but little is known about chemical effect. The choice for the
FTIR test was given because it is a very efficient characterization technique and mainly for issuing
results quickly. For the study, pastes were made with cement substitution limestone filler in the contents
of 0, 10, 15, 25 and 35% by and a solid-water ratio of 0.48. The evolution of hydration reactions of the
pastes was monitored by FTIR at the ages of 1, 3, 7 and 28 days. Hydration was stopped using
lyophilization technique. The results obtained by FTIR showed that among the products of the hydration
reaction of the pastes with addition of limestone filler, in addition to ettringite, carboaluminate was also
found. This demonstrates that the addition of limestone filler alters the products of hydration of cement
pastes and that the FTIR technique was efficient in detecting these changes.

ISBN: 978-65-00-55912-5 1233


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Keywords: Limestone filler; Cement hydration; FTIR, Cement past, Supplementary cementitious
material.

1. INTRODUÇÃO
O cimento Portland é definido pela NBR 16697 (ABNT, 2018) como um ligante hidráulico obtido pela
moagem de clínquer Portland com adições minerais. Este material tem uma grande importância na
construção civil, pois é o aglomerante mais utilizado na indústria atualmente.
Por conta dessa grande demanda, há uma produção em larga escala desse material ao redor do
mundo, sendo o Brasil um dos principais produtores. No ano de 2020, de acordo com o Sindicato
Nacional da Indústria do Cimento a produção anual de cimento foi de 60,6 milhões de toneladas, sendo
a região sudeste a maior produtora, responsável por quase metade da produção nacional (SNIC, 2020).
Tendo em vista a importância da produção do cimento, é necessário refletir a respeito deste processo.
Para isso, serão descritas brevemente as etapas da fabricação do cimento. As matérias-primas
utilizadas nessa fabricação são: calcário, argila e minério de ferro. Esses minerais são retirados das
jazidas e levados para dosagem, logo antes de entrarem no moinho de rolo, onde são homogeneizados,
formando a farinha crua. Após essa etapa, a farinha crua é lançada ao forno, onde a temperatura cresce
gradativamente, até a formação do clínquer. Com o clínquer pronto, é adicionada uma pequena
quantidade de gesso para controlar o enrijecimento, podendo também haver a adição de outros
minerais, dependendo da demanda. Em seguida é feita a moagem e ao fim desse processo o cimento
é armazenado e transportado.
Analisando as etapas da produção, pode-se notar que na fase na qual há a formação do clínquer, é
liberada uma grande quantidade de CO2 na atmosfera, tornando a fabricação do cimento um processo
que contribui para o efeito estufa. Uma das estratégias de diminuir a produção de CO 2 por parte da
indústria cimenteira é a substituição do cimento por materiais cimentícios suplementares (MCS), como
o fíler calcário. O fíler calcário é um material proveniente da moagem de carbonáceos, principalmente
de calcário, muito abundante no Brasil. O seu uso como MCS tem como vantagem não exigir grandes
investimentos, não necessitar de calcinação e possuir disponibilidade ampla para todas as fábricas que
optarem por sua utilização (VISEDO; PECCHIO, 2019).
Entretanto, é necessário entender quais são os efeitos que a adição do fíler calcário causa no cimento.
São eles: efeito fíler; efeito de nucleação; efeito de diluição e efeito químico (WANG et al, 2018). O foco
do presente trabalho foi estudar mais a fundo o efeito químico, que geralmente é ignorado pelos
pesquisadores.
O efeito químico está relacionado com os produtos que são formados na reação de hidratação do
cimento. Para a compreensão deste efeito, é preciso relembrar a reação de hidratação, agora com a
adição do fíler. Segundo Ingram e Daugherty (1991) o fíler reage majoritariamente com o C3A,
resultando em formas alta e baixa de carboaluminatos de cálcio e também em formas alta e baixa de
sulfoaluminatos de cálcio. A alta forma do carboaluminato tem como fórmula química:
3CaO.Al2O3.3CaCO3.32H2O. Já a baixa forma do carboaluminato, tem como fórmula química:
3CaO.Al2O3.CaCO3.12H2O. Esses produtos, são similares aos sulfoaluminatos, sendo o alto conhecido
como etringita (3CaO.Al2O3.3CaSO4.32H2O) e o baixo conhecido como monossulfoaluminato
(3CaO.Al2O3.CaSO4.12H2O).
Apesar do efeito químico ter menor influência dentre todos os outros efeitos do fíler calcário no cimento,
é importante que ele seja estudado e mais bem compreendido, pois o efeito químico influencia na

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alcalinidade, na umidade e na estabilização do volume das matrizes, além de influenciar também na


resistência mecânica e na resistência ao ataque de sulfatos no concreto (Wang et al, 2018).
Nesse trabalho, a Espectroscopia de Infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) foi a técnica
escolhida para estudar a reação de hidratação do cimento com fíler calcário, visando compreender
melhor o efeito químico da adição do fíler. A espectroscopia é a ciência que estuda a interação da
radiação eletromagnética com a matéria. As medidas espectroscópicas são baseadas na medida da
quantidade de radiação produzida ou absorvida pelas moléculas ou átomos presentes na amostra de
interesse. (SOUZA; LIMA; OLIVEIRA, 2014).
Esta técnica foi escolhida pelos seguintes motivos: ser eficiente na análise qualitativa, ou seja, na
identificação dos compostos formados; por ser uma técnica em que os resultados são obtidos
rapidamente; e por ser pouco abordada na literatura, na qual existem poucos trabalhos utilizando essa
técnica com o material alvo do estudo.
Dessa maneira, o presente trabalho tem como objetivo analisar os produtos formados na reação de
hidratação do cimento com adição de fíler calcário, por meio da técnica FTIR. Essa análise será feita
por meio do estudo de pastas de cimento com adição de diversos teores de fíler calcário em diferentes
idades.

2. METODOLOGIA

2.1 Materiais
Foi utilizado cimento Portland classe G da marca Holcim, fíler calcário da Fábrica Calcário Paraíso
sediada em Italva – RJ e água deionizada. O cimento utilizado no trabalho é composto apenas de
clínquer e gesso.

2.2 Caracterização dos materiais


O ensaio de massa específica do cimento foi feito com o picnômetro a gás, modelo AccuPyc 1340 da
Micromeritics. O gás utilizado foi gás Hélio, em uma amostra de cimento seca a temperatura de 22,5
ºC. O resultado obtido foi a média aritmética de 5 medições, dentro de um erro relativo de 0,05%. Já a
massa específica do fíler calcário foi determinada através de um picnômetro de vidro, com água
deionizada como meio dispersor.
A distribuição granulométrica das partículas de cimento e fíler foram determinadas a laser no
equipamento Malvern Mastersizer 2000. Na análise do cimento, usou-se o álcool etílico absoluto P.A.
como meio dispersor, com tempo e velocidade de dispersão das partículas de aproximadamente 10
min e 2150 rpm respectivamente. Na análise do fíler, usou-se água deionizada como meio dispersor,
com tempo e velocidade de dispersão das partículas de aproximadamente 10 minutos e de 1650 rpm,
respectivamente. A quantidade de ambos os materiais sólidos em solução, foi determinada de forma
que a obscuração ficasse entre 10 e 20%.
A composição química de ambos os materiais foi determinada através da análise por espectrômetro de
fluorescência de raios-X (FRX) no equipamento AxiosMax, marca Panalytical. As amostras de cimento
foram preparadas em prensa automática VANEOX com um molde de 30 mm, pressão igual a 20 ton, e
tempo de 30 segundos, utilizando como aglomerante ácido bórico (H 3BO3) na proporção de 1:0,3,
sendo 2,0 g da amostra seca à 105 °C por 12 horas e 0,6 g do ácido bórico. Já a amostra de fíler
calcário foi preparada através da fusão à 1050 °C na máquina VULCAN com uma diluição 1:5, sendo
1 g de amostra seca à 105 °C e 5g do fundente Li 2B4O7. Os resultados semiquantitativos estão

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expressos em porcentagem, calculados como a média de 3 medições, em óxidos, retirando os valores


menores que 0,1%,
A perda por calcinação indica o teor de material que pode ser perdido pela amostra quando a mesma
é submetida à elevadas temperaturas. Com ambos os materiais foram feitas 3 medidas em balança
analítica de quatro casas decimais, de cada uma das 3 amostras, todas elas com aproximadamente
1g. Depois foram queimados em forno mufla a 1000°C por 16h. Ambos os materiais foram resfriados
em um dessecador, e pesados novamente para determinar a perda por calcinação (ABNT, 2012).
A análise termogravimétrica do cimento e do fíler foi feita com o equipamento SDT Q600 TGA/DTA/DSC
Simultâneo da TA Instruments, em uma taxa de aquecimento de 10 °C/min, da temperatura ambiente
até 1000 ºC, com fluxo de nitrogênio de 100 mL/min e cadinho aberto de platina.
O ensaio de superfície específica de ambos os materiais foi feito usando a técnica desenvolvida por
Blaine, previsto na NBR NM 76 (ABNT, 2015). Esta técnica determina que a superfície específica de
uma amostra é proporcional ao tempo necessário para que uma determinada quantidade de ar
atravesse uma camada de material compactado.

2.3 Dosagem e confecção das pastas


Foram confeccionadas pastas nas porcentagens de fíler calcário com relação a massa do cimento de:
0% (Referência); 10%; 15%; 25%; 35%. Os tempos de hidratação estudados de cada uma dessas
pastas foram de 1; 3; 7 e 28 dias. A quantidade total de pasta produzida, de cada porcentagem, foi de
37 g, sendo a relação de água/sólidos de 0,48. A massa de água deionizada foi constante em todas as
pastas, igual a 12 g. A massa de cimento e de fíler variaram de acordo com a porcentagem, como
mostra a Tabela 1.
O cimento e o fíler calcário foram misturados, formando a mistura seca, em seguida o conteúdo de
água deionizada foi vertido para o béquer com a mistura seca e foi realizada a homogeneização por
cerca de 1 min, com um bastão de vidro. Após esse tempo, as pastas foram separadas em quatro sacos
ziplock, com aproximadamente 9,25 g cada e foram armazenadas em uma sala com temperatura de
22ºC.

Tabela 1 – Massa dos sólidos das pastas


Pasta Cimento (g) Fíler (g)
0% 25,00 0,00
10% 22,50 2,50
15% 21,25 3,75
25% 18,75 6,25
35% 16,25 8,75

Ao chegar às idades definidas, cada amostra foi macerada utilizando-se almofariz e pistilo e levada ao
liofilizador para interromper a hidratação. Ao fim do processo de liofilização, a amostra foi novamente
macerada, colocada em sacos ziplock, e armazenada em um dessecador.

2.4 Ensaio FTIR


As amostras foram levadas para o laboratório do Instituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano
(IMA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro onde o ensaio foi realizado. O aparelho utilizado foi o
espectrômetro PerkinElmer Frontier FTIR/FIR. O software utilizado na leitura dos dados foi o Spectrum

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Version 10.4.2. Além das pastas, também foram ensaiadas duas amostras de 5 g, uma de cimento
anidro e outra de fíler calcário puro, totalizando 22 unidades.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Caracterização dos materiais


O resultado do ensaio de granulometria pode ser visto através da curva granulométrica na figura 1.
Observando a curva, fica evidente que a distribuição granulométrica de ambos os materiais é muito
próxima, fazendo com que o efeito fíler não seja muito relevante. O tamanho médio das partículas (d 50)
está apresentado na Tabela 2, além dos resultados dos ensaios de massa específica, superfície
específica, perda ao fogo e composição química.
Como pode ser observado na composição química, o cimento tem uma porcentagem razoavelmente
baixa de óxido de alumínio, pois segundo o fabricante, ela pode chegar até 15%. Porém mesmo com
uma quantidade de Al2O3 de aproximadamente 4%, foi possível perceber a formação de novos produtos
na reação de hidratação com o fíler calcário, pois de acordo com Ingram e Daugherty (1991) é esse
óxido que reage com o carbonato de cálcio e com a água, formando novos produtos, os
carboaluminatos de alta e baixa forma.
Os resultados dos ensaios de análise termogravimétrica são apresentados nas figuras 2 e 3. Conforme
ilustrado pela figura 2, o cimento apresenta perda de massa nas faixas de temperatura: 25-350ºC; 350-
450ºC e 450-650ºC. Essas perdas acontecem por conta da desidratação do gesso e de outros
componentes (0,40%), desidroxilação do hidróxido de cálcio (0,85%) e pela descarbonatação do
CaCO3 (1,37%), respectivamente (ALMEIDA, et al., 2019). A perda total de massa observada no ensaio
foi de 1,1%, estando dentro do previsto pelo ensaio de perda ao fogo.
De acordo com a figura 3, o fíler calcário apresenta perda de massa relevante na faixa de temperatura
de 600-800ºC. Isso ocorre, devido a decomposição do CaCO3 e MgCO3, liberando CO2. A porcentagem
de carbonatos no fíler calcário é cerca de 87,5%. A massa calcinada observada na análise
termogravimétrica de 38,21% e está de acordo com o previsto pelo ensaio de perda ao fogo (ALMEIDA;
et al., 2019).

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Figura 1 – Curva granulométrica do cimento Portland classe G e do fíler calcário

Tabela 2 – Caracterização física e química do Cimento Portland classe G e do fíler calcário


Cimento Portland Fíler Calcário
Perda ao Fogo (%) 1,6 39,3
Massa Específica (g/cm³) 3,19 2,83
Superfície específica (cm²/g) 3331,0 4895,5
d50 (µm) 19,2 21,7
Na2O (%) 0,41 0,23
MgO (%) 1,40 5,50
Al2O3 (%) 3,90 1,10
SiO2 (%) 19,9 7,10
SO3 (%) 3,40 -
K2O (%) 0,36 0,21
CaO (%) 64,10 45,7
TiO2 (%) 0,18 -
Fe2O3 (%) 4,50 0,53
SrO (%) 0,16 -
CuO (%) - 0,29

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Figura 2 – Curva da análise termogravimétrica do cimento Portland classe G

Figura 3 – Curva de análise termogravimétrica do fíler calcário

3.2 Ensaio FTIR


A figura 4 apresenta a influência do tempo de cura e do teor de fíler nas bandas de absorção dos
espectros de FTIR, enquanto a Tabela 3 apresenta o sumário com as bandas, os tipos de ligações, os
produtos relacionados e as principais referências. As escalas da figura 4 estão em unidades arbitrárias

ISBN: 978-65-00-55912-5 1239


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com o objetivo inicial de se observar o aparecimento ou o desaparecimento de bandas relacionadas a


produtos hidratados.
Em relação ao tempo de cura, e comparando com o cimento anidro, observa-se que a banda na região
de 3643 cm-1, relacionada ao CH, começa a ficar mais definida a medida em que o tempo de cura da
pasta progride. Em 3405 cm-1 aparece uma banda larga que está relacionada com água livre presente
nas pastas.
Em 949 cm-1 pode ser observado o surgimento de uma banda relacionada com o C-S-H. Etringita (Aft)
está relacionada com a banda que aparece em 822 cm -1. Note que este pico é mais evidente até os 3
dias de cura e após isso começa a desaparecer. Monossulfoaluminato (Afm) tem uma banda
relacionada em 1100 cm-1. Monocarboaluminato está relacionado com as bandas em 1651 e 1424 cm-
1 e aparecem desde o terceiro dia de cura, não se mostrando presente no cimento anidro. Carbonatos

podem ser detectados pela presença das bandas em 1795, 1389, 872 e 712 cm -1. Devido à alta
sensibilidade desta técnica a carbonatos, bandas relacionadas a este produto podem ser detectadas
no cimento anidro, ainda que em baixíssimas quantidades. Esta carbonatação no cimento anidro ocorre
devido a exposição do cimento a condições ambiente. As fases não hidratadas do cimento (C3S e
C4AF) podem ser observadas nas bandas que aparecem em 906 e 662 cm -1 que são mais evidentes
no cimento anidro. A partir de 3 dias de cura, estas bandas já não são mais distinguíveis.

ISBN: 978-65-00-55912-5 1240


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Figura 4 – Influência do tempo de hidratação e dos diferentes teores de fíler calcário nos espectros do
infravermelho das pastas estudadas.
Em relação ao teor de fíler nas pastas, pode ser observado que o seu aumento leva ao aparecimento
de uma nova banda em 1795 cm-1 que está relacionado ao CaCO3 presente no fíler. Além disso, ocorre
uma maior definição das bandas de carbonato em 1651 e 1424 cm -1, que estão relacionadas a formação
de monocarboaluminato. Também é possível observar que bandas relacionadas ao carbonato ficaram
mais evidentes em todos os casos contendo fíler.

ISBN: 978-65-00-55912-5 1241


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Tabela 3 – Principais bandas de absorção no infravermelho identificadas para as pastas estudadas.


(*) associados a fase monocarboaluminato.
Número de onda (cm-1) Tipo de ligação Relacionado a: Referência
E. Knapen
3643 O-H CH
(2009)
E. Knapen
3405 O-H H 2O
(2009)
Ferraz, E.
1795 C-O CaCO3
(2019)
M. A. Trezza
1651 O-H Afm*
(2001)
E. Knapen
1474 C-O CaCO3
(2009)
M. A. Trezza
1424 C-O CaCO3*
(2001)
Ferraz, E.
1389 C-O CaCO3
(2019)
E. Knapen
1140 S-O SO4-2
(2009)
M. A. Trezza
1100 S-O Afm
(2001)
E. Knapen
949 Si-O C-S-H
(2009)
906 Si-O C 3S M. Król (2022)
Ferraz, E.
872 C-O CaCO3
(2019)
Georgesc, M.
822 Al-O Aft
(2002)
Ferraz, E.
712 C-O CaCO3
(2019)
662 Al-O C4AF M. Król (2022)
Com o intuito de se ter uma estimativa qualitativa da quantidade de produtos hidratados formados nas
pastas com os diferentes teores de fíler, os espectros de FTIR foram normalizados utilizando o método
de Padronização Normal de Sinal (ou SNV – Standard Normal Variate). Os espectros resultantes, que
comparam os diferentes teores de fíler nas pastas, nos diferentes tempos de cura, podem ser
observados na figura 5.
Os resultados indicam que o aumento no teor de fíler calcário na pasta de cimento leva a um aumento
na quantidade de produtos hidratados de forma geral, que pode estar relacionado ao efeito fíler, que
favorece a formação de sítios de nucleação e o crescimento destas fases (BERODIER; SCRIVENER,
2014). Veja que a banda relacionada a CH tende a aumentar ao longo do tempo de hidratação e com
o aumento do teor de fíler. Considerando que a quantidade de carbonato de cálcio não tende a se
alterar significativamente ao longo do tempo de cura analisado, note que a relação entre as alturas das
bandas do C-S-H (949 cm-1) e do carbonato (872 cm-1) aumenta, indicando o aumento da quantidade
do primeiro. Em relação ao monocarboaluminato, fica evidenciado o aumento da quantidade desta fase
com o aumento no teor de fíler nas pastas. Ao longo do tempo de cura, nota-se que as bandas
relacionadas com esta fase ficam cada vez mais evidentes e a banda relacionada a CaCO 3 em 1474
cm-1 perde intensidade, indicando que a formação do monocarboaluminato se prolonga até idades mais
avançadas, provavelmente devido a incorporação do CaCO3 presente nas pastas a essa fase.

ISBN: 978-65-00-55912-5 1242


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Algumas exceções podem ser observadas nas constatações discutidas acima, no entanto, isto está
relacionado as dificuldades de se manter a homogeneidade, a espessura e a relação pasta de
cimento/KBr no preparo das pastilhas de KBr. Apesar da análise de FTIR no modo de Reflectância
Total Atenuada (ATR) ser a mais indicada para a quantificação das fases do cimento, o preparo das
amostras agrega uma maior complexidade em vistas das pastilhas de KBr. Todavia, novas análises
estão em andamento para confirmar os resultados obtidos até o momento e serão publicadas
futuramente.

Figura 5 – Espectros de infravermelho normalizados pelo método de SNV.

4. CONCLUSÕES
Conforme os resultados expostos no ensaio FTIR, o efeito químico do fíler calcário se mostra presente
por conta da formação dos carboaluminatos. Apesar desta adição mineral não ser tão reativa quanto
as que possuem atividade pozolânica, sua presença também tem influência nas reações de hidratação
do cimento, principalmente na reação dos aluminosilicatos.
Como pôde ser visto nos espectros de infravermelho houve um pico significativo na faixa de 1474 cm -
1 nas pastas com maior teor de fíler calcário devido ao aumento da quantidade de carbonato de cálcio

presente nas amostras. Além disso, é possível perceber que conforme a reação de hidratação vai

ISBN: 978-65-00-55912-5 1243


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avançando ao longo do processo de cura, essa faixa acaba perdendo intensidade. Por outro lado, as
faixas de 1651 e 1424 cm-1, referentes a formação do monocarboaluminato, ficam mais evidentes.
Entretanto, pelo ensaio FTIR fornecer apenas uma análise qualitativa, se mostra necessário mais
estudos a respeito do tema, visando mais informações sobre de que maneira o efeito químico do fíler
calcário pode influenciar as propriedades físicas e mecânicas da pasta de cimento.

AGRADECIMENTOS
Ao CNPq pela bolsa de iniciação científica concedida ao primeiro autor, que possibilitou a realização
da pesquisa e dos ensaios apresentados neste trabalho.
À Thuanny Moraes do Instituto de Macromoléculas Professora Eloisa Mano da UFRJ, pela condução
do ensaio FTIR.

REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 16697: Cimento Portland -
Requisitos. Rio de Janeiro, 2018.
______. NBR NM 18: Cimento Portland - Análise química - Determinação de perda ao fogo. Rio de
Janeiro, 2012.
______. NBR 16372: Cimento Portland e outros materiais em pó - Determinação da finura pelo método
de permeabilidade ao ar (método de Blaine). Rio de Janeiro, 2015
BERODIER E, SCRIVENER K. Understanding the filler effect on the nucleation and growth of C-S-H. J
Am Ceram Soc. 2014;97:3764–73.
DE ALMEIDA R.D.; BRITO, B.L.F.; ROCHA, C.A.A.; FILHO, R.D.T. Efeito da substituição do cimento
por fíler calcário na hidratação e propriedades mecânicas de matrizes a base de cimento. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE CONCRETO, 61., 2019, Fortaleza. Anais... Fortaleza: IBRACON,
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