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"As observações de Albert-László Barabási sobre

networks têm amplas aplicações em negócios.


Bem escrito... Uma história de detetive intelectual:'
- New York Times

"Linked (Conectado) é realmente interessante, mostrando


í como esta nova ciência promete mudar o modo que
conduzimos tudo, desde tratamentos médicos até
a guerra contra o terrorismo:'
- The Washington Monthly -

"Todos os pesquisadores sonham em fazer uma descoberta


que irá transformar seu campo. Albert-László Barabási pôde
fazer melhor. Em apenas três anos, sua descoberta
começou a propagar ondas em campos tão diferentes, tais
como ecologia, biologia molecular; ciência da
computação e física quântica:'
- New Scientist -

"Um olhar animado em networks através do tempo."


- The Washington Post -

"Linked (Conectado) é a melhor escolha para os leigos,


porque Barabási minimiza a matemática e escreve
elegantemente:'
- Detroit Free Press -

Livro traduzido em 8 idiomas

ISBN 978-852890612-7

BERT�L�SZLÓ BARABASI
9 788528 906127
ALBERT-LÁSZLÓ BARABÁSI

LINKED
(Conectado)

A N·ova Ciência dos Networks


Como tudo está conectado a tudo e o que isso significa
para os negócios, relações sociais e ciências

Publicação

Distribuição Exclusiva
Albert-László Barabási, um dos maiores
especialistas dos Estados Unidos na nova
ciência de networks, nos conduz a uma
aventura intelectual para provar que
networks sociais, corporações e LINKED
organismos vivos têm mais em comum (Conectado)
do que antes se imaginava Uma total
compreensão da ciência de networks irá
algum dia realçar nossa habilidade de A Nova Ciência dos Networks
projetar negócios de alto valor, Como tudo está conectado a tudo e o que isso significa
interromper a epidemia de doenças fatais para os negócios, relações sociais e ciências
e influenciar o intercâmbio de ideias e
informações.

Cativante e competente, Linked


(Conectado) proporciona um
emocionante insi9ht no século XXI da
ciência e uma nova perspectivi3- sobre a
conectividade em nosso mundo.

"Fascinante ... Linked (Conectado) é


divertido, uma exuberante brincadeira
através de um excitante campo novo."
- Time Out New York

"Extraordinário... Um olhar abrangente


em uma nova e instigante ciência"
- Donald Kennedy, Science

"Linked (Conectado) é a melhor escolha


para os leigos, porque Barabási minimiza
a matemática e escreve elegantemente."
- Detroit Free Press
Prefácio
SUMÁRIO
RicardoBorgatti Neto

Editor
MaximBehar

Tradução
Jonas Pereira dos Santos

Preparação e revisão de texto


Patrizia Zagni

Diagramação PREFÁCIO DA EDIÇÃO BRASILEIRA ..................... VII


MCTBooks PRIMEIRA CONEXÃO: Introdução. . 1
Capa SEGUNDA CONEXÃO: Universo Randômico. 8
Sergio Ng
TERCEIRA CONEXÃO: Seis Graus de Separação 23
QUARTA CONEXÃO: Mundos Pequenos . 37
Título do original norte-americano
LINKED QUINTA CONEXÃO: Hubs e Conectores 50
SEXTA CONEXÃO: Regra 80/20 .... 59
©Copyright 2002 by Albert-László Barabási
Todos os direitos reservados SÉTIMA CONEXÃO: Ricos Ficam Mais Ricos 72

©Copyright 2009 by Leopardo OITAVA CONEXÃO: Legado de Einstein . 85


Mediante contrato firmado com o editor NONA CONEXÃO: Calcanhar de Aquiles . 98
DÉCIMA CONEXÃO: Vírus e Modismos ......... 111
-·Todos os direitos adquiridos
e reservada a propriedade literária desta publicação pela DÉCIMA PRIMEIRA CONEXÃO: Despertar da Internet . 129
DÉCIMA SEGUNDA CONEXÃO: Rede Fragmentada. 143
DÉCIMA TERCEIRA CONEXÃO: Mapa da Vida. 159
DÉCIMA QUARTA CóNEXÃO: Economia em Rede 176
€,J.,-toro. ÚLTIMA CONEXÃO: Teia sem Aranha 192
LEOPARDO EDITORA
AGRADECIMENTOS 199
NOTAS ....... 201
Visite nosso site: www.leopardoeditora.com.br

Impresso no Brasil/Printed in Brazil

V
r -
PREFACIO DA EDIÇAO BRASILEIRA

De alguma forma, sempre estivemos conectados (linked) uns aos outros,


pois há pelo menos um elo comum entre todos nós: o planeta em que vivemos e
no qual tecemos a grande rede da vida. Entretanto, apenas recentemente passa­
1 mos a compreender melhor como dinâmicas de redes se desenvolvem.
Em nossa sociedade, a quantidade de conexões e a velocidade com que
ocorrem são cada vez maiores. Basta atendermos ao telefone celular para nos
conectar de imediato a outra pessoa em qualquer lugar do mundo. Algo similar
acontece quando navegamos via internet por links criados entre páginas na
Web.
Estamos cada vez mais envolvidos com o discurso de redes (networks) em
nosso dia a dia. É comum encontrarmos no discurso da mídia citações de rede
de negócio, rede de relacionamentos sociais, rede neural, rede digital e até
mesmo rede terrorista. Somos uma sociedade em rede, mesmo que nem sempre
tenhamos consciência disso.
Mas o que é uma rede? Em essência, é uma teia de nós (elementos) e links
(conexões) entre esses nós. Por exemplo, em uma rede social, cada indivíduo
pode ser cons_ideradd um nó (no sentido técnico do termo) e nossas relações
pessoais com outros indivíduos, links.
Conhecer certas propriedades da rede permite compreender por que, ape­
sar do esforço de pessoas qualificadas, muitas vezes a sociedade privilegia cer­
tos indivíduos menos capacitados. Eles podem estar sendo favorecidos pela
dinâmica da rede, ou seja, a configuração do todo, do coletivo, pode afetar a
realidade das partes.
Compreender como as redes funcionam na estruturação de mercados e no
desenvolvimento de comportamentos de compra propicia grandes insights para
os negócios. Da mesma forma, entender o surgimento de padrões comporta­
mentais coletivos pode inspirar formas de atuação de liderança.
Na natureza e sociedade, a maioria das redes é dinâmica, em razão da
mudança de comportamento de seus elementos, entrada e saída destes e altera­
ção tanto das conexões entre os elementos quanto da natureza das interações
entre os elementos conectados.
A dinâmica presente em várias redes possibilita que estas possam ser con­
sideradas sistemas complexos. Da mesma forma, a recíproca também é verda­
deira: muitos sistemas complexos são estudados como se fossem redes.

VII
Não há como negar que comportamentos de sistemas complexos - objeto
Entende-se sistema como parte da realidade que forma um todo organi­ das ciências da complexidade -, seja qual for a natureza do sistema e aborda­
zado composto de elementos inter-relacionados e complexo como algo que pos­
gem adotada, estão envolvidos com não linearidade, dinâmica evolutiva,
sui um comportamento de difícil previsibilidade, em razão das dinâmicas orga­
nizacionais não lineares. Desta forma, reconhecemos nas redes de grande auto-organização e o fenômeno da emergência de padrões não planejados. Para
importância características de sistemas complexos. entender melhor a dinâmica de redes, a compreensão desses conceitos se toma
Apesar de a análise de redes sociais sempre ter sido objeto de interesse bastante útil no estudo de um comportamento complexo.
sociológico, principalmente a partir de méados do século XX, é interessante Uma noção de não linearidade pode ser apresentada na seguinte expres­
observar que estudos mais aprofundados da dinâmica de redes, que utilizam a são: "Pequenos eventos (causas) podem proporcionar grandes consequências
evolução da teoria dos grafos com abordagem de dinâmica de sistemas e uso (efeitos) e vice-versa". Nas redes, em determinadas condições, pequenos even­
intensivo de recursos computacionais, foram desenvolvidos apenas há cerca de tos podem desencadear grandes efeitos.
dez anos, quando se procuraram alternativas às tratativas clássicas que conside­ A dinâmica evolutiva nos remete à ideia de que sistemas dinâmicos devem
ravam a formação de redes um processo puramente randômico. relacionar-se a suas mudanças históricas, pois elementos e relações estão ao
Ao ajustar ainda mais nossas lentes, é interessante constatar que podere­ -1 longo do tempo em constante transformação e com interconectividade retroa­
mos ver como redes células organismos, ecossistemas, malhas viárias e aéreas, tiva. As redes de maior importância estão em constante evolução.
centros urbanos etc., o que toma ainda mais importantes os avanços científicos Auto-organização tem sido uma das questões mais exploradas em sistemas
relacionados à compreensão do comportamento delas. complexos. Trata da dinâmica organizacional que ocorre sem a necessidade de
Definir e explicar padrões organizacionais comuns às diversas dinâmicas
um organismo central de planejamento ·- seja externo ou interno - em que as
de redes é um dos desafios explorados pelo livro Linked, que apresenta a evolu­
interações simultâneas dos seus componentes individuais podem provocar uma
ção do conhecimento científico relativo às redes, principalmente no que se re­
organização não planejada do todo. Entender esse processo tem sido um desafio
fere à exploração de conceitos, tais como: six degree (expressão que sugere que
estamos a poucos links de distância de qualquer pessoa do mundo - neste caso, no estudo de todos os sistemas complexos, o que inclui a dinâmica das redes de
a seis passos), links fracos, redes do tipo mundo pequeno (small world), redes maior importância.
em crescimento, conectores ou nós preferenciais (hubs), modelo de redes sem Emergência diz respeito a um padrão organizacional não planejado que
escala (scale-free network) - que é um tipo de rede que se caracteriza matemati­ emerge. Em sistemas complexos, tal padrão pode ocorrer em virtude da
camente por leis de potência (power laws) -, aptidão para conectividade, redes auto-organização. O estudo topológico das redes trata de identificar esses
do tipo "o vencedor leva tudo", robustez e vulnerabilidade da rede, entre padrões organizacionais emergentes.
outros. Mais do- que conhecer as partes, é necessário compreender a dinâmica
O estudo atual das redes insere-se em um contexto mais amplo do avanço organizacional por trás da formação da rede, que faz emergir a configuração da
da ciência, cujas fronteiras estão sendo desafiadas pelas chamadas "ciências da rede em determinado momento, a configuração do todo, ou seja, é fundamental
complexidade", que estão em constante evolução no estudo dos sistemas transcender o reducionismo. Entender as inter-relações simultâneas e seus
complexos. resultados não planejados é essencial para tratar os problemas complexos em
Abordagens de temas como a dinâmica de redes seguem a linha das ciên­ rede que enfrentamos, tais como apagões elétricos, epidemias, crises financeiras
cias da complexidade, em que estudos são realizados de forma inter e multidis­ e até mesmo questões sociais mais amplas, como a distribuição de riqueza.
ciplinar, ao mesmo tempo que há intenção de se identificar princípios organiza­ O século XXI, com seus desafios, necessita compreender melhor o compor­
cionais transdisciplinares.
tamento de sistemas complexos. A "ciência de network" pode contribuir tanto
Cada estágio na evolução do conteúdo dessas novas ciências provoca
novas evoluções, que afetam disciplinas diversas. Linked nos traz um desses para o desenvolvimento desse conhecimento científico como para a construção
estágios do conhecimento da dinâmica de redes para ser desafiado em sua evo­ de uma forma ampliada de pensamento mais complexo.
lução. Em especial, as descobertas e reflexões apresentadas sobre o crescimento
da Internet/Web e nossas relações com ela, que caracterizam cada vez mais Prof. Dr. Ricardo Borgatti Neto
nossa orientação em ser uma sociedade digital, levam-nos a pensar profunda­ Autor da tese de doutorado
mente nas transformações a que estamos sujeitos ao longo dos próximos anos, Perspectivas da Complexidade Aplicadas à Gestão de Empresas
assim como em novos modelos para descrever o comportamento de sistemas (Escola Politécnica da Universidade de São Paulo).
complexos.

IX
VIII
Entende-se sistema como parte da realidade que forma um todo organi­ �ão _ há como neg� que com�ortamentos de sistemas complexos - objeto
zado composto de elementos inter-relacionados e· complexo como algo que pos­ das ciencias da complexidade -, SeJa qual for a natureza do sistema e aborda­
sui um comportamento de difícil previsibilidade, em razão das dinâmicas orga­ gem adotada, estão envolvidos com não linearidade, dinâmica evolutiva
nizacionais não lineares. Desta forma, reconhecemos nas redes de grande auto-organização e o fenômeno da emergência de padrões não planejados. Par�
importância características de sistemas complexos. entender melhor a dinâmica de redes, a compreensão desses conceitos se torna
Apesar de a análise de redes sociais sempre ter sido objeto de interesse bastante útil no estudo de um comportamento complexo.
sociológico, principalmente a partir de meados do século XX, é interessante uma noção de não linearidade pode ser apresentada na seguinte expres­
observar que estudos mais aprofundados da dinâmica de redes, que utilizam a _ ,
sao:_ 'Peque1:1os eventos (causas) podem proporcionar grandes consequências
evolução da teoria dos grafos com abordagem de dinâmica de sistemas e uso (efeitos) e vice-versa". Nas redes, em determinadas condições, pequenos even­
intensivo de recursos computacionais, foram desenvolvidos apenas há cerca de tos podem desencadear grandes efeitos.
dez anos, quando se procuraram alternativas às tratativas clássicas que conside­ A dinâmica evolutiva nos remete à ideia de que sistemas dinâmicos devem
ravam a formação de redes um processo puramente randômico. relacionar-se a suas mudanças históricas, pois elementos e relações estão ao
Ao ajustar ainda mais nossas lentes, é interessante constatar que podere­
longo do tempo em constante transformação e com interconectividade retroa­
mos ver como redes células organismos, ecossistemas, malhas viárias e aéreas,
tiva. As redes de maior importância estão em constante evolução.
centros urbanos etc., o que torna ainda mais importantes os avanços científicos
relacionados à compreensão do comportamento delas. Auto-organização tem sido uma das questões mais exploradas em sistemas
Definir e explicar padrões organizacionais comuns às diversas dinâmicas complexos. Trata da dinâmica organizacional que ocorre sem a necessidade de
de redes é um dos desafios explorados pelo livro Linked, que apresenta a evolu­ �m org�s1:10 ce;1tral de planejamento - seja externo ou interno - em que as
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fere à exploração de conceitos, tais como: six degree (expressão que sugere que orgamzaçao nao pl aneJada do todo. Entender esse processo tem sido um desafio
estamos a poucos links de distância de qualquer pessoa do mundo - neste caso, no estudo de todos os sistemas complexos, o que inclui a dinâmica das redes de
a seis passos), links fracos, redes do tipo mundo pequeno (small world), redes maior importância.
em crescimento, conectores ou nós preferenciais (hubs), modelo de redes sem Emergêncic_i- diz respeito a um padrão organizacional não planejado que
escala (scale-free network) - que é um tipo de rede que se caracteriza matemati­ emerge. Em sistemas complexos, tal padrão pode ocorrer em virtude da
camente por leis de potência (power laws) -, aptidão para conectividade, redes auto-organização. O estudo topológico das redes trata de identificar esses
do tipo "o vencedor leva tudo", robustez e vulnerabilidade da rede, entre padrões organizacionais emergentes.
outros.
O estudo atual das redes insere-se em um contexto mais amplo do avanço 1:'iai � do que c�nhecer as p�es, é necessário compreender a dinâmica
orgamzac10nal �or tras da formaçao da rede, que faz emergir a configuração da
da ciência, cujas fronteiras estão sendo desafiadas pelas chamadas "ciências da rede em determmado momento, a configuração do todo, ou seja, é fundamental
complexidade", que estão- em constante evolução no estudo dos sistemas
transcender o reducionismo. Entender as inter-relações simultâneas e seus
complexos.
resultados não planejados é essencial para tratar os problemas complexos em
Abordagens de temas como a dinâmica de redes seguem a linha das ciên­
cias da complexidade, em que estudos são realizados de forma inter e multidis­ rede que enfrentamos, tais como apagões elétricos, epidemias, crises financeiras
,
ciplinar, ao mesmo tempo que há intenção de se identificar princípios organiza­ e ate mesmo questões sociais mais amplas, como a distribuição de riqueza.
cionais transdisciplinares. O sécul� XXI, com seus desafios, necessita compreender melhor o compor­
Cada estágio na evolução do conteúdo dessas novas ciências provoca tamento de sistemas complexos. A "ciência de network" pode contribuir tanto
novas evoluções, que afetam disciplinas diversas. Linked nos traz um desses para o desenvolvim�nto desse conhecimento científico como para a construção
estágios do conhecimento da dinâmica de redes para ser desafiado em sua evo­ de uma forma ampliada de pensamento mais complexo.
lução. Em especial, as descobertas e reflexões apresentadas sobre o crescimento
da Internet/Web e nossas relações com ela, que caracterizam cada vez mais Prof. Dr. Ricardo Borgatti Neto
nossa orientação em ser uma sociedade digital, levam-nos a pensar profunda­
Autor da tese de doutorado
mente nas transformações a que estamos sujeitos ao longo dos próximos anos,
assim como em novos modelos para descrever o comportamento de sistemas Perspectivas da Complexidade Aplicadas à Gestão de Empresas
complexos. (Escola Politécnica da Universidade de São Paulo).

VIlI IX
Entende-se sistema como parte da realidade que forma um todo organi­ Não há como negar que comportamentos de sistemas complexos - objeto
zado composto de elementos inter-relacionados e· complexo como algo que pos­ das ciências da complexidade -, seja qual for a natureza do sistema e aborda­
sui um comportamento de difícil previsibilidade, em razão das dinâmicas orga­ gem adotada, estão envolvidos com não linearidade, dinâmica evolutiva,
nizacionais não lineares. Desta forma, reconhecemos nas redes de grande auto-organização e o fenômeno da emergência de padrões não planejados. Para
importância características de sistemas complexos. entender melhor a dinâmica de redes, a compreensão desses conceitos se torna
Apesar de a análise de redes sociais sempre ter sido objeto de interesse bastante útil no estudo de um comportamento complexo.
sociológico, principalmente a partir de meados do século XX, é interessante Uma noção de não linearidade pode ser apresentada na seguinte expres­
observar que estudos mais aprofundados da dinâmica de redes, que utilizam a são: "Pequenos eventos (causas) podem proporcionar grandes consequências
evolução da teoria dos grafos com abordagem de dinâmica de sistemas e uso (efeitos) e vice-versa". Nas redes, em determinadas condições, pequenos even­
intensivo de recursos computacionais, foram desenvolvidos apenas há cerca de tos podem desencadear grandes efeitos.
dez anos, quando se procuraram alternativas às tratativas clássicas que conside­ A dinâmica evolutiva nos remete à ideia de que sistemas dinâmicos devem
ravam a formação de redes um processo puramente randômico. relacionar-se a suas mudanças históricas, pois elementos e relações estão ao
Ao ajustar ainda mais nossas lentes, é interessante constatar que podere­ longo do tempo em constante transformação e com interconectividade retroa­
mos ver como redes células organismos, ecossistemas, malhas viárias e aéreas, tiva. As redes de maior importância estão em constante evolução.
centros urbanos etc., o que torna ainda mais importantes os avanços científicos
Auto-organização tem sido uma das questões mais exploradas em sistemas
relacionados à compreensão do comportamento delas.
Definir e explicar padrões organizacionais comuns às diversas dinâmicas complexos. Trata da dinâmica organizacional que ocorre sem a necessidade de
de redes é um dos desafios explorados pelo livro Linked, que apresenta a evolu­ um organismo central de planejamento - seja externo ou interno - em que as
ção do conhecimento científico relativo às redes, principalmente no que se re­ interações simultâneas dos seus componentes individuais podem provocar uma
fere à exploração de conceitos, tais como: six degree (expressão que sugere que organização não planejada do todo. Entender esse processo tem sido um desafio
estamos a poucos links de distância de qualquer pessoa do mundo - neste caso, no estudo de todos os sistemas complexos, o que inclui a dinâmica das redes de
a seis passos), links fracos, redes do tipo mundo pequeno (small world), redes maior importância.
em crescimento, conectores ou nós preferenciais (hubs), modelo de redes sem Emergência diz respeito a um padrão organizacional não planejado que
escala (scale-free network) - que é um tipo de rede que se caracteriza matemati­ emerge. Em sistemas complexos, tal padrão pode ocorrer em virtude da
camente por leis de potência (power laws) -, aptidão para conectividade, redes auto-organização. O estudo topológico das redes trata de identificar esses
do tipo "o vencedor leva tudo", robustez e vulnerabilidade da rede, entre padrões organizacionais emergentes.
outros. Mais do- que conhecer as partes, é necessário compreender a dinâmica
O estudo atual das redes insere-se em um contexto mais amplo do avanço organizacional por trás da formação da rede, que faz emergir a configuração da
da ciência, cujas fronteiras estão sendo desafiadas pelas chamadas "ciências da rede em determinado momento, a configuração do todo, ou seja, é fundamental
complexidade", que estão em constante evolução no estudo dos sistemas transcender o reducionismo. Entender as inter-relações simultâneas e seus
complexos. resultados não planejados é essencial para tratar os problemas complexos em
Abordagens de temas como a dinâmica de redes seguem a linha das ciên­ rede que enfrentamos, tais como apagões elétricos, epidemias, crises financeiras
cias da complexidade, em que estudos são realizados de forma inter e multidis­ e até mesmo questões sociais mais amplas, como a distribuição de riqueza.
ciplinar, ao mesmo tempo que há intenção de se identificar princípios organiza­
cionais transdisciplinares. O século XXI, c9m seus desafios, necessita compreender melhor o compor­
Cada estágio na evolução do conteúdo dessas novas ciências provoca tamento de sistemas complexos. A "ciência de network" pode contribuir tanto
novas evoluções, que afetam disciplinas diversas. Linked nos traz um desses para o desenvolvimento desse conhecimento científico como para a construção
estágios do conhecimento da dinâmica de redes para ser desafiado em sua evo­ de uma forma ampliada de pensamento mais complexo.
lução. Em especial, as descobertas e reflexões apresentadas sobre o crescimento
da Internet/Web e nossas relações com ela, que caracterizam cada vez mais Prof. Dr. Ricardo Borgatti Neto
nossa orientação em ser uma sociedade digital, levam-nos a pensar profunda­ Autor da tese de doutorado
mente nas transformações a que estamos sujeitos ao longo dos próximos anos,
Perspectivas da Complexidade Aplicadas à Gestão de Empresas
assim como em novos modelos para descrever o comportamento de sistemas
(Escola Politécnica da Universidade de São Paulo).
complexos.

VIII IX
PRIMEIRA CONEXÃO

\._(

Introdução

Sete de fevereiro de 2000 deveria ter sido um grande dia para o Yahoo.
Em vez dos poucos milhões de clientes que diariamente se conectam à ferra­
menta de busca da Internet, bilhões de pessoas tentavam acessar o site da
empresa. Essa explosiva popularidade deveria ter transformado a companhia no
ativo mais valioso da nova economia. Havia um problema, no entanto. Todas
aquelas pessoas chegaram exatamente no mesmo instante, e nenhuma delas
procurava a cotação de uma ação ou a receita de uma torta de nozes. Pelo con­
trário, todas haviam enviado, em linguagem de computador, a seguinte mensa­
gem: "Sim, eu ouvi você!". O Yahoo, até onde se pôde perceber, nada disse.
Apesar disso, centenas de computadores nos escritórios do Yahoo, em Santa
Clara, Califórnia, estavam ocupados respondendo a esses terríveis fantasmas,
enquanto milhões de consumidores de verdade, que queriam um título de filme
ou um bilhete de passagem aérea, aguardavam. Eu era um desses consumido­
res. Naturalmente, não tinha ideia de que o Yahoo estava freneticamente ocu­
pado atendendo a 10 bilhões de fantasmas. Esperei pacientemente cerca de três
minutos antes de procurar um dispositivo de busca mais responsivo. No dia
seguinte, os reis da Web, Amazon.com, eBay, CNN.com, ETrade e Excite, sucum­
biram ao mesmo feitiço: também foram obrigados a atender bµ.hões de fantas­
mas fazendo a mesma infrutífera busca que tirou o Yahoo do ar. Os consumido­
res, com seus reluzentes cartões de crédito prontos para as compras, foram
forçados a esperar do outro lado da linha.
Evidentemente, fazer que bilhões de usuários reais de computador digitem
"Yahoo.com" em seus browsers, exatamente às 10h20 no horário do Pacífico, é
algo impossível. Simplesmente não há computadores suficientes na área. As pri­
meiras notícias atribuíam a paralisação dos principais sites de comércio eletrô­
nico à ação de um grupo de sofisticados hackers. O consenso foi que esses rene-

1
gados hackers, fascinados pelo desafio de burlar os sofisticados sistemas_ _ de
segurança, haviam assumido o controle de centenas de computadores em esco­
1.
las, laboratórios de pesquisa e em.presas e os transformado em zumbis, dizendo
milhares de vezes ao Yahoo: "Sim, eu ouvi você!". A cada segundo, um.a imensa Os primeiro:' �stãos nada m.�i� eram que um.a seita judaica renegada.
quantidade de dados era lançada nesse poderoso site da Web, em. volume bem .
Considerados excentncos e problem.aticos, foram perseguidos tanto pelos judeus
superior a sua capacidade de processamento. O maciço ataque de negação de con:i� pelas autoridades romanas. Não há evidência histórica de que seu líder
serviço que o Yahoo enfrentou desencadeou um.a ampla caçada internacional
�spmtual, J�su� de Nazaré, tenha pretendido exercer influência fora do juda­
aos hackers responsáveis. ism.o. Suas ideias eram bastante difíceis e controvertidas para os judeus e
Surpreendentemente, a propalada operação do Federal Bureau of Investi­ alc�çar os gentios parecia algo particularmente improvável. Inicialmente, ' os
gation (FBI) não levou à suposta organização ciberterrorista. Em vez disso, o N
nao Judeus que quiseram. seguir Jesus tiveram. de submeter-se à circuncisão
FBI chegou à suburbana residência de um adolescente canadense. Os investiga­ obs:1:"ar as l�is do judaísmo da época, e foram expulsos do Templo - 0 centr�
dores, ao rastrearem. um.a sala de bate-papo da Internet, por acaso ouviram. o espmtual do Judeo cristianismo primitivo. Pouquíssimos seguiram. essa via. De
adolescente solicitando sugestões para novos alvos de ataque. Ele foi preso fato, era quase �p� ssível abor;I�-los co� a mensagem.. Em um.a sociedade :frag­
vangloriando-se.
Escondido sob o pseudônimo Mafiaboy, esse jovem de 15 anos de idade n:ientada e m.atenalista, ·as noticias e as ideias propagavam-se a pé, e as distân­
cias eram longas. O cristianismo, a exemplo de muitos outros movimentos reli­
havia conseguido paralisar operações de 1 bilhão de dólares de companhias com giosos na história humana, parecia fadado ao esquecimento. Apesar das
acesso aos melhores especialistas em segurança de computador do mundo. Seria .
adver�1dades, aproxinladam.ente 2 bilhões de pessoas se declaram. cristãs hoje
ele um Davi contemporâneo que, armado com seu modesto estilingue (compu­ _
em dia. Com.o se deu isso? De que maneira as crenças heterodoxas de um.a
tador caseiro), atingira o formidável Golias da era da informação? Na alça de pequena e desdenhada seita judaica vieram a se estabelecer com.o os fundamen­
mira, os especialistas concordam. em um ponto: os ataques não foram obra de tos da religião dominante do mundo ocidental?
gênio. Foram executados com ferramentas disponíveis a qualquer pessoa em
M�it� s creditam. o triunfo do cristianismo à mensagem. proposta pela
vários sites de hacker da Web. A travessura on-line de Mafiaboy revelou que se - _
figura �stonca que hoJe conhecem.os com.o Jesus de Nazaré. Os especialistas em
tratava de um amador cujo descaso com os próprios rastros levou a polícia dire­
marketing da atualidade classificariam. sua mensagem. com.o "de adesão" _
tamente à casa de seus pais. De fato, suas ações lembravam. mais as · de um
re�e:cutia e se transmitia de geração em geração, enquanto outros movimentos
Golias que as de um Davi: sem know-how para acessar qualquer dos sites, ele
relig10sos _fracassaram. e se extinguiram.. O crédito pelo sucesso do cristianismo
atacou e, canhestro e lerdo, só procurou abater alvos fáceis, obviam.ente compu­
no entanto, caôe a um judeu ortodoxo e piedoso que nunca se 'encontrou co�
tadores vulneráveis de universidades e de pequenas em.presas, que ele simples­
Jesus. Conquanto seu nome hebraico seja Saulo, ele nos é mais bem conhecido
mente instruiu que bombardeassem. o Yahoo com mensagens.
Pode-se imaginar um garoto de 15 anos de idade, atrás da porta de seu P:l? romano, Paulo. A missão da vida de Paulo foi reprimir o cristianismo. Ele
quarto, sob o brilho da tela de seu computador, deliciando-se com o prolongado viajava de com.unidade em com.unidade perseguindo os cristãps porque conside­
ravam. Jesus, condenado pelas autoridades com.o blasfemo, Deus. Paulo recorria
"sim, eu ouvi você!", disparado contra o Yahoo. Ele deve ter gritado essa frase 1
a açoites, anátemas e excomunhões com.o forma de preservar as tradições e
milhão de vezes quando sua mãe ou pai o chamou para almoçar ou recolher o _ _ .
m.e10 de forçar os d1ss1dentes a aderir à lei judaica. Não obstante, segundo os
lixo. O ataque ocorreu com força bruta, muita energia e pouca sofisticação. Mas
relatos históricos, esse implacável perseguidor dos cristãos sofreu súbita conver­
é exatamente isso que nos leva a perguntar: "Com.o as ações desse adolescente
são no ano �4 e tornou-se o mais fervoroso paladino da nova fé, possibilitando
puderam. atingir as maiores corporações da nova economia?". Se um simples
adolescente consegue provocar estragos dessa magnitude na Internet, de que que um.a dlm.inuta seita judaica se transformasse na religião dominante do
mundo ocidental pelos 2 1nil anos seguintes.
não será capaz um pequeno grupo de profissionais treinados e capacitados?
Quão vulneráveis som.os a esses ataques? �or �ue os _esfor!os de :aulo foram bem-sucedidos? Ele percebeu que, para
o cns . 1amsm.o difundir-se alem das fronteiras do judaísmo, era preciso abolir as

barreiras que se impunham. à conversão dos gentios. A circuncisão e as rigorosas
normas alimentares precisavam. ser afrouxadas. Paulo recebeu a mensagem. dos
primeiros discípulos de Jesus em Jerusalém. e foi incumbido de continuar a
evangelização sem o requisito da circuncisão.

2 3
Paulo, no entanto, percebeu que isso ainda não era suficiente. A mensa­ 3.
gem precisava ser difundida. Utilizou, então, o conhecimento em primeira mão
de que dispunha das redes sociais do mundo civilizado do século I, de Roma a
Jerusalém, para abordar e converter o máximo de pessoas que conseguisse. Per­ "Aqui há dragões!", escreviam os antigos cartógrafos, demarcando o desco­
correu cerca de 16 mil quilômetros nos 12 anos subsequentes de sua vida. Mas nhecido ameaçador. À medida que os exploradores de aventuras incursionaram
não peregrinava ao acaso. Aportou nas principais comunidades de seu tempo e pela imensidão do globo, esses demarcadores de regiões ocupadas por monstros
chegou a povos e lugares em cujo seio a fé pudesse germinar e propagar-se de foram gradativamente desaparecendo. Não obstante, ainda há muitas áreas
maneira mais efetiva. Foi o primeiro e de longe o caixeiro-viajante de maior efi­ infestadas de dragões em nosso mapa mental a respeito de como as diferentes
cácia do cristianismo, utilizando a teologia e as redes sociais com idêntica efeti­ partes do mundo se encaixam, do universo microscópico fechado dentro de uma
vidade. Pode-se, então, atribuir a Paulo, Jesus ou à mensagem o êxito do cristia­ célula ao mundo ilimitado da Internet. A boa notícia é que recentemente os
nismo? Poderia ele ocorrer de novo? cientistas começaram a aprender a mapear nossa interconectividade. Seus
mapas estão lançando nova luz sobre nosso universo em forma de teia, ofere­
cendo surpresas e desafios que não podiam sequer ser imaginados poucos anos
atrás. Mapas detalhadôs da Internet revelaram a vulnerabilidade da rede aos
2. hackers. Mapas de companhias conectadas por transações comerciais ou víncu­
los de propriedade traçaram a trilha do poder e dinheiro no Vale do Silício'.
Mapas de interações entre espécies em ecossistemas proporcionam relances do
Há diferenças imensas entre Mafiaboy e Paulo: a ação de Mafiaboy foi des­ impacto destrutivo da humanidade sobre o ambiente. Mapas de genes atuando
trutiva. Paulo, malgrado suas intenções iniciais, edificou a ponte entre as comu­ conjuntamente em uma célula demonstram o desenvolvimento do câncer. Mas a
nidades cristãs primitivas. Ambos, contudo, possuem algo importante em verdadeira surpresa adveio da justaposição desses mapas. Da mesma forma
comum: tanto um como outro foram mestres da rede. Conquanto nenhum deles como humanos diversos compartilham esqueletos que são quase indistinguíveis,
o pensasse nesses termos, a chave de seu sucesso foi a existência de uma com­ aprendemos que esses diferentes mapas obedecem a um arcabouço comum.
plexa rede que proporcionava um efetivo meio para suas ações. Mafiaboy ope­ Recentemente, uma série de descobertas surpreendentes nos obrigou a reconhe­
rava em uma rede de computadores - a Internet é o meio mais rápido e efetivo cer que leis naturais espantosamente simples e de amplo espectro governam a
de atingir contingentes cada vez maiores de pessoas na virada do terceiro milê­ estrutura e a evolução de todas as complexas redes que nos cercam.
nio. Paulo foi mestre das conexões sociais e religiosas do século I, a única rede
dos primórdios da era moderna capaz de transmitir e difundir a fé. Nenhum
deles dominou por completo as forças que os ajudaram em suas ações. Entre­
tanto, praticamente 2 mil anos depois do apóstolo, estamos fazendo as primei­
ras incursões no sentido de ·entender qual a razão do sucesso de Paulo e Mafia­ 4.
boy. Sabemos agora que a resposta encontra-se tanto na estrutura e na
topologia das redes em que operaram quanto na capacidade de cada um deles O leitor já viu uma criança desmontar um brinquedo favorito? Viu-a cho­
navegá-las. rar depois, ao perceber que não conseguiria remontar todas as peças? Bem, eis
Paulo e Mafiaboy foram bem-sucedidos porque estavam conectados. Nossa um segredo que nunca virou manchete: desmontamos o universo e não temos
existência biológic:;i., o mundo social, a economia e as tradições religiosas rela­ ideia de como remontá-lo. Após gastar trilhões de dólares em pesquisa para des­
tam uma irresistível história de interconectividade. Como disse o grande escri­ montar· a natureza no século XX, só agora estamos reconhecendo que não dispo­
tor argentino Jorge Luis Borges, "tudo se entrelaça". mos de nenhuma pista de como prosseguir - exceto para desmontá-lo ainda
mais.
O reducionismo foi a força propulsora de boa parte da pesquisa científica
do século XX. Para compreender a natureza, segundo seus preceitos, precisamos
primeiramente decifrar seus componentes. A premissa é que uma vez compreen­
didas as partes, será fácil apreender o todo. Dividir e conquistar; o diabo está
nos detalhes. Por conseguinte, durante décadas fomos obrigados a ver o mundo

4 5
por suas partes constitutivas. Fomos instruídos .a estudar os átomos e as super­ democracia virtual à vulnerabilidade da Internet, passando pela disseminação
cordas para entender o universo; as moléculas para compreender a vida; os de vírus letais.
As redes estão por toda parte. Basta observá-las. À medida que transitar de
genes individuais para entender o complexo comportamento humano; os profe­
uma conexão à outra no decorrer deste livro, o leitor aprenderá a encarar a
tas para ver as origens de modismos e religiões.
sociedade como uma complexa rede sqcial e a perceber a pequenez deste
Agora estamos prestes a saber praticamente tudo o que há para conhecer grande mundo em que vivemos. Passará a compreender como e por que Paulo
acerca das partes. Estamos, porém, tão longe quanto sempre estivemos de obteve êxito e como, apesar de algumas diferenças óbvias, seu meio social era
entender a natureza como um todo. Com efeito, a remontagem revelou-se similar àquele que vivenciamos hoje em dia. Verá os desafios que os médicos
muito mais difícil do que previram os cientistas. A razão é simples: sob a égide enfrentam quando tentam curar uma doença, concentrando-se em uma única
do reducionismo, deparamo-nos com a dura muralha da complexidade. Apren­ célula ou gene e desconsiderando a interconectividade da matéria viva. Recor­
demos que a natureza não é um quebra-cabeça bem projetado que possui ape­ dará que Mafiaboy não está sozinho em ataques a redes. Observará como a
nas uma única forma de montagem. Em sistemas complexos, os componentes Internet, vista amiúde como criação inteiramente humana, assemelha-se mais a
podem articular-se de modos tão diferentes que levaríamos bilhões de anos para um organismo ou ecossistema, demonstrando o poder das leis fundamentais
tentar todos eles. Não obstante, a natureza reúne as partes com uma graça e que governam todas as redes. Verá como a emergência do terrorismo se pauta
precisão aguçada ao longo de milhões de anos. Ela o faz explorando as leis também pelas leis de formação de rede e perceberá como essas redes mortais se
gerais da auto-organização, cujas raízes, em ampla medida, ainda constituem aproveitam da robustez fundamental das redes da natureza. Ficará espantado
um mistério para nós. com as incríveis similaridades existentes entre sistemas tão díspares quanto a
Hoje, cada vez mais reconhecemos que nada ocorre isoladamente. Muitos economia, a célula e a Internet, utilizando um para compreender o outro. Será
eventos e fenômenos se acham conectados, são causados por uma gama de uma viagem transdisciplinar de abertura da percepção que o desafiará a superar
outras partes de um complexo quebra-cabeça universal e com elas interagem. os compartimentos estanques do reducionismo e a explorar, conexão por cone­
Começamos a perceber que vivemos em um mundo pequeno, em que tudo se xão, a revolução cie:µtífica adveniente: a nova ciência das redes.
encadeia a tudo. Estamos testemunhando uma revolução na maneira como cien­
tistas de todas as diferentes disciplinas descobrem que a complexidade possui
uma rigorosa arquitetura. Começamos a perceber a importância das redes.
Com a Internet dominando nossa vida, a palavra rede é assunto trivial de
todo mundo hoje em dia, destacando-se na razão social de empresas e em títu­
los de jornais populares. Após a tragédia de 11 de setembro, ao testemu­
nharmos a capacidade letal das redes terroristas, tivemos de nos acostumar
ainda a um outro significado do termo. Muito poucas pessoas, no entanto, se
dão conta de que a rápida evolução da ciência das redes está explicitando fenô­
menos que são bem mais excitantes e reveladores do que o casual uso da pala­
vra rede pode designar. Algumas dessas descobertas são tão recentes que muitos
dos resultados fundamentais ainda circulam como trabalhos inéditos no âmbito
da comunidade científica. Elas descortinam uma nova perspectiva sobre o
mundo interconectado que nos circunda, indicando que as redes dominarão o
novo século em um patamar bem superior ao que muitas pessoas já estão dis­
postas a reconhecer. Elas pautarão as questões fundamentais que configuram
nossa visão de mundo na era que se inicia.
Este livro tem um objetivo simples: suscitar reflexão acerca das redes. Sua
temática gira em torno da forma como as redes emergem, que configuração pos­
suem e como evoluem. Revela uma visão de natureza, sociedade e negócios cal­
cada em rede, uma nova moldura para a compreensão de questões que vão da

6 7
volumes, de 600 páginas cada um. Os últimos 17 anos da vida de Euler, entre
SEGUNDA CONEXÃO seu retomo a São Petersburgo, em 1766, e sua morte, aos 76 anos de idade,
foram bastante tumultuados. Entretanto, apesar das muitas tragédias pessoais,
cercá. de metade de suas obras foi escrita durante esses anos. Compreendem um
tratado de 775 páginas sobre o movimento da lua, um influente manual de
Universo Randômico álgebra e uma discussão em três volumes sobre cálculo integral, concluído
enquanto ele continuava a publicar uma média de um trabalho matemático por
semana no jornal da Universidade de São Petersburgo. O espantoso é que ele
mal escreveu ou leu uma única linha durante esse tempo. Tendo perdido parci­
almente a visão logo após retomar a São Petersburgo em 1766, Euler ficou com­
pletamente cego após uma cirurgia malsucedida de catarata em 1771. Os milha­
res de páginas dos teoremas foram todos ditados de memória.
Três décadas antes, com a visão intacta, Euler escrevera um sucinto traba­
lho abordando um intrigante problema que havia se originado em Kõnigsberg,
cidade não muito distante de sua residência em São Petersburgo. Kõnigsberg,
próspera cidade da Prússia oriental, não desconfiava, no começo do século
Em 18 de setembro de 1783, na cidade de São Petersburgo, Leonhard XVIII, do triste destino e da dilaceração -da guerra que a esperavam como palco
Euler iniciou sua jornada como de costume. Deu aula de matemática a um de de uma das mais ferozes batalhas da Segunda Guerra Mundial. Esboços contem­
seus netos e fez alguns cálculos sobre o voo de balões. Exatamente três meses porâneos mostram uma florescente cidade às margens do Pregel, onde um trá­
antes, no sul de Lyon, os irmãos Montgolfier haviam lançado um enorme balão fego intenso de · navios e seu comércio ofereciam uma confortável vida aos
que alcançara 6.500 pés de altitude e aterrissara com segurança a cerca de uma comerciantes locais--'e às famílias destes. A pujante economia permitiu à admi­
milha de distância. Euler estava trabalhando na mecânica do movimento dos nistração da cidade construir pelo menos sete pontes sobre o rio. Muitas delas
balões, enquanto os irmãos Montgolfier preparavam-se para lançar uma ovelha, ligavam a elegante ilha Kneiphof, encravada entre as duas margens do Pregel, a
um pato e uma galinha ao ar, diante do rei Luís XVI, em Paris, um voo que ocor­ outras regiões da cidade. Duas pontes adicionais cruzavam as duas margens do
reu no dia seguinte, em 19 de setembro. Euler, porém, nunca ouvira falar do rio (Figura 2.1) . A população de Kõnigsberg, desfrutando uma éRoca de paz e
evento. Após almoçar, trabalhando com seus assistentes, efetuou alguns cálcu­ prosperidade; entretinha-se com quebra-cabeças do tipo: "Pode-se cruzar as sete
los sobre a órbita do planeta Urano, recentemente descoberto. As equações por pontes sem jamais passar pela mesma ponte duas vezes?". Ninguém conseguira
ele formuladas, capturando a peculiar órbita do planeta, levariam, décadas mais descobrir tal caminho até a construção de uma nova ponte em 1875.
tarde, à descoberta do plan_eta Plutão1• Euler tampouco viveu para testemunhar
Quase 150 anos antes da nova ponte, em 1736, Euler propusera uma rigo­
essa descoberta. Aproximadamente às cinco horas da tarde, sofreu uma hemor­
rosa demonstração matemática estabelecendo que, com as sete pontes, esse
ragia cerebral e disse: "Estou morrendo", antes de perder a consciência. Faleceu
caminho não existia. Ele não só resolveu o problema de Kõnigsberg, mas
naquela noite, encerrando a mais prolífica carreira de todos os tempos na
matemática. também, em seu sucinto trabalho, sem querer acabou desbravando um imenso
Euler, matemático suíço que fez carreira em Berlim e São Petersburgo, ramo da matemática conhecido como a teoria dos grafos. Atualmente, essa teo­
exerceu extraordinária influência sobre todos os campos da matemática, física e ria constitui a base de nosso pensamento acerca das redes. Séculos depois de
engenharia. Surpreende não apenas pela importância de suas descobertas ini­ Euler, ela se tomou um campo perfeitamente desenvolvido, que tem recebido a
gualáveis, mas também pela quantidade de sua produção. Opera Omnia, o regis­ contribuição de grandes matemáticos. Visando a descortinar o domínio das
tro ainda incompleto das obras coligidas de Euler, perfaz atualmente mais de 73 redes, vamos retomar rapidamente o raciocínio que levou Euler à introdução do
primeiro grafo.
1 Até 2006, Plutão era considerado um planeta principal. Após a descoberta de vários corpos celestes
de tamanhos comparáveis e até mesmo de um objeto maior no Cinturão de Kuiper, passou a
denominar-se planeta-anão.

8 9
e A prova euleriana de que em Kõnigsberg não havia passagem que cruzasse
todas as sete pontes uma única vez ba�eou-se em uma observação simples. Nós
que possuem um número ímpar de links devem ser o ponto de partida ou de
chegada do percurso. Uma passagem contínua que atravessasse todas as pontes
só podia ter um único ponto de partida e um ponto de chegada. Por conse­
guinte, esse caminho não poderia existir em um grafo que tivesse mais de dois
nós com um número ímpar de links. Como o grafo de Kõnigsberg tinha quatro
desses nós, não era possível encontrar o caminho desejado.
Para nosso propósito, o aspecto mais importante da prova de Euler é que a
existência do caminho não depende de nossa ingenuidade para encontrá-lo.
Trata-se, mais exatamente, de uma propriedade do grafo. Dado o layout das pon­
tes de Kõnigsberg, independentemente de nossa perspicácia, jamais conseguire­
mos encontrar o caminho desejado. A população de Kõnigsberg finalmente.con­
cordou com Euler, desistiu das tentativas infrutíferas e, em 1875, construiu uma
nova ponte entre B e C, incrementando a quantidade de links desses dois nós
para quatro. Agora, apenas dois nós (A e D), com um número ímpar de links,
B subsistem. Ficou mais simples encontrar o caminho desejado. Será que a criação
desse caminho foi o raciocínio subjacente à construção da ponte?
Figura 2.1. Pontes de Konigsberg: o layout de Kõnigsberg antes de 1875, com a ilha de Em retrospectiva, a mensagem involuntária de Euler é muito simples: gra­
Kneiphof (A) e a faixa de terra D encravada entre as duas vertentes do rio Pregel. Para fos ou redes possuem propriedades, ·ocultas em sua construção, que limitam ou
solucionar o problema de Kõnigsberg, foi preciso encontrar um caminho em volta da intensificam nossa capacidade de lidar com eles. Por mais de dois séculos, o
cidade que fizesse uma pessoa cruzar cada ponte apenas uma vez. Em 1736, Leonhard layout do grafo de Kõnigsberg limitou a capacidade de seus cidadãos resolverem
Euler inventou a teoria dos grafos ao substituir cada uma das quatro faixas de terra por o problema de seus cafés. Contudo, uma mudança no layout, a adição de apenas
nós (A a D) e cada ponte por um link (a a g), obtendo um grafo formado por quatro nós
um link extra, repentinamente eliminou essa restrição.
e sete links. A partir do grafo de Kõnigsberg, ele provou, então, que não há uma rota que
cruze cada link apenas uma vez. De �uitas formas, o resultado obtido por Euler simboliza umà importante
mensagem deste livro: a construção e a estrutura de grafos ou redes são a chave
para compreender o complexo mundo que nos rodeia. Pequenas mudanças na
topologia, afetando tão somente alguns poucos nós ou links, podem abrir portas
1. ocultas, permitindo a emergência de novas possibilidades.
A teoria dos grafos desenvolveu-se bastante após Euler, com contribuições
feitas pelos expoentes da matemática, como Cauchy, Hamilton, Cayley, Kirch­
A demonstração de Euler é simples e elegante, facilmente compreensível
hoff e Pólya. Eles simplesmente revelaram tudo quanto se conhece acerca de
até por aqueles que não têm formação matemática. Mas não foi a demonstração
grandes, mas ordenados grafos, como a treliça formada por átomos em um cris­
que fez história, e, sim, a etapa intermediária que ele adotou para resolver o
tal ou a treliça hexagonal formada pelas abelhas em uma colmeia. Até meados
problema. A grande sacada de Euler foi encarar as pontes de Kõnigsberg como
do século XX, o objetivo da teoria dos grafos era simples: descobrir e catalogar
um grafo, um conjunto de nós conectados por links. Para tanto, ele utilizou nós
as propriedades dos vários grafos. Os célebres problemas consistiam em encon­
a fim de representar cada uma das quatro faixas de terra separadas pelo rio, dis­
trar um meio de escapar de um labirinto, o que foi resolvido primeiramente em
tinguindo-as com as letras A, B, C e D. Em seguida, chamou as pontes de links e
1873, ou encontrar uma sequência de movimentos com um cavaleiro em um
conectou por linhas aqueles trechos de terra interligados por uma ponte. Euler
tabuleiro de xadrez, de tal forma que cada quadrado fosse visitado apenas uma
obteve, então, um grafo cujos nós eram as faixas de terra e cujos links eram as
vez e o cavaleiro retornasse a seu ponto de partida. Alguns dos problemas mais
pontes.
difíceis permaneceram insolúveis durante séculos.

10 11
nosso pensamento acerca das redes que ainda estamos lutando por nos desven­
Dois séculos depois da inspiradora obra. de Euler, o foco da atenção dos
cilhar de seu domínio.
matemáticos se deslocou do estudo das propriedades dos vários grafos para a
formulação da questão fundamental, ou seja, como se formam os grafos ou, em
termos mais comuns, como se formam as redes. De fato, como se estruturam as
redes reais? Que leis governam sua forma e estrutura? Essas questões e a pri­
meira resposta que se lhes deu não foram suscitadas antes da década de 1950, 3.
quando dois matemáticos húngaros revolucionaram a teoria dos grafos.

Organize uma festa para uma centena de pessoas que foram escolhidas e
convidadas porque não conhecem nenhuma outra pessoa da lista de convida­
2. dos. Ofereça vinho e queijo a esse grupo de estranhos, e eles imediatamente
começarão a conversar, porque o desejo inato dos seres humanos de encontrar e
Em uma tarde da Budapeste do final de 1920, um jovem de 17 anos de conhecer outras pessoas inevitavelmente os reúne. Logo veremos de 30 -a 40
idade que caminhava de maneira esquisita pelas ruas deteve-se diante de uma grupos de duas ou três pessoas cada um. Comente agora com um dos convida­
elegante sapataria que vendia calçados sob medida. Em razão da estranha ana­ dos que o vinho tinto das garrafas verde-escuras sem rótulo é um raro Porto
tomia de seus pés, nos quais sapatos de forma normal jamais entrariam, justifi­ envelhecido 20 anos, bem melhor do que.aquele de rótulo vermelho. Peça, con­
cava-se que ele recorresse a um sapateiro. Mas o motivo dessa visita não era a tudo, que esse convidado partilhe essa informação apenas com seus novos
aquisição de novos sapatos. Após bater à porta da loja - com uma atitude que conhecidos. Você sabe que seu caro vinho do Porto é perfeitamente seguro, por­
deve ter parecido tão inusitada naquela época quanto o seria hoje -, o rapaz que seu amigo só. teve tempo de encontrar duas ou três pessoas no recinto.
entrou no estabelecimento, sem dar atenção à vendedora no balcão, e dirigiu-se Entretanto os convidados inevitavelmente ficarão entediados conversando com
a um garoto de 14 anos de idade que se encontrava no fundo da loja. a mesma ;essoa por muito tempo e irão se juntar a outros grupos. Um observa­
"Diga um número de quatro dígitos", pediu. dor externo não perceberia nada de especial. Não obstante, existem conexões
"2.532", respondeu o rapaz de olhos arregalados diante da estranha cria­ sociais invisíveis entre pessoas que se encontraram antes, mas agora pertencem
tura. O rapaz mais velho, contudo, não o deixou nesse estado de perplexidade a grupos diferentes. Como consequência, sutis ligações começam a 'conectar pes­
por muito tempo. soas que ainda são estranhas entre si. Por exemplo, embora John ainda não
"O quadrado desse número é 6.441.024", prosseguiu ele. "Desculpe, estou tenha encontrado Mary, ambos já encontraram Mike, portanto existe uma liga­
ficando velho e não consigo lhe dizer o cubo. Quantas provas do teorema de ção de John a Mary através de Mike. Se John conhecer o vinho, há chances de
Pitágoras você conhece"? que agora Mary também o conheça, pois pode ter sido informada por Mike, que
"Uma", respondeu o mâis jovem. dele soube por intermédio de John. Com o passar do tempo, os convidados fica­
"Eu conheço trinta e sete", e, sem respirar, continuou. ''Você sabia que os rão cada vez mais emaranhados por esses elos intangíveis, c;riando uma fina teia
pontos de uma linha reta não formam um conjunto contável?" Após apresentar de conhecidos que inclui uma parcela considerável dos convidados. O caro
a elegante prova do jovem Cantor como evidência e dando por terminado o que vinho está cada vez mais ameaçado à medida que sua identidade se desloca de
ali fora fazer, ele disse: "Preciso correr". Deu meia-volta e saiu precipitadamente um pequeno grupo . de íntimos para mais e mais grupos de bate-papo
da loja. (Figura 2.2).
Paul Erdós apressou-se em tornar-se um gênio soberano e o indivíduo mais Admitindo-se que cada pessoa transmita a informação a todos os seus
desajustado do século XX. Escreveu mais de 1.500 trabalhos matemáticos antes
novos conhecidos, a reputação do fino Porto chegará ao conhecimento de todos
de sua morte, ocorrida em 1996. Esse resultado, sem paralelo desde Euler, com­ os convidados antes do final da festa? Decerto, se todos viessem a se conhecer,
preendia oito artigos publicados com outro matemático húngaro, Alfréd Rényi.
todo mundo estaria vertendo o vinho superior da garrafa sem rótulo. Entre­
Esses oito trabalhos abordavam pela primeira vez na história a questão mais
tanto, se cada abordagem durar apenas dez minutos, levará cerca de 16 horas
fundamental pertinente à compreensão de nosso universo interconectado. Como
para encontrar todos os 99 convidados restantes. Festas raramente duram tanto
as redes se formam? A solução que eles propuseram lançou as bases da teoria
tempo. Logo, você poderia achar que deveria revelar a identidade do vinho a
das redes randômicas. Essa sofisticada teoria determinou tão profundamente

13
12
os nós, e cada encontro cria um elo social entre eles. É assim que surge uma
rede de conhecidos - um grafo -, um aglomerado (cluster) de nós conectados
por links. Computadores conectados por linhas telefônicas, moléculas de nosso
corpo conectadas por reações bioquímicas, empresas e clientes conectados por
transações comerciais, células nervosas conectadas por axônios, ilhas conecta­
das por pontes, todos esses são exemplos de grafos. Independentemente da
identidade e da natureza dos nós e dos links, para um matemático eles formam
o mesmo animal: um grafo ou uma rede.
Não obstante sua sofisticação, simplificar todas as redes em grafos é algo
que suscita alguns desafios formidáveis. Se a sociedade, a Internet, uma célula
ou o cérebro podem ser representados por grafos, cada um deles é claramente
bastante diferente entre si. É difícil imaginar que exista muito em comum entre
Figura 2.2. A festa: em uma festa com dez convidados, em que, a princípio, nenhum a sociedade humana, na qual fazemos amigos e conhecidos por intermédio de
deles conhece o outro, formam-se laços sociais à medida que os convivas começam a uma combinação de encontros casuais e decisões conscientes, e a célula, nâ qual
conversar em pequenos grupos. De início, os grupos são isolados uns dos outros (painel leis inexoráveis da química e da física governam todas as reações entre as molé­
esquerdo). De fato, conquanto haja vínculos sociais (ilustrados como linhas contínuas) culas. Deve haver uma nítida diferença nas regras que governam a localização
entre os que se acham no mesmo grupo, quem quer que esteja fora desse grupo ainda é de links nas várias redes que encontramos na natureza. Descobrir · um modelo
um estranho. Com o passar do tempo (painel direito), três convidados se deslocam para para descrever todos esses diferentes sistemas parece, à primeira vista, um desa­
diferentes grupos, emergindo então um gigantesco agrupamento. Embora nem todo fio intransponível.
mundo conheça todo mundo, existe agora uma única rede social que abarca todos os Apesar disso; o objetivo último de todos os cientistas é encontrar a explica­
convidados. Seguindo os· vínculos sociais, é possível agora encontrar um caminho por çi;í.o mais simples possível para fenômenos muito complexos. Erdós e Rényi acei­
entre dois convidados quaisquer. taram esse desafio ao proporem uma sofisticada formulação· m_atemática para
seu amigo e esperar sensatamente que alguns serão deixados para o final da descrever todos os grafos complexos em um único esquema. Como diferentes
festa. sistemas obedecem a regras díspares na configuração de suas próprias redes,
Erdós e Rényi deliberadamente desconsideraram essa diversidade e propuseram
Paul Erdós e Alfréd Rényi se permitiram discordar. "Um matemático é uma
a solução mais simples que a natureza poderia adotar: conectar os nós aleatoria­
máquina que transforma café em teoremas", costumava dizer Erdós, citando
mente. Eles decidiram que a maneira mais simples de criar uma rede era jogar
Rényi. Uma xícara de café particularmente sortuda transformou-se em um teo­
da.dos: escolha dois nós e, se rolar um seis, crie um link entre eles. Para qual­
rema muito citado: se cadª pessoa conhecer pelo menos um outro convidado,
quer outro, role os dados, não conecte esses dois nós, mas escolha um par dife­
então logo todo mundo estará tomando o Porto reserva. De acordo com Erdós e
rente e comece de novo. Dessa forma, Erdós e Rényi encaravam os grafos e o
Rényi, transcorreriam apenas 30 minutos para que se formasse uma única rede
mundo que eles representam como fundamentalmente aleatórios.
social invisível comportando todos os convidados na sala. Minutos após ter
ouvido a recomendação do vinho, você pode se encontrar vertendo uma garrafa "Há muito se discute", Erdós gostava de dizer, "se criamos a matemática
vazia em sua sequiosa taça. ou se simplesmente a descobrimos. Em outras palavras, as verdades já estão
dadas, mesmo que ainda não as conheçamos?" Erdós tinha uma resposta clara
para essa questão: as verdades matemáticas participam do rol de verdades abso­
lutas, e nós apenas as descobrimos. A teoria randômica dos grafos, tão elegante
e simples, parecia-lhe pertencer às verdades eternas. Hoje, no entanto, sabemos
4. que as redes aleatórias desempenharam reduzido papel na montagem de nosso
universo. Em vez disso, a natureza serviu-se de poucas leis fundamentais, que
Os convidados que encontramos no coquetel são parte de um problema na serão reveladas nos capítulos seguintes. O próprio Erdós criou verdades mate­
máticas e uma visão alternativa de nosso mundo ao desenvolver a teoria randô­
teoria dos grafos, o ramo da matemática iniciado por Euler. Os convidados são
mica de grafos. ·Por não conhecer as leis da natureza ao criar o cérebro .e a socie-

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dade, Erdós arriscou seu melhor palpite ao admitir que Deus aprecia jogar mesma forma, existe um caminho entre dois neuroruos quaisquer em nosso
dados. Seu amigo Albert Einstein, em Princeton, estava convencido do oposto: cérebro, entre duas companhias quaisquer- no mundo, entre duas substâncias
"Deus não joga dados com o universo". químicas quaisquer em nosso corpo. Nada se exclui dessa rede altamente inter­
conectada da vida. Paul Erdós e Alfréd Rényi nos explicaram por quê: se requer
apenas um link por nó para ficar conectado - um conhecido por pessoa, um link
com pelo menos um outro neurônio para cada neurônio no cérebro, a capaci­
5. dade de participar pelo menos de uma reação para cada substância química em
nosso corpo, operação comercial com pelo menos uma outra companhia no
mundo dos negócios. Um é o limiar. Se os nós tiverem menos de urp.a conexão
Voltemos a nosso coquetel e exercitemos a teoria randômica dos grafos. em média, então nossa rede se fragmentará em pequenos aglomerados incomu­
Comecemos com um grande número de nós isolados. Em seguida, aleatoria­ nicáveis. Se houver mais de uma conexão por nó, esse risco tornar-se-á remoto.
mente, insiramos links entre os nós, reproduzindo os encontros casuais entre . os A natureza, repetitiva e extravagantemente, excede o mínimo de um link.
convidados. Se acrescentarmos apenas algumas conexões, a única consequência Os sociólogos estimam que conheçamos entre 200 e 5 mil pessoas por nome.
de nossa atividade é que alguns dos nós se emparelharão. Se continuarmos Um neurônio médio está conectado a dezenas de outros, alguns a milhares
acrescentando links, inevitavelmente conectaremos alguns desses pares entre si, mesmo. Cada companhia inevitavelmente está ligada a centenas de fornecedo­
formando aglomerados de diversos nós. Entretanto, quando acrescentarmos res e clientes; algumas das maiores possuem vínculos com milhões. Em nosso
links suficientes para que cada nó tenha uma média de um link, então ocorrerá corpo, muitas moléculas participam de mais de uma única reação - algumas,
um milagre: emergirá um grande e único aglomerado gigante (cluster). Em como a água, de centenas. Por conseguinte, verdadeiras redes não apenas estão
outras palavras, muitos nós farão parte de um único aglomerado, de tal sorte conectadas, como superam de longe o limiar de um único link. A teoria randô­
que, partindo de qualquer nó, poderemos chegar a qualquer outro navegando mica das redes nos diz que ,enquanto o número médio de links por nó extrapola
pelos links existentes entre os nós. Esse é o momento em que nosso caro vinho o crítico de um, o número de nós excluídos do aglomerado gigantesco decresce
está em perigo, pois um rumor pode chegar a qualquer um que pertença ao exponencialmente. Em outras palavras, quanto mais links acrescentamos, mais
gigantesco aglomerado. Os matemáticos designam esse fenômeno como a emer­ difícil se torna encontrar um nó que permaneça isolado. A natureza não corre
gência de um gigantesco componente, aquele que engloba uma grande fração risco mantendo-se próxima do . limiar. Ela vai bem além. Consequent�mente, as
de todos os nós. Os físicos chamam-no de percolação e nos dirão que apenas tes­ redes que nos cercam não são apenas redes. São verdadeiras redes densas das
temunhamos uma transição de fase, semelhante ao momento em que a água quais nada pode- escapar e dentro das quais todo nó é navegável. Eis por que
congela. Os sociólogos diriam que nossos sujeitos simplesmente formaram uma não existem ilhas de pessoas completamente isoladas da sociedade em sentido
comunidade. Muito embora diferentes disciplinas possam dispor de terminolo­ amplo e por que todas as moléculas em nosso corpo estão integradas em um
gia diversa para designar o fenômeno, todas concordarão que, quando pinçamos único mapa celular complexo. Isso explica por que a mensagem do apóstolo
e conectamos aleatoriamenté pares de nós juntos em uma rede, ocorre algo Paulo chegou a pessoas com quem ele_ nunca se encontrou; explica também por
especial: a rede, após comportar um número crítico de links, drasticamente que Mafiaboy ganhou manchetes: ao longo dos links, suas ações facilmente afe­
muda. Antes, tínhamos grupos de pequenos aglomerados isolados de nós, dife­ taram milhões de pessoas.
rentes grupos de pessoas que se comunicavam apenas dentro dos grupos.
Depois, um aglomerado gigante, formado por quase todos os convidados.

7.
6. A descoberta d e Erdós e Rényi desse momento muito especial em que
surge um aglomerado gigante mediante uma transição de fase ou percolação foi
Somos tõdos parte de um grande aglomerado, a rede social mundial, da um acontecimento extraordinário na teoria dos grafos, mas não por ter feito a
qual ninguém é excluído. Não conhecemos todas as pessoas deste planeta, mas incrível previsão de que se requer apenas um conhecido para que se forme uma
existe um caminho entre qualquer um de nós dois nessa rede de indivíduos. Da sociedade. Pelo- contrário, foi grandiosa porque, antes de Erdós e de Rényi, a

16 17
vel busca pela verdade matemática. A única proposta de emprego permanente
teoria dos grafos não lidava com coquetéis, redes sociais ou grafos aleatórios. que recebeu foi da Universidade de Notre Dame, em South Bend, Indiana.
Co�centrava-se quase exclusivamente em grafos regulares, sem qualquer ambi­ Arnold Ross, à época chefe do Departamento · de Matemática, ofereceu a Erdós o
guidade acerca de sua estrutura. Quando, porém, se trata de sistemas comple­ cargo de professor visitante em condições bastante generosas: ele poderia vir e
xos como � Inte�ne: ou a célula, os grafos regulares são a exceção, e não a voltar conforme lhe apetecesse, desde que tivesse um assistente que retomasse
regra. Erdos e Renyi reconheceram pela primeira vez que os grafos reais, das as preleções a partir de onde houvesse parado.
redes sociais às linhas telefônicas, não são comportados e regulares e sim irre­
Faculdade católico-liberal de artes, Notre Dame não era a Universidade de
me��velmente complicados Subju�ados por sua complexidade, E;dós e R.ényi
ponta que viria a tornar-se décadas mais tarde. Apesar disso, proporcionou a
adm1trram que essas redes sao randomicas.
,:
Erdós um ambiente de trabalho sossegado e confortável, bem como a oportuni­
Em retrospe�va, não é de surpreender que tenha sido essa improvável dade de frequentes discussões com seus colegas sacerdotes, que Erdós, com sua
,
dupla �e mate�ancos �ue causou reviravoltas em um respeitável campo da perspectiva única acerca do universo e da divindade, particularmente apreciava.
.
matemanca ao mtroduzrr a aleatoridade em seu bojo. Acaso e aleatoridade · Indagado certa vez sobre o tempo que lá passara, respondeu: "Há sinais
cons�tuíam parte muito importante da vida de Erdós e de Rényi. Muito embora demais", uma referência aos numerosos crucifixos existentes no campus.
,
Renyi fosse sete anos mais jovem que Erdós, eles se conheceram graças à ami­ Quando Notre Dame finalmente lhe propôs que seu regime de trabalho se tor­
zade que havia entre seus pais em Budapeste. Mais ou menos na época em que nasse permanente, nas mesmas condições confortáveis que desfrutava como
começaram a trabalhar juntos, após se encontrarem em Amsterdã em 1948 visitante, Erdós polidamente recusou. Abrir mão da aleatoriedade e imprevisibi­
�?os haviam vi�do tempos difíceis. Vítima das leis do Numems Clausus qu� lidade que haviam caracterizado sua vida talvez lhe fosse algo fora do comum
limitavam o connngente de judeus admitidos à universidade, Rényi trabalhou incorporar.
em um estaleiro após concluir os estudos secundários. Tendo vencido uma com­
petição em matemática e grego, obteve autorização para frequentar a Universi­
dade em 1939. Logo em seguida, após concluir seus estudos matemáticos foi
convocado para trabalho forçado, do qual de algum modo escapou. 8.
. Erdós e seus �olegas, que conheciam as atividades de resistência de Rényi
durante a gue?"a, nnham profunda admiração e respeito por ele. Rényi, corajo­
samente, se �sfarçara com o uniforme dos fascistas húngaros, nyilas, para aju­ O encontro em Amsterdã entre Erdós e Rényi foi o início de uma estreita
d�r s_eus amigos a escapar dos campos de concentração. Segundo se conta; amizade e colaboração que resultou em mais de 30 publicações conjuntas antes
Renyi entrou no gueto de Budapeste vestido de soldado nyila e conseguiu acom­ da morte prematura de Rényi, aos 49 anos de idade, em 1970. Entre essas
panhar seus pais. Ele também viveu durante anos em uma Budapeste contro­ publicações, encontravam-se os oito lendários trabalhos sobre a teoria dos gra­
lad� pelos nazistas utilizando documentos falsos. Só os que têm consciência da fos. O primeiro, publicado mais de uma década após o encontro de Amsterdã,
realida�� do terror _nazista .cons_eguem apreciar verdadeiramente a coragem abordava pela primeira vez importantes questões concernentes à formação · dos
necessaria para prancar tais atos. Não surpreende que a capacidade de Rényi grafos. O uso que faziam da aleatoridade para tentar resolver os problemas da
para concentrar-se em matemática tenha se restringido profundamente até 0 teoria dos grafos se toma mais evidente quando atentamos para a quantidade
fim da guerra, quando, em 1946, ele viajou a Leningrado para prosseguir seus de links que os nós possuem em um grafo ou rede. Os grafos regulares são úni­
estudos. Ali sua criatividade eclodiu. Não só aprendeu e absorveu a teoria dos cos no sentido de que cada nó possui exatamente o mesmo número de links. De
números em ten,i-po recorde, apesar das limitações que o idioma russo lhe impu­ fato, em uma rede bidimensional de linhas perpendiculares formando uma sim­
nha, mas tambem demonstrou alguns teoremas fundamentais a partir de um ples treliça quadrada, cada nó possui exatamente quatro links, ou em uma tre­
dos problemas notoriamente difíceis da teoria dos números, a conjectura de liça hexagonal de uma colmeia, cada nó se conecta a exatamente outros três.
Goldbach. Desse modo, quando encontrou Erdós dois anos mais tarde em Essa regularidade está nitidamente ausente dos grafos randômicos. A pre­
missa do modelo randômico de rede é profundamente igualitária: estabelece­
1:111sterdã, Rényi já não era o jovem aspirante de matemática e o amigo da famí- mos os links de maneira absolutamente aleatória; dessa forma, todos os nós
lia, mas um renomado cientista de reputação internacional.
possuem a mesma chance de obter um link - exatamente como em Las Vegas,
Erdós, nessa época, já desenvolvera o estilo de vida de matemático itine­ onde supostamente todos os jogadores têm chances iguais de ganhar o prêmio.
rante que era sua marca registrada. Surgia na soleira da porta de .seus colegas e Ao final do dia, contudo, só alguns de nossos companheiros de jogo saem mais
proclamava: "Meu cérebro está aberto", um convite a juntarem-se a sua incansá-

19
18
�-
ricos. Similarmente, se inserirmos os links aleatoriamente em\1m grafo, alguns
nós obterão mais links que outros. Alguns podem até ter azar de não conseguir 9.
nada durante algum tempo. O mundo randômico de Erdós e Rényi pode ser
simultaneamente injusto e generoso: pode tomar alguns pobres, e outros, ricos. A teoria randômica de rede de Erdós e Rényi dominou o pensamento cien­
Entretanto, uma importante predição da teoria de Erdós e Rényi nos diz que só tífico das redes desde sua introdução, em 1959. Criou vários paradigmas que
aparentemente isso acontece. Se a rede é grande, apesar da localização absolu­ estão, consciente ou inconscientemente, gravados na mente de qualquer pessoa
tamente aleatória dos links, quase todos os nós terão aproximadamente o mesmo. que trabalhe com redes. Equiparou complexidade a aleatoridade. Se uma rede
número de links. era complexa demais para ser apreendida em termos simples, exigia que a des­
Uma forma de visualizar isso é entrevistar todos os convidados à medida crevêssemos como randômica. Com certeza, a sociedade, a célula, as redes .de
que saírem do coquetel, perguntando-lhes quantos conhecidos fizeram. Quando comunicação e a economia são suficientemente complexas para ser descritas
todos tiverem partido, poderemos desenhar um histograma representando como randômicas.
quantos convidados têm um, dois ou exatamente k novos conhecidos. Para o
O leitor pode estar pensandõ que há algo duvidoso em relação a esse uni­
modelo de rede randômica de Erdós e Rényi, o formato do histogramá foi deri­
verso randômico no qual todos os nós são iguais. Seria eu capaz de escrever este
vado e testado exatamente em 1982 por um dos alunos de Erdós, Béla Bollobás,
livro se as moléculas em meu corpo decidissem reagir umas às outras em termos
professor de matemática da Universidade de Memphis, nos Estados Unidos, e do
aleatórios? Haveria nações, Estados, escolas e igrejas ou quaisquer outras mani­
Trinity College, no Reino Unido. O resultado mostra que o histograma segue
festações de ordem social se as pessoas interagissem umas com as outras de
uma distribuição de Poisson, que possui algumas propriedades únicas que nos
maneira absolutamente randômica? Haveria economia se as empresas escolhes­
acompanharão ao longo deste livro. Uma distribuição de Poisson possui um pico
sem seus clientes ao acaso, substituindo seus vendedores por milhões de dados?
proeminente, indicando que a maioria dos nós tem o mesmo número de links
A maioria das pessoas sente que não vive em um mundo aleatório como esse -
que a média dos nós. Dos dois lados do pico, a distribuição rapidamente dimi­
que deve haver alguma orde� por trás desses complexos sistemas.
nui, tomando extremamente raros desvios significativos a partir da média.
Convertida para uma sociedade de mais 6 bilhões de pessoas, uma distri­ Por que, então, dois intelectos tão inigualáveis como os de Erdós e Rényi
buição de Poisson nos diz que muitas destas possuem aproximadamente o escolheriam modelar a emergência das redes como um processo totalmente ran­
mesmo número de amigos e de conhecidos. Prediz que é exponencialmente raro dômico? A resposta é simples: eles nunca planejaram propor um; teoria univer­
encontrar alguém que se desvie da média tendo consideravelmente mais ou um sal de formação de rede. Estavam bem mais intrigados com a beleza matemática
pouco menos links do que o indivíduo médio. Por conseguinte, a teoria randô- · das redes randômicas do que com a capacidade do modelo para apreender fiel­
mica dos grafos prediz que se alocarmos links sociais ao acaso, chegaremos a mente as redes que a natureza criou em tomo de si. Certamente, em seu traba­
uma sociedade extremamente democrática, na qual todos somos média e muitÓ lho original de 1959, Erdós e Rényi, de fato, mencionaram que "a evolução dos
poucos, desvio da norma para ser tipos extremamente sociais ou absolutamente grafos pode ser considerada antes um modelo simplificado da evoluçãd de cer­
associais. Obtemos uma reáé de estrutura bastante uniforme na qual a média é tas redes de comunicação (ferrovia, rodovia ou sistemas de rede elétrica)". Con­
a norma. tudo, apesar dessa breve incursão pelo mundo real, o trabalho deles nessa área
O universo randômico de Erdós e Rényi é dominado pelas médias. Prediz foi motivado mais por uma profunda· curiosidade em relação às profundidades
que a maioria das pessoas possui aproximadamente o mesmo número de conhe­ matemáticas do problema do que por suas aplicações.
cidos; a maioria dos neurônios conecta-se aproximadamente ao mesmo número Erdós seria o primeiro a concordar conosco que redes reais devem ter prin­
de outros neurônios; a maioria das empresas negocia com aproximadamente o cípios organizacionais que as distinguem do modelo de rede randômica que eles
mesmo número de outras empresas; a maioria dos sites da Internet é acessada apresentaram em 1959. Para ele, contudo, essa seria uma questão colateral. Ao
aproximadamente pelo mesmo número de visitantes. Como a natureza lança utilizar a hipótese da aleatoridade, Erdós abriu uma janela para um novo
cegamente os links à sua volta, a 1ongo prazo nenhum nó é favorecido ou mundo, cuja beleza e consistência matemática eram a principal força motriz do
isolado. subsequente trabalho no campo da teoria dos grafos.
Até há pouco tempo, não tínhamos alternativa para descrever nosso uni­
verso interconectado. As redes r'andômicas vieram, então, dominar nossas ideias
sobre modelagem de rede. Redes reais complexas eram vistas como fundamen­
talmente randômicas.

20 21
Erdós mantém o recorde por sugerir bons problemas e assegurar que uma
outra pessoa os resolva. Embora jamais tenha tido mais que algumas roupas que TERCEIRA CONEXÃO
cabiam em uma pequena valise de couro com que sempre viajava, frequente­
mente oferecia recompensas em dinheiro por soluções ou demonstrações de
problemas que considerasse interessantes - cinco dólares por um problema que
considerasse simples e SOO por um problema realmente difícil. E ele pagaria de Seis Graus de Separação
bom grado se a demonstração fosse entregue. Pouco importava que um pro­
blema de um dólar frequentemente se revelasse mais difícil do que um de 500.
Seja como for, o afortunado matemático que ganhou uma de suas recompensas
jamais descontou seus cheques. Muitos deles ele emoldurou. A recompensa era
um reconhecimento único do gênio que dominou o século; nenhuma quantia
em dinheiro superava seu valor espiritual.
Sigamos o exemplo de Erdós e formulemos uma questão que ele deixou
intacta. Como são as redes reais? A postulação de um problema em termos tão
mal formulados jamais o satisfaria. É algo genérico demais. Pode até não com­
portar uma única resposta. E é bem provável que jamais poderemos oferecer
uma prova rigorosa. Possivelmente, não faria parte do livro Transfinito, o último Em 1912, quando Anna Erdós descobriru que estava grávida de seu tercei­
repositório no mundo de Erdós de todas as boas demonstrações e teoremas ro filho, Paul, as ruas de Budapeste andavam alvoroçadas com os comentários
matemáticos. Contudo, muito embora a questão não obtivesse a aprovação dele, sobre uma nova coletânea de poemas e prosa dos melhores escritores húngaros
veremos nos capítulos seguintes que faz grande diferença fora do mundo da e il;lternacionais. A-primeira-'edição esgotara-se antes mesmo que os críticos lite­
matemática. rários pudessem consegui-la, a segunda impressão também estava desapare­
cendo quando se publicaram as primeiras resenhas sérias nos jornais do país.
Nesse ínterim, Anna Erdós internara-se no hospital, dera à luz Paul e voltara
para casa, apenas para descobrir que suas duas filhas mais velhas haviam sido
vítimas de uma epidemia de febre escarlate que assolava toda a Budapeste.
Apesar das muitas tragédias pessoais da cidade, o entusiasmo pelo novo
fenôme:p.o literário não arrefecera. A popularidade do livro fundamentava-se em
um pequeno detalhe: todos os poemas e contos eram tapeação. Em Igy Irtok Ti
(This Is How You Write), Frigyes Karinthy, um poeta e escritor de 25 anos de
idade praticamente desconhecido, inventou o que chamou de caricatura literá­
ria. O volume é uma coletânea de poemas e contos que parece ter sido escrita
por um quem é quem da literatura mundial. Quem estivesse familiarizado com
os autores facilmente conseguiria reconhecer o estilo de cada um deles. Cada
peça é uma paródia astuciosa que, a exemplo de um espelho distorcido, toma o
autor imitado reconhecível, guardadas as devidas proporções. Karinthy aplicou
seu humor cáustico e demolidor com idêntica desenvoltura a gigantes falecidos
e amigos íntimos. E sua flecha era amiúde mortal: os autores que ele mais vene­
nosamente parodiou nos são conhecidos apenas por seu livro; suas obras origi­
nais perderam-se no inexorável fosso do gosto literário e da história.
Igy Irtok Ti é um dos livros mais lidos da história húngara, o qual tomou
Karinthy uma celebridade instantânea. Nunca mais ele teve de esperar o ônibus
no terminal rodoviário - ele simplesmente lhe acenava de onde estivesse, e o

22 23
motorista, com largo sorriso, parava para ele. Karinthy escreveu boa parte do por, no máximo, cinco links, foi a primeira manifestação de que se tem notícia
tempo atrás das amplas janelas de vidro do Café Central, no coração de Buda­ do conceito que hoje conhecemos como "seis graus de separação" (six degrees).
peste. Os transeuntes frequentemente executavam uma estranha dança. Quando
passavam pela janela, subitamente paravam, voltavam-se e examinavam através
dela o escritor trabalhando, como se ele fosse um exótico espécime em um novo
aquário. 1.
Quase duas décadas depois de Igy Irtok Ti, em 1929, mais ou menos na
mesma época em que o Erdós de 17 anos de idade estava prelecionando sobre o Os seis graus de separação foram redescobertos quase três décadas depois,
teorema pitagórico na loja de sapatos distante algumas ruas do Café Central, em 1967, por Stanley Milgram, professor de Harvard que celebrizou muito o
Karinthy publicou seu quadragésimo sexto livro, Minden Masképpen Van (Every­ conceito revolucionando o estudo acerca de nossa interconectividade. Surpreen­
thing Is Different), coletânea de 52 contos. Por essa época, ele era reconhecido dentemente, o primeiro trabalho de Milgram sobre o assunto soa às vezes como
como o gênio da literatura húngara. Todo mundo, porém, ainda aguardava "O 'tradução inglesa de "Láncszemek'', de Karinthy, reescrito para um público de
Livro", o romance que definiria Karinthy e lhe asseguraria seu lugar entre os sociólogos. Milgram, talvez o mais criativo profissional da psicologia experimen­
imortais da literatura. Os críticos francamente se preocupavam com o fato de tal, é mais bem conhecido por uma série de experimentos altamente debatidós
Karinthy estar traindo seu talento único ao escrever contos que lhe proporciona­ que demonstram o conflito entre obediência à aut9ridade e consciência pessoal.
vam vantagens imediatas. Karinthy, cuja vida incrivelmente desordenada e caó­ Seu intelecto, contudo, era de grande alcance, e ele rapidamente passou a se
tica se dissipara entre cafés e uma casa agitada e barulhenta, não conseguiu interessar pela estrutura de nossa rede social, tópico que fora frequentemente
entregar o volume longamente esperado. A coletânea de contos foi um rotundo discutido por sociólogos em Harvard e no Massachusetts Institute of Technology
fracasso crítico e afundou na obscuridade. Esgotou-se desde então. Visitei mui­ (MIT) durante os últimos 60 anos.
tas livrarias e sebos de Budapeste, mas não consegui encontrar nem rastro dela. O objetivo de Milgram era descobrir a "distância" entre duas pessoas
Mas existe uma narrativa intitulada "Láncszemek'' ("Chains") que merece nossa quaisquer nos Estados Unidos. A questão balizadora do experimento era: quan­
atenção. tos conhecidos são necessários para conectar dois indivíduos selecionados ao
"Para demonstrar que as pessoas hoje, em qualquer parte do mundo, estão acaso? Como ponto de partida, el� escolheu duas pessoas-alvo, a esposa de um
mais próximas do que nunca, um membro do grupo sugeriu um teste. Apostou estudante graduado em teologia, em Sharon, Massachusetts, e um corretor de
que poderíamos indicar qualquer indivíduo dentre um e meio bilhão de habitan­ ações em Boston. Escolheu Wichita, em Kansas, e Omaha, em Nebraska, como
tes da terra e por intermédio de, no máximo, cinco relações, uma das quais em pontos de partida para o estudo porque "vistas de Cambridge, essas cidades
termos pessoais, ele conseguiria conectar a pessoa escolhida", escreveu Karinthy parecem vagamente 'distantes' nas Grandes Planícies ou em alguma outra
em "Láncszemek''. E, de fato, o personagem ficcional de Karinthy imediata­ parte". Havia pouco consenso em torno de quantos links eram necessários para
mente liga um ganhador do -Prêmio Nobel a si próprio, observando que o Nobel conectar pessoas dessas regiões remotas. O próprio Milgram observou em 1969:
deve conhecer o rei Gustavo, o monarca sueco que concede o Prêmio Nobel, "Há pouco perguntei a alguém inteligente quantas mediações seriam necessá­
que, por sua vez, é um consumado jogador e, às vezes, joga com um campeão rias, e tal pessoa me respondeu que demandariam cem ou mais pessoas inter­
de tênis que vem a ser amigo do personagem de Karinthy. Observando que é mediárias, de Nebraska a Sharon".
fácil conectar celebridades, o personagem de Karinthy solicita uma tarefa mais O experimento de Milgram envolveu a remessa de cartas a moradores
difícil. Em seguida, ele tenta conectar um operário da fábrica da Ford a si pró­ aleatoriamente selecionados de Wichita e Omaha pedindo-lhes que participas­
prio: "O operário conhece o gerente da .fábrica, que conhece Ford; Ford tem sem de um estudo sobre contato social na sociedade americana. A carta conti­
amizade com o diretor-geral da Hearst Publications, que ano passado se tornou nha breve sumário do propósito do estudo, uma foto, o nome e endereço, bem
amigo de Árpád Pásztor, alguém que não apenas conheço, mas também é o como outras informações sobre uma das pessoas-alvo, acompanhadas das qua­
melhor conhecido de um amigo meu - de forma que poderia facilmente tro instruções seguintes:
pedir-lhe que envie um telegrama por meio do diretor-geral dizendo a Ford que
converse com o gerente e faça o operário da fábrica montar um carro para mim,
porque estou precisando de um". Embora esses contos tenham sido negligencia­
dos, a intuição que Karinthy teve, em 1929, de que as pessoas estão interligadas

24 25
COMO PARTICIPAR DESTE ESTUDO planeta está separado por apenas seis outras pessoas. Seis graus de separação.
Entre nós e qualquer outra pessoa neste planeta. O presidente dos Estados Uni­
1. ADICIONE SEU NOME À LISTA QUE SE ENCONTRA NO FINAL DESTA dos. Um gondoleiro em Veneza... Não são apenas os grandes nomes. É qualquer
FOLHA, para que a próxima pessoa que receber esta carta saiba quem a um. Um nativo em uma floresta tropical. Um habitante da Terra do Fogo. Um
enviou. esquimó. Estou ligada a qualquer um neste planeta por uma trilha de seis pes­
2. PEGUE UM CARTÃO-POSTAL. PREENCHA-O E DEVOLVA-O À UNIVERSI­ soas. É um pensamento profundo ... Como toda pessoa é uma nova porta que se
DADE DE HARVARD. Não é preciso selar. O cartã0-postal é muito impor­ abre para outros mundos".
tante, pois lhe permitirá acompanhar o andamento do formulário até sua O estudo de Milgram restringiu-se aos Estados Unidos, conectando pessoas
recepção pela pessoa-alvo. "de lá", em Wichita e Omaha, com as "de cá", em Boston. Para a personagem
Ousa, da peça de Guare, no entanto, os seis graus de separação se aplicam a
3. CASO CONHEÇA PESSOALMENTE O DESTINATÁRIO-ALVO, ENVIE-LHE todo mundo. Nascia, então, um mito. Como a maioria das pessoas vê mais fil­
DIRETAMENTE ESTE FORMULÁRIO PELO CORREIO. Só o faça se já hou­ mes do que lê trabalhos de sociologia, a versão de Guare prevaleceu no imagi­
ver se encontrado com a pessoa-alvo e se se conhecerem pelo primeiro nário popular.
nome. Seis graus de separação intrigam porque sugerem que, apesar das enormes
dimensões de nossa sociedade, esta pode ser facilmente navegada pelos links
4. SE NÃO CONHECER PESSOALMENTE O DESTINATÁRIO-ALVO, NÃO
sociais de uma pessoa a outra - uma rede de 6 bilhões de nós em que qualquer
TENTE FAZER CONTATO COM ELE DIRETAMENTE. NESSE CASO, ENVIE
par de nós encontra-se, em média, a seis Links um do outro. Talvez nos surpre­
O FORMULÁRIO (CARTÕES-POSTAIS E TODO O MATERIAL) A UM enda o fato de que existe um acesso entre duas pessoas quaisquer. Entretanto,
CONHECIDO SEU QUE MAIS PROVAVELMENTE DO QUE VOCÊ CONHEÇA
vimos nos capítulos anteriores que estar conectado requer muito pouco - ape­
A PESSOA-ALVO. Você pode enviar o formulário a um amigo, parente ou nas mais de um link social por pessoa. Como todos temos muito mais de um
conhecido, mas deve ser alguém que você conheça pelo primeiro nome.
link, cada um de nós é parte da gigantesca rede que chamamos de sociedade.
Stanley Milgram nos conscientizou de que não apenas estamos conecta­
Milgram tinha uma preocupação premente: será que alguma das cartas dos, mas também vivemos em um_ mundo no qual ninguém está mais do que a
atingiria o alvo? Se a quantidade de links efetivamente oscilasse em tomo de alguns poucos apertos de mão de ·qualquer outra pessoa. Em outras palavras,
uma centena, como supôs seu amigo, então o experimento provavelmente malo­ vivemos em um mundo pequeno (small word). Nosso mundo é pequeno porque a
graria, porque sempre há alguém ao longo da cadeia que não coopera, Foi uma sociedade é uma rede bastante densa. Temos mais amigos do que o número crí­
grata surpresa, portanto, quando em poucos dias chegou a primeira carta, per­ tico necessário para nos manter conectados. Serão os seis graus de separação
correndo apenas dois links intermediários. Esse se tomaria o caminho mais algo unicamente humano, de certa forma relacionado com nosso desejo de
curto já registrado, mas _finalmente 42 das 160 cartas voltaram, algumas exi­ constituir vínculos sociais? Ou outras modalidades de redes se assemelham? As
gindo cerca de uma dúzia de intermediários. Essas cadeias completas permiti­ respostas a essas questões vieram à t9na apenas há alguns anos. Sabemos agora
ram a Milgram determinar o número de pessoas necessárias para que a carta que as redes sociais não são as únicas que se podem caracterizar como mundos
chegasse a seu alvo. Ele verificou que o número médio de pessoas intermedi­ pequenos.
árias foi de 5,5, cifra realmente muito pequena - e, por coincidência, espantosa­
mente próxima da sugerida por Karinthy. Arredondando-a para 6, porém,
chega-se aos famosos "seis graus de separação".
Milgram, como me fez ver Thomas Blass, psicólogo social que dedicou os 2.
últimos 15 anos a uma profunda pesquisa sobre a vida e obra daquele, jamais
utilizou a expressão "seis graus de separação". John Guare forjou o termo em "Suponha que toda informação armazenada em computadores de qualquer
sua brilhante peça de teatro de 1991 que leva esse título. Após uma temporada parte estivesse conectada ... Todas as melhores informações contidas em qual­
de extraordinário sucesso na Broadway, a peça foi adaptada ao cinema com o quer computador na European Organization for Nuclear Research (CERN) e no
mesmo título. Na peça, Ousa (personagem vivida no cinema por Stockard Chan­ planeta estariam disponíveis para mim e para qualquer outra pessoa. Haveria
ning), refletindo sobre a interconectividade, diz a sua filha: "Todo inundo neste um único espaço global de informação." Esse era o sonho de Tim Berners-Lee

26 27
em 1980, quando trabalhava como programador na CERN, em Genebra, na quisa no Departamento de Física da Universidade de Notre Dame - a perceber a
Suíça. Para transformar seu sonho em realidade, Tim escreveu um programa dimensão do mundo por trás da Web.
que permitia aos computadores compartilhar informações - conectar-se entre si. Nosso primeiro objetivo foi obter um mapa da Web, essencialmente um
Ao inventar os links, Berners-Lee liberou um gênio cuja existência nos era des­ inventário de todas as páginas da rede e dos links que as conectam. A informa­
conhecida. Em menos de dez anos, o gênio converteu-se na World Wide Web, ção contida nesse mapa seria realmente inédita. Se fôssemos construir um mapa
uma das redes mais extensas já construídas pelo homem. Trata-se de uma rede semelhante para a sociedade, teria de conter os interesses profissionais e pesso­
virtual cujos- nós são Webpages que tudo contêm: notícias, filmes, fofocas, ais de cada indivíduo e registrar todas as pessoas que ele conhecesse. Faria o
mapas, quadros, receitas, biografias e livros. Se algo pode ser escrito, dese­ experimento de Milgram parecer inabilidoso e obsoleto por nos permitir desco­
nhado ou fotografado, há chances de que já exista um nó na Web que de certa brir, em questão de segundos, a via de acesso mais curta a qualquer pessoa no
forma o contém. mundo. Seria uma ferramenta de uso obrigatório para todo mundo, de políticos
O poder da Web está nas conexões (nos links), os localizadores uniformes a vendedores e epidemiologistas. Evidentemente, esse mecanismo de busca
de recursos (URLs), que nos permitem transitar, com o clique de um mouse, de · social é de construção impossível, pois levaria, no mínimo, uma vida toda para
uma página a outra. Eles nos possibilitam navegar, localizar e reunir informa­ interrogar os mais de 6 bilhões de habitantes da Terra e catalogar os amigos e
ção. Esses links transformam a gama de documentos individuais em uma grande conhecidos de cada um. Não obstante, existe algo de mágico acerca da Web que
rede percorrida por cliques de mouse. São os pontos que mantêm sem emendas a distingue da sociedade: podemos navegar em seus links instantaneamente. É
o tecido de nossa moderna sociedade da informação. Se fossem retirados os só uma questão de cliques.
links, o gênio se desvaneceria espetacularmente. Enormes bancos de dados ina­ Diferentemente de nossa sociedade atual, a Web é digital. Isso nos permite
cessíveis seriam deixados para trás, as ruínas contemporâneas de um mundo escrever um programa de software que baixa qualquer documento, encontra
interconectado. todos os links nele contidos, visita e baixa os documentos referenciados, prosse­
Qual é a extensão da Web hoje em dia? Quantos documentos e links exis­ guindo assim até que todas as páginas da Web sejam capturadas. Se deixásse­
tem nela? Até recentemente, ninguém sabia ao certo - não há nenhuma organi­ mos esse programa rodar, teoricamente nos traria um mapa completo da Web.
zação que acompanhe o desenvolvimento de todos os nós e links. Steve Law­ No mundo do computador, esse software é chamado de robô, ou crawler, porque
rence e Lee Giles, trabalhando no NEC Research Institute, em Princeton, varre a Web sem supervisão humana. As grandes ferramentas de busca, como
aceitaram esse desafio único em 1998. Suas avaliações indicaram que em 1999 Alta Vista ou Google, possuem milhares de computadores rodando inúmeros
a Web possuía cerca de 1 bilhão de documentos - nada mau para uma sociedade robôs que constantemente vasculham novos documentos na Web. Está claro que
virtual nascida havia menos de uma década. Considerando que ela cresça muito nosso pequeno grupo de pesquisa não poderia competir na mesma escala dessas
mais rapidamente do que a sociedade humana, é provável que quando este livro ferramentas. Jeong criou, então, um robô para atingir um objetivo mais
for publicado, haja mais documentos de Web do que habitantes na Terra. modesto. Primeiramente, ele nos proporcionou um mapa do domínio nd.edu
mapeando cerca de 300 mil documentos no âmbito da Universidade de Notre
Mas a verdadeira questão não consiste nas dimensões globais da Web, e,
Dame, uma eclética coleção que tem de tudo, das Webpages do curso de filosofia
sim, na distância entre dois documentos quaisquer. Quantos cliques são neces­
a sites de fãs da música irlandesa. Mas não estávamos preocupados com o con­
sários para ir da home page de um estudante universitário em Omaha para a
teúdo das páginas, e, sim, interessados apenas nos links que nos dissessem co­
página da Internet de um corretor de ações de Boston? Apesar dos bilhões de
mo navegar de uma página a outra. Com esse mapa em mãos, podíamos, então,
nós, poderia a Web ser um "mundo pequeno"? A resposta a essa questão não é
mensurar a distância entre duas páginas quaisquer dentro da Universidade.
irrelevante para quem quer que navegue na Web. Se as páginas da Internet
encontram-se a milhares de cliques umas das outras, então é desanimador Da mesma maneira como Milgram viu algumas de suas cartas chegar à
encontrar qualquer documento sem uma ferramenta de busca. Descobrir que a pessoa-alvo em duas etapas, enquanto outras levaram 11, nossos resultados
Web não é um mundo pequeno também indicaria que as redes existentes por indicaram uma gama de variabilidade nas distâncias entre os documentos da
trás da sociedade e no universo on-line são fundamentalmente diferentes. Nesse Web. Por exemplo, meus alunos de gradução possuem links para minha página
caso, para compreender completamente as redes, precisaríamos entender por na Web; logo, estão a um clique de mim. Entretanto, para ir de minha página na
que e como surge essa diferença. Nesse sentido, no final de 1988, comecei, com Web à home page de uma especialização de filosofia, frequentemente são neces­
Réka Albert, um estudante de doutorado, e Hawoong Jeong, um associado com sários 20 cliques. O espantoso, contudo, é que, tomados em conjunto, esses
pós-doutorado - ambos trabalhando ao mesmo tempo em meu grupo de pes- caminhos não eram tão longos quanto a vastidão da Web sugeriu. As mensura-

28 29
ções indicaram que as páginas estavam; em média, ª 11 �ques uma� das 3.
,
outras. Parafraseando o título da peça de Guare, podenamos dizer que existem
11 graus de separação em Notre Dame.
Apesar disso, as Webpages em nossa universidade, o domínio nd.edu, Tomados em conjunto, os seis graus de Milgram e os 1 9 graus da Web
representam apenas um pequeno subconjunto da rede mundial de computado­ sugerem que por trás das pequenas distâncias observadas existe algo mais fun­
res. A Web como um todo, em 1999, era pelo menos 3 mil vezes maior. _Isso damental que o desejo da humanidade de propagar links sociais por todo o
significaria que a distância entre dois nós escolhldos aleatoriamente na rede globo. Essa suspeita confinnou-se por descobertas ulteriores que demonstraram
mundial de computadores era também três mil vezes mais longa do que os 11 que pequenas distâncias são comuns em praticamente qualquer rede que os
cliques que nossas mensurações indicaram? Em outras palavras, seriam necessá­ cientistas tiveram oportunidade de estudar. De fato, espécies em cadeias ali­
rios 33 mil cliques para ir de uma página a outra da Web? Para responder a essa mentares parecem estar, em média, a dois links umas das outras; moléculas na
questão, precisaríamos de um mapa de toda a Web. O problema é que ninguém célula estão separadas, em média, por três reações qUÍillicas; cientistas de dife­
tinha um mapa. Mesmo as maiores ferramentas de busca que incansavelmente rentes campos da ciência estão separados por quatro a seis links de coautoria; e
escaneiam a Web com milhares de computadores conseguem cobrir menos de os neurônios no cérebro da larva C. elegans estão separados por 14 sinapses. Na
15% de toda a Web. Poderíamos detenninar a separação para toda a Web sem realidade, parece que a Web mantém o absoluto recorde de 19 graus, ao pàsso
um mapa desses? A resposta era afirmativa. Contudo, teríamos de utilizar um que todas as demais redes analisadas até agora revelam uma separação entre
método comumente empregado em mecânica estatística - o campo da física que dois e 14 graus.
trabalha regularmente com sistemas aleatórios dotados de componentes ou Dezenove graus podem parecer drasticamente distantes dos seis. Mas, não
resultados imprevisíveis. é esse o caso. O importante é que grandes redes, com centenas de milhões ou
Nossa abordagem possuía uma simples premissa: se a Web é grande bilhões de nós, entram em colapso, revelando separação bem menor do que o
demais para caber em nosso computador, então deveríamos estudar muitos número de nós que possuem. Nossa sociedade, uma rede de 6 bilhões de nós,
fragmentos menores dela que coubessem nele. Por exemplo, tomamos u�a tem uma separação de seis graus. A Web, com aproximadamente 1 bilhão de
pequena parte da Web, com apenas mil nós, e calculamos a separação entre ?º�s nós, tem uma separação de 19. A Internét, uma rede de centenas de milhares de
nós quaisquer nessa pequena amostra. Em seguida, pegamos um segmento hge1- roteadores, tem uma separação de dez. Vista por esse prisma, a diferença entre
ramente maior, com 10 mil nós, e detenninamos novamente a separação. Repe­ seis e 19 é desprezível.
timos a �peração para os sistemas maiores que nossos computadores nos permi­
A questão natural é: por quê? Como as redes perfazem esse caminho uni­
tiram usar e buscamos tendências nas distâncias obtidas de nó a nó. Os
formemente curto, embora sejam formadas por bilhões de nós? A resposta se
resultados indicaram que a separação média entre os nós aumentava muito
encontra na natureza altamente interconectada dessas redes. No capítulo 2,
mais lentamente do que o número de documentos, seguindo uma equação
vimos que as redes randômicas requerem apenas um link por nó para formar
matemática muito simples e reprodutível1 . Esse achado nos pennitia predizer a
um gigantesco aglomerado. E se, como geralmente ocorre nas redes reais, os
separação em toda a Weô desde que soubéssemos o número total de do�umen­
nós tiverem muito mais links do que esse? No ponto crítico, quando a conectivi­
tos lá existentes. Esse número foi fornecido pelo grupo NEC, que est1mou a
dade média gira em torno de um por nó, a separação entre •nós poderia ser até
dimensão da Web publicamente indexável em cerca de 800 milhões de nós no
maior. Entretanto, quando adicionamos mais links, a distância entre os nós subi­
final de 1998. Assim, nossa expressão previa que o diâmetro da Web era 18,59,
tamente decai. Considere uma rede na qual os nós tenham, em média, k links.
próximo de 19. Como diria Guare: "Dezenove graus de separação". Embora a
Isso significa que, a partir de um nó típico, podemos atingir a quantidade k2 -de
navegação possa nos dar uma impressão diferente, na realidade a Web é um
outros nós com um único passo. Existem, porém, k2 de nós com dois links de dis­
mundo pequeno. Qualquer documento está em média apenas a 19 cliques um
tância e cerca de kd nós exatamente d links distantes. Logo, se k é grande,
do outro.
mesmo para pequenos valores de d, o número de nós a que se pode chegar pode
tornar-se muito grande. Com poucos passos, chega-se a todos os nós a ser
encontrados, o que explica por que a separação média é tão pequena em muitas
1 Descobrimos que a separação é proporcional ao logaritmo do número de nós na rede. Ou seja, se
redes.
denotamos d como a separação média entre os nós em uma rede de N Webpages, então essa Esses argumentos podem ser facilmente convertidos em uma fórmula
separação seguia a equação d=0,35 + 2logN, onde log N denota o logaritmo base 10 de N. matemática que prediz a separação em uma rede randômica como uma função

30 31
do número de nós2• A origem da pequena distância é devida à função logarít­ Erdós juntou-se a Alfred Rényi em 1959 para escrever sua famosa série de
mica presente na fórmula. Desta forma, mesmo havendo um número muito oito ensaios sobre redes randômicas. Os trabalhos efetivamente continham a
grande, seu logaritmo é bastante pequeno. O logaritmo base 10 de 1 bilhão é expressão, dando o diâmetro da rede como uma função do número de nós.
apenas 9. Por exemplo, se tivermos duas redes, ambas com uma média de dez Qualquer dos dois, se houvesse se interessado, poderia ter mostrado facilmente
links por nós, mas sendo uma rede cem vezes maior do que a outra, a separação que a intuição de Karinthy estava correta, em razão de os muitos links sociais
na rede maior será apenas dois graus superior à separação na rede menor. O que temos se reduzirem, mesmo as redes gigantescas, a mundos pequenos real­
logaritmo encolhe as grandes redes, criando os mundos pequenos em nossa mente. Erdós e Rényi, porém, nunca mencionararam essa aplicação em seus tra­
volta. balhos, e provavelmente jamais saberemos se se entretinham com a ideia nos
intervalos entre suas elaborações matemáticas de demonstrações e teoremas.
Mas os links não param por aí. Stanley Milgram publicou seus experimentos
revelando os 5,5 links em 1967, quatro décadas depois da conjetura karint­
4. hyanq dos cinco links e quase uma década após Erdós e Rényi haverem apresen­
tado a teoria randômica de rede. Ele não parecia ter se inteirado do corpo do
trabalho sobre redes na teoria dos grafos e muito provavelmente jamais ouvira
Uma das pessoas mais distraídas de sua geração, Karinthy era bastante falar de Erdós e Rényi. Milgram é conhecido por ter sido influenciado pela obra
conhecido por se esquecer dos compromissos agendados. Dezsó Kosztolányi, de Ithel de Sole Pool, do MIT, e de Manfred Kochen, da IBM, que durante déca­
amigo íntimo e rival literário de Karinthy, certa vez observou: "Tive de correr das difundiram textos sobre a problemática dos mundos pequenos para um
para casa porque Karinthy prometera que nos visitaria e talvez se esquecesse de grupo de colegas, sem publicá-los, po:r:que acreditavam não ter "quebrado a
que prometera, e ele realmente veio". Curiosamente, os seis graus parec�m espinha dorsal do problema". Por acaso; Milgram é filho de pai húngaro e mãe
seguir uma via bem karinthyana: esquecidos, reformulados e redescobertos na romena que emigraram para os .Estados Unidos e se estabeleceram no Bronx.
imprensa popular e também em textos científicos. Não tenho noção de quem Seria possível que seu pai ou seus tios, que frequentemente visitavam a família,
originalmente descobriu o conceito dos seis graus de separação. Os primeiros tenham se inteirado, ainda que por brincadeira, dos cinco graus de Karinthy? É
relatos escritos de que tenho conhecimento são de Karinthy. Mas como ele che­ possível que seu verdadeiro interesse pelo problema tenha se originado de his­
gou a esse conceito? Por concepção própria? Tendo em vista seu inigualável
intelecto e seu apego a ideias imprevisíveis e heterodoxas, não é inconcebível �ória� vagamente -ouvidas quando criança? Uma vez mais, trata-se de algo que
Jamais saberemos, mas certamente sugere algumas pistas interessantes na evo­
que tenha sido assim. Ou terá ele ouvido esse conceito de outras pessoas nos lução do conceito dos seis graus de separação.
cafés, como sugere o conto de sua autoria? Talvez jamais saibamos ao certo.
Mas é interessante especular sobre a reviravolta subsequente dos aconte­
cimentos.
O conto de autoria de Karinthy foi publicado em 1929, quando Erdós, que 5.
também vivia em Budapeste, tinha 17 anos de idade. Como todos os livros mal­
sucedidos de Karinthy foram eventos literários, não é improvável que Erdós
tenha lido o conto "Chains" ou ouvido falar dele, no qual Karinthy postula que A expressão seis/dezenove graus de separação é muito mal interpretada
todas as pessoas na Terra podem conectar-se por uma corrente de cinco conhe­ porque sugere que é fâcil encontrar tudo em um mundo pequeno. Isso não
cidos. A mesma conjetura poderia até ser feita em relação a Alfred Rényi, que, poderia distanciar-se mais da verdade! Não é apenas a pessoa ou documento
embora contasse apenas nove anos de idade quando "Chains" foi publicado, desejado que se encontra a seis/dezenove links de separação, e sim todas as pes­
tinha uma afinidade única por literatura. De fato, Rényi era conhecido pela ami­ soas ou documentos. Em outros termos, seis - ou dez, ou dezenove - pode ser
zade que mantinha com muitos escritores, inclusive o filho de Karinthy, Ferenc, um número ou muito pequeno ou muito grande, dependendo do que se tente
ele mesmo um escritor muito conhecido. fazer. Como o número médio de links em qualquer dado documento da Web
oscila em tomo de sete, isso significa que enquanto podemos seguir apenas sete
2 Se temos N nós na rede, kd não deve exceder N. Portanto, utilizando kd = N, obtemos uma
links a partir da primeira página, existem 49 documentos a dois cliques de dis­
tância, 343 a três cliques de distância, e assim por diante. Mais ou menos na
média segue a equação d = log N/l.og k.
época em que pesquisamos os nós que estão exatamente a 19 graus de distân-
fórmula simples que funciona bem para redes randômicas, informando-nos de que a separação

33
32
eia, em princípio teríamos de ter checado 1016 documentos, 10 milhões de vezes de nós não conhece pessoalmente o próprio senador tentaríamos encontrar
mais do que o número total das páginas na Web. Essa contradição é de fácil alguém que o conhecesse e se dispusesse a marcar ur:i encontro com o presi­
solução: alguns dos links que encontramos ao longo da via remeterão a páginas dente. Essas tratativas exigiriam pelo menos três apertos de mão. Entretanto,
que vimos antes. Logo, não são "novos" links. Entretanto, mesmo que leve ape­ não teríamos nenhuma indicação de que o senhor ao lado do qual nos sentamos
nas um segundo para checar um documento, seriam necessários ainda mais de alguns dias antes em um jantar tenha frequentado a escola com o presidente.
300 milhões de anos para acessar todos os documentos que estão a 19 cliques Dessa forma, na realidade estamos apenas a dois graus de distância do presi­
de distância. Contudo, apesar da abundância de escolhas, por vezes encontra­ dente. Similarmente, os caminhos registrados pelo experimento de Milgram
mos documentos com muita rapidez, mesmo sem ferramentas de busca. eram invariavelmente mais longos do que o mais curto possível. Assim a verda­
O truque, evidentemente, é que não seguimos todos os links. Em vez disso, deira separação na sociedade foi claramente superestimada. Deve ser r:iais curta
utilizamos pistas. De fato, se estamos procurando informação sobre Picasso e que seis - talvez mais curta do que os cinco graus de Karinthy. Não dispomos de
nos deparamos com três escolhas em uma dada página da Web, temos mais con­ uma ferramenta de busca social, razão pela qual é possível que jamais saibamos
dição de seguir o link arte moderna do que o link de um famoso lutador ou o da o verdadeiro número com absoluta certeza.
vida amorosa das rãs. Interpretando os links, evitamos checar todas as páginas
dentro dos 19 graus e podemos zerar na página desejada dentro de poucos
links. Embora pareça ser o mais eficiente, esse método nem sempre encontra o
caminho mais curto. De fato, sempre é possível que o lutador de cuja página nos 6.
desviamos compense sua imagem troglodita com um link para o melhor site de
Picasso. Mas muitas pessoas que buscam Picasso ignorariam o link do lutador e Os seis graus de separação são o produto de nossa sociedade moderna -
acabariam percorrendo um caminho mais longo até o destino. O computador, um resultado de nossa insistência em manter-nos em interação. São facilitados
por não ter gosto ou preconceito (ainda) , absorverá, com idêntico entusiasmo, por nossa capacidade relativamente recente de nos comunicar a grandes distân­
as páginas do lutador, da arte moderna e da vida amorosa das rãs, percorrendo _
cias - fre�uentemente a milhares de quilômetros. A aldeia global é agora uma
pragmaticamente os links de acesso a todas elas. Ao tentar todos os caminhos nova realidade para os seres humanos. Os antepassados de muitos americanos
possíveis, inevitavelmente localizará o mais curto deles, independentemente do perderam contato com aqueles que deixaram para trás no velho continente. Dos
conteúdo das páginas intermediárias. pastos de rebanhos bovinos ou das minas de ouro das Montanhas Rochosas era
Encontrar Picasso nos destaques da Web é um problema fundamental de impossível entrar em contato com entes queridos separados por oceanos e conti­
seis graus: o método de Milgram superestimou a distância mais curta entre duas nentes. Não havia cartões-postais nem chamadas telefônicas. Na tênue rede
pessoas nos Estados Unidos. Os seis graus realmente são um limite superior. social daquela época, era muito difícil ativar os laços que haviam se desfeito
Existe um enorme número de caminhos com extensões bem diferentes entre com o deslocamento das pessoas. Isso mudou neste século quando o correio, 0
duas pessoas quaisquer. Os sujeitos do experimento de Milgram jamais tiveram telefone e, depois, as viagens aéreas demoliram as barreiras e encurtaram as
conhecimento do caminho mais curto para alcançar seu objetivo. É como estar distâncias físicas. Atualmente, os imigrantes da América podem se decidir por
perdido em um enorme labirinto onde só conseguimos ver os corredores e as manter-se em comunicação com as pessoas que deixaram para trás. Podemos e
portas que estão mais perto de nós. Mesmo que tenhamos um compasso e saiba­ no� mant �mos em contato com as pessoas que nos são caras. Acompanho meus
mos que a saída é na direção norte, encontrá-la seria algo desesperadamente pais e aimgos mesmo que estejam em lugares muito distantes, como a Coreia ou
ineficiente e demorado. Com um mapa do labirinto em mãos, poderíamos sair a Europa Oriental. A distância no mundo irreversivelmente entrou em colapso
dele em cinco minutos. Da mesma maneira, as cartas de Milgram teriam percor­ no sé�ulo XX. E ainda sofre outra implosão exatamente agora, quando a Inter­
rido o caminho mais curto entre Omaha e Boston se todos os participantes do n �t ��ge cada canto do mundo. Muito embora nos encontremos a 19 graus de
experimento tivessem tido um mapa que compilasse os links sociais de todos os distancia de qualquer pessoa na Web, estamos apenas a um clique de distância
americanos. Por não disporem de um mapa como esse, enviaram a mensagem de n�ssos amigos. Eles podem ter esperado três cidades e cinco empregos desde
,
àqueles que, a seu ver, tinham mais probabilidade de encaminhá-la ao destino a últlma vez que nos enco�tramos pessoalmente. Mas, onde quer que estejam,
correto. Por exemplo, se desejamos ser apresentados ao presidente dos Estados em geral podemos encontra-los na Internet se e quando quisermos. O mundo
Unidos, tentaríamos pensar em alguém que conheça o presidente. Muito prova­ está encurtando porque os vínculos sociais que teriam se extinguido cem anos
velmente faríamos gestões junto a nosso senador ou deputado. Como a maioria atrás agora se mantêm vivos e podem ser facilmente ativados. O número de vín-

34 35
Ili
1,
1,

culos sociais que um indivíduo pode manter ativamente tem crescido de mane­
ira dramática, rebaixando os graus de separação. Milgram estimou seis. QUARTA CONEXÃO
Karinthy, cinco. Hoje, poderíamos estar bem mais próximos de três.
"Mundos pequenos" são uma propriedade genérica das redes em geral.
Curta separação não é um mistério de nossa sociedade ou algo peculiar concer­
nente à Web: a maioria das redes que nos cercam obedece a essa propriedade. Mundos Pequenos
Ela se insere em sua estrutura - simplesmente não me exige muitos links para
acessar um grande número de páginas da Web ou de amigos. Os mundos peque­
nos resultantes são bem diferentes do mundo euclidiano a que estamos acostu­
mados e no qual as distâncias são medidas em quilômetros. Nossa capacidade
de contatar pessoas tem a ver cada vez menos com a distância física entre nós.
Descobrir relações comuns com perfeitos estrangeiros em viagens pelo mundo
repetidamente nos traz à memória que algumas pessoas do outro lado do pla­
neta estão frequentemente mais próximas da rede social do que aquelas que são
nossas vizinhas. Navegar nesse mundo não euclidiano é algo que amiúde trai
nossa intuição e nos lembra de que existe aí uma nova geometria que precisa­
mos dominar para entender o mundo que nos rodeia. Quando submeteu seu trabalho especial à publicação, Mark Granovetter
ainda era estudante de graduação em Harvard, mas acalentava grandes espe­
ranças em relação a seu ensaio. No final da década de 1960, Harvard era o
lugar certo no momento certo. As redes quase infestaram a sociologia, e Har­
vard e o MIT constituíam sementeiras das novas ideias. Uma série de preleções
de Harrison White, pioneiro da perspectiva cfe rede nas ciências sociais, expôs
Granovetter às redes sociais no começo de sua graduação. Muitas das novas ide­
ias demonstraram haver caído em terreno fértil por ocasião de sua tese de dou­
torado, que pôs sob microscópio sociológico uma questão que mais cedo ou
mais tarde permearia todas as graduações: como as pessoas arrumam emprego.
Em vez de burilar o próprio currículo e frequentar feiras de emprego, Granovet­
ter atravessou o rio Charles em direção a Newton, Massachusetts. Embora hoje
seja um pujante subúrbio de Boston, no final de 1960 Newton era um bairro
operário. Pretendendo deséobrir como as pessoas "entram em rede" - utilizam
suas conexões sociais para arranjár um emprego -, Granovetter entrevistou
dezenas de gerentes e funcionários perguntando-lhes quem os ajudara a encon­
trar o emprego atual._ Foi um amigo? Obtinha sempre a mesma resposta: "Não,
não foi um amigo. Foi apenas um conhecido". Isso fez Granovetter lembrar-se
da clássica aula de química que demonstrava como o hidrogênio fraco mantém
coesas as grandes moléculas da água, e essa imagem, inculcada desde o primes
iro ano de faculdade, inspirou seu primeiro trabalho de pesquisa, um longo e
esclarecedor ensaio sobre a importância dos vínculos sociais fracos em nossas
vidas: Ele o enviou pelo correio, em agosto de 1969, à American Sociological
Review. Em dezembro, foi informado de que dois julgadores anônimos haviam
recusado o trabalho. Segundo um deles, o texto não deveria ser publicado por
"uma série infindável de razões que vêm de imediato à mente". Terrivelmente

36 37
desencorajado, Granovetter não tocou no trabalho durante os três anos seguin­
tes. Em 1972, submeteu urna versão concisa'do texto a outro jornal, o American
Joumal of Sociology. Teve mais sorte dessa vez, e o trabalho foi finalmente
publicado em maio de 1973, quatro anos após sua primeira submissão. Hoje, o
ensaio de Granovetter, The Strenght of Weak Ties, � reconhecido corno um dos
mais influentes trabalhos de sociologia já escritos. E também um dos mais cita­
dos, distinguido com uma citation classic por Current Contents em 1986.
Em The Strenght of Weak Ties, Granovetter propõs algo que se afigura
paradoxal à primeira vista: quando se trata de arranjar emprego, saber das
novidades, abrir um restaurante ou espalhar a última fofoca, nossos vínculos
sociais fracos são mais importantes que as sólidas amizades que cultivamos.
Segundo ele, a estrutura da rede social em torno de uma pessoa comum, que ele
chama de Ego, é bastante genérica: "Ego terá um grupo de amigos íntimos, mui­
tos dos quais se acharão em interação recíproca - um aglomerado de estrutura
social densamente articulado. Além disso, Ego terá um grupo de pessoas de suas
relações, e algumas dessas pessoas conhecerão umas as outras. É provável,
porém, que cada uma dessas pessoas tenha seus próprios amigos íntimos, a ser
enredados, portanto, em uma intrincada trama de estrutura social, diferente,
contudo, da de Ego".
Embutida no argumento de Granovetter, encontra-se uma imagem de
sociedade bem diferente do universo randôrnico descrito por Erdós e Rényi. Na
visada por Granovetter, a sociedade é estruturada em aglomerados altamente Figura 4. 1 . Vínculos fortes e fracos: no mundo social de Mark Granovetter, nossos amigos
i:nais próximos frequentemente também são amigos uns dos outros. A r;de que se en:on­
conectados, ou círculos de amigos profundamente entrosados, em que todo tra por trás dessa sociedade clusterizada é formada por pequenos crrculos de �gos
mundo conhece todo mundo. Alguns vínculos externos que conectam esses gru­ totalmente conectados, que se congregam por sólidos vínculos, como mostram as linhas
pos não permitem que eles se isolem do restante do mundo. Se a esquernatiza­ em negrito. Os vínculos fracos, ilustrados por linhas tênues, conectam os component�s
ção proposta por Granovetter estiver correta, então a rede que descreve nossa desses círculos de amizade a seus conhecidos, que possuem fortes laços com seus pro­
sociedade terá uma estrutura bastante peculiar. Trata-se de uma coleção de gra­ prios amigos. Os vínculos fracos desempenham p�pel imp_?rtante em uma série de ativi­
fos completos, minúsculas clusterizações nas quais cada nó está conectado a dades sociais que vão da disseminação de boatos a obtençao de um emprego.
todos os demais dentro do cluster (Figura 4.1). Esses grafos completos estão
ligados uns aos outros por-algumas fracas ligações entre conhecidos que perten­
cem a diferentes círculos de amigos. Em uma rede randôrnica, não haveria nenhum círculo de amigo,s na
Os vínculos fracos desempenham papel crucial em nossa capacidade de .
medida em que nossas conexões com outros nós são completamente a:eato1:1as.
nos comunicar com o mundo exterior. Frequentemente, nossos amigos íntimos No universo social de Erdós-Rényi, a probabilidade de qu� meus dois ami�os
podem nos oferecer pouca ajuda quando se trata de arranjar emprego. Eles mais chegados se conheçam é a mesma de que o melhor amigo de um sa� aterro
transitam pelas mesmas rodas que nós e inevitavelmente estão expostos às mes­ australiano seja um chefe tribal africano. Mas não é essa a configuraçao que
mas informações. Para obter novas informações, ternos de ativar nossos vínculos nossa sociedade apresenta. Na maioria dos casos, dois bons amigos conhecem
fracos. De fato, é mais provável que funcionários de nível gerencial fiquem os amigos de cada um deles. Geralmente, vão às mesma� festas, fre,quentam os
sabendo da existência de uma vaga por meio de contatos sociais fracos (27,8% mesmos pubs e assistem aos mesmos filmes. Quanto mais forte o �culo en?"e
dos casos) do que por relações sólidas (16,7%). Esses vínculos fracos, ou de duas pessoas maior a sobreposição entre seus círculos de anngos. Mmto
conhecidos (que não seriam amigos íntimos), constituem nossa ponte com o embora O ar�ento de Granovetter acerca da importância das relações fracas
mundo exterior, pois, por frequentar lugares diferentes, eles obtêm informações possa parecer contraintuitivo à primeira vis:,a e a�é mesmo paradoxal, formul�
de fontes diferente_s daquelas dos seus amigos mais próximos. _
uma verdade simples sobre nossa organizaçao socral. A sociedade granovetten-

38 39
ana, uma teia fragmentada de aglomerados totalmente interligados que se essas leis. No Sudoeste da Ásia, agrupam-se aos milhões em volta de grandes
comunicam através de elos fracos, é mais verdadeira para nossa experiência manguezais, piscando intermitentemente. De repente, todos os vaga-lumes
cotidiana do que a descrição absolutamente randômica proposta por Erdós e começam a ligar e desligar as caudas fluorescentes, acendendo-as e apa­
Rényi. Para entender plenamente a estrutura da sociedade, a teoria das redes gando-as exatamente no mesmo instante, transformando a árvore em forma de
randômicas tem de ser conciliada, de certa forma, com a realidade das clusteri­ farol em um imenso bulbo luminoso pulsante, avistável a quilômetros de dis­
zações descrita por Granovetter. Transcorreram quase três décadas para se che­ tância. Uma sutil premência de sincronizar é algo que permeia a natureza. Com
gar a tal conclusão. Curiosamente, a chave para uma possível solução .não efeito, aciona milhares de células marca-passo no coração e sincroniza os ciclos
adveio da sociologia ou da teoria dos grafos. menstruais de mulheres que vivem juntas por longos períodos.
Duncan Watts, trabalhando em sua tese de doutorado em matemática apli­
cada na Universidade de Comell, em meados de 1990, foi incumbido de investi­
gar um curioso problema: como os grilos sincronizam seus cri-cris. Os grilos
1. fêmeos atraem os machos cricrilando forte. Diferentemente de muitos humanos,
os grilos evitam a ostentação ouvindo cuidadosamente os outros grilos à sua
Atravessando o Café Central, a poucos passos da janela favorita de volta, ajustando o próprio cri-cri para sincronizá-lo com o de seus compànhei­
Karinthy, o visitante desce por uma pequena porta e uma estreita escada do ros. Se juntarmos muitos deles, da cacofonia surgirá uma sinfonia que, amiúde,
subsolo e entra em um dos estúdios teatrais da elite de Budapeste. Apropriada­ aprec:iamos ouvir no quintal, nas noites úmidas d.e verão.
mente chamado de Kamra, ou Closet, pois comporta apenas cerca de dez atores Watts não se encaixa na imagem estereotipada do matemático livresco.
no palco e uma centena de pessoas na plateia, os assentos para suas apresenta­ Dono de uma mente ágil, tem a rara capacidade de parar, recuar e refletir sobre
ções são muito disputados por aqueles que têm familiaridade com a borbu­ seu trabalho, mudando de direção se preciso for. De fato, a pesquisa acerca dos
lhante vida teatral de Budapeste. A última apresentação a que assisti no Kamra grilos fez dele um estudioso das redes sociais e finalmente um sociólogo, trans­
aboliu a cortina para aproveitar o espaço, obrigando o público a imaginar exata­ formação oficializada em 2000, quando recebeu um convite para lecionar no
mente quando a peça acabaria. Mas foi difícil escapar quando repentinamente Departamento de Sociologia da Universidade de Columbia.
todo mundo em volta de mim prorrompeu em calorosos aplausos, que ecoavam Enquanto se esforçava por compreender como os grilos sincronizam seus
e eram amplificados pelas paredes pretas da pequena caverna subterrânea. Em cri-cris, Watts se deparou com o conceito dos seis graus de separação, que lhe
algum momento, a caótica trovoada deu lugar a aplausos uníssonos. Nossas pal­ fora inculcado pelo pai durante uma conversa casual. As pessoas se perguntam
mas ocorriam exatamente no mesmo instante, unidas por uma misteriosa força o tempo todo-sobre assuntos como os seis graus, mas essa filosofia de café rara­
que nos compelia a aplaudir sincronizadamente, como se guiadas pela batuta de mente conduz à pesquisa séria. Watts achava que para bem compreender como
um invisível regente. Quando os atores se inclinavam em agradecimento, deixa­ os grilos se sincronizam, era preciso entender como prestavam atenção uns aos
vam o palco e reapareciaI!)., os aplausos cadenciados se tomavam cada vez mais outros. Será que todos os grilos prestam atenção a cada um dos outros que
estrondosos. Sua sincronicidade se dissolvia momentaneamente quando os estão cricrilando? Ou será que alguns escolhem um outro favorito para tentar
aplausos adquiriam velocidade e força, apenas para recobrar força total alguns sincronizar-se apenas com esse? Qual a estrutura da rede. que codifica como os
segundos depois. grilos, ou as pessoas, se influenciam mutuamente? Refletindo cada vez mais
Aplausos sincronizados dificilmente são algo excepcional para o pequeno sobre redes e cada vez menos sobre grilos, Watts procurou seu orientador de
teatro Kamra de Budapeste. São uma ocorrência regular ao final de apresenta­ doutorado, Steven Strogatz, para consultar-se. Professor de matemática apli­
ções cênicas, concertos ou eventos esportivos na Europa Oriental e, às vezes, cada em Comell, notabilizado pelos estudos acerca do caos e da sincronização,
são ouvidos em qualquer parte do mundo. Surgiram espontaneamente, por Strogatz não é conhecido por deixar escapar uma ideia heterodoxa. Logo se
exemplo, no Madison Square Garden, quando o público inconscientemente sin­ viram em territórios desconhecidos, deslocando as redes para além das frontei­
cronizava seus aplausos em homenagem a Wayne Gretzky, o lendário jogador ras estabelecidas por Erdós e Rényi.
de hóquei, antes de aposentar-se do New York Rangers em 1999. Espontâneos e Watts principiou sua incursão pelas redes com uma pergunta simples: qual
misteriosos, os aplausos sincronizados oferecem um exemplo magnífico de a probabilidade de dois amigos meus se conhecerem? Como vimos há pouco,
auto-organização, obedecendo a leis rigorosas que são amplamente investigadas essa questão recebe uma clara resposta na teoria de rede randômica. Como os
por físicos e matemáticos. Algumas espécies de vaga-lume também se sujeitam a nós se articulam de maneira aleatória, meus dois melhores amigos têm a mesma

40 41
probabilidade de se conhecerem, tanto quanto um gondoleiro veneziano e um Erdós l. Os que escreveram um trabalho com um coautor de Erdós possuem
pescador esquimó. Evidentemente, como argumentou Granovetter 25 anos número de Erdós 2, e assim por diante. Um baixo número de Erdós é motivo de
atrás, não é assim que a sociedade funciona. Somos membros de grupos nos orgulho - tanto que há quem suspeite de que falsas colaborações possam ter
quais todo mundo conhece todo mundo. Logo, meus dois melhores amigos ine­ sido engendradas após a morte de Erdós, em 1996, para rebaixar o número de
vitavelmente se conhecerão. Para aduzir evidências acerca da natureza gregária alguém. Consequentemente, matemáticos de todo o mundo se esforçaram (e
da sociedade, em termos aceitáveis para um matemático ou físico, precisamos ainda se esforçam) para demonstrar suas respectivas distâncias em relação a
ser capazes de mensurar as clusterizações. Para tanto, Watts e Strogatz introdu­ esse excêntrico centro do universo matemático. Para facilitar essa pesquisa de
ziram uma grandeza chamada coeficiente de clusterização (clustering coeffi.cient). distância, Jerry Grossmann, professor de matemática da Universidade de Oak­
Admitamos que alguém tenha quatro bons amigos. Se todos eles também forem land, em Rochester, Michigan, mantém uma detalhada página da Web com uma
amigos uns dos outros, é possível vincular cada um deles a um link, obtendo ao coletânea de números de Erdós de milhares de matemáticos, possibilitando que
todo seis links de amizades. Há probabilidade, contudo, de que alguns de seus qualquer matemático com trabalho publicado possa calcular seu próprio
amigos não sejam amigos uns dos outros. Então, a conta chegará a menos de número.
seis links - digamos, quatro. Nesse caso, o coeficiente de clusterização do cír­ Muitos matemáticos apresentam números de Erdós bastante reduzidos,
culo de amigos dessa pessoa é 0,66, que se obtém dividindo-se o número efetivo geralmente de dois a cinco passos de Erdós. Mas a influência de Erdós extrapola
de links entre seus amigos (quatro) pelo número de links que poderiam ter se seu campo imediato. Economistas, físicos e cientistas da computação também
todos fossem amigos uns dos outros (seis). podem facilmente conectar-se a ele. Einstein tem número de Erdós 2. Paul
O coeficiente de clusterização nos informa o grau de coesão de nosso cír­ Samuelson, prêmio Nobel de Economia, tem 5. James D. Watson, codescobridor
culo de amigos. Um número próximo de 1 significa que todos os nossos amigos da dupla hélice, tem 8. Noam Chomsky, o célebre linguista, tem 4. Até William
são bons amigos uns dos outros. Por outro lado, se o coeficiente de clusteriza­ H. (Bill) Gates, fundador da Microsoft, que pouca ciência publicou, tem número
ção for zero, significará que somos os únicos que agregamos nossos amigos, Erdós 4. Meu número de Erdós também é 4. Erdós escreveu um trabalho com
quando não parecerem apreciar a companhia uns dos outros. A visão granovet­ Joseph E. Gillis, que teve George H. Weiss entre seus 17 coautores, o qual, por
teriana de sociedade comporta muitas clusteí:izações altamente conectadas, sua vez, trabalhou com H. Eugene Stanley, meu orientador no doutorado, de
interligadas entre si por vínculos fracos. Uma rede tão altamente clusterizada quem fui coautor em um livro e em mais de uma dúzia de artigos científicos.
deveria possuir um grande coeficiente de clusterização. Para obter evidência A própria existência do número de Erdós demonstra que a comunidade
quantitativa de que a sociedade é, de fato, permeada por essas clusterizações, científica forma uma rede altamente interconectada na qual todos os cientistas
precisaríamos medir o coeficiente de clusterização de cada habitante da Terra. estão linkados _reciprocamente pelos trabalhos acadêmicos que produzem. A
Como não há nenhum mapa que nos indique quem está conectado a quem e pequenez de muitos números de Erdós indica que essa rede científica constitui
quem é amigo de quem, trata-se de tarefa impossível. Felizmente, contudo, um realmente um mundo pequeno. Como só raramente acontece de os autores de
subconjunto peculiar da so_çiedade regularmente publica seus vínculos sociais. uma publicação não se conhecerem pessoalmente, a coautoria representa víncu­
Podemos, portanto, verificar a clusterização entre esse grupo incomum. los sociais fortes. Consequentemente, a rede científica é um protótipo em
pequena escala de nossa rede social, com a única característica de que suas
conexões são regularmente divulgadas. Com efeito, da mesma forma como os
pesquisadores podem localizar trabalhos sobre determinado tópico, assim tam­
2. bém todas as publicações científicas são registradas em bancos de dados compu­
tadorizados; isso automaticamente cria um registro digital pormenorizado das
conexões sociais e profissionais entre os cientistas. Podemos, portanto, uti­
Hoje Paul Erdós é famoso não apenas por seus mumeros teoremas e
lizá-los para estudar a estrutura da rede de colaboração.
demonstrações, mas também por um conceito por ele inspirado: o número de
Foi exatamente isso que se fez na primavera de 2000. Tamás Vicsek, um
Erdós. Tal autor publicou mais de 1.500 trabalhos com 507 coautores. É uma
distinto pesquisador e chefe do Departamento de Física Biológica da Universi­
honra ímpar incluir-se entre suas centenas de coautores. Em suma, é uma
dade Eõtvõs, em Budapeste, durante o ano acadêmico de 1999 a 2000, organi­
grande distinção estar a apenas dois links dele. Para avaliar a própria distância
zou um programa anual voltado para a física biológica no Instituto de Estudos
em relação a Erdós, os matemáticos introduziram o número de Erdós. Este tem
Avançados, situado em um charmoso castelo medieval de Buda, com vista para
número de Erdós zero. Aqueles que foram coautores dele possuem número de

42 43
o Danúbio. Zoltán Néda, físico da Romênia, foi um dos participantes que trouxe importante de Watts e Strogatz é que a clusterização não se detém na fronteira
consigo Erzsébet Ravasz, à época estudante de mestra�o do grupo de Néd� . das redes sociais.
_ _
Também fazia parte da equipe András Schubert, esl;)eciahsta �m soc10me:11a Conquanto seja comum associar a inteligência humana à complexidade e à
que trabalhava na Academia Húngara, o qual teve acesso, para fim de pesqmsa, dimensão da rede neural no interior de nosso cérebro, o impronunciável Cae­
a grandes bancos de dados de coautoria. Com Vicsek, Ravasz, Néda, Schubert � norhabditis elegans, citado pelo apelido C. elegans, é prova viva de quão longe se
Hawoong Jeong, conectamos todos os matemáticos por meio de trabalhos publi­ pode alcançar com meros 302 neurônios. Apesar de seu intervalo de vida de
cados entre 1991 e 1998, compondo a rede altamente inter�gada de 70.97� duas a três semanas, esse verme de um milímetro teve uma brilhante trajetória
matemáticos, conectados por mais de 200 mil links de coautona. Se os ma�e�a­ desde que Sydney Brenner, eminente biólogo molecular do Molecular Sciences
ticos houvessem escolhido seus coautores aleatoriamente, a rede randormca Institute, em Berkeley, na Califórnia, elegeu-o, em 1962, "cobaia" da biologia
resultante teria, segundo a teoria de Erdós e Rényi, um pequeno coe�ciente de molecular. Desde então, ele figura em milhares de artigos e tem sido procriado
_ _
clusterização de, aproximadamente, 10-5 • Contudo, nossas mensuraçoes md1ca­ em centenas de laboratórios no mundo todo, e diversas páginas da Web lhe são
ram que o coeficiente de clusterização da rede real de colaboração é cerca de 10 dedicadas.
mil vezes maior, o que prova que os matemáticos não escolhem seus colabor�­ Embora seu genoma não seja tão diferente do dos humanos, C. eleg_ans é
dores de maneira aleatória. Eles formam antes uma rede altamente clusten­ um dos organismos multicelulares mais simples. De fato, os cientistas consegui­
zada semelhante à identificada por Granovetter na sociedade em sentido lato. ram decifrar a precisa trama de seu sistema nervoso, criando um mapa que
'Desconhecido pelo grupo, Mark Newman, físico do Instituto Santa Fé, detalha quais neurônios estão conectados a outros neurônios. Estudando esse
também esteve investigando o grafo de colaboração de cientistas - particular­ diagrama da rede neural, Watts e Strogatz descobriram que essa minúscula rede
mente dos físicos, médicos e cientistas da computação -, formulando questões não difere muito da social em geral. Ela revela alto grau de clusterização - tão
similares às que fizemos em Budapeste. Newman, cuja habilidade vai dos siste­ elevado, de fato, que os vizinhos de um neurônio têm cinco vezes mais probabi­
mas randômicos às extinções de espécies em ecossistemas, reconheceu a oportu­ lidade de estarem interligados do que teriam em uma rede randômica. Os pes­
nidade única que nosso mundo computadorizado nos oferece para finalmente quisadores detectaram o mesmo padrão quando estudaram a rede elétrica do
conhecer as redes. Antes de se voltar para as redes de colaboração, ele havia Oeste americano, cujos nós são geradores e transformadores interligados por
escrito diversos trabalhos sobre mundos pequenos que agora são considerados linhas de força. Essa rede de força também revela um alto grau de clusterização
clássicos. Quando nosso computador estava rodando os primeiros resultados, incomum. Da mesma forma opera a rede de colaboração de atores de Holly­
ele postou na Internet seu primeiro trabalho sobre colaborações entre cientistas. wood, rede que discutiremos com mais detalhes no capítulo 5.
O trabalho de Newman provou que a atividade cotidiana da ciência se processa Graças ao alto interesse por clusterização suscitado pela descoberta ines­
por meio de grupos densamente conectados de cientistas, ligados por ocasi? n�s perada de Watts e Strogatz, subsequentemente a comunidade científica tem
_ _
links fracos. Seu trabalho, combinado com o nosso, proporcionou evidencia estudado muitos outros tipos de redes. Sabemos agora que a clusterização está
quantitativa de algo que sentíramos ser verdade desde o início, m�s q�e era presente na Web; identificamo-la nas redes físicas que conectam os computado­
notoriamente difícil de mensurar antes dos computadores: a clustenzaçao, de res na Internet; os economistas detectaram-na na rede que descreve como as
fato, está presente nos sistemas sociais. empresas se vinculam por relações de propriedade; os ecologistas veem-na em
cadeias alimentares que quantificam como as espécies alimentam umas as
outras nos ecossistemas; e os biólogos celulares descobriram que a clusterização
caracteriza a tênue rede de moléculas envolvidas em uma célula. A descoberta
3. de que a clusterização é onipresente alçou-a rapidamente da condição de carac­
terística específica da sociedade à posição de propriedade genérica das redes
Clusterização em sociedade ' é algo que entendemos intuitivamente. Os complexas, desafiando seriamente a visão de que as redes reais são fundamen­
seres humanos possuem o desejo inato de constituir rodas e grupos que lhes talmente randômicas.
proporcionem familiaridade, segurança e intimidade. Todavia, uma pr? priedade
,, da rede social só é de interesse para os cientistas se revelar algo genénco acerca
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da maior parte das redes na natureza. Por conseguinte, a descoberta mais
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4.
Para explicar a onipresença da clusterização na maioria das redes reais,
Watts e Strogatz propuseram uma alternativa ao modelo de rede randômica
postulado por Erdós e Rényi no estudo que publicaram na revista Nature, em
1998. Eles apresentaram um modelo que pela primeira .vez reconc9,iou a cluste­
rização com o caráter inteiramente ao acaso dos grafos randômicos. Perceberam
que as pessoas vivem em um círculo (Figura 4.2), em cujo âmbito todo mundo
conhece seus vizinhos imediatos. Nesse modelo simples, cada nó possui exata­
mente quatro vizinhos, que estão conectados uns aos outros por três links. Por­
tanto a rede resultante tem elevado coeficiente de clusterização. De fato, se
todo; os quatro vizinhos estivessem conectados uns aos outros, havería seis
links entre eles. Como há apenas três, o coeficiente de clusterização é de 3/6, ou
0,5, próximo do 0,56 que encontramos para os matemáticos. Para perceber que
isso realmente representa uma clusterização significativa, considere uma rede Figura 4.2. Um pequeno e clusterizado mundo: para modelar redes com alto grau de clus­
randômica na qual um nó típico ainda tem quatro vizinhos, mas é conectado terização, Duncan Watts e Steveri Strogatz partiram de um círculo de nós onde cada nó
aleatoriamente a qualquer outro nó no sistema. O número de links entre meus se conecta ao seguinte e a seus vizinhos mais próximos (esquerda)'. Para tomar esse
quatro vizinhos depende agora do tamanho da rede. Se eu tiver 12 nós, como mundo um mundo pequeno, adicionam-se alguns links extras, conectando nós aleatoria­
mente escolhidos (direita) . Esses links de amplo espectro oferecem o atalho crucial entre
tenho na figura, o coeficiente de clusterização será de 0,33. Para 1 bilhão de
nós distantes, encurtando drasticamente a separação média entre todos os nós.
nós, contudo, ele cai para 4 em 1 bilhão. Evidentemente, o coeficiente de cluste­
rização de 0,5 que o novo modelo prevê é gigantesco, se comparado a esses
valores. um link para meu alvo australiano por meio dos links de amizade cada vez mais
Porém, temos de pagar um preço pela elevada clusterização que o modelo densos que meu amigo está criando em torno de si exatamente agora. Um
nos proporciona. Foi-se nosso mundo pequeno. Na sociedade-modelo mostrada modelo realista de sociedade hoje deve possibilitar links distantes. Podemos
na figura, apenas meus vizinhos imediatos e mais próximos estão ligados a facilmente perceber isso no modelo descrito na figura 4.2, adicionando poucos
mim. Para contatar alguém que se encontra do outro lado do círculo, teria, lite­ links a alguns nós selecionados aleatoriamente em torno do círculo. Em outras
ralmente, de rodear o círculo, apertando inúmeras mãos pelo caminho. Efetiva­ palavras, tomemos dois nós quaisquer ao longo do círculo e os conectemos a um
mente, é fácil perceber que o caminho mais curto que liga o nó do topo ao nó da novo link. Isso reduzirá para 1 a distância entre os nós escolhidos, e seus vizi­
base tem uma extensão de pelo menos três links. Pode não parecer muito, mas nhos imediatos ficarão muito mais próximos também uns dos outros. Se eu adi­
se tivesse tido a paciência (e espaço) de desenhar 6 bilhões de nós ao longo do cionar esses links aleatórios, poderei manter todos os nós. bem próximos entre
mesmo anel, cada qual conectado a seus vizinhos imediatos e próximos, o ata­ si.
lho mais curto para o lado oposto do círculo demandaria mais de 1 bilhão de A surpreendente descoberta de Watts e Strogatz é que poucos links extras
apertos de mão! Logo, uma sociedade em círculo não só é altamente clusteri­ já são suficientes pma reduzir drasticamente a separação média entre os nós.
zada, como também representa um "mundo demasiado grande" (grandes dis­ Esses poucos links não alterarão significativamente o coeficiente de clusteriza­
tâncias de separação entre os nós). ção. Todavia, graças às extensas pontes que formam, frequentemente conec­
Na realidade, todos temos links com pessoas distantes em volta do mundo. tando nós no lado oposto do círculo, o grau de separação entre todos os nós
Temos amigos que não vivem localmente próximos uns dos outros. Se quiser decai de forma significativa. A capacidade que tem o modelo de reduzir drasti­
encontrar um caminho para uma pessoa na Austrália, não irei de porta em camente a separação, mantendo o coeficiente de clusterização praticamente
porta, porque mais cedo ou mais tarde chegarei ao oceano Pacífico. Em vez inalterado, indica que podemos ser bastante provincianos na escolha de nossos
disso, eu me lembrarei de que meu melhor amigo da escola secundária se amigos, desde que uma pequena parcela da população possua alguns links de
mudou para Sidney há poucos anos. Logo, tudo o que preciso fazer é encontrar grande alcance. Segundo o insight proporcionado por esse modelo simples, os

46 47
seis graus de separação baseiam-se no fato de que algumas pessoas possuem trouxe um aglomerado de hubs - nós dotados de um número extraordinaria­
amigos e parentes que já não vivem próxim.os a elas. Esses links distantes nos mente grande de links. O problema era que, no modelo igualitário de Erdós é
oferecem atalhos para pessoas que se encontram em regiões muito remotas do Rényi, esses hubs são extremamente raros; era claro, portanto, que o modelo
mundo. Grandes redes não precisam ser repletas de links aleatórios para revelar não podia explicar a descoberta de nosso robô. O modelo Watts-Strogatz não se
traços de mundo pequeno. Poucos links desses darão conta do recado. saía muito melhor, pois também impede a existência de nós significativamente
com mais links do que os que o nó médio possui. Claramente.faltava algo impor­
tante de ambos os modelos, o que limitava nossa compreensão do universo em
forma de teia. Os dados nos levaram a buscar uma melhor compreensão das
s. redes reais, obrigando-nos, por fim, a abandonar de vez a cosmovisão randô­
mica. Seguindo esse caminho, os eventos deram uma guinada bastante inespe­
A publicação do trabalho de Watts-Strogatz acerca da clusterização, dois rada. Tivemos de descartar simplesmente tudo o que havíamos aprendido
anos após a morte de Erdós, suscitou enorme interesse igualmente entre físicos acerca das redes até então.
e matemáticos. Em primeiro lugar, formalizou a visão de Granovetter ao propor
um modelo que efetivamente revelava clusterização significativa. Em segundo
lugar, desempenhou papel único ao chamar a atenção da comunidade dos físi­
cos e matemáticos para o problema do mundo pequeno, temática muito investi­
gada na sociologia. Por um breve momento, teve-se a impressão de que o
modelo mais geral, do grupo ·de amigos, proposto por Watts e Strogatz substitu­
iria o universo randômico de Erdós e Rényi. Todos poderíamos nos relacionar
com a simples representação da ordem familiar local salpicada de poucos links
distantes, oferecendo uma lúcida explanação dos mundos pequenos que existem
em tomo de nós. o modelo propunha um sofisticado compromisso entre o
mundo inteiramente randômico de Erdós e Rényi, que é um mundo pequeno,
mas hostil aos círculos de amigos, e de uma treliça regular, que revela alta clus­
terização, mas na qual existem nós que estão bem distantes uns dos outros.
Hoje entendemos que o modelo Watts-Strogatz não é incompatível com a
cosmovisão de Erdós-Rényi. Decerto, ao pressupor que começamos com uma
treliça regular, ele, de fato, admite clusters. Mas, de diversas formas, sua filoso­
ª
fia fundamental continua seguir de perto a visão de Erdós e Rényi. Indepen­
dentemente do arranjo inicial dos nós ao longo do círculo, conectamos os nós
de maneira inteiramente randômica uns aos outros. Por conseguinte, ambos os
modelos descrevem uma sociedade profundamente igualitária, cujos links são
regulados pelo lance de um dado.
Quando o trabalho pioneiro de Watts e Strogatz foi publicado em 1988,
meu grupo de pesquisa estava tentando entender a estrutura das redes comple­
xas, enfocando principalmente a Web. Levou algum tempo para que se perce­
besse inteiramente a importante mensagem do trabalho e se apreciasse a capa­
cidade do novo modelo de congregar a visão de mundo de Erdós-Rényi com a
sociedade clusterizada de Granovetter. Com o tempo, isso aconteceu, e tínha­
mos uma situação emergente em mãos. Nosso pequeno robô retomou da Web
com uma rede que era drasticamente diferente das previsões dos modelos tanto
de Erdós-Rényi como de Watts-Strogatz. Como veremos no capítulo 5, ele nos

48 49
juntando facilmente diferentes raças, níveis de instrução e linhagens. Ao obser­
QUINTA CONEXÃO var os conectores, Gladwell pensou estar vendo algo particularmente humano.
De fato, sem sabê-lo, havia se deparado por acaso com algo maior, um fenô­
meno que intrigava meu grupo de pesquisa muito antes da publicação de The
Tipping Point. Os conectores - nós que contêm um número anomalamente
Hubs e Conectores grande de links - estão presentes em diversos sistemas complexos, que vão da
economia à célula. São uma propriedade fundamental da maioria das redes,
fato que intriga cientistas de disciplinas tão díspares quanto a biologia, a ciência
da computação e a ecologia. Sua descoberta subverteu tudo o que até então
pensávamos saber a respeito de redes. A clusterização expôs a primeira fissura
na visão randômica de mundo de Erdós-Rényi. O modelo simples de Watts e
Strogatz, discutido no capítulo 4, salvou a situação, reconciliando o círculo de
amigos com os seis graus de separação. Os conectores são o golpe definitivo
contra ambos os modelos. Para dar conta desses nós altamente conectados, é
preciso abandonar de uma vez por todas a cosmovisão randômica.

Malcolm Gladwell, redator da revista New Yorker, apresenta em seu recen­


te livro, The Tipping Point, um teste simples que serve para aferir o grau de
sociabilidade de um indivíduo. Ele fornece uma lista de 248 sobrenomes compi­ 1.
lados de uma lista telefônica de Manhattan e pede que o leitor atribua um
ponto a si mesmo se por acaso conhecer alguém com um daqueles nomes. Múl­ O ciberespaço representa a liberdade fundamental de expressão. Alguns
tiplos também contam: se o leitor conhecer três pessoas chamadas Jones, um püdem estar contrariados, outros podem amá-lo, mas o conteúdo de uma
dos nomes constantes da lista, somará três pontos. Correndo a lista pelos alunos página da Web é de difícil censura. Uma vez postada, fica à disposição de cente­
universitários do City College of Manhattan, muitos deles imigrantes recentes nas de milhões de pessoas. Essa inigualável liberdade de expressão, combinada
na casa dos 20, Gladwell registrou um escore médio de 21. Em outras palavras, com custos reduzidos de publicação, faz da Web o fórum máxim3 da democra­
eles geralmente conheciam cerca de 21 pessoas com o mesmo sobrenome de cia; a voz de qúalquer pessoa pode ser ouvida com idêntica oportunidade. Pelo
alguém da lista. Um grupo aleatório majoritariamente branco, formado por menos é o que enfatizam advogados constitucionalistas e vistosas revistas de
indivíduos de elevada escolaridade, obteve escore por volta de 39, quase o negócios. Se a Web fosse uma rede randômica, eles estariam certos. Mas não é.
dobro do obtido por estudantes universitários. Esse resultado foi pouco surpre­ O resultado mais curioso de nosso projeto de mapeamento da Web foi a com­
endente. Mas o que chamou a atenção de Gladwell foi a amplitude. Na classe pleta falta de democracia, de equidade e de valores igualitários nela. Descobri­
dos universitários, os escores foram de 2 a 95. Em uma amostra aleatória, o mos que a topologia da Web não nos permite perceber senão uma mera parcela
escore mais baixo foi 9 e o mais alto, 118. Mesmo para um grupo altamente dos bilhões de documentos nela existentes.
homogêneo de pessoas de idade, nível educacional e renda similares, a ampli­ Quando se trata da Web, a questão fundamental já não é se nossas concep­
tude era enorme: o escore mais baixo foi 16, enquanto o mais alto chegou a ções podem ser divulgadas. Elas podem. Uma vez divulgadas, estarão instanta­
108. Gladwell prosseguiu testando cerca de 400 pessoas no total, encontrando neamente à disposição de qualquer pessoa em qualquer parte do mundo que
sempre algumas com escores muito elevados em todo grupo social observado. possua conexão com a Internet. A questão é saber se, levando-se em conta esse
Sua conclusão foi inevitável: "Em meio a esse universo... encontra-se um cenário de 1 bilhão de documentos, a informação que postamos na Web será
punhado de pessoas que tem um dom realmente extraordinário de fazer amigos percebida por alguém.
e conhecidos. Elas são conectores". Para ser lido, é preciso ter visibilidade, truísmo igualmente válido para
Os conectores são um componente extremamente importante da nossa escritores de ficção e cientistas. Na Web, a medida de visibilidade é o número de
rede social. Eles criam tendências e modas, fazem contatos importantes, espa­ links. Quanto mais links de entrada para nossa página na Web, mais visível ela
lham novidades ou ajudam a abrir um restaurante. São a tessitura· da sociedade, será. Se cada documento na Web tivesse um link para nossa página, em pouco

50 51
tempo todo mundo saberia o que temos a dizer. Mas a página média da Web Os hubs são o mais forte argumento contra a visão utópica de um ciberes­
possui apenas, aproximadamente, de cinco a sete links, cada um deles apon­ paço igualitário. Sim, todos temos o direito de colocar o que quisermos na Web.
tando para uma dentre 1 bilhão de páginas existentes. Por conseguinte, a proba­ Mas alguém perceberá? Se a Web fosse uma rede randômica, teríamos a mesma
bilidade de que um documento específico conecte-se a nossa página na Web chance de ser vistos e ouvidos. Coletivamente, de certa forma criamos hubs,
aproxima-se de zero. Websites a que todo mundo se conecta. São muito fáceis de encontrar, indepen­
Essa conclusão aplica-s e perfeitamente a minha h o m e page, dentemente de onde estejamos na Web. Em comparação a esses hubs, o restante
http://www.nd.edu/-alb. Segundo o AltaVista, existem cerca de 40 outras da Web é invisível. Para todos os propósitos práticos, páginas conectadas por
páginas da rede mundial que se conectam a ela. Sinceramente é muito, conside­ apenas um ou dois outros documentos simplesmente não existem. É quase
rando-se seu restrito escopo. Todavia, se levarmos em conta que há cerca de 1 impossível encontrá-las. Até as ferramentas de busca lhes são desfavoráveis,
bilhão de páginas para escolher, a probabilidade de que o leitor descubra minha ignorando-as quando rastreiam a Web à procura de novos sites mais
página na Web é de aproximadamente 40 em 1 bilhão. Em outras palavras, se o interessantes.
leitor navegar ao acaso na Web e a visita a cada página demorar apenas dez
segundos, ele navegará oito anos, dia e noite, antes de seguir um link que indi­
que minha home page.
Cada pessoa tem interesses, valores, crenças e preferências bem diferentes. 2.
Os links que adicionamos a nossas páginas da Web refletem essa diversidade.
Conectamos todo o mapa, de sites sobre arte tribal africana a portais de comér­ O filme ·de Kevin Bacon, The Air Up There (Um Gigante d e Talento), foi ao
cio eletrônico. Considerando o bilhão adicional de nós dentre os quais podemos ar pela televisão na noite em que Craig Fass, Brian Turtle e Mike Ginelly, alunos
escolher, podemos esperar que o padrão de conexão resultante seja randômico. do Albright College em Reading, na Pensilvânia, tiveram uma revelação. Repen­
Essa conexão randômica implicaria a predominância do modelo Erdós-Rényi. tinamente lhes ocorreu que Bacon atuara em filmes tão diferentes que era possí­
Uma Web randômica seria o mensageiro por excelência do igualitarismo, pois a vel conectá-lo a praticamente qualquer ator em Hollywood. Eufóricos, em jane­
teoria Erdós-Rényi assegura que todos os nós são muito semelhantes entre si, . iro de 1994, eles enviaram· uma carta a Jon Stewart Show, um irreverente e
cada qual contendo aproximadamente o mesmo número de links de entrada. célebre programa de entrevistas popular cujo público é formado por estudantes
Nossas avaliações, entretanto, contestam essas expectativas. O mapa que universitários. "Somos três homens em missão. Nossa miss�o é provar ao
nosso robô nos disponibilizou revelou evidências de alto grau de desigualdade público de Jon Stewart, ou melhor, ao mundo, que Bacon é Deus." Para a sur­
na topologia da Web. Das 325 mil páginas no domínio da Universidade de Notre presa deles, conseguiram seus 15 minutos de fama. Foram convidados a compa­
Dame que pesquisamos, 270 mil, ou 82% de todas as páginas, possuíam três ou recer ao programa de Stewart com Kevin Bacon e encantaram o público com
menos links de entrada. Entretanto, uma pequena minoria, aproximadamente sua capacidade de conectar Bacon a qualquer ator cujo nome lhes fosse mencio­
42 páginas, fora refere11ciada por mais de mil outras páginas e tinha mais de mil nado. Apesar disso, estavam redondamente equivocados. Bacon não está mais
links de entrada! Avaliações subsequentes, feitas a partir de uma amostra de próximo do centro de Hollywood do que do centro do universo.
203 milhões de páginas da Web, revelaram um espectro ainda maior: a maioria, A grande sacada desses estudantes, se assim se pode.chamar, foi observar
até 90% de todos os documentos, tem dez ou menos links que lhe fazem que todo ator em Hollywood pode ser conectado a Kevin Bacon geralmente com
referência, enquanto algumas, cerca de três páginas, são referenciadas por apro­ dois ou três links. Por exemplo, Tom Cruise está apenas a um passo de distância
ximadamente 1 milhão de outras páginas. de Bacon porque atuaram juntos em A Few Good Men (Questão de Honra). Utili­
Como em uma sociedade poucos conectores conhecem um número extra­ zando-se a analogia do número de Erdós, Tom Cruise tem número de Bacon 1.
ordinariamente grande de pessoas, descobrimos que a arquitetura da Web é Mike Myers tem 2, sendo conectado com Robert Wagner por The Spy Who Shag­
dominada por poucos nós ou hubs altamente conectados. Esses hubs, como o ged Me (Austin Powers - O Agente "Bond" Cama). Wagner tem número de Bacon
Yahoo! ou Amazon.com, são extremamente visíveis - para onde quer que nos 1, graças a Wild Things (Garotas Selvagens). Contudo, mesmo figuras históricas
viremos, sempre existe um outro link apontando na direção deles. Na rede que como Charlie Chaplin têm acesso a Bacon: Chaplin atuou com Barry Norton em
se encontra por trás da Web, muitos nós não populares ou pouco percebidos, Monsieur Verdoux, que atuou com Robert Wagner em What Price Glory (Sangue
que possuem apenas um pequeno número de links, são sustentados por esses por Glória), que, como já sabemos, está apenas a um link de distância de Bacon.
poucos sites da Web altamente conectados. Logo, Charlie Chaplin tem número de Bacon 3. Para complicar um pouco mais,

52 53
Paul Erdós tem número de Bacon 4, em virtude de N Is a Number, documentário Mitchum atuou com 2.905 colegas durante suas décadas na tela prateada. Esses
a.seu .respeito no qual ele próprio atua. No elenco, interpretando a si mesmo, atores excepcionalmente bem conectados são os hubs de Hollywood. Se alguns
estava Gene Patterson, que depois fez uma ponta no filme Box of Moonlight (A deles forem retirados, rapidamente os caminhos de quase todo ator para Bacon
Chave da Liberdade), pelo qual ganha número de Bacon 3. E como N Is a Number serão drasticamente alongados.
representou o creme de la creme da teoria dos grafos, muitos matemáticos não Por um lado, seria razoável supor que os atores que atuaram nos princi­
só possuem um pequeno número de Erdós, mas também um pequeno número pais filmes são também os mais conectados, tendo menor distância em relação a
de Bacon. qualquer outro em Hollywood. Em geral, esse fato parece ser verdadeiro.
O jogo de Kevin Bacon teria permanecido apenas um mero passatempo Quanto mais filmes um ator fizer, mais curta será sua distância média em rela­
sobre filmes se dois estudantes de ciência da computação não tivessem assistido ção a seus colegas. Por outro lado, a listagem de atores com os principais filmes
ao programa de Stewart. Glen Wasson e Brett Tjaden, da Universidade da Virgi­ não nos informa os atores mais conectados e também contém algumas surpre­
nia, imediatamente perceberam que a determinação da distância entre dois ato­ sas. Compilada por Hawoong Jeong, a lista dos dez mais, que informa entre
res quaisquer era um projeto viável de ciência da computação caso se tivesse parênteses o número de filmes em que atuaram, apresenta a seguinte composi­
acesso a um banco de dados de todos os atores e filmes já lançados. O Internet ção: Mel Blanc (759), Tom Byron (679), Marc Wallice (535), Ron J_eremy
Movie Database, ou IMDb.com, uma fonte de influência cinéfila que oferece (500), Peter North (491), T. T. Boy (449), Tom London (436), Randy West
mais informações sobre atores e filmes do que se pode precisar, já estava funcio­ (425), Mike Horner (418) e Joey Silvera (410). Para muitos, esses nomes são
nando. Transcorreram algumas semanas de programação para que Wasson e tão irreconhecíveis quanto foram para nós quando olhamos a lista pela primeira
Tjaden instalassem o Website do oráculo de Bacon, que se tornou o mestre vez. Bem, o leitor pode conhecer Mel Blanc, o famoso intérprete de desenhos
imbatível do jogo. Se clicarmos no nome de dois atores quaisquer, em milisse­ animados populares e queridos como Pemalonga, Pica-Pau, Patolino, Gaguinho,
gundos ele informará o caminho mais curto entre eles, listando a cadeia de ato­ Piu-Piu e Frajola. E aqueles com mais de 50 anos de idade terão visto Tom Lon­
res e filmes pelos quais são conectados. Até então o Website nunca havia alcan­ don, talvez o mais inventivo ator de filme de faroeste B, representar inúmeros
çado mais de 20 mil visitas ao dia, o que o levou a entrar· na lista dos dez xerifes, donos de ranchos e capangas;, O restante dos atores da lista dos mais
principais sites (top ten) de 1997 da revista Time. Na última que verifiquei, em prolíficos, contudo, nos é totalmente desconhecido. Depois de p'esquisar um
26 de agosto de 2001, ele havia recebido mais de 13 mil visitas em um único pouco, simplesmente os descartamos. São todos atores pornôs.
dia. A lista talvez seja a mais vívida demonstração de que quando se trata de
redes, tamanho nem sempre importa. A despeito do número recorde de filmes
que os atores -pornôs fazem, em parte alguma eles conseguem se aproximar do
centro de Hollywood. Como as redes são clusterizadas, nós que são conectados
3. apenas a nós em seu cluster teriam um papel central nessa subcultura ou
gênero. Sem links que os conectem ao mundo exterior, eles podem ficar bem
Podemos nos entreter com o jogo de Kevin Bacon porque Hollywood distanciados de nós existentes em outros clusters. Logo, é mais difícil conectar
forma uma rede densamente interconectada na qual os nós são atores conecta­ um ator que atuou apenas em filmes pornôs e tem links apenas com estrelas
dos pelos filmes em que atuaram. Um ator tem links com todos os outros do pornôs ao elenco de um filme de Martin Scorsese ou Andrey Tarkovsky. Eles
elenco. Assim, aqueles que atuaram em diversos filmes rapidamente adquirem simplesmente transitam em mundos muito diferentes. A posição realmente cen­
links. Como cada ator tem uma média de 27 links, bem mais do que o necessá­ tral nas redes é reservada àqueles nós que são simultaneamente parte de clus­
rio 1 para tornar a rede plenamente conectada, os seis graus são inevitáveis. ters muito maiores. São os atores que atuaram em gêneros bem diferentes ao
Cada ator pode ser conectado com qualquer outro ator através de três links em longo de suas carreiras. São as páginas da Web que não só referenciam arte
média. Todavia, como observou meu grupo de pesquisa ao analisar a rede de moderna, mas também possuem links para todos os domínios de investigação
ator, as médias não se aplicam aqui, pois até 41% de atores têm menos do que humana. São os indivíduos que regularmente entram em contato com pessoas
dez links. Esses são os atores menos conhecidos, cujos nomes aparecem na tela de diversos campos e estratos sociais. São os Erdós da matemática, que não
do cinema quando o espectador já saiu da sala de exibição. Uma pequena mino­ podem ser confinados em um compartimento, que representam, com igual
ria de atores, contudo, tem bem mais de dez links. John Carradine colecionou 4 desenvoltura, questões relevantes para muitos subcampos da ciência. São os
mil links com outros atores durante sua prolífica carreira, ao passo que Robert

54 55
Leonardos da Vinci das redes, que se sentem . à vontade tanto nas artes como nas redes reais. Não havia nada que nos preparasse para eles porque eram proibidos
ciências. tanto pelo modelo de Erdós-Rényi quanto pelo de Watts-Strogatz. Simplesmente
Evidentemente, Bacon é um ator magistral de Hollywood. Atuou em mais não se supunha que existissem.
de 46 filmes, colecionando links com mais de 1.800 atores. Sua separação A descoberta de que na Web poucos hubs detêm a maior parte dos links
média de qualquer outro em Hollywood é de 2,79 - ou seja, muitos atores estão deu início a uma frenética pesquisa de hubs em diversas áreas. Os resultados
a três links dele. Essa é a razão pela qual alguns são tão bons no jogo de Kevin são surpreendentes: sabemos agora que Hollywood, a Web e a sociedade não
Bacon, conectando facilmente qualquer outro ator a ele. Mas Bacon é o ator são de forma alguma casos incomuns. Por exemplo, hubs emergem na célula,
mais conectado? Quando Hawoong Jeong preparou a lista dos mil atores mais dentro da rede de moléculas conectadas por reações químicas. Poucas molécu­
conectados, os verdadeiros hubs de Hollywood, levou certo tempo para localizar las, como a água ou o trifosfato de adenosina (ATP), são os Rod Steigers da
Bacon ali. Vimos Rod Steiger na primeira posição, com uma distância média de célula, participando de um enorme número de reações. Na Internet, a rede de
2,53 em relação a qualquer outro. Donald Pleasence, com uma separação de linhas físicas que conectam computadores em todo o mundo, foram estabeleci­
2,54, estava logo atrás dele. Martin Sheen, Christopher Lee, Robert Mitchum e dos poucos hubs para desempenhar um papel crucial no sentido de garantir a
Charlton Heston ocuparam as quatro posições seguintes, cada qual com uma solidez da Internet contra falhas. Erdós é um grande hub da matemática,
separação menor que 2,57. Lemos centenas de nomes, repassamos dezenas de enquanto 507 matemáticos têm número de Erdós 1. Segundo estudo da AT&T,
páginas, sem nenhum sinal de Bacon. Por fim o localizamos no final da lista, poucos números de telefone são responsáveis por uma parcela extraordinaria­
ocupando a 876ª posição. mente elevada de chamadas efetuadas ou recebidas. Embora aqueles que
Por que, então, nos entretemos com o jogo de Kevin Bacon? A proeminên­ tenham um adolescente morando em casa possam duvidar da identidade de
cia de Bacon é um feliz acaso histórico baseado na publicidade proporcionada alguns desses hubs telefônicos, a verdade é que as empresas de telemarketing e
pelo programa de Stewart. Todo ator está a três links de muitos atores. Bacon os números do serviço de atendimento a9 consumidor provavelmente são os
não é de forma alguma especial. Ele não se encontra longe apenas do centro do verdadeiros responsáveis. Os hubs aparecem na maioria das grandes redes com­
universo, mas, de fato, do centro de Hollywood. plexas que os cientistas conseguiram estudar até agora. Eles estão por todà­
parte, como um bloco de construção genérico de nosso complexo mundo
interconectado.

4.
Um universo randômico não suporta conectores. Se a sociedade fosse ran­ 5.
dômica, então na modesta amostra social de Gladwell de 400 · pessoas, com suas
médias em torno de 39 links sociais, o indivíduo mais social teria bem menos De uns tempos para cá, os hubs têm desfrutado excepcional atenção. Cele­
conhecidos do que os 118 encontrados. Se a Web fosse uma rede randômica, a brando o poder dos conectores\ Emanuel Rosen reservou diversos capítulos de
probabilidade de haver uma página com 500 links de entrada seria 10-99 - ou seu livro The Anatomy of Buzz para categorizar hubs sociais ·e verificar o papel
seja, praticamente zero, indicando que hubs são proibidos sem uma Web rando­ que desempenham na disseminação de novidades e modismos. A cada quatro
micamente conectada. Todavia, a pesquisa mais recente acerca da Web, reco­ anos, os Estados Unidos empossam um novo hub social - o presidente. De fato,
brindo menos de um quinto · de toda a rede, encontrou 400 dessas páginas e um a agenda de Franklin Delano Roosevelt continha cerca de 22 mil nomes, tor­
documento com mais de 2 milhões de links de entrada. A probabilidade de nando-o um dos maiores hubs da época em que viveu. Três eminentes biólogos
encontrar um nó desses em uma: rede randômica é menor do que a de localizar sugeriram recentemente, na prestigiosa revista científica Nature, que a natureza
um átomo particular no universo. Se Hollywood forma uma rede randômica, de hub de uma certa molécula, a proteína p53, é a chave para entender o pro­
Rod Steiger não existe, pois a probabilidade de ter um ator tão bem conectado é cesso subjacente a muitas formas de câncer em nível molecular. Os ecologistas
de aproximadamente 10-120, um número tão pequeno que é difícil traduzi-lo acreditam que os hubs das cadeias alimentares são as espécies angulares de um
com uma metáfora adequada. Esses números incrivelmente pequenos ajudam a ecossistema, decisivas para a manutenção da estabilidade do ecossistema.
explicar nossa surpresa quando pela primeira vez identificamos hubs na Web e
em Hollywood durante nossas tentativas iniciais de entender a estrutura das 1 Entende-se conector como um hub da sociedade. (N.T.)

56 57
'!I'

A atenção para com os hubs é bem rrierecida, pois são especiais. Dominam
a estrutura de todas as redes nas quais estão presentes, fazendo-as parecer SEXTA CONEXÃO
mundos pequenos. De fato, com links para uma quantidade extraordinaria­
mente grande de nós, os hubs criam atalhos entre dois nós quaisquer no sis­
tema. Consequentemente, embora a ·separação média entre duas pessoas aleato­
riamente escolhidas na Terra seja 6, a distância entre qualquer indivíduo e um Regra 80/20
conector é frequentemente apenas de 1 ou 2. De maneira semelhante, embora
duas páginas na Web estejam a 19 cliques de distância, o Yahoo.com, um gigan­
tesco hub, pode ser acessado, da maioria das páginas da Web, em dois ou três
cliques. Da perspectiva dos hubs, o mundo é realmente muito pequeno.
A visão de que as redes são randômicas, consideradas assim por décadas
pela influência de Erdós e Rényi, tem sido questionada ultimamente em muitas
frentes. O modelo de Watts e Strogatz propôs uma explicação simples para a
clusterização, colocando as redes randômicas e a clusterização sob a mesma
égide. Uma vez mais, no entanto, os hubs desafiam o status quo. Não podem ser
explicados por nenhum dos modelos vistos até agora. Por conseguinte, os hubs
nos obrigam a reconsiderar nosso conhecimento das redes e a formular três
questões fundamentais: como surgem os hubs? Quantos deles se espera encon­ Vilfredo Pareto, o influente economista italiano, ao discursar, no início dos
trar em uma dada rede? Por que todos os modelos anteriores não conseguem anos de 1900, em uma conferência sobre economia em Genebra, foi interrom­
dar conta dos hubs? pido, reiterada e ruidosamente, por seu poderoso colega Gustav von Scbmoller.
Ao longo dos últimos dois anos, respondemos a muitas dessas questões. De Este, que de seu trono na Universidade de Berlim dominava todo o mundo aca­
fato, descobrimos que os hubs não são acidentes raros de nosso universo intera dêmico alemão, ostensivamente bradava em tom defensivo: "Mas há leis na
conectado. Pelo contrário, obedecem a rigorosas leis matemáticas cuja onipre­ economia?".
sença e cujo alcance nos desafiam a pensar sobre redes de forma bem diferente. Não obstante sua aristocrática educação, Pareto nutria pouco apreço pelas
Descobrir e explicar essas leis tem sido uma fascinante corrida de monta­ aparências, tendo escrito sua monumental obra, o Trattato di Sociologia Gene­
nha-russa durante a qual aprendemos mais acerca de nosso complexo mundo rale, segundo se reporta, quando possuía apenas um único par de sapatos e um
interconectado do que se sabia nos últimos cem anos. temo. Foi-lhe fáéil, então, passar-se por mendigo no dia seguinte e abordar von
Schmoller na rua: "Por favor, senhor", disse Pareto, "pode-me dizer onde encon­
tro um restaurante em que se coma de graça?". "Meu caro", respondeu von
Schmoller, "não há restaurantes desse tipo, mas existe um lugar dobrando a
esquina onde o senhor pode conseguir uma refeição bem barata." "Ah", disse
Pareto, rindo triunfantemente, "então há leis na economia!".
Pareto voltou sua atenção para a economia após trabalhar durante duas
décadas como engenheiro de ferrovia. Profundamente influenciado pela beleza
matemática da física newtoniana, dedicou o restante da vida a seu sonho de tor­
nar a economia uma ciência exata, passível de descrição por leis comparáveis,
em amplitude e universalidade, àquelas formuladas pelos Princípios, de Newton.
O resultado de sua incansável pesquisa, os três volumes do Trattato, continua
sendo uma fonte de inspiração e interpretação igualmente para economistas e
sociólogos.
Fora do âmbito acadêmico, Pareto é mais bem conhecido por uma de suas
observações empíricas. Ávido cultivador, reparou que 80% de suas ervilhas
eram produzidas por apenas 20% das vagens. Observador atento das desigual-

58 59
dades econômicas, verificou que 8 0% das terras italianas eram ocupadas por de sino1, uma distribuição mais parecida à de um pico que caracteriza as redes
apenas 20% da população. Mais recentemente, o princípio ou lei de Pareto, randômicas. Por exemplo, se medirmos a altura de todos os nossos conhecidos
também conhecido como a regra do 8 0/20, transformou-se na lei de Murphy da do sexo masculino e elaborarmos um histograma mostrando quantos deles têm
administração: 80% dos lucros são produzidos por apenas 2 0% dos emprega­ 1,20, 1,52, 1, 82 e 2,13 metros de altura, verificaremos que muitos indivíduos
dos, 80% dos problemas do serviço de atendimento ao consumidor são criados em nossa amostra estão entre 1, 52 e 1, 82 metro de altura. Nosso histograma
por apenas 2 0% dos clientes, 80% das decisões são tomadas durante 20% do terá um pico em tomo desses valores. De fato, a menos que nos pareçamos
tempo de uma reunião, e assim por diante. A lei de Pareto plasmou ainda uma muito com jogadores de basquete, teremos poucos indivíduos com 2,13 metros
enorme gama de outras verdades incontestáveis: por exemplo, 80% dos delitos ou mais de altura em nossa amostra. Tal fato também se aplica a pessoas de
são cometidos por 20% dos infratores. estatura mais baixa: indivíduos com 1,20 metro ou menos de altura serão muito
Sob diferentes aspectos, a regra do 8 0/20 descreve o mesmo fenômeno: na raros. Como a maioria das grandezas na natureza segue uma distribuição com
maioria dos casos, quatro quintos de nossos esforços são em ampla medida irre­ pico, que vai de nossos Qis à velocidade das moléculas em um gás, muitas pes­
levantes. Permitam-me contribuir com mais alguns itens que se assemelham à s·oas têm familiaridade com essas curvas de sino que são muito comuns.
regra do 80/20: 80% dos links da Web são dirigidos a somente 1 5 % das Webpa­ Nas últimas décadas, os cientistas reconheceram que, por vezes, a natu­
ges, 80% das citações compreendem apenas 3 8% dos cientistas, 80% dos links reza gera grandezas que seguem uma distribuição do tipo lei de potência, em
de Hollywood estão conectados a 30% dos atores. Muito embora possa ser ten­ vez de uma curva de sino. As leis de potência são muito diferentes das curvas de
tador inferir que a regra do 80/2 0 se aplica praticamente a tudo, essa seria uma sino que descrevem nossa altura. Em primeiro lugar, uma distribuição lei de
generalização grosseira. Na realidade, todos os sistemas que obedecem à lei de potência não tem pico. Pelo contrário, um histograma que segue uma lei de
Pareto são um tanto especiais. O que os distingue é uma propriedade que potência é uma curva continuamente decrescente, implicando que eventos mui­
desempenha um papel-chave também na compreensão das redes complexas. tos pequenos coexistem com poucos eventos de grande magnitude. Se a altura
dos habitantes de um planeta imaginário seguisse uma distribuição lei de potên­
cia, muitas criaturas seriam realmente baixas. Mas ninguém se surpreenderia
por ver, ocasionalmente, um monstro com 30 metros de altura caminhando pela
1. rua. De fato, entre 6 bilhões de habitantes haveria, no mínimo, um com mais de
2 .400 metros de altura. Dessa forma, o caráter distintivo de uma lei de potência

Quando Hawoong Jeong começou a construir nosso pequeno robô para não é apenas o fato de haver muitos eventos pequenos, mas que os inúmeros
mapear a Web, tínhamos expectativas ingênuas sobre como seria a rede que se eventos pequenos coexistam com poucos eventos de grande magnitude. Esses
encontra por trás da Web. Guiados pelos insights de Erdós e Rényi, esperávamos eventos extraordinariamente grandes são simplesmente proibidos em uma
descobrir que as páginas da Web são randomicamente conectadas entre si. curva de sino2•
Como discutido no capítulo 2, o número de links em uma página da Web deve­ Toda lei de potência é caracterizada por um expoente único, que nos
informa, por exemplo, quantas páginas muito populares da Web existem, com­
ria seguir uma distribuição com um pico, informando-nos de que muitos dos
parativamente a páginas menos populares. Como, nas redes, a lei de potência
documentos são igualmente populares. Mas a rede que nosso robô nos disponi­
descreve a distribuição do grau3, o expoente é frequentemente chamado de grau
bilizou como resultado de sua incursão continha muitos nós com apenas poucos
exponencial. Nossas avaliações indicaram que a distribuição de links de entrada
links e poucos hubs com uma quantidade extraordinariamente grande de links.
A maior surpresa que tivemos foi quando tentamos encaixar o histograma da
conectividade do nó em um assim chamado gráfico log-log. O resultado foi que 1 A curva de sino também é conhecida como curva de Gauss, que representa uma distribuição
aleatória de números, onde o pico é a média (N.T.).
a distribuição de links em várias páginas da Web segue precisamente uma
sino no tocante à cauda da distribuição. As curvas de sino possuem uma cauda exponencialmente
2 Observe que existe uma importante diferença qualitativa entre uma lei de potência e uma curva de
expressão matemática denominada lei de potência.
Quem não é físico ou matemático, muito provavelmente nunca ouviu falar declinante, que é um decréscimo muito mais rápido que o revelado por uma lei de potência. Essa
de leis de potência. Isto porque muitas grandezas na natureza seguem uma curva cauda exponencial é responsável pela ausência dos huhs. Em comparação, as leis de potência
decaem bem mais lentamente, possibilitando "eventos raros" como os huhs.
3 Neste caso, entende-se grau como o número de links por nó (degree distribuition), que é diferente
na expressão six degree (seis graus), em que o grau se refere à quantidade média de links (passos)
que um nó leva para encontrar qualquer outro nó (N.T.).

60 61
nas páginas da Web obedecia a uma lei de potência com um único e bem defi­ 2.
nido expoente de grau próximo de 2. Uma lei de potência semelhante se mani­
festou quando observamos links de saída, sendo o expoente de grau dessa vez
ligeiramente maior4• Percebemos melhor as surpreendentes diferenças visuais e estruturais
Nosso pequeno robô ofereceu evidências incontestáveis de que milhões de entre uma rede randômica e uma rede descrita por uma distribuição de grau
criadores de Webpage trabalham em conjunto, de maneira um tanto mágica, que obedece a uma lei de potência quando comparamos um mapa rodoviário
para gerar uma complexa Web que desafia o universo randômico. Sua ação cole­ dos Estados Unidos com um mapa de linhas aéreas. Nos mapas rodoviários, as
tiva obriga a distribuição de grau a abandonar a curva de sino - uma marca das cidades são os nós e as estradas que as conectam, os links. Essa é uma rede cla­
redes randômicas - e a fazer da Web uma rede muito peculiar descrita por uma ramente uniforme: cada cidade grande tem pelo menos um link com o sistema
lei de potência. Entretanto, o robô não conseguiu responder a nossa mais pre­ rodoviário, e não há cidades servidas por centenas de estradas. Dessa forma,
mente questão: o que permitia à Web desafiar as estritas previsões das redes muitos nós são claramente familiares, com aproximadamente o mesmo número
randômicas? de links. Como vimos no capítulo 2, essa uniformidade é uma propriedade ine­
Pe�cebemos, então, que havia uma outra maneira de abordar esse pro­ rente das redes randômicas que possuem distribuição com um pico.
blema. E possível que leis igualmente simples caracterizem a maioria das redes O mapa das rotas aéreas difere drasticamente do mapa rodoviário. Os nós
complexas e não as vimos porque não as havíamos procurado antes? Essa dessa rede são aeroportos conectados por voos diretos entre eles. Observando os
segunda linha de questionamento revelou-se muito mais produtiva. Com efeito, mapas que aparecem nas vistosas revistas colocadas na traseira das poltronas
poucos meses depois, ao analisarmos a rede de atores de Hollywood, descobri­ dos aviões, não podemos deixar de perceber poucos hubs, como Chicago, Dallas,
mos que também obedecia a alguma relação matemática: o número de atores Denver, Atlanta e Nova York, dos quais partem voos para quase todos os outros
que tinham links com exatamente k outros atores decaía seguindo uma lei de aeroportos dos Estados Unidos. A maioria dos aeroportos é pequena, afigu­
potência. Mais tarde, soubemos que Erdós e seus colegas matemáticos também rando-se como nós com, no máximo, poucos links que os conectam com um ou
obedeciam a essa lei. A rede existente no interior da célula integrou a lista diversos hubs. Dessa forma, em contraste com o mapa rodoviário, no qual a
quando verificamos que o número de moléculas que interagem com exatamente maioria dos nós é equivalente, no mapa aéreo poucos hubs conectam centenas
k outras moléculas decresce seguindo uma lei de potência. Descobrimos, ainda, de pequenos aeroportos (Figura 6.1).
um trabalho de Sid Redner, professor de física da Universidade de Boston, que Uma desigualdade semelhante caracteriza redes com distribuição de grau
observou que a distribuição de citações em jornais de física segue uma lei de em lei de potência. No âmbito matemático, as leis de potência formulam o fato
potência. Encarando as citações como links de uma rede cujos nós são publica­ de que, em muit_§ls redes reais, a maioria dos nós tem apenas poucos links e esses
ções, o achado de Redner implicou que a rede de citação também é descrita por numerosos nós pequenos (ºexistem com poucos hubs, nós que possuem um
uma distribuição de grau lei de potência. Subsequentemente, em numerosas número anomalamente el�vado de links. Os poucos links que conectam os nós
redes de grande porte que nosso grupo e muitos outros cientistas tiveram a menores entre si não são suficientes para garantir que a rede seja inteiramente
oportunidade de investigar, surgiu um padrão incrivelmente simples e consis­ conectada. Essa função é assegurada pelos relativamente raros hubs que impe­
tente: o número de nós com exatamente k links obedece a uma lei de potência, dem a desagregação das redes reais.
cada qual com um único expoente de grau que, para a maioria dos sistemas, Em uma rede randômica, o pico da distribuição implica que a maioria dos
varia entre 2 e 3. nós tem o mesmo número de links e que os nós que se desviam da média são
extremamente raros. Por conseguinte, uma rede randômica possui uma escala
característica em sua conectividade nodal, representada pelo nó médio e fixada
pelo pico da distribuição de grau. Ao contrário, a ausência de um pico em uma
distribuição de grau em lei de potência implica que, em uma rede real desse
tipo, não existe algo como um nó característico. Vemos uma contínua hierarquia
segue N(k) -F, onde o parâmetro y é o expoente do grau.
4 Isso implica que o número de Webpages com exatamente k links de entrada, denotado por N(k),
de nós, que vão dos raros hubs aos numerosos nós menores. O hub maior é
O declive da linha reta no gráfico log-log indica que o expoente do grau tinha um valor próximo de seguido de perto por dois ou três hubs relativamente menores, seguidos por
2.1. Quando contamos quantos links de saída havia em um dado documento Web, observamos o dezenas de outros que são ainda menores, e assim por diante, chegando por fim
mesmo padrão: o gráfico log-log indica que o número de páginas com exatamente k links de saída aos numerosos nós pequenos.
segue N(K) -P, com y = 2,5.

62 63
/r
(scala-free networks), rapidamente passou a permear muitas disciplinas que se
defrontam com redes complexas.
Curva de sino Distribuição de grau em lei de potência Nem a hierarquia dos onipresentes hubs, nem as leis de potência que os

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acompanham foram explicadas por qualquer das teorias de rede disponíveis à
] Muitos nós com ir época em que as descobrimos, em 1999. De fato, foram consideradas mera­
Maioria dos nós possui o .;., •, -7 _..,..---- poucos links l
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mente acidentais. A teoria randômica de rede de Erdós e Rényi e sua extensão a
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nós com k links deveria decrescer exponencialmente - um decréscimo muito
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mais rápido do que o previsto por uma lei de potência. Ambas nos diziam, em
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s r_1T rv rigorosos termos matemáticos, que não existem hubs.
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1 A surpreendente descoberta das leis de potência na Web obrigou-nos a


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✓ 1,
reconhecer os hubs. A distribuição lei de potência lentamente declinante aco­
Número de links (k) Número de links (k)
moda essas anomalias altamente conectadas de maneira natural. Ela prediz que
cada rede sem escala terá diversos hubs de grande porte que definirão funda­
mentalmente a topologia da rede. A descoberta de que a maioria das redes com
importância conceitual é do tipo sem escala, que vai da Web à rede existente no
interior da célula, conferiu legimitidade aos hubs. Viríamos a perceber que eles
determinam a estabilidade estrutural, o comportamento dinâmico, a solidez e a
tolerância a erros e ataques das redes reais. Eles se estabelecem como prova da
existência de princípios organizacionais extremamente importantes que gover­
nam a evolução das redes.

Figura 6. 1. Redes randômicas e redes sem escala: a distribuição de grau de uma rede ran­
dômica segue uma curva de sino, informando-nos que a maioria dos nós possui o mesmo
número de links e não existem nós com grande quantidade de links (canto superior 3.
esquerdo) . Portanto, uma rede randômica é semelhante a uma rede viária nacional, em
que os nós são as cidades, e os links, as principais rodovias que as ligam. De fato, muitas ,,·,,
P�eto nunca utilizou rexpressão 80/20. Essa formulação é resultado dos
cidades são servidas, grosso modo, pelo mesmo número de estradas (canto inferior '. \,
esquerdo) . Em contraposição, a distribuição de grau em lei de potência de uma rede sem econorrnstas que o sucederam e trabalharam com a observação paretiana. Mais
escala prevê que muitos nós- possuem apenas poucos links, articulados por poucos hubs
_ ,,{
exatamente, no final do século XIX, Pareto observou que pequenas grandezas na
altamente conectados (canto superior direito). Visualmente, esse esquema é muito simi­ }: . natureza e na economia contestam a onipresente curva de sino e obedecem a
lar ao sistema de tráfego aéreo, em que um número grande de pequenos aeroportos é ,'
uma lei de potência. Sua mais célebre descoberta foi a de que a distribuição da
conectado entre si por poucos hubs maiores (canto inferior direito). ·,,·:, _. renda segue uma lei de potência, o que significa que a maior parte do dinheiro é
�: apropriada por alguns indivíduos muito ricos, enquanto a maioria da população
A distribuição de grau em lei de potência obriga-nos, portanto, a abando­ f aufere pequenos ganhos. A descoberta de Pareto implica que aproximadamente
80% do dinheiro é apropriado por apenas 20% da população, uma desigualdade
nar a ideia de uma escala ou de um nó característico. Em uma hierarquia contí­ !
nua, não existe um único nó que possamos destacar e pretender que seja carac­ que ainda persiste entre nós um século depois de sua constatação.
terístico de todos os nós. Não há nenhuma escala intrínseca nessas redes. Essa é Não se sabe ao certo quando surgiu a expressão 80/20. Enquanto físicos e
a razão pela qual meu grupo de pesquisa começou a descrever redes com distri­ matemáticos falam com ar de indiferença sobre leis de potência, o princípio do
buição de grau em lei de potência como redes sem escala. Com a percepção de 80/20 permeia a imprensa popular e a literatura sobre negócios. Entretanto,
que a maioria das redes complexas na natureza tem uma distribuição de grau toda vez que uma regra 80/20 realmente se aplica, pode-se apostar que existe
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em lei de potência, a expressão redes sem escala, ou rede livre de escala uma lei de potência subjacente ao fenômeno. As leis de potência formulam em
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termos matemáticos a noção de que poucos eventos de grande magnitude res- tam-se em conjunto e em momento algum se desagregam para compor outras
pondem pela maior parte da ação. moléculas, formando ainda outros grupos.
As leis de potência raramente surgem em sistemas completamente domi­ O resfriamento de um copo de água não altera significativamente essa
nados por um lance de dados. Os físicos verificaram que muito frequentemente magnífica dança da água. Só toma o movimento das moléculas mais digno -
elas assinalam uma transição da desordem à ordem. Portanto, as leis de potên­ mais pesado e mais lento. A 0ºC, no entanto, algo especial ocorre. As moléculas
cia que observamos na Web indicavam, pela primeira vez em termos matemáti­ de água repentinamente formam um cristal de gelo perfeitamente ordenado,
cos precisos, que as redes reais estão longe do randômico. Redes complexas por como soldados desgarrados que se alinham a uma ordem do comandante. Con­
fim começaram a nos falar em uma linguagem que os cientistas com formação tudo, os soldados ensaiam esse exercício centenas de vezes, aprendendo doloro­
em auto-organização e complexidade podiam finalmente entender. Elas falavam samente sua precisa localização na formação. As moléculas de água, em contra­
de ordem e comportamento emergente. Só precisávamos ouvir cuidadosamente. partida, podem nunca ter experienciado o gelo antes. Elas obedecem a um
Pode parecer que a descoberta de que as redes obedecem a uma simples misterioso impulso de abandonar um estilo de vida desordenado, em prol de um
lei de potência é excitante apenas para alguns matemáticos ou físicos. Entre­ ·outro, rígido e ordenado. O gelo, símbolo familiar do frio e da perfeita ordem,
tanto, as leis de potência estão no cerne de alguns dos mais desconcertantes emerge espontaneamente.
avanços conceituais da segunda metade do século XX, emergindo em campos A mudança de sua dança aquática para a gélida ordem cristalina de um
como caos, fractais e transições de fase. Sua detecção nas redes sinalizou rela­ sólido é um dos exemplos mais bem conhecidos de transição de fase, fenômeno
ções, até então desconhecidas, com outros fenômenos naturais e colocou as que os físicos tentaram entender durante muitos anos, antes da década de 1960.
redes na vanguarda de nossa compreensão dos sistemas complexos em geral. O Transições de fase são comuns em matérias diversas, assumindo formas e aspec­
fato de que as redes subjacentes à Web, a Hollywood, aos cientistas, à célula e a tos marcadamente diferentes da água congelada. Por exemplo, cada átomo em
muitos outros sistemas complexos obedecem a uma lei de potência permitiu-nos um metal ferromagnético tem um momento magnético ou spin, frequentemente
parafrasear Pareto e defender, pela primeira vez, que talvez houvesse leis por representado por pequenas setas que transpassam o átomo. Sob altas tempera­
trás das redes complexas. turas, os átomos estão com seus spins definidos aleatoriamente em todas as
diferentes direções. Resfriados a certa temperatura crítica, porém, todos os áto­
mos orientam seus spins precisamente na mesma direção e formam um ímã.
O resfriamento de um líquido e a emergência de um ímã constituem tran­
4. sições da desordem à ordem. Certamente, em relação à perfeita ordem do gelo
cristalino, a água.líquida é mais'--
desorganizada. No ponto de resfriamento, ela
Com uma grande cabeça e m O e duas grandes orelhas em H, a molécula abandona, como que por milagre, esse estado de desordem, escolhendo, ao con-
da água e seu símbolo H20 são familiares a todos nós. Seu tamanho e sua estru­ trário, um estado de elevada simetria e ordem. De maneira semelhante, os spins
tura interna são conhecidos _nos mínimos detalhes. Isso não é de surpreender: aleatoriamente orientados em um metal ferromagnético estão em estado de
trata-se da substância mais comum e mais estudada da Terra. Não obstante, a desordem caótica. Como que por encanto, assumem a orientação comum alta­
água em estado líquido, com seus bilhões de moléculas coesivas que povoam mente ordenada quando resfriados a · uma temperatura crítica. Essas súbitas
um copo, continua a nos desafiar. transições contêm a chave explicativa de uma profunda questão relativa ao fun­
Os gases são simples: as. moléculas flutuam no espaço vazio e só tomam cionamento da natureza, de interesse tanto dos cientistas como dos filósofos:
conhecimento uma das outras quando se chocam entre si. Os cristais represen­ como a ordem emerge da desordem?
tam o oposto, mas também são relativamente simples: as moléculas se unem
fortemente para formar uma treliça perfeitamente rígida. Os líquidos, contudo,
realizam um delicado equilíbrio entre esses dois extremos. As forças de atração
que asseguram a coesão das moléculas da água não têm poder suficiente para 5.
coagi-las a uma ordem rigorosa. Comprimidas entre a ordem e o caos, as molé­
culas de água participam de uma majestosa dança na qual algumas moléculas se O s estados ordenado e desordenado de um ímã correspondem, segundo a
aglutinam, originam grupos pequenos e, de certa forma, ordenados, movimen- termodinâmica, a distintas fases da matéria. Exatamente no ponto de transição,
o sistema se posiciona em um tipo de equilibrio para escolher entre essas duas

66 67
fases, a exemplo do alpinista que, tendo chegado ao topo, deve decidir por qual do ponto crítico, precisamos deixar de ver os átomos separadamente. Mais
dos lados da montanha descerá. Indeciso sobre qual caminho seguir, o sistema ainda, eles deveriam ser considerados comunidades que atuam em uníssono. Os
frequentemente recua e avança, e essas oscilações aumentam quando o sistema átomos devem ser substituídos por compartimento de átomos, tal que dentro de
está próximo do ponto crítico. cada compartimento todos os átomos se comportam como se fossem um.
Essas oscilações, do ponto de vista experimental, comportam consequên­ Por essa época, o grande número de horas dedicadas às transições de
cias mensuráveis. Próximo do ponto crítico, os elementos da ordem e da desor­ fase, absorvendo os melhores e os mais brilhantes em física teórica, levara à
dem se mesclam dentro do mesmo material, sinalizando que o sistema explora descoberta de nove expoentes críticos diferentes, cada qual associado a alguma
ambos os lados do topo da montanha. Em metais que se acham próximos à tem­ lei de potência emergindo na vizinhança do ponto crítico. A ideia de Kadanoff
peratura de transição, agrupamentos de átomos desenvolvem spin.s que apon­ propunha um sugestivo modelo visual que poderia ser utilizado para deri­
tam na mesma direção. Quanto mais o metal se aproxima do ponto crítico, mai­ var relações matemáticas precisas dentre essa fauna de expoentes. Kadanoff
ores se tornam esses agrupamentos (clusters) magneticamente ordenados. A demonstrou que a transição da desordem para a ordem não requeria todos os
crescente quantidade de evidências experimentais obtidas pelos físicos durante nove expoentes desconhecidos, mas poderia ser expressa por quaisquer dois
os anos de 1960 indicou que, na vizinhança do ponto crítico, diversas grande­ deles. Outros pesquisadores que não o conheciam chegaram à mesma conclusão
zas-chave obedecem a leis de potência. Por exemplo, a extensão da distância na simultaneamente. Ben Widom, físico-químico da Universidade de Cornell, e A.
qual átomos se comunicam entre si, a extensão de correlação, frequentemente Z. Patashinskii e V. L. Pokrovskii, físicos da União Soviética, derivaram relações
é utilizada como uma medida aproximada do tamanho de clusterização. As escalares semelhantes por meio de um percurso diferente. Um conjunto de desi­
medidas indicaram que quando nos aproximamos do ponto crítico, essa exten­ gualdades entre os expoentes, derivadas pelo físico Michael Fisher, da Universi­
são de correlação cresce seguindo uma distribuição de grau em lei de potência dade de Cornell, ofereceu outras sugestões,de ordem no bojo da fauna.
caracterizada por um único expoente crítico. Quanto mais o metal chega à tem­ Contudo, ainda faltava algo. Não havia nenhuma teoria que pudesse con­
peratura da transição de fase, maior é a extensão da distância na qual os spin.s cluir como resultado os dois expoentes remanescentes ou que explicasse por que
se conhecem mutuamente. A força do ímã na vizinhança da temperatura crítica, surgiam leis de potência toda vez que a ordem emergia espontaneamente em
determinada pela fração de spin.s que apontam na mesma direção, também obe­ sistemas complexos. Não era de todo claro se uma teoria geral como essa existia
dece a uma lei de potência, com diferente expoente crítico. de fato. Com base na beleza e na autoconsistência dos resultados obtidos até
À medida que os físicos investigavam cuidadosamente de que maneira, em então, todo mundo esperava que existisse. A comunidade dos físicos teve de
vários sistemas, a ordem emerge da desordem, mais se descobria que leis de esperar pela resposta definitiva até nove!IfDrO de 1971. Ela veio, inesperada­
potência operam durante a transição de fase. As mesmas leis emergiam quando mente, de um físico que pouco acompanhava as transições de fase e os fenôme­
líquidos se transformavam em gás uma vez aquecidos, ou quando uma peça de nos críticos.
chumbo se transformava em supercondutor uma vez suficientemente resfri­ No final da década de 1960, Wilson era professor assistente de heterogê­
ada. A transição desordem-_ordem começou a revelar um surpreendente grau de nea reputação no Departamento de Física da Universidade de Cornell. Todo
consistência matemática. O problema era que ninguém sabia por quê. Por que mundo sabia que ele era brilhante, embora seu brilhantismo não houvesse se
líquidos, ímãs e supercondutores perdem a identidade em algum ponto crítico e traduzido em publicações - a medida tangível de sucesso no meio acadêmico.
decidem obedecer a idênticas leis de potência? O que está por trás do alto grau Essa situação quase comprometeu seu trabalho em Cornell. Compelido a publi­
de similaridade entre sistemas tão díspares? E o que as leis de potência têm a car pela comissão de titulação, Wilson desengavetou vários trabalhos. Dois
ver com isso? deles, simultaneamente submetidos em 2 de junho de 1971 e publicados em
novembro do mesmo ano pela Physical Review B, relacionavam-se à física esta­
tística. Propunham uma sofisticada e abrangente teoria das transições de fase.
Wilson tomou as ideias de escala desenvolvidas por Kadanoff e mode­
6. lou-as por uma poderosa teoria denominada renormalização. O ponto de partida
de sua abordagem foi a invariância de escala: Wilson pressupôs que, na vizi­
Uma das principais guinadas n o entendimento da transição d a desordem nhança do ponto crítico, as leis da física aplicavam-se igualmente a todas as
para a ordem ocorreu durante a semana do Natal de 1965. Leo Kadanoff, físico escalas, dos átomos isolados a compartimentos que continham milhões de átoc
da Universidade de Illinois, em Urbana, teve uma súbita intuição: na vizinhança mos idênticos atuando em uníssono. Conferindo um rigoroso substrato matemá�

68 69
tico à invariância de escala, sua teoria gerava leis de potência toda vez que ele se despem de seus traços únicos e revelam. um comportamento universal que
abordava o ponto crítico, o lugar em que a desordem. abre espaço para a ordem. possui características similares em um.a gama considerável de sistemas.
O grupo de renormalização de Wilson não só invocava leis de potência, mas A onipresença das leis de potência em sistemas que experimentam. transi­
também pela primeira vez conseguiu prever os valores de dois expoentes críti­ ção da desordem. para a ordem levou meu orientador de doutorado, H. Eugene
cos faltantes. Com isso, ele assentou a última pedra no topo da pirâmide das Stanley, que chefia, na Universidade de Boston, o grupo de pesquisa mais atu­
transições de fase, feito que lhe valeu o Prêmio Nobel de Física em 1982. ante que investiga essas transições de fase, a dizer, em tom de brincadeira, que
A natureza normalmente detesta leis de potência. Em sistemas com.uns, em Boston só existe produção acadêmica sobre log-log. Stanley, que participou
todas as grandezas seguem curvas de sino, e as correlações decrescem. rapida­ das principais descobertas que moldaram. nossa com.preensão das transições de
mente, obedecendo a leis exponenciais. Tudo isso, porém, muda se o sistema for fase e da universalidade, estava se referindo ao método de com.pilação de dados
obrigado a passar por um.a transição de fase. Nesse caso, surgem leis de potên­ em base logarítmica, normalmente com representação gráfica, utilizado pelos
cia - sinal inequívoco da natureza de que o caos está partindo em favor da cientistas para detectar a presença de leis de potência em dados experimentais.
ordem. A teoria das transições de fase nos disse alto e bom som que a rota da Com efeito, para onde quer que olhassem. nas décadas de 1980 e 1990, físicos,
desordem. à ordem é assegurada por poderosas forças de auto-organização e biólogos, ecologistas, cientistas dos materiais, matemáticos ou economistas, pre­
fundamentada por leis de potência. Também nos diz que as leis de potência não dominando a auto-organização, deparavam-se com as leis de potência e sua uni­
são apenas um.a outra forma de caracterizar o comportamento de um sistema' e' versalidade. Parece que as redes não são diferentes: por trás dos hubs, existe
sim, marcas patentes de auto-organização em sistemas com.plexos. um.a expressão matemática muito rigorosa, um.a lei de potência. J
Esse significado único e profundo das leis de potência talvez explique Isso nos leva ao próximo quebra-cabeça. Se as leis de potência sã-0--á marca
nossa euforia quando as identificam.os pela primeira vez na Web. Não se tratava de sistemas em transição do caos para a ordem, que tipo de transição está ocor­
apenas de serem algo sem precedente e inesperado no contexto das redes. As rendo nas redes complexas? Se as leis de potência surgem na vizinhança de um
leis de potência guindavam. as redes complexas para fora do cenário da ponto crítico, o que. compatibiliza as redes reais com seu ponto crítico, permi­
aleatoridade em que Erdós e Rényi as haviam situado 40 anos antes e ainda as tindo-lhes revelar um comportamento sem escala? Conseguimos compreender
posicionavam. no centro da colorida e conceitualmente rica arena da auto-orga­ os fenômenos críticos depois que os físicos descobriram. o mecanismo que regula
nização. Observando as leis de potência que nossa pequena ferramenta de busca as transições de fase; rigorosas teorias nos permitem. agora calcular com grande
nos trouxe ao final de sua jornada, percebem.os indícios de um.a nova e insuspei­ precisão todas as grandezas que caracterizam. os sistemas que engendram. a
tada ordem no interior das redes, um.a ordem que revelava um.a beleza e coe­ ordem. Mas até então só havíamos observado os hubs nas redes. Sabíamos agora
rência incomuns. que eram a cons_equência das leis de potência - um indício de auto-organização
e de ordem. Decerto, esse era um importante avanço que nos permitia retirar as
redes do domínio do randômico. Todavia, as questões mais importantes, perti­
nentes aos mecanismos responsáveis pelos hubs e pelas leis de potência, perma­
iir': 7. neciam. ainda sem resposta. Serão as redes reais um estado contínuo de transi­
ção da desordem. à ordem? Por que -os hubs aparecem. em redes de todos os
1I1:1,: "• tipos, dos atores à Web? Por que eram descritos por leis dé potência? Haverá
i Os físicos que tentavam. entender com.o o s ímãs funcionam. e por que a
l:i leis fundamentais que obriguem. diferentes redes a revestir a mesma forma e
água congela tiveram. um.a revelação quando se desvendaram. a teoria de escala
/1i' configuração unversais? Com.o a natureza tece suas teias?
e a do grupo de renormalização no firnl.l da década de 1960 e início da de 1970.
Eles descobriram. que próximo do ponto crítico, exatamente quando a ordem
emerge da desordem., todas as grandezas quantitativas de interesse obedecem. a
leis de potência caracterizadas por expoentes críticos. Entretanto, se observa­
m.os a água passando do líquido para o gasoso, o magma petrificando-se, o
metal magnetizando-se ou a cerâmica transformando-se em supercondutor,
aplicam-se sempre as mesmas leis, gerando as misteriosas leis de potência. .
Finalmente descobrimos que quando originam. a ordem, os sistemas com.plexos

70 71
,
SETIMA CONEXAO
- destino a Porto, entrei em contato com Duncan Watts, que gentilmente nos for­
neceu os dados que descreviam a rede elétrica do Oeste dos Estados Unidos e a
topologia do C. elegans. Brett Tjaden, ex-aluno de graduação que operava o
Website do Oráculo de Bacon, agora professor assistente de ciência da computa­
ção da Universidade de Ohio, em Athens, Ohio, enviou-nos a base de dados dos
Ricos Ficam Mais Ricos atores de Hollywood. Jay Brockman, professor de ciência da computação em
Notre Dame, forneceu-nos dados sobre uma rede de fabricação humana, o dia­
grama de wiring de um chip de computador produzido pela IBM. Antes de partir
para a Europa, minha aluna de graduação Réka Albert e eu concordamos que
ela analisaria essas redes. Em 14 de junho, uma semana após -1,IlÍnha partida,
recebi um longo e-mail dela detalhando algumas atividades e� curso. Ao final
da mensagem, havia uma frase que fora acrescentada como reflexão posterior:
"Também analisei a distribuição de grau, e em quase todos os sistemas (IBM,
'atores, rede elétrica) o perfil da distribuição segue uma lei de potência".
O e-mail de Réka subitamente deixou claro que a Web de forma alguma
era especial. Vi-me sentado no recinto da conferência sem prestar atenção aos
debates, pensando nas implicações dessa c;lescoberta. Se duas redes tão diferen­
tes quanto a Web e a comunidade de atores de Hollywood revelam a distribui­
Outrora destacado porto comercial do império português, Porto dá hoje a ção de grau em lei de potência, então alguma lei ou mecanismo universal deve
impressão de ser uma cidade esquecida. Construída no ponto em que o vago­ ser responsável por isso. Se tal lei existia, potencialmente podia ser aplicada a
roso rio Douro termina seu curso para o Atlântico, ao lop.go das colinas escarpa­ todas as redes.
das que protegem o litoral, Porto traz a marca de uma dinâmica cidade medie­ No intervalo das discussões, resolvi me isolar na tranquilidade do seminá­
val estrategicamente situada em um estreito facilmente defensável. Com seus rio onde estávamos instalados. Mas não consegui. Durante o trajeto de 15 minu­
magníficos castelos com vista para o rio e uma rica história de produção viní­ tos de volta para meu quarto, ocorreu-me uma potencial explicação, tão simples
cola, supõe-se que seja uma da.s cidades mais visitadas do mundo. Entretanto, e direta, que duvidei que pudesse ser correta. Retomei imediatamente à univer­
escondida como é no extremo norte da península ibérica, poucos turistas des­ sidade para passar um fax a Réka, pedindo-lhe que checasse o conceito utili­
viam-se da rota para conhecê-la. Ao que tudo indica, há muito poucos aficiona­ zando o computador. Poucas horas depois, ela me respondeu por e-mail. Para
dos do caracteristicamente encorpado vinho do Porto para despertar essa minha grande surpresa, a ideia funcionou. Um simples fenômeno rico fica mais
grande cidade medieval de sua letargia. rico, potencialmente presente em muitas redes, podia explicar as leis de potên­
Visitei Porto no verão de 1999, logo depois que meus alunos e eu concluí­ cia observadas na Web e em Hollywood.
mos nosso trabalho sobre o papel das leis de potência na Web. Estava partici­ Depois do Porto, retomei a Nôtre Dame por um breve período, antes de
pando de um workshop sobre sistemas fora do equihbrio e sistemas dinâmicos embarcar em outra viagem com duração de um mês. Era evidente, contudo, que
organizado por dois professores de física da Universidade do Porto, José Men­ não podíamos esperar mais um mês para apresentar nossos resultados. Tínha-
des e Maria Santos. Durante esse verão, muito poucas pessoas pensavam em mos sete dias para escrever um trabalho.
redes, e não houve discussões sobre esse assunto durante o evento. Mas as redes O voo de oito horas de Lisboa a Nova York pareceu a oportunidade ideal
estavam muito presentes em meu pensamento. Não pude ajudar levando para preparar o primeiro esboço. Assim que o avião decolou, peguei meu laptop
comigo na viagem nossas questões não resolvidas: por que hubs? Por que leis de que adquirira pouco antes da viagem ao Porto e freneticamente comecei a digi­
potência? tar. Mal acabara de escrever a introdução, quando um comissário de bordo,
Naquela época, a Web era a única rede que se provava, por meio de cálcu­ segurando um refrigerante para o passageiro que estava a meu lado, subita­
los matemáticos, possuir hubs. Tentando compreendê-la, procurávamos verificar mente derramou todo o conteúdo do copo em cima do meu teclado. Caracteres
seus traços característicos. Ao mesmo tempo, queríamos aprender mais acerca randômicos tremeluziram na tela de meu laptop novinho. Mesmo assim, termi­
da estrutura de outras redes reais. Por esse motivo, pouco antes de partir com nei o trabalho no avião, escrevendo-o à mão do começo ao fim. Uma semana

72 73
mais tarde, o texto foi apresentado ao prestigioso jornal Science, apenas para ser vavelmente diminuirá à proporção que a maioria das informações reunidas pela
recusado dez dias depois, sem haver passado pelo costumeiro processo de revi­ humanidade deixar de ser obtida on-line, até agora não há sinais de decréscimo.
são dos pares, porque os editores acharam que o trabalho não se encaixava nos Com mais de 1 bilhão de documentos disponíveis hoje, é difícil acreditar
padrões de novidade e interesse geral da publicação. Mas a essa altura, estava que a Web emergiu de um nó em um dado momento. Mas foi assim mesmo que
na Transilvânia, visitando minha família e meus amigos no coração das Monta­ surgiu. Mais ou menos uma década atrás, a Web só tinha um nó, a famosa pri­
nhas dos Cárpatos. Desapontado, mas convencido de que o trabalho era impor­ meira página de Tim Berners Lee. À medida que físicos �entistas da computa­
tante, fiz algo que jamais fizera: telefonei para o editor que rejeitara o trabalho, ção começaram a criar páginas por conta própria, o site orÍginal gradativamente
em uma tentativa desesperada de fazê-lo mudar de ideia. Para minha grata sur­ ganhou links que referenciavam a página de Lee. Essa modesta Web de uma
presa, consegui. dúzia de documentos primitivos foi a precursora do arcabouço de dimensões
planetárias que a Web é hoje. Apesar de sua enorme importância e complexi­
dade, continua a crescer em termos incrementais, nó a nó. Essa expansão está
em flagrante contraste com a premissa dos modelos de rede descritos até agora
1. neste livro, que partem do princípio de que o número de nós em uma rede é
uma constante no tempo.
O modelo randômico de Erdós e Rényi baseia-se em dois pressupostos sim­ A rede de Hollywood também começou com um minúsculo núcleo, os ato­
ples e frequentemente desconsiderados. Em primeiro lugar, começamos com um res dos primeiros filmes mudos da década de 1890. Segundo o banco de dados
inventário deles. Dispondo de todos os nós desde o início, pressupomos que o do IMDb.com, Hollywood tinha apenas 53 atores em 1900. Com a crescente
número deles é fixo e permanece imutável ao longo de toda a vida da rede. Em demanda por filmes, esse núcleo lentamente se expandiu, adicionando poucos
segundo lugar, todos os nós são equivalentes. Por não conseguir distinguir entre rostos novos a cada filme. Hollywood experimentou seu primeiro boom entre
os nós, conectamo-los aleatoriamente entre si. Esses pressupostos não foram 1908 e 1914, quando o número de atores em atuação foi de menos de 50 para
questionados em mais de 40 anos de pesquisa de rede. 'Mas a descoberta dos mais de 2 mil em um ano. Um segundo boom espetacular iniciado na década de
hubs - e das leis de potência que os descrevem - obrigou-nos a abandonar 1980 transformou a produção cinematográfica na megaindústria do entreteni­
ambos os pressupostos. O trabalho submetido à Science foi a primeira etapa mento que conhecemos hoje. De um minúsculo grupo de atores mudos tor­
desse caminho. nou-se uma rede gigantesca de mais de meio milhão de nós, e continua a cres­
cer a uma taxa incrível. No período de apenas um ano, 1998, nada menos de
13.209 nomes de atores que surgiram pela primeira vez na telona do cinema
foram incorporados à base de dados do IMDb.com.
2. Não obstante sua diversidade, a maioria das redes reais compartilha um
traço essencial: o crescimento. Tome qualquer rede que se possa imaginar e pro­
vavelmente o que se segue será verdade: começando com poucos nós, ela cresce
Existe algo acerca da Web com o qual todos concordam: ela está cres­ de forma incremental pela adiçãó de novos nós, atingindo gradativamente o
cendo. A cada dia, novos documentos são adicionados por indivíduos, deta­ tamanho atual. Obviamente, o crescimento nos obriga a repensar nossos pressu­
lhando seus últimos hobbies ou interesses; por empresas, expandindo suas postos de modelagem. Tanto o modelo de Erdós-Rényi quanto o de Watts-Stro­
linhas de produtos e serviços; por governos, que se utilizam da Web para divul­ gatz admitiam que .temos um número fixo de nós ligados entre si de alguma
gar informações aos cidadãos; por professores universitários, publicando suas maneira inteligente. As redes geradas por esses modelos são, portanto, estáticas,
anotações de aula; por organizações sem fins lucrativos, tentando contatar o que significa que o número de nós permanece imutável durante a vida da
aqueles que poderiam usufruir seus serviços; e por milhares de companhias rede. Em contrapartida, nossos exemplos sugeriram que, para as redes reais, a
pontocom, criando vistosas páginas, de olho em nossa carteira. Estima-se que hipótese estática não é apropriada. Em vez disso, deveríamos incorporar o cres­
dentro de dez anos a Web hospedará aproximadamente um exabite (1018) de cimento a nossos modelos de rede. Essa foi a intuição inicial que tivemos
informações disseminadas pelo planeta em numerosos formatos, muitos dos quando tentamos explicar os hubs. Ao fazê-lo, acabamos por destronar o prime­
quais são atualmente desconhecidos. Muito embora a taxa dessa explosão pro- iro pressuposto do universo randômico - seu caráter estático.

74 75
3. AltaVista, um dos mais populares sites de bus;a, tinha um_ o çam�nto de P1:1blici­
7
dade de aproximadamente 100 milhões de dolares. Amenca Online, o Gohas do
mundo on-line, efetivamente chegou perto disso, com 75 milhões de dólares.
É relativamente fácil modelar uma rede em crescimento. Começamos de Em 1999, mais de 3,2 bilhões de dólares foram gastos em marketing on-line,
um minúsculo núcleo e continuamos a adicionar nós, um após o outro. Admita­ mais ou menos metade do montante despendido durante o mesmo período em
mos que cada novo nó tenha dois links. Logo, se começarmos com dois nós, publicidade na TV a cabo, mídia cuja história tem mais de duas décadas.
nosso terceiro nó se conectará com ambos. O quarto nó possui três nós a partir Qual a intenção dessas empresas? A resposta é simples, se não convencio­
dos quais poderemos escolher. Como selecionar os dois a que iremos nos conec­ nal. Tanto as companhias iniciantes como as empresas já estabelecidas haviam
tar? Por questão de simplicidade, vamos seguir o exemplo de Erdós e Rényi e torrado capital de risco e seu suado dinheiro, milhões por dia, para derrotar o
escolher aleatoriamente dois dos três nós e conectar o novo nó a eles. Podemos universo randômico de Erdós e Rényi. Elas sabiam que não nos conectamos
prolongar esse processo indefinidamente, de sorte que toda vez que adiciona­ aleatoriamente na Web. Queriam tirar proveito dessa não aleatoriedade
mos um novo nó, conectamo-lo a dois nós aleatoriamente escolhidos. A rede pedindo-nos que nos conectássemos a elas.
gerada por esse simples algoritmo, chamada modelo A, difere do modelo de rede Como efetivamente escolhemos a que sites nos conectar na Web? De
randômica de Erdós e Rényi apenas por sua natureza expansiva. Essa diferença, acordo com os modelos de rede randômica, conectar-nos-íamos aleatoriamente
contudo, é significativa. Apesar de escolhermos os links de maneira aleatória e à quaisquer dos nós. Um pouco de reflexão sobre nossas escolhas, no entanto,
democrática, os nós no modelo A não são equivalentes entre si. Facilmente indica o contrário. Por exemplo, há uma profusão de opções de Webpages com
identificamos vencedores e perdedores. A cada momento todos os nós possuem links para agências de notícias. Uma rápida pesquisa de "notícias" no Google
idêntica chance de ser conectados, resultando em uma clara vantagem para os retoma cerca de 109 milhões de destaques. O diretório manualmente organi­
nós mais antigos. De fato, independentemente de algumas flutuações estatísti­ zado do Yahoo oferece a opção de mais de 8 mil jornais on-line. Como escolher
cas raras, os primeiros nós no modelo A serão os mais ricos, pois tiveram mais um? Os modelos de rede aleatória dizem que selecionamos aleatoriamente a
tempo para colecionar links. Os nós mais pobres serão os últimos a aderir ao sis­ partir da lista. Sinceramente, não acho que ninguém proceda dessa forma. Pelo
tema, com apenas dois links, porque ninguém teve tempo ainda'de conectar-se a contrário, a maioria de nós tem familiaridade com algumas agências de notícias
eles. O modelo A esteve entre nossas primeiras tentativas de explicar as leis de importantes. Sem pensar muito, conectamo-nos a uma delas. Como antigo leitor
potência que observamos na Web e em Hollywood. As simulações computadori­ de The New York Times, não tenho dificuldade para escolher nytimes.com.
zadas rapidamente nos convenceram de que ainda não havíamos encontrado a Outros podem preferir CNN.com ou MSNBC.com. Significativamente, porém, as
resposta. A distribuição de grau, a função que distingue as redes sem escala dos páginas da Web,às quais prefiro me conectar não são nós comuns, e, sim, hubs.
modelos randômicos, declinou muito rapidamente, seguindo uma exponencial. Quanto mais conhecidos são, mais links os referenciam. Quanto mais links cap­
Enquanto os primeiros nós eram claramente vencedores, a forma exponencial tam mais fácil é encontrá-los na Web e mais familiares nos tomamos deles. Em
apresentada previa que eles eram pequenos demais e havia muito poucos deles. úl�a instância, todos seguimos uma tendência inconsciente, conectando, com
Logo, o modelo A não conseguiu dar conta dos hubs nem dos conectores. maior probabilidade, os nós que conhecemos, que são inevitavelmente os nós
Demonstrou, contudo, que o crescimento por si só não pode explicar a emergên­ mais conectados da Web. Preferimos hubs.
cia das leis de potência. O fundamental é que quando se trata de decidir onde se conectar na Web,
adotamos a conexão preferencial: quando se trata de escolher entre duas pági­
nas, uma com duas vezes mais links que a outra, aproximadamente o dobro das
pessoas acessa a página mais conectada. Muito embora nossas e�colhas ind!vi­
4. duais sejam altamente imprevisíveis, enquanto grupo segmmos padroes
rigorosos.
Durante o Super Bowl de 1999, numerosas companhias nuncaouvifa­ As regras de conexão preferencial valem também em Hollywood. O pro­
lar.com, tais como OurBeginning.com, WebEx.com e Epidemie Marketing, gas­ dutor cuja atividade é produzir filme que dê lucro conhece as estrelas que ven­
taram 2 milhões de dólares com publicidade para divulgar seus nomes a dem filmes. Por conseguinte, o elenco é determinado por dois fatores concor­
milhões de americanos que acompanhavam o embate entre Denver e St. Louis. rentes: a correspondência entre o ator e o papel e a popularidade daquele.
Só em um ano, E*Trade desembolsou 300 milhões de dólares para se promover. Ambos os fatores introduzem o mesmo viés no processo de seleção. Os atores

76 77
com mais links possuem maior probabilidade de conseguir novos papéis. De
fato, quanto mais filmes um ator tiver feito, maior a probabilidade de que apa­
reça novamente no elenco da tela do radar do diretor. É aí que os atores inician­
tes levam a pior, dilema que todo mundo conhece dentro e fora de Hollywood.
É preciso ser conhecido para conseguir bons papéis, mas é preciso ter bons
papéis para se tornar conhecido.
A Web e Hollywood nos obrigam a abandonar o segundo pressuposto
importante inerente às redes randômicas - seu caráter democrático. Nos mode­
los Erdós-Rényi e Watts-Strogatz, não há nenhuma diferença entre os nós de
uma rede: logo, todos os nós possuem idêntica probabilidade de obter ligações.
Os exemplos que acabamos de discutir sugerem o contrário. Nas redes reais, a
conexão nunca é aleatória. Pelo contrário, a popularidade é atrativa. As páginas
de Web com mais conexões têm maior probabilidade de ser conectadas de novo, Figura 7. 1. O surgimento de uma rede sem escala: a topologia sem escala é __uma
atores altamente conectados são mais frequentemente cogitados para novos consequência natural da constituição sempre expansiva das redes reais. Partindo de dois
papéis, trabalhos altamente citados têm maior probabilidade de ser citados nós conectados (canto superior esquerdo), em cada painel se adiciona um novo nó à
novamente, conectores fazem mais novos amigos. A evolução das redes é gover­ rede (mostrado como um .círculo vazio). Quando se trata de decidir onde conectar-se,
nada pela lei sutil, embora inexorável, da conexão preferencial. Guiados por ela, novos nós preferem ligar-se a nós mais conectados. Graças ao crescimento e à conexão
inconscientemente adicionamos links a uma taxa mais elevada para escolher preferencial, surgem alguns hubs altamente conectados.
nós que já são altamente conectados.

B. Conexão preferencial: pressupomos que cada novo nó se conecte aos nós


5. existentes com dois links. A probabilidade de que se escolha um dado nó é
proporcional ao número de. links que o nó escolhido possui. Em outras pala­
Encaixando as peças do quebra-cabeças, descobrimos que as redes reais vras, dada a escolha entre dois nós, um com o dobro de links do outro, é
são governadas por duas leis: crescimento e conexão preferencial. Cada rede duas vezes - mais provável que o novo nó se conectará ao nó mais conec­
parte de um pequeno núcleo e expande-se com a adição de novos nós. Esses tado.
novos nós então, quando se trata de decidir onde se conectar, preferem os nós
que possuem mais· links. Essas leis representam um abandono significativo dos Toda vez que repetimos (a) e (b), adicionamos um novo nó à rede. Por
modelos anteriores, que pressupunham um número fixo de nós aleatoriamente conseguinte, nó por nó, geramos uma rede continuamente em expansão
conectados entre si. Mas serão suficientes para explicar os hubs e as leis de (Figura 7.1). Esse modelo, que combina crescimento e conexão preferencial, foi
potência encontrados nas redes reais? nossa primeira tentativa bem-sucedida de explicar os hubs. As simulações com­
Para responder a essa questão, no trabalho publicado pela Science, em putadorizadas de Réka logo indicaram que ele gerava leis de potência ilusórias.
1999, propusemos um modelo de rede que incorpora ambas as leis. O modelo é Como o primeiro modelo para explicar as leis de potência sem escala observa­
muito simples, na medida em que o crescimento e a conexão preferencial natu­ das nas . redes reais, ele rapidamente tornou-se conhecido como modelo sem
ralmente levam a um algoritmo definido pelas duas regras seguintes (Figura escala.
7.1):
A. Crescimento: para cada período dado, adicionamos um novo nó à rede. Essa
etapa enfatiza que as redes se compõem de um nó por vez.
6. 7.
Por que os hubs e as leis de potência emergem n o modelo sem escala? Em Nosso propósito com o modelo sem escala era mais modesto: demonstrar
primeiro lugar, o crescimento desempenha papel importante. A expansão da que duas simples leis de crescimento e de conexão preferencial poderiam resolver
rede significa que os primeiros nós dispõem de mais tempo do que os últimos o quebra-cabeça dos hubs e das leis de potência. Assim, a grande influência do
para adquirir links: se um nó é o último a chegar, nenhum outro nó tem a opor­ modelo sobre a pesquisa subsequente foi uma grata surpresa para nós, particu­
tunidade de se conectar a ele; se um nó é o primeiro na rede, todos os nós sub­ larmente porque ficara claro desde o início que a topologia das redes reais era
sequentes têm chance de se conectar a ele. Dessa forma, o crescimento oferece moldada por muitos efeitos que havíamos ignorado para fins de simplicidade e
uma nítida vantagem para os nós antigos, tomando-os os mais ricos em links. A transparência. Um dos mais óbvios desses efeitos é o fato de que, enquanto
antiguidade, contudo, não é suficiente para explicar as leis de potência. Os hubs todos os links presentes no modelo sem escala são adicionados quando novos
requerem a ajuda da segunda lei, a conexão preferencial. Como novos nós pre­ nós se agregam à rede, na maioria das redes novos links podem emergir espon­
ferem conectar-se a nós mais conectados, os primeiros nós com mais links serão taneamente. Por exemplo, quando adiciono à minha página na Web um link que
escolhidos com mais frequência e crescerão mais rapidamente do que seus pares referencia nytimes.com, crio um link interno conectando dois nós antigos. Em,_
mais jovens e menos conectados. Quanto mais e mais nós chegam e escolhem os Hollywood, 94% dos links são internos, formados quando dois atores tradicio­
nós mais conectados para se conectar, os primeiros nós inevitavelmente se sepa­ nais trabalham juntos pela primeira vez. Um outro traço ausente do modelo sem
rarão do pacote, adquirindo um número muito grande de links. Eles se transfor­ escala é que em muitas redes nós e links podem desaparecer. De fato, muitas
marão em hubs. Portanto, a conexão preferencial induz um fenômeno rico fica páginas da Web são desativadas, levando consigo milhares de links. Estes tam­
mais rico que ajuda os nós mais conectados a capturar um número desproporci­ bém podem ser religados, como quando decidimos substituir nosso link com
onalmente grande de links a expensas dos últimos. CNN.com por um novo link. que reférencia nytimes.com. Esses e outros fenôme­
Esse fenômeno rico fica mais rico remete naturalmente às leis de potência nos frequentes em algumas redes, mas ausentes do modelo sem escala, ilustram
observadas nas redes reais. De fato, as simulações computadorizadas que reali­ que a evolução das redes reais é bem mais complexa do que o modelo sem
zamos indicaram que o número de nós com exatamente k links segue uma lei de escala prevê. Para entender as redes no complexo mundo que nos rodeia, tería­
potência para qualquer valor de k. O valor exato do grau do expoente, o parâ­ mos de incorporar esses mecanismos a uma consistente teoria de rede (network)
metro que caracteriza a distribuição de lei de potência, já não era nenhum mis­ e explicar seu impacto sobre a estrutura da rede.
tério. Conseguimos calculá-lo analiticamente utilizando uma ferramenta mate­ Após submeter nosso artigo sobre o modelo sem escala, Réka Albert e eu
mática chamada teoria do continuum que desenvolvemos para esse propósito. começamos a investigar os efeitos de processos como links internos e renovação
Com efeito, graças à conexão preferencial, cada nó atrai novos links a uma taxa (rewiring) sobre a estrutura das redes sem escala. Mas já não estávamos sozi­
proporcional ao número de seus links atuais. Utilizando essa simples observa­ nhos. Um mês após a publicação de nosso trabalho na Science, tomei conheci­
ção, conseguimos propor uma equação simples prevendo como os nós adquirem mento de um trabalho semelhante que estava sendo desenvolvido em diversos
links à medida que as redes se expandem. A solução nos permitiu calcular anali­ laboratórios de pesquisa do mundo. Ltiis Amaral, meu colaborador de longa
ticamente a distribuição de grau, confirmando que esta, de fato, segue uma lei data, atualmente professor pesquisador na Universidade de Boston, estava gene­
de potência1 • ralizando o modelo sem escala para incluir o fator idade, incorporando a possi­
Poderia o crescimento ou a conexão preferencial por si só explicar as leis bilidade de que os atores parassem de conseguir links depois da aposentadoria.
de potência? Simulações e cálculos computadorizados nos convenceram de que Amaral, trabalhando em parceria com Gene Stanley e dois alunos, Antonio
ambos são necessários para engendrar uma rede sem escala. Uma rede em Scala e Mark Barthélémy, demonstrou que se os nós não conseguirem links após
expansão destituída de conexão preferencial possui distribuição de grau expo­ certa idade, o tamanho dos hubs será limitado, tomando hubs grandes menos
nencial, que é semelhante a uma curva de sino, na medida em que proíbe os frequentes do que o previsto por uma lei de potência. Ao mesmo tempo, José
hubs. Na ausência de crescimento, retrocedemos aos modelos estáticos, incapa­ Mendes e Sergey Dorogovtsev estavam trabalhando independentemente sobre
zes de gerar leis de potência. um problema similar na cidade do Porto; eles logo publicaram o primeiro de
uma série de trabalhos muito influentes sobre redes sem escala. Pressupondo
que os nós pouco a pouco perdiam a capacidade de atrair links à medida que
1 O grau do expoente para o modelo sem escala é y = 3, i.e., a distribuição de grau segue· P(k) -k-3•

80 81
envelheciam, Mendes e Dorogovtsev mostràram que o gradual envelhecimento quando esta criou seus vários sistemas complexos. Se modelarmos corretamente
não destrói as leis de potência, mas simplesmente altera o número de hubs ao a configuração da rede, a rede daí resultante deverá assemelhar-se bastante à
mudar o expoente de grau. Paul Krapivsky e Sid Redner, também da Universi­ realidade. Portanto, nosso objetivo já não era mais descrever a topologia, e sim
dade de Boston, trabalhando com Francois Leyvraz, do México, generalizaram a compreender os mecanismos que moldam a evolução da rede.
conexão preferencial para explicar a possibilidade de que a conexão a um nó Essa mudança de foco acarretou também uma dramática alteração na lin­
não seria simplesmente proporcional ao número de links que o nó possui, mas guagem das redes. Só nos demos conta da natureza estática dos modelos clássi­
obedeceria a alguma função mais complicada. Eles descobriram que esses efei­ cos quando fomos obrigados a incorporar o fator crescimento. Similarmente, a
tos podem destruir a lei de potência que caracteriza a rede. aleatoridade só passou a constituir problema quando as leis de potência exigi­
Esses foram os primeiros de inúmeros resultados subsequentes obtidos por ram a introdução da conexão preferencial. A compreensão de que a estrutura e
físicos, matemáticos, cientistas da computação, sociólogos e biólogos que exami­ a evolução das redes não poderiam ser dissociadas dificultou o retomo aos
n aram o modelo sem escala e suas diversas extensões. Graças a seus esforços, modelos estáticos que dominaram nosso pensamento durante décadas. Essa
dispomos atualmente de uma rica e consistente teoria do crescimento e da evo­ mudança de concepção criou um conjunto de oposições: estático versus cresci­
lução de redes, algo que teria sido impensável até poucos anos atrás'. Entende­ mento, aleatório versus sem escala, estrutura versus evolução.
mos que links internos, renovação (rewiring), remoção de nós e links, envelheci­ Ao final do capítulo 6, formulamos uma importante questão: a presença
mento, efeitos não lineares e muitos outros processos que afetam a topologia de das leis de potência implica que as redes reais são o resultado ou uma transição
rede podem ser inconsutilmente incorporados em· um estupendo constructo teó­ de fase da desordem à ordem? A resposta a que chegamos é simples: as redes
rico de redes evolutivas, que comportam, como um caso particular, o modelo não estão a caminho de um estado randômico para um estado ordenado. Tam­
sem escala. Esses processos alteram a forma como as redes creséem e evoluem pouco estão na fronteira entre o acaso e o caos. Pelo contrário, a topologia sem
modificando inevitavelmente o número e o tamanho dos hubs. Em muitos casos: escala constitui evidência de princípios organizacionais atuando em cada está­
porém, quando crescimento e conexão preferencial estão a um só tempo presen­ gio do processo de formação das redes. Há pouco mistério aqui, já que o cresci­
tes, hubs e leis de potência emergem igualmente. Em redes complexas, uma mento e a conexão preferencial podem explicar as características fundamentais
estrutura sem escala não é a exceção, e sim a norma, o que explica sua presença das . redes observadas na natureza. Independentemente de quão grande e com­
constante em muitos sistemas reais. plexa se tome uma rede, na presença da conexão preferencial e do crescimento,
ela manterá sua topologia sem escala dominada por hubs.
O modelo sem escala teria permanecido um interessante exercício acadê­
mico se não houv�ssem ocorrido diversas descobertas ulteriores. A mais impor­
8. tante delas foi a percepção de que a maioria das redes complexas de importân­
cia científica e prática é sem escala. Os dados da Web eram suficientemente
A teoria de redes em.expansão, desenvolvida nos últimos três anos, repre­ robustos e detalhados para nos convencer de que as leis de potência descrevem
senta um marco na modelagem de rede. Entretanto, encarando as redes como redes reais. Essa percepção desencadeou uma avalanche de descobertas que
sistemas dinâmicos que se modificam continuamente ao longo do tempo, o continua até hoje. À medida que Hollywood, a rede metabólica no interior da
modelo sem escala incorpora uma nova filosofia de modelagem. Os clássicos célula, as redes citacionais, as redes econômicas e a rede linguística2 passavam a
modelos estáticos, partindo de Erdós-Rényi, procuravam simplesmente arranjar integrar a lista, de um momento para outro as origens da topologia sem escala
um número fixo de nós e links, tal que a teia final, o desenho final da rede, é tomaram-se importantes para muitos campos científicos. As duas leis que gover­
resultado dos ajustes que ocorrem à medida que esta é modelada. Esse processo nam a evolução das redes sobre as quais se erigiu o modelo sem escala oferece­
assemelha-se ao ato de desenhar. Sentados diante de uma Ferrari, nossa tarefa ram um bom ponto de partida para explorar esses diversos sistemas.
é desenhar uma figura que permita a qualquer pessoa reconhecer o carro. Mas o Em primeiro lugar, as leis de potência conferiram legitimidade aos hubs. O
desenho fidedigno do automóvel não faz com que tenhamos uma melhor com­ modelo sem escala acarretou um desenvolvimento conceituai matematicamente
preensão dos processos originais de fabricação do veículo. Para tanto, temos de fundamentado nas leis de potência observadas nas redes reais. Com base em
saber como montar um carro exatamente como o original. É precisamente isso
os nós sã�palavras, e os links representam co-ocorrências significativas nos textos, ou relações
2 A natureza sem escala da linguagem foi demonstrada por diversos grupos de pesquisa. Nessa rede,
que os vários modelos de rede evolutiva procuram fazer. Eles apreendem como
as redes são configuradas, reproduzindo as etapas seguidas pela natureza semânticas (sinônimos, antônimos) .

82 83
uma sofisticada teoria de redes evolutivas que nos permite prever com precisão
os expoentes de escala e a dinâmica das redes, atingimos um novo patamar de OITAVA CONEXÃO
entendimento de nosso complexo mundo interconectado, aproximando-nos,
mais do que nunca, da compreensão da arquitetura da complexidade.
Mas o modelo sem escala suscitou novas questões. Uma em particular sub­
siste: como se arranjam os recém-chegados em um mundo em que apenas os Legado de Einstein
ricos ficam mais ricos? A busca de resposta a essa questã9 levou-nos a um lugar
bastante improvável: o nascimento da mecânica quântica no começo do
século XX.

A menos que o leitor seja•cientista da computação especializado em ferra­


mentas de busca ou tenha acompanhado a evolução das empresas pontocom,
provavelmente nunca ouviu falar de Inktomi, a companhia que operacionalizava
o mecanismo de busca do site mais popular da Web, Yahoo! Contrariamente à
crença popular, Yahoo!, America Online, Microsoft e muitas outras empresas de
ponta não realizam pesquisas. Assinam uma gigantesca base de dados como a
da Inktomi, um dos maiores repositórios da Web. Como a Inktomi preferiu não
criar seu próprio portal, nunca teve seu nome reconhecido pelos clientes e rara­
mente aparece na mídia. Isso mudou de uma hora para outra em junho de
2000, quando a imprensa noticiou que o valor de mercado das ações da compa­
nhia sofrera perda de aproximadamente 2,8 bilhões de dólares. A razão?
Yahoo rompera com a Inktomi, substituindo-a por uma empresa criada havia
apenas dois anos, chamada Google.
Encontrei Larry Page, egresso de Stanford e cofundador do Google, em
março de 2000, quando poucas pessoas tinham ouvido falar de sua ferramenta
de busca. Fôramos conferencistas de um workshop promovido pela Internet
Archive, em São Francisco. O evento atraíra um eclético conjunto de cientistas
da computação, físicos, matemáticos, bibliotecários, advogados e um grupo de
milionários pontocom, unidos por seu fascínio pelo universo on-line recente­
mente surgido. Larry Page fez uma breve preleção sobre sua ferramenta de
busca e espalhou uma caixa de camisetas no meio da sala, que proclamavam a
linha de assinatura do Google: "Estou com sorte". De volta para casa, tentei
minha própria conexão. Também acessei o Google e em momento algum me
tomei viciado. Não me surpreendeu que Yahoo quisesse uma fatia dele.

84 85
1. enciam a taxa à qual adquirem links em um ambiente competitivo. Alguns apa­
recem muito depois, no entanto capturam todos os links dentro de curto espaço
de tempo. Outros surgem antes, e realmente nunca o fazem, falham na tarefa
O Google me intrigou porque violava a previsão básica do modelo sem de transformar sua condição de agente pioneiro em um hub. Se quiséssemos
escala, a de que quem faz o primeiro movimento leva vantagem. No modelo explicar a feroz competição que se observa em muitas redes, teríamos de reco­
sem escala, os nós mais conectados são aqueles que apareceram primeiro. Eles nhecer que cada nó é diferente.
dispõem de maior tempo para colecionar links e desenvolver hubs. O Google,
lançado apenas em 1997, foi um retardatário da Web. Ferramentas de busca
populares como AltaVista ou Ink:tomi dominaram o mercado durante muito
tempo antes do aparecimento do Google, tornando-se claramente um agente 2.
secundário. Em menos de três anos, contudo, o Google tornou-se igualmente o
maior nó e a ferramenta de busca mais popular.
Evidentemente, a história empresarial é repleta de casos de companhias Certas pessoas têm o dom de transformar cada encontro casual em um
com produtos inovadores cujos clientes foram atraídos por um retardatário mais vínculo social duradouro. Algumas companhias tornam cada cliente um parceiro
bem-sucedido. Um famoso exemplo na indústria de computadores é a Apple, leal. Algumas páginas da Web viciam os navegadores. O que esses nós sociais,
cujo engenhoso PDA Newton foi completamente superado pelo célebre Palm. Se empresariais e da Web têm em comum? Claramente, cada um deles pos­
encararmos os produtos como nós em uma complexa rede corporativa e os cli­ sui alguma propriedade intrínseca que os impulsiona ao topo. Muito
entes como links para eles, poderemos dizer que os links da Apple foram, em embora fuja a nosso escopo revelar um segredo universal do sucesso, podemos
curto espaço de tempo, reconectados ao Palm. abordar o processo que separa vencedores de perdedores: a competição nos sis­
A indústria da aviação oferece um exemplo bem menos conhecido. A Boe­ temas complexos.
ing não inventou o poderoso avião de passageiros: a glória dessa realização per­ Em um ambiente competitivo, cada nó possui certa aptidão, que é nossa
tence à companhia britânica De Havilland, que comercializou o primeiro jato, habilidade de fazer amigos, comparativamente a qualquer outra pessoa de
chamado Comet, em 1949. Com velocidade recorde de 450 milhas por hora, o nosso meio: a capacidade que tem uma companhia de atrair e manter clientes,
Comet conquistou o mercado europeu e o americano, mas não por muito relativamente a outras empresas; a aptidão de um ator de se fazer querido e
tempo. Um ano depois dos primeiros voos comerciais, os aviões da De Havilland lembrado, relativamente a outros atores aspirantes; a capacidade que tem uma
começaram a cair, matando todos os passageiros a bordo. A fuselagem dos Webpage de fazer com que retornemos diariamente a ela, em comparação com
aviões se desgastava diferentemente por causa das velocidades mais altas e das bilhões de outras páginas que disputam nossa atenção. É uma medida quantita­
altitudes. A Boeing levou em conta o trágico erro da De Havilland no design de tiva da capacidade que tem um nó de manter-se na vanguarda da competição.
seu primeiro jato, e cinco anos depois do primeiro voo do Comet apresentou o A aptidão pode ter raízes genéticas, em se tratando de pessoas; pode estar rela­
Boeing 707, que rapidamente abocanhou o mercado da De Havilland. Quatro cionada ao produto e à qualidade da gestão empresarial, ao talento dos atores
décadas depois, a Boeing, consternada, vê um terceiro agente, a Airbus Euro­ ou ao conteúdo dos sites.
peia, impor seu domínio global, açambarcando o mercado em uma escala sem Podemos atribuir uma aptidão a cada nó em uma rede, mimetizando sua
precedente. capacidade de competir por links. Por exemplo, na Web, minha página teria
O efeito "garoto novo no pedaço" parece estar presente em muitas redes. uma aptidão de 0,00001, enquanto a do Google teria 0,2. A efetiva magnitude
Mas o modelo sem escala não tem lugar para esses recém-chegados dominantes, desses números é irrelevante, mas sua taxa reflete nosso relativo potencial de
porque nesse modelo, assim como nos demais discutidos até agora, todos os nós angariar visitantes. Com efeito, um indivíduo mediano naturalmente acharia o
são idênticos. Para ser exato, o modelo sem escala estabelece diferença entre Google cerca de 2 mil vezes mais útil do que meu site pessoal na rede.
nós com base no número de links que foram adquiridos, que é uma função do A introdução da aptidão não elimina o crescimento nem a conexão prefe­
tempo de seu ingresso na rede. Contudo, em sistemas mais complexos, cada nó rencial, os dois mecanismos básicos que governam a evolução das redes. Muda,
possui características únicas que se manifestam mesmo que não conheçamos contudo, o que se considera atrativo em um ambiente competitivo. No modelo
sua conectividade, ou seja, que independem do número de links já existentes. sem escala; pressupomos que a atratividade de um nó era determinada unica­
Páginas da Web, companhias e atores possuem qualidades intrínsecas que influ- mente por seu número de links. Em um ambiente competitivo, a aptidão tam­
bém desempenha um papel: os nós com aptidão mais elevada são conectados

86 87
com maior frequência. Uma maneira simples de incorporar a aptidão ao modelo cresce em função da raiz quadrada do tempo. O modelo de aptidão prevê um
sem escala é admitir que a conexão preferencial é direcionada pelo produto da comportamento bem diferente. Ele nos diz que os nós ainda adquirem links em
aptidão do nó e pelo número de links que ele possui. Cada novo nó decide onde consonância com uma lei de potência, t�. Mas o expoente dinâmico, /3, que
se conectar comparando o produto da aptidão pela conectividade1 de todos os nós mede a rapidez com que um nó capta novos links, é diferente para cada nó. É
disponíveis, conectando-se com maior probabilidade àqueles que possuem um proporcional à aptidão do nó, de tal sorte que um nó que seja duas vezes mais
produto mais elevado, os quais são, portanto, os mais atraentes. Entre dois nós apto que qualquer outro nó adquirirá links mais rapidamente porque seu expo­
com o mesmo número de links, o mais apto adquire links com maior rapidez. Se ente dinâmico é duas vezes maior. Portanto, a velocidade a que os nós adqui­
dois nós tiverem a mesma aptidão, contudo, o mais antigo ainda terá uma rem links já não é questão de antiguidade. Independentemente de quando um
vantagem. nó se integrou a uma rede, um nó apto rapidamente deixará para trás todos os
Esse simples modelo de aptidão, que incorpora a competição e o cresci­ nós com menor aptidão. O Google é a melhor prova disso: um recém-chegado,
mento, representou nossa primeira tentativa de explicar o Google. Foi conce­ dotado de grânde tecnologia de busca, adquiriu links muito mais rapidamente
bido como uma solução rápida e fácil que nos permite distinguir entre os nós e do que seus concorrentes, ofuscando todos eles. A beleza suplanta o fator idade.
dar uma chance aos retardatários. Logo percebemos que a aptidão 'comporta · O dinâmico quadro subjacente ao modelo livre de escala é semelhante a
outras consequências além dessas. A solução rápida e fácil por nós aventada uma congestionada rodovia de faixa única na qual cada carro tem que seguir o·­
abriu uma perspectiva inesperada para uma rica família de fenômenos que são da frente. O carro que primeiro entra na rodovia é o inevitável vencedor, com a
inteiramente invisíveis em um universo igualitário, desprovido de aptidão. antiguidade ganhando da velocidade. A competição no modelo de aptidão, em
que os nós possuem diferente aptidão e, dessa. forma, adquirem links a diferen­
tes taxas, é de longe mais rica. Isso se assemelha a um carro de corrida em uma
3. grande estrada de múltiplas faixas, em que veículos de todos os tipos e modelos
competem. Os carros entram na corrida um após o outro, cada qual com um
Ginestra Bianconi estava graduada havia um ano, com poucos meses de motor diferente sob o capô e um motorista de talentos únicos sobre as rodas.
doutorado, quando lhe pedi que estudasse as propriedades do modelo de apti­ Inevitavelmente os carros de corrida deixam as minivans e os veículos utilitários
dão, esperando entender como o Google se tomara um hub quase da noite para comendo poeira.
o dia. Nascida e educada em Roma, Bianconi trouxe para nosso grupo de pes­ O modelo de aptidão, que incorpora a competição às redes complexas, sus­
quisa um fascínio extraordinário pela física e uma bagagem realmente sólida em citou novas questões. A lei de potência observada no modelo sem escala
mecânica estatística. O modelo de aptidão pareceu-me uma escolha relativa­ baseia-se no fato de que todos os nós obedecem à mesma regra dinâmica
mente interessante, mas, em termos matemáticos, não seria muito desafiador quando adquirem links; em uma rede na qual alguns nós crescem vagarosa­
decerto para uma aluna iniciante. Bianconi logo me mostrou quão equivocado mente enquanto outros captam links com muita rapidez, esse cauteloso equilí­
eu estava. Em primeiro lugar, seus fundamentos matemáticos estavam longe de brio é significativamente perturbado. Estariam as leis de potência presentes
ser triviais. Em segundo lugar, revelaram-se bem mais interessantes do que se nesse ambiente competitivo - aplicar-se-ião elas ao modelo de adequação? Con­
afiguraram a princípio. Bianconi demonstrou inúmeros estratos de profundi­ tinuariam as redes direcionadas pela competição sendo s�in. escala? Ou a feroz
dade e surpreendentes propriedades das redes complexas que enriqueceram sig­ competição por links destruiria o distintivo de ordem que hê:!.víamos descoberto?
nificativamente nossa compre�nsão acerca da configuração e evolução delas. Nossa pesquisa para entender como a competição molda a topologia da rede
Os cálculos de Bianconi corroboraram primeiramente nossa suspeita de levou-nos a um desvio bastante improvável, remontando no tempo a três gigan­
que, em presença da aptidão, quem madruga não necessariamente se consagra tes da teoria quântica: Bose, Einstein e Planck.
vencedor. Mais propriamente, a aptidão ocupa posição de destaque, fazendo ou
desfazendo os hubs. No modelo sem escala, a conectividade dos nós na rede

1 No modelo sem escala, a probabilidade de que um novo nó se conecte a um nó com k links é dada 4.
A possibilidade de se conectar a um nó com k links e uma aptidão T] é: k'T]JL;k;T]i- Em ambas as
por k,/í:,/c;- No modelo de aptidão, cada nó possui uma característica adicional que é sua aptidão 'IJ·

expressões, a soma, tomados todos os nós presentes na rede, normaliza a distribuição de Em junho de 1924, Albert Einstein recebeu uma carta e um sucinto ensaio,
probabilidade. escrito em inglês, de um anônimo físico indiano de Dacca, chamado Satyendra-

88 89
nath Bose. Desconhecido de Einstein, o texto fora rejeitado havia pouco pela termodinâmica forem modificadas para assimilar o fato de que certas partículas
Philosophical Magazine of the Royal Society, em Londres. Einstein gostou tanto subatômicas são verdadeiramente idênticas, a lei de Planck poderá ser facil­
do escrito que deixou de lado seu próprio trabalho e o traduziu para o alemão, mente derivada.
além de lhe haver obtido publicação no Zeit.schrift fü.r Physik. Até lhe acrescen­ O trabalho de Bose ainda estava no prelo quando Einstein compareceu à
tou uma observação elogiosa: "Em minha opinião, a derivação bosiana da fór­ Academia Prussiana a fim de apresentar seus próprios resultados em um ensaio
mula de Planck representa um importante avanço. O método utilizado também intitulado Quantum Theory of Single-Atom Gases, no qual ampliou o método de
dota a teoria quântica de um gás ideal, como formularei detalhamente em outra Bose para as moléculas de gás. Seis meses mais tarde, ele já tinha disponível
parte". uma outra publicação, o Second Treatise. Nesses trabalhos, Einstein previu um
O que deixara Einstein, já laureado com o Prêmio Nobel, entusiasmado a fenômeno muito estranho, hoje conhecido como condensação de Base-Einstein.
ponto de passar a trabalhar com uma nova problemática, com 'base em um texto Em temperaturas normais, os átomos de gás entrechocam-se a diferentes
inédito de autoria de um obscuro físico? Para entender plenamente o que se velocidades. Alguns são rápidos, outros, lentos. Na terminologia dos físicos,
passou, é preciso que recuemos duas décadas antes. Na virada do século XIX, o alguns possuem alta energia, enquanto outros têm baixa energia. Se congelar­
físico alemão Max Planck pretendeu resolver um problema de grande interesse mos o gás, todos os átomos diminuirão de velocidade. Para detê-los, teríamos
para a comunidade física: como os objetos emitem luz e calor? Existem duas de congelar o gás a zero absoluto, uma temperatura inatingível. Einstein previu
teorias concorrentes, cada qual explicando diferentes partes, mas não tudo, dos qtie se um gás formado de átomos indistinguíveis for suficientemente resfriado,
dados experimentais. Até então, as múltiplas tentativas de reconciliar as duas uma fração significativa das partículas se estabelecerá com a energia mais
abordagens haviam sido infrutíferas. Em 1900, Planck foi o primeiro a derivar baixa. Em outras palavras, os átomos podem ser impelidos a seu estado de ener­
uma expressão que reúne perfeitamente todos os experimentos, conhecida hoje gia mais baixa a uma temperatura crítica acima de zero absoluto. Quando atin­
como a fórmula de Planck. Ele, no entanto, pagou caro porque teve de introdu­ gem esse estado, as partículas integram uma nova forma de matéria chamada
zir a pressuposição ad hoc de que a luz e o calor são emitidos em pequenos fei­ de condensado de Bose-Einstein.
xes ou quantas discretos, ideia que desconsiderava suas concepções contempo­ A previsão einsteiniana de 1925 foi recebida com profundo ceticismo.
râneas de que a luz e a radiação eletromagnética são ondas e não se formam de Mesmos os pontos mais frios do espaço intergaláctico são ambientes excessiva­
partículas discretas. Einstein esteve entre os primeiros a levar a sério a hipótese mente aquecidos para a condensação de Bose. A impossibilidade de alcançar a
de Planck. Admitindo que a luz é, de fato, formada por minúsculas partículas temperatura exigida - um milionésimo de 1 ºK para a maioria dos átomos - tor­
chamadas fótons, ele previu o efeito fotoelétrico, descoberta pela qual ganhou o nou a previsão de pouca significação física e de v�çlade questionável. Embora
Prêmio Nobel de 1922. Planck, citado por Einstein, recebera um Nobel, em rapidamente observadas em vários sistemas que vão do hélio superfluido aos
1919, pela hipótese quântica. supercondutores, durante 70 anos as previsões de Einstein permaneceram não
Em 1924, a hipótese quântica da luz ainda era um tanto problemática: ine­ confirmadas. Então, em 1995, um grupo do National Institute of Standards, em
xistia uma derivação da mecânica quântica da fórmula de Planck. Embora hoje Boulder, Colorado, chefiado por Eric A. Comell e Carl E. Weiman, refrigerou
seja um problema simplés para estudantes de física na graduação, à época todas átomos de rubídio a temperaturas suficientemente baixas para formar um con­
as tentativas de derivá-la revelaram-se infrutíferas - até que Bose propôs uma densado de Bose-Einstein.
consistente solução. A magnitude da descoberta de Cornell e Weiman foi reconhecida por have­
O que Bose poderia sussurrar de Dacca que fosse desconhecido de titãs da rem sido laureados com o Prêmio Nobel de Física apenas seis anos depois, em
física como Einstein e Planck? No século XIX, os físicos acreditavam que os áto­ 2001. A descoberta deles não só corroborou, nos mínimos detalhes, a previsão
mos podiam ser distinguidos e numerados individualmente. Pense naquelas de Einstein, mas também deflagrou uma revolução na física atômica. Hoje
bolinhas numeradas a se entrechocar pelo movimento de uma uma utilizada entendemos que a aplicabilidade da descoberta de Einstein vai além dos gases.
para sortear os números ganhadores em uma loteria. Se for tirada uma bola da Eventos análogos à condensação de partículas em nível de energia mais baixo
uma, milhões de pessoas que estão com os bilhetes saberão exatamente qual estão presentes em muitos sistemas quânticos que possuem pouca semelhança
delas saiu, porque os números aparecem nelas. Entretanto, a capacidade que com um gás efetivo. A condensação de Bose-Einstein tornou-se disposi­
temos de distinguir certas partículas subatômicas é uma ilusão do senso comum, tivo-padrão do cabedal de instrumentais teóricos dos físicos, ajudando-nos a
segundo Bose. Partículas de luz são realmente diferentes, não têm número e são entender fenômenos tão díspares quanto a formação estelar e a supercondutivi-
perfeitamente indistinguíveis. Bose mostrou que se a mecânica estatística e a

90 91
dade. Foi desse cabedal de instrumentais que Bianconi se valeu quando tentou nos contraintuitivos sem contrapartes no mundo macroscópico. Essas leis são
entender o comportamento do modelo de adequação. bastante diferentes das que regem as redes encontradas neste livro. Por exem­
plo, os nós e ,ts links da Internet são objetos macroscópicos, roteadores e cabos
que podemos tocar e cortar se quisermos. Ninguém acreditaria seriamente que
são regidos pela mecânica quântica. Apesar disso, durante décadas procuramos
5. abordar as redes como objetos geométricos estritamente pertencentes ao campo
da matemática. A descoberta de que as redes reais são sistemas dinâmicos em
rápida evolução catapultara o estudo das redes complexas nos braços dos físi­
Não temos partículas subatômicas na Web, e as redes não possuem "níveis
cos. Talvez ainda estejamos a caminho de outra mudança cultural. De fato, a
de energia", pelo menos na acepção física do termo. Então, por que falar da
condensação de Bose-Einstein? Essa foi a questão que formulei a Ginestra Bian­ analogia de Bianconi indicou que, nos termos das leis que regulam seu compor­
coni na tarde de um domingo de 2000, ao passar rapidamente pela Universi­ tamento, as redes e um gás de Bose são idênticos. Alguns traços de redes com­
dade para buscar alguns trabalhos. Quando estava saindo de minha sala, Bian­ plexas estabelecem ponte entre o mundo micro e o mundo macro, com conse­
coni, bastante eufórica, disse-me que havia encontrado algo que podia ser quências tão intrigantes quanto a própria existência da ponte.
interessante. "Agora não tenho tempo", tive de lhe dizer, porque meu filho A previsão mais importante decorrente dessa analogia é que algumas
de quatro anos estava me esperando no carro. ''Vejo você na segunda-feira." redes 'podem sofr:er uma condensação Base-Einstein. As consequências dessa
Condensação Bose-Einstein? Quem já ouviu falar de condensado fora da mecâ­ previsão podem ser compreendidas sem que nada se conheça a respeito de
nica quântica? Ela devia estar trabalhando no modelo de aptidão, regulado mecânica quântica: simplesmente informam , que em algumas redes o vencedor
pelas leis inteiramente familiares da física clássica. O que a mecânica quântica pode levar tudo. Da mesma maneira como em um condensá.do de Base-Einstein
teria a ver com a Web ou as redes sociais? Essa foi minha linha de raciocínio todas as partículas se aglomeram no nível de energia mais baixo, deixando
ermos os demais níveis de energia, assim também em algumas redes o nó mais
durante o trajeto de duas horas de carro de Notre Dame a Chicago. Mas, teria
uma surpresa na segunda-feira. adequado pode, teoricamente, capturar todos os links, sem deixar nenhum para
os outros. O vencedor leva tudo.
Utilizando uma simples transformação matemática2, Bianconi substituiu
aptidão por energia, atribuindo um nível de energia individual a cada nó no
modelo de aptidão. De repente, os cálculos adquiriram um significado insuspei­
tado: começaram a se assemelhar àqueles que Einstein analisara oito anos antes
quando descobriu os condensados. Isso poderia ter sido coincidência, mas não 6.
sem consequência. Mas, efetivamente, existia uma analogia matemática precisa
entre o modelo de aptidão e um gás de Bose. De acordo com essa analogia, cada Toda rede tem sua própria distribuição de aptidão, que nos informa a res­
nó na rede corresponde a um nível de energia no gás de Bose. Quanto maior a peito do grau de similaridade ou diferença de seus nós. Nas redes em que a
aptidão do nó, menor o nível de energia correspondente. Os links da rede con­ maioria dos nós possui aptidão compará,vel, a distribuição obedece a uma curva
verteram-se em partículas no gás, a que se atribuiu individualmente um dado de sino com um pico. Em outras redes, a amplitude da aptidão é muito grande,
nível de energia. Adicionar um novo nó à rede é como adicionar um novo nível tal que poucos nós são muito mais aptos que muitos outros. O Google, por
de energia ao gás de Bose; adicionar um novo link à rede é o mesmo que injetar exemplo, é sem dúvida 10 mil vezes mais interessante para todos os navegado­
uma nova partícula de Bose no gás. Nessa analogia, as redes complexas são res da Web do que qualquer Webpage pessoal. De fato, ferramentas matemáticas
como um imenso gás quântico, e seus links se comportam como partículas desenvolvidas décadas antes para descrever gases quânticos nos permitiram ver
subatômicas. que, independentemente da natureza dos links e dos nós, o comportamento e a
Essa correspondência entre redes e gás de Bose era altamente inesperada. topologia de uma rede são determinados pelo formato de sua distribuição de
Afinal, um gás de Bose é uma criatura única da mecânica quântica. É regulado aptidão. Entretanto, muito embora cada sistema, da Web a Hollywood, tenha
pelas leis peculiares da física subatômica, que permitem uma série de fenôme- uma distribuição de aptiq.ão única, o cálculo de Bianconi indicou que, em ter­
mos de topologia, todas as redes enquadram-se em uma de apenas duas catego­
2 A transformação exigiu que atn1míssemos um nível de energia s a cada nó com aptidão TJ, usando
a expressão e = (-1/13) log TJ, onde j3 é um parâmetro que, na condensação de Bose-Einstein,
rias possíveis. Em muitas redes, a competição não tem impacto facilmente per-
desempenha o papel de temperatura inversa.

92 93
ceptível sobre a tipologia da rede. Em algumas redes, contudo, os vencedores 7.
levam todos os links, claro sinal da condensação de Bose-Einstein.
A primeira categoria inclui todas as redes nas quais, a despeito da feroz
competição por links, a topologia sem escala sobrevive. Essas redes revelam um O produto mais visível da parceria Bill Gates e Paul Allen é indiscutivel­
comportamento do tipo apto fica rico, significando que o nó mais apto inevita­ mente o Microsoft Windows. Seu impacto sobre nosso mundo dominado pelos
velmente cresce para tomar-se o hub maior. A liderança do vencedor, porém, computadores é quase impossível de quantificar. Ele assinalou o começo de urna
nunca é significativa. O hub maior é seguido de perto por um ·menor, que divisão cultural: ou se ama ou se odeia o Windows. Não há meio-termo. Qual­
adquire quase tantos links quanto o nó mais apto. A qualquer momento ternos quer que seja o campo em que se çitue, porém, é muito provável que se utilize o
urna hierarquia de nós cuja distribuição de grau obedece a urna lei de potência. Windows. Não obstante, a despeito de sua onipresença, o Windows não é a
Em muitas redes complexas, as leis de potência e a luta por links não são, por­ invenção mais importante de Bill Gates. Sem dúvida, o legado mais duradouro
tanto, antagônicas, podendo coexistir pacificamente. da colaboração Gates-Allen foi a ideia de vender software. Isso era simplesmente
Nas redes pertencentes à segunda categoria, o vencedor leva tudo, os nós . inimaginável antes deles. Enquanto um computador é urna entidade física, o
mais adequados capturam todos os links, deixando poucos para o restante dos software é pura informação, urna série sem fim de O e 1 em um disco ou
nós. Essas redes desenvolvem urna topologia estelar, na qual todos os nós são CD-ROM. O mais extraordinário de tudo é o sistema operacional, que não faz
conectados a um hub central. Nessa rede hub-and-spokes, existe um grande senão operar outras sequências de O e 1, formando urna ponte não essencial
hiato entre o hub isolado e qualquer outro no sistema. Assim, urna rede do tipo entre várias aplicações e o hardware. Por conseguinte, inicialmente, o plano de
vencedor leva tudo é bem diferente das redes sem escala que encontramos ante­ negócio da Microsoft era oposto ao de todo mundo. Hackers que buscam infor­
riormente, em que há urna hierarquia de hubs cuja distribuição de tamanho mação e programas podem odiá-lo à vontade. Pessoas de negócio ficaram ater­
segue urna lei de potência. Urna rede do tipo vencedor leva tudo não é urna rede rorizadas com a possibilidade de comercializar algo que seria tão facilmente
sem escala. Em vez disso, existe um hub único e muitos nós pequenos. Essa é copiado.
urna distinção muito importante. De fato, o rápido crescimento do Google não é Corno todo mundo sabe, o Windows predominou, muito embora a Micro­
indicação de comportamento vencedor leva tudo; apenas nos diz que o apto fica soft não tenha sido pioneira. Quando surgiu a primeira versão do Windows,
rico. Decerto, o Google é um dos hubs mais aptos. Mas nunca conseguiu açam­ parecia urna versão feia e custosa do revolucionário sistema operacional da
barcar todos os links e tomar-se estrela. Ele compartilha os holofotes com diver­ Apple. Contudo, a Apple manteve um rigoroso monopólio sobre seu hard­
sos nós cujo número de links é comparável ao do Google. Quando o vencedor ware, enquanto o PC oferecia livre trânsito a todos os -fabricantes de computa­
leva tudo, não há espaço para um potencial desafiador. dor. Logo, os PCs� se tomaram a plataforma dominante em nosso mundo impul­
Haverá alguma rede real que revele um verdadeiro comportamento do sionado por computadores, arrastando Bill Gates e seu Windows na onda.
tipo vencedor leva tudo? Podemos agora prever se urna dada rede seguirá o com­ Pensemos nos sistemas operacionais como nós que competem por links, ou
portamento do tipo apto fica rico ou vencedor leva tudo observando sua distribui­ seja, por usuários. Toda vez que um usuário instala o Windows em seu compu­
ção de aptidão. A aptidãÕ, contudo, remanesce corno grandeza um tanto difusa, tador, adiciona-se um link à Microsoft. O modelo sem escala prevê que o sis­
pois as ferramentas para mensurar com precisão a aptidão de um nó individual tema operacional mais antigo deve ser também o mais popular. Nesse caso,
ainda estão sendo desenvolvidas. Mas o comportamento do tipo vencedor leva todos deveríamos estar rodando o primitivo DOS. No modelo de aptidão mais
tudo tem tal impacto singular e visível sobre a estrutura de urna rede que, se realista, os sistemas operacionais mais aptos capturariam os clientes de sistemas
presente, é difícil passar despercebido. Ele destrói a hierarquia dos hubs que operacionais menos aptos, independentemente de sua antiguidade.
caracteriza a topologia sem escala, convertendo-a em urna rede estelar com um Se um comportamento do tipo apto fica rico das redes sem escala prevale­
único nó que captura todos os links. E existe urna rede na qual não con'seguirnos cesse no mercado, deveria haver urna hierarquia de sistemas operacionais tal
deixar de perceber a existência de um nó que possui a característica de um con­ que o mais popular seria seguido de perto por diversos competidores menos
densado Bose-Einstein. O nó se chama Microsoft. populares. Essa hierarquia efetivamente está presente na maioria das indústrias.
Veja, por exemplo, o caso dos fabricantes de computadores. Com base nas ven­
das mundiais efetuadas no segundo trimestre de 2000, a Compaq tinha: 13% de
participação de mercado, seguida de perto pela Dell, com 11 %. Hewlett-Packard
e IBM possuíam 7% cada uma, e a Fujitsu-Siemens detinha 4% do total das ven-

94 95
das. Outros fabricantes respondiam por extraordinários 55% das vendas, pulve­ lutam por oportunidades de atuação e as pessoas disputam links sociais. Em
rizando o mercado em segmentos cada vez menores. Como a maioria das pes­ outros sistemas, a dinâmica é mais sutil. As moléculas em uma célula, por exem­
quisas lista apenas os primeiros cinco maiores fabricantes de computadores, é plo, ganham links em benefício do organismo como um todo. Entretanto; goste­
difícil verificar se a distribuição de sua participação de mercado, de fato, obe­ mos ou não, somos todos parte de um complexo jogo competitivo. Na medida
dece a uma lei de potência. Não ficaria surpreso, contudo, se_descobrisse que é em que acenamos para alguns nós e descartamos outros, sempre haverá vence­
dessa forma que isso acontece. A estrita hierarquia sugere que os fabricantes de dores e perdedores. As redes-que nos circundam trazem a marca dessa competi­
computadores são descritos pela fase apto fica rico, em que nenhum nó isolado ção no estrato de links e nós.
domina o mercado. Quando concebemos as redes como aleatórias, modelamo-las como grafos
No mercado dos sistemas operacionais, entretanto, essa saudável competi­ estáticos. O modelo sem escala reflete nosso despertar para a realidade de que
ção e hierarquia estão completamente ausentes. Realmente, o Windows não é o as redes são sistemas dinâmicos que mudam constantemente pela adição de
único sistema operacional que existe. Todos os produtos da Apple continuam a novos nós e links. O modelo de aptidão nos permite descrever as redes como sis­
rodar o Mac OS.DOS, o precursor do Windows, ainda instalado em grande temas competitivos nos quais os nós lutam impetuosamente por links. Agora, a
número de PCs. O Linux, o sistema operacional livre e o único rival sério do - condensação Base-Einstein explica como alguns vencedores têm a chance de
domínio da Microsoft, cada vez mais está ganhando participação de mercado. O levar tudo.
UNIX continua a rodar na maioria dos computadores dedicados ao processa­ Será que os avanços obtidos pelo reconhecimento da aptidão descartam o
mento numérico, utilizado exclusivamente por cientistas e engenheiros de rede. modelo sem escala? De modo algum. Nas redes que revelam comportamento do
Mas todos esses sistemas operacionais encolhem-se perante a sombra do Win­ tipo apto fica rico, a competição conduz a_ uma topologia sem escala. A maioria
dows, da mesma forma como suas diferentes versões estão zunindo em extraor­ das redes que estudamos até agora - a Web, a Internet, a célula, Hollywood e
dinários 86% de todos os PCs. O segundo sistema operacional mais popular, o muitas outras _redes reais - pertence a essa categoria. O vencedor divide os holo­
Mac OS, da Apple, detém apenas 5% de participação de mercado. O antigo DOS fotes com uma contínua hierarquia de hubs.
vem logo a seguir, com 3,8%, seguido pelo Linux, com 2,1%. Todos os demais Não obstante, a condensação Base-Einstein oferece a possibilidade teóricç1
sistemas operacionais, incluindo o UNIX, detêm menos de 1 % do mercado. de que, em alguns sistemas, o vencedor possa levar todos os links. Quando isso
Essencialmente, a Microsoft leva tudo. Como um nó, não é apenas ligeira­ ocorre, a topologia sem escala se desvanece. Até agora, entre os sistemas reais,
mente maior que seu concorrente mais imediato. Em termos de clientes, é sim­ apenas o mercado de sistemas operacionais, com a Microsoft como seu hub
plesmente incomparável. Todos nos comportamos como as partículas extrema- dominante, parece satisfazer o requisito. Haverá outros sistemas que revelem
mente sociais de Bose, e a conveniência nos condensa em uma massa sem rosto comportamentQ semelhante? Muito provavelmente. Levará algum tempo, con­
de usuários do Windows. Quando adquirimos novos computadores e instalamos tudo, para que possamos reconhecer todos eles.
o Windows, cuidadosamente alimentamos e mantemos o condensado desenvol­ Só nos últimos anos, o percurso que trilhamos nos levou à descoberta de
vido em tomo da MicrC>soft. O mercado de sistemas operacionais comporta os novos e fascinantes aspectos de nosso universo em forma de teia. Ao desvendar
clássicos sinais de uma rede submetida à condensação de Base-Einstein, reve­ os mecanismos que regulam a evolução das redes, apreendemos a universali­
lando nítido comportamento do tipo vencedor leva tudo. Embora muitos sistemas dade do arsenal de ferramentas de que lança mão a natureza para criar o com­
operacionais concorram por visibilidade e participação de mercado, a Microsoft plexo mundo que nos cerca. Agora, cientistas de campos diversos, que vão da
ocupa a posição de um condensado, uma estrela que domina a maioria dos links biologia celular aos negócios, começaram a explorar as consequências das com­
com os consumidores. plexas topologias descobertas. De que maneira essas topologias afetam a estabi­
lidade dos sistemas complexos? Como os vírus se espalham pelas redes reais?
Como as falhas formam cascatas nas emergências? Conquanto haja muito por
apreender acerca da estrutura e do comportamento das redes, começamos a
8. colocar nossas recentes descobertas intelectuais para operar de algumas manei­
ras realmente fascinantes e criativas.
Os nós sempre competem por conexões porque os links representam a
sobrevivência em um mundo interconectado. Na maioria dos casos, essa compe­
tição é aberta, como quando as companhias competem por clientes, os atores

96 97
dessa questão em Harper 's, as empresas de serviços públicos aprenderam a
NONA CONEXÃO incrementar a estabilidade e a reduzir custos compartilhando facilidades e
socorrendo-se mutuamente em situaçpes de emergência. Como resultado, siste­
mas antes isolados começaram a interligar-se, fazendo surgir a maior estrutura
construída pelo homem na Terra, com fiação suficiente para uma ida e volta à
Calcanhar de Aquiles Lua.
Com milhares de geradores, milhões de quilômetros de linhas e mais de 1
bilhão de cargas, esse enorme animal elétrico é agora tão conectado e sensível
que um simples distúrbio pode ser detectado a milhares de quilômetros. Mas o
blecaute de 1996 ressaltou a vulnerabilidade subjacente desse formidável sis­
tema. "Ter um sistema interconectado realmente torna mais eficiente o uso de
· nossos recursos naturais e reduz custos", disse Lynn Baker, porta-voz da Bonne­
ville Power Administration, que supervisiona a rede elétrica no Pacífico Noro­
este. "Mas isso significa que quando algo sai errado, pode ocorrer um efeito cas­
cata ao· longo de todo o sistema." Com prejuízos e perda de produtividade de
mais de 1,5 bilhão de dólares, o blecaute do Oeste revelou uma propriedade fre­
quentemente ignorada das redes complexas: a vulnerabilidade decorrente da
A temperatura da tarde em Denver passara dos 38 ºC, e centenas de fun­
interconectividade.
cionários de escritórios corriam dos prédios para o ambiente refrigerado pelo
ar-condicionado de seus carros. Longas filas se formavam nos postos em busca
de combustível e gelo, os semáforos estavam apagados, os hospitais e os contro­
ladores de tráfego aéreo operavam apenas em esquema de emergência, e as pes­
soas presas nos elevadores em vão apertavam o botão de alarme. "Em um dia
1.
quente, uma moderna torre de escritórios se transforma rapidamente em
estufa", comentou um funcionário de escritório. "Não há ventilação nem dá Erros e falhas, de maneira geral, corrompem todos os projetos e artefatos
para abrir as janelas." humanos. De fato, a falha de um único componente do motor de nosso carro
É fácil esquecer quão dependentes somos da tecnologia moderna. Para pode facilmente nos obrigar a chamar o guincho. Similarmente, um minúsculo
verificar a que ponto, precisamos testemunhar seu eventual colapso, como o erro de fiação em nossos circuitos computacionais pode fazer com que tenha­
que ocorreu no verão de 1996, quando tudo o que se acionava por eletricidade mos de descartar todo o computador. Os sistemas naturais, entretanto, pleite­
tornou-se silencioso desde .o topo das Montanhas Rochosas até o Pacífico. Os iam ser diferentes. No decurso da história da Terra, as espécies desapareceram a
especialistas sempre temeram uma repetição do Grande Blecaute do Nordeste uma taxa de um por milhão a cada ano. Com a estimativa de que haja de 3 a
de 1965, que deixou 30 milhões de pessoas sem eletricidade por 13 horas. Em 100 milhões de espécies vivendo na Terra, isso significa que este ano algo entre
termos de impacto financeiro, o apagão do sistema elétrico do Oeste em 1996 três e uma centena de espécies desaparecerão. Essas extinções naturais, con­
foi muito mais devastador. Alguns temem que a direção na qual a indústria elé­ tudo, parecem causar pouco estrago. Durante milhões de anos, o ecossistema
trica vem se desenvolvendo possa tornar essas interrupções mais frequentes do tem desenvolvido uma impressionante insensibilidade a erros e fracassos, sobre­
que se espera. A crise de eletricidade da Califórnia em 2001 pouco fez para vivendo mesmo a drásticos eventos, como o impacto do meteorito de Yucatán,
arrefecer esses temores. que matou dezenas de milhares de espécies, incluindo os dinossauros. O ecossis­
Comparada à do sistema atual, a rede elétrica de 1965 era bem menos tema, portanto, revela uma tolerância a erros raramente vista em sistemas cons­
conectada. O estado do Maine sobreviveu ao blecaute do Nordeste porque ope­ truídos pelos seres humanos.
rava como uma ilha, dotada de poucas conexões com o restante da Nova Ingla­ Em geral, os sistemas naturais possuem uma capacidade única de sobrevi­
terra que se encontrava às escuras. Entretanto, como a dependência do país em ver em um amplo espectro de condições. Muito embora falhas internas possam
relação à eletricidade se acirrou com o passar dos anos, a população entra em afetar seu comportamento, eles amiúde mantêm suas funções básieas sob taxas
pânico toda vez que falta luz. Segundo Alan Weisman, que escreveu acerca de erro bastante elevadas. Isso está em flagrante contraste com a maioria dos

98 99
artefatos produzidos pelo homem, em que a avaria de um único componente realizar. Esperávamos que as redes sem escala pudessem desempenhar algum
frequentemente prejudica todo o equipamento. Ultimamente, cientistas de todas papel também na compreensão da robustez das redes. Após preparar a sugestão
as disciplinas têm reconhecido a resiliência dos modelos da natureza, manifes­ solicitada até o prazo máximo de 1 ° de novembro, sentei-me com Réka Albert e
I.
tando esperança de que possamos explorar essa conveniência em estruturas pro­ Hawoong Jeong e sugeri que não esperássemos pela resposta da Darpa para ini­
duzidas pelo homem. Dessa forma, a robustez - que deriva do latim robus, signi­ ciar o trabalho sobre algumas das questões que formulamos na proposta enca­
ficando "carvalho", símbolo de força e longevidade no mundo antigo - é tópico minhada a esse órgão.
cada vez mais investigado em muitos campos. Falhas de nós podem facilmente esfacelar uma rede em fragmentos isola­
A robustez é do maior interesse para os biólogos, que querem entender dos, sem comunicação entre si. Por exemplo, a obstrução simultânea de todas as
como uma célula sobrevive e funciona sob condições extremas e frequentes rodovias que vão e vêm de Jacksonville e de Lake City, na Flórida, não só isola­
erros endógenos. Ela interessa aos cientistas sociais e aos economistas que abor­ ria essas cidades, mas também tomaria toda a península da Flórida inacessível
dam a estabilidade em organizações humanas em face da fome, da guerra e das por via terrestre ao restante dos Estados Unidos. Essa fragmentação é uma pro­
mudanças na política social e econômica. É uma questão séria para ecologistas e priedade bem conhecida de redes acometidas por falhas, tópico bastante estu­
cientistas ambientais, ensejando ambiciosos projetos mundiais para preservar a dado também entre matemáticos e físicos. Em geral, a questão é a seguinte:
sustentabilidade de um ecossistema ameaçado pelos efeitos danosos do desen­ quanto tempo uma rede levará para se fragmentar se lhe retirarmos os links
volvimento industrial. Garantir a robustez é o objetivo fundamental de especia­ aleatoriamente? Quantos roteadores devem ser removidos da Internet para
listas em sistemas de comunicação cada vez mais interdependentes, os quais dividi-la em computadores isolados que não possam comunicar-se entre si?
mantêm elevado grau de prontidão, a despeito das inevitáveis disfunções de Evidentemente, quanto mais nós retirassemos, maior seria a probabilidade
seus componentes. de que isolássemos grandes blocos de nós. Décadas de pesquisa sobre redes ran­
A maioria dos sistemas que revelam alto grau de tolerância a falhas com­ dômicas, contudo, indicaram que o colapso de uma rede não é um processo gra­
partilha um traço comum: sua funcionalidade é assegurada por uma complexa dual. A retirada de apenas poucos nós teria pouco impacto sobre a integridade
rede altamente interconectada. A robustez de uma célula oculta-se em sua da rede. Entretanto, se a quantidade de nós retirados chegar a um ponto crítico,
intrincada rede reguladora e metabólica; a resiliência da sociedade baseia-se na o sistema abruptamente se reduzirá a minúsculas ilhas desconectadas. Falhas
trama da teia social; a estabilidade da economia é assegurada por uma delicada em redes randômicas oferecem um exemplo de transição de fase inversa: há um
rede de organizações financeiras e de órgãos reguladores; a sobrevivência de limite crítico de erro abaixo do qual o sistema permanece relativamente intacto.
um ecossistema é codificada em uma rede meticulosamente construída de inte­ Acima desse patamar, no entanto, a rede simplesmente rui.
rações entre espécies. Parece que a natureza se empenha em garantir a robustez Motivados _pela proposta da Darpa, em janeiro de 2000 realizamos uma
por intermédio da interconectividade. Essa escolha universal de uma arquitetura série de experimentos computacionais para testar a resiliência da Internet a
de rede talvez seja mais que mera coincidência. falhas de roteador. Com base no melhor mapa da Internet disponível, retiramos
nós aleatoriamente escolhidos da rede. Na expectativa de um ponto crítico, gra­
dativamente aumentamos o numero de nós removidos, aguardando o momento
de a Internet fragmentar-se. Para nosso grande espanto, a rede se recusou a fra­
2. cionar-se. Conseguimos remover algo em tomo de 80% de ·todos os nós, e os
20% restantes ainda se mantiveram atrelados, formando um aglomerado (clus­
No outono de 1999, a Agência d e Pesquisa d e Projetos Avançados de ter) fortemente interconectado. Essa descoberta era coerente com a crescente
Defesa (Darpa) convocou uma audiência pública para acolher sugestões sobre o percepção de que a Internet, diferentemente de muitos outros sistemas construí­
estudo de redes tolerantes a erros. Segundo o edital, "o programa dará ênfase dos pelo homem, revela alto grau de robustez contra falhas de roteador. De
primordialmente ao desenvolvimento de novas tecnologias de rede que permiti­ fato, um estudo da Universidade de Michigan-Ann Arbor verificara que em dado
rão que as redes do futuro sejam resistentes a ataques e continuem a fornecer momento centenas de roteadores da Internet param de funcionar. A despeito
serviços". Poucos meses depois da publicação de nosso trabalho sobre a Web e dessas frequentes e inevitáveis interrupções, os usuários raramente percebem
as redes sem escala, estava buscando recursos para nossa pesquisa nessa área. A lapsos significativos nos serviços da Internet.
convocação da Darpa nos pareceu uma excelente oportunidade, já que os objeti­ Logo se tomou claro que não estávamos testemunhando uma propriedade
vos do programa seguiam as mesmas diretrizes da pesquisa que pretendíamos única da Internet. Simulações de computador que realizamos em redes geradas

100 101
pelo modelo sem escala indicaram que parcela significativa de nós pode ser física da Universidade de Bar-Ilan, em Ramat Gan, Israel, apresentando a solu­
aleatoriamente removida de qualquer rede sein escala, sem que ocorra sua frag­ ção. Ex-presidente da Sociedade Israelita de Física, Havlin é um especialista
mentação. A robustez insuspeitada contra falhas decorre de que as redes sem mundial em teoria da percolação, o campo da física que desenvolveu um con­
escala revelam uma propriedade não compartilhada pelas redes randômicas. junto de ferramentas que agora estão sendo amplamente utilizadas nos estudos
Como a Internet, a Web, a célula e as redes sociais são conhecidas como redes das redes randômicas. Efetivamente, muitos dos resultados obtidos por Erdós e
livres de escala, os resultados indicam que sua bem conhecida resiliência a erros Rényi têm sido desde então independentemente descobertos pelos físicos que
é propriedade inerente a sua topologia - uma boa notícia para as pessoas que estudam percolação.
dependem dessas redes. Havlin rapidamente percebeu que as redes sem escala devem possuir uma
resposta única a falhas. Ele e seus alunos Reuven Cohen e Keren Erez, com
Daniel Ben-Avraham, ex-aluno seu e atualmente professor de física na Universi­
dade de Clarkson, puseram-se a calcular a fração de nós que deve ser retirada
3. · de uma rede aleatoriamente escolhida, randômica ou sem escala, para que se
verifique sua desintegração. Por um lado, o cálculo por eles efetuado explicou o
Qual a origem dessa impressionante robustez topológica? O traço distintivo bem conhecido resultado de que as redes randômicas se desmembram após a
das redes sem escala é a existência de hubs, os poucos nós altamente conectados retirada de um número crítico de nós. Por outro lado, Havlin e seus colaborado­
que asseguram a integridade delas. As falhas, contudo, não fazem discrimina­ res descobriram que, para as redes sem escala, o limiar -crítico desaparece nos
ções entre nós, mas afetam pequenos nós e grandes hubs com idêntica probabili­ casos em que o expoente de grau é inferior ou igual a 3. Surpreendentemente, a
dade. Se retirasse cegamente dez bolas de um saco que contivesse dez verme­ maioria das redes de interesse, que vão da Internet à célula, é do tipo sem
lhas e 9.990 brancas, haveria 99 chances em 100 de que saíssem apenas bolas escala e possui um expoente de grau inferior a 3. Por conseguinte, essas redes
brancas. Logo, se as falhas nas redes afetam com igual probabilidade todos os se desintegram apenas após a retirada de todos os nós - ou, para todos os efei­
nós, os pequenos nós têm maior probabilidade de desmantelamento, pois há tos práticos, nunca.
uma quantidade muito maior deles.
Os pequenos nós pouco contribuem para com a integridade de uma rede.
Se fechar um aeroporto aleatoriamente escolhido, com maior probabilidade
atingirei um dos numerosos pequenos pontos, como o aeroporto de South Bend, 4.
em Indiana. Sua ausência mal será percebida em qualquer outra parte dos Esta­
dos Unidos: sem ele, ainda poderemos viajar de Nova York a Los Angeles ou de Mafiaboy, o adolescente de Montreal responsável pelos ataques ao Yahoo!,
Santa Fé a Detroit. Só os poucos passageiros que voam para ou de South Bend eBay e Amazon.com, foi sentenciado um dia depois do ataque terrorista de 11
arcarão com os inconveni�ntes. Mesmo que algo como dez ou 20 pequenos de setembro contra o World Trade Center e ao Pentágono. Foi condenado a pas­
aeroportos fossem simultaneamente fechados, só uma pequena fração do trá­ sar oito meses em um centro prisional_para jovens e a fazer uma doação de 250
fego aéreo seria significativamente afetada. dólares a título de filantropia. Antes de pronunciar a sentença, o juiz Gilled Oul­
De maneira similar, nas redes sem escala, as falhas afetam predominante­ let argumentou que "esse ataque debilitou todo o sistema de comunicação ele­
mente os numerosos nós pequenos. Logo, essas redes não se desmantelam sob trônica". Entretanto, a despeito dessa e de muitas alegações semelhantes, Mafia­
efeito de falhas. A retirada acidental de um único hub tampouco será fatal, já boy em nenhum momento representou uma ameaça à Internet. Embora
que a contínua hierarquia de vários hubs de grandes dimensões manterá a inte­ temporariamente tenham negado acesso a importantes sites da Web, suas ações
gridade da rede. A robustez topológica funda-se, portanto, na desigualdade nunca prejudicaram a infraestrutura da rede. As consequências de seus ataques
estrutural das redes sem escala: as falhas atingem desproporcionalmente os não poderiam sequer comparar-se ao potencial de destruição da "Operação Eli­
pequenos nós. gible Receiver", ocorrida dois anos antes.
Nossas simulações computadorizadas deixaram uma questão crucial sem No verão de 1997, vieram à tona relatos sobre um jogo de guerra da Agên­
resposta: todas as redes sem escala revelam o mesmo grau de tolerância a erro? cia Nacional de Segurança (ANS) para testar a segurança da infraestrutura ele­
Não tivemos de esperar muito tempo por uma resposta. Uma semana antes da trônica dos Estados Unidos. Publicidade contestadora sugeriu que a ANS havia
publicação de nosso trabalho, recebi um e-mail de Shlomo Havlin, professor de contratado algo entre 25 e 50 especialistas de computação para executar um

102 103
ataque coordenado contra sistemas não classificados do país, sabotando redes tos permanecessem abertos, o tráfego aéreo dentro dos Estados Unidos seria
elétricas, sistemas 911 etc. Significativamente, o exercício denominado "Eligible interrompido em questão de horas. Nossas simulações computadorizadas indica­
Receiver'' ilustrou que esses assaltos coordenados por adversários moderada­ ram que enfrentamos problemas semelhantes também na Internet. Se crackers
mente sofisticados, utilizando ferramentas acessíveis, eram plausíveis e potenci­ lançassem um ataque bem-sucedido contra os maiores hubs da Internet, o pre­
almente devastadores, capazes de derrubar por completo os sistemas de comu­ juízo potencial poderia ser imenso. Isso não é consequência de mau planeja­
nicação militar dos Estados Unidos e outras infraestruturas críticas. mento ou de falhas nos protocolos da Internet. Essa vulnerabilidade a ataques é
O resultado das ações de Mafiaboy foi, no máximo, incômodo, negando propriedade inerente de todas as redes sem escala.
aos usuários da Web o acesso aos sites on-line mais populares. O ataque do "Eli­ Da mesma forma, nosso grupo verificou um colapso igualmente espetacu­
gible Receiver'', por outro lado, demonstrou vulnerabilidades amedrontadoras lar quando removemos as proteínas altamente conectadas da rede de interação
nas artérias vitais dos sistemas econômico e de segurança dos Estados Unidos. de proteínas da célula da levedura. O mesmo colapso foi observado pelos ecolo­
Tampouco o ataque alvejou nós ao acaso, uma vez que objetivava intuitiva­ gistas quando eliminaram nós altamente conectados das cadeias alimentares.
mente dizimar os hubs. Pesquisas ulteriores, uma do ·grupo de Havlin e outra de Duncan Callaway, da
Universidade Cornell, em parceria com Mark Newman, Steven Strogatz e Dun­
can Watts, forneceram substrato analítico para essa observação. Demonstraram
que quando os nós maiores são removidos, existe um ponto crítico para além do
5. qual a rede se desintegra. Por conseguinte, a resposta das redes sem escala a
ataques é semelhante ao comportamento .das redes randômicas quando da ocor­
Imitando as ações de um cracker que derrubou sucessivamente1 os maiores rência de falhas. Entretanto, há uma diferença crucial. Não precisamos remover
hubs da Internet, embarcamos em um novo conjunto de experimentos. A exem­ grande número de nós para alcançar o ponto crítico. Basta inabilitar poucos
plo de Mafiaboy e dos envolvidos na Operação Eligible Receiver, já não escolhe­ hubs para que uma rede sem escala se'desintegre em pouco tempo.
mos os nós ao acaso, mas atacamos a rede mirando os hubs. Em primeiro lugar,
retiramos os hubs maiores, outros hubs maiores próximos, e assim por diante.
As consequências de nosso ataque foram evidentes. A retirada do primeiro hub
não interrompeu o sistema, porque o restante deles ainda tinha capacidade de 6.
preservar a integridade da rede. Após a remoção de diversos hubs, contudo, o
efeito das disrupções foi claro. Grandes blocos de nós desprenderam-se da rede Poucos dias depois d a apresentação de nosso trabalho que descrevia a
e desconectaram-se do aglom1=rado (cluster) principal. À proporção que avançá­ tolerância de redes complexas a erros e ataques, a Darpa rejeitou nossa pro­
vamos, removendo sempre mais hubs, testemunhavámos o colapso espetacular posta. Nosso ensaio, contudo, logo foi publicado pela Nature e destacado na
da rede. O ponto crítico, JlOtavelmente ausente quando da ocorrência de falhas, capa da publicação. Embora desapontado pela decisão da Darpa, não podia cen­
subitamente reemergiu quando a rede foi atacada. A remoção de poucos hubs surá-los. No começo de 2000, ninguém poderia antever o importante papel que
provocou o desmoronamento da. Internet em estilhaços pequenos e irremedia­ as redes sem escala desempenhariam em nossa compreensão da sobrevivência a
velmente isolados. ataques e tolerância a erro. Nessa época, mesmo o fato de que a Internet consti­
Embora a ausência simultânea dos aeroportos de Santa Fé e de South tuía uma rede sem escala só era do conhecimento de alguns pesquisadores, e
Bend mal pudesse ser notada, o fechamento do aeroporto O 'Hare, de Chicago, suas consequências foram claramente inexploradas. Apenas nos dias atuais,
por algumas horas seria destaque na imprensa, afetando todo· o tráfego aéreo depois de dezenas de projetos de pesquisa, estamos começando a entender as
do país. Se alguns eventos atingissem simultaneamente os aeroportos de ramificações dessas descobertas.
Atlanta, Chicago, Los Angeles e Nova York, mesmo se todos os demais aeropor- Consideradas em conjunto, as descobertas indicam que as redes sem
escala não são vulneráveis a falhas. O custo dessa resiliência sem precedentes
1 Ultimamente o termo cracker é utilizá.do para distinguir indivíduos que utilizam seu conhecimento está embutido em sua fragilidade sob ataque. A remoção dos nós mais conecta­
para violar os sistemas computacionais com fins danosos, paralisando-os ou provocando outros
dos rapidamente desintegra essas redes, implodindo-as em pequenas ilhas inco- ·
aptidões computacionais que testam os limites de nosso universo on-line sem danificar outros
prejuízos. Em contraste, o uso da palavra hacker é positivo, denotando indivíduos com excelentes
municáveis. Por conseguinte, ocultas no bojo de sua estrutura, as redes sem
computadores ou interferir em outros usuários.

104 105
escala abrigam um insuspeitado calcanhar de aquiles, combinando robustez 7.
contra falhas com vulnerabilidade a ataques.
A coexistência de robustez e vulnerabilidade desempenha papel funda­ Embora as primeiras especulações tenham envolvido de tudo de discos
mental na compreensão do comportamento de sistemas mais complexos. As voadores a terroristas, o blecaute do verão de 1966 não revelou ser � resultado
simulações mostram que a rede de proteína impede o seu esfacelamento sob de um ataque organizado. As linhas de transmissão de eletricidade se dilatam
mutações genéticas aleatórias. Pode-se remover muitos nós dessa rede celular q�an�o aquecidas. O aquecimento pode ser causado por temperaturas extraor­
fundamental sem que haja risco de dizimação do organismo. Se, contudo, um d�anamente el�vadas, mas as linhas de transmissão também se aquecem e se
remédio ou uma doença debilitar os genes que codificam a maior parte das pro­ dilatam por efeito de sobrecarga. Em um dia de temperaturas recordes, às
teínas conectadas, então a célula não sobreviverá. De maneira semelhante, 15:42:37 de l 0 de agosto de 1996, a linha Allston-Keeler, no Oregon, dilatou-se
simulações efetuadas nas cadeias alimentares por Ricard V. Solé e José M. Mon­ , _ ,
e ve�gou proXlIIlo a uma arvore. Houve um grande clarão, e os 1.300 megawatts
toya, da Universidade Politécnica da Catalunha, em Barcelona, mostraram que de linha entraram em colapso. C?mo a eletricidade não pode ser armazenada,
os ecossistemas podem facilmente sobreviver às eliminações aleatórias de espé­
cies. Se, no entanto, espécies fundamentais altamente conectadas forem retira­ �sse eno�e montante de energia teve de ser rapidamente transmitido para
linh�s proximas. Essa mudança ocorreu automaticamente, afunilando a corrente­
das, ocorrerá a dramática falência do ecossistema. em linhas de voltagem mais baixa, de 115 e 230 kilovolts, a leste das Monta­
Um exemplo muito estudado é o das lontras-do-mar da Califórnia. Esses nhas Cascades.
mamíferos praticamente desapareceram durante o século XIX por causa da Essas linhas ·elétricas não foram planejadas, contudo, para comportar
excessiva caça que se promoveu em razão de suas peles. Quando órgãos regula­ tamanho excesso de energia por muito tempo. Com sobrecarga de 115% de seus
dores federais, em 1911, proibiram a caça dessas adoráveis criaturas, verifi­ e índices térmicos, também entraram em colapso. Um relé derrubou a linha de
cou-se um significativo reaparecimento das lontras-do-mar. Como se alimentam · 115 kilo�olts, e a corrente em excesso superaqueceu a sobrecarregada linha
de ouriços-do-mar, o crescimento delas acarretou o declínio da população de Ross-Lexmgton, fazendo-a cair em uma árvore. A partir desse momento a
ouriços. Com poucos ouriços nas redondezas, a quantidade de algas, alimento situação não poderia senão piorar. Treze geradores do McNary Dam ·sofrer�
preferido dos ouriços, cresceu dramaticamente. Isso aumentou a provisão de ali­ pane, pro:7ocando oscilações de energia e voltagem, efetivamente rompendo a
mento para os peixes e protegeu a costa contra erosões. Logo, a proteção de .
Interligaçao Norte-Sul do Pacífico, próximo à fronteira entre a Califórnia e o
apenas uma espécie, um hub, alterou significativamente tanto a economia como Oregon. Isso estilhaçou a Rede Interconectada do Oeste, provocando blecaute
a ecologia do litoral. De fato, os peixes predominam nas peixarias do litoral que em 11 estados americanos e duas províncias canadenses.
anteriormente se dedicavam aos crustáceos. O blecaute dé 1996 é um típico exemplo do que os cientistas frequente­
Muito embora as redes sem escala sejam vulneráveis a ataques, vários dos mente chamam de falha em cascata. Quandq uma rede atua como um sistema
hubs maiores devem ser retirados simultaneamente para suplantá-las. Isso
requer muitas vezes a retirada de aproximadamente 5% a 15% de todos os hubs �e transporte, uma falha local acarreta a transferência de cargas ou responsabi­
lidades para ou?"os nós. Se a carga suplementar -é desprezível, pode ser tranqui­
ao mesmo tempo. Dessa fon.Íí:a, os crackers necessitariam atacar e inutilizar cen­ lament� absorvida pelo restante do sistema, e a falha efetivamente passa des­
tenas de roteadores da Internet, o que consumiria bastante tempo. Pode parecer P:�cebida. Se c�ga adicional exceder a capacidade de transporte dos nós
então que, a despeito de seu calcanhar de aquiles, a topologia da Internet _
vizinhos, estes cairao ou novamente redistribuirão a carga para: seus vizinhos.
abriga sólidas defesas tanto contra interrupções como contra ataques malicio­ Em qualquer das hipóteses? estamos diante de um evento cascata, cuja magni­
sos. Infelizmente, com base em profundas análises, revelou-se que, de fato, esse tude e alcance dependem da centralidade e capacidade dos nós que foram
não é o caso. Como veremos em seguida, fiar-se na estabilidade topológica con­ removidos na primeira rodada.
tra ataques representa uma falsa segurança. As falhas em cascata não são exclusivas das redes de eletricidade. Um
r?teador disfuncional automaticamente levará os protocolos de Internet a des­
viar-se dos nós perdidos, enviando pacotes a outros roteadores. Se houver trá­
f�go mui�o intenso no roteador danificado, a paralisação deste sobrecarregará
_
significa_:1vamente o� rote�dores mais próximos. Roteadores não caem por efei­
to de tráfego excessivo. Srmplesmente formam uma fileira, processando tantos

106 107
pacotes quanto puderem e descartando o restante. Por conseguinte, tráfego 8.
excessivo enviado a um roteador equivale a um ataque de negação de serviço.
Só um pequeno percentual dos pacotes terá sua passagem franqueada. Como o
remetente dos pacotes perdidos não obtém confirmação de que sua mensagem A tolerância ao erro discutida neste capítulo é realmente uma boa notícia.
chegou, envia-a de novo, provocando aumento do congestionamento. Por conse­ A robustez das redes implica que quando algumas substâncias químicas em
guinte, a remoção de vários nós de grande porte pode facilmente criar a mesma
nosso corpo não funcionam a contento, resultando em alguma erupção ou outra
disrupção catastrófica na Internet que a rede elétrica caída no Oregon causou irritação menor, temos condições de desempenhar nossas funções normais coti­
ao sistema elétrico. dianas. A robustez das redes explica por que raramente nos damos conta do
As falhas em cascata são fenômenos frequentes na economia. De fato, efeito de erros rotineiros e por que o desaparecimento de algumas espécies não
muitos atribuem a crise econômica do Leste asiático de 1997, que será discutida acarreta uma catástrofe ambiental.
em maiores detalhes no capítulo 14, à pressão que o Fundo Monetário Interna­ O preço da robustez topológica, contudo, é a extrema exposição a ataques.
cional (FMI) exerceu sobre os bancos centrais de diversas nações do Pacífico, A eliminação de uma hierarquia de hubs altamente conectados desintegrará
limitando a capacidade deste de fornecer crédito de emergência aos bancos em qualquer sistema. Essa é uma péssima notícia para a Internet, já que esta per­
apuros. Esses bancos, por sua vez, cobraram seus empréstimos das companhias, mite aos crackers planejar estratégias que possam danificar toda a infraestru­
fazendo com que a decisão do FMI, supostamente o maior hub financeiro, acar­ tura. É uma péssima notícia também para nosso sistema econômico, pois indica
retasse inadimplência em cascata de bancos e empresas. que, ao enfocar as redes subjacentes à economia, pode-se formular estratégias
Falhas em cascata são um fenômeno bastante conhecido também em sis­ para avariá-la. Os;resultados das pesquisas descritas neste capítulo nos obriga­
temas vivos, afetando em idêntico grau os hábitats ecológicos e a célula. De ram, portanto, a reconhecer que a topologia, a robustez e a vulnerabilidade não
fato, como já vimos em relação às lontras-do-mar, a remoção de algumas espé­ podem ser dissociadas. Todos os sistemas complexos possuem seu calcanhar de
cies pode desencadear uma série de eventos capazes de acarretar uma reorgani­ aquiles. Aprendemos que topologia é algo importante, instigando-nos a melhor
zação significativa do ecossistema. De maneira semelhante, a mudança abrupta apreciar os hubs. Esse é o primeiro passo para defendê-los.
na concentração de uma molécula pode resultar em uma cascata de eventos Os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 ilustram simultanea­
capaz de resultar na morte da célula. mente o poder dos hubs e a resiliência das redes. Sem dúvida, os alvos não
Obviamente, a probabilidade de que uma falha pontual provoque pane de foram escolhidos aleatoriamente: eram os símbolos mais visíveis do poder eco­
todo o sistema será muito maior se perturbarmos os nós mais conectados. Isso nômico e da segurança dos Estados Unidos. Ao colocá-los na mira, os terroristas
foi corroborado pelas descobertas de Duncan Watts, da Universidade de Colum­ pretenderam destruir os hubs do capitalismo global. Embora tenham provocado
bia, que investigou um modelo projetado para capturar os aspectos genéricos uma tragédia humana maior do que qualquer outro evento experienciado pelos
das falhas em cascata, como os períodos de interrupção do fornecimento de Estados Unidos nas duas décadas anteriores, os terroristas não conseguiram rea­
energia elétrica, e o fenômeno oposto, a popularidade em cascata de livros, fil­ lizar seu intento supremo: arruinar a rede. Desencade_aram, contudo, uma cas-,
mes e álbuns, que também -podem ser descritos dentro do mesmo esquema. cata de falhas que contiµua a convulsionar o mundo enquanto escrevo este
Suas simulações indicaram que a maioria das cascatas não é instantânea: as livro. Entretanto, a despeito da destruição das torres gêmeas do World Trade
falhas podem passar despercebidas durante bom tempo, antes que ocorra um Center, todas as redes, da Internet à emaranhada rede econômica, sobreviveram
desmoronamento. Não obstante, a tentativa de reduzir a frequência dessas cas­ - uma vívida demonstração das diferenças fundamentais entre a vulnerabili­
catas comporta consequências inevitáveis, pois as cascatas que conseguem obter dade do planejamento humano centralizado e a resiliência do desenho de rede
maior êxito são, portanto, mais disruptivas. auto-organizada.
Não obstante esses avanços, nossa compreensão das falhas em cascata é Se há algum aprendizado científico a extrair dos eventos de 11 de setem­
bastante limitada. A robustez topológica é um traço estrutural das redes. As bro, é o de que ainda estamos realmente longe de entender a interação entre
falhas em cascata, porém, são uma propriedade dinâmica de sistemas comple­ robustez e vulnerabilidade. Decerto, os cientistas descobriram recentemente os
xos, ramo da ciência relativamente inexplorado. Não ficaria surpreso se sou­ princípios fundamentais da robustez. Compreendemos, agora, o papel essencial
besse que existem leis ainda não descobertas que regulam as falhas em cascata. que as redes desempenham quando se trata de assegurar a resiliência, um
A descoberta dessas leis acarretaria implicações profundas para muitas áreas, da avanço que veio para ficar. A etapa crucial, contudo, de transformar esse conhe­
Internet ao marketing. cimento em habilidade prática ainda está por consubstanciar-se. Ninguém pode-

108 109
ria ter previsto a magnitude dos prejuízos em cascata que os ataques terroristas
causariam. À medida que os eventos se desenrolavam, todo mundo assistia hor­ DÉCIMA CONEXÃO
rorizado, fazendo-se a mesma pergunta: "Qual será o próximo?". Até que ponto
chega nossa vulnerabilidade? Felizmente, nosso entendimento acerca das falhas
e dos ataques indica que as falhas em cascata e as avarias pontuais podem ser
discutidas em linguagem científica. Compreender esses problemas, portanto, só Vírus e Modismos
depende da alocação de recursos às questões certas. Com a crescente conscienti­
zação das questões concernentes à robustez e aos ataques que os eventos de 11
de setembro suscitaram, inquestionavelmente nossa percepção dessas problemá-
ticas se expandirá significativamente.

Gaetan Dugas tinha tudo o que queria e sabia disso. Com um seleto
guarda-roupa de grifes de Londres e Paris e um corpo bem definido, embora
não bombado, era um tipo que chamava a atenção em qualquer boate. Só preci­
sava de um bom papo com seu charmoso sotaque franco-canadense para seduzir
quem quisesse. "Sou o mais bonito", costumava dizer, e seus amigos concorda­
vam. De uns tempos para cá, no entanto, Gaetan vinha evitando as casas notur­
nas mais badaladas. Passara a preferir os espelhos embaçados e o ambiente
pesado das saunas da Bay Area de São Francisco. Apesar da perfeição narcísica,
dera para gostar das casas mais escuras que pouco deixavam entrever seus fasci­
nantes traços físicos. Os longos corredores de lúgubres cubículos agora o faziam
se sentir mais à vontade. Certa noite, em 1982, quando se preparava para sair
de um daqueles cubículos, acendeu a luz, voltou-se lentamente na direção do
homem com quem se encontrara poucos minutos antes e fizera sexo imediata­
mente e apontou as manchas avermelhadas e os inchaços que tinha no rosto:
"Contraí o câncer gay", disse ele. ''Vou morrer e você também."
Ex-comissário de bordo franco-canadense, Dugas costuma ser designado
de Paciente Zero da epidemia de Aids. Não por ter sido o primeiro a ser diag­
nosticado com a enfemúdade, mas porque pelo menos 40 das 248 pessoas diag­
nosticadas com Aids em abril de 1982 ou haviam feito sexo com ele ou com
alguém que havia. Dugas estava no centro de uma emergente rede sexual com­
plexa entre homens gays, rede ancorada entre a Costa Leste e a Costa Oeste da
América do Norte, estendendo-se por São Francisco, Nova York, Flórida e Los
Angeles.
Sua centralidade nessa rede está longe de ser mera coincidência. Dugas foi
um <los primeiros gays americanos a ser diagnosticado com o sarcoma de Ka­
posi. Mais ou menos em 1983, tomou-se cada vez mais evidente que a enfermi-

110 111
dade de que Dugas e centenas de outros gays haviam sido acometidos tinha
alguma origem infecciosa, e Dugas, uma vez inais, foi um dos primeiros pacien­
tes a ser notificado desse fato. No entanto, continuou insistindo que sofria ape­
nas de um câncer de pele. Como câncer não é contagioso, por muitos anos
Cédula da eleição presidencial na Flórida


Dugas jamais admitiu a si mesmo que pudesse representar qualquer risco a seus Siga a seta e perfure no local apropriado
parceiros sexuais. Orgulhoso da atração que exercia e de suas conquistas sexu­
ais, confidenciou depois aos assistentes de saúde os detél.lhes íntimos de seus
Bush---------��


hábitos sexuais. Calculava ter aproximadamente 250 parceiros ,sexuais por ano.
Como, segundo algumas estimativas, o número total de seus parceiros deve ter
sido superior a 20 mil, sua década de promiscuidade em boates e saunas gays
claramente o colocou em contato sexual com pelo menos 2.500 pessoas.


Não se sabe ao certo se Dugas trouxe a Aids para a América do Norte. Ele
viajava frequentemente para a França, onde alguns dos primeiros casos foram
descobertos, mas jamais poderemos afirmar com exatidão se ele foi infectado lá Gore


ou nos Estados Unidos. O que de fato sabemos, contudo, é que muitos dos pri­
meiros casos ocorridos nos Estados Unidos tinham ligação com ele, o que o
situava na raiz de uma epidemia que até agora matou quase 20 milhões de
pessoas.
Dugas desempenhou papel importante ao fazer que a epidemia da Aids,
em poucos anos, deixasse de ser um obscuro e raro "câncer gay" para tomar-se
a maior crise de saúde da América do Norte. Ele é um exemplo aterrador do fra­
casso dos modelos epidemiológicos clássicos e uma demonstração do poder dos
hubs em nossa sociedade altamente móvel e conectada. Com efeito, em se tra­ Figura 1 0.1. Cartum de Mike Collins satirizando as confusas cédulas-borboleta utilizadas
tando de vírus e epidemias, os hubs fazem uma diferença mortal. nas eleições presidenciais de 2000 (reproduzido com autorização de Mike Collins).

Websites dos Está'dos Unidos ao Japão bombardearam-no com pedidus de auto­


1. rização para publicá-lo. Em poucas horas, ele deixara de ser simplesme�te
_
"Mike" para se tomar uma celebridade instantânea, com um� séne de g�otas
- reparando nele e pais querendo fotografá-lo em companhia de suas filhas.
A exemplo de milhões de outros americanos, Mike Collins viu pela televi- Enquanto o debate eleitoral finalmente arrefecia, o desenho assinado por Col­
são, na noite de 8 de novembro de 2000, uma imagem da controvertida lins tomou-se talvez o cartum mais reconhecido da década, estampado em tudo
cédula-borboleta das eleições presidenciais na Flórida. "Meu Deus, como eles quanto era objeto, de camisetas que ele vendeu através de seu site a cartões de
não conseguem seguir as setas em direção aos pontos?", foi sua primeira reação. felicitações. É provavelmente a única imagem mais duradoura da malfadada
"Talvez eu desenhe algo que tomará essa cédula mais confusa." Collins, enge­ cédula eleitoral da Flórida de 2000 (Figura 10.1).
nheiro de 26 anos do Departamento Municipal de Água e cartunista amador de A instantânea passagem de Mike Collins à celebridade é uma reedição do
Elmira, Nova York, desenhou um cartum de quatro linhas e o enviou por e-mail clássico sonho americano. Mas o extraordinário aqui é a velocidade com que se
a 30 amigos seus. Como faria aniversário no dia seguinte, quando sua irmã deu deu. Poucas décadas atrás, era impossível granjear fama internacional literal­
à luz uma menina, passou o dia inteiro fora de casa. Quando voltou para casa mente do dia para a noite, mesmo na América. Algo havia mudado. Normal­
aquela noite, era aguardado por um grande público: 17 mil novas mensagens mente creditamos essas mudanças à Internet, e decerto a mídia alimenta e dis­
em sua Webpage e centenas de e-mails. Embora estivesse distante, o cartum que semina a fama. Mas uma explicação baseada inteiramente na tecnologia não é
desenhara, traduzindo perfeitamente a frustração geral com a eleição presiden­ suficiente. Estamos testemunhando algo qualitativamente novo, algo que está
cial de 2000, dera a volta ao mundo. Quem via queria uma cópia. Jornais e

112 113
possibilitando que ideias e modismos alcancem todo mundo à velocidade da do Meio-Oeste em menos de dez anos. Iowa, em particular, foi rápido em sua
luz. adoção. Embora a nova semente não estivesse disponível antes de 1929, por
volta de 1939 cerca de 75% da área cultivável de milho era reservada ao
lubrido. Essa rápida expansão, combinada à boa escrituração contábil dos fazen­
deiros, propiciou a primeira oportunidade de investigar o processo de propaga­
2. ção das inovações. Bryce Ryan e Neal C. Cross, do Iowa State College, embarca­
ram nesse estudo em 1943.
Gaetan Dugas e Mike Collins notoriamente têm pouco em comum: um Antes de adotar qualquer inovação, normalmente nos fazemos algumas
propagou uma doença cruel; o outro era amador de uma cidadezinha e a perguntas do tipo: "Devo empregar meu tempo avaliando o novo produto?".
e�grandeceu com uma ideia inteligente. A Aids levou uma década para desven­ "Devo investir dinheiro nele?". "Como sei que ele funcionaÍá para mim segundo
cilhar-se de suas origens africanas e difundir-se pelo mundo, transmitindo-se de o que foi prometido?". As questões não eram diferentes no caso do lubrido. Para
p arceiro a p arceiro, primordialmente por contato sexual. O cartum de Mike · adotá-lo, os fazendeiros tiveram de investir em novas sementes p ara substituir
explodiu do dia para a noite, correndo o mundo através de cliques e e-mails. as que já tinham. Muito embora a mudança prometesse maior retorno, havia
Não obstante, Dugas e Collins possuem algo importante em comum. São ambos pouca garantia de que vantagens marginais pudessem compensar o investi­
exemplos da difusão que se processa em uma complexa rede. A Aids se espalhou mento inicial. O risco era particularmente relevante para os pioneiros. Não obs­
seguindo os links da intrincada rede sexual da década de 1980, favorecida pela tante, o lubrido enraizou-se em Iowa graças a um pequeno grupo de indivíduos
emergência de uma ativa cultura gay altamente sexualizada. O cartum da dispostos a assumir riscos. Hoje os chamaríamos de inovadores.
cédula eleitoral se disseminou instantaneamente pela emaranhada rede de com­ Todos conhecemos alguns inovadores. Foram conhecidos nossos que se
putadores, ajudada por nossa capacidade de contatar nossos amigos por e-mail. dispuseram a comprar o Newton, o PDA da Apple, só p ara descobrir que a tec­
Ambos, contudo, obedeceram às mesmas leis fundamentais que regem a propa­ nologia não cumpriéi. suas promessas. Poucos anos depois, eles foram os primei­
gação de modismos, ideias e epidemias em redes complexas. Essas leis têm sido ros a rabiscar caracteres na tela cinzenta dos primeiros Palm Pilots, dessa vez
intensamente pesquisadas por executivos de marketing que tentam idealizar deflagrando a revolução dos PDAs. Eles são os adolescentes que seguiram as
formas de colocar seus produtos em nossas bolsas; por sociólogos que procuram novas tendências antes que se tornassem dominantes; são os artistas e intelectu­
entender modismos, modas e tumultos; por cientistas políticos que acompa­ ais que alimentaram as ideias muito antes que chegassem ao nosso conheci­
�am os padrões de votação e as trajetórias políticas; por médicos e epidemiolo­ mento por meio de livros, filmes e revistas. Em Iowa, eram os fazendeiros p ara
gistas que esperam coibir o avanço do vírus Ebola, tanto quanto a recorrente quem bastava cgnversar com representantes comerciais e ler a documentação
gripe de início de inverno; por adolescentes que desenvolvem vírus de computa­ para se persuadirem a experimentar a nova semente.
dor com o objetivo de destruir todos os produtos da Microsoft da noite para o Ryan e Cross descobriram que a plotagem do número de fazendeiros que
dia; e por gestores de sistemas determinados a prevenir que os vírus provoquem adotaram a semente a cada ano produz uma curva que cresce rapidamente até
esse estrago. Acredita-se que essas leis sejam universais, como de fato são. Mas alcançar um máximo, p ara, em seguida, declinar também rapidamente. É uma
n? sso emer�ente conhecimento acerca das redes complexas nos capacita a curva de sino. Se um novo produto passa no teste crucial dos inovadores, ba­
ve-las a partrr de uma nova perspectiva. seãdo em sua recomendação, os pioneiros irão adotá-lo. Eles são seguidos pela
numerosa maioria inicial, até que metade das pessoas que finalmente o adota­
rão já esteja participanclo do jogo. Para além desse ponto, o número dos novos
adotantes começa a decrescer, e a inovação passa a atrair aqueles que, embora
3. lentos para decidir-se, são persuadidos pela evidência irresistível em seu favor.
Essa grande parte posterior é composta de fazendeiros que viram metade das
terras à sua volta decidir-se pelo lubrido e finalmente se convenceram disso. A
Enquanto, em 1933, o milho lubrido era cultivado em apenas 40 mil hec­
curva inevitavelmente termina com os poucos retardatários, que só aderem após .
tares em toda a América do Norte, por volta de 1939 alcançara 24 milhões de
ter se tornado uma nítida minoria.
hectares, um quarto da área cultivável de milho do país. Ele revolucionou e A curva de sino observada por Ryan e Cross não é exclusiva dos fazendei­
remodelou a lavoura americana, açambarcando finalmente toda a agricultura ros de Iowa. Ela caracteriza a difusão da maioria das inovações, oferecendo

114 115
uma excelente ferramenta com o auxílio da qual os especialistas de marketing e O estudo do Pfizer demonstrou que as inovações se disseminam a partir de
planejamento preveem a demanda em relação a um novo produto. Entretanto, inovadores em direção aos hubs. Os hubs, por sua vez, enviam a informação
não consegue responder a algo que todo mundo, dos epidemiologistas aos presi­ para seus numerosos links, alcançando muitas pessoas dentro de uma dada rede
dentes dos conselhos de administração (CEOs), quer saber hoje em dia: "Se e social ou profissional. Os hubs, os componentes integrante� das redes sem
que papel desempenha a rede social na disseminação de um vírus ou de uma escala, são indivíduos estatisticamente raros, altamente conectados que confor­
inovação?". mam as redes sociais. Na epidemia de Aids, o comissário de bordo gay Gaetan
Dugas claramente se qualificou como hub importante. E o peregrino Paulo, com
seu extenso círculo de amigos e seguidores, foi um dos mais influentes hubs do
cristianismo primitivo.
4. Os hubs, que em marketing costumam ser referidos como "líderes de opi­
nião", "usuários poderosos" ou "influenciadores", são elementos que se comuni­
Em 1954, Elihu Katz, pesquisador do Bureau of Applied Social Research da cam com mais pessoas acerca de determinado produto do que um sujeito me­
Universidade de Columbia, divulgou uma proposta de estudo do efeito que os diano. Com seus numerosos contatos sociais, estão entre os primeiros a
laços sociais exercem sobre o comportamento. Por coincidência, o diretor de perceber e utilizar a experiência dos inovadores. Embora não necessariamente
pesquisa de mercado do gigante farmacêutico Pfizer era um aluno da Universi­ sejam inovadores eles próprios, sua conversão é a chave para o lançamento de
dade de Columbia. Curioso por saber como os médicos prescrevem um novo uma ideia ou inovação. Se os hubs resistem a um produto, erigem um muro tão
medicamento, ele ofereceu 40 mil dólares a Kats e seus dois colegas, James impenetrável e influente que a inovação não pode senão malograr. Se o acei­
Coleman e Herbert Menzel, para traçar a disseminação da tetraciclina, poderoso tam, influenciam grande contingente de pessoas.
antibiótico introduzido em meados da década de 1950. Sociólogos e especialistas em marketing têm plena consciência desses líde­
Coleman, Katz e Menzel entrevistaram 125 médicos de uma pequena res de opinião. Mas até recentemente tratavam os hubs como fenômeno único,
cidade de Illinois e pediram-lhes que listassem separadamente os três médicos sem compreender bem por que e como muitos deles existem. Os modelos de
com quem a maioria frequentemente discutia práticas médicas, três a quem con­ rede social não suportam a existência de hubs. O marco oferecido pelas redes
sultavam a respeito de um medicamento e três que considerassem amigos. Essas sem escala proporcionou pela primeira vez a legitimidade que os hubs merecem.
listas lhes permitiram reconstituir a complexa rede de vínculos e influências Como veremos a seguir, os hubs estão mudando praticamente tudo. o que sabe­
sociais no interior da comunidade médica. mos a respeito da propagação de ideias, inovações e vírus.
Os resultados revelaram significativas diferenças-entre os médicos. Alguns
foram citados por grande parcela de seus colegas como indivíduos que desem­
penhavam importante papel em suas decisões cotidianas. Eram os hubs da
comunidade médica. A _maioria, contudo, desempenhava papel bem menor. 5.
Quando se tratou da difusão da tetraciclina, os médicos mencionados por três
ou mais outros como amigos tinham três vezes mais probabilidade de adotar o Revelado em 1993 como criação intelectual de John Sculley, CEO da
novo medicamento do que aqueles que não haviam sido citados por ninguém. Apple criado na Pepsi, o promovidíssimo computador PDA Newton nunca des­
Recorrendo aos registros de prescrições das farmácias, os pesquisadores lanchou. Apesar disso, desencadeou uma revolução.
puderam acompanhar a expansão do uso do medicamento ao longo dos links Hoje existem milhões de aparelhos de bolso em circulação. Apesar de sua
sociais. Revelou-se que os primeiros adotantes e a primeira maioria eram predo­ enorme quantidade, muitos acreditam que ainda estamos no começo da curva
minantemente médicos que tinham numerosos vínculos sociais. Esses médicos de sino em termos de inserção no mercado. O problema da Apple é que nenhum
altamente conectados tinham maior probabilidade de estar em contato com ino­ desses aparelhos de mão é um Newton. Palm, Handspring, vários PCs de bolso e
vadores, aprendendo, portanto, acerca do novo medicamento mais rapida­ seus incontáveis primos obscureceram a visão da Apple, constituindo uma
mente. Uma vez adotado por esses médicos, o medicamento se difundiu desses demonstração eloquente de que nem sempre leva vantagem quem sai na frente.
hubs para seus colegas menos conectados, que formavam a maioria tardia. Por Newton conjugava muitas tecnologias novas em um equipamento "original",
último, vinham os retardatários, médicos que resistiam a adotar a nova droga prometendo a realização de um sonho. Mas não foi fácil. O pesadelo começou
até o fim. com uma série de avaliações negativas que ridicularizavam a capacidade de

116 117
reconhecimento de escrita do Newton. Os críticos denunciavam seu consumo rão crescerá exponencialmente, até que todo mundo capaz de utilizá-la tenha
voraz de bateria por simples meia hora de uso. AE decepções se sucederam, e as adquirido o novo produto.
vendas do MessagePad, versão redesenhada do Newton, atingiram um patamar O reconhecimento de que a superação de um limiar crítico é pré-requisito
desolador de 85 mil unidades em 1995. O produto foi descontinuado três anos para a disseminação de modismos e vírus talvez tenha sido o mais importante
mais tarde como tentativa de estancar as perdas, depois que Steve Jobs reassu- avanço conceitua! na compreensão da disseminação e da difusão. Atualmente, o
miu como CEO interino da Apple. limiar crítico é parte de toda teoria da difusão. Os epidemiologistas trabalham
O fiasco do PDA Newton e de muitos outros produtos requer explicação. com esse limiar quando modelam a probabilidade de que uma nova infecção se
Por que algumas invenções, rumores e vírus percorrem o mundo, enquanto tome epidemia, como aconteceu com o vírus da Aids. Os manuais de marketing
outros só se difundem em âmbito restrito ou simplesmente desaparecem? Por referem-se ao limiar crítico quando estimam a probabilidade de que um produto
que e como os perdedores se diferenciam dos vencedores? A publicidade clara­ o transponha no mercado ou quando se trata de compreender por que alguns
mente não constitui explicação suficiente. Afinal, o Newton fracassou apesar da produtos nunca o excedem. Os sociólogos fazem uso dessa ferramenta para
formidável máquina de marketing da Apple. A questão de 1 bilhão de dólares é: · explicar a disseminação das prática� de controle da natalidade entre as mulhe­
"Como detectar as maçãs podres?". res. E a ciência política explora esse conceito para explicar o ciclo -de vida de
partidos e movimentos ou para modelar a probabilidade de que manifestações
pacíficas descambem em arruaças.
Durante décadas, um paradigma simples, mas poderoso, dominou o trata­
6. mento que administramos aos problemas da difusão. Se quiséssemos estimar a
probabilidade de que uma inovação se difundiria, bastava conhecer sua taxa de
Visando a explicar o desaparecimento de alguns modismos e vírus e a dis­ disseminação e o limiar crítico correspondente. Ninguém colocava em xeque
seminação de outros, os cientistas sociais e os epidemiologistas desenvolveram esse paradigma. Recentemente, contudo, descobrimos que alguns vírus e inova­
uma ferramenta muito útil denominada modelo de limiar. Todos nós diferimos ções não o levam em conta.
em nossa disposição a aceitar inovações. Em geral, com suficiente evidência
positiva, cada um pode ser convencido a adotar uma nova ideia. Contudo, o
nível de testemunho aceitável difere de pessoa para pessoa. Reconhecendo nos­
sas diferenças, os modelos de difusão atribuem um limiar a cada indivíduo, 7.
quantificando a probabilidade de que ele adote uma da4a inovação. Por exem­
plo, aqueles que compraram o Newton logo após seu lançamento tinham limiar Lançado nas Filipinas, Love Bug, o vírus de computador mais delet�rio de
próximo de zero para artefatos PDAE. Antes do desfalque em nossos cartões de todos os tempos, atingiu, em questão de horas, todos os recantos do mundo que
crédito, contudo, muitos_ querem ver um novo produto funcionando; logo, a falam a linguagem dos computadores. No dia 8 de maio de 2000, o sol se levan­
maioria de nós revela um elevado limiar. tou continente após continente para qSsistir à queda dos computadores, milha­
Apesar das diferenças significativas em termos de propósito e detalhe, res a um só tempo - um efeito dominó em escala global que se alastrou de leste
todos os modelos de difusão preveem o mesmo fenômeno: cada inovação possui a oeste. Os especialistas em segurança de computadores mal haviam começado
uma tmca de disseminação bem definida, representando a probabilidade de que a socorrer as primeiras vítimas em Hong Kong quando os administradores de
será adotada por uma pessoa a quem tiver sido apresentada. Por exemplo, a sistema de um importante jornal alemão assistiram, estupefatos, à destruição de
taxa de disseminação incorpora a probabilidade de que, após a demonstração 2 mil fotografias digitais pelo vírus. Propagando-se para a Bélgica, atingiu os
de um novo equipamento PDA, estaremos dispostos a adquiri-lo. Contudo, não caixas eletrônicos, afetando o abastecimento de numerário aos clientes. Lon­
basta conhecer a taxa de disseminação para decidir a sorte de uma inovação. dres, ao despertar uma hora mais tarde, assistiu à paralisação das atividades do
Para tanto, devemos calcular o limiar crítico, valor determinado pelas proprie­ Parlamento. Antes de se deslocar da Europa, aproximadamente 70% dos com­
dades da rede na qual a inovação se propaga. Se a taxa de disseminação da ino­ putadores da Suécia, da Alemanha e da Holanda estavam arruinados. A destrui­
vação ficar abaixo do limiar crítico, extinguirá em curto espaço de tempo. Se ção se propagou para os Estados Unidos, onde o vírus se introduziu sorrateira­
estiver acima do limiar crítico, contudo, o contingente de pessoas que a adota- mente nos computadores do prédio do Capitólio, em Washington, D.C., infectou
80% de todas as agências federais, inclusive os Departamentos de Defesa e de

118 119
Estado, e interrompeu as comunicações via e-mail da campanha presidencial de intitulado Open Problems in Computer Virus Research, de Steve R. White, espe­
Bush. cialista da IBM em vírus de computador. O trabalho sustentava que os modelos
O Love Bug, que causou prejuízos de mais de 10 bilhões de dólares em 45 epidemiológicos biologicamente inspirados não descrevem adequadamente a
milhões de computadores destruídos em todo o mundo, foi um ardil psicológico disseminação do Love Bug e de outros vírus de computador.
bem arquitetado a que ninguém conseguiu resistir. Como não se abriria imedia­ Intrigados com essa observação, os pesquisadores decidiram dissecar o
tamente uma mensagem intitulada "Carta de amor para você"? Se o destinatá­ problema de maneira acurada. Utilizando os registros do Virus Bulletin, um
rio caísse em tentação, o vírus ativado apagava uma série de documentos do recurso on-line de prevenção a vírus de computador, determinaram a probabili­
disco rígido, com particular apetite por arquivos jpeg e mp3 que codificam ima­ dade de que um vírus ainda existisse vários meses após sua primeira ocorrência.
gens e músicas digitais. Em seguida, rastreava o programa de e-mail do Micro­ Os resultados foram surpreendentes: o tempo de vida típico da maioria dos
soft Outlook Express. Se encontrasse um, enviava novas cópias da carta de amor vírus oscila entre seis e 14 meses. Ou seja, os vírus infectam computadores mais
a todos os amigos e conhecidos cujos endereços eletrônicos estivessem de um ano após sua primeira ocorrência e suposta erradicação. Como dizem
armazenados. Pastor-Satorras e Vespignani, "esses tempos de vida característicos são impres­
A carnificina diminuiu quando Richard Cheng e Maricel Soriano, das Fili­ sionantemente maiores se comparados com o intervalo durante o qual o soft­
pinas, criaram um antídoto, um programa que conseguia imunizar computado­ ware antivírus permanece à disposição do mercado (geralmente dias ou sema­
res contra o vírus. O que assusta no Love Bug, no entanto, é que, apesar de o nas após o relato do primeiro incidente)". Como as múmias, os vírus .são
antídoto se encontrar disponível em larga escala, o vírus ainda existe. Segundo repetidamente despertados de seus sarcófagos e não conseguem descansar.
o Virus Bulletin, recurso on-line que registra as ocorrências de vírus, o Love Bug Os pesquisadores normalmente utilizam várias versões dos modelos de
ainda era o sétimo vírus mais ativo em abril de 2001, um ano após a liberação limiar-padrão para descrever como os vírus de computador se disseminam. Nes­
do programa que o detecta e desativa. Recebi uma cópia dele em julho de 2001. ses modelos, cada computador pode ser saudável ou infectado. Durante cada
É tentador especular que o Love Bug talvez seja tão virulento que é prati­ intervalo de tempo, um computador saudável pode ser infectado pelo vírus se
camente impossível erradicá-lo. Mas sua contínua presença não pode ser expli­ estiver em contato com um computador já infectado. Tão logo um computador
cada apenas pela virulência. Essa foi a conclusão de dois físicos, Romualdo Pas­ infectado é curado, torna-se novamente suscetível à infecção. Admitindo que os
tor-Satorras e Alessandro Vespignani, que mostraram que, ao contrário das computadores sejam aleatoriamente conectados entre si, esse modelo corrobora
sólidas previsões dos modelos de limiar, nas redes reais a alta virulência não o clássico cenário de propagação de vírus: um vírus agressivo, de contagiosi­
assegura a propagação de um vírus. dade superior a um limiar crítico, afeta muitos computadores. Em contraste, se
a agressividade do ,vírus for menor do que o limiar, o número de computado.res
novamente infectados decrescerá rapidamente até que o vírus se extinga.
Por volta de agosto de 2000, Pastor-Satorras e Vespignani concluíram que
8. White estava correto: os vírus de computador desafiam as previsões dos mode­
los epidemiológicos clássicos. A origem dessa discrepância, no entanto, conti­
A extraordinária cidade de Trieste, no norte da Itália, com sua lubrida e nuou desconhecida para eles. Por sorte, o trabalho de meu grupo de pesquisa
agitada herança histórica, é sede do prestigioso International Center for Theore­ sobre o calcanhar de aquiles da Internet fora destaque de · capa da Nature
tical Physics. Fundada e dirigida durante décadas pelo vencedor do Prêmio daquela mesma semana. Lendo-o, eles rapidamente encontraram o elemento
Nobel, o físico paquistanês Abdus Salam, essa instituição oferece um porto que faltava. Na Internet, . os computadores não são interconectados aleatoria­
seguro e intelectualmente desafiador para físicos do Terceiro Mundo, colo­ mente. Pelo contrário, a rede subjacente possui uma topologia livre de escala.
cando-os em contato com seus colegas de todo o mundo. Romualdo Pas­ Logo, os vírus de computador devem ser modelados a partir de uma rede sem
tor-Satorras, físico espanhol, concluiu um pós-doutorado de dois anos no Centro escala, e não da rede randômica utilizada em todos os estudos anteriores. Pas­
em 1999, antes de regressar a Barcelona para assumir uma cátedra. No verão de tor-Satorras e Vespignani se apressaram justamente para fazê-lo, investigando
2000, voltou a Trieste para uma visita de dois meses, planejando concluir diver­ pela primeira vez a difusão em uma rede sem escala realista. Os resultados
sos projetos pendentes que ele e seu então orientador, Alessandro Vespignani, foram altamente surpreendentes: em redes sem escala, o limiar epidêmico mira­
haviam iniciado durante a primeira estada. Enquanto compilavam a bibliografia culosamente se volatiliza! Em outras palavras, mesmo que um vírus não seja
de um novo trabalho, depararam-se com um ensaio de ciência da computação muito contagioso, sua propagação persiste. Desafiando todo o conhecimento

120 121
acumulado ao longo de cinco décadas de estudos acerca da difusão, a transmis­ enquanto realizava uma atividade acadêmica. Ela se dispusera a prever o
são de vírus em redes sem escala parece não perceber nenhum limiar. Pratica­ número de parceiros sexuais de um grupo de suecos. Os hábitos sexuais na Sué­
mente não se pode detê-los. cia, um dos primeiros países a conceder direitos a casais não casados que viviam
A origem desse comportamento altamente inesperado reside na topologia juntos, são liberais comparados aos de outros países. A Suécia também se orgu­
irregular da Internet. As redes sem escala são dominadas pelos hubs. Como cada lha de seu notável e dispendioso seguro-saúde e de seus serviços sociais. Como
hub é conectado a um grande número de outros computadores, tem alta proba­ a Aids chamou a atenção no norte da Europa, os pesquisadores suecos iniciaram
bilidade de ser infectado por um deles. Uma vez infectado, um hub transmite o uma extensa pesquisa sobre os contatos sexuais, esperando encontrar meios de
vírus para todos os outros computadores a que está conectado. Dessa forma, mitigar a epidemia.
hubs altamente conectados oferecem um meio excepcional pelo qual os vírus A obtenção de um mapa da trama sexual, conectando as pessoas por inter­
persistem e se propagam. Enquanto as espécies virulentas rapidamente atingem médio das relações sexuais, é algo simples�ente impossível. Alguém se disporia
todos os nós em qualquer rede, em um ambiente sem escala suas contrapartes a me fornecer o nome de todas as pessoas com quem se envolveu intimamente,
moderadamente contagiosas também possuem boa chance de sobrevivência. s·abendo que eu contataria todas elas depois, para mapear também as relações
Esses resultados não se restringem aos vírus de computador. Os modelos sexuais delas? Felizmente, não temos necessidade de um mapa completo da
utilizados por Pastor-Satorras e Vespignani, com algumas modificações, propor­ rede sexual para decidir se é do tipo sem escala ou randômica. Basta medir a
cionam uma descrição simples da disseminação de ideias, inovações e novos distribuição de grau, indagando a um subconjunto significativo da sociedade
produtos, bem como da difusão de doenças contagiosas. Em uma abordagem quantos parceiros sexuais cada um teve. Não tendo de solicitar a nossos sujeitos
grosseira, eles capturam o processo que facilita também a propagação das reli­ que revelassem a identidade de seus parceiros, logo nos vimos diante de um tra­
giões: Paulo, hub altamente conectado e móvel, facilitou a propagação das cren­ balho menos desafiador. Em 1996, os cientistas suecos conduziram milhares de
ças do cristianismo primitivo ao maior número de pessoas possível. Ideias e ino­ pesquisas com uma amostra aleatória de 4.781 indivíduos com idades entre 18
vações difundem-se de pessoa para pessoa por meio de links da rede social. e 74 anos, coligindo informações concernentes a seus hábitos sexuais. Com taxa
Como a rede social parece ter uma topologia sem escala, as anomalias observa­ de resposta da ordem de 59%, eles obtiveram o número de links para 2.810 nós
das nos vírus de computador devem estar presentes também nesses sistemas. na rede sexual sueca.
Hoje os estudantes frequentemente recebem os dados coletados para tes­
tar vários métodos estatísticos. Roman tinha uma cópia dos dados quando pro­
curou seu colega de quarto, Fredrik Liljeros, em busca de ajuda para interpretar
9. a curva oblíqua que havia obtido pela plotagem dos dados. Iniciante nos estudos
de sociologia, Liljeros ficou tão favoravelmente impressionado durante uma
Das centenas de vínculos sociais que cada indivíduo possui, somente pou­ série de palestras sobre sociologia matemática que se dedicou a essa área, enfo­
cos são suficientemente íntimos para transmitir uma enfermidade sexual. Por cando a evolução das organizações sociais. Essa pesquisa colocou-o em contato
conseguinte, a Aids avança por uma sub-rede muito esparsa de nossa teia social com uma enorme gama de ferramentas e conceitos matemáticos, incluindo
altamente interconectada. Acrescente-se a isso a contagiosidade relativamente auto-organização e leis de potência. Embora de aspecto tipicamente nórdico,
baixa da doença e se perceberá que a epidemia deveria ter amainado e se extin­ quando se trata de sua paixão, a pesquisa, o Liljeros de cerca de 20 anos não
guido no momento atual. Não obstante as adversidades, a Aids já infecto;u. apro­ compartilha o estereótipo fleumático e o caráter reservado de seus compatrio­
ximadamente 50 milhões de pessoas, e os números continuam a subir. E tenta­ tas. "Isso parece uma lei. de potência!", gritou ele para sua colega de quarto
dor tomar o estudo de Trieste por seu valor nominal e atribuir a rápida depois de observar o diagrama na tela de Roman. Em vez de ajudá-la no traba­
propagação da epidemia de Aids à topologia sem escala da rede social. Entre­ lho, Liljeros pediu os dados e foi checar seu palpite. Em seguida, enviou uma
tanto, como nem todos os vínculos sociais representam links sexualmente ati­ cópia por e-mail para Luís Amaral, da Universidade de Boston, com quem havia
vos, precisamos nos perguntar: qual é a topologia da rede sexual que transmite colaborado anteriormente. De uns tempos para cá, Amaral havia direcionado
essa doença letal? sua atenção para as redes complexas, escrevendo diversos trabalhos originais
No final de novembro de 2000, Carina Mood Roman, aluna de doutorado sobre modelagem de topologia sem escala. Ele imediatamente percebeu que os
em sociologia da Universidade de Estocolmo, na Suécia, tentava entender uma dados que Liljeros lhe havia mandado por e-mail continham a informação-chave
curva extremamente oblíqua obtida pela plotagem de dados que recebera

122 123
para responder à pergunta que formulamos linhas atrás: qual a topologia da 10.
rede sexual?
Qualquer estudo sobre hábitos sexuais enfrenta diversos vieses de memó­
Quando, em 1997, assistimos ao primeiro declínio das mortes por Aids nos
ria: os homens parecem lembrar-se mais dos(as) parceiros(as) sexuais que as
Estados Unidos, pensamos que o pior havia passado. Estávamos enganados.
mulheres. Logo, de início se pediu aos sujeitos do estudo sueco que revelassem
Atualmente, a cada dia 15 Inil pessoas são infectadas em todo o mundo. A maio­
quantos parceiros sexuais haviam tido só no ano anterior, na esperança de que
ria delas morrerá da doença dentro de uma década. Quem tem 15 anos em Bot­
a resposta pudesse ser um tanto acurada. Era evidente que as respostas concer­
suana, hoje, corre risco de quase 90% de contrair Aids e morrer dessa enfenni­
ne�tes ao número de parceiros que recordavam haver tido ao longo da vida
dade. De fato, seríamos tentados a resgatar um adolescente desse ou de outros
senam pro�damente ��tadas por lapsos de memória e expectativas. A despei­
países subsaarianos, para evitar que mais cedo ou mais tarde não fosse morto
to �esses vieses potenciais, os resultados foram consistentes. Indicaram que a
_ pela pandemia. Isso apesar de muitos tratamentos relativamente eficazes contra
maiona dos respondentes tivera entre um e dez parceiros sexuais durante a . a Aids já se encontrarem no mercado. Decerto, nenhum deles representa a cura
vida. Alguns, no entanto, chegaram a ter dúzias ou mais. Alguns haviam tido
da enfennidade, mas cada um contribui para que ela se torne uma doença crô­
centenas. A distribuição seguiu uma lei de potência, independentemente de se
nica com a qual muitos pacientes poderão conviver indefinidamente. O maior
haver examinado o intervalo de um ano, considerado todos os parceiros sexuais
problema é que esses tratamentos de 15 Inil dólares ao ano não estão ao alca�ce
e se concentrado apenas em homens ou mulheres. Tomados em conjunto, os
da maioria dos países fora da Europa e dos Estados Unidos.
dados proporcionaram evidência surpreendente de que a rede de nossas rela­
A crise enfrentada pela África é a mais grave. O problema não consiste
ções sexuais possui uma topologia sem escala, conclusão reforçada por um
apenas no fato de que a maior parte dos países africanos não pode arcar com os
estudo subsequente que focalizou a população americana.
custos dos medicamentos. Mesmo que os preços dos remédios viessem a cair,
�parentemente, Gaetan Dugas manteria o recorde, com 250 parceiros esses países não possuem infraestrutura para distribuir e administrar o trata­
sexuais em um ano. Mas a pretensão de Wilt Chamberlain de que teria mantido
mento. Aos 20 anos, a epidemia de Aids tornou-se uma macabra celebridade.
relações sexuais com uma aterradora cifra de 20 mil mulheres claramente
Por meio de manifestações públicas e do apoio financeiro de colaboradores
supera esse marco. "Sim, é isso mesmo, 20 mil mulheres diferentes", escreveu
poderosos, que vão de Bill Gates a um sem-número de estrelas pop, o ativismo
ele. "Em minha idade, isso equivale a fazer sexo com 1,2 mulher por dia todo
antiaids atraiu os holofotes, obrigando os grandes laboratórios farmacêuticos a
dia, desde os 15 anos." A contagem do hall da fama dos machos da NBA fe� dele
fornecer medicamentos a preço de custo para as nações pobres. Mas isso repre­
um para-raio das :ríticas daqueles que foram prejudicados por sua promiscui­
senta apenas o :primeiro passo. É evidente que, a despeito do poderoso fundo
dade. A colaboraçao Estocolmo-Boston, contudo, revelou que ele não é excep­
_ _ internacional de bilhões de dólares, não haverá dinheiro suficiente par� com­
c10nal. A topologia sem escala implica que, muito embóra a maioria das pessoas
prar medicamentos para todo mundo a preço de custo. Quem terá acess0 a eles
tenha �penas alguns links sexuais, a rede de contatos sexuais se mantém por
. então?
uma hierarqma de hubs_altamente conectados. Eles são os Wilt Chamberlain e
Enquanto a disseminação original da Aids era atribuída primordialmente
os Ga�tan Dugas, colecionando um número estonteante de parceiros sexuais.
às relações homossexuais, hoje as relações heterossexuais constituem o princi­
A luz desses �esult�dos, as previsões de Trieste oferecem uma nova pers­
. pal meio de transmissão do vírus. Como dissemos, os hubs desempenham papel
pectiva sobre a ep1denna da Aids. O vírus mortal deve ter seguido a rota já
fundamental nesses processos. Sua importância excepcional sugere uma solução
observada na disseminação de inovações e vírus de computador: os hubs estão
drástica, embora cruel: na medida em que os recursos são finitos, deveríamos
entre os primeiros infectados, graças a seus numerosos contatos sexuais. Uma
tratar apenas os hubs. Em outras palavras, quando existe tratamento, mas não
vez infectados, rapidamente containinam centenas de outros. Se nossa teia
há dinheiro suficiente para oferecê-lo a todo mundo que dele necessita, deve­
se�al formasse uma rede homogênea, randômica, a Aids teria se extinguido há
mos proporcioná-lo primordialmente aos hubs. Essa é a conclusão a que chega­
mmto tempo. A topologia sem escala à disposição da Aids possibilitou a propa­
ram dois estudos recentes, um de Pastor-Satorras e Vespignani e outro de Zol­
gação e a persistência do vírus.
tán Dezsó, estudante de graduação que trabalha em meu grupo de pesquisa. Os
resultados indicam que se oferecermos tratamento a todos os nós com grau
maior que um valor pré-selecionado, independentemente do ponto em que
fixarmos o limite, o limiar epidêmico será finito. Quanto mais hubs tratarmos,

124 125
maior o limiar epidêmico e, portanto, maior a probabilidade de que o vírus se paga por um único avião de guerra. Enquanto nos debatemos com nossas priori­
extinga. dades nesse ínterim devemos fazer tudo para deter a escalada da doença,
O problema é que não sabemos ao certo quem são os hubs. Por essa razão, mesm.'o que isso exija recompensar a promiscuidade.
Zoltán Dezsó e eu passamos a abordar uma questão mais difícil. Embora não
saibamos como identificar os hubs com alto grau de confiança, décadas de pes­
quisa produziram numerosos métodos sociológicos de identificação de grupos
de alto risco, tanto quanto indivíduos que possuem maior probabilidade de 1'1 .
constituir a origem da epidemia em dada comunidade. Status social, idade, ocu­
pação e muitos outros fatores desempenham papel importante nesse sentido. Nossa compreensão dos sucessos e fracassos, das epidemias e dos modis­
Portanto, com certa probabilidade, é possível identificar os hubs. Indubitavel­
mente, muitos hubs serão descobertos, enquanto alguns não hubs integrarão a
k:
mos, progrediu consideravelmente desde o estudo pioneiro de Iowa. últimas
décadas têm assistido a uma incrível diversificação do tema. Descobnmos que
lista. Mas também devemos nos perguntar se tal método imperfeito é util. _Como �alisar a adoção de novos grupos pode nos ajudar a entender a proliferação da
não basta nos empenhar ao máximo para identificar os hubs, podemos ainda Aids e a ocorrência de grandes transformações. Percebemos que, embora a ale�­
recuperar o limiar epidêmico? Para responder a essa pergunta, devemos pressu­ toriedade esteja presente em todos os processos de difusão, o processo obedece
por que os nós não sejam tratados ao acaso, mas as organizações de saúde a leis que podem ser formuladas em termos matemático� precisos. E começamos
sigam uma política enviesada em função da qual um indivíduo com numerosos a compreender o importante papel que a rede social desempenha nesses
links sexuais tem maior probabilidade de ser tratado do que aqueles que pos­ processos.
suam apenas alguns links. Essa abordagem estocástica nos permite comparar - . ,
Mas houve muitas mudanças ao longo das cmco decadas passadas. A rede
políticas que possuem maior efetividade para identificar e tratar os nós alta­ social de alcance mundial implodiu com a disseminação dos artefatos de com�­
mente conectados a outras políticas que distribuem o tratamento de maneira nicação de alta velocidade, compreendendo do fax a� e:TI?-ail, qu: nos aproxi­
aleatória. Zoltán Deszó fez essa comparação, e os resultados nos surpreende­ mam e nos integram em um grau sem precedente na hist�na. Se�tlm._?-nos com­
ram. Decerto, toda política que continuou distribuindo os tratamentos de forma pelidos a entender por que essa implosão afeta as �e1s de d:fusao Com �
aleatória permaneceu tendo limiar zero e não conseguiu coibir o vírus. Mas toda _
crescente ameaça do bioterrorismo e o persiste�te contag10 �a Aids, h� necessi­
,-
política que revelou viés em relação aos nós mais conectados, ainda que com dade vital de prever e acompanhar o desenvolvimento de VIrUs mortais em um
um pequeno viés, recuperou o finito limiar epidêmico. Em outros termos, mundo cada vez mais volátil, onde indivíduos contaminados podem embarcar
mesmo não conseguindo detectar todos os hubs, ao tentar fazê-lo, podemos em um avião e transformar uma epidemia local em pandemia. Em um mundo
reduzir a taxa à qual a enfermidade se dissemina. cada vez mais dependente dos computadores, criamos uma nova cepa de yírus
Qualquer política seletiva suscita importantes questões éticas. De fato, que ignora fronteiras nacionais. Esses primos do Love Bug não são mais que
nossos resultados indicaram que, em face dos recursos limitados, acabaríamos simples flagelos. Representam uma ameaça palpável a no�sa segurança e �
recompensando a promiscuidade. Quanto mais parceiros sexuais um indivíduo A
nosso estilo de vida, que pode facilmente causar emergencias ameaçadoras a
tiver, maior sua probabilidade de ser selecionado para tratamento. Quanto vida. Com sua proliferação, surgiu uma nova casta de epidemiologistas, os espe­
melhor formos na seleção e no tratamento dos indivíduos promíscuos, menos cialistas em segurança de computadores, que, vigilantemente, momtoram _ a
pessoas serão afetadas por essa doença. Será que estamos preparados para saúde de nosso universo on-line.
abandonar os pacientes menos conectados em benefício da população em geral? As inovações e os vírus biológicos ou de computadores se _Prof'.ag� por
Será que estamos dispostos a oferecer medicamentos às prostitutas pobres mais meio de redes não homogêneas em que os hubs fazem o show. As rmplicaçoes do
conectadas do que às mais ricas, porém sexualmente menos conectadas, da estudo de Trieste são no sentido de que devemos aguardar muitas surpresas
classe média? sobre o que sabemos acerca de disseminação e difusão. Os resultados �btid�s
Há uma solução que academiciza esses debates morais: uma vacina. Atual­ até agora representam apenas a ponta do iceberg. Na me�da em qu: � disse�­
mente, o mundo desembolsa meros 350 milhões de dólares por ano para reali­ _ _ sao
nação e a difusão possuem propriedades universais, os s1ste:11as md!viduais
zar pesquisas em prol de uma vacina contra a Aids. Essa cifra é pífia se compa­ A _ _
dotados de traços característicos que, com frequencia, sao tao rmportantes
rada com os mais de 3 bilhões de dólares gastos com remédios contra a Aids na quanto algumas das leis gerais. Estaríamos nos il�din�o se acreditássemos que �
América do Norte e na Europa, ou com o mais de 1 bilhão de dólares que se modelagem de vírus de computador nos proporcronana um bom quadro da ep1-

126 127
demia de Aids. Para poder pormenorizar as previsões a partir da proliferação da
doença, os modelos devem comportar maior detalhamento específico à pande­
,
DECIMA PRIMEIRA CONEXAO
-
mia. É um sonho ainda distante. Mas compreender as leis fundamentais que
governam a disseminação e a difusão é pré-requisito-chave para o sucesso. Os
recentes avanços nessas direções oferecem um poderoso estímulo para rever
problemas cujo espectro se estende do marketing à disseminação da influenza e, Despertar da Internet
ainda, para avaliar criticamente as pressuposições inerentes. À medida que
seguirmos esse caminho, muito mais surpresas e avanços potenciais virão à
tona.
As recentes mudanças de paradigma nos estudos da difusão das epidemias
foram possíveis graças à riqueza de dados proporcionada pela Internet, uma das
redes mais mapeadas. A Internet nos ajudou a descobrir redes sem escala em
primeira mão. Os vírus que nela navegam proporcionaram os insights e os dados
necessários que possibilitaram o estudo de Trieste, revelando a natureza sem
limiar de algumas epidemias. A compreensão que ensejaram capacitou-nos a
fazer uma revisão geral, compreendendo desde os modismos até a pandemia da
Aids. Retrocedamos agora e lancemos um olhar sobre esse intrincado meio de
comunicação que possibilitou essas descobertas (a Internet), mapeando-lhe a Quando Paul Baran se inscreveu, uma semana depois, em sua primeira
aula de ciência da computação na Universidade da Pensilvânia, sabia que já
rede subjacente.
havia perdido a primeira palestra, mas não estava muito pr�ocupado. De qual­
,
quer forma, não se · produz muito na primeira aula. Assim, compareceu a
segunda aula, de álgebra booleana, a matemática subjacente à lógica. Conforme
se lembra "o instrutor foi à lousa e escreveu: '1 + 1 = O'. Olhei em volta espe­
rando qu; alguém corrigisse sua atroz aritmética. Ninguém corrigiu. Imaginei,
então' que talvez estivesse um tanto perdido ali, e não voltei". Não obstante,
,
Baran reviu a matéria dez anos depois, em seu quarto emprego apos a gradua-
ção. Dessa vez elé enfrentou um problema diferente: estava muito à frente de
seu tempo.
Beirando os 30 anos de idade e com apenas alguns meses no novo
emprego na Rand Corporation, Baran foi incumbido da prodigiosa tarefa de
desenvolver um sistema de comunicação que sobrevivesse a um ataque nuclear.
Em 1959, a possibilidade de uma ogiva nuclear soviética cair do céu não _era
mera ficção científica, mas um potencial cenário de guerra devidamente tenndo.
o empregador de Baran, um instituto de pesquisa da Califórnia fundado em
1946 com o objetivo de· prover conhecimento intelectual ao desenvolvimento
nuclear militar, tinha considerável habilidade no desenvolvimento de cenários
de guerra e das consequências de um desastre potencial. Essas excruciantes
tarefas, na medida em que previam e detalhavam a morte de milhões de pes­
soas por um ataque nuclear, nunca eram fonte de boas notícias, frequentemente

128 129
varrendo a companhia com a vassoura do Dr. Strangelove1 . A atribuição de
Baran, que consistia em desenvolver um · sistema de comunicação capaz de
sobreviver a um ataque nuclear, tinha equivalência com o curso na Rand. Baran
levou seu emprego a sério e, em uma coletânea de 11 volumes de memorandos
da Rand, descreveu meticulosamente as vulnerabilidades da infraestrutura de
comunicação existente e propôs uma melhor - a Internet.
Baran percebeu a vulnerabilidade do sistema de comando da década de
1950 escondida na topologia da rede de comunicação existente. Como um ata­
que nuclear prejudica todo equipamento dentro do raio de detonação, ele que­
ria projetar um sistema cujos usuários fora desse âmbito não perdessem contato
entre si. Inspecionando os sistemas daquela época, ele verificou três tipos de
redes (Figura 11.1). Baran descartou a topologia em forma de estrela, conclu­
indo que "a rede centralizada é notoriamente vulnerável, na medida em que a
destruição de um único nó central arruína a comunicação entre as estações
finais". Baran via o sistema de então como uma "estrutura hierárquica de um
conjunto de estrelas conectadas na forma de uma grande estrela", oferecendo
uma precoce descrição de uma rede sem escala. Com incrível percepção, achava
essa topologia centralizada demais para ser viável em caso de ataque. Na con­ CENTRALIZADA DESCENTRALIZADA DISTRIBUÍDA
cepção de Baran, a arquitetura ideal, em termos de sobrevivência, era uma rede (AJ (B) (C)

distribuída em forma de malha, semelhante a um sistema rodoviário, suficiente­


mente redundante para que mesmo se alguns nós fossem derrubados, vias alter­ Figura 1 1.1. As redes de Paul Baran: Em 1964, Paul Baran começou a cogitar a estrutura
nativas mantivessem a conexão entre o restante deles. ótima da Internet. Ele sugeriu três possíveis arquiteturas para essa rede - centralizada,
Um mito persistente alega que a Internet foi projetada para sobreviver a descentralizada e distribuída - e alertou que as estruturas centralizada e descentralizada
um ataque nuclear da União Soviética. É verdade que a principal motivação de que dominavam os sistemas de comunicação da época eram vulneráveis demais a ata­
Baran consistiu em projetar um sistema que não pudesse ser destroçado pelo ques. Propôs, então, que a Internet fosse desenhada segundo uma arquitetura distribuí­
arsenal nuclear soviético. A longo prazo, no entanto, suas ideias e inovações da em forma de :rp.alha (reproduzido com autorização de PaulBaran).
foram inteiramente ignoradas pelos militares. Como consequência, a topologia
da Internet de hoje tem pouco a ver com a visão de Baràn. No entanto, a mesmos". As ideias de Baran, derrotadas a cada passo pela indústria e pelos
mudança topológica defendida por ele não era a razão para que qualquer pes­ militares, foram redescobertas apenas dez anos mais tarde, quando a Agência
soa da indústria militar sê opusesse veementemente a seu projeto. A objeção era de Pesquisas em Projetos Avançados (Arpa), desconhecendo os resultados a que
a sua proposta de fragmentar as mensagens em pequenos pacotes de tamanho ele chegara, formulou a mesma concepção por conta própi;ia. Nessa época, no
uniforme capazes de trafegar em recíproca independência ao longo da rede. Isso entanto, a Internet já seguia seu curso de desenvolvimento.
não podia ser feito com o sistema de comunicação analógica então existente. Entender a topologia da Internet é pré-requisito para projetar ferramentas
Por esse motivo, Baran defendia a migração para um sistema digital. Também e serviços que ofereçam uma infraestrutura de comunicação rápida e confiável.
era muito difícil para AT&T, o monopólio de comunicação de sua época, absor­ Conquanto seja uma obra humana, a Internet não é concebida em termos cen­
ver esse processo. Por isso, Jack Osterman, da AT&T, boicotou a concepção de tralizadores. Estruturalmente, a Internet está mais próxima de um ecossistema
Baran quando declarou: "Primeiro, é possível que não funcione e, se funcio­ do que de um relógio suíço. Por conseguinte, entender a Internet não é apenas
nasse, seria prejudicial, pois estaríamos fomentando a competição contra nós um problema de engenharia ou de matemática. De formas importantes, as for­
ças históricas plasmaram sua topologia. Uma intrincada história de convergên­
1 Dr. Strangelove é um filme de 1964, dirigido por Stanley Kubrick, traduzido como Dr. Fantástico, cia de ideias e de motivações concorrentes deixou sua marca na estrutura da
no Brasil. Seu título completo é um dos maiores da história do cinema: Dr. Strangelove or: How I Internet, criando um intrincado emaranhado de informações a ser elucidado por
Leamed to Stop Wonying and Lave the Bomb. Misto de comédia, humor negor e sátira, reflete as
historiadores e cientistas da computação.
paranoias e maneirismos da Guerra Fria (N.T.).

130 131
1. apenas à infraestrutura física de conexão de computadores. A Internet é uma
rede de roteadores que se comunicam entre si à.través de protocolos previstos
por Paul Baran e possibilitados graças aos generosos orçamentos da Arpa. Ironi­
A Arpa foi a resposta do presidente Eisenhower ao lançamento soviético camente, os princípios regentes da Internet de hoje equiparam-se à visão origi­
do primeiro satélite, Sputnik. Originalmente, a Arpa tinha pleno controle das nal de Baran em todos os aspectos, exceto o princípio diretor que motivou seu
pesquisas militares mais avançadas e dos projetos de desenvolvimento, em par­ trabalho: a prevenção da vulnerabilidade a ataques. A rede distribuída em
ticular os programas antimísseis e satélites. Perdeu poder, porém, quando a forma de rodovia, segundo a concepção de Baran, só poderia ter se tornado rea­
Nasa assumiu a condução do programa espacial. lidade se a Internet tivesse continuado a ser controlada e mantida pelos milita­
Lutando em prol de uma missão, a Arpa reinventou-se para coordenar as res. A Internet, contudo, adquiriu vida própria.
pesquisas de maior abrangência relevantes para os militares, em contraste com
os projetos desenvolvimentistas imediatos conduzidos por diferentes agências
militares. A Internet integrou-lhe o quadro por volta de 1965 ou 1966, quando
Bob Taylor, diretor do programa de computação da Arpa, subitamente passou a 2.
se preocupar com o enorme desperdício de recursos federais que acabara de
descobrir.
Na década de 1960, a Arpa já financiava pesquisas em computação em Na comunidade de ciência da computação, Bill "Ches" Cheswick, pesquisa­
larga escala. Tais pesquisas, de fato, demandavam investimentos consideráveis dor de uma incubadora dos laboratórios Lucent/Bell chamada Lumeta, é mais
- com a revolução do PC décadas adiante, os computadores custavam entre bem conhecido por seu trabalho emfirewalls e segurança de computador. Mas o
meio milhão e vários milhões de dólares. A Arpa tinha vários desses monstros público cada vez mais o reconhece pelos coloridos mapas da Internet que ele e
em seu portfólio de pesquisa, hospedados por laboratórios de pesquisa em todo Hal Burch, também da Lumeta, produzem e vendem através da Peacock­
o país. O problema era que mesmo computadores que se encontravam na maps.com. O mapa do milênio, representando a topologia da Internet em 1° de
mesma sala não conseguiam se comunicar. Canalizar a capacidade computacio­ janeiro de 2000, mostra uma densa e emaranhada floresta de roteadores e links,
nal armazenada em outros sites apoiados pela Arpa estava fora de questão. Bob uma rede de considerável beleza. Sua complexidade talvez só se equipare à do
Taylor teve uma ideia brilhante: para conter o desperdício, por que não conec­ cérebro humano. Mas existe uma importante diferença entre ambos. Enquanto o
tar de alguma forma esses equipamentos incompatíveis? Em fevereiro de 1966 tamanho do cérebro humano estagnou há séculos, a Internet continua a crescer
após apresentar seu plano a Charlie Herzfeld, diretor da Arpa, ele saiu com Í exponencialmente, sem qualquer sinal de arrefecimento.
milhão de dólares fresquinhos em seu orçamento e um novo senso de missão. Cheswick está longe de ser o único cientista com aspirações artísticas. Ele
A ideia de conectar computadores também ocorreu a Donald Davies, dire­ se acha em ilustre companhia. A Darpa, sucessora da Arpa, investe atualm�nte­
tor de ciência da computação do Britain National Physical Laboratory, em Ten­ milhões de dólares em grupos de pesquisas em todos os Estados Unidos para
nington, cidade não muito distante de Londres. Trabalhando arduamente para fazer exatamente o que Cheswick está fazendo: mapear a Internet. O mais visí­
transformar seu plano em realidade, Davies reinventou pacotes e comutação de vel desses projetos é a Cooperative Association for Internet Data Analysis
pacotes muito antes de tomar conhecimento do trabalho preexistente de Baran. (Caida), uma colaboração em tomografia da Internet patrocinada pela Universi­
Seu grupo expôs esses conceitos em um simpósio realizado em 1967, em Gatlin­ dade da Califórnia, em San Diego, cujo principal objetivo é monitorar simples­
burg, no Texas, apresentando suas ideias e as de Baran ao grupo de pesquisa mente todas as características da Internet, do tráfego à topologia. Do outro lado
patrocinado pela Arpa. Logo se tornou patente a todo mundo que a comutação do Atlântico, mas apenas a um clique de distância, Martin Dodge, pesquisador
de pacotes em linhas mais rápidas era a tecnologia exigida para criar uma rede do Center for Advanced Spatial Analysis da University College London, hospeda
de comunicação realmente eficiente. Por fim, a visão de uma década de Baran Cybermaps.com, um colorido site da Web que coleciona um espantoso acervo de
começou a se materializar. E assim nascia a rede que hoje chamamos de mapas que visualizam a Internet.
Internet. Já ocorreu alguma vez ao leitor traçar meticulosamente um mapa do pró­
A palavra Internet é frequentemente utilizada para descrever tudo o que se prio relógio, do chip Pentium de seu computador ou do carro que dirige todos os
relaciona com nosso universo on-line, incluindo computadores, roteadores, dias? Dificilmente. Se estiver realmente interessado em conhecer o que existe
cabos ópticos e até a Web. Neste livro, utilizaremos a palavra para nos referir sob o capô, entrará em contato com o fabricante para conseguir o projeto do
carro. Os engenheiros elaboram centenas de mapas antes de construir cada reló-

132 133
gio, chip ou carro, detalhando não apenas cada componente, mas também a Situação semelhante se aplica à Web. A infraestrutura nunca foi preparada
localização e a inter-relação entre cada peça. Entretanto, mesmo hoje que a para ela. Trata-se de um excelente exemplo de um "sucesso desastroso", o dese­
Internet é o burro de carga da economia americana, ainda não temos um mapa nho de uma nova função que resvala para o mundo real e se multiplica a uma
detalhado da rede. Desde que a National Science Foundation abandonou suas taxa imprevista antes de o projeto ser totalmente implantado. Hoje, a Internet é
funções de supervisão da Internet, no começo de 1995, nenhuma autoridade utilizada quase exclusivamente para acessar a rede mundial de computadores e
central se encarregou de controlar ou documentar o crescimento e o desenho da o e-mail. Se seus criadores originais tivessem previsto esses usos, teriam proje­
rede. tado uma infraestrutura bem diferente, resultando em uma experiência muito
Atualmente, a Internet se desenvolve segundo decisões distribuídas em mais agradável. Em vez disso nos encontramos presos a uma tecnologia que só
termos locais, com base no "quando necessário". Todo mundo, das empresas às com grande dificuldade se adapta à estrondosa diversidade e à demanda
instituições educacionais, adiciona nós e links sem precisar de permissão de imposta pelo uso cada vez mais criativo da Internet.
uma autoridade central. Tampouco existe uma rede única. Redes independen­ Até meados da década de 1990, toda pesquisa se concentrava no desenho
tes, mas interligadas, coexistem e operam, regulando-se por nomes como · de novos protocolos e componentes. Ultimamente, contudo, um crescente
WNET, vBNS ou Abilene. número de pesquisadores está formulando uma inesperada questão: o que exa­
Poder-se-ia pensar que existe alguém de fora que, se necessário, teria con­ tamente criamos? Embora sua concepção seja inteiramente humana, a Internet
dição de interromper todo o aparato. Errado. Embora se pudesse persuadir uma vive agora uma existência independente. Tem todas as características de um
instituição a encerrar parte da rede sob sua responsabilidade, nenhuma compa­ complexo sistema evolutivo, assemelhando-se mais a uma célula ou a um chip
nhia ou pessoa, individualmente, controla mais que uma fatia desprezível de de computador. Diversos componentes desenvolvidos separadamente contri­
toda a Internet. A rede subjacente tornou-se tão distribuída, descentralizada e buem para o funcionamento de um sistema que é muito mais que a soma de
localmente protegida que mesmo uma tarefa tão simples como a produção de suas partes. Por essa razão, os pesquisadores da Internet se tornam cada vez
um mapa central se revela praticamente inexequível. mais exploradores, e não designers. Assemelham-se aos biólogos ou ecologistas
que se acham diante de um sistema incrivelmente complexo que, para todos os
efeitos práticos, existe independentemente deles. Mas o mistério é um pouco
mais profundo do que isso. Enquanto os biólogos levaram décadas imaginando
3. como são as proteínas e como interagem entre si, todos os detalhes concernen­
tes aos compoenentes da Internet estão plenamente disponíveis para o tomó­
Há importantes razões práticas para tentar obter um mapa global da Inter­ grafo da Internet. O que nem os cientistas da computação nem os biólogos
net. Sem conhecer a topologia da Internet, é impossível projetar ferramentas e sabem é como a estrutura de larga escala emerge quando se dá o acoplamento
serviços de maneira mais adequada. Os atuais protocolos da Internet foram das partes.
desenvolvidos com uma pe_quena rede e segundo tecnologias e necessidades que
se tinha em mente na década de 1970. À medida que a rede cresceu e surgiram
novas aplicações, esses protocolos geralmente ficaram aquém de nossas expec­
tativas. De fato, boa parte do uso atual da Internet era inimaginável por aqueles 4.
que projetaram a infraestrutura básica ainda vigente hoje em dia. Por exemplo,
o e-mail surgiu quando um hacker aventureiro, Rag Tomlinson, trabalhando na Vern Paxon e Sally Floyd, cientistas da computação do International Com­
BBN, pequena firma de consultoria de Cambridge, Massachusetts, imaginou puter Science Institute Center for Internet Research, em Berkeley, na Califórnia,
como modificar os protocolos de transferência de arquivo para transmitir men­ em um trabalho influente e bastante citado, de 1997, identificaram nosso limi­
sagens de correio. Durante muito tempo, Tomlinson manteve silêncio sobre sua tado conhecimento da topologia de rede como o principal obstáculo para uma
importante descoberta. Quando a revelou pela primeira vez a um de seus cole­ melhor compreensão da Internet como um todo. Dois anos mais tarde, três
gas, ele o advertiu: "Não conte a ninguém! Não é nisso que deveríamos estar irmãos, cientistas gregos da computação, Michalis Faloutsos, da Universidade
trabalhando". Mas o e-mail acabou vindo a público e se tornou uma das aplica­ da Califórnia-Riverside, Petros Faloutsos, da Universidade de Toronto, e Chris­
ções dominantes da primeira Internet. tos Faloutsos, da Carnegie Mellon University, fizeram uma descoberta surpreen­
dente. Verificaram que a distribuição de conectividade dos roteadores da Inter-

134 135
net obedece a um.a lei de potência. Em seu trabalho original, On Power-Law Corno se deve ter notado, a Internet segue o clássico cenário de uma rede
Relationship of the Internet Topology, mostraram que a Internet, uma coleção de em crescimento. Hoje, duas décadas depois, continua a se expandir nó a nó -
roteadores conectados por várias 1inhas físicas, é urna rede sem escala. Sua des­ condição primeira e necessária para a emergência de uma topologia sem escala.
coberta comportava urna mensagem simples que logo se difundiu pela comuni­ A conexão preferencial, condição segunda, contudo, é mais sutil. Por que
dade de pesquisa: todas as ferramentas utilizadas para modelar a estrutura da alguém conectaria seu computador a um roteador qualquer que não o mais pró­
Internet antes de 1999, com base em ideias calcadas em redes randôrnicas, esta­ ximo? Afinal, sai mais caro instalar um cabo de comprimento maior.
vam simplesmente equivocadas. Revelou-se que a extensão do cabo não representa o fator limitador deter­
Os irmãos Faloutsos não tinham conhecimento das descobertas paralelas minante do crescimento ou da estagnação da Internet. Quando uma instituição
das leis de potência na topologia da Web. De par com esses desenvolvimentos, a decide conectar seus computadores à Internet, só tem um parâmetro em mente:
descoberta deles revestiu novo siginificado, retirando a Internet do mundo das o custo de comunicação. Considerando a largura de banda, a medida de quan­
redes randômicas e inserindo-a na colorida fauna das topologias sem escala. tos bits uma conexão pode transmitir por segundo, o nó mais próximo, em
Isso era bastante inesperado. Afinal, a Internet é composta de linhas físicas e de geral, não é a melhor escolha. Percorrendo poucos quilômetros a mais, é possí­
roteadores. É totalmente hardware. Como essas dispendiosas conexões de cobre vel conseguir acesso a roteadores mais rápidos.
pesado podem obedecer às mesmas regras que os humanos quando estabelecem Os roteadores que oferecem mais largura de banda provavelmente tam­
contatos sociais amenos ou adicionam URLs a suas Webpages? bém possuem mais links. Logo, quando se trata de conseguir um ponto bom
para conectar-se, os engenheiros de rede inevitavelmente tendem a preferir
pontos de acesso mais fortemente conectados. Esse simples efeito é uma possí­
5. vel fonte de conexão preferencial. Não sabemos ao certo se é a única, mas a
conexão preferencial está inquestionavelmente presente na Internet. Isso foi
demonstrado pela primeira vez por Soon-Hyung Yook e Hawoong Jeong,
Em outubro de 1969, Charley Kline recebeu a incumbência de inserir a pri­
ambos trabalhando em meu grupo de pesquisa, quando compararam mapas da
meira mensagem de computador para computador através de uma linha tele­
Internet registrados em vários intervalos temporais de meses. Mapeando corno a
fônica comum. Trabalhando como programador no laboratório da UCLA de Leo­
Internet cresce nó a nó, descobriram evidência quantitativa de que nós ricos em
nard Kleinrock, ele fazia parte de um projeto que tentava conexão com o outro
links adquirem mais links do que nós que possuem apenas alguns links.
único nó de Internet existente, localizado na Universidade de Stanford. Estabe­
Crescimento e conexão preferencial deveriam ser fatores suficientes para
lecida a conexão, Kline digitou "login". Digitou l e obteve o eco de Stanford con­
explicar a topologia sem escala descoberta pelos irmãos Faloutsos. Na Internet,
firmando que a carta havia sido recebida. Digitou o o e novamente recebeu o
porém, a situação é um tanto mais complicada. Inegavelmente, é mais di,spen­
eco correspondente. Em seguida, tentou o g. Mas era muita informação para um
dioso instalar dois quilômetros de cabo óptico do que meio. Devemos levar em
sistema tão novo assimilar, e o computador desligou, derrubando a conexão.
consideração também que os nós não aparecem aleatoriamente no mapa. Os
A conexão foi rapidamente refeita, e depois que os nós da UCLA e de
roteadores são adicionados onde há demanda deles, e demanda depende do
Stanford foram firmemente estabelecidos, muitos outros se juntaram. Segundo
número de pessoas que esperam usar a Internet. Por conseguinte, há intensa
John Naughton, autor de A Brief History of the Future, a Universidade da Califór­
correlação entre densidade populacional e densidade nodal da Internet. A distri­
nia-Santa Bárbara e a Universidade de Utah conseguiram o terceiro e o quarto
buição de roteadores no mapa da América do Norte forma um conjunto fractal,
nós em novembro e dezembro de 1969, respectivamente. O quinto foi entregue
objeto matemático autossirnilar descoberto na década de 1970 por Benoit Man­
à BBN, empresa de consultoria de Massachusetts, no começo de 1970, com o
delbrot. Portanto, quando tentamos modelar a Internet, devemos simultanea­
primeiro circuito transversal do país - uma segunda linha conectando os equi­
mente reconhecer a interação entre crescimento, conexão preferencial, distância
pamentos em Los Angeles à BBN em Boston. No verão de 1970, aproximada­
de dependência, bem como uma estrutura fractal subjacente.
mente, os nós seis, sete, oito e nove haviam sido instalados no MIT, na Rand, na
Cada urna dessas forças isoladamente, se levadas ao extremo, poderia
System Development Corporation e em Havard. Por volta do final de 1971, a
destruir a topologia sem escala. Por exemplo, se o comprimento da fiação fosse
Internet consistia em 15 nós; no final de 1972, mais ou menos, em 37. Corno
a principal consideração quando decidimos onde nos conectar, a rede resultante
diz Naughton, "o sistema começava a abrir suas asas - ou, para quem é supersti­
teria uma distribuição de grau exponencial, desenvolvendo uma topologia bas­
cioso, seus tentáculos".
tante similar à do sistema rodoviário. Mas o surpreendente aqui é que esses

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mecanismos coexistem em delicado equilíbrio recíproco, assegurando a existên­ ter acesso à infraestrutura. Durante muitos anos, os Estados Unidos se recusa­
cia de uma Internet sem escala. Esse mesmo equilibrio de poder é o próprio cal­ ram a partilhar a tecnologia com países considerados inimigos. Vivenciei essa
canhar de aquiles da Internet. situação quando a odiosa lista do Cocom oficialmente excluiu a Hungria até a
queda do Muro de Berlim. A Internet, porém, era contagiosa demais para que se
pudesse contê-la mediante barreiras artificiais. Graças à ingenuidade dos gesto­
res locais do sistema, diversas universidades do Leste Europeu se comunicavam
6. regularmente via e-mail com seus colegas da Europa Ocidental, muito antes da
eliminação das restrições. Hoje, praticamente qualquer país do mundo está
MAI Network Services, pequeno provedor de serviço de Internet sediado conectado à Internet. Essa política de acesso irrestrito também comportava ris­
em McLean, Virginia, possui diversos roteadores de Internet de alta velocidade cos e vulnerabilidades inesperados, cada vez mais ameaçadores para nosso
conectados às gigantescas redes da Sprint e da UUNet. Na manhã da sexta-feira mundo Ínterconectado.
de 25 de abril de 1997, MAI liberou uma tabela de roteamento atualizada para Um dos nós mais ocupados dos Estados Unidos, de propriedade da AT&T,
seus roteadores. Os roteadores despachavam os pacotes que recebiam para seu é uma instalação subterrânea altamente vigiada em Schaumburg, Illinois,
destino, conforme o endereço constante da tabela de roteamento. Essas tabelas subúrbio de Chicago. Esse e diversos outros nós-chave igualmente bem protegi­
de roteamento são os mapas rodoviários da Internet. Como a topologia da rede dos transmitem uma falsa sensação de segurança de qúe a Internet não é vulne­
muda constantemente, as tabelas de roteamento também são periodicamente rável a ataques intencionais. Mas a interação que cada vez se compreende
atualizadas. Às 8h30 da manhã, a MAI divulgou a informação de roteamento melhor entre a arquitetura de rede e os protocolos revela uma outra configura­
atualizada para seus próprios roteadores. Por causa de uma configuração incor­ ção. Na realidade, alguns crackers bem treinados poderiam destruir a rede em
reta, a atualização não se restringiu ao âmbito da MAI, mas fugiu do controle e 30 minutos a partir de qualquer ponto do mundo. Há muitas formas de lançar
reescreveu as tabelas de roteamento de grande número de roteadores da Sprint um ataque dessa .natureza, da pane dos computadores que operacionalizam
e da UUNet. Ela os instruiu a direcionar todo o tráfego para diversos roteadores diversos roteadores essenciais à deflagração de ataques de negação de serviço
da MAI. contra os nós mais carregados. O verme Código Vermelho, que se alastrou como
Foi como observar o rompimento de um dique, cujas águas destruíram um vírus e infectou centenas de milhares de computadores em todo o mundo no
tudo em seu caminho. Horrorizada, a MAI viu todo o tráfego da Internet ser verão de 2001, constitui bom exemplo de tecnologia que poderia levar a cabo
abruptamente redirecionado a ela. Como nunca fora capaz de manejar sequer essa modalidade de destruição. À primeira vista, parecia um vírus inofensivo,
uma partícula desse fluxo, a MAI tomou-se um buraco negro, absorvendo paco­ pois não infligia danos a seu hospedeiro. Entretanto, inativo por alguns dias, ele
tes a uma taxa inacreditável. Quarenta e cinco minutos depois, a companhia subitamente transformava em zumbis todos os computadores infectados, ao
viu-se obrigada a se desconectar para conter os prejuízos. Nesse ínterim, os pro­ mesmo tempo que direcionava o tráfego para o domínio whitehouse.gov. O
vedores de Internet viam todo o seu tráfego ser tragado pelo buraco negro Código Vermelho foi apenas uma demonstração de prova de princípio do que
aberto pelo erro de reconfiguração. A Sprint só se recuperou depois que alterou são capazes os vírus automatizados. Versões mais sofisticadas poderiam acarre­
manualmente todas as tabelas de roteamento que possuía, a exemplo do que tar prejuízos incomparáveis. O comprometimento de alguns nós fundamentais
fizeram muitos dos grandes e pequenos provedores afetados pelo problema. não seria suficiente para desintegrar a rede, mas as falhas em cascata de outros
Graças à rápida solução e à relativa menoridade da Internet, o incidente roteadores resultantes do redirecionamento do tráfego para nós menores con­
passou despercebido para o mundo. Mas deu uma vívida demonstração da rapi­ cluiriam o trabalho.
dez com que os erros se propagam na rede: minutos depois de sua liberação, a A maioria dos crackers ou hackers que possuem know-how não teria inte­
tabela de roteamento mal configurada já fazia parte de grandes redes, desenca­ resse em desativar toda a Internet. Um ataque bem-sucedido à rede acabaria
deando um clássico exemplo de falha em cascata. com seus jogos favoritos, negando-lhes também acesso à rede. Por essa razão,
Paul Baran tinha em mente uma ameaça muito concreta quando concebeu uma ação em larga escala tendo por alvo a Internet como um todo nunca seria
o protótipo da Internet. Anteviu ogivas nucleares soviéticas atingindo órgãos de obra de verdadeiros hackers, mas poderia ser facilmente o objetivo de terroristas
inteligência e instalações militares, acarretando potencialmente perda total de e elementos nocivos à nação. A compreensão da topologia da Internet nos aju­
informação e comunicação. Nem ele nem os pioneiros da Internet consideraram dará a protegê-la.
a possibilidade de que um dia pessoas de qualquer parte do mundo pudessem

138 139
7. O envio de uma mensagem pela Internet é um sofisticado processo regu­
lado por estratos de complexos protocolos. Por exemplo, quando clicamos uma
Em 30 de agosto de 2001, a National Public Radio levou ao ar um trecho URL para ver uma Webpage, nossa solicitação é atomizada em pequenos pacotes
de cinco minutos de nossa pesquisa mais recente, publicada no mesmo dia pela que são, então, transportados para o computador pertencente à Webpage. Lá, a
revista britânica Natu.re. Não era a primeira vez que nosso trabalho recebia des­ solicitação é reconstituída e interpretada, levando o computador remoto a nos
taque na mídia. Mas na manhã seguinte, ao verificar com espanto e increduli­ enviar o documento da Web solicitado. Assim, uma tarefa aparentemente sim­
dade o mostrador do Website do projeto registrando mais de 10 mil mensagens pes como clicar uma URL envolve uma gama significativa de atividades compu­
da noite para o dia, percebi que tudo seria um pouco diferente desta vez. Minha tacionais para sua execução. A computação parasitária explora essa instalação
caixa de e-mails recebera uma avalanche de mensagens. A maioria positiva. Mas obrigando os computadores a executar a computação ao comando de um hospe­
algumas eram de conteúdo assustador. "Fique longe do meu computador!", deiro mestre, simplesmente envolvendo os computadores na comunicação. Para
escreveu um funcionário sénior de uma empresa desenvolvedora de programas tanto, dissimulamos complexos problemas computacionais como legítimas soli­
de repressão. ''Eu detestaria ver outro sujeito da CompSci do Leste Europeu citações de Internet. Quando recebe um pacote, o computador faz uma checa­
encarcerado pelo governo federal dos Estados Unidos", dizia uma outra mensa­
gem de rotina para garantir que o pacote não foi corrompido durante o per­
gem menos que amistosa, recordando-me da recente prisão de um hacker russo
curso. Ao fazer a contagem, ele resolveu um problema de nosso interesse,
pelas autoridades americanas. "Peço que nos assegure que nenhum computador
de nossas redes foi ou está sendo visado por esse programa", escreveu o CEO de codificado no pacote.
uma empresa norueguesa. "Recordo-lhe que o uso não autôrizado de recursos A implementação que fizemos da computação parasitária demonstrou que
localizados nesses endereços IP é ilegal e pode ensejar processo judicial e pleito podemos servilizar computadores localizados a milhares de quilômetros de dis­
indenizatório." Como um trabalho de pesquisa direcionado ao público acadê­ tância, obrigando-os a executar computação em nosso benefício. Essa vulnerabi­
mico e publicado por um dos mais prestigiosos jornais científicos pudera provo­ lidade fundamental da Internet suscitou uma série de questões computacionais,
car tamanha fúria e reação imediata? éticas e jurídicas. E se alguém aprimorasse o método, tornando-o eficiente, e
James McAdms, chefe do Departamento de Governo e de Estudos Interna­ passasse a utilizá-lo em larga escala? Quem domina as fontes disponibilizadas a
cionais de Notre Dame, teve uma grande ideia no começo de 2000. Reuniu sete qualquer pessoa através da Internet? Poderia isso assinalar o nascimento do
professores de diferentes departamentos, inclusive os de economia, física, direi­ computador Internet? Haverá um novo ser inteligente ao final dessa estrada?
to, química, engenharia, ciência da computação e línguas asiáticas, para discu­ Levada ao extremo, a computação parasitária sugere que, no futuro, os
tir, em ambiente informal, o impacto da Internet sobre tudo, da democracia à computadores poderão intercambiar informações e serviços segundo as necessi­
educação. Reunindo-nos uma vez por mês para almoço ou café, alternáva­ dades. Agora, .a comunicação no interior de um chip são ordens de magnitude
mo-nos discutindo tópicos e distribuindo material de leitura sobre temas que mais rápida do que a comunicação através da Internet. Com a comunicaçã9 de.
iam do direito cibernético aos movimentos sociais na Web. Durante um dos en­ banda larga em livre curso, o fosso se estreitará. Muito em breve fará todo sen­
contros no café da manhã, o cientista da computação Jay Broclanan comentou tido pedir que outros computadores "chipem" seus recursos ociosos para resol­
que a Web era um computador, metaforicamente falando. Seu comentário me ver complexos problemas que não podem ser equacionados por um único pes­
deixou perplexo. Certamente, a Internet é formada por computadores que po­ quisador ou grupo de pesquisa. Em Úm.a escala menor, essa. possibilidade já vem
dem intercambiar Webpages e mensagens de correio eletrônico. Mas essa comu­ sendo explorada pela SETl@home, projeto baseado em Berkeley que canaliza o
nicação limitada, direcionada ao usuário, ainda não torna a Web um único tempo ocioso de milhões de PCs para pesquisar inteligência extraterrestre.
computador. O modelo SETI -requer colaboração voluntária. A maioria das pessoas, no
Poderíamos fazer algo para mudar essa situação? Poderíamos fazer os entanto, é indolente demais para engajar-se. Se, contudo, os protocolos que pos­
computadores se direcionar a atividades recíprocas? Para começar, poderia eu sibilitam o intercâmbio de serviços e informações se tornarem a norma, vastos
obrigar qualquer computador externo a fazer computação em meu benefício?
recursos ociosos poderão ser canalizados. No decorrer do processo, a Internet
Essa agora era uma questão interessante que eu estava disposto a discutir. Ter­
minamos formando um pequeno grupo para tentar abordá-la. Vincent Freeh, poderá vir a tornar-se independente de supervisão humana, pois poderá direcio­
especialista em protocolos da Internet, e Hawoong Jeong, meu colaborador de nar boa parte das informações e recursos de que necessita para resolver proble­
longa data, logo se juntaram a mim e a Broclanan. Após muitas discussões e mas específicos. Isso também poderá ter impacto imprevisto sobre a topologia
tutoriais sobre como os computadores se comunicam, surgiu uma ideia simples, da Internet, conferindo à auto-organização um papel cada vez mais proemi­
mas controvertida: computação parasitária. nente. Posso imaginar uma época em que, depois de obter de um browser a

140 141
solução para um problema, nem o leitor nem seu computador saberão ao certo
de onde partiu essa resposta. Afinal, sabe o leitor onde se armazena a letra A no DÉCIMA SEGUNDA CONEXÃO
cérebro?

Rede Fragmentada
8.
Nossa pele é um componente extraordinário de engenharia. Consegue ava­
liar e sentir as mudanças de temperatura e o movimento do ar; dimensionar os
objetos e identificar seu formato. Executa todas essas tarefas com o auxílio de
inúmeros sensores químicos minúsculos e integrados que se comunicam entre si
através do sistema nervoso. Como observou Neil Gràss, na BusinessWeek, uma
pele de sensibilidade semelhante recobre a Terra agora. Milhões de dispositivos
de avaliação, incluindo câmeras, microfones, termostatos e medidores de tem­
peratura, sensores de luz e tráfego, bem como detectores de poluição, pululam
por toda parte, alimentando informações em computadores cada vez mais rápi­ Escritores de ficção científica e visionários cujos livros consumia quando
dos e sofisticados. Os especialistas preveem que por volta de 2010 haverá apro­ criança fizeram-me acreditar que, mais ou menos na virada do século, robôs de
ximadamente 10 mil equipamentos telemétricos para cada ser humano no pla­ aparência humana executariam todas as tarefas corriqueiras. Chegamos ao novo
neta. Esse número não é particularmente significativo em si mesmo - há muito milênio, no entanto, e esses humildes servos ainda não marcaram presença. Tal­
convivemos com os sensores, das câmeras de vigilância nos supermercados aos vez t�nham chegado discretamente. Não têm o brilho dourado do sempre preo­
detectores de carro embutidos no chão, passando pelos semáforos nos cruza­ cupado C-3PO, nem reproduzem o alegre assobio do R2-D2. Sabiamente, evi­
mentos de vias. A novidade é que, pela primeira vez, essa profusão de sensores tam partilhar conosco o adensado espaço euclidiano onde o preço dos imóveis
alimenta informações em um único sistema· integrado. Muito em breve haverá está inflacionado. Os robôs do século XX são invisíveis e imateriais. Foram resi­
mais de 3 bilhões de telefones celulares conectados à Internet e quase 16 dir no mundo virtual, que lhes permite saltar, com invejável facilidade, de conti­
bilhões de computadores integrados a ela, embutidos em toda uma gama de nente em continente. Se olharmos para a tela do nosso computador, não vere­
objetos, de torradeiras a designs de moda. Os minúsculos sensores dessa epi­ mos esses robôs. Entretanto, se reservarmos tempo para verificar
derme planetária espionarão tudo, do meio ambiente a nossas rodovias e cor­ cuidadosamente os arquivos log do computador, que guardam os registros deta­
pos. O mais importante, contudo, é que estarão todos conectados. Nosso planeta lhados de quem visita nossas Webpages, poderemos flagrá-los em ação. Veremos
está evoluindo no sentido dé um único computador formado por bilhões de pro­ esses robôs executando, incansavelmente, uma das mais ingratas e tediosas
cessadores e sensores interconectados. A questão que muitos se perguntam é: tarefas que a humanidade já inventou: a leitura e indexação de milhões
quando esse computador se tornará autoconsciente? Quando uma máquina pen­ Webpages.
sante; com ordens de magnitude mais rápidas do que um cérebro humano, Concebidos para desempenhar tarefas com velocidade e eficiência, esses
emergirá espontaneamente de bilhões de módulos interconectados? robôs - os carros esportivos da Web - rapidamente percorrem os links, rastre­
É impossível prever quando a Internet se tornará autoconsciente, mas é ando simplesmente tudo o que encontram. Quando esses guerreiros de estrada
notório que ela já tem vida própria. Cresce e desenvolve-se a uma taxa sem pre­ ofuscaram o pequeno besouro que Hawoong Jeong construíra para mapear a
cedente, obedecendo às mesmas leis de que se utiliza a natureza para tecer suas Web, realmente senti orgulho dele. Era como o primeiro carro usado que se
próprias teias. De fato, ela revela muitas similitudes com os organismos reais. podia produzir. E se chocava quase todo dia, muitas vezes entrando em fria por
Exatamente como os milhões de reações que ocorrem no interior da célula, os trazer inadvertidamente Webpages protegidas por arquivos de exclusão de robô.
terabytes de informação trafegam diariamente por seus links. O surpreendente é Logo se evidenciou que o mapeamento da Web como um todo era sonho
que algumas dessas informações são de difícil localização. Esse tópico nos que extrapolava as capacidades de nossa pequena ferramenta. Rápida e
remete a uma outra rede: a Web. disfarçadamente, porém, conseguiu trazer cerca de 300 mil Webpages, o sufici-

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ente para que descobríssemos a existência de redes sem escala. Desativamo-la lista de documentos. Na realidade, as listas retornadas por diferentes ferramen­
nesse ponto - talvez prematuramente. Se tivéssemos prosseguido e deixado que tas de busca raramente são idênticas. Mas sempre há uma sobreposição signifi­
coletasse uma amostra maior da Web, poderíamos ter descoberto outras caracte­ cativa. Por exemplo, dos mil documentos que contêm a palavra cristal encontra­
rísticas das redes complexas não muito evidentes a partir de uma amostra de dos pelo AltaVista, 343 também estavam na lista do HotBot. Dividindo-se o
menor tamanho. Mecanismos de busca veem uma parcela muito maior da Web número de documentos sobrepostos pelo número de documentos retornados
do que conseguimos no decurso de nossos experimentos. Analisando essas gran­ pelo AltaVista, tem-se a parcela da Web que o HotBot abrange. Como o HotBot
des amostras, os pesquisadores têm feito descobertas fascinantes. Descobriram declaradamente indexou 1 10 milhões de páginas em dezembro de 1997, o
que a Web é fragmentada em continentes e comunidades, limitando e determi­ grupo do NEC estimou que a Web tivesse aproximadamente 110/0,343 milhão,
nando nosso comportamento no universo on-line. Paradoxalmente, os pesquisa­ ou aproximadamente 320 milhões de documentos na mesma época. Hoje, esse
dores também nos informam de que nela há terra ignota, continentes inteiros número pode não parecer tão grande. Em 1997, contudo, isso era pelo menos
da Web nunca visitados ou avistados por robôs. O mais importante é que desco­ duas vezes a melhor estimativa corrente acerca do tamanho da Web.
brimos que a estrutura da Web impacta tudo, do surfe à democracia. Antes de 1998, acreditávamos em tudo o que as ferramentas de busca nos
diziam sobre o tamanho da Web. Afinal, elas deveriam saber. O estudo pionei­
ro de Lawrence e Giles tornou a Web um objeto de investigação científica - um
objeto que podia e devia ser estudado por meio de métodos sistemáticos e
1. reprodutíveis. Mas suas descobertas acerca da capacidade das ferramentas de
pesquisa para mapear a Web foram pouco alentadoras.
Há alguns anos, achávamos que conhecíamos tudo o que havia por conhe­
cer acerca da Web. Era comum ouvir comentários do tipo: "Se não conseguiu
encontrar com a ajuda, do AltaVista, então provavelmente não tem" ou "HotBot
é o primeiro robô de busca capaz de indexar e pesquisar toda a Web". Acreditá­
2.
vamos que as ferramentas de busca vasculhavam e nos colocavam toda a Web à
disposição. Isso mudou de uma hora para outra em abril de 1998. "Preferimos De acordo com o estudo do NEC em · 1997, o HotBot coligiu o maior
indexar sites de qualidade a indexar uma quantidade maior de sites" foi a nova número de documentos, distinguindo-se como a ferramenta de busca de maior
tirada do porta-voz de uma importante ferramenta de busca. Outros foram mais cobertura. Foi uma grande notícia para a companhia. David Pritchard, diretor
longe, alegando que "não valia a pena indexar muitas páginas". Que havia acon­ de marketing do HotBot, orgulhosamente reconheceu: "Somos o maior índex da
tecido? Essa mudança de humor fora provocada por um trabalho de pesquisa rede - não há surpresas para nós nesse relatório". Bem, havia algumas. A má
publicado em 3 de abril de 1998 no jornal Science. Suas três páginas alteraram notícia era que o HotBot abrangia apenas 34% de toda a Web. Ou seja, 66% de
completamente nossas percepções acerca da acessibilidade da informação arma­ todas as páginas da Web não eram vistas por ele. AltaVista, a ferramenta de
zenada na Web. busca mais popular naquela época, era o segundo na lista porque seus robôs
Steve Lawrence e Lee Giles nunca planejaram minar a credibilidade das vasculhavam apenas 28%. Algumas ferramentas de busca, co.mo Lycos, haviam
ferramentas de pesquisa. Trabalhando no NEC Research Institute, em Princeton, capturado uma ínfima parcela de 2%. Sua reação era previsível: "Francamente,
Nova Jersey, eles estavam interessados em aprendizado de máquina, um revolu­ não acredito muito nesse tipo de relatório. Nosso foco não é a quantidade, e sim
cionário subcampo da ciência da computação. Construíram uma ferramenta de a qualidade", declarou Rajive Mathur, gerente de produto sênior da Lycos Inc.
metapesquisa, um robô chamado Inquiros, capaz de investigar, em cada ferra­ Poder-se-ia pensar que o estudo do NEC levara as ferramentas de busca a
menta çl.e busca importante, documentos correspondentes a determinada con­ incrementar sua cobertura. Não levou. Um ano mais tarde, em fevereiro de
sulta. No meio do caminho, perceberam que seu robô tinha capacidade de fazer 1999, Lawrence e Giles repetiram suas avaliações e descobriram que o tamanho
mais do que o originalmente programado: podia ajudá-los a estimar o tamanho da Web mais que duplicara alcançando 800 milhões de documentos, mas as fer­
da Web. ramentas de busca não acompanharam esse crescimento. De fato, sua cobertura
O Inquirus vasculhava diversas ferramentas de busca para listar todos os até se reduzira. Nessa época, a Northern Light era a líder, abrangendo meros
documentos que contivessem uma dada palavra, por exemplo, cristal. Se qual­ 16% da Web. HotBot e AltaVista haviam perdido terreno significativo: sua
quer ferramenta de busca visitar e indexar toda a Web, deverá retornar a mesma cobertura decrescera para 1 1o/o e 15%, respectivamente. O Google indexava

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apenas 7,8% dos 800 milhões de páginas estimadas. Tomadas em conjunto, em 3.
1999 as ferramentas de busca cobriam aproximadamente 40% de toda a Web.
Isso significa que seis de cada dez páginas relevantes para nossa consulta nunca
r:tomariam por qualquer ferramenta de busca. Simplesmente, nunca seriam Apesar do bilhão de documentos existentes na Web, 1 9 graus de separação
vistas. sugerem que a Web é facilmente navegável. Grande, porém pequena. Mas o
Por fim, o estudo do NEC desencadeou uma acirrada competição entre as mundo pequeno que se esconde por trás da Web é um pouco enganoso. Decerto,
ferramentas de busca. De uma hora para outra, tamanho passou a importar. se há um caminho entre dois documentos, este geralmente é curto. Mas, na rea­
Deflagrou-se uma guerra pelo poder entre AltaVista e a nova ferramenta de lidade, nem todas as páginas podem ser interconectadas. Partindo de uma
busca operacionalizada pela FAST (Fast Search & Transfer), cujo endereço, all­ página qualquer, só conseguimos acessar cerca de 24% de todos os documentos.
theweb.com, deixa pouca margem à ambiguidade em relação ao objetivo da O restante escapa ao nosso alcance, sendo inacessível à navegação.
companhia. Em janeiro de 2000, alltheweb.com rompeu a barreira dos 300 Essa é uma consequência de, por diversas razões técnicas, os links da Web
milhões de páginas. AltaVista vinha na cola. Por volta de junho de 2000 a nova .serem direcionados. Em outras palavras, ao longo de um dado URL, podemos
sensação, o Google, tomara-se um sério concorrente, rompendo a marc; de 500 trafegar apenas em uma direção. Se não há nenhum link direto entre dois nós
milhões de páginas. Inktomi logo galgou esse patamar, e assim 0 fez um outro em uma rede direcionada, pode-se conectá-los através de outros nós: por exeD1-
iniciante, o WebTop.com. Em junho de 2001, o Google bateu novo recorde, plo, se quisermos ir de A a D, poderemos partir do nó A, passar ao nó B, que
alcançando pela primeira vez a cobertura mágica de 1 bilhão de documentos. tem um link para o nó C, que aponta para o nó D. Mas não é possível percorrer
Desde essa época, o Google mantém a liderança. Alltheweb.com, perse­ o sentido inverso. Em uma rede não direcionada, na qual se pode seguir um link
guindo seu sonho de finalmente mapear toda a Web, vem em segundo lugar, em ambas as direções, um trajeto A ➔ B ➔ ·e ➔ D implica que o caminho mais
com mais de 600 milhões de documentos, seguido pelo AltaVista, com 550 curto de D para A é o percurso reverso D ➔ C ➔ B ➔ A. Em uma rede direcio­
milhões. As ferramentas de busca estão se saindo cada vez melhor. Essa é uma nada, contudo, não há garantia de que o caminho reverso exista. Muito prova­
grande notícia. Só existe um problema: a Web está crescendo cada vez mais velmente teríamos dé seguir uma rota diferente de volta: partindo de D, precisa­
rápido. ríamos visitar dezenas de nós intermediários antes de chegar a A. A Web é
Muitas das ferramentas de busca nem sequer tentam abarcar toda a Web. repleta desses caminhos direcionados de caráter disjuntivo. Fundamentalmente,
A razão é simples: a ferramenta de busca que tem a maioria dos documentos determinam a navegabilidade da Web.
n�? _é necessariamente a melhor. Decerto, se estivermos buscando informação Redes direcionadas não representam fundamentalmente uma nova classe
difícil de encontrar, a ferramenta de maior cobertura é nossa melhor aposta. de redes: independentemente de a rede ser sem escala ou randômica, os links
Entretanto, quando se trata de tópicos populares, um índex maior não necessa­ podem ser direciónados ou não direcionados. Até agora lidamos, na maioria dos
riamente oferece os melhores resultados. A maioria de nós já está farta dos casos, com links não direcionados. De fato, a maioria das redes, envolvendo de,
milhares de solicitações que os mecanismos de busca retomam em razão de redes de interação social à proteína, é não direcionada. Mas algumas delas,
simples consultas. Por isso, depois de certo ponto é mais vantajoso elevar o incluindo redes da Web às cadeias alimentares, possuem links direcionados.
algoritmo que seleciona a melhor página da já enorme base de dados da ferra­ Essa direcionalidade tem consequências para a topologia da rede. No contexto
menta de busca do que aprofundar-se na Web. da Web, tais consequências foram abordadas pela primeira vez por Andrei Bro­
Quando se trata de navegar na Web, quer como indivíduos, quer como der, do AltaVista, e seus colaboradores da IBM e da Compaq. Eles estudaram
robôs, as compensações econômicas (ou sua falta) não são as únicas limitações. uma amostra de 200 milhões de nós, quase metade de todas as Webpages exis­
A topologia da Web restringe nossa capacidade de ver tudo. A Web é uma rede tentes em 1999. As avaliações efetuadas por eles indicaram que a consequência
sem escala, dominada por hubs e nós com grande quantidade de links. Entre­ mais importante da direcionalidade é que a Web não constitui uma única rede
tanto, como veremos a seguir, essa topologia de larga escala coexiste com homogênea. Pelo contrário, fragmenta-se em quatro grandes continentes
numerosas estruturas de pequena escala que limitam seriamente o quanto se (Figura 12.1), cada um dos quais nos obriga a obedecer a diferentes normas de
pode explorar simplesmente clicando os links que aparecem pelo caminho. tráfego quando queremos navegar por eles.
O primeiro desses continentes contém cerca de um quarto de todas as
páginas da Web. Frequentemente chamado de núcleo central, abriga todos os
grandes sites da Web, do Yahoo! à CNN.corri.. Seu traço característico é ser facil-

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alcançados a partir do núcleo central, mas, uma vez abandonado o núcleo, não
há links para trazer-nos de volta. O território exterior é povoado pelos Websites
corporativos que podem ser facilmente acessados a partir de fora; entretanto,
uma vez em seu interior, não temos saída. O quarto continente é formado de
filamentos e ilhas desconectadas, grupos isolados de páginas interconectadas
que são inacessíveis a partir do núcleo central e não possuem links de volta para
ele. Alguns desses grupos isolados podem conter milhares de documentos Web.
Cerca de um quarto de todos os documentos Web se encontra nessas ilhas ou
filamentos. Em geral, a localização de uma Webpage na Web tem pouco a ver
com o conteúdo da página; pelo contrário, em larga medida é determinada por
sua relação, através de links de entrada e de saída, com outros documentos.
Esses quatro continentes limitam significativamente a navegabilidade da
Web. A extensão da navegação depende de nosso ponto de partida. Partindo de
um nó pertencente ao núcleo central, podemos acessar todas as páginas perten­
centes a esse importante continente. Independentemente de quanto tempo este­
jamos dispostos a cliclar, contudo, cerca de metade da Web ainda nos será invi­
sível, pois o território interior e as ilhas isoladas não podem ser alcançados a
partir do núcleo. Se partirmos desse núcleo em direção ao território exterior,
rapidamente chegaremos a uma rua sem saída. Se principiarmos nossa jornada
a partir de um filam�nto ou de uma ilha isolada, a Web parecerá muito pequena
Filamentos porque só os outros documentos na mesma ilha serão acessíveis. Se nossa Web­
page estiver em uma ilha, as ferramentas de busca jamais a descobrirão, a
Figura 12. 1. Os continentes de uma rede direcionada: redes direcionadas como a Web menos que lhes forneçamos nosso endereço URL.
naturalmente se fragmentam em diversos continentes facilmente identificáveis. No Por conseguinte, nossa capacidade de mapear a Web como um todo não é
núcleo central, cada nó pode ser alcançado a partir de qualquer outro nó. Nós situados apenas uma questão de recurso ou incentivo econômico. A direcionalidade dos
no continente interior são dispostos de forma que a sequência dos links finalmente nos links cria uma W�b bastante fragmentada, dominada por quatro grandes conti­
remete ao núcleo central, mas a partida do núcleo não nos permite regressar ao nentes. As ferramentas de busca conseguem mapear cerca de metade dela, o
continente interior. Em contraste, todos os nós situados no continente exterior podem componente conectado e o território exterior, pois os nós pertencentes a eles,
ser alcançados a partir do núcleo, mas, uma vez lá, não há links que levem de volta ao podem ser localizados a partir de qualquer nó do núcleo central frequentemente
núcleo. Por fim, tubos conectam diretamente os continentes interior e exterior; alguns visitado. Contudo, a outra metade da Web, formada pelas ilhas e pelo território
nós formam filamentos, ligados apenas aos continentes interior e exterior; e alguns interior, é irremediavelmente isolada. Por mais que tentem, os robôs jamais
poucos nós formam ilhas isoladas a que não se tem acesso a partir dos nós restantes. conseguirão encontrar os documentos ali situados. Essa é a razão pela qual a
maioria dos mecanismos de busca nos permite fornecer o endereço de nosso
Website. Nesse caso, poc;lem começar a rastrear a partir daí e potencialmente
mente navegável, pois existe um caminho entre dois documentos quaisquer per­ descobrir links com regiões da Web onde jamais estiveram. Se nos recusarmos a
tencentes a ele. Isso não significa que há um link direto entre dois nós quaisquer fornecer essa informação, muitos nós poderão continuar residindo em terra
do núcleo central. Pelo contrário, existe um caminho ao longo dos nós perten­ ignota por anos a fio.
centes ao núcleo que nos permite navegar entre dois nós quaisquer. Essa estrutura fragmentada veio para ficar? Ou a evolução e o crescimento
O segundo e o terceiro continentes, chamados interior e exterior, são tão da Web finalmente absorverão os quatro continentes em um único núcleo plena­
grandes quanto o núcleo central, embora mais difíceis de navegar. Partindo das mente conectado? A resposta é simples: enquanto os links permanecerem dire­
páginas do continente interior, pode-se alcançar o núcleo central, mas não há cionados, essa homogeneização jamais ocorrerá. Os continentes não são de
caminhos a partir do núcleo que nos levem de volta ao território interior. Em forma alguma uma propriedade peculiar à Web, visto que estão presentes em
contraste, os nós pertencentes ao continente exterior podem ser facilmente

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todas as redes direcionadas. Consideremos, por exemplo, uma rede crucial para on-line. Por conseguinte, os quatro continentes não são as únicas estruturas iso­
nossa capacidade de localizar informação científica: a rede de citações. Cada ladas da Web. Em uma escala menor, esses continentes são salpicados de
trabalho científico cita outros trabalhos relevantes para a obra em discussão. vibrantes vilarejos e metrópoles. São Websites irmanados por uma ideia de
Um trabalho de matemática poderia citar outros trabalhos de matemática que união, hobby ou hábitat, formando comunidades de interesses compartilhados.
enfocam problemas semelhantes ou, ocasionalmente, um trabalho de biologia Amantes do jazz formam uma comunidade bem definida na Web, como também
ou de física ilustrando as aplicações dos resultados obtidos. Dessa forma, todas os ornitólogos. Os fundamentalistas religiosos do Leste Europeu partilham
as publicações científicas fazem parte de uma rede científica na qual os nós são espaço virtual com seus congêneres ideológicos dos Estados Unidos. Os ativistas
publicações de pesquisa conectadas por citações. Esses links são direcionados. antiglobalização da Europa unem forças com seus pares do Japão para coorde­
De fato, seguindo as referências ao final deste livro, será possível encontrar os nar estratégias e atividades.
trabalhos citados. Não obstante, nenhum desses trabalhos poderia remeter o lei­ As comunidades são componentes essenciais da história social humana. Os
tor a este livro, pois não o citam. A rede de citações é uma rede direcionada círculos de amigos de Granovetter, os elementos construtivos básicos das comu-
muito peculiar, na qual os componentes internos e externos refletem a sucessão . nidades, apontavam para esse fato. Ultimamente, contudo, talvez sem o conhe­
histórica dos trabalhos e o componente central é minúsculo, se é que existe. A cimento de seus membros, essas comunidades estão cada vez mais registradas
natureza também contém algumas redes direcionadas. Nas cadeias alimentares, na topologia da Web. Um efeito colateral de nossa vida digital é que nossas
as espécies são conectadas por links que nos informam quais espécies alimen­ crenças e adesões são de domínio público. Toda vez que nos conectamos a uma
tam quais. Os links dessas redes raramente são de mão dupla: o leão come o página da Web, chancelamos sua relevância para nossa curiosidade intelectual.
antHope, e nunca vice-versa. Assim, os links de um entusiástico ornitólogo podem nos conduzir a outros sites
O essencial é que todas as redes fragmentam-se nos mesmos quatro conti­ de idêntica orientação da Web, o que nos permite mapear a comunidade dos
nentes. Sua existência não reflete quaisquer princípios organizacionais exclusi­ amantes da ornitologia.
vos da Web. Randômicas ou sem escala, se os links são direcionados, os conti­ A identificação dessas comunidades baseadas na Web tem um imenso
nentes estão lá. Isso foi demonstrado recentemente por Sergey Dorogovstev, potencial de aplicações. De fato, a localização da comunidade dos amantes de
José Mendes e A. N. Samukhin, da Universidade do Porto, em Portugal. Eles carros esportivos permitiria às montadoras comercializar seus novos modelos
mostraram que o tamanho e a estrutura desses continentes podem ser previstos com maior efetividade, mediante inserção de mensagens publicitárias em diver­
em termos analíticos. Obviamente, dependendo das propriedades particulares sos hubs dessa comunidade. Os ativistas antiaids podem utilizar o conhecimento
da rede, o tamanho relativo desses continentes varia. Entretanto, esses resulta­ da comunidade para mobilizar as pessoas que realmente se preocupam com a
dos indicam que, independentemente de quão complexa e grande venha a se doença, transformando-as em um efetivo grupo de lobby e ação. Os organizado­
tomar a Web, os continentes vieram para ficar. res de festivais étnicos poderiam aproveitar informações sobre as comunidades
étnicas baseadas na Web para divulgar eventos a realizar-se e incubar organiza- ·
ções populares locais. O problema é que há mais de 1 bilhão de páginas na rede.
Temos condições de localizar as comunidades em uma rede tão gigantesca?
4. Potter Stewart, juiz da Suprema Corte, fez uma célebre observação em
1964: "Hoje não tento definir [a obscenidade] ... e talvez nunca tenha conse­
Em junho de 2000, Cass Sustein, professor de direito da Universidade de guido fazê-lo de maneira inteligível. Mas conheço-a quando a vejo". Enfrenta­
Chicago, conduziu um levantamento de 60 sites políticos e verificou que apenas mos problemas semelhantes quando tentamos encontrar uma definição apro­
15% deles possuem links para sites que sustentam visões opostas. Em contraste, priada de "comunidades baseadas na Web". Todos nós as conhecemos quando
60% deles possuem links para Webpages que adotam a mesma linha ideológica. as vemos, mas todo mundo tem critérios ligeiramente diferentes para caracte­
Um estudo enfocando o discurso democrático na Web chegou à conclusão seme­ rizá-las. Uma razão para isso é que não existem fronteiras bem definidas entre
lhante: apenas cerca de 15% das Webpages oferecem links para pontos de vista diversas comunidades. Efetivamente, o mesmo Website pode pertencer simulta­
opostos. Sustein teme que, ao limitar o acesso a pontos de vista conflitantes, o neamente a diferentes grupos. Por exemplo, a Webpage de um físico pode mes­
univeso on-line emergente estimule a segregação e a fragmentação sociais. De clar links de física, música e alpinismo, combinando interesses profissionais e
fato, os mecanismos subjacentes ao isolamento social e político na Web são hobbies. Em qual comunidade devemos encaixar uma página desse tipo? O
autorreforçadores: alteram também a topologia da Web, segregando o universo tamanho das comunidades também varia bastante. Por exemplo, enquanto a

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comunidade dos aficionados de "criptografia" é pequena e relativamente fácil Longe de ser um mar homogêneo de nós e links, a Web se fragmenta em
de localizar, a comunidade dos amantes de "literatura inglesa" é mais difícil de quatro continentes, cada um dos quais hospeda inúmeras vilas e cidades que se
identificar, além de se fragmentar em diversas subcomunidades que vão dos afiguram como comunidades sobrepostas. Quem quer que se disponha a · assu­
admiradores de Shakespeare aos fãs de Kurt Vonnegut. mir presença virtual pertence a uma ou a muitas dessas comunidades. Certa­
Recentemente, Gary Flake, Steve Lawrence e Lee Giles, do NEC, sugeriram mente, estamos longe de entender por completo essa refinada estrutura da Web.
que os documentos pertencem à mesma comunidade se possuem mais links recí­ Muitas forças, porém, dos interesses comerciais à curiosidade científica, cada
procos do que documentos externos à comunidade. Essa definição é suficiente­ vez mais nos motivam a fazer o melhor nesse sentido. Quanto mais nos apro­
mente precisa para desenvolver algoritmos visando a identificar diferentes agru­ fundarmos, mais surpresas teremos, o que nos descortinará uma visão mais
pamentos, dada a topologia da Web. Evidencia-se, contudo, que é notoriamente clara desse universo on-line complexo, amorfo e sempre mutável.
difícil localizar tais comunidades. Esse tipo de pesquisa pertence à classe dos
chamados problemas NP completos, o que significa que, embora em princípio as
comunidades possam ser localizadas, não há nenhum algoritmo eficiente para a
realização dessa tarefa. Desse modo, a dificuldade de localizar comunidades na 5.
Web é semelhante à de resolver o problema de um caixeiro-viajante em trânsito
que nos pergunta qual o caminho mais curto para chegar a um certo número de Em 20 de novembro de 2000, em decisão sem precedente, o juiz Jean-Jac­
cidades, pressupondo que não nos é dado visitar a mesma cidade duas vezes. O ques Gomes, da França, determinou ao Yahoo! que negasse acesso dos consumi­
único algoritmo garantido que nos permite localizar comunidades ou traçar o dores franceses a qualquer de seus sites que comercializassem souvenirs nazis­
roteiro solicitado pelo caixeiro-viajante requer que tentemos todas as combina­ tas. A decisão se respaldou em uma lei francesa que proíbe a venda desses· itens
ções possíveis. No caso das comunidades, o tempo necessário para a busca na França. As implicações jurídicas da decisão da corte ainda são discutidas em
aumenta exponencialmente com o tamanho da Web. Se dispusermos de compu­ todo o mundo. O Yahoo! alegou em sua defesa que a Internet é essencialmente
tadores rápidos, conseguiremos localizar as comunidades em uma amostra de livr� em relação às restrições geográficas e nacionais e que sujeitar uma
centenas de documentos. Descobri-las, porém, em meio a 1 bilhão de Webpages empresa americana a leis de qualquer outro país caracterizava grave ofensa à
é algo que simplesmente não se cogita. filosofia basilar da Internet. Outros discordaram argumentando que não havia
Combinar conteúdo e topologia torna o problema menos desafiador. Por nada de particularmente novo em relação à Internet, que deve submeter-se aos
exemplo, podemos nos concentrar em documentos que contenham apenas uma mesmos acordos comerciais internacionais como qualquer outra corporação
ou duas palavras-chave. Lada Adamic, da Universidade de Stanford, investigou transnacional.
recentemente comunidades descobertas pela busca das expressões "aborto - Independentemente das ressonâncias jurídicas, a questão mais profund�
pró-escolha" e "aborto - pró-vida". A pesquisa "pró-vida" resultou em um núcleo diz respeito ao código - o software subjacente à Web. A corte francesa reconhe­
de 41 documentos em que era possível ir de uma página à outra. Em contrapar­ ceu que, considerando-se a natureza da Web, não há como manter a França de
tida, o movimento "pró-escolha" se fragmentava em diversos sites desco­ todo apartada do mundo. Os juízes, no entanto, foram persuadidos por especia­
nectados. listas que atestaram ser possível ao Yahoo! instalar um mecanismo de filtragem
Essas diferenças na estrutura de comunidades concorrentes acarretam con­ capaz de interceptar pelo menos 70% a 80% dos franceses no país que tentas­
sequências importantes no que tange à sua capacidade de barganhar e de orga­ sem acessar os sites nazistas do Yahoo! Dessa forma, a corte determinou ao
nizar-se em. prol de uma causa comum. Como observa Adamic, uma campanha Yahoo! que alterasse o · código. Esse é · exatamente o tipo de procedimento que
contra a lei do aborto por nascimento parcial deflagrada a partir do interior do Lawrence Lessig, professor de direito da Universidade de Stanford, vislumbrou
grupo pró-vida pode facilmente alcançar outros sites pró-vida, pois há muitos em seu influente livro Code and Other Laws of Cyberspace. Segundo ele, "deixado
links .entre eles. Além disso, em virtude dos links existentes nos sites pró-vida, os a si próprio, o ciberespaço tornar-se-á um perfeita ferramenta de controle ... A
visitantes dos sites pró-escolha também se inteirariam dela. Entretanto, seria mão invisível do ciberespaço está construindo uma arquitetura que é exata­
necessário chamar a atenção para diversos Websites pró-escolha desconectados mente o oposto do que era quando surgiu o ciberespaço".
a fim de que se pudesse realizar uma campanha igualmente eficiente contra a Lessig utiliza o termo "arquitetura" para se referir ao somatório dos soft­
lei. Logo, a comunidade pró-vida não só tem melhor presença na Web, como wares que rodam por trás da Web e conclui que a única forma de influenciar o
também é mais organizada - seus sites são mais informados entre si. comportamento no ciberespaço é regulando o código. O professor sugere que

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duas forças estão alinhadas justamente nesse sentido. Em primeiro lugar, os um link de entrada têm menos de 10% de chance de serem percebidos por
governos encontram dificuldades para policiar o comportamento na Web. É fácil alguma ferramenta de busca. Em contrapartida, os robôs encontram e indexam
criar leis que limitam o acesso a tudo, da pornografia às chaves dos códigos aproximadamente 90% das páginas que possuem de 21 a uma centena de links
criptográficos. Em um cibermundo sem fronteira, no entanto, é praticamente de entrada.
impossível assegurar o cumprimento dessas leis. Se os governos deixarem esca­ Lessig está certo: a arquitetura da Web controla praticamente tudo, do
par a oportunidade de regular a Web, o comércio irá lidar com isso. Empresas acesso aos consumidores à probabilidade de ser visitada navegando pelos links.
em busca de um ambiente de negócios mais seguro, em que possam identificar Mas a ciência da Web demonstra cada vez mais que essa arquitetura representa
consumidores para diversas finalidades, das preocupações com a segurança ao um nível mais elevado de organização do que o código. A capacidade de o leitor
marketing, impelirão o código no sentido do controle. Os netizens, os cidadãos encontrar minha Webpage é determinada por apenas um fator: sua posição na
da rede (citizens of the net), perderão completamente sua existência anônima e Web. Se muitas pessoas acharem minha página interessante e se conectarem
sem espaço à medida que a tecnologia se desenvolver para satisfazer suas aspi­ comigo, meu nó lentamente se tornará um pequeno hub, e as ferramentas de
rações de consumo. busca inevitavelmente o perceberão. Se todo mundo ignorar minha Webpage, as
Por um lado, como o caso do Yahoo! e outros têm demonstrado, algumas ferramentas de busca farão o mesmo. Integrarei as categorias dos Websites invi­
das mais sombrias previsões de Lessig vêm se tornando realidade. Por outro síveis, que, de qualquer forma, são a maioria. Portanto, a topologia de -larga
lado, para realmente entender o ciberespaço, temos de distinguir cuidadosa­ escala da Web - ou seja, sua verdadeira arquitetura - impõe limitações mais gra­
mente código de arquitetura. Código - ou software - é o tijolo e a argamassa do ves a nosso comportamento e visibilidade na Web do que o governo ou a indús­
ciberespaço. Arquitetura é o que construímos utilizando o código como tijolo. tria sequer poderia fazer retificando o código. As regulações vêm e vão, mas a
Os grandes arquitetos da história humana, de Michelangelo a Frank Lloyd topologia e as leis naturais fundamentais que a regulam são invariantes no
Wright, demonstraram que se as matérias-primas são limitadas, não o são as tempo. Enquanto continuarmos delegando ao indivíduo a escolha de onde
possibilidades arquitetônicas. O código pode restringir o comportamento, e isso conectar-se, não conseguiremos alterar significativamente a topologia de larga
realmente influencia a arquitetura, mas esta não é determinada unicamente escala da Web e teremos de arcar com as consequências.
pelo código.
A exemplo das construções dos arquitetos, a arquitetura da Web é produto
de dois substratos igualmente importantes: o código e as ações humanas coletivas
que se aproveitam do código. O primeiro pode ser igualmente regulado por tri­ 6.
bunais, governos e empresas. As segundas, contudo, não podem ser formatadas
por nenhum usuário ou instituição, porque a Web não tem um planejamento O grande acontecimento acerca da Web é que nossas Webpages amaq_ure­
central - é auto-organizada. Ela se desenvolve a partir das ações individuais de cem conosco. Uma vez alterada nossa página pessoal, ninguém será capaz de
milhões de ;t:isuários. C�mo resultado, sua arquitetura é muito mais rica do que nos impingir visões opostas que possamos ter defendido décadas antes. Você se
o somatório de suas partes. A maioria dos traços realmente importantes e das lembra daquele namorado com quem rompeu há alguns anos? Claro que se lem­
propriedades emergentes da Web deriva de sua topologia auto-organizada em bra, mas provavelmente espera que ninguém mais se lembre. Decerto, todas as
grande escala. fotografias dele saíram de sua Webpage. E aquele manifesto da época da facul­
Um bom exemplo é a democracia na Web. Vimos que topologia sem escala dade que ainda lhe causa embaraço? Ou aquela coleção de links com sites dos
significa que a maioria dos documentos dificilmente é visível, pois uma minoria Democratas que o leitor reuniu há apenas dois anos antes de imprimir a carteiri­
altamente popular detém todos os links. Sim, de fato dispomos de liberdade de nha dos Republicanos? São todos irrastreáveis. Pelo menos tendemos a pensar
expressão na Web. Há chances, contudo, de que nossas vozes, de tão débeis, se que sim. Isso porque os netizens nunca ouviram falar de Brewster Kahle. A ver­
tornem inaudíveis. Páginas que possuem poucos links de entrada são de impos­ dade é que Kahle poderia facilmente conseguir uma cópia de todas as fotos e
sível localização por navegação casual. Em vez disso, somos repetidamente leva­ documentos que o leitor tão cuidadosamente removeu de seu Website e dos
dos na direção dos hubs. É tentador acreditar que os robôs possam evitar essa quais já se esqueceu.
armadilha da popularidade. Eles podem, mas não o fazem. Em vez disso, a pro­ Inventor do servidor de informações em área expandida e fundador da
babilidade de que um documento seja indexado por uma ferramenta de busca Alexa Internet, uma das maiores ferramentas de busca, Kahle é veterano da
depende muito do número de seus links de entrada. Documentos com apenas Web. Depois de vender a Alexa para o Amazon.com em 1999, dedicou-se a criar

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o Internet Archive, organização sem fins lucrativos sediada em Presidio, base verso on-line. O Archive está longe de capturar tudo o que existe na rede. Seu
militar adaptada, localizada na cidade de São Francisco. Seu objetivo é simples: maior acervo advém do Alexa, a ferramenta de busca criada por Kahle e Bruce
evitar que o conteúdo da Internet desapareça no passado. Gilliat em 1996. Como sabemos, as ferramentas de busca cobrem apenas
Quando visitei o Archive para dar uma palestra no First Internet Archive pequena parcela da Web e o Alexa nunca se notabilizou por buscar uma co­
Workshop, em março de 2000, Kahle me lembrou da antiga biblioteca de Ale­ bertura significativa. Por conseguinte, a despeito de suas proporções gigantes­
xandria. Acredita-se que ela possuía um exemplar de todos os livros escritos no cas, o acervo atual do Archive representa tão-só uma minúscula fração da Web,
mundo antigo, os quais desapareceram quando pegou fogo. Ele me contou tam­ principalmente das Webpages populares. Alexa atingiu os hubs; o restante, a
bém acerca das grandes coleções cinematográficas que foram recicladas para maioria das páginas menos conectadas e ignoradas por seus robôs, foi relegado
seu conteúdo prata1 . Sem artefatos culturais, a humanidade não tem memória, ao esquecimento a uma taxa de milhões ao dia.
e sem memória não pode aprender com seus sucessos e seus fracassos. No caso
da Web, uma vez mais estamos deixando a história passar sem registro. Para
evitar que a história se repita, a criação de Kahle, o Internet Archive, preserva
cuidadosamente todos os documentos que Alexa rastreou desde 1996. O acervo 7.
já conta com 100 bilhões de Webpages, representando cerca de 100 terabytes de
informações. Comparativamente, para que se tenha uma ideia da magnitude de
seu acervo, todos os livros e documentos arquivados pela Biblioteca do Con­ Para um alienígena que se aproximasse do sistema solar, a Terra daria a
gresso representam apenas cerca de 20 terabytes. impressão de · ser nada mais que uma esfera. Aproximando-se mais, ele poderia
.O acervo do Archive é de valor incomparável tanto para historiadores e observar melhor os continentes. A iluminação ofuscante de Paris Nova York
cientistas sociais como para topógrafos da Web. Para escrever a história da elei­ Londres e Tóquio seria um indício da existência de vida intelig�nte. Aproxi�
ção presidencial americana de 2000, seria necessário começar com o Archive. mando-se ainda mais, ele discerniria aglomerações urbanas menores e uma
Ele possui uma máquina do tempo que nos permite ver os sites dos candidatos, densa malha rodoviária. O alienígena precisaria chegar mais perto ainda para
as cédulas eleitorais e as Webpages dos partidos políticos, exatamente como enxergar os seres humanos responsáveis pelo ordenamento de larga escala que
eram durante a campanha eleitoral. Queremos avaliar a reação do universo se percebe do espaço.
on-line aos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001? Um mês depois dos A exploração que fizemos da Web seguiu um percurso idêntico ao do alie­
acontecimentos, o Archive já possuía uma coleção de 200 milhões de documen­ nígena. Primeiramente, descobrimos a topologia de larga escala não homogênea
tos relacionados aos fatos. Se um topógrafo da Web quiser entender a arquite­ e compreendemos que ela é tão inevitável quanto a configuração esférica da
tura da Web, o Archive é um excelente ponto de partida. Ele nos permite identi­ maioria dos planétas. Olhando mais de perto, percebemos a existência de qua­
ficar quando e onde as Webpages e os links foram adicionados e removidos tro grandes continentes, cada um dos quais obedece a leis diferentes. Ajustando
como alguns nós mais recentes se tomaram populares da noite para o dia � o foco, começamos a avistar comundidades e grupos de Webpages unidos por
como hubs mais antigos pêrderam o brilho. Comparando os mapas da Web pro­ interesses comuns. Essas incursões ao reino do desconhecido alteraram signifi­
duzidos em diferentes intervalos de tempo, é possível acompanhar a emergência cativamente a compreensão que tínhamos da Web. Descobrimos que o universo
e a cristalização das comunidades virtuais. O .Archive possui dados para recons­ on-line é muito maior do que qualquer outro já existente. Também cresce mais
tituir a caótica evolução de nós e links, ajudando a descobrir os mecanismos res­ rapidamente do que estamos dispostos a acreditar. Para desalento nosso, desco­
ponsáveis pela vigente arquitetura da Web. brimos também que é bem menos mapeado do que estaríamos dispostos a acei­
O Archive tem aficionados dos mais diversos campos do conhecimento, tar. Dois anos atrás, seis de cada dez páginas não haviam sido visitadas por
mas a maioria dos pesquisadores que poderia beneficiar-se dele ou não sabe de nenhuma ferramenta de busca. Se a tendência for confiável, as ferramentas de
sua existência ou não tem know-how de programação para acessá-lo e utilizá-lo busca atuais veem uma fração cada vez menor da Web. A boa notícia é que a
com eficiência. Dessa forma, seu potencial é subutilizado pelos pesquisadores e competição obriga as ferramentas de busca a realizar um trabalho melhor. Mas
pelo público em geral. Esperamos, contudo, que Internet .Archive seja apenas o nunca devemos perder de vista o quadro mais abrangente: qualquer que seja a
começo de um despertar da nossa responsabilidade histórica para com o uni- extensão da competição das ferramentas de busca, a Web é sempre maior.
Apesar disso, não devemos subestimar os enormes serviços que as ferra­
mentas de busca e seus robôs nos prestam. Por vezes desesperamos e dizemos
1 Referência aos filmes em preto e branco (N.T.) . que a Web é uma "floresta". A verdade é que, sem robôs, ela seria um buraco

156 157
negro. O espaço se dobraria sobre si mesmo, de tal sorte que qualquer objeto
que nele caísse jamais sairia. Os robôs impedem que a Web entre em colapso DÉCIMA TERCEIRA CONEXÃO
sob o peso de sua crescente complexidade. Eles desdobram o espaço, assegu­
rando a ordem no caos de nós e links.
Nossa vida é crescentemente dominada pela Web. Apesar disso, presta­
mos-lhe escassa atenção e pouco nos empenhamos por entendê-la. Em termos Mapa da Vida
relativos, não seria necessário muito esforço para promover uma nova revolu­
ção no acesso à informação. A questão é: o que efetivamente perdemos nesse
meio-tempo?
Em uma sociedade cada vez mais dominada pela Internet, o entendimento
da Internet tem enorme valor em si mesmo. Contudo, as recompensas vão mais
além. Um dos mais excitantes aspectos dessa exploração é a descoberta de leis
cuja validade não se revoga diante dos portões do ciberespaço. Essas leis, igual­
mente aplicáveis à célula e ao ecossistema, demonstram quão inevitáveis são as
leis da natureza e quão profundamente a auto-organização molda o mundo que
nos cerca. Em virtude de sua natureza digital e de suas gigantescas dimensões, a
Web oferece um modelo de sistema cujos detalhes podem ser singularmente Em fevereiro de 1987, a revista Nature-reportou uma descoberta de ponta:
descobertos. Nunca antes observamos uma rede com tamanha acurácia. Ela con­ o gene da depressão maníaca ou, segundo sua denominação mais recente, o
tinuará sendo fonte de inspiração e de ideias para quem quer que deseje conhe­ transtorno bipolar. A depressão maníaca acomete de 1 % a 5% dos a_dultos nos
cer as propriedades da teia em que se configura nosso universo. Estados Unidos e até· 25% a 50% deles tentaram suicídio pelo menos uma vez_
Como o risco de desenvolver depressão maníaca é de cinco a dez vezes mais ele­
vado se os parentes em primeiro grau sofrerem da doença, a visão prevalecente
é a de que a depressão maníaca é um distúrbio genético. Dessa forma, tão logo
surgiram métodos que relacionavam as doenças a genes específicos, houve uma
corrida para identificar o gene da depressão maníaca. O ambicionadíssimo "pri­
meiro" parece ter-ido para os autores do trabalho publicado na Nature em 1987,
que localizaram o gene no cromossomo 11 quando estudavam uma exte1;1sa
familia amish em Lancaster, na Pensilvânia. Não obstante, dois anos depois o
grupo de pesquisa fez uma retratação negando os resultados. Mas o erro crasso
não desencorajou outros caçadores de_gene. Com efeito, infundiu-lhes motiva­
ção adicional para descobrir o verdadeiro gene. Em 1996, quase uma década
após o primeiro estudo publicado, três grupos de pesquisa independentes relata­
ram ligações com genes em outros cromossomos. Um outro estudo amish envol­
veu os cromossomos 6, 13 e 15; um estudo que focalizou a população isolada
do Central Valley de Costa Rica reportou ligações com o cromossomo 18; e os
resultados relacionados a uma extensa familia escocesa indicaram o envolvi­
mento do cromosso 4. Pesquisa sobre um outro importante distúrbio mental, a
esquizofrenia, seguiu padrão semelhante, atrelando a doença a duas diferentes
regiões do cromossomo 1, com um outro grupo de pesquisa implicando o cro­
mossomo 5 poucos anos depois.
Cientistas distraídos? Pesquisa de má qualidade? Nada disso. Não se trata
de resultados conflitantes. Eles simplesmente demonstram que as enfermidades,

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da depressão maníaca ao câncer, não são causadas por um único gene disfun­ projeto genoma acarretou uma nova percepção: o comportamento dos sistemas
cional. Pelo contrário, diversos genes interagindo através de uma complexa rede vivos raramente pode ser reduzido a seus componentes moleculares.
oculta no interior de nossas células são simultaneamente responsáveis. Confron­ Nossa incapacidade de detectar um único gene responsável pela depressão
tados com a gigantesca tarefa de entender os blocos construtivos da célula, dos maníaca constitui a melhor ilustração. Não basta montar uma lista de genes sus­
genes às proteínas, os cientistas até recentemente focavam a biologia, e não as peitos. Para curar muitas doenças, precisamos entender os sistemas vivos em
redes. Entretanto, com as peças agora em mãos, a biologia pós-genômica dá um sua integridade. Temos de decifrar como e quando diferentes genes atuam em
passo atrás para melhor visualizar o conjunto. Novas e excitantes descobertas conjunto, como as mensagens trafegam no interior da célula, que reações .ocor­
que estão revolucionando a biologia e a medicina proclamam alto e bom som: rem ou não em dado momento e como os efeitos de uma reação repercutem
se quisermos entender a vida - e em última instância a cura da doença -, deve­ ao longo dessa complexa rede celular. Para tanto, precisamos mapear a rede
remos pensar em redes. existente no interior da célula. Essa rede da vida determina se uma célula se
desenvolve na pele ou age constantemente no coração, decide a resposta da
eélula aos distúrbios externos, assegura a chave da sobrevivência em ambientes
constantemente mutantes, avisa à celula quando se dividir ou morrer e é res­
1. ponsável por doenças que vão do câncer aos transtornos psiquiátricos. Com_o
concluiu o histórico artigo da Science que reportou a decodificação do genoma
humano, "não há genes 'bons ' ou genes 'ruins ', mas apenas redes 9-ue existem
"Hoje estamos aprendendo a linguagem com a qual Deus criou a vida",
em vários níveis".
disse o presidente Bill Clinton em 26 de junho de 2000, em cerimônia na Casa
Branca, na qual anunciou a decodificação dos 3 bilhões de "letras" químicas do
genoma humano. Será verdade? Terá a humanidade manejado o "livro da
vida"? Francis Collins e Craig Venter, os dois cavalheiros que se postaram ao 2.
lado do presidente, serão os profetas do século XX? Afinal, Collins e Venter,
representando o Projeto do Genoma Humano, de natureza pública, e a
A decodificação do genoma humano disponibilizou-nos um inventário das
empresa privada Celera Genomics, que decodificou o genoma humano, nos
partes da célula. Para retomar a analogia do carro, é como se tivéssemos milha­
trouxeram o livro. res de partes dele no pátio. Se quisermos vê-lo funcionando, precisaremos
Abramos o "livro da vida" e veremos um "texto" de aproximadamente 3 encontrar o projeto, um mapa que nos permita montá-lo. Para a maioria das
bilhões de letras, ocupando cerca de 10 mil exemplares da edição dominical do células, esse mapá é quase tão indefinível agora como o era 15 anos atrás, nos
jornal The New York Times. Cada linha se assemelha à seguinte: primórdios do Projeto do Genoma Humano. A falta de uma ferramenta de busça
celular é apenas uma parte do problema. A dificuldade maior é que no interior
TCTAGAAACA ATTGCCATTG TTTCTTCTCA TTTTCTTTTC ACGGGCAGCC de cada célula existem muitos estratos organizacionais, cada um dos quais pode
ser encàrado como uma rede complexa. Para entender a rede da vida, é preciso
Essas letras, abreviaturas das moléculas que compõem o DNA, poderiam que nos familiarizemos com alguns desses estratos.
facilmente significar que o anônimo doador cujo genoma foi sequenciado ficará Na sociedade altamente consciente de hoje, é senso comum que as células
calvo por volta dos 50 anos de idade. Ou poderiam revelar que desenvolverá o queimam nutrientes dividindo complexas moléculas para criar os blocos cons­
mal de Alzheimer aos 70. Reiteradamente ouvimos dizer que tudo, de nossa trutivos das células e a energia de que necessitam para manter-se vivas. Esse
personalidade à história médica futura, está codificado nesse livro. Podemos processo se realiza por intermédio de uma rede de centenas de reações bioquí­
lê-lo? Duvido. Permita-me revelar um segredo:·nem os biólogos nem os médicos micas intracelulares multifásicas, a que nos referimos em conjunto como a rede
tampouco podem. metabólica. Os nós dessa rede podem ser simples substâncias químicas, como a
Não há dúvida de que o sequenciamento do genoma humano é um triunfo, água ou o dióxido de carbono, ou moléculas mais complexas formadas por
o resultado da capacidade da moderna biologia molecular de reduzir os siste­ dezenas de átomos, como a ATP. Os links são as reações bioquímicas que ocor­
mas vivos complexos a suas menores partes constitutivas. É indubitavel­ rem entre essas moléculas. Se duas moléculas, A e B, reagem mutuamente para
mente uma catálise de uma nova era tanto na medicina como na biologia. Mas o criar C e D, então todas as quatro são conectadas ao complexo metabolismo da
célula.

160 161
Pensemos no metabolismo celular como o motor de um carro. Por si só, o
fato de possuir um motor não nos leva muito longe. Precisamos das rodas, da
3.
suspensão, dos freios, dos faróis e de muitos outros componentes, cada um dos
quais assegura que o carro correrá com segurança na estrada. Em termos seme­ Zoltán Oltvai, biólogo celular da Northwestern University Medical School
lhantes, a célula possui um intrincada rede regulatória que controla tudo, do em Chicago, tinha diversas descobertas significativas e bastante citadas em seu
metabolismo à morte da célula. Os nós dessa rede são os genes e as proteínas portfólio quando nos encontramos em 1998. Naquela época, morávamos em
codificados pela gigantesca molécula do DNA. Os links são as várias interações Oak Park, subúrbio de Chicago caracterizado pela presença arquitetônica das
bioquímicas que ocorrem entre esses componentes. Os genes são primeiramente torres de Frank Lloyd Wright. Com filhos pequenos de idades semelhantes,
copiados em moléculas únicas do RNA mensageiro, que são, então, traduzidas começamos a nos visitar regularmente. Depois de esgotar todos os tópicos rela­
em proteínas. Algumas proteínas interagem com o DNA, iniciando ou supri­ cionados a cultura e política, nossa conversa passou a abordar questões ligadas
mindo a tradução de novos genes, reparando eventuais avarias do DNA, copi­ à ciência e à biologia. Mais ou menos nessa época, meu grupo estava condu-
ando os dois filamentos de DNA quando as células se replicam, e assim por . zindo uma pesquisa sobre a Web e a Internet. Inevitavelmente, nossos
diante. Outras proteínas interagem entre si formando grandes complexos protei­ bate-papos de fim de semana giravam em torno das semelhanças e diferenças
cos. Um exemplo notável é a hemoglobina, complexo proteico composto de qua­ entre a rede da vida e demais redes complexas. Logo se desenvolveu um argu­
tro proteínas que se combinam para transportar o oxigênio em nossa corrente mento constante. A Web e a rede de atores sociais são redes sem escala porque
sanguínea. Desse modo, as proteínas podem ser vistas como nós de uma com­ emergiram graças ao crescimento e à conexão preferencial, processos facilmente
plexa rede de interação proteína-proteína na qual duas proteínas se conectam se identificáveis em ambas as redes. A célula, por outro lado, é diferente. Decerto
puderem se ligar fisicamente. Toda a arquitetura molecular em forma de rede que o acoplamento original das primeiras pi:-otocélulas a partir de uma sopa pri­
de uma célula é codificada na rede celular, somatório de todos os componentes mordial de moléculas orgânicas deve ter sido semelhante a uma rede em cresci­
celulares (genes, proteínas e outras moléculas) conectados por todas as intera­ mento. Contudo, no decorrer dos 3 bilhões de anos passados, a evolução e a
ções fisiologicamente relevantes, que vão das reações bioquímicas aos links físi­ seleção natural seguiram seu curso. Durante esse tempo, houve significativa­
cos. Essa rede da vida contém todas as interações metabólicas proteína-proteína mente menos crescimento, apenas alguns ajustes na rede celular, fluidificando-a
e proteína-DNA presentes no interior da célula. e otimizando-a. Dessa forma, por um lado, mesmo que uma topologia sem
Não faz muito tempo, acreditava-se em geral que tudo o que importa para escala tivesse se desenvolvido quando moléculas inertes ensaiaram os primeiros
a história biológica de um organismo está codificado nos genes. A biologia passos em direção à vida, teria se perdido por causa dos efeitos globais da evo­
pós-genômica, embora ainda incipiente, já enfrenta uma importante batalha. lução. Por outro� lado, é difícil conceber que a complexa rede bioquímica exis­
Ela tenciona reduzir o papel historicamente onicompreensivo atribuído aos tente no interior da célula seria completamente randômica. Portanto, será o
genes individuais. Os genes são conhecidos por desempenhar um papel estrutu­ mapa da vida randômico, como a rede de Erdós-Rényi, ou sem escala, como a
ral, determinando o escopo e a configuração das proteínas e transmitindo essa Web? Como caracterizar a complexa topologia da célula?
informação, em termos hereditários, às gerações subsequentes. Recentemente, Depois de exaurir argumentos para nos convencer a seguir uma ou outra
contudo, os cientistas descobriram que os genes também desempenham rele­ direção, Oltvai e eu resolvemos encaminhar nossas discussões para fora do play­
vante papel funcional enquanto membros de uma complexa rede celular. Esse ground e sair em busca de dados concretos acerca da rede dá. vida. Felizmente,
papel funcional se manifesta apenas no contexto dinâmico em que um gene durante boa parte do século XX, a biologia e a bioquímica se empenharam em
individual interage com muitos outros componentes celulares. O papel estrutu­ identificar e inter-relacionar as várias moléculas no interior da célula. James
ral dos genes pode ser revelado a partir de sua sequência. Agora temos a Watson, co-descobridor da estrutura de dupla hélice do DNA, escreveu em
sequência completa de diversos organismos fundamentais, que vão da bactéria 1970, no agora clássico Molecular Biology: "Já conhecemos pelo menos um
Escherichia coli aos seres humanos. Mas estamos apenas no começo do segundo quinto, e talvez mais de um terço, de todas as reações metabólicas jamais des­
desafio científico igualmente revolucionário: revelar o papel funcional dos critas [na bactéria E. coli]", sugerindo que "dentro dos próximos dez a 20 anos
genes. Para tanto, precisamos de um segundo projeto genoma, desta vez mape­ atingiremos um estado em que será possível descrever essencialmente todas as
ando a rede existente no interior da célula. Temos o "livro da vida". Agora pre­ reações metabólicas". A visão de Watson se cumpriu. Hoje em dia, os bacteriolo­
cisamos do mapa da vida. gistas acreditam que a complexa rede de mais de 700 nós e de cerca de mil links
representa praticamente boa parte da lista completa de reações que estimulam

162 163
o metabolismo da E. coli. O que Watson não podia ter imaginado em 1970 é Para nossa grande surpresa, as mensurações indicaram que as extensões
que, 30 anos mais tarde, os bancos de dados on-line estariam compilando a rede do caminho típico são bem mais curtas que cem. De fato, as células são mundos
de reações metabólicas de centenas de organismos. Embora ainda careçamos de pequenos com três graus de separação. Em outras palavras, muitos pares de
um mapa metabólico detalhado da complexíssima célula humana, nosso conhe­ moléculas podem ser conectados por uma via de três reações. As pertu.rbações,
cimento acerca · de diversos organismos mais simples está praticamente portanto, nunca são pontuais: qualquer mudança na concentração de uma
completo. molécula logo afetará muitas outras moléculas. Essa descoberta teve respaldo
Assim, minhas discussões com Oltvai não poderiam ter sido travadas em no estudo de Andreas Wagner, da Universidade do Novo México, e de David A.
momento mais propício. Poucos anos antes, minha investigação laboratorial em Fell, da Universidade de Oxford Brooks, que concluíram, cada um por si, que a
tomo da topologia da célula teria sido interrompida por falta de dados. No final rede metabólica da E.coli é sem escala e possui propriedades de mundo
de 1999, contudo, diversos Websites tinham os mapas que procurávamos. Após pequeno.
pesquisar os bancos de dados disponíveis, criamos um novo, operado pelo Embora inesperadamente curtos, os três graus de separação não foram o
Argonne National Laboratory, fora de Chicago, apelidado "What Is There?", que aspecto mais interessante de nosso achado. Como todos os 43 organismos
compilou a rede metabólica de 43 organismos diversos. Hawoong Jeong, uma tinham diferentes tamanhos, esperávamos que a separação aumentaria com o
vez mais revelando sua habilidade em computação, escreveu um programa que tamanho do organismo, da mesma maneira como o diâmetro da Web aumenta
baixava cada reação individualmente. Oltvai e eu observávamos por sobre seus com o número de documentos. Surpreendentemente, as mensurações indicaram
ombros como Jeong compreendia essa rede extremamente complexa, reunindo que se estivermos navegando na minúscula rede de uma pequena bactéria para­
um a um todos os mapas metabólicos desses 43 organismos. Concluída a tarefa, sita ou no sistema viário altamente desenvolvido de um organismo multicelular,
ele passou a caracterizar essas redes, calculando a quantidade de reações de que como uma flor, por exemplo, a separação será a mesma. Conquanto a diferença
cada molécula participa. A robustez dos resultados foi impressionante. Indepen­ na arquitetura celular entre uma bactéria primitiva e a célula de um organismo
dentemente do organismo examinado, detectávamos uma nítida topologia sem multicelular possa ser tão grande quanto a diferença entre um povoado e a
escala. Cada célula assemelhava-se a uma minúscula rede, extremamente assi­ cidade de Nova York, despojadas de suas redes dinamicamente relevantes, todas
métrica, com poucas moléculas envolvidas na maioria das reações - os hubs do as células se parecem com uma pequena cidade. Analisando mais a fundo, veri­
metabolismo -, enquanto a maioria das moléculas participava de apenas uma ficamos que boa parte das células compartilha também os mesmos hubs. Ou
ou duas. seja, para a maioria dos organismos, as dez moléculas mais conectadas são as
mesmas. A adenosina trifosfato (ATP) é quase sempre o hub maior, seguida de
perto pela adenosina difosfato (ADP) e água.
Decerto, o papel da ATP, da ADP e da água como hubs proeminentes não
4. foi de maneira alguma surpreendente. Nas células, a ATP serve como depósito
conveniente e versátil de energia, direcionando centenas de reações bioquími­
Retomando nossas redes sociais, se duas moléculas participam d a mesma cas. Ao suprir energia para essas reações, a ATP converte-se em ADP, abando­
reação, sua separação é 1. Se, contudo, são necessárias duas reações ulteriores nando um grupo de fosfato; dessa forma, no interior da rede metabólica, tanto a
para conectá-las, então sua separação é 2. Reunindo todos os nós e links, terá ATP como a ADP são conectadas a grande número de moléculas que participam
essa complexa rede situada no interior da célula as propriedades de um mundo de reações ávidas de energia. Não obstante, tomada em conjunto, a lista das dez
pequeno? mais moléculas altamente conectadas foi muito reveladora. Uma previsão fun­
Mensurar a separação entre moléculas não é consequência de nossa obses­ damental do modelo sem escala é que nós com grande número de links são
são pelos seis graus de separação. O diâmetro da rede - ou grau de separação aqueles que foram adicionados previamente à rede. Em termos de metabolismo,
entre os nós - tem significado biológico. Por exemplo, se acharmos que o cami­ isso implicaria que as moléculas mais conectadas devem ser as mais antÍgas no
nho químico mais curto entre duas moléculas é cem, então qualquer mudança interior da célula. E, de fato, a análise de Wagner e Fell mostrou que as molécu­
na concentração da primeira molécula terá de passar por cem reações interme­ las mais conectadas também possuem uma história evolutiva pregressa. Acre­
diárias antes de atingir a segunda molécula. Qualquer perturbação definhará e dita-se que algumas dessas moléculas sejam os remanescentes do chamado
se extinguirá nesse longo percurso. mundo do RNA, a etapa evolutiva anterior à emergência do DNA, enquanto
outras são ·conhecidas como os componentes das trilhas metabólicas mais anti-

164 165

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gas. Por conseguinte, a vantagem do pioneiro parece também permear a emer- podem interagir. Para a levedura de padeiro, isso exige a checagem de 6.300
gência da vida. vezes 6.300 pares - algo próximo de 40 milhões de interações potenciais. Com
Se todos os organismos possuem a mesma topologia sem escala e a mesma ferramentas da biologia molecular padrão, essa checagem demandaria décadas
separação nodal e compartilham os mesmos hubs, como então as células de e centenas de pessoas. Não obstante, a despeito da magnitude da tarefa, dois
diferentes organismos são díspares entre si? Há alguma diferença entre a arqui­ grupos de pesquisa obtiveram, cada um por si, um mapa detalhado da rede de
tetura química de uma bactéria e a de uma célula humana? Evidenciou-se que proteína da levedura. Eles conseguiram isso graças a uma importante revolução
existem diferenças significativas. Comparando a rede metabólica de todos os 43 tecnológica, o chamado método do duplo-hfbrido. Desenvolvido por Stanley
organismos, verificamos que apenas 4% das moléculas aparecem em todos eles. Fields em 1989, o método do duplo-hfbrido proporciona uma técnica semiauto­
Conquanto os hubs sejam idênticos, quando se trata das moléculas menos matizada relativamente rápida de detecção de interações proteína-proteína.
conectadas, todos os organismos possuem suas próprias variedades peculiares. Embora o método seja conhecido por fornecer numerosos falsos-negativos e
A vida se assemelha a um bairro em que cada casa foi projetada pelo mesmo positivos, o mapa que gerou propicia uma oportunidade inédita de esquadrinhar
arquiteto, mas diferentes construtores e designers de interior se encarregaram a organização reguladora da célula.
dos acabamentos, do material do piso ao tamanho e formato das janelas. Do Eufóricos com os insights propiciados pela análise topológica do metabo­
alto, todas as casas parecem iguais. De perto, contudo, as diferenças se tomam lismo celular, no outono de 2000, Oltvai, Jeong e eu, com uma jovem aluna,
perceptíveis. Sean Mason, passamos a nos interessar pela estrutura da rede de interação da
O metabolismo representa apenas um componente, ainda que muito proteína. Os dados relativos ao duplo-hibrido publicados poucos meses antes
.
rmportante, da rede celular. A mesma arquitetura sem escala estará presente proporcionaram uma excelente oportunidade para esse estudo. Após baixar
também na rede regulatória - a rede responsável pela operacionalidade da todas as interações proteína-proteína conhecidas, reconstituímos a rede de pro­
célula? De fato, recentemente passamos a nos interessar por toda a arquitetura teína da levedura com o intuito de examinar suas características de larga escala.
molecular em forma de teia dos organismos vivos. A questão é: os diferentes Uma vez mais, os resultados deixaram pouca margem à ambiguidade: demons­
componentes dessa rede da vida obedecem às mesmas leis e traços arquitetôni­ traram que a rede de interação da proteína possui uma topologia sem escala.
cos ou a evolução descobriu diferentes soluções para os vários componentes? Em outros termos, muitas proteínas na célula desempenham um papel bastante
Para além de nosso desejei de compreender os aspectos fundamentais da arqui­ específico, interagindo com apenas uma ou duas outras proteínas. Algumas pro­
tetura da célula, o entendimento da rede regulatória também tem importantes teínas, no entanto, são capazes de acoplar-se fisicamente a uma grande quanti­
implicações práticas. Efetivamente, distúrbios genéticos decorrem de disfunções dade de outras. Esses hubs são cruciais para o funcionamento adequado da
dos nós da rede regulatória. Por conseguinte, a robustez dessa rede contra célula e sua sobJevivência. De fato, conseguimos mostrar que a remoção de um
falhas de nó determina nossa capacidade de sobreviver a diversas enfermidades, gene responsável por uma proteína hub aniquila a célula em 60% a 70% dos
tanto quanto a capacidade dos pesquisadores de produzir medicamentos efica­ casos. Mutações que afetam uma proteína fracamente conectada, em contrapar­
zes no tratamento desses �stúrbios que não podemos facilmente suportar. tida, têm menos de 20% de probabilidade de revelar-se letais.
Uma série de resultados paralelos embasou esses achados. Andreas Wag­
ner confirmou, de maneira independente, que a rede de proteína da levedura
possui uma topologia sem escala. Stefan Wuchty, jovem pesquisador que traba­
5. lha no European Media Laboratories, descobriu uma arquitetura semelhante em
uma rede marcadamente diferente no interior da célula. Em sua assim chamada
A levedura d e padeiro, uma das células eucarióticas mais simples, possui rede de domínio de proteína, os nós são diferentes superfícies através das quais
cerca de 6.300 genes, codificando aproximadamente o mesmo número de pro­ as proteínas se conectam mutuamente, e duas superfícies são consideradas
teínas. Muito embora isso represente apenas um quinto dos estimados 30 mil conectadas se estiverem simultaneamente presentes na mesma proteína. Jong
genes diferentes que uma célula humana contém, já é um número enorme. Em Park e colaboradores do European Bioinformatics Institute, no Reino Unido,
geral, quando interagem por interpenetração, as proteínas têm uma boa razão observaram uma topologia sem escala quando reconstituíram a rede da leve­
para_ proceder dessa for1?ª· A m�oria das interações desempenha algum papel dura com base nos dados da interação da proteína coletados pelo Protein Data
funcional relevante na Vlda da celula. Por conseguinte, para compreender como Bank. Nosso grupo de pesquisa detectou a mesma estrutura em um organismo
as células trabalham, devemos identificar todos os pares de proteínas que bem diferente da levedura, uma simples bactéria chamada Helicobacter pylori,

166 167
sugerindo que a natureza sem escala da rede de interação da proteína é uma tro cópias do gene da hemoglobina disperso ao longo do genoma. Hoje em dia,
característica geral de todos os organismos. cada um desses genes codifica um dos quatro componentes do complexo pro­
Considerada em conjunto, a topologia de larga escala semelhante das teico da hemoglobina.
redes de interação metabólica e de proteína indica a existência de alto grau de A duplicação genética tem impacto significativo sobre a rede celular. Ela
harmonia na estrutura da célula: qualquer que seja o nível organizacional que resulta em dois genes idênticos, que produzem idênticas proteínas, que, por sua
examinemos, deparamo-nos com uma topologia sem escala. Essas incursões vez, interagem com as mesmas proteínas. Cria-se, assim, um novo nó, a proteí­
pelo interior da célula indicam que Hollywood e a Web apenas redescobriram a na gerada pelo gene duplicado. Suas vizinhas, as proteínas com as quais a pro­
topologia que a vida desenvolvera 3 bilhões de anos antes. As células são real­ teína duplicada interage, interagirão agora cada uma com ambos os pais e com
mente mundos pequenos que compartilham a topologia de muitas outras redes a idêntica proteína descendente. Portanto, cada proteína em contato com a pro­
não biológicas, como se o arquiteto da vida só pudesse projetar estas. teína duplicada adquire um link extra. Nesse jogo altamente conectado, as pro­
Como a vida chegou a essa arquitetura? Logo depois de formular a ques­ teínas levam uma vantagem natural: têm maior probabilidade de possuir um
tão, obtivemos uma resposta. Cerca de meio ano após a publicação de nossas · link para a proteína duplicadora do que seus primos fracamente conectados.
descobertas relativas à topologia da rede de interação de proteína, recebi três Não que os hubs se dupliquem com maior frequência. Pelo contrário, como os
e-mails em praticamente um mês, cada qual com um texto de um grupo de pes­ hubs estão em contato com maior número de proteínas, têm maior probabili­
quisa diferente. Surpreendentemente, cada um dos três grupos de pesquisa ofe­ dade de possuir um link para um nó duplicador, o que lhes oferece um link
recia, de forma independente, a mesma explicação simples e elegante, argumen­ extra, uma versão sutil da conexão preferencial.
tando que a topologia sem escala da célula resulta de um equívoco comum que A característica mais importante dessa explanação é que remete a origem
as células cometem quando se reproduzem. da topologia sem escala a um mecanismo biológico bem conhecido, a duplica­
ção genética. Para tanto, mostra que a duplicação genética pode levar, simulta­
neamente, tanto ao .crescimento da rede proteica pela adição de uma proteína
extra quanto à conexão preferencial pela agregação de novos links, a uma taxa
6. mais elevada, para proteínas mais conectadas. É prematuro determinar se essa
constitui a única explicação, pois é concebível que diferentes mecanismos, ainda
As células se reproduzem por duplicação de seu conteúdo e por bipartição. inexplorados, consigam engendrar a mesma topologia. Tampouco é claro se
Os detalhes desses processos podem variar, conforme se trate de simples bacté­ com isso se explica a estrutura sem escala observada no metabolismo. Demons­
rias ou de células humanas mais complexas. Mas, certas etapas são universais. tra-se, não obstante, que mecanismos presentes na célula podem forjar a topolo­
Em primeiro lugar, a fim de produzir uma célula descendente geneticamente gia sem escala. A essa altura, estamos em condição de tratar de uma importante
idêntica, o DNA deve ser fielmente replicado. Esse processo, contudo, não é questão: o mapa da vida nos capacitará a entender melhor as enfermidades e a
imune a erros. Muito embora o intrincado mecanismo de reprodução da célula alavancar os processos terapêuticos correspondentes?
assegure que as sequências do DNA são herdadas com extraordinária fidelidade,
aproximadamente uma letra em mil é aleatoriamente modificada a cada 200
mil anos. Um outro erro comum é a duplicação de genes. Por um raro acidente
no processo de reprodução, a duplicação de genes pode ocorrer quando as 7.
extremidades das moléculas de DNA partidas se juntam. Como resultado, seg­
mentos de extensão variável do DNA do genitor aparecerão duas vezes no O câncer é a doença humana mais investigada. A extraordinária atenção
genoma do descendente. Esses erros de reprodução por vezes matam a célula. que a comunidade médica lhe presta tem acarretado diversos avanços significa­
Em outros casos, múltiplas cópias do mesmo gene possuem vantagens evoluti­ tivos. O mais importante deles provavelmente seja a descoberta do gene p53.
vas e são legadas às gerações futuras. A hemoglobina é um exemplo bem Embora tenha sido reportado já nos idos de 1979 por David Lane e Arnold J.
conhecido. Levine, não foi senão no final da década de 1980, na esteira do trabalho de Bert
Originalmente, as células tinham apenas um gene de hemoglobina. Há Vogelstein, que se apreciou por inteiro sua importância na carcinogênese
cerca de 500 milhões de anos, no decurso da evolução das espécies de peixe humana. Vogelstein reconheceu que a proteína p53, criada pelo gene p53, é um
mais elevadas, ocorreu uma série de duplicações genéticas, resultando em qua- supressor de tumor. Da mesma maneira como os freios têm por função fazer

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parar o carro, os genes supressores de tumor atu� no s�ntido de r;t�dar e cula p53, um dos nítidos hubs da rede celular, toma a célula cancerígena e,
deter a replicação e a divisão do DNA em novas celulas. Celulas sauda�e1: con­ finalmente, mata o organismo. Isso explica por que ataques farmacológicos
centram um pequeno número de moléculas p53 a sua volta. Se a rad1açao ou combinados contra moléculas que interagem com a p53 surtem progressiva­
alguma outra lesão afetar a célula, produz-se mais p53, prevenindo a pro�es­ mente efeitos mais graves sobre a célula, assemelhando-se a um ataque contra a
são da célula por meio da divisão celular. Isso dá tempo para que a celula própria p53.
repare a lesão antes que mais cópias da célula disfuncional possam ser produzi­ O trabalho de Vogelstein, Lane e Levine publicado na Nature demonstrou a
das. Contudo, se a lesão for irreparável, a proteína p53 ativará um grupo de força e a onipresença do pensamento em rede. Ideias desenvolvidas para melhor
genes para matar a célula. defender a Internet e quantificar os efeitos dos ataques de hackers caíram em
Se O freio da célula - a proteína p53 - falhar, a célula poderá atacar às solo fértil na biologia celular, que se preocupa com a defesa das células huma­
cegas. As células cancerosas diferem das células saudáveis por sua capacidade nas saudáveis contra todos os organismos ameaçadores. No âmago da pesquisa
de multiplicar-se a uma taxa bastante elevada. Efetivamente, cerca de 50% dos sobre a Internet e a biologia celular, as questões são silnilares. O primeiro passo
cânceres humanos contêm mutações no gene p53. Essa observação estimulou é mapear a rede subjacente a esses sistemas. Em seguida, a partir desses mapas,
uma avalanche de pesquisas, resultando em mais de 17 mil publicações desde precisamos inferir as leis que governam as redes. A essa altura, o topógrafo da
1989. Em reconhecimento ao seu papel no câncer, em 1993 a molécula p53 foi Internet, o mapeador da Web e o pesquisador do câncer estarão no mesmo
eleita a "molécula do ano" pela Science. Considerando-se a atenção de que foi campo.
objeto a molécula p53, era de esperar que já se tivesse encontrado a cura para o Entretanto, a implicação mais importante da rede p53 extrapola as analo­
câncer. Afinal, tudo o que precisamos fazer é desenvolver medicamentos capa­ gias fundamentais que ela ilustra entre as. células e a Internet. Ela aponta para
zes de assegurar que a molécula p53 cumpra sempre a tarefa que lhe compete. uma nova abordagem de terapias medicamentosas e de produção de remédios
Por que, então, essa superabundância de pesquisas ainda não se traduziu na contra o câncer. O objetivo último que se persegue com o estudo da rede p53 é
produção de um medicamento universalmente eficaz contra o câncer? encontrar a cura para o câncer. Como discutiremos mais adiante, esse é, em
Não obstante sua importância na carcinogênese humana, fixar-se no gene larga medida, um processo de tentativa e erro. Na maioria dos casos, os trata­
p53 não conduzirá, por si só, à cura dessa enfermidade letal. A razão disso foi mentos contra o câncer visam à destruição: fulminarão as células cancerígenas,
anunciada recentemente pelos próprios responsáveis pela localização do p53 no destruindo sua rede celular, quer por medicamentos, quer por radiação. A cres­
centro de pesquisa do câncer. Vogelstein, Lane e Levine foram coautores de um cente compreensão da rede p53 sugere um outro curso de ação: devemos pri­
trabalho publicado em novembro de 2000, na revista Nature, que fez das redes meiramente decifrar a precisa topologia dessa rede, compreendendo plena­
0 ponto crucial de sua argumentação. A razão pela qual não compreendemos o
mente todas as- interações. Com tal mapa em mãos, poderemos desferir um
câncer em sua plenitude, sugerem os três estudiosos, é que a célula se asseme­ ataque frontal, descobrindo medicamentos que restaurem as funções da molé­
lha à Internet. cula p53 sem desmantelar a rede circunjacente.
Os três pesquisador�s sugerem que devemos refrear nossa obsessão com a
onipresente molécula p53 e concentrar-nos no que chamaram de rede p53, suma
de todas as moléculas e genes que interagem com a molécula p53. Segundo os
pesquisadores, "uma maneira de entender a rede p53 é compará-la à Inte�et. A 8.
célula, a exemplo da Internet, se assemelha a uma 'rede sem escala : um
pequeno subconjunto de proteínas é altamente co1;ectado (linkado) e c�n1:1"ola a
atividade de um grande número de outras protemas, enquanto a maiona das Até h á pouco tenipo, só nos era possível tratar os sintomas de enfermida­
proteínas interage com apenas algumas outras. As proteínas nessa rede funcio­ des como câncer, doenças cardíacas e transtornos psiquiátricos. Pesquisávamos
nam como os nós, e os nós mais altamente conectados são os hubs. Em tal rede, substâncias químicas raras, dos laboratórios de química às florestas tropicais, na
a performance é quase inalterada pela remoção aleatória de nós. Esses sistemas, esperança de que pudessem possibilitar a produção de drogas miraculosas para
contudo, encerram um calcanhar de aquiles". o tratamento de algumas doenças. Segundo certas estimativas, as drogas dispo­
O calcanhar de aquiles de uma rede, recordar-se-á o leitor, refere-se à vul­ níveis no mercado têm por alvo apenas cerca de 500 das 30 Inil proteínas exis­
nerabilidade de seus hubs. A inativação de moléculas menos conectadas não tentes no corpo humano. E muito embora disponhamos de múltiplas drogas
surte efeitos draconianos sobre a célula, ao passo que uma mutação na molé- para diversas doenças, quase sempre é um processo de tentativa e erro desco­
brir o que funciona para determinado paciente.

170 171
Uma compreensão minuciosa de toda a rede bioquímica no interior da ingerir o medicamento, iria perceber. As doses de substâncias químicas injeta­
célula promete eliminar essa conjetura. Com conhecimento preciso do diagrama das em seu organismo em poucos minutos afetariam seu comportamento e suas
de ligações de uma célula e de posse de ferramentas diagnósticas capazes de reações. Ele se surpreenderia realizando atividades e experimentando sensações
apreender a força das várias interações celulares, futuramente os médicos pode­ que nunca realizara nem experimentara. Em muitos casos, o primeiro medica­
rão testar a resposta de nossas células a um medicamento antes de sua adminis­ mento não surtiria efeito. Talvez o deixasse hiperativo ou até mesmo mais
tração. Graças ao mapa da vida, que implica uma pormenorizada compreensão depressivo. Poucas semanas depois, o medicamento teria de ser trocado por um
de como os genes atuam sinergicamente, um dia poderemos diagnosticar doen­ outro, na expectativa de melhores resultados. De rotina, o paciente experimen­
ças como a depressão maníaca ou o câncer antes da manifestação de algum de taria cinco ou seis medicamentos durante meses até descobrir o mais eficaz.
seus sintomas. Esse conhecimento nos ajudará a desenvolver medicamentos Apesar das melhoras, esses medicamentos não curariam a doença. Alterariam
mais acurados e altamente precisos que atuarão tão-somente sobre as células momentaneamente a química cerebral, desencadeando as mudanças ocasiona­
disfuncionais, preservando as células saudáveis. Em suma, serão eficazes contra das pela disfunção da rede genética. Se interrompesse o tratamento, o desequilí­
os males a que se propõem combater. brio químico e os sintomas depressivos voltariam a se manifestar.
Quando se altera a concentração de uma substância química em nosso Daqui a 20 anos a situação poderá transcorrer de forma bem diferente.
corpo por meio de um medicamento, pode-se reduzir os sintomas de uma Diante do mesmo médico, a consulta levará cinco minutos, como no caso de
doença específica. Contudo, como a célula é controlada por uma complexa rede uma gripe qualquer. Um assistente colherá algumas gotas de sangue, e o paci­
dotada de propriedades de mundo pequeno, uma perturbação induzida por ente sairá do consultório de mãos vazias. À noite, adquirirá o remédio na farmá­
medicamento inevitavelmente afeta muitas outras substâncias químicas, possi­ cia mais próxima. No dia seguinte, acordará disposto e satisfeito, como se sentia
velmente acarretando efeitos colaterais indesejados. Pacientes que sofrem de antes da manifestação dos sintomas. Os comportamentos maníaco e depressivo
depressão maníaca podem morrer de doença cardíaca, condição que jamais do paciente terão desaparecido.
experimentaram antes. Além disso, o medicamento que provoca doença car­ Como se produzirá esse avanço? Em primeiro lugar, toda a rede bioquí­
díaca em uma pessoa pode não apresentar efeitos colaterais em um outro indiví­ mica da célula humana terá sido mapeada até lá, o que nos permitirá entender
duo. Afinal, todos nós temos olhos e cabelos de cores diferentes e traços faciais minuciosamente como genes e moléculas diferentes atuam em conjunto. Em
únicos, razão pela qual não surpreende que metabolizemos os medicamentos segundo lugar, o DNA e os chips de proteína, novas tecnologias agora em desen­
também de maneira diferenciada. De posse do mapa da vida e com ferramentas volvimento, estarão no consultório de cada médico, permitindo-lhe monitorar
como os chips de DNA recentemente desenvolvidos que monitoram os links os genes e proteínas que não funcionam a contento nas células do paciente.
entre os genes, os médicos terão condições de obter uma lista detalhada de Embora seja provável que o mapeamento da rede celular humana leve ainda
todas as moléculas e genes afetados por determinado medicamento. A explora­ mais de uma década, o monitoramento instantâneo da atividade genética já
ção dos efeitos colaterais já não será questão de conjetura. Teremos personali­ é possível em alguns laboratórios de pesquisa.
zado a medicina, possibilitando a comercialização e a autorização de medica­ Por volta de 2020, esses avanços mudarão o panorama da medicina como
mentos eficazes para apenas 10% da população e potencialmente fatais para um todo. As crianças não serão levadas ao médico com inflamação de garganta
qualquer outro paciente. - a mãe terá um dispositivo portátil, com chip substituível, que indicará que a
inflamação da garganta de Tommy é uma infecção estrepto.cócica e identificará
também a origem dela. A mãe poderá conectar o dispositivo ao computador e
ao arquivo de e-mail do consultório do médico, de modo que quando. Tommy
9. for para a escola, o medicamento já estará à disposição dele na enfermaria. O
mais importante é que esse medicamento não será um antibiótico agressivo que
mata todas as bactérias, perniciósas ou não, existentes em seu corpo. Produzido
S e alguém sofresse de depressão maníaca há alguns anos, a primeira con­ sob medida para extirpar apenas o organismo que infeccionou a sua garganta,
sulta ao médico talvez começasse por um questionário de uma hora para que se será inócuo contra qualquer outra bactéria, minimizando, assim, as chances de
pudesse avaliar com cuidado os pensamentos e os sentimentos desse indivíduo. que ele desenvolva resistência a um antibiótico.
Ao final da entrevista, o paciente deixaria o consultório com uma prescrição
médica. Se ele nunca tivesse percebido que a atividade e o bem-estar de
seu cérebro são em larga medida uma questão de química cerebral; agora, após

172 173
Tal visão não é mirabolante. Na realidade, é modesta, acanhada mesmo. distintos comportamentos exibidos por uma célula típica, a diferença entre o
Trata-se apenas de uma simples interpolação das ferramentas já disponíveis na verme e os humanos é desconcertante: os humanos poderiam ser considerados
maioria dos laboratórios de pesquisa do mundo todo. Esses avanços respal­ 103·ººº vezes mais complexos do que nossos parentes vermiculares!
dam-se em uma guinada fundamental na maneira de encarar a realidade como Se o século XX foi o século da física, o século XXI será, prevê-se, o da bio­
um todo, da vida às doenças. Decorrem da visão sistêmica que agora se tem da logia. Uma década atrás teria sido tentador denominá-lo de século do gene.
célula, como uma rede, e não como um punhado de substâncias químicas Poucos ousariam dizer isso a respeito do século que se inicia. Muito provavel­
isoladas. mente será um século de complexidade. Deve ser também um século de redes
biológicas. Se existe algum campo em que o pensamento de rede pode desenca­
dear uma revolução, provavelmene é no da biologia.

10.
O projeto genoma é a apoteose do gene. Até recentemente, acreditávamos
que toda a história biológica de um ser humano estava codificada nos 3 bilhões
de letras do DNA helicoidal. Não há dúvida de que o mapeamento do genoma
humano revolucionou a · pesquisa biológica, mas mostrou também que só conhe­
cemos realmente uma diminuta parcela do vasto mundo e que muito ainda há a
ser explorado.
Em 1996, a decodificação do genoma da levedura causou comoção na
comunidade científica: ele continha 6.300 genes. A expectativa era que só a
cerca de um quarto desses genes se pudesse atribuir vagas funções. Para marcar
posição e estimulados pela importância percebida dos seres humanos como o
ápice da evolução, os biólogos estimaram que o genoma humano teria, no
mínimo, 100 mil genes. Acreditava-se que essa cifra fosse suficiente para dar
conta da elevada complexidade do Homo sapiens. Aí veio o mês de fevereiro de
2001 e a publicação do genoma humano. Verificou-se, então, que temos menos
de um terço dos genes previstos - apenas 30 mil aproximadamente. Assim, o
incremento de mero um terço em genes explica a diferença que existe entre nós
e o humilde Caenorhabditis _elegans - ideia por demais desafiadora quando con­
sideramos que os 20 mil genes do C. elegans requerem apenas 300 neurônios
para codificar-se, ao passo que nossos 10 mil genes excedentes têm que dar
conta do bilhão de células nervosas presentes em nosso cérebro.
Em síntese, torna-se evidente agora que o número de genes não é propor­
cional à nossa complexidade percebida. Que sentido, 'então, tem a complexi­
dade? As redes indicam a resposta. Formatada em terminologia de rede, nossa
questão se formula nos seguintes termos: quantos comportamentos potencial­
mente distintos pode uma rede genética revelar com o mesmo quantitativo de
genes? Em princípio, duas células idênticas, exceto pelo fato de que um gene
específico está ativo na primeira célula e inativo na segunda, podem compor­
tar-se de maneira diferente. Admitindo-se que cada gene pode ativar-se ou ina­
tivar-se independentemente, uma célula com N genes poderia revelar 2N estados
distintos. Se adotarmos como medida de complexidade o número potencial de

174 175
as duas empresas, os analistas queriam nos convencer de que seria uma combi­
DÉCIMA QUARTA CON·EXÃO nação perfeita. Os mesmos analistas nos tinham dito que a aquisição hostil da
Chrysler pela Daimler-Benz em 1998 também fora uma cartada perfeita para
ambas as companhias. Fora assim a fusão dos titãs da indústria petroleira,
Exxon e Mobil, em 1998; quatro meses depois, houve uma outra aquisição
Economia em Rede importante, pela qual a Amoco foi comprada pela British Petroleum. Mas a lista
de fusões e aquisições que chamaram a atenção não se encerra por aqui. Só em
1998, a Bell Atlantic se fundiu com a GTE, a SBC Communications comprou a
Ameritech, o Bank:America se incorporou ao NationsBank e o Citicorp fundiu-se
ao Travelers Group.
São plausíveis essas fusões? Não, se dermos ouvidos aos ativistas antiglo­
balização, que acusam as grandes corporações de ditar tudo, da política à moda.
São inevitáveis, contudo, se encararmos a economia como uma complexa rede
cujos nós são as empresas e cujos links representam as diversas relações econô­
mico-financeiras que as vinculam. De fato, numa economia em rede, os hztbs
devem avantajar-se à medida que a rede se expande. Para satisfazer sua voraci­
Dez anos atrás, uma iniciante e desconhecida incubadora de Internet era dade de links, os nós da rede corporativa aprendem a absorver os nós menores,
altamente deficitária. Como gerente da Time Warner, um dos diretores da incu­ um método novo que não se observa em outras redes. Como a globalização
badora encarou o problema como oportunidade para a gigante do entreteni­ pressiona os nós em direção ao crescimento, as fusões e as aquisições são conse­
mento em que trabalhava. Sugeriu, então, a um executivo sênior da Time War­ quência natural de uma economia em expansão.
ner que bancasse a incubadora. Com apenas 5 milhões de dólares, o Motivada pelo renascimento das redes na física e na matemática, recente­
conglomerado de mídia ficaria com 11 o/o da companhia. Seria uma ninharia mente uma gama de novas descobertas documentou o poder - universal das
para a Time Wamer e proporcionaria acesso à Internet, à época um canal de redes, da estrutura das empresas ao mercado. Descobrimos que uma rede
distribuição novo em folha. "Se fizéssemos isso", respondeu o executivo sênior, esparsa, formada por alguns executivos poderosos, controla todas as nomeações
dando a entender que se tivesse aceitado a Internet como canal viável de distri­ relevantes nas mil maiores empresas da Fortune; uma rede de alianças deter­
buição para a Timer Wamer, "tudo o que fizemos de 1923 para cá seria jogado mina o sucesso, na indústria da biotecnologia; a estrutura da rede interna da
pela janela". empresa é responsável por sua capacidade de adaptar-se às rápidas transforma­
Sem dúvida, ele era um hábil estrategista financeiro: dez anos depois, os 5 ções do mercado; e as estratégias que se aproveitam da natureza de rede da
milhões de dólares do investimento estariam valendo mais de 15 bilhões de base de clientes determinam o sucesso fenomenal do marketing. Com o predo­
dólares. A aquisição também teria mudado a história. De fato, uma década mais mínio dos links e das conexões, a compreensão dos efeitos de rede torna-se cru­
tarde, Steve Case, CEO do America Online (AOL), a então desconhecida incuba­ cial para a sobrevivência em uma nova economia que evolui _a passos rápidos.
dora de Internet, e Jerry Levin, presidente da Timer Warner, anunciaram a
fusão das duas companhias em coletiva de imprensa dada em Manhattan. Pou­
cos anos antes, a Time Wamer facilmente poderia ter àbsorvido a incubadora de
Internet. Em 2000, porém, era a AOL, empresa de que poucos haviam escutado 1.
falar uma década antes, que fazia sombra ao gigante da mídia.
A Time Wamer tinha conteúdo; a AOL, os meios de fazê-lo chegar ao con­ Independentemente da indústria e do escopo, a rede subjacente a todas as
sumidor. Um pouco antes do estouro da bolha da Nasdaq (National Association corporações do século XX possui a mesma estruttira: uma árvore em cuja raiz se
of Securities Dealers Automated Quotations), na primavera de 2000, Jerry Levin situa o CEO e cujos galhos bifurcados representam as atividades cada vez mais
estava sendo pressionado para ir para as pontocom a fim de reconquistar a especializadas e não sobrepostas dos gerentes de escalão mais baixo· e dos funci-·
atenção de Wall Street, e Steve Case precisava de acesso ao cabo da Time War­ onários. A responsabilidade diminiu à medida que se desce pelos galhos, fin-
ner para chegar à nossa sala de estar. A despeito das diferenças culturais entre

176 177
dando nos operários, que executam as ordens concebidas na instância das intra e intercompanhias e terceirização proliferam. Por tudo isso, empresas que
raízes. pretendem competir em um mercado em rápida transformação estão migrando
Apesar de sua generalização, há muitos problemas na árvore corporativa. do modelo estático e otimizado de árvore para uma configuração dinâmica e
Em primeiro lugar, a informação precisa ser cuidadosamente filtrada ao chegar evolutiva de rede, que proporciona uma estrutura de comando mais maleável,
à hierarquia. Se a filtragem ficar aquém do ideal, a sobrecarga na instância mais flexível. As que resistem à mudança poderão ser simplesmente alijadas
superior, onde se dá a confluência de todos os ramos, poderá ser enorme. À para a periferia.
medida que a empresa se expande e a árvore cresce, a iI).formação no escalão A reestruturação da rede interna da empresa é uma das consequências de
superior inevitavelmente eclode. Em segundo lugar, a integração acarreta um uma economia em rede. Outra consquência é a percepção de que as empresas
imprevisto engessamento organizacional. Um típico exemplo é o das fábricas da nunca atuam isoladamente. Elas colaboram com outras instituições, adaptando
Ford, uma das primeiras plantas industriais a implementar a organização hie­ práticas de negócios que se revelaram eficazes em outras organizações. A cone­
rárquica em sua plenitude. O problema é que eles foram bons demais nisso. As xão estratégica entre a cúpula da companhia e o restante do mundo corporativo
linhas de montagem da Ford foram integradas e otimizadas a tal extremo que -compete em geral ao CEO e aos diretores. Como veremos mais adiante, os efei­
mesmo modificações ínfimas no design dos veículos exigiam a paralisação das tos de rede desempenham papel decisivo nessas interações.
fábricas por semanas ou meses. A otimização gera o que alguns chamam de
monólitos bizantinos, corporações que de tão organizadas se inflexibilizam por
inteiro e se tomam incapazes de responder às mudanças no ambiente de
negócios. 2.
O modelo de árvore se coaduna melhor com a produção em massa, que
representou a fórmula do sucesso econômico até há bem pouco tempo. Hoje em "Quero declarar, de forma categórica e inequívoca, que a senhora
dia, no entanto, o valor reside nas ideias e na informação. Chegamos ao ponto Lewinsky me assegurou em termos taxativos que não manteve -relação sexual
em que podemos produzir qualquer objeto com que sonhemos. Mas a grande com o presidente", leu Vemon Jordan em coletiva de imprensa convocada às
questão é: "O que deveria ser"?. pressas em meio ao escândalo Clinton-Lewinsky. "Mas ele logo teve de bolar
Enquanto as empresas se veem diante da eclosão da informação e da alguns dos álibis mais mirabolantes de sua carreira - para tentar se safar da
necessidade sem precedente de flexibilização em um mercado que muda rapida­ enrascada em que se metera", segundo Eric Pooley, da Time, quando todo
mente, o modelo corporativo encontra-se em meio a uma completa transforma­ mundo passou a pressioná-lo a dar uma explicação satisfatória para os quatro
ção. Não se trata de uma mudança superficial na descrição de cargos de alguns encontros que mantivera e para os sete telefonemas que trocara com a ex-esta­
indivíduos. A questão é repensar radicalmente o tipo de resposta que se há de giária da Casa Branca tentando lhe arrumar um emprego em uma dentre várias
dar ao novo ambiente de negócio da era pós-industrial, denominado de econo­ companhias importantes.
mia da informação. Os pauzinhos que Jordan mexeu para arranjar emprego para Monica
O fator mais visível dessa reestruturação é a passagem de uma organiza­ Lewinsky em uma empresa não surpreenderam quem conhece os bastidores de
ção em árvore para uma organização em teia ou rede, plana, com muitos links Washington. Mas a inabilidade de desviar o foco de si mesn;i.o era algo novo.
transversais entre os nós. Nesse sentido, os recursos valiosos já não são os ativos Líder atuante dos direitos civis na década de 1970, Jordan foi baleado nas cos­
tangíveis, e sim os bits e as informações, a integração das operações passa a ser tas em 1980 por um branco supremacista que o atacou após saber que Jesse
virtual, e não vertical, o escopo das empresas é o 111ercado global, e não o Jackson, a quem realmente queria matar, se encontrava fora da cidade. Desde
doméstico, o tempo de vida dos inventários se reduz de meses a horas, a estra­ esse episódio, Jordan afastou-se dos holofotes, tomando-se o mais poderoso
tégia empresarial migra do topo para a base e os trabalhadores assumem maio­ anônimo do Distrito de Columbia, exímio negociador e superadvogado rara­
res responsabilidades ou se tomam autônomos. mente ouvido ou visto no mundinho midiático de Washington. Como escreveu
Novos produtos requerem novas alianças, internas ou externas à compa­ Pooley na Time, Jordan "fatura um milhão de dólares ao ano por uma advocacia
nhia, demandando uma nova topologia. Em razão disso, aboliram-se os escalões que não lhe exige o ajuizamento de nenhuma ação judicial ou seu compareci­
gerenciais intermediários. Funcionários que antes executavam tarefas de rotina mento aos tribunais, porque suas horas de prática forense transcorrem em sofis­
ou de apoio são guindados, de um dia para o outro, à condição de responsáveis ticados restaurantes, ao celular, nos bancos traseiros revestidos de couro das
pelos principais produtos da empresa. Equipes de projeto, alianças estratégicas

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limusines - fazendo uma habilidosa apresentação aqui, agenciando um lobby mais influente dessa teia, com base na rede formada pelas listas das mil compa­
ali, contornando uma situação embaraçosa antes que chegue aos jornais". nhias da revista Fortune, constituído por 10.100 conselhos de administração
De maneira atípica, Jordan viu-se estampado nos jornais do país inteiro ocupados por 7.682 executivos . Se cada conselheiro desempenhasse suas -fun­
em 1998, com seus encontros. e telefonemas sendo investigados por todo ções em apenas um órgão, a rede se estilhaçaria em minúsculos círculos_ p�ena­
mundo, da mídia ao promotor independente Kenneth Starr. Emergiu como pro­ mente conectados, cada qual do tamanho de um único co1:selho,de adIIllillstra­
eminente nó na emaranhada rede do escândalo Clinton-Lewinsky, frequente­ ção. Mas não é esse o caso. Enquanto 79% dos conselheiros tem assento em
mente apelidado de seis graus de Monica. apenas um conselho, 14% ocupam postos em dois conselh�s ': cer�a �e 7% pres­
Jordan não era nenhum recém-chegado a estes mundos pequenos. Con­ tam serviço a três ou mais órgãos deliberativos. As avaliaçoes mdicaram que
quistara sua posição de destaque como consumado agente de bastidor de Was­ esses poucos conselheiros em situação de sobreposição compõem uma :e�e �o
hington navegando com desenvoltura por uma das mais prestigiosas redes do tipo mundo pequeno, com cinco graus de separação . Efetivamente, a �istancia
tipo mundo pequeno da economia americana, a empresarial. No decorrer dos entre dois conselheiros quaisquer pertencentes ao agrupamento maior, que
anos que precederam o escândalo Clinton-Lewinsky e a presidência Clinton, Jor­ reúne 6.724 executivos, era, em média, de 4,6 apertos de mãos.
dan tomara-se o conselheiro de maior destaque da pequena elite corporativa A natureza de mundo pequeno da rede administrativa se deve aos 21 %
que dirige o mundo empresarial da Fortune 1 000. dos conselheiros que possuem assento em mais de um conselho de administra­
O conselho de administração, colegiado que reúne cerca de uma dúzia de ção, pois são eles que mantêm essa complexa rede integrada. Entre eles, Vemon
indivíduos, detém extraordinário poder no que tange ao monitoramento do Jordan desempenha um papel todo especial. Com assento em dez conselho� de
futuro de uma companhia. É a instância responsável pelas grandes decisões, da administração, nos quais regularmente se eI).contra com 106 outros conselheiros
demissão do CEO por insuficiência de desempenho à aprovação das principais das mil empresas da Fortune, Jordan é o conselheiro de maior centralidade da
fusões e aquisições. Por essa razão, as empresas se empenham ao máximo para elite empresarial, com três apertos de mão de distância da mai0ria dos outros
contratar conselheiros experientes e com bom trânsito no meio corporativo. conselheiros.
CEOs, advogados e políticos de renome costumam ser sondados e cortejados
para ocupar simultaneamente postos de comando em diversos conselhos de
administração.
Embora se considere que conselheiros a serviço simultâneo de várias 3.
empresas possivelmente não encontrem tempo suficiente para se dedicar com
afinco a todas elas, muitas companhias querem que seus executivos tenham A carreira de Jordan é uma vívida demonstração de como o emaranhado
experiência em outros conselhos. À medida que os conselheiros aplicam o mundo pequeno dos conselhos de administração determina a maioria das n�m�­
conhecimento e a experiência adquiridos no exercício de funções deliberativas ações que ocorrem no âmbito das companhias americanas. De fato, na ma10na
de uma empresa a problemas com que se defrontam em outra, essa intrincada das vezes em que participou de um conselho, Jordan já con1;ec�a pelo �eno� um
rede administrativa cumpre função importantíssima na propagação das práticas de seus membros por haver ocupado posições em outros orgaos deliberativos.
corporativas e na preservação da influência política e econômica das grandes No início da década de 1970, na qualidade de presidente . da Liga Nacional
corporações. Urbana, influente organização dos direitos civis, Jordan reiteradas vezes defen­
Pelo relevante papel que exercem os conselhos de administração na con­ deu a inclusão dos negros na poderosa elite empresarial dos Estados Unidos. Em
formação do panorama da vida empresarial americapa, a rede administrativa 1972, John Brooks, presidente da Celanese Corporation, fabricante de produto�
costuma ser enfocada na literatura de negócios. Só recentemente, no entanto, químicos, disse-lhe: "Você deve investir seu dinheiro on�e _ está :,ua boca ... Vo:e
com o advento de métodos de análise de redes complexas, passamos a perceber defende· a participação de negros nos conselhos de admmistraçao. Por que nao
em que medida o poder dessa teia é função de sua emaranhada topologia. vem para o conselho da Celanese?".
Na rede administrativa, cada nó é um membro do conselho de administra­ .
Admitido no conselho de administração da Celanese, Jordan recebeu dois
ção conectado a outros conselheiros com assento no mesmo órgão. Com milha­ telefonemas convidando-o a integrar os do Marine Midland Bank e do Bankers
res de companhias, cada qual com cerca de uma dúzia de conselheiros, a rede Trust. Indeciso entre um e outro, telefonou para pedir a opinião de John
resultante é bastante extensa. Gerald F. Davis, Mina Yoo e Wayne E. Baker, da Brooks. ''Você não tem escolha. É o Bankers Trust'', respondeu-lhe Brooks sem
University of Michigan Business School, recentemente estudaram o componente meias palavras. Quando Jordan perguntou "por quê?", Brooks se limitou a res-

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ponder: "Como você acha que conseguiu a indicação para o conselho do B an­
kers Trust? Eu faço parte do conselho. Indiquei você". No Bankers Trust, Jordan 4.
trabalhou com William M. Ellinghaus, que ocupara cargo de direção também na
JC Penney. Um ano mais tarde foi convidado para o conselho dessa instituição. Embora as universidades e as empresas por elas criadas, pequenas indús­
Três anos depois, Jord an pediu a Peter McCullough, CE0 da Xerox, que trias de biotecnologia, constituam hoje a força propulsora na produção de novos
assumisse o cargo de presidente corporativo da Liga Nacional Urbana. McCul­ medicamentos, o capital e a experiência necessários à realização de pesquisas
lough aceitou, mas com uma condição: "Serei seu presidente corporativo desde clínicas de larga escala e à comercialização em âmbito global continuam em
que você venha para o conselho de administração da Xerox''. Jordan topou. Três poder dos grandes laboratórios químico-farmacêuticos. Como os custos de pro­
anos depois de tomar-se conselheiro da Xerox, Jordan foi convidado a integrar dução e comercialização de uma nova droga podem variar de 150 milhões a 500
o conselho de administração da American Express, no qual dois outros conse­ milhões de dólares, as várias instituições que intervêm nessa área, compreen­
lheiros da Xerox haviam ocupado anteriormente. Não foi surpresa alguma dendo desde as universidades e laboratórios de pesquisa até as agências gover­
quando, em 1980, Jord an se tomou membro do conselho de administação da RJ namentais, as indústrias do ramo químico-farmacêutico e os fundos de capital
Reynolds. De fato, o CE0 da Celanese e um outro conselheiro da JC Penney de risco são obrigados a formar parcerias estratégicas. Essas alianças e a incipi­
haviam servido no conselho da RJ Reynolds, e Jordan mantinha ligações próxi­ ente indústria biotecnológica representam um caso anormalmente bem do.cu­
mas também com o CE0 dessa instituição, que fora associado do conselho da mentado de formação de rede, permitindo-nos acompanhar e entender a emer­
Celanese. gência das redes nos sistemas econômicos.
Contatos pessoais permitem que os conselheiros indiquem futuros candi­ Desde o início, a indústria biotecnológica revelou os atributos essenciais
datos. Assim, a dinâmica de mundo pequeno contribui para a formação de uma de uma rede em expansão. Essa expansão foi captada em um dinâmico grafo
poderosa '.'rede de velhos amigos", ou elite empresarial, que desfruta prestígio desenvolvido por Walter W. Powell, Douglas White e Kenneth W. Kou,pt, retra­
ímpar na vida econômica e política do país. O atual emprego de Jordan no Akin, tando a rede de biotecnologia em diferentes estágios de sua evolução, entre
Gump, Strauss, Hauer & Feld, uma das maiores bancas de advocacia de Was­ 1988 e 1999. Em 1988, que representa os primórdios da indústria, havia muitos
hington, também pode remontar a essa rede de velhos amigos: Robert S. Stra­ menos links do que nós: 79 organizações conectadas por apenas 31 links.
uss, sócio responsável pela contratação de Jordan, foi membro do conselho de Segundo a célebre previsão de Erdós-Rényi, a rede deveria ter se pulverizado
administração da Xerox. em uma miríade de minúsculos aglomerados (clusters). Mas, na realidade, os
A trajetória de Jord an não tem nada de extraordinário. Sabe-se que os nós formavam dois grandes componentes, um com 27 e o outro com quatro
efeitos de rede estão presentes em todas as indústrias. No Vale do Silício, por organizações. 011 seja, nenhum dos 31 links se perdeu - cada um deles contri­
exemplo, a intensa rotatividade dos trabalhadores cria profundas relações pes­ buiu para um componente maior, desenvolvendo algumas empresas de biotec­
soais intercompanhias. Esses tênues contatos sociais são amplamente mobiliza­ nologia em seu entorno, o que acarretou um nível de conectividade que não
dos para contratar novos funcionários e atrair gerentes. Como os funcionários poderia emergir em uma rede randômica. Alguns hubs já perceptíveis nesse
atuais podem dar referências de seus contatos sociais, da mesma forma como os estágio inicial foram empresas de biotecnologia pioneiras, como Centocor,
membros de um conselho de administração podem dar recomendações de seus Genzyme, Chiron, Alza e Genentech. Sem elas, a rede de biotecnologia teria se
pares, os trabalhadores admitidos por mediação das redes sociais se demitem fragmentado em uma série de lillilÚsculos nós desconectados:
com menor frequência e têm melhor desempenho funcional do que os que são Mas a existência de poucas companhias com grande número de parcerias,
contratados por outros meios. semelhantes a hubs, não basta para identificar a natureza da rede. Para tanto, é
A intrincada natureza dos conselhos de administração e da teia de conta­ preciso analisar a distribuição de grau, objeto de um estudo há pouco desenvol­
tos pessoais dos trabalhadores do Vale do Silício exemplifica a complexidade vido por dois economistas, Massimo Riccaboni e Fabio Pammolli, ambos da Uni­
das redes sociais e de poder que impulsionam a economia dos Estados Unidos. versidade de Siena, trabalhando com o físico Guido Cardarelli, da La Sapienza
Entretanto, para saber como uma economia realmente funciona, é necessário Universidade de Roma, Itália. O trabalho desses pesquisadores baseou-se em
entender como se processam as interações recíprocas das empresas e de outras dados coletados pelo Phamaceutical Industry Database, hospedado pela Univer­
instituições econômicas geridas por esses executivos altamente conectados. sidade de Siena, que fornece informações a 3.973 convênios de pesquisa e
desenvolvimento entre 1.709 empresas e instituições. A análise indica que os
hubs observados por Powell, White e Koput não são acidentais, mas fundamen-

182
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tados na natureza sem escala da rede subjacente à indústria farmacêutica. De transação, e a direção aponta do fornecedor para o receptor. A estrutura e a
fato, o número de companhias que firmaram parceria com exatatamente k evolução dessa rede pesada e direcionada determinam o resultado de todos os
outras instituições, representando o número de links que possuem no interior da processos macroeconômicos.
rede, obedeceu a uma lei de potência, a característica de uma topologia sem Segundo Walter W. Powell, em Neither Market nor Hierarchy: Network
escala. Uma hierarquia de grandes corporações bem conectadas reuniu um Forms of Organization, "nos mercados, a estratégia-padrão é barganhar ao
imenso contingente de pequenas empresas, integrando todos os agentes em máximo na transação imediata. Já nas redes, em geral, prefere-se criar uma
uma crescente economia sem escala. relação de compromisso e confiança a longo prazo". Por conseguinte, em uma
Como as atividades de pesquisa, inovação, desenvolvimento de produto e economia de rede, compradores e fornecedores são não competidores, mas par­
marketing se especializam cada vez mais e se dissociam umas das outras, con­ ceiros. A relação que se estabelece entre eles é, usualmente, duradoura e
vergimos para uma economia em rede na qual alianças e parcerias estratégicas estável.
são os meios de sobrevivência em todas as indústrias. Os vínculos intercompa­ A estabilidade desses links permite às companhias concentrar-se em sua
nhias de fornecedores e subcontratantes são bastante documentados no sudo­ · atividade-fim, seu core business. Em caso de violação das parcerias, os danos
este da Alemanha e no centro-norte da Itália; as empresas japonesas há muito podem ser graves. Na maioria dos casos, eles se restringem aos parceiros do link
se respaldam em colaborações interempresariais para distribuir responsabilida­ afetado. Às vezes, porém, contagiam toda a economia. Como veremos em
des pelas inovações tecnológicas; o modelo de negócio coreano congrega diver­ seguida, os desequilfbrios macroeconômicos podem arrastar nações inteiras a
sas empresas sob o guarda-chuva dos grandes conglomerados; o Vale do Silício profundas crises financeiras, enquanto as falhas nas parcerias empresariais
regularmente se beneficia das transferências de tecnologia decorrentes da cola­ podem prejudicar seriamente as joias da noya economia.
boração entre incumbadoras e empresas tradicionais. Essas alianças fluidas,
periodicamente renegociadas quando o mercado muda ou o escopo das partes
se altera, dão uma ideia do futuro ambiente de negócios em termos mundiais.
6.
Em 5 de fevereiro de 1997, a Somprasong Land, empresa tailandesa de
desenvolvimento imobiliário, não conseguiu pagar juros de 3,1 milhões de dóla­
5. res de uma dívida conversível em euro. Numa economia globalizada, em que tri­
lhões de dólares mudam de mão diariamente, essa cifra é uma bagatela. Não
A despeito do relevante papel que essas alianças intercompanhias desem­ surpreende que tal incidente tenha passado despercebido do investidor médio.
penham na economia, a teoria econômica, surpreendentemente, pouca atenção Embora muitos não tenham se dado conta, essa simples inadimplência foi o
presta às redes. Até há pouco tempo, os economistas encaravam a economia estopim de uma crise que desestruturou a arquitetura financeira mundial.
como um conjunto· de indivíduos autônomos e anônimos que interagem unica­ Um mês depois, o governo tailandês tomou a primeira de uma série de
mente por meio do sistema de preço, modelo que se costuma denominar padrão medidas desesperadas para salvar a economia do país de um iminente colapso,
fonnal da economia. Pressupunha-se que as ações individuais das empresas e anunciando que compraria 3,9 bilhões de dólares de dívidas imobiliárias inopor­
dos consumidores acarretavam pouca consequência ao estado do mercado. tunas de instituições financeiras. Dias depois, faltou com a promessa, o que
Compreendia-se melhor o estado da economia por agregados macroeconômicos, alguns analistas financeiros interpretaram como sinal de estabilidade. O diretor
como emprego, renda ou inflação, ignorando-se· os microcomportamentos do Fundo Monetário Internacional, Michel Camdessus, posteriormente criticado
inter-relacionados responsáveis por esses agregados. Considerava-se que empre­ pelo papel que sua instituição desempenhou na crise financeira da Ásia, decla­
sas e grupos econômicos interagiam não entre si, mas com "o mercado", enti­ rou: "Não vejo razão para o aprofundamento dessa crise".
dade mítica que medeia todas as interações econômicas. Os desdobramentos do episódio mostraram que Camdessus estava equivo­
Na realidade, o mercado nada mais é que uma rede direcionada. Empre­ cado. Duas semanas depois, o setor financeiro estremeceu na Malásia, levando o
sas, grupos econômicos, instituições financeiras, governos e todos os potenciais Banco Central do país a restringir os empréstimos. Enquanto isso, a Sammi
agentes econômicos constituem os nós. Os links quantificam as várias interações Steel, a principal empresa dos 26 maiores conglomerados da Coreia, pediu con­
que ocorrem entre essas instituições, envolvendo compras e vendas, convênios cordata, primeiro passo em direção à falência. Em maio, o Japão sugeriu que
,1 de pesquisa e projetos de marketing etc. O peso dos links captura o valor da elevaria as taxas de juros para conter a queda do iene (que nunca aconteceu),
'i

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desencadeando vendas globais de moedas do Sudeste asiático e derrubando o antes. Certamente não foi a última, a despeito das medidas que bancos e gover­
mercado de ações local. Uma semana depois, a Tailândia não conseguiu salvar nos parecem ter adotado para evitá-la.
sua maior instituição financeira, a Finance One, que efetivamente foi à bancar­ Esses eventos não podem ser explicados dentro de um marco no qual
rota. O episódio provocou um forte ataque especulativo contra a moeda tailan­ todas as organizações interagem apenas com um mítico mercado. As falhas em
desa, bath, que, a despeito das reiteradas promessas em contrário do governo, cascata são decorrência direta de uma economia em rede, de interdependências
foi abandonado em 2 de julho. induzidas pelo fato de que, em uma economia global, nenhuma instituição pode
AB falhas em cascata de empresas e instituições financeiras na Tailândia, funcionar sozinha. A compreensão das interdependências macroeconômicas em
na Indonésia, na Coreia e nas Filipinas ocupariam centenas de páginas para ser termos de redes pode nos ajudar a prever e limitar crises futuras. Pensar as
inteiramente documentadas, assim como a crônica das incriminações, com des­ redes pode nos ensinar a monitorar a trajetória do prejuízo e erguer barreiras
taque para a crítica feroz do primeiro-ministro malaio, Mahathir Mohamad, aos protetoras, identificando e reforçando os nós capazes de conter a propagação de
"especuladores trapaceiros", que culminou em um pronunciamento na conferên­ incêndios macroeconômicos.
cia anual do FMI/Banco Mundial, em que chamou de imoral a especulação com Não devemos nos permitir acreditar que essas falhas em cascata, como a
moeda. George Soros, grande financista internacional, respondeu no dia crise asiática e suas congêneres latino-americanas, são efeitos colaterais de sis­
seguinte: "Dr. Mahathir é uma ameaça a seu próprio país". temas financeiros instáveis de nações que se encontram em rápido processo de
Alguns economistas responsabilizaram "as distorções estruturais e políticas desenvolvimento. Economias maduras como a dos Estados Unidos, que dispõem
dos países da região" pela crise financeira. Entretanto, Clinton e sua equipe eco­ de recursos financeiros e de capacidade técnica para sanar as falhas antes que
nômica, no relatório econômico do presidente ao congresso americano em assumam proporções globais, não estão imunes a falhas em cascata. AB vulnera­
1999, sustentaram que a crise "não se devia a problemas relacionados com os bilidades relacionadas à interconectividade estão presentes também em econo­
fundamentos econômicos". Menos de um ano depois dos acontecimentos, Paul mias estáveis, como o estouro da bolha das pontocom evidenciou.
Krugman, professor de economia e assuntos internacionais da Universidade de
Princeton, sintetizou o sentimento geral: "Parece seguro afirmar que ninguém
previu nada parecido com a atual crise asiática". Algumas pequenas e pontuais
dificuldades financeiras haviam deflagrado uma reação em cadeia de falhas que 7.
se alastraram pelas fronteiras nacionais, provocando profunda desvalorização
cambial e quedas no mercado de capitais da Ásia à América do Sul. Por fim, No final de 1999, o PC de bolso da Compaq tornou-se o carro-chefe da
provocou a maior perda individual de pontos de todos os tempos da média companhia. Como discutido em recente estudo de Strategy & Business, a
industrial do índice Dow Jones, que desabou 554,26 pontos em 27 de outubro demanda pelo equipamento superou 25 vezes a capacidade de suprimento,
de 1997. levando os executivos da Compaq a sonhar que, com suporte e acessórios, os
Como pôde a falha de uma empresa grande, mas que estava longe de ser equipamentos portáteis logo poderiam proporcionar um mercado maior do que
uma empresa dominante ÍÍa área de desenvolvimento patrimonial, abalar o os tradicionais PCs. Foi aí que os problemas começaram a aparecer.
maior mercado acionário do planeta e levar o presidente da "nação mais pode­ Compaq, Cisco Systems e diversas-outras empresas são líderes de um nova
rosa do mundo" a dar explicações mesmo dois anos depois dos acontecimen­ estratégia empresarial: a terceirização. A Cisco, que há pouco· tempo estava na
tos? Se encararmos a economia como uma rede altamente conectada de empre­ iminência de tomar-se a primeira companhia de 1 trilhão de dólares, é a força
sas e instituições financeiras, poderemos começar a entender esses eventos. Em propulsora dessa tendência. Obtivera de 30% a 40% de crescimento de receita
tais redes, a falha de um nó tem pouco efeito sobre a integridade do sistema. anual com uma nova e agressiva estratégia de produção: não produzia nada do
Ocasionalmente, porém, a ruptura de alguns nós bastante seletos acarreta uma que vendia. Pelo contrário, estabelecera sólidos vínculos com grande número de
cascata de falhas que pode abalar a· totalidade do sistema. fabricantes que construíam e montavam as peças vendidas sob a marca Cisco. A
A crise asiática foi um exemplo em larga escala de uma falha financeira Compaq e muitas outras companhias seguiram seu exemplo.
em cascata semelhante às discutidas no capítulo 9, uma consequência natural A terceirização requer estreita integração dos fornecedores, que devem
da conectividade e da interdependência. Mas não foi a primêira: a América· do garantir o abastecimento pontual de todas as peças. Assim, quando alguns for­
Sul e o México haviam experienciado falhas em cascata semelhantes dois anos necedores não conseguiram entregar certos componentes básicos, como conden­
sadores e memórias flash, a rede da Compaq foi paralisada. A companhia se viu

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diante de 600 mil a 700 mil ordens inacabadas de equipamentos portáteis. Os cebola muito quente para vend-er. Em 4 de julho de 1996, ele e seu parceiro,
PCs de US$ 499 estavam sendo vendidos a US$ 700 ou US$ 800 em leilões do Jack Smith, lançaram um serviço que oferecia nada menos que e-mail - grátis
eBay e da Amazon.com. A Cisco enfrentou um problema diferente, mas igual­ para qualquer pessoa no mundo. Batizaram-no de Hotmail. Mais ou menos· no
mente prejudicial. Quando os pedidos escassearam, a Cisco descuidou-se da final do ano, eles haviam conseguido a adesão de 1 milhão de usuários, cada
desativação de sua cadeia de suprimento, o que resultou em um aumento de um dos quais via diariamente o banner publicitário mostrado em sua conta de
300% de seu custo de estoque de matérias-primas. e-mail, a principal fonte de receita do Hotmail. Quando a Microsoft bateu à
Os números finais são estarrecedores: a perda de valor agregado de mer­ porta um ano depois, aproximadamente 10 milhões de usuários possuíam con­
cado entre março de 2000 e março de 2001 das 12 principais companhias que tas do Hotmail. Bhatia tinha apenas 28 anos de idade quando, após fazer um
adotaram a terceirização - Cisco, Deli, Compaq, Gateway, Apple, IBM, Lucent, tour pelos 26 prédios do império da Microsoft, em Redmond, Washington, e de
Hewlett-Packard, Motorola, Ericson, Nokia e Nortel - superou 1,2 trilhão de apertar a mão de Bill Gates, foi conduzido a uma sala em que se encontravam
dólares. A dolorosa experiência dessas companhias e de seus acionistas constitui 12 negociadores da Microsoft. Eles lhe ofereceram 160 milhões de dólares.
uma vívida demonstração do que ocorre quando se ignoram os efeitos de rede. "Darei retomo aos senhores", disse Bathia, e foi embora.
A postura individual, em que o equilíbrio financeiro imediato da companhia é o Atualmente, o Hotmail tem cerca de um quarto de todas as contas de
único fator, limita o pensamento de rede. Não compreender de que maneira as e-mail. É o maior provedor de serviço de correio eletrônico na Suécia e na Índia,
ações de um nó afetam outros nós é uma limitação que facilmente compromete países em que nunca fez propaganda. Ao final, a Microsoft pagou 400 milhões
todos os segmentos da rede. de dólares pela companhia, a qual, um ano depois, antes do estouro da bolha
Os especialistas concordam que essas perdas em cascata não são um das pontocom, valia 6 bilhões de dólares.
aspecto inevitável da economia em rede. Pelo contrário, essas companhias Como uma incubadora deficitária conseguiu a adesão de um quarto de
falharam porque terceirizaram seu processo produtivo sem compreender plena­ todos os usuários de e-mails? A resposta é simples: eles exploraram o poder das
mente as mudanças que se faziam necessárias em seu modelo de negócio. O redes, utilizando uma.nova e potente técnica de marketing chamada "marketing
pensamento hierárquico não se coaduna com uma economia em rede. Em orga­ viral''; que funciona segundo o mesmo princípio que possibilitou a Love Bug cir­
nizações tradicionais, mudanças bruscas podem ser implementadas no âmbito cular pelo planeta em poucas horas. O vírus de computador infectou todo
interno, com algumas das perdas resultantes sendo compensadas por ganhos mundo vasculhando a lista de e-mails que armazenamos em nosso programa
auferidos em outras partes da hierarquia. Em uma economia em rede, por sua Microsoft Outlook e enviando uma cópia sua para cada um dos endereços cons­
vez, cada nó deve ser lucrativo. Por não compreender isso, os grandes jogadores tantes da lista. Graças a uma inovação semelhante, os usuários do Hotmail
do jogo de rede se expuseram a riscos ele conectividade sem tirar partido de voluntariamente oferecem o mesmo serviço.
suas vantagens. Quando os problemas surgiram, eles não conseguiram tomar as Tim Draper, da empresa de capital de risco Draper, Fisher e Jurvetson,
decisões certas, porém difíceis, como a de paralisar a cadeia de suprimento, no após fornecer 300 mil dólares de capital inicial para o lançamento do Hotmail,
caso da Cisco, e se encontraram em dificuldades ainda maiores. persuadiu Bhatia e Smith a adicionar uma linha extra ao final de cada mensa­
Quer no nível macroeêonômico, quer no nível microeconômico, a econo­ gem: "Obtenha seu e-mail particular e grátis em http: //www.hotmail.com".
mia em rede veio para ficar. A despeito de algumas perdas consideráveis, a ter­ Assim, toda vez que enviam e-mails para seus amigos, os usuários do Hotmail
ceirização será uma prática cada vez mais comum. As interdependências finan­ divulgam e chancelam a companhia. As novidades sobre o Hotmail trafegam em
ceiras, ignorando as fronteiras nacionais e continentais, não serão senão uma rede sem escala, utilizando exatamente as mesmas rotas que ajudaram a
reforçadas com a globalização. Está se formando uma revolução na área de ges­ propagar o Love Bug. Como o limiar crítico de disseminação de inovação desa­
tão. Ela adotará uma nova visão da economia orientada para redes e uma com­ parece em redes desse tipo, era provável que o Hotmail obtivesse sucesso. O que
preensão das consequências da interconectividade para aplainar o caminho. surpreendeu foi a rapidez e a magnitude que alcançou.
Qual a origem do sucesso fenomenal do Hotmail? A resposta encontra-se
em parte no estudo de Trieste discutido no capítulo 10. Inovações e produtos
8. com elevada taxa de disseminação possuem maior chance de conquistar uma
parcela considerável da rede. O Hotmail incrementou sua taxa de disseminação
Sabeer Bhatia não sabia como vender uma empresa. Entretanto, nascido e abolindo certas restrições que as pessoas enfrentam nesses casos. Em primeiro
criado na Índia, sabia comprar cebolas. É preciso negociar. Agora ele tinha uma lugar, é grátis; logo, não há por que considerar se está se realizando um investi-

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mento razoável. Em segundo lugar, a interface do Hotmail facilita muito a ade­ 9.
são. Em dois minutos já se tem uma conta; logo, não há investimento de tempo.
Em terceiro lugar, aberta a conta, toda vez que se envia um e-mail, divulga-se O s efeitos de rede proliferam no mundo dos negócios. Vimos Vemon Jor­
gratuitamente o Hotmail. Combine esses três fatores e o resultado será um ser­ dan navegando com sucesso na complexa rede corporativa, tomando-se um
viço com elevada taxa de contágio, um mecanismo embutido para dissemi­ influente membro da elite empresarial americana. Vnnos o Hotmail tirar partido
nar-se. As teorias tradicionais de marketing ensinam que a combinação de ser­ da natureza sem escala da rede do consumidor para tomar-se o maior provedor
viço gratuito, de fácil aprendizado e rápido alcance através do marketing de mundial de correio eletrônico. A lista não para por aqui. Motivada pela evolu­
consumidor colocou o produto acima do limiar, razão pela qual se generalizou. ção do mercado, uma gama de novas empresas jurou colocar o pensamento de
Com base em nossa compreensão do fenômeno da difusão em redes complexas, rede no cerne de seus modelos de negócios. Apesar desse esforço, os registros
sabemos que essa explicação é só parcialmente correta. É verdade que se tem demonstram que os resultados obtidos por essas empresas têm sido, na melhor
uma altíssima taxa de disseminação. Mas também não se tem limiar algum. Pro­ das hipóteses, variados.
dutos e ideias se disseminam por ser adotados pelos hubs, os nós altamente Tomemos, por exemplo, o caso da SixDegrees.com, incubadora sediada em
conectados da rede de consumidor. Nova York que pediu a seus membros que apresentassem os nomes de seus ami­
Pode o Hotmail ser replicado? Não aposte nisso. Veja, por exemplo, o caso gos, convidando-os a participar. Se eles aderissem, também indicariam os
da EpidemicMarketing.com, empresa que desembolsou 2, 1 milhões de dólares nomes de seus amigos. Passo a passo, a SixDegrees obteve um detalhado mapa
em publicidade no trigésimo segundo Super Bowl em 2000, sonhando alto em da rede social de seus membros, permitindo-lhes acessar qualquer pessoa a dois
explorar o poder das redes. No anúncio do Super Bowl, um homem entra em links de distância deles. Esse marketing viral orientado para o consumidor possi­
um banheiro público e recebe uma gorjeta do atendente, em vez de gratificá-lo, bilitou à SixDegrees a adesão de mais de 3 milhões de consumidores. Apesar
como é de praxe. A grande sacada da Epidemie, como ela mesma declarou em disso, a incubadora baixou as portas em 30 de dezembro de 2000, sem conse­
seu comercial, foi recompensar as pessoas por realizarem atividades que fazem gu ir transformar os seis graus em um viável plano de negócio.
todo dia. Seu modelo de negócio era remunerar os consumidores para adiciona­ O estouro da bolha das pontocom é frequentemente atribuído ao pensa­
rem links a empresas de Internet em seus e-mails enviados. Eperava-se assim mento unidimensional de muitos entusiastas da Internet. Inúmeras incubadoras
que informação sobre uma companhia ou promoção se disseminasse ampla­ se respaldaram na simples filosofia de que a oferta de bens e serviços on-line era
mente pelo boca a boca, replicando o sucesso fenomenal do Hotmail. O modelo, suficiente para replicar as histórias de sucesso da nova economia. Entretanto,
contudo, carecia de um elemento crucial do marketing viral: as pessoas para as com exceção de poucas incubadoras que começaram desde cedo, como Ama­
quais se mandava e-mail tinham pouco interesse em repassar o link para seus zon.com, AOL ou eBay, a maioria faliu. O verdadeiro legado da Internet não é o
conhecidos. Não surpreendeu, então, quando a Epidemie fechou as portas e nascimento de milhares de novas companhias virtuais, e sim a transformação
demitiu seus 60 funcionários em junho de 2000, após torrar os 7,6 milhões de das empresas existentes. Podemos ver seu sinal em tudo, das lojinhas de bairro
dólares que captara. aos grandes conglomerados transnacionais.
O Hotmail demonstra o poder das redes de consumidor. Alguns produtos As redes não oferecem uma droga milagrosa, uma estratégia que nos torna
não carecem de telemarketing dispendioso ou de publicidade na televisão e nos invencíveis em qualquer ambiente de negócios. O papel r�almente importante
jornais para subsistir. Simplesmente se disseminam pelo boca a boca como um que as redes desempenham consiste em ajudar as organizações estabelecidas a
vírus. Embora possa não funcionar para todos os produtos, a inserção de ele­ adaptar-se rapidamente às mudanças das condições de mercado. O verdadeiro
mentos do marketing viral é capaz de alavancar praticamente todas as vendas. conceito de rede implica uma abordagem multidimensional.
Não obstante, o fiasco da Epidemie indica que o Hotmail não pode ser facil­ A diversidade de redes nas empresas e na economia é espantosa. Há redes
mente copiado. Em vez disso, a experiência do Hotmail deve ser o ponto de par­ políticas, redes de propriedade, redes de colaboração, redes organizacionais,
tida para novas abordagens de marketing, combinando estratégias tradicionais marketing de rede etc. Seria impossível integrar essas diversas interações em
com um melhor entendimento dos efeitos de rede. uma única rede abrangente. Porém, independentemente do nível organizacional
que observemos, as mesmas leis robustas e universais que governam as redes da
natureza parecem nos saudar nas nossas redes sociais. O desafio, para a pes­
quisa econômica e de rede é colocar essas leis em prática.

190 191
de Notre Dame, apresentei meu primeiro trabalho de pesquisa sobre redes
ÚLTIMA CONEXÃO complexas.
Em Notre Dame, tentei com pouco sucesso contatar mecanismos de busca
para coligir dados sobre a topologia da Web. Sob pressão para publicar e obter
subvenções, gradativamente substituí as redes por uma pesquisa mais conven­
Teia sem A ranha cional e segura. Mais ou menos no início de 1998, no entanto, estava pronto
para retomar ao pensamento sobre nós e links. Agora estava pedindo a um de
meus alunos que parasse tudo o que estava fazendo para juntar-se a mim nessa
empreitada arriscada. Pouco encorajamento podia eu lhe oferecer àquela época.
Tive de lhe dizer que meu único trabalho sobre redes fora recusado por quatro
publicações e jamais fora editado. Disse-lhe que ela corria o risco de interrom­
per bruscamente a história de sucesso de que fizera parte até então. Mas lhe
disse também que por vezes devemos estar prontos para assumir riscos. A meu
ver, as redes eram algo que valia a pena tentar.
Em 1994, ou mesmo no começo de 1998, ninguém poderia prever o fluxo
de descobertas que remodelariam por completo, nos anos seguintes, a compre­
ensão que tínhamos a respeito de noss9 mundo interconectado. Durante o
almoço com Albert, quando lhe apresentei as redes, não pude lhe falar
Por volta de março de 1998, quando em uma atitude inédita convidei sobre mundos pequenos. Nem mesmo em meus sonhos mais delirantes pude
Réka Albert para almoçar, havia apenas um ano e meio que ela ingressara no imaginar leis de potência ou redes sem escala. Tampouco pude falar sobre tole­
curso de graduação, mas já dispunha de publicações suficientes para obter o rância a erro e ataque, que não constituía questão de pesquisa de rede àquela
doutorado. Um de seus trabalhos, sobre meios granulares e castelos de areia, época. Com efeito, toda problemática digna de estudo sobre a qual pudesse lhe
fora destaque de capa da Nature e da Science News, e os resultados preliminares falar havia se provado desde então mal embasada ou simplesmente irrelevante.
de seus projetos em andamento também eram promissores. Dessa forma, o pro­ Foi o robô de Hawoong Jeorig que nos obrigou a pensar em termos mais
pósito daquele almoço desafiava toda sabedoria: pretendia persuadi-la a desistir amplos. )eong juntou-se a meu grupo como pesquisador com pós-doutorado em
da pesquisa que tão bem levara a cabo até então para dar início a algo inteira­ agosto de 1998, cinco meses depois que Albert e eu assumimos as redes como
mente novo. Falei-lhe de meu sonho de estudar as redes. objeto de pesquisa. Graduado havia pouco pela prestigiosa Seoul National Uni­
Quatro anos antes, no outuno de 1994, com um doutorado que acabara de versity, da Coreia, a fascinação e o conhecimento de Jeong sobre computadores
obter em física teórica, eu iniciara um pós-doutorado na lendária torre de mar­ eram prodigiosos. Certo dia, após longa noitada de discussão, perguntei-lhe por
fim corporativa da IBM, o-T. J. Watson Research Center, em Yorktown Heights, acaso se seria capaz de construir um robô para mapear a Web. Jeong nada pro­
Nova York. Quatro meses depois, já trabalhando lá, tocado talvez pelo espírito meteu. Um mês depois, no entantó, seu computador estava coletando nós e
do lugar, retirei da biblioteca um livro voltado ao público em geral sobre ciência links. Mas naquela época tínhamos alguma familiaridade com a literatura clás­
da computação para lê-lo durante o recesso de Natal. À medida que me debru­ sica sobre grafos e redes randômicas. Assim ficou imediatamente claro que as
çava sobre algoritmos, grafos e lógica booleana, comecei a perceber quão pouco leis de potência detectadas pelo robô representavam um sério desvio em relação
se sabia a respeito das redes em geral. Todas as minhas leituras me diziam que a tudo quanto então se sabia a respeito de redes. Foi só após a construção do
os milhões de cabos elétricos, telefônicos e inteméticos que se enredavam sob o modelo sem escala, contudo, que entendemos por completo quão diferentes as
asfalto de Manhattan formavam uma rede fundamentalmente randômica. redes reais são do universo randômico retratado por Erdós e Rényi.
Quanto mais pensava a respeito disso, mais me convencia de que devia haver Hoje sabemos que embora as redes reais não sejam tão randômicas quanto
alguns princípios organizacionais que governam as complexas redes que nos viam Erdós e Rényi, acaso e aleatoridade efetivamente desempenham impor­
cercam. Sonhando identificar alguns sinais de ordem, passei a estudar teoria de tante papel em sua construção. As redes reais não são estáticas, como eram
rede, principiando com os clássicos trabalhos de Erdós e Rényi. Antes de deixar todos os modelos teóricos de grafos até há bem pouco tempo. Pelo contrário, o
a IBM, no outono de 1995, para assumir a docência em física na Universidade crescimento exerce papel fundamental na modelagem de sua topologia. Não são

192 193
tão centralizadas quanto a rede em estrela. Em vez disso, existe uma hierarquia Um dramático exemplo do caráter difuso dessa nova linguagem sobreveio
de hubs que assegura a integridade dessas redes, um nó fortemente conectado após 11 de setembro de 2001, quando as redes adquiriram um significado que
seguido de perto por diversos nós menos conectados, acompanhados por deze­ antes não era familiar para a maioria de nós. A maioria dos fatores que levaram
nas de nós menores ainda. Nenhum nó central se interpõe no meio dessa teia de à tragédia faz bastante sentido pela perspectiva de rede. AI Qaeda, a rede terro­
aranha, controlando e monitorando cada link e cada nó. Não existe um único nó rista responsabilizada pelos ataques de 11 de setembro, não foi criada em sete
cuja remoção pudesse desintegrar a rede. Uma rede sem escala é uma teia sem dias. Sob a égide de crenças religiosas e da intolerância para com a ordem
aranha: sociopolítica estabelecida, milhares de pessoas foram arregimentadas para a
Na ausência de uma aranha, não existe também nenhum desígnio meticu­ organização radical no decorrer de vários anos. A rede expandiu um nó por vez,
loso por trás dessas redes. As redes reais são auto-organizadas. Elas oferecem assumindo todas as características de uma rede sem aranha. De fato, a AI Qaeda
um vívido exemplo de como as ações independentes de milhões de nós e links não conseguiu se transformar na rede hub-and-spoke, cuja liderança central tem
conduzem a um espetacular comportamento emergente. Sua topologia sem ara­ controle sobre tudo o que acontece em seu meio. Evitou também a estrutura de
nha e livre de escala é consequência inevitável de sua evolução. Toda vez que a árvore, a cadeia de comando característica das organizações militares e das
natureza está pronta para operacionalizar uma nova rede, incapaz de escapar a empresas do século XX. Evoluiu antes para uma rede sem aranha auto-organi­
suas próprias leis, ela cria uma rede cujos traços estruturais fundamentais são zada, na qual uma hierarquia de hubs assegura a coesão da estrutura.
aquelas dezenas de outras redes acionadas anteriormente. A robustez das leis Após 11 de setembro, Valdis Krebs, consultor executivo que normalmente
que governam a emergência das redes complexas é a explicação para a onipre­ utiliza a teoria de rede para analisar as comunicações corporativas, reuniu um
sença da topologia sem escala, descrevendo sistemas tão díspares como a rede mapa dos 19 sequestradores que se encontravam a bordo dos quatro aviões
subjacente à linguagem, os links entre as proteínas na célula, as relações sexuais envolvidos nos ataques e das 15 pessoas que as autoridades alegam ter cone­
interpessoais, o diagrama de fiação de um chip de computador, o metabolismo xões com eles. Krebs cuidadosamente inseriu todos os contatos publicamente
da célula, a Internet, Hollywood, a Web, a rede de cientistas conectados por revelados entre esses 34 indivíduos, ponderando os links com base na conhecida
coautorias e a intrincada rede colaborativa .que está por trás da economia, só proximidade da relação. A rede obtida é extremamente reveladora para quem
para citar alguns exemplos. quiser entender as atividades internas da célula mortal que desfechou os ata­
ques. Ela oferece poucas surpresas a quem tem familiaridade com o formato das
redes reais. Mohamed Atta, o suposto mentor dos ataques, é, de fato, o nó mais
conectado. Mas, teve contato direto apenas com 16 dos 23 nós. Logo depois
1. dele está Marwan AI-Shehhi, o segundo nó mais conectado, com links para 14
nós. À medida que percorremos a lista de alto a baixo, encontramos numerosos
Um dos aspectos mais fascinantes do surgimento de uma nova ciência é a nós escassos de links, os soldados periféricos da organização mortífera.
nova linguagem que ela �ngendra, permitindo-nos discorrer causalmente sobre O mapa mostra ainda que, apesar de sua centralidade na estrutura, a
ideias e questões que nos empenhávamos por descrever antes de sua emergên­ remoção de Atta não teria desmantelado a célula. O restante dos hubs teria
cia. O renascimento da teoria de rede fez isso em relação a nosso mundo inter­ assegurado a integridade da rede, p·ossivelmente deflagran_do o ataque sem sua
conectado. Os conectores da sociedade, as estrelas de Hollywood e as espécies ajuda. Muitos suspeitam que a estrutura da célula envolvida nos ataques de 11
fundamentais de um ecossistema são, de repente, apenas manifestações de uma de setembro caracteriza a totalidade da organização terrorista. Por causa de sua
única realidade, e sua importância percebida, dentro do ambiente em que se topologia auto-organizada distribuída, a AI Qaeda é tão dispersa e autossusten­
encontram, é atribuível ao status que desfrutam como hubs no bojo das respecti­ tada que mesmo a eliminação de Osama bin Laden e de seus colaboradores mais
vas redes. O pensamento de rede está em via de invadir todos os domínios da próximos poderia não erradicar a ameaça que eles criaram. Trata-se de uma teia
atividade humana e a maioria dos campos de investigação humana. É mais do sem uma verdadeira aranha.
que uma outra perspectiva ou ferramenta proveitosa. As redes são, por sua pró­ Hoje os agressores mais perigosos do mundo, que vão da AI Qaeda aos car­
pria natureza, a urdidura dos sistemas mais complexos, � os nós e links impreg­ téis colombianos das drogas, não são organizações militares formadas por divi­
nam profundamente todas as estratégias voltadas para a abordagem de nosso sões, e sim redes auto-organizadas de terror. Na ausência de sinais familiares de
universo interconectado. organização e ordem, frequentemente os designamos como "exércitos irregula­
res". Ao fazê-lo, contudo, novamente equiparamos complexidade com aleatori-

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dade. Na realidade, as redes terroristas obedecem a rígidas leis que determinam azul recobriam cada centímetro do prédio, oferecendo um dos espetáculos artís­
sua topologia, estrutura e, portanto, sua capacidade de funcionamento. Explo­ ticos mais belos de nossa época.
ram todas as vantagens naturais das redes auto-organizadas, incluindo a flexibi­ Do portfólio do artista búlgaro Christo e de sua parceira, a artista francesa
lidade e a tolerância a falhas internas. A falta de familiaridade com essa nova Jeanne-Claude, constam obras monumentais como a Pont Neuf, a famosa ponte
ordem e a ausência de terminologia para formalizar nossa experiência talvez parisiense, que foi embrulhada com um drapejado amarelo, e as magníficas Sur­
sejam nossos inimigos mais letais. rounded Islands, as 11 ilhas da Baía de Biscayne, na Flórida, recobertas por 6
Decerto, a batalha contra a Al Qaeda pode e será vencida pelo desbarata­ milhões de metros quadrados de náilon cor-de-rosa. De muitas formas, o embru­
mento da rede, seja pela remoção de hubs suficientes para atingir o ponto crí­ lhamento do Reichstag foi o apogeu de décadas de sua atividade artística de
tico de fragmentação, seja pela drenagem de seus recursos, preparando as bases embrulhar. Não obstante, seria simplista ver os artistas como meros empacota­
para as falhas internas em cascata. Não obstante, o colapso da Al Qaeda não dores de prédios, pontes e monumentos. A obra deles comporta uma poderosa
porá fim à guerra. Outras redes de escopo e ideologia similares não hesitarão filosofia: a "revelação pelo ocultamento". Ao esconder os detalhes, os artistas
em assumir seu lugar. Bin Laden e seus seguidores não inventaram as redes ter­ nos permitem perceber a inteireza da forma. O embrulhamento molda nossa
roristas. Simplesmente fomentaram o ódio dos militantes islâmicos, explorando visão, tomando-nos mais conscientes e observadores, ao mesmo tempo que
as leis da auto-organização no decorrer de sua jornada. Se quisermos vencer a transforma objetos comuns em esculturas monumentais e peças arquitetônicas.
guerra, nossa única esperança é extirpar as raízes sociais, econômicas e políticas Em certo sentido, abordamos o mundo neste livro seguindo o espírito de ·
subjacentes que alimentam o crescimento da rede. Devemos ajudar a eliminar a Christo e Jeanne-Claude. Observando as redes que se encontram por trás de
necessidade e o desejo que sentem os nós de estabelecer links com as organiza­ complexos sistemas como a célula ou a sociedade, ocultamos todos os detalhes.
ções terroristas, oferecendo-lhes oportunidades de pertença a redes mais cons­ Ao vermos apenas nós e links, temos o privilégio de observar a arquitetura da
trutivas e significativas. Independentemente de quão bons nos tomemos ao ven­ complexidade. Distanciando-nos das particularidades, vislumbramos os princí­
cermos cada batalha de rede, se formos incapazes de inibir o desejo de links, o pios organizacionais universais que informam esses sistemas complexos. O ocul­
pré-requisito para a formação dessas redes auto-organizadas letais, a guerra de tamento revelou as leis fundamentais que regem a evolução do mundo em
rede jamais chegará ao fim. forma de teia que nos envolve e nos ajudou a entender como essa intrincada
arquitetura afeta todas as dimensões de nossa vida, da democracia à cura do
câncer.
Para onde vamos a partir daqui? A resposta é simples. Devemos retirar o
2. invólucro. O objetivo é entender a complexidade. Para tanto, precisamos ir além
da estrutura e da topologia e começar a focar a dinâlnica que se processa ao
Em 23 de junho de 1995, o New York Times estampou uma grande imagem longo dos links. As redes são apenas a estrutura da complexidade, as vias dos
do Parlamento alemão, 9_ centenário Reichstag, em sua capa. Foi cinco anos diversos processos que fazem nosso mundo vibrar. Para descrever a sociedade,
ª?ós a reunificação alemã e quase exatamente quatro anos após o Bundestag, precisamos revestir os links da rede social com as interações dinâmicas reais
situado em Bonn, ter votado pela transformação de Berlim na capital da Alema­ intersubjetivas. Para entender a vida, devemos passar a observar a dinâmica
nha novamente unida. Não obstante, a política e o esfacelamento do comu­ reativa que se dá ao longo dos links da rede metabólica. Pàra entender a Inter­
nismo tinham pouco a ver com a renovada atenção mundial para com o Reich­ net, devemos adicionar tráfego a seus emaranhados links. Para entender o desa­
stag. A verdadeira atração para 5 milhões de visitantes que afluíram a Berlim parecimento de algumas espécies de um ecossistema, devemos reconhecer que
durante as duas semanas seguintes foi o fato de que nenhum deles podia efeti­ algumas presas são mais fáceis de capturar do que outras.
vamente ver sequer um pedaço do prédio. As sóbrias paredes cinzentas caracte­ No século XX, chegamos até onde nos foi possível para descobrir e descre­
rísticas do Reichstag; testemunhas sombrias e serenas de um século da convul­ ver os componentes dos sistemas complexos. Nosso empenho por compreender
sionada história alemã, estavam inteiramente invisíveis. Esse símbolo máximo a natureza atingiu um teto de vidro porque ainda não sabemos como montar as
do poder foi embrulhado por um tecido metálico das escadarias ao mastro da peças. As complexas questões com que nos deparamos, em campos que vão dos
bandeira, transformando-o em monumento de art� públi�a. Mais de 1 milhão de sistemas de comunicação à biologia celular, exigem novo enquadramento.
metros quadrados de tecido de polipropileno amarrados por 5 mil pés de corda Empreender a jornada sem a ajuda de um mapa seria desalentador. Felizmente,
a contínua revolução das redes já nos proporcionou muitos dos mapas funda-

196 197
mentais. Malgrado haja ainda muitos "dragões" à nossa frente, a configuração
de um novo mundo tomou-se discernível, continente por continente. E o que é AGRADECIMENTOS
mais importante: descobrimos as leis da cartografia de rede, o que nos permite
esboçar novos mapas sempre que nos virmos diante de novos sistemas. Agora
devemos seguir esses mapas para completar a jornada, encaixando as peças
umas nas outras, nó por nó, link por link, e apreendendo sua dinâmica
interacional. Temos 98 anos para realizar essa proeza e fa�er do século XXI o
século da complexidade.

É impossível agradecer adequadamente a todos os cientistas cujas pes­


quisas me inspiraram. Alguns são mencionados no livro; outros aparecem nas
notas. A maioria, contudo, não figura na exposição. Mas não são menos impor­
tantes. De diversas formas, eles constituem os alicerces desta obra.
Minhas fontes não se limitaram às publicações. Fui extremamente benefi­
ciado pelos alunos e colegas que me abordaram no decorrer dos anos com ques­
tões e ideias atinentes às redes. As discussões que travamos e os e-mails que tro­
camos desempenharam papel crucial na formatação do conteúdo deste trabalho,
abrindo meus olhos para o pensamento de rede em áreas bem diferentes.
Este livro jamais teria sido possível sem a ajuda de meus ex e atuais alunos
realmente extraordinários, Réka Albert, Ginestra Bianconi, Zoltán Dezsó, illés
Farkas, Erzsébet Ravasz, Soon-Hyung Yook, que escolheram pesquisar redes. As
habilidades excepcionais e a perseverança de Hawoong Jeong, ex-pós-douto­
rado de meu grupo de pesquisa, tomaram possível e divertida nossa jornada em
direção às redes reais. Também estou em débito com numerosos colaboradores,
incluindo Eric Berlow, Jay Brockman, Imre Derényi, Jennifer Dunne, Vincent
Free, Byungnam Kahng, János Kertész, Neo Martinez, Zoltán Néda, Zoltán
Oltvai, Peter Schiffer, András Schubert, Bálint Tombor, Yuhai Tu, Tamás Vicsek
e Rich Williams pelas muitas ideias e ajuda oferecida ao longo .dos últimos anos.
Diversas pessoas forneceram informações que se revelaram cruciais
quando coligimos o material para a produção deste livro. Em 1999, Tibor Braun
enviou-me o conto de Karinthy sobre os cinco graus e Thomas Bass ajudou-me a
entender a obra de Milgram sobre os seis graus de separação. Luis Amaral, Eric
Bonabeau, Guido Caldarelli, Christopher R. Edling, Lee Giles, Mark Granovetter,
Byungnam Kahng, Jeff Kantor, Judith Kleinfeld, Valdis Krebs, Steve Lawrence,
Fredrick Liljeros, Sid Redner, Ricard V. Solé e Alessandro Vespignani partilha­
ram comigo ensaios inéditos, informações e fontes.
Muitas pessoas se prontificaram a ler e comentar o texto nos diversos está­
gios de sua elaboração. Zoltán Oltvai fez um trabalho realmente heroico, ofere­
cendo sugestões linha a linha no intuito de aperfeiçoá-lo. Também fui altamente

198 199
beneficiado pelos comentários e conhecimentos de Réka Albert, Kevin Barry,
Steve Buechler, Reuven Cohen, Gábor Forgács, Viktor Gyuris, Boldizsár Jankó, NOTAS
Hawoong Jeong, Gerald Jones, Jim McAdams, Mark Newman, H. Eugene Stan­
ley, Alessandro Vespignani, Tamás Vicsek, Ed Vielmetti e Eduardo Zambrando.
As discussões realmente estimulantes que encetamos nos almoços com os mem­
bros do Grupo Web, grupo de Notre Dame liderado por Jim McAdams, me aju­
daram a depurar algumas das ideias que finalmente se incorporaram ao livro. O
grupo incluía Sheri Alpert, Kevin Barry, Patricia Louise Bellia, Kathy Biddick,
Jay Brockman, Leo Burke, David S. Hachen, Martin Haenggi, Lionel M. Jensen,
Lee Byung Joo, Jeffrey C. Kantor, Barry Patrick Keating, Gregory Madey, Gail
Hinchion Mancini, Khalil Matta, Kajal Mukhopadhyay, Daniel Myers, Susan
Ohmer e Richard Pierce.
Meus colegas do Departamento de Física, que encorajaram as grandes gui­
nadas que meu trabalho deu nos últimos anos, criaram uma atmosfera real­ PRIMEIRA CONEXÃO: Introdução
mente estimulante para a pesquisa e a elaboração deste livro. Gostaria de agra­
decer particularmente a Bruce Bunker, Margaret Dobrowolska, Jacek Furdyna, Página 2: O episódio de Mafiaboy foi amplamente noticiado na imprensa. Para um
Boldizsár Jankó, Gerald Jones e Kathie Newman pelo constante apoio. Jennifer conjunto de links, veja http://www.mafiaboy.com/. A frase "Sim, eu ouvi você" foi ex­
Maddox, com sua postura profissional e otimista em relação a qualquer pro­ traída de C. Taylor, "Behind the Hack Attack'',. Time Magazine (21 de fevereiro de 2000).
blema de ordem logística que eu pudesse levantar, poupou-me inúmeras horas, Página 3: A vida de São Paulo e seu papel na difusão do cristianismo têm sido objeto
todas as quais foram empregadas neste livro. de inúmeros livros e monografias. Veja, por exemplo, C. J. Den Heyer, Paul: a Mano of
Deborah Justice passou horas editando as primeiras etapas do manuscrito, Two Worlds (Harrisburg: Trinity Press International, 1998), e Robert Jewlett, A Chrono­
ajudando-me a entender os meandros da gramática e da estilística da língua logy ofPaul 's Life (Philadelphia: Fortress Press, 1979) .
inglesa. O livro jamais teria sido concluído sem o dedicado apoio técnico de Les­ Página 6: A complexidade, campo emergente da ciência que tem por objetivo entender.
ley Krueger, que testemunhou em primeira mão a metamorfose de um simples como os sistemas formados por milhões de componentes diversos se comportam e como
rascunho em um livro acabado. Enikó J�ó e Zoltán Dezsó levaram horas atua­ a ordem emerge do caos e da aleatoriedade, sob a égide das leis da auto-organização,
lizando as intermináveis versões do manuscrito, repassando-o rapidamente de encontra-se em franca expansão. Nela atuam cientistas oriundos de dezenas de discipli­
vez em quando. Estou realmente em dívida com Hawoong Jeong, que reiterada­ nas, que vão da matemática à física, passando pela ecologia e pela administração de
mente deu mostras de seu toque mágico e sua infinita paciência na preparação empresas. Para livros populares e textos introdutórios sobre o tema, veja, por exemplo,
dos números finais para o livro. de Murray Gell-Mann, The Quark and the Jaguar: Adventures in the Simple and the Com­
plex (New York: W. H. Freeman, 1995); Hidden Order: How Adaptation Builds Complexity
Agradeço à equipe dá Perseus por todo o apoio prestado e pelo profissio­
(Cambridge: Perseus, 1996); de Ricard V. Solé eBrian Goodwin, Signs ofLife: How Com­
nalismo demonstrado em cada etapa da redação e produção do livro. Não con­ plexity Pervades Biology (New York: Basic Books, 2001); de YaneerBar-Yam, Dynamics of
sigo conceber editores melhores do que Amanda Cook e Joan Benham, cuja ori­ Complex Systems (Cambridge: Perseus, 1997) .
entação editorial tomou este livro bem mais legível. Elizabeth Carduff, Chris
Coffin e Marco Pavia acompanharam o manuscrito pelos meandros do processo
de produção com rapidez excepcional. Agradeço muito a Lissa Warren, que aju­ SEGUNDA CONEXÃO : Universo Randômico
dou na edição, e a Katinka Matson e Brockman, Inc. pela minha parceria com a
Perseus. Página 8 : A vida de Euler encontra-se descrita sucintamente em diferentes lugares.
Linked jamais poderia ter sido iniciado - e muito menos concluído - sem o Para uma recensão atual, veja, por exemplo, a nota biográfica em William Durham,
caloroso entusiasmo de Janet Kelley, que me alentou toda vez que estive na imi­ Euler: The Master of Us All (Washington: Mathematical Association of America, 1999).
nência de desistir. É difícil expressar em palavras quão significativo me foi seu
Página 9: A vida de Euler em São Petersburgo foi bastante tumultuada. Perdeu a
apoio.
esposa de três décadas só para casar-se com a meia-irmã dela três anos mais tarde. Um
incêndio destruiu sua casa e consumiu todos os seus livros e anotações; ele escapou gra-

200 201
ças à bravura de um colega suíço, que caminhou em meio às chamas e transportou nas Página 12: A vida de Erdós inspirou muitos relatos populares. O que consta da intro­
costas o ilustre conterrâneo para fora da casa. dução baseia-se em András Várzsonyi, que era o rapaz de 14 anos de idade na sapataria
e que, mais tarde se tomaria o segundo Ph.D mais jovem da Hungria naquele tempo
Página 10: O frescor e a clareza da escrita de Euler são dignos de nota. O entusiasmo
(depois de Erdós) e amigo de toda a vida deste. Veja Fan Clung e Ron Graham, Erdós on
que revela por seus temas é vibrante mesmo séculos depois. Hoje, quando o estilo acadê­
Graphs: His Legaey and Unsolved Problems (Wellesley: A. K. Peters, 1988). Para biogra­
mico dificilmente é inteligível aos não iniciados, a linguagem despojada de seus textos é
fias populares de Erdós, veja Paul Hoffman, The Man Who Loved Only Numbers (New
invejável. Euler passou cerca de um quarto de século em Berlim, a convite de Frederico,
York: Hyperion, 1998), e Bruce Schechter, My Brain Is Open (New York: Touchstone,
o Grande, rei da Prússia, período durante o qual recebeu proposta para lecionar ciências
1998). Veja também András Hajnal e Vera T. Sós, "Paul Erdós Is Seventy'', Joumal of
naturais à princesa de Anhalt-Dessau, sobrinha do monarca. A obra de 400 páginas
Graph Theory 7 (1983) : 391-393.
escrita como resposta a essa indicação, Letters of Euler on Different Subjeets in Natural
Philosophy, Addressed to a German Prineess, aborda praticamente todos os campos da Página 12: O honroso rol de oito artigos de Erdós e Rényi, que estabeleceram a teoria
ciência, discutindo questões que vão da gravidade da lua à natureza dos espíritos. Letters randômica dos grafos, aparece no ensaio de Michal Karonski e Adrzej Rucinski "The Ori­
to a German Prineess logo se tomou um sucesso internacional. Esse é o mais autêntico gins of the Theory of Random Graphs", in The Mathematics of Paul Erdós, ed. R. L. Gra­
exemplo de escrito científico popular de autoria de um acadêmico que trabalhava nas ham e J. Nesetril (Berlin: Springer, 1997). São eles: On Random Graphs I, Màth. Debre­
fronteiras de seu campo. Veja Leonhard Euler, Letters of Euler on Different Subjeets in cen 6 (1959): 290-297; "On the Evolution of Random Graphs", PubL Math. Inst. Hung.
Natural PhilosophyAddressed to a German Prineess (New York: Amo Press, 1975). Aead. Sei 5 (1960): 17-61; "On the Evolution of Random Graphs", Bull. Inst. Intemat.
Statist 38 (1961): 343-347; "On the Strenght of Connectedness of a Random Graph",
Página 10: As obras coligidas de Euler são publicadas sob o título Opera Omnia (Basel:
Aeta Math. Aead. Sei. Hungar 12 (1961): 261-267; "Asymmetric Graphs", Aeta Math.
Birkhãuser Verlag AG, 1913). Embora sua publicação tenha começado em 1911 e mais
Acad. SeL Hungary 14 (1963) : 295-315; "On Random Matrices", PubL Math. Inst. Hung.
de seis dúzias de volumes tenham vindo a lume, a obra ainda está incompleta.
Aead. Sei 8 (1964) : 455-461; "On the Existence of a Factor of Degree One of a Connec­
Página 10: Um agradável relato dos primórdios da teoria dos grafos, com pano de ted Random Graph", Aeta Math. Aead. Sei. Hungary 17 (1966): 359-368; "On Random
fundo histórico e tradução inglesa dos mais importantes trabalhos nessa área, pode ser Matrices II", Studia Sei. Math. Hung 13 (1968): 459-464.
encontrado em Graph Theory: 1 736-1936, de Norman L. Biggs, E. Keith Lloyd e Robin J.
Página 15: Observe que, desconhecidas de Erdós e de Rényi, bem como da maioria dos
Wilson (Oxford: Clanderon Press, 1976). O livro contém ainda um ensaio original de
matemáticos, as redes randômicas foram introduzidas uma década antes da clássica obra
Euler sobre as pontes de Kõnigsberg.
de Erdós-Rényi, em Ray Solomonoff e Anatol Rapoport, "Connectivity of Random Nets",
Página 10: Para apreciar em mais detalhes os argumentos eulerianos, considere, por Bulletin of Mathematieal Biophysics 13 (1951). Curiosamente, o ensaio deriva o clássico
exemplo, o nó D, que possui três links representando a terra conectados com três pontes, resultado contrário novamente atribuído a Erdós e Rényi de que, quando um grau médio
e, f e g. Quem tentasse cruzar todas as três pontes uina única vez, teria de visitar o nó D atinge 1, surge um gigantesco cluster. É difícil explicar por que o ensaio nunca foi reco­
pelo menos duas vezes. Por exemplo, poderia chegar pela ponte f, deixaria a e e aí viria nhecido como precÚrsor da obra de Erdós e Rényi. Talvez a beleza matemática da prova
novamente pela g. O problema é que essa pessoa não poderia partir de novo, pois não de Erdós tenha sido o aspecto sedutor para os matemáticos, algo notoriamente ausente
deixara nenhuma ponte por percorrer. Logo, D ou é ponto de partida ou é ponto de che­ da derivação heurística de Salomonoff e Rapoport.
gada da travessia. Mas essa não .é uma característica única do nó D: é fácil perceber que
Página 18: A vida de Rényi, contudo, é bem menos destacada na imprensa internacio­
todos os nós com um número ímpar de links possuem essa propriedade. Em outros ter­
nal. Para conhecer um pouco mais de sua matemática e sua vida, veja a série de artigos
mos, uma pessoa que queira visitar todos os nós deve começar ou terminar neles. Os nós
publicados (em húngaro), logo após seu falecimento, em Matematikai Lapok 3-4 (1970) :
A, B, C e D compartilham igualmente essa propriedade, na medida em que todos pos­
Turán Pál. "Rényi Alfred munkássága", 199-210; Révész Pál, "Rényi Alfred valószinü­
suem três links cada um. Isso significa que A, B, C e D devem ser, simultaneamente,
ségszámitási munkássága", 211-231; Csiszár Imre, "Rényi Alfred infonnációméleti mun­
ponto de partida ou ponto de chegada do percurso.
kássága", 233-241; Katona ·Gyula e Tusnády Gábor, "Rényi Alfred pedagógiai munkás­
Página 12: Por exemplo, o problema das quatro cores, que remonta a 1852, permane­ sága, 243-244; B. Mészáros Vilma, "Guibus Vívere est Cogitare", 245-248. Hoje, ele é
ceu indemonstrável até 1976. O problema é bem simples de início: prove que qualquer lembrado pela incubadora recentemente rebatizada dos matemáticos húngaros, o Alfred
mapa pode ser pintado com quatro cores, de tal sorte que dois países fronteiriços não Rényi Institute of Mathematics, em Budapeste.
compartilhem a mesma cor. Quem tentasse colorir um mapa facilmente se convenceria
de que, de fato, quatro cores são suficientes. Entretanto, os matemáticos passaram mais
Página 19: Embora não tenha conseguido cooptar Erdós para a Universidade de Notre
Dame, Arnold Ross deu continuidade a uma carreira bastante profícua como educador
de um século sem atinar com a demonstração, que se tomou o primeiro grande teorema
científico. Fundou o Programa Ross, curso intensivo de verão sobre matemática para
a ser demonstrado com auxílio de computador.
talentosos estudantes de graduação e professores. Ross iniciou seu programa em 1947,
em Notre Dame, e o transferiu para a Universidade de Ohio em 1964, coordenando-o, a

202 203
partir daí, a cada verão. Veja, e.g., Allyn Jackson, "Interview with Arnold Ross", Notices viemos pela primeira vez de uma cidadezinha para Nova York, gostávamos de nos diver­
of the American Mathematics Society 48, n. 7 (agosto de 2001) : 691-697. tir com o jogo das mensagens. A ideia era escolher dois indivíduos bastante diferentes -
digamos, um caçador de talentos das Ilhas Solomon e um sapateiro de Rock Island, Illi­
Página 20: A distribuição de grau de um grafo randômico foi derivada emB.Bollobás,
nois - e imaginar que um deles receberia uma mensagem do outro pelo boca a boca;
"Degree Sequences of Random Graphs", Discrete Mathematics 33 (1981): 1. cada uma de nós imaginava então, em silêncio, uma rede de pessoas, plausível ou pelo
Página 21: Retrospectivamente, não fica claro em que medida a obra de Erdós e Rényi menos possível, através das quais a mensagem poderia ser transmitida. Quem conse­
foi motivada por um desejo de modelar nosso mundo interconectado e em que medida o guisse compor a cadeia plausível mais curta de mensageiros ganhava o jogo".
foi pela beleza matemática do problema em tela. Em seu ensaio original de 1959, eles Página 25: O estudo de Milgram sobre os seis graus de separação foi publicado em
não mencionam aplicações potenciais: "Parece plausível que, considerando-se o cresci­ diversos lugares. Veja, por exemplo, Stanley Milgram, "The Small World Problem",
mento randômico das estruturas mais complexas..., poder-se-ia obter modelos clara­ Physiology Todczy 2 (1967): 60-67. Para seu traballho sobre obediência, que é uma fasci­
mente razoáveis de processos de crescimento real mais complexos (e.g., o crescimento nante leitura por si mesmo, veja Stanley Milgram, From Obedience to Authority (New
de uma complexa rede de comunicação composta de diferentes tipos de conexões e _York: Harper and Row, 1969).
mesmo de estruturas orgânicas da matéria viva etc.)". A despeito de sua incrível perspi­
cácia em relação ao futuro, é razoável admitir que sua obra nessa área tenha sido moti­ Página 25: Para saber mais sobre a obra e a vida de Milgram, veja ThomasBlass, ''The
vada mais por uma profunda curiosidade acerca dos meandros do problema do que por Social Psychology of Stanley Milgram", em Advances in Experimental Social Psychology,
suas aplicações. ed. M. P. Zanna (San Diego: Academic Press, 1992), 25:277-328; e Thomas Blass, ed.
Obedience to Authority: Current Perspectives on the Milgram Paradigm (Mahwah: Law­
Página 21: À medida que avançarmos na jornada por nosso mundo interconectado, a
rence Erlbaum, 2000) . Maiores informações e links podem ser obtidos em
teoria das redes randômicas de Erdós-Rényi será amiúde nosso ponto de referência. Ao http://www.stanleymilgram.com.
longo das conexões, às vezes não podemos ajudar contrastando-a com o mundo real.
Entretanto, as deficiências do modelo não diminuem nossa admiração e respeito pelo Página 26: Note que a metodologia utilizada por Milgram para chegar à conclusão dos
legado monumental de Erdós e Rényi. Nossa crítica esporádica tem por alvo todos aque­ seis graus foi questionada recentemente por Judith S. Kleinfeld, que manuseou os
les dentre nós que, como seus seguidores, durante décadas, aplicaram indiscriminada­ ensaios e notas de Milgram, bem como o pacote de cartas que chegaram a seu destino,
mente ao mundo real a visão randômica que eles retrataram. guardados nos arquivos de Yale. Em particular, estudos recentes sugerem que nosso
mundo é profundamente dividido por classes e raças, o que dificulta muito a navegação
por essas barreiras sociais. Veja, e.g., Judith S. Kleinfeld, "The Small World Problem",
TERCEIRA CONEXÃO : Seis Graus de Separação Society 39 Ganeiro-fevereiro, 2002): 61-66; e "Six Degrees of Separation: an Urban
Myth", Psichology Today (2002) .
Página 23: Há um grande número de livros em húngaro acerca da obra e vida de Página 26: Sabê-se que os aspectos técnicos do trabalho de Milgram sobre nossa
Karinthy. Veja, e.g., o volume in memoriam Karinthy Frigyes, A humor a teljes igazság, conectividade social foram inspirados pela obra de Anatol Rapoport, matemático e pia­
ed. Mátyás Domokos, Budapeste: Nap Kiadó (1998), coletânea de contos sobre Karinthy nista russo que publicou diversos ensaios originais sobre redes sociais. De maneira inde­
escrita por amigos e colegas, muitos deles escritores. Veja também Dolinszky Miklós, pendente, ele apresentou o conceito de grafos randômicos e exerceu profundo impacto
Szószerint (A Karinthy Passió), (Budapest: Magvetó, 2001), e Levendel Júlia, Így e1t sobre a sociologia. Seus ensaios mais relevantes incluem R. Solomonoff e A. Rapoport,
Karinthy Frigyes (Budapest: Mora Kõnyvkiadó, 1979). "Connectivity of Random Nets", Bulletin of Mathematical Biophysics 13 (1951): 107-117;
e A. Rapoport, "Contribution to the Theory of Random andBiased N�ts", Bulletin ofMat­
Página 24: Frigyes Karinthy, "Lácszemek'', em Minden másképpen van (Budapest: Athe­
hematical Biophysics 19 (1957): 257-277.
neum Iroday es Nyomday R.-T. Kiadása, 1929), 85-90. Estou profundamente em dívida
com Tibor Braun, que me chamou a atenção para esse conto e dele me enviou cópia em Página 2 7: John Gaure, Si.x Degrees of Separation (New York: Random House, 1990).
1999, logo depois que nossa pesquisa sobre os 19 graus na Web foi noticiada pela mídia
Página 28: Para a historia dos primórdios: da Web, tal como relatada por seu criador,
húngara. Não acho que o conto já tenha sido traduzido para o inglês. Para uma coletâ­
veja TimBemers-Úe com Mark Fischetti, Weaving the Web: the Original Design and Ulti­
nea de contos de Karinthy em inglês, veja Frigyes Karinthy, Grave and Gay (Budapest:
mate Destiny of the World Wide Web by Its Inventor (San Francisco: Harper, 1999).
Korvina Kiadó, 1973).
Página 28: Quanto ao tamanho da Web, veja Steve Lawrence e C. Lee Giles, "Sear­
Página 25: Para uma outra publicação anterior do conceito dos seis graus, veja a obra
ching the World Wide Web", Science 280 (1998) : 98-100; e "Accessibility of Information
de Jane Jacobs, The Death and Life ofAmerican Cities (New York: Random House, 1961),
on the Web", Nature 400 (1999) : 107-109. Veja também a extensa discussão no capítulo
um dos mais importantes livros já escritos sobre planejamento urbano, que deu início à
12.
revitalização de regiões antigas. Nesse livro, recorda a autora: "Quando minha irmã e eu

204 205
Página 31: O estudo que revela os 19 graus de separação da Web foi publicado em R. acerca de sua conectividade e tamanho, sua separação seria muito mais próxima da pre­
Albert, H. Jeong e A.-L. Barabási, "Diameter of the World Wide Web", Nature 401 visão dos dez cliques da fórmula da rede randômica. Isso seria igualmente verdadeiro
(1999): 130-131. O método que utilizamos para descobrir o diâmetro de toda a Web é para mm.tas outras redes existentes na natureza, cujo tamanho e cuja conectividade são
conhecido na literatura como "escala de tamanho finito". conhecidos com maior precisão. Os números, contudo, raramente se equiparam - um
indício da ordem oculta no interior de nosso intrincado mundo. Para uma lista deta­
Página 31: Para o grau de separação em cadeias alimentares, veja Richard J. Williams,
lhada de redes mundo pequeno, ressaltando a discrepância entre a previsão da rede ran­
Neo D. Martinez, Eric L. Berlow, Jennifer A. Dunne e Albert-László Barabási, Two
dômica e sua real separação, veja, e.g., R. Albert e A.-1. Barabási, "Statistical Mechanics
Degrees of Separation in Complex Food Webs, http://www.santafe.edu/sfi/publicati­
of Complex Networks", Reviews ofModem Physics 74 Ganeiro de 2002) : 47-97.
ons/Abstracts/01-07-036abs.html; José M. Montoya e Ricardo V. Sole, Small World Pat­
tems in Food Webs, http://santafe.edu/sfi/publications/Abstracts/00-10-059abs.html. Página 33: Para a nota de Kochen sobre a história dos mundos pequenos, veja Man­
Para a separação no interior da célula, veja capítulo 13, e Hawoong Jeong, Bálint Tom­ fred Kochen, prefácio de The Small World, ed. Manfred Kochen (Norwood: Ablex, 1989).
bar, Réka Albert, Zoltán N. Oltvai e Albert-László Barabási, "The Large-Scale Organiza­ Página 34: Para uma discussão sobre a navegabilidade dos mundos pequenos, veja J.
tion of Metabolic Networks", Nature 407 (2000) : 651; Hawoong Jeong, Sean Mason, M. Kleinberg, "Navigation in a Small World - It Is Easier to Find Short Chains Between
Albert-László Barabási e Zoltán N. Oltvai, "Centrality and Lethality of Protein Networks", Points in Some Networks Than Others", Nature 406 (agosto de 2000) : 845.
Nature 411 (2001): 41-42; Andreas Wagner e David Fell, The Small World Inside Metabo­
Página 36: Note que também se pode arguir que a obra de Milgram subestimou o gra:u
lic Networks, Proceedings of the Royal Society of London, Series B - Biological Sciences,
268 (set. 7, 2000) : 1803-1810. Para a rede de cientistas e o mundo pequeno entre eles, de separação entre as pessoas, na medida em que não corrigiu o efeito de cadeias
veja A.-L. Barabási, H. Jeong, E. Ravasz, Z. Néda, T. Vicsek e A. Schubert, Evolution of incompletas. De fato, se uma carta não chegou ao destinatário, foi ignorada. Como no
the Social Network of Scientific Collaborations, http://xxx.lanl.gov/abs/cond-mat/
experimento de Nebraska, apenas 42 de 160 cartas chegaram ao destino e a maioria das
0104162 (2002); M. E. J. Newman, Who is the Best Connected Scientist? A Study of Scien­ cadeias expandidas ficou claramente fora da amostra. Cadeias expandidas têm maior
i:ific Coauthorship Netwo rks, http ://www.santafe . e du/sfi/publicati­
probabilidade de não fazê-lo, de sorte que a amostra estudada por Milgram foi envie­
ons/Abstracts/00-12-064abs.html; M. E. J. Newman, The Structure of Scientific Collabo­ sada no sentido dos percursos mais curtos completados.
rations Networks, Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States
of America 98 Gan. 16, 2001); 404-409. Para o mundo pequeno em redes neurais, veja
D. J. Watts e S. H. Strogatz, "Collective Dynamics of 'Small World ' Networks", Nature QUARTA CON EXÃO: Mundos Pequenos
393 (1998) : 440-442.
Página 38: A descoberta original acerca de nossa sociedade clusterizada foi publicada
Página 31: Podemos testar nossa simples previsão em duas redes familiares: a socie­
em Mark S. Granovetter, "The Strenght of Weak Ties", American Joumal of Sociology 78
dade e a Web. Para a sociedade, precisamos saber qÚantas pessoas um sujeito mediano
(1973) : 1360-1380:Granovetter recordou a saga em tomo de sua publicação no sucinto
conhece. Embora isso possa parecer fácil de calcular, os sociólogos não estão de acordo,
artigo publicado em Current Contents (Sociology and Behavioral Sciences Edition 18, n.
e as estimativas vão de 200 a mais de 5 mil! Como há pouco me informou Duncan
49 [dezembro 1986] : 24) por ocasião da indicação do ensaio para uma Citation Classic.
Watts, matemático que se tornou sociólogo na Universidade de Columbia, a descoberta
Veja também "The Strenght of Weak Ties: a Network Theory Revisited", Sociological The­
da resposta correta complica-se-pela dificuldade de definir o termo "conhecido". "Prova­
ory 1 (1983): 201-233; Mark S. Granovetter, Getting a Job (Cambridge: Harvard Univer­
velmente eu conheça o nome de mil pessoas, mas poderia telefonar para elas ao visitar a
sity Press� 1994).
cidade delas? Eu me sentiria à vontade para lhes pedir um favor? Poderia confiar
nelas?" Para abordar esse problema, admitamos que uma pessoa mediana tenha aproxi­ Página 40: O fenômeno dos aplausos sincronizados é amplamente estudado na litera­
madamente mil conhecidos a quem se dirija pelo primeiro nome, o que representa mais tura física como manifestação de sincronização. As primeiras mensurações pormenoriza­
ou menos a metade entre as estimativas mais conservadoras e as mais otimistas. Com 6 das foram descritas em Z: Néda, E. Ravasz, Y. Brechet, T. Vicsek e A.-1. Barabási,
bilhões de pessoas, nossa fórmula nos diz que a separação na sociedade é próxima de 3. "Self-Organizing Processes: the Sound of Many Hands Clapping", Nature 403 (2000) :
A mesma fórmula aplicada à Web, utilizando 1 bilhão de documentos e uma conectivi­ 849-850. Para uma exposição mais detalhada, veja Z. Néda, E. T. Ravasz, Y. Brechet e A.
dade média de sete, prevê uma separação de 10. Ambas as previsões situa).ll-se no limite L- Barabási, "Physics of the Rhythmic Applause", Physical Review E 61, n. 6 (2000) :
inferior, mas não muito longe das respostas "corretas" (seis e 19, respectivamente). A 6987-6992. Para uma apresentação simplificada dessa pesquisa, veja Henry Fountain,
fórmula matemática não elimina senão todas as diferenças de ordem de magnitude no "Making Order Out of Chaos When a Crowd Goes Wild", New York Times (março de
número de nós, explicando por que chegamos a essa pequena separação em geral. 2000); e Josie Glausiusz, "Joining Hands", Discover 21 Gulho de 2000) .
O desvio em relação à resposta "correta" subjaz à premissa elementar deste livro: as Página 40: John Buck e Elisabeth Buck, "Synchronous Fireflies", Scientific American
redes reais não são randômicas. Se a Web fosse randômica, como há pouca ambiguidade (maio de 1976) : 74-85. Para um livro recente sobre sincronização, veja Arkady

206 207
Pikovsky, Michael Rosenblum e J. Kurths, Synchronizati.on: a Universal Concept in Nonli­ Página 44: O que o modelo de rede randômica nos diria acerca do coeficiente de clus­
near Sciences (Cambridge: Cambridge University Press, 2001). Veja também Ian Stewart terização? Como o coeficiente de clusterização é a probabilidade de que dois de meus
e Seven H. Strogatz, "Coupled Oscillators and Biological Synchronization", Scienti.fic amigos sejam conectados, para o modelo de Erdós isso não é senão a probabilidade de
American (dezembro de 1993): 68. que dois nós quaisquer tenham um link para eles. Com efeito, podemos calcular o coefi­
Página 41: Para os bastidores da descoberta de Watts-Strogatz, veja Duncan J. Watts, ciente de clusterização para um grafo randômico com N nós dividindo o número total de
Small Worlds (Princeton: Princeton University Press, 1999). links presentes na rede (L) pelo número total de links possíveis N(N-1)/2, obtendo-se C
= 2L/N(N-1), o que se revela como o parâmetro de controle do modelo de Erdós-Rényi,
Página 41: Enquanto as redes desviaram a atenção de Duncan Watts da sincronização, amiúde denotado por p, indicando a probabilidade de que dois nós quaisquer estejam
uma gama de pesquisas tem revisto o liame entre redes e sincronização. Veja, por exem­ conectados entre si. Em outros termos, o coeficiente de clusterização é dado por C =
plo, J. Jast e N. P. Jog, "Spectral Properties and Synchronisation in Coupled Map Latti­ <k>/N, onde <K > é o número médio de links por nó na rede.
ces", Physical Review, E 65 (2002) : 016201; X. F. Wang e G. R. Chen, "Synchronisation
in a Scale-Free Dynamical Network: Robustness and Fragility, "IEEE Transaction on Cir­ Página 44: Com um pouco de familiaridade em relação à forma como os cientistas
cuits Systems I 49 (2002) : 54-62; M. Barahona e L. M. Pecora, "Synchronisation in colaboram entre si, podemos começar a entender a origem da enorme clusterização des­
Small-World Systems", http://xxx.lanl.gov/abs/nlin.CD/01 12023; J. Ito e K. Kaneko, coberta pelo estudo realizado por Newman e por mim. Efetivamente, muitos trabalhos
"Spontaneous Structure Formation in a Network of Chaotic Units with Variable Connec­ científicos são escritos por três ou mais autores. Cada um desses trabalhos gera um grafo
tion Strenghts", Physical Review Letters 88 (2002) : 02801. completo, semelhante ao nosso círculo de amigos, porque cada autor está conectado- a
todos o s outros autores do trabalho. Dessa forma, o grafo d a colaboração é salpicado de
Página 42: O "coeficiente de clusterização" foi utilizado pela primeira vez por Watts e minúsculos grafos completos, cada um dos quais possui alto coeficiente de clusterização,
Strogatz em D. J. Watts e S. H. Strogatz, "Collective Dynamics of 'Small-World' Net­ alavancando a clusterização média de toda a rede. Mas existe também um fator social.
works", Nature 393 (1998): 440-442. O mesmo valor, sob a designação dei.'.'fração de tri­ Mesmo que dois de meus alunos de graduação não sejam coautores de um ensaio
pletes transitivos", era utilizado na literatura sociológica. Veja, e.g., o agora clássico s. enquanto cursarem a faculdade, cada um deles ainda se encontra a dois passos um do
Wasserman e K. Faust, Social Network Analysis: Methods and Applicati.ons (Cambridge: outro, porque todos escreveram ensaios comigo. Continuando a trabalhar na mesma
Cambridge University Press, 1994) : 598-602. área, provavelmente, no futuro, irão escrever, em algum momento, um trabalho em par­
Página 42: Para uma extensa discussão sobre os números de Erdós, veja o site dele ceria, corroborando meu coeficiente de clusterização.
mantido por Jerrold W. Grossman, http://www.oakland.edu/-grossman.erdoshp.html. Página 45: Para maiores informações sobre o verme Caenorhabditis elegans, veja
Para uma lista de cientistas famosos e seus números de Erdós, veja Rodrigo de Castron e http://elegans.swmed.edu/ ou http://www.nematodes.org/.
Página 45: Embora o diagrama de fiação neural do verme C. elegans tenha sido intei­
Jerrold W. Grossman, "Famous trails to Paul Erdós", Mathemati.cal Intelligencer 21 (verão
de 1999): 51-63.
ramente mapeado, ,seria impossível tentar algo semelhante em relação ao cérebro
Página 43: Note que na partícula física, que é um subcampo muito atuante da física, é humano. Não porque haja bilhões de neurônios por mapear, alguns com milhares de
comum que centenas de físicos dispersos por vários continentes e frequentemente nunca links para outros neurônios, mas porque as conexões entre os neurônios no cérebro
apresentados uns aos outros contribuam para a descoberta de uma nova partícula ele­ humano se modificam, criando novos links e comprometendo os antigos à medida que
mentar. Para eles, então, a coautoria não pode ser tomada como sinal de conhecimentos aprendemos e envelhecemos. O C. elegans remanesce, contudo, como estudo confiável
pessoais ou de vínculos sociais. Em muitos campos de pesquisa, contudo, essas extensas com cérebro de fiação estática, no qual as conexões são geneticamente predeterminadas.
colaborações são a exceção, e não a regra.
Página 45: Para um estudo sobre a topologia do diagrama de fiação do Caenorhabditi.s
Página 44: Nosso trabalho sobre redes de colaboração entre matemáticos e neurocien­ elegans, veja D. J. Watts e S. H. Strogatz, "Collective Dynamics of 'Small-World 'Net­
tistas está resumido em A.-L. Barabási, H. Jeong, R. Ravasz, Z. Néda, T. Vicsek e A. works", Nature 393 (1998) :. 440-442, que contém o estudo sobre a rede do poder, bem
Schubert, On the Topology of Scienti.fic Collahorati.on Networks, http://xxx.lanl.gov.abs/ como sobre a dos atores de Hollywood. Veja também S. Horita, K. Oshio, Y. Osama, Y.
cond-mat/0104162 (em Physical A, 2002). Resultados semelhantes foram obtidos inde­ Funabashi e K. Oka Kawamara, "Geometrical Structure of the Neuronal Network of Cae­
pendentemente por Mark Newman, enfocando físicos, cientistas da computação e profis­ norhabditis elegans", Physyca A 298 (2001) : 553-561.
sionais de outras áreas. Veja M. E. J. Newman, "The Structure of Scientific Collaboration
Networks", Proceedings of the Nati.onal Academy of Sciences 98 (2001) : 404-409; "Scienti­ Página 45: Para clusterização na Web, veja L. A. Adamic, "The Small World Web", Pro­
fic Collaboration Networks: I. Network Construction and Fundamental Results", Physical ceedings of the European Conference on Digital Libraries 1 999 Conference (Berlin: Springer
Review, E 64 (2001) : 016131; "Scientific Collaboration Networks: II. Shortest Paths, Verlag, 1999): 443. Para clusterização na topologia da Internet, veja, e.g., Soon-Hyung
Weighted, and Centrality'', Physical Review, E 64 (2001) : 016132. Yook, Hawoong Jeong e Albert-László Barabási, Modeling the Intemet 's Large-Scale
Topology, http://xxxlanl.gov/abs/cond-mat/0107417; e Romualdo Pastor-Satorras, Ale-

208 209
xei Vazquez e Alessandro Vespignani, Dynamical and Correlation Properties of the Inter­ Página 52: Diversas ferramentas de busca, como Google ou AltaVista, permitem a
net, Physical Review Letters (2001) : Artigo n. 258701. A clusterização na economia é dis­ qualquer um encontrar páginas que se conectam a uma dada Webpage. Para executar
cutida em Bruce Kogut e Gordon Walker, "The Small World of Germany and the essa função, basta digitar "link:", seguido do URL, na janela de busca. Por exemplo, para
Durability of National Networks", American Sociological Review 66 (2001) : 317-335. Para encontrar os links que referenciam www.nd.edu/-networks, digita-se o Únk:
clusterização na rede ecológica, veja Richard J. Williams, Neo D. Martinez, Eric L. Ber­ http://www.nd.edu/-networks.
low, Jennifer A. Dunne e Albert-László Barabási, Two Degrees of Separation in Complex Página 52: Para o estudo sobre o Website da Notre Dame, veja Réka Albert, Hawoong
Food Webs, http://www.santafe.edu/sfi/publications/Abstracts/01-07-03abs.html. Jeong e Albert-László Barabási, "Diameter of the World Wide Web", Nature 401 (1999) :
Página 46: O modelo original sugerido por Watts e Strogatz em.Nature 393 (1998) : 130-131. Os dados brutos que fornecem informação sobre qual página está conectada a
440-442, não adicionou links extras, mas religou alguns dos links existentes a nós distan­ outras páginas, permitindo reconstituir a rede subjacente à amostra da Web e determi­
tes, com idêntico efeito. A versão descrita aqui foi proposta por M. Newman e D. J. nar quanto hubs existem lá, estão disponíveis em http:www.nd.edu/-networks/data­
Watts; veja, e.g., "Renormalization Group Analysis of the Small-World Network Model", base/index.html.
Physics Letters, A, 263 (1999) : 341; "Scaling and Percolation in the Small-World Net­ - Página 52: Para um resumo do estudo dos 200 milhões de Webpages, veja A. Broder,
work Model", Physical Review, E 60 (1999): 7332. Graças à sua simplicidade, o modelo R. Kumar, F. Maghoul, P. Raghavan, S. Rajagopalan, R. Stata, A. Tomkins e J. Wiener,
algorítmico é frequentemente preferido ao modelo original Watts-Strogatz por aqueles "Graph Structure in the Web", texto apresentado à nona conferência sobre Web,
que tentam calcular as propriedades do modelo. '· http://www9.org/w9cdrom/160/160.html.
l
Página 47: Para exemplos adicionais de clusterização em redes complexas, veja R. Página 52: A distribuição de grau que permitiu identificar a conectividade da maioria
Albert e A.-1. Barabási, "Statistical Mechanics of Complex Networks", Review of Modem dos nós conectados, mencionada no texto quando se refere à amostra de 200 milhões,
Physics 74, n. 1 Ganeiro de 2002): 47-97. foi fornecida por A. Tomkins. .
Página 52: O número de links de saída, k', depende inteiramente do criador da Web­
QUINTA CONEXÃO: Hubs e Conectores page porque ele é a única pessoa que pode adicioná-los ao documento. Quantos desses
links esperávamos ver em uma página típica? O poder da Web está no fato de que ela é
um hipertexto que permite ao webdesigner estruturar a informação em páginas e subpá­
Página 50: Malcolm Gladwell, The Tipping Point (New York: Little Brown, 2000) . ginas conectadas à página principal. Assim, qualquer livro respeitável sobre webdesign
Página 50: A lista telefônica de teste utilizada por Gladwell foi inventada por sociólo­ recomenda que não se sobrecarregue a página. A primeira página deve ser um mapa
gos para estimar o número de links sociais que as pessoas possuem. Para uma recente rodoviário, informativo e de fácil leitura. Todos os detalhes devem ficar no fundo, em
revisão dos métodos de mensuração do tamanho dos links sociais de um indivíduo, veja páginas extras, organizadas em uma hierarquia de documentos cada vez mais específi­
Linton. C. Freeman e Claire R. Thompson, "Estimating Acquaintanceship Volume", em cos. Quantos links -podemos colocar em um página sem sobrecarregá-la? Em geral, dis­
The Small World, ed. Manfred Kochen (Norwood: Ablex, 1989): 147-158. pomos de espaço para uma centena de palavras, incluindo talvez de cinco a 15 links. Se
todo mundo seguisse as dicas dos livros de Webdesign, muitas páginas teriam um
Página 52: Tecnicamente, podemos facilmente descobrir quantos links de saída uma número ótimo de links, obtendo um salutar equih'brio entre conteúdo máximo de infor­
dada página possui simplesmente visitando-a e contando os URLs que nela constam. mação e legibilidade. Evidentemente, algumas páginas poderiam ter mais, outras menos
Mais difícil, no entanto, é contar o número de links de entrada. Links de entrada repre­ do que esse número ótimo, a depender dos valores estéticos do webmaster, mas haveria
sentam os links de outros sites da Web que referenciam determinado documento. Por um meio-termo e poucos transgressores desse padrão. Nesse mundo 'ideal, a distribuição
exe�plo, meus alunos de graduação têm suas próprias Webpages e todos eles possue� de links deveria obedecer a uma curva de sino ou distribuição de Gauss, em linguagem
links para minha página. Se alguém visitar as páginas deles, com um clique poderá aces­ matemática, cujo pico gira em tomo de um ótimo k:, muito similar à previsão do modelo
sar a minha. Entretanto, quando tal indivíduo visita minha página, não tem como saber de rede randômica.
que outras páginas se conectam a ela. Para descobrir quantos links de entrada minha
página possui, é necessário visitar cada uma do bilhão de páginas existentes na Web e Página 52: Os nós altamente conectados da Web são frequentemente chamados de
verificar se possuem link para meu site. O número de links de entrada que uma página hubs e autoridades, em alusão a nós dotados de muitos links de saída ou de entrada, res­
da Web tem reflete sua popularidade: quanto mais links de entrada uma página possui, pectivamente. Veja, e.g., J. Kleinberg, "Authoritative Sources in a Hyperlinked Environ­
mais pessoas devem tê-la visitado e a ela se conectado. E o que é mais importante: ment'', Proceedings of the Association for Computing Machinery - Societyfor Industrial and
quanto mais links de entrada ela tem, mais fácil é encontrá-la navegando na rede. Se Applied Mathematics. Symposium on Discrete Algorithms (1998); versão ampliada em
ninguém referencia nossa página na Web, então, para efeitos práticos, ela não existe. Joumal of the ACM 46 (1999): 604-632.

210 211
Página 53: Craig Fass, Mike Ginelli e Brian Turtle, Six Degrees of Kevin Bacon (New Página 57: Para a discussão sobre hubs na rede p53 no interior da célula, veja Bert
York: Plume, 1996). Vogelstein, David Lane e Arnold J. Levine, "Surfing the ·p53 Network", Nature 408
Página 53: O importante papel dos hubs de ator ern Hollywood é ilustrado pelo fato de (2000) : 307-310.
que os caminhos mais curtos de Marilyn Monroe, Myke Myers ou Charlie Chaplin para Página 57: Para uma discussão sobre espécies fundamentais, veja Simon Levin, Fragile
Bacon passam pelo rnesrno ator, Robert Wagner. Este é o mais importante hub na vizi­ Dominion (Cambridge: Perseus, 1999). Para uma discussão sobre hubs e espécies funda­
nhança de Bacon, sendo seu link crucial para a Hollywood histórica. De fato, Wagner mentais, veja Ricard V. Sole e José M. Montoya, Complexity and Fragility in Ecological
atuou ern pelo menos 101 filmes e colecionou 2.017 links. Embora não seja o ator mais Networks, http://www.santafe.edu/sfi/publications/Abstracts/00-ll-060abs.htrnl.
conectado, ocupa a proeminente posição 24ª, posto que causaria muita inveja a Bacon.
Página 5 4 : O Oráculo de B acon, na Virginia, pode ser encontrado ern
http://www.cs.virginia.edu/oracle/. SEXTA CONEXÃO: Regra 80/20
Página 55: A classificação dos atores de Hollywood baseou-se ern uma mensuração
que Hawoong Jeong fez ern 2000 após baixar o banco de dados do IMDb.corn e reconsti­ •página 59: O episódio protagonizado por Pareto é mencionado ern diversas partes.
tuir a rede subjacente de Hollywood. Os resultados de mensurações semelhantes são fre­ Veja, e.g., a nota biográfica de Arthur Livingston na tradução inglesa de Trattato di Soci­
quentemente citados na imprensa. Corno os dados foram colhidos ern diferentes momen­ ologia Generale, The Mind and Society (New York: Harcourt Brace, 1942) .
tos, pode haver pequenas diferenças quanto à ordem predsa na qual os atores mais Página 60: A lei do 80/20 gerou numerosos artigos no mundo corporativo, até final­
conectados aparecem ou quanto ao número de links que possuem. As mensurações são mente conseguir seu próprio livro. Veja Richard Koch, The 80/20 Principie - The Secret
consistentes, contudo, no que tange à identidade dos atores mais conectados e à sua to Success byAchieving More with Less (New York:. C=ency, 1998).
separação relativamente aos demais atores de Hollywood.
Página 60: Nossa descoberta de que urna lei de potência descrevia a topologia da Web
Página 57: Para evidências de hubs na rede molecular da célula, veja, e.g., o capítulo foi publicada ern Réka Albert, Hawoong Jeong e Albert-László Barabási, "Diameter of the
13, Hawoong Jeong, Balint Tornbor, Réka Albert, Zoltán N. Oltvai e Albert-László Bara­ World Wide Web", Nature_ 401 (1999): 130-131. Urn estudo independente chegou à
bási, "The Large-Scale Organization of Metabolic Networks", Nature 407 (2000) : 651; rnesrna conclusão. Veja R. Kurnar, P. Raghavan, S. Rajalopagan e A. Tornkins, "Extrac­
Hawoong Jeong, Sean Mason, Albert-László Barabási e Zoltán N. Oltvai, "Centrality and ting Large-Scale Knowledge Bases frorn the Web", Proceedings of the 9th ACM Symposium
Lethality of Protein Networks", Nature 411 (2001): 41-42; Andréas Wagner e David Fell, on Principies ofDatabase Systems 1 (1999).
"Toe Srnall World Inside Large Metabolic Networks", Proceedings of the Royal Society of
London B, 268 (7 de setembro de 2001): 1803-1810. Página 61: Ern artigos cientificos, a natureza de lei de potência da distribuição do grau
é frequentemente escrita ern termos de probabilidades. A probabilidade de que urn nó
Página 57: Para hubs na topologia da Internet, veja M. Faloutsos, P. Faloutsos e C. aleatoriamente selecionado tenha exatamente k links segue P(k) -k·Y, onde y é chamado
Faloutsos, "On Power-Law Relationships of the Internet Topology'', Proceedings of ACM de expoente do grau.
Special Interest Group on Data Communication (SIGCOMM), 1999 (Cambridge, agosto
1999). Página 61: Para uma introdução elementar às leis de potência e sua ocorrência ern
vários sistemas, veja Mark Buchanan, Ubiquity: the Science of History... Or Why the World
Página 57: Para o grafo do telefonema, veja J. Abello, P. M. Pardalos e M. G. C. Is Simpler Than We Think (New York: Crown Publishers, 2001). Para as leis de potência
Resende, Disc. Math. And Theor. Comp. Sei., DIMACS ser. 50 (1999) : 1999; William que se manifestam ern um outro contexto muito estudado, chamado de criticalidade
Aielo, Fan Chung e Linyuan Lu, A Random Graph Model for Massive Graphs, Proceedings auto-organizada, veja Per Bak, How Nature Works (Oxford: Oxford University Press,
of the 32nd ACM Symposium on Theor Comp (2000). 1996).
Página 57: Emanuel Rosen, The Anatomy ofBuzz (New York: Doubleday, 2000) . Página 62: Para a natureza de lei de. potência da rede de atores de Hollywood, veja
Página 57: A rede de conhecimentos pessoais de Franklin Delano Roosevelt é discutida Albert-László Barabási e Réka Albert, "Ernergence of Scaling in Randorn Networks", Sci­
ern H. Rosenthal, Acquaintances and Contacts of Franklin Roosevelt (tese de mestrado, ence 286 (1999): 509-512; Albert-László Barabási, Réka Albert e Hawoong Jeong,
Massachusetts Institute of Technology, 1960). Veja também Linton C. Freernan e Claire "Mean-Field Theory for Scale-Free Randorn·Networks", Physica A 272 (1999) : 173-187.
R. Thompson, "Estirnating Acquaintanceship Volume", 147-158, ern The Small World, ed. Página 62: Para as leis de potência nas colaborações cientificas, veja A.-1. Barabási, H.
Manfred Kochen (Norwood: Ablex, 1989). Jeong, E. Ravasz, Z. Néda, T. Vicsek e A. Schubert, On the Topology of the Scientific Col­
laboration Networks, http://xxx.lanl.gov./abs/cond-rnat/0104162. Resultados similares
foram obtidos independentemente por Mark Newman, enfocando físicos, cientistas da
computação e profissionais de outras áreas. Veja M. E. J. Newman, "The Structure of

212 213
Scientific Collaboration Networks", Proceedings of the National Academy of Sciences 98 Página 68: A descoberta natalina de Kadanoff, no contexto da história dos fenômenos
(2001) : 404-409; "Scientific Collaboration Networks: I. Network Construction and Fun­ críticos, é relembrada em Leo P. Kadanoff, From Order to Chaos, Essays: Critical, Chaotic
damental Results", Physics Review E 64 (2001) : 016131; "Scientific Collaboration Net­ and Otherwise (Singapore: World Scientific, 1993): 157-163. Kadanoff não partilha o
works: II. Shortest Paths, Weighted Networks, and Centrality'', Physics Review E 64 crédito com outros, pois as ideias de escala que ele introduziu foram independente­
(2001): 016132. mente descobertas por diversos outros pesquisadores, incluindo Michael Fischer, Ben
Página 62: Para as leis de potência no interior da célula, veja H. Jeong,B. Tombor, R. Widom, A. Z. Patashinskii e V. L. Pokrovskii. Acredita-se que Wilson tenha sido laureado
Albert, Z. N. Oltvai e A.-1. Barabási, "The Large-Scale Organization of Metabolic Net­ com um Nobel não compartilhado pelos fenômenos críticos precisamente porque houve
works", Nature 407 (2000) : 651-654; Hawoong Jeong, Sean Mason, Albert-László Bara­ muitos que receberam crédito pela descoberta do pré-requisito crucial, os conceitos de
bási e Zoltán N. Oltvai, "Lethality and Centrality in Protein Networks", Nature 411 escala. Lamentavelmente, o prêmio deixou de honrar muitas contribuições de fato cru­
(2001): 41-42; Andreas Wagner e David A. Fell, "The Small World Inside Large Metabo- ciais. Muitos de nós sentimos que contribuições fundamentais de outras pessoas também
lic Networks", Proceeding of the Royal Society, London 268 (2001): 1803-1810. merecem reconhecimento.

Página 62: Para a frequência das citações científicas, veja Sid Redner, "How Popular Is Página 69: Para dois ensaios originais de Wilson, veja Kenneth G. Wilson, "Renormali­
Your Paper? An Empirical Study of the Citation Distribution", Euro Phys JoumalB 4 zation Group and Critica! Phenomena: I: Renormalization Group and the Kadanoff Sca­
(1988) : 131; veja também S. Bilke e C. Peterson, "Topological Properties of Citation and ling Picture", Physics ReviewB 4 (1971) : 3174-3183; "Renormalization Group and Criti­
Metabolic Networks", Physical Review E 64 (2001): 036106. ca! Phenomena. II. Phase-Space Cell Analysis of Critica! Behavior'', Physical Review B 4
(1971) : 3184-3205. Para uma recente revisão pedagógica do campo, veja J. J. Binney,
Página 63: Não há dúvida de que o mapa das rotas dos Estados Unidos é meticulosa­ N. J. Dowrick, A. J. Fisher e M. E. J. Newman, The Theory of Critical Phenomena: an
mente projetado pelas companhias aéreas. para maximizar o lucro. Consequentemente, Introduction to the Renormalization Group (Oxford: Oxford University Préss, 1992).
como mostraram Luis Amaral e colegas da Universidade de Boston, a distribuição do
número de passageiros que visitam um aeroporto tem uma cauda exponencial. Não obs­ Página 70: As transições de fase de segunda ordem normalmente são reversíveis, o
tante, como a topologia da rede é dominada por hubs, ela possui todos os atributos visu­ que significa que observamos leis de potência independentemente de nossa direção, à
ais das redes de lei de potência, razão pela qual oferece um excelente exemplo para medida que atravessamos o ponto crítico, indo da ordem à desordem, ou vice-versa, da
relembrar os principais traços das redes sem escala. Para um estudo sobre o sistema desordem à ordem.
aeroviário, veja L. A. N. Amaral, A. Scala, M. Barthélémy e H. E. Stanley, "Classes of Página 71: A universalidade tomou-se o princípio reitor para a compreensão de mui­
Small-World Networks", Proceedings of the National Academy of Sciences 97 (2000) : tos· fenômenos díspares. Ela nos diz que, por toda parte, as leis da física que governam
1149-1152. os sistemas complexos e a transição da desordem para a ordem são simples, reprodutí­
Página 66: Para uma extensa, mas fascinante biografia da água escrita para um veis e onipresentes. Sabemos agora que os mesmos mecanismos universais que geram as
público genérico, veja Philip Bali, Life 's Matrix (New York: Farrar, Straus e Giroux, formas dos flocos-de neve também determinam o formato de neurônios na retina. As leis
1999). de potência e a universalidade emergem nos sistemas econômicos, descrevendo o cresci­
mento das empresas e a flutação dos preços do_algodão. Exp_licam o comportamento gre­
Página 67: Para uma excelente introdução aos fenômenos críticos do grupo de gário de pássaros e peixes, bem como as diferenças de escala dos terremotos. Consti­
pré-renormalização, veja o clássico livro de H. Eugene Stanley, Introduction to Phase tuem o princípio norteador subjacente a duas descobertas deveras intrigantes da
Transitions and Critical Phenomena (Oxford: Oxford University Press, 1971). segunda metade do século XX: o caos e os fractais. Como resultado, uma segunda revo­
Página 67: Observe que embora tanto a água como os sistemas magnéticos sujeitem-se lução na mecânica estatística, ocorrida nas décadas de 1980 e 1990, pretende explicar
a uma transição de fase, eles o fazem de maneiras bem diferentes. A transição de fase como as leis de potência podem ocorrer em sistemas muito diferentes, alguns dos quais
água-gelo é o que os físicos chamam de transição de fase de primeira ordem, signifi­ não parecem sujeitar-se a transições de fase. A criticalidade auto-organizada, subcampo
cando que as grandezas termodinâmicas relevantes mudam descontinuam.ente no ponto da mecânica estatística, reúne diversos pesquisadores interessados em propor uma res­
de transição (i.e., saltam.) . Os sistemas magnéticos, em contraste, revelam a assim deno­ posta geral a essa questão.
minada transição de fase de segunda ordem (i.e., as grandezes termodinâmicas mudam Página 71: Embora seja relativamente fácil dar crédito à escala e ao grupo de renor­
continuamente no ponto de transição) . Verifica-se, assim, que ·os instrumentais teóricos malização, muito mais difícil é compreender a origem do conceito de universalidade.
necessários para descrever diferentes transições de fase, embora possuam as mesmas raí­ Kadanoff utilizou-o um ano depois de seu texto original sobre escala em um artigo de
zes, são bem distintos quando chegamos ao cerne da matéria. É a transição de fase de revisão. Ele recorda-se de tê-lo ouvido durante uma conversa em um bar de Moscou com
segunda ordem que sempre conduz às leis de potência, à medida que nos aproximamos Sasha Polykov e Sasha Migdal, dois eminentes físicos russos que trabalhavam na frontei­
do ponto crítico. ra entre transições de fase e teoria do campo, ramo da física comumente frequentado
tanto pela física das particulas como pela física da matéria condensada. Mas o conceito

214 215
tem sido utilizado na mecânica estatística por diversos outros estudiosos em diferentes Albert, "Emergence of Scaling in Random Networks", Science 286 (1999): 509-512;
contextos. O que pouco se percebe, no entanto, é' que a universalidade expandiu-se a Albert-László Barabási, Réka Albert e Hawoong Jeong, "Mean-Field Theory for
ponto de assumir um novo significado, implicando que as propriedades de sistemas bem Scale-Free Random Networks", Physical A 272 (1999): 173-187. Note que, embora por
diferentes são idênticas enquanto sofrem uma transição da desordem à ordem. simplicidade tenhamos escolhido conectar os novos nós exatamente com dois outros nós
no exemplo discutido neste livro, em geral podem ser conectados a um número arbitrá­
rio de nós, sem que se alterem as feições essenciais do modelo.
SÉTIMA CONEXÃO: Ricos Ficam Mais Ricos Página 79: O fato de que o modelo sem escala engendra uma lei de potência com
expoente de grau igual a 3 foi demonstrado exatamente por alguns dos primeiros cola­
Página 73: O ensaio escrito no avião foi publicado mais ou menos cinco meses depois boradores de Erdós. Veja B. Bollobás, O. Riordan, J. Spencer e G. Tusnády, ''The Degree
com Albert-László Barabási e Réka Albert, "Emergence of Scaling in Random Networks", Sequence of a Scale-Free Random Graph Process", Random Structures and Algorithms 18
Science 286 (1999): 509-512. (maio de 2001): 279-290.
Página 74: No que tange ao montante de informação que será armazenada na Web em Página 80: A extensão do modelo sem escala para incluir links internos foi publicada
dez anos, veja Phil Berstein, Michael Brodie, Stefano Ceri, David DeWitt, Mike Franklin, em Réka Albert e Albert-László Barabási, "Topology of Evolving Networks: Local Events
Hector Garcia-Molina, Jim Gray, Jerry Held, Joe Hellerstein, H. V. Jagadish, Michael and Universality'', Physical Review Letters 85 (2000) : 5234.
Lesk, Dave Maier, Jeff Naughton, Hamid Pirahesh, Mike Stonebraker e Jeff Ullman, "The
Página 81: O trabalho do grupo da Universidade de Boston sobre o fator idade foi
Asilomar Report on Database Research", ACM Sigmod Record 27, n. 4 (1998): 74-80.
publicado em L. A. N. Amaral, A. Scala, M. Barthélémy e H. E. Stanley, "Classes of
Página 75: A informação concernente ao crescimento da rede de Hollywood baseia-se Small-World Networks", Proceedings of the National Academy of Sciences 97 (2000) :
nos dados coligidos por Hawoong Jeong a partir do IMDb.com.database. 11149-11152.
Página 76: Para uma análise pormenorizada do modelo A, veja Albert-László Barabási, Página 81: O grupo do Porto publicou dois trabalhos bastante afins. Veja S. N. Doro­
Réka Albert e Hawoong Jeong, "Mean-Field Theory for Scale-Free Random Networks", govtsev e J. F. F. Mendes, "Evolution of Reference Networks with Aging", Physical
Physica A 272 (1999): 173-187. Review E 62 (2000) : 1842; S. N. Dorogovtsev, F. F. Mendes e A. N. Samukhim, "Struc­
ture of Growing Networks with Preferential Linking'', Physical Review Letters 85 (2000) :
Página 76: Para orçamentos de publicidade on-line, veja Michell Jeffers e Evanth�i
4633.
Schibsted, "The Sizzle: What 's New and Now in Marketing and Advertising for E-Busi­
ness and E-Commerce", Business 2.0 (maio de 2000): 161-162. Página 82: O efeito das não linearidades sobre a topologia das redes sem escala, que
explica o fato de que a taxa de conexão pode ser proporcional a k·Y, foi publicado em P.
Página 77: Evidentemente, quando se trata de agências de notícias, todos nós temos
L. Krapivsky, S. Redner e F. Leyvraz, "Connectivity of Growing Random Networks",
preferências similares, navegando nos poucos sites que podem nos proporcionar cober­
Physical Review Letters 85 (2000) : 4629-4632.
tura inteligente e instantânea. Para os menos alinhados à corrente majoritária, contudo,
nossas escolhas são menos previsíveis e, portanto, mais aleatórias. De fato, podemos ser Página 82: Para um resumo detalhado das várias extensões do modelo sem escala e
as únicas pessoas que se conec!am às Webpages de nossos amigos de faculdade. Mas na um apanhado geral do campo das redes complexas, veja dois recentes artigos de revisão:
maioria dos casos, seguimos um viés inconsciente, conectando-nos com maior probabili­ S. N. Dorogovtsev e J. F. F. Mendes, "Evolution of Networks", Advances in Physics
dade a nós que possuem mais links. (2002); Réka Albert e Albert László Barabási, "Statistical MechaI)ics of Complex Net­
works", Reviews ofModem Physics 74 Ganeiro de 2002) : 47-97.
Página 77: Descobriu-se evidência quantitativa direta da existência de conexão prefe­
rencial em redes tão diversas quanto a Internet, Hollywood, redes colaborativas e redes Página 83: A natureza sem escala da linguagem foi abordada por diversos grupos de
citacionais. Veja H. Jeong, Z. Néda e A.-1. Barabási, "Measuring Preferential Attachment pesquisa. Com Soon-Hyung Yook e Hawoong Jeong, conectamos todos os sinônimos por
for Evolving Networks", http://xxx.lanl.gov/abs/cond-mat/0104131; M. E. J. Newman, links, verificando que a rede que obtivemos possuía uma topologia sem escala. Nunca
"Clustering and Preferential Attachment in Growing Networks", Physical Review E 64 publicamos os resultados. Diversos grupos, contudo, vêm publicando excelentes ensaios
(2001) : 025102; Romualdo Pastor-Santorras, Alexei Vasquez e Alessandro Vespignani, que analisam a rede da linguagem, utilizando diferentes critérios para os links, cada
"Dynamical and Correlation Properties of the Internet", Physical Review Letters 87 qual encontrando uma topologia sem escala. Veja, e.g., Ramon Ferrer Cancha e Ricard
(2001): 258701; K. A. Eriksen e M. Hornquist, "Scale-Free Growing Networks Imply Pre­ V. Sole, ''The Small-World of Human Language", Proceedings of the Royal Society ofLon­
ferential Attachment'', Physical Review E 65 (2001): 017102. don B 268 (2001) : 2261-2265; Mariano Sigman e Guillermo Cecchi, "Global Organiza­
tion of the Wordner Lexicon", Proceedings of the National Academy of Sciences 99 (2002) :
Página 78: O modelo sem escala, de par com os dois conceitos basilares, o de cresci­
mento e o de conexão preferencial, foi apresentado em Albert-László Barabási e Réka

216 217

1742-1747. S. N. Dorogovtsev e J. F. F. Mendes, "Language as an Evolving Word Web", exatamente isso que o hélio faz, o que constitui uma visível manifestação da condensa­
Proceedings of the Royal Society of London B 268 (dezembro de 2001): 2603-2606. ção de Base-Einstein.
Página 91: Para uma descrição elementar das novas descobertas em relação à conden­
sação de Base-Einstein, bem como de suas potenciais aplicações, veja, e.g., Graham P.
OITAVA CONEXÃO: Legado de Einstein Collins, 'Toe Coolest Gas in the Universe", Scientific American (dezembro 2000): 92-99;
Wolfgang Ketterle, "Experimental Studies of Base-Einstein Condensation", Physics Today
Página .85: Yahoo! Inc. dispensou a Inktomi Corp. em razão de seu deficitário meca­ 52 (dezembro 1999): 30-35; Eric A. Cornell e Carl E. Wieman, "The Base-Einstein Con­
nismo de busca em 26 de junho de 2000 e substituiu-a pelo Google. As principais agên­ densate", Scientific American (março de 1998): 40-45.
cias de notícia destacaram o fato. Não havia expectativa de que a rescisão contratual
Página 93: O elo existente entre redes e condensação de Base-Einstein foi publicado
fosse ter impacto imediato sobre o futuro financeiro da Inktomi, pois nessa época ela
em G. Bianconi e A.-L. Barabási, "Base-Einstein Condensation in Complex Networks",
possuía 80 clientes, e a parceria com Yahoo! respondia por menos de 2% de sua receita.
Physical Review Letters 86 Gunho 2001) : 5632-5635. Diversos pesquisadores ampliaram
Não obstante, as ações da Inktomi despencaram mais de 25 5/16 pontos, para perto de
esse trabalho, mostrando que o fenômeno vencedor pode levar tudo pode ser descrito sem
115 1/16 na Nasdaq.
recorrer ao liame com a mecânica quântica. Veja, e.g., S. N. Dorogovtsev e J. F. F. Men­
Página 85: O colóquio do Internet Archive ocorreu nos dias 8 e 9 de março de 2000, des, "Evolution of Random Networks", Advances in Physics (2002) .
em Presidio, San Francisco, sede do Archive. Para maiores informações sobre os objeti­
Página 93: A condensação de Base-Einstein não é a única área em que todos os ferra­
vos dessa instituição, veja o capítulo 12.
mentais da mecânica quântica se mostraram proveitosos no estudo das redes complexas.
Página 86: Para uma descrição visual detalhada do nascimento do computador portátil As propriedades espectrais das matrizes randômicas, área da qual Eugene Wig;ner foi
Newton, da Apple, veja Doug Menuez, Markos Kounalakis e Paus Saffo, Defying Gravity: pioneiro na década de 1960, representaram o ponto de partida de estudos acerca das
the Making of Newton (Hillsboro: Beyond Words, 1993). Infelizmente, o livro acaba no propriedades espectrais das redes complexas. Veja, por exemplo, I. J. Farkas, I. Derényi,
momento em que o assunto se torna interessante, como quando Newton contraria o A.-L. Barabási e T. Vicsek, "Spectra of 'Real-World ' Graphs: Beyond the Semi-Circle
mercado. Law", Physical Review· E 64 (2001) : 026704; K. I. Goh, B. Kahng e D. Kim, "Spectra and
Eigenvectors of Scale-Free Networks", Physical Review E 64 (2001) : 051903. Os instru­
Página 86: Para uma exposição detalhada dos retardatários bem-sucedidos nos negó­
mentais da teoria do campo, ramo matematicamente avançado da mecânica quântica,
cios, veja Joan Indiana Rigdon, "The Second-Mover Advantage", Red Herring (1 ° de
também têm encontrado aplicação nas redes complexas. Veja A. Krzgwicki, "Defining
setembro de 2000) ._
Statistical Ensembles of Random Graphs", http://laml.gov/abs/cond-mat; 0110574; Z.
Página 88: O modelo de adequação foi publicado em G. Bianconi e A.-L. Barabási, Burda, J. D. Correia e A. Krzgwicki, "Statistical Ensemble of Scale-Free Random
"Competition and Multiscaling in Evolving Networks", Europhysics Letters 54 (maio de Graphs", PhysicalReview E 64 (2001) : 046118.
2001): 436-442. Para desdobramentos do modelo que incluem efeitos adicionais ocor­
Página 94: Note que um fenômeno muito similar à condensação de Bose-Einstein é
rentes em redes reais, como a aptidão aditiva ou multiplicativa, veja Ergun e G. J. Rod­
previsto em redes com conexão preferencial não linear. Veja P. L. Krapivsky, S. Redner e
gers, Growing Random Networks with Fitness, Physica A 303 Ganeiro de 2002): 261-272.
F. Leyvraz, "Connectivity of Growing Random Networks", Physical Review Letters 85
Página 90: Para uma descrição histórica detalhada da relação Base-Einstein, bem (2000) : 4629-4632.
como para o surgimento das ideias que permeiam a condensação de Bose-Einstein, veja
Página 95: A rede que descreve a operação dos sistemas de mercado é um assim cha­
William Blanpied, "Einstein as Guru? The Case of Bose", em Einstein: the First Hundred
mado grafo bipartido, formado por dóis diferentes conjuntos de nós, de tal sorte que
Years, ed. Maurice Goldsmith, Alan Mackay e James Wouldhuysen (Oxford: Pergamon
cada nó só tem permissão de ligar-se a nós que pertençam ao outro conjunto. Não são
Press, 1980): 93-99. Veja também Albrech Fõlsing, Albert Einstein; a Biography (New
admitidos links diretos entre nós pertencentes ao mesmo conjunto. No exemplo da
York: Viking, 1997).
Microsoft, um conjunto de nós são os sistemas operacionais, e o outro, os numerosos cli­
Página 91: Uma bizarra manifestação da condensação de Bose-Einstein foi descoberta entes que escolhem (conectam-se) um sistema operacional. Um grafo bipartido seme­
por Pyotr Kapitza e John F. Allen em 1938. O hélio, gás fluido utilizado em balões de lhante também descreve a rede de atores de Hollywood. Ali, um conjunto de nós são os
aniversário, sujeita-se à condensação de Bose-Einstein abaixo de 2,2 K, tornando-se atores, enquanto o outro são os filmes em que atuaram. Nesse grafo bipartido, os atores
superfluido. Uma impressionante manifestação do novo estado do hélio é a perda da vis­ não se conectam entre si. Pelo contrário, cada ator se conecta apenas aos filmes. A partir
cosidade, permitindo que esse líquido suba pelas paredes de um recipiente aberto. Ima­ desse grafo bipartido, pode-se facilmente gerar a rede de atores discutida no capítulo 5,
ginemos nosso café da manhã subindo pelas paredes da xícara e derramando-se. Mas é mediante a conexão de todos os atores que remetem ao mesmo filme. Para uma discus­
são sobre grafos bipartidos, veja, e.g., M. E. J. Newman, S. H. Strogatz e D. J. Watts,

218 219
,-'
dente dos Estados Unidos, ele não é indispensável. Mesmo que se recuse a nos apresen­
"Random Graphs with Arbitrary Degree Distributions and Their Applications", Physical tar, há muitos outros acessos, amiúde igualmente curtos, que nos levam ao presidente.
Review E 64 (2001): 026118; Steven H. Strogatz, "Exploring Complex Networks", Nature Uma redundância semelhante se -instaura na Internet. Se um roteador não funciona, as
410 (2001) : 268-276. mensagens serão roteadas por vias alternativas. A redundância está presente igualmente
Página 95: Para um histórico subjetivo dos sistemas operacionais, veja Neal Stephen­ nos ecossistemas. Um predador só muito raramente se alimenta apenas de uma única
son, In the Beginning Was the Command Line, http://www.cryptonomicon.com. espécie. Com efeito, em face do crescimento dos camundongos em relação ao animal de
estimação doméstico, o gato, a contragosto, sobrevive de enlatados. Rotas alternativas
Página 95: Os dados concernentes à participação de mercado dos fabricantes de com­ são uma importante fonte de redundância e tolerância a erro. Em outras palavras, na
putadores são do IDC e estão disponíveis em http://www.idc.com/. maioria dos sistemas naturais, a disfuncionalidade de vários nós não é fatal, porque as
Página 96: As informações sobre participação de mercado dos sistemas operacio�ais vias eliniinadas por sua ausência podem ser substituídas por uma das muitas rotas alter­
são de Stephanie Miles e Joe Wilcox, "Windows 95 Remains the Most Popular Operatmg nativas. Experimentamos esse. fenômeno quando escolhemos um per=so alternativo
System", Cnet.com (20 de julho de 1999). para nosso destino ao saber pelo rádio da ocorrência de congestionamentos nas vias
mais próximas, ou quando o mau tempo ou o cancelamento de um voo nos redireciona
Página 97: Exemplo de sistema no qual a adequação teve de intervir para explic;ar a
para um hub diferente durante a viagem. Mas poderia haver algo além da redundância
topologia de rede é a Internet. Veja, e.g., Romualdo Pastor-Santorras, Alexei Vasquez e
_ quando se trata da robustez?
Alessandro Vespignani, "Dynamical and Correlation Properties of the Internet'', Physrcal
Review Letters 87 (2001): 258701. Página 101: O colapso de uma rede randômica em razão da remoção de um nó randô­
mico constitui problema de percolação reversa. A teoria da percolação nos diz que a
transição de uma rede fragmentada para uma .outra rede plenamente conectada repre­
NONA CONEXÃO: Calcanhar de Aquiles senta uma transição de fase de segunda ordem. Para uma revisão da percolação, veja D.
Stauffer e A. Aharony, Introduction to Percolation Theory (London: Taylor and Francis,
1994); A. Bunde e S. Havlin, eds., Fractal.s and Disordered Systems (Berlin: Springer,
Página 98: Para uma vívida descrição da cena em Denver, durante o 2 de julho de
1996); idem, eds. Fractal.s in Science (Berlin: Springer, 1995).
1996, quando da pane da rede elétrica, veja, e.g., L. M. Co�s, "Power Gri� Fails, Bla:­
_
kóut Affects 1.5 Million in West'', Denver News Times, 3 de Julho de 1996; Power Gnd Página 101: Nosso estudo da tolerância ao erro, segundo o qual as redes sem escala
Fails Blackout Affects Millions in West'', Nando.net, 2 de julho de 1996. Para a repeti­ não são vulneráveis a ataques, foi publicado em Réka Albert, Hawoong Jeong e
ção do mesmo problema ocorrida em agosto, veja Sagging Power Lines, Hot Weather Bla­ Albert-László Barabási, "Attack and Error Tolerance of Complex Networks", Nature 406
medfor Blackout, CNN (11 de agosto de 1996). (2000) : 378. Para sumário e perspectiva, veja o artigo que acompanha News & Views,
Yuhai Tu, "How Robust Is the Internet?", Nature 406 (2000): 353-354.
Página 99: As várias interrupções do fornecimento de energia elétrica que atingir�
os Estados Unidos, bem como a vulnerabilidade da rede elétrica, foram amplamente dis­ Página 101: Para uma discussão sobre a estabilidade da Internet, veja, e.g., Craig
cutidas tanto pela imprensa popular como por diversas organizações profissionais. Veja, Labovitz, Abha Ahuja e Farnam Jahanian, "Experimental Study of Internet Stability and
e.g., Massoud Amin, "Toward Self-Healing Infrastructure Systems': IEEE Co7:1pu_ter Wide-Area Backbone Failures", Proceedings of Institute of Electrical and Electronics Engi­
:
(agosto 2000) : 2-11; D. N. Kosterev, C. W. Taylor e W. A. Mittlestadt, Model Validatton neers (IEEE) Symposium ofFault-Tolerant Computing FTCS (Madison, junho de 1999).
of the August 10, 1996 WSCC System Outage", IEEE Transactions on Power Syste� 14
Página 102: Ao considerar a robustez, não podemos ignorar as propriedades dinânli­
(agosto 1999): 967-977. Para uma discussão abrangente acerca da desr�gulamentaça? e
cas dos sistemas complexos. A maioria dos sistemas considerados robustos possui nume­
seus impactos sobre a infraestrutura, veja Alan Weisman, "Power Tnp: The Commg
rosos controles e anéis de retroalimentação que lhes asseguram a sobrevivência a erros e
Darkness of Electricity Deregulation", Harper 's (outubro de 2000) : 76-85.
falhas. De fato, os protocolos de Internet foram cuidadosamente concebidos para "con­
Página 99: Para uma discussão sobre a quantidade de espécies exist�ntes na �erra, tornar o problema", evitando roteadores disfuncionais; as células possuem numerosos
biodiversidade e extinções, veja, e.g., Robert M. Mat, "How Many Speoes Inhab1t the mecanismos de retroalimentação para corrigir erros, desmantelando proteínas deficien­
Earth?", Scientifi.c American, outubro de 1992, 42-48; Joel L. Swerdlow, "Biodiv_ers!�= tes e barrando genes disfuncionais. Nossas simulações computacionais indicaram, con­
Taking Stock of Life", National Geographic 192 (fevereiro de 1999): 2-41; Vrrgirua tudo, um novo componente de tolerância a erro. Sabemos que a natureza seleciona cri­
Morell, ''The Sixth Extinction", National Geographic 192 (fevereiro de 1999) : 43-59. teriosamente a estrutura dos sistemas mais complexos, oferecendo-lhes um grau sem
paralelo de tolerância a erro e falha. Em virtude unicamente de sua topologia, esses sis­
Página 100: Uma fonte muito citada da robustez da natureza é a redundância, proprie­
temas revelam alto grau de resiliência, propriedade que denominamos robustez
dade inerente a todas as redes, mas virtualmente ausente da maioria dos arcabouços
topológica.
humanos. Na maioria das redes, há um grande número de vias alternativas entre muitos
pares de nós. De fato, embora o senador local possa oferecer uma via de acesso ao presi-

221
220
,'
Página 103: O cálculo do limiar de percolação das redes sem escala foi publicado em (2000). Para o efeito das atividades humanas sobre a estabilidade e o colapso potencial
Reuven Cohen, Keren Erez, Daniel Ben-Avraham e Shlomo Havlin, "Resilience of the do ecossistema, veja, e.g., Stuart L. Pimm e Peter Raven, "Biodiversity: Extinction by
Internet to Random Breakdowns", Physical Review Letters 85 (2000) : 4626. Resultados Numbers", Nature 403 (2000) : 843-845. Para a proteção de nossa biodiversidade, veja
similares foram obtidos independentemente em D. S. Callaway, M. E. J. Newman, S. H. Norman Myers, Russel A. Mittermeier, Cristina G. Mittermeier, Gustavo A. B. da Fonseca
Strogatz e D. J. Watts, "Network Robustness and Fragility: Percolation on Random e Jennifer Kent, "Biodiversity Hotsposts for Conservation Priorities", Nature 403 (2000) :
Graphs", Physical Review Letters 85 (2000) : 5468-5471. 853-858. Para uma incursão fotográfica fenomenal nessas áreas de alta biodiversidade,
veja Russell A. Mittermeier, Norman Myers, Patrício Robles Gil e Cristina G. Mitterme­
Página 1 0 3 : P ara uma lista detalhada de links sobre MafiaBoy, vej a ier, Hotspots: Earth 's Biologically Richest and Most Endangered Terrestrial Ecoregions
http://www.mafiaboy.com. (México City: Cemex Conservation International, 2000).
Página 104: Note que nem todo mundo acredita que a Operação "Eligible Receiver"
Página 106: A expressão "calcanhar de aquiles", tal como aplicada às redes e à Inter­
realmente tenha existido. Alguns críticos sustentam que não passa de invencionice do net, me foi sugerida por Janet Kelley depois que lhe expliquei nossos resultados. Origi­
Pentágono repetida aos jornalistas. Veja, e.g., · http://www.soci.niu.edu/-crypt/ nalmente incluída no título do ensaio publicado na Nature, a expressão só apareceu na
other/eligib.htm. capa da revista.
Página 104: Segundo o Computer Currents Internet Dictionary (http://www.compute­ Página 106: O conceito de espécies fundamentais foi introduzido por Robert Paine,
ruser.com/resources/dictionary.html), cracker é "o indivíduo que viola sistemas compu­ em R. T. Paine, "A Note on Trophic Complexity and Community Stability'', American
tacionais e os utiliza sem autorização, por maldade ou exibicionismo". Em constraste, Naturalist 103 Gan-fev 1969) : 91-93. Para uma discussão geral sobre as lontras-do-mar,
hacker é "o sujeito que conhece bem de computadores e possui criatividade em progra­ veja o capítulo 1 em Simon Levin, Fragile Dominion: Complexity and the Commons (Cam­
mação, o que geralmente implica capacidade de programar em linguagem assembly ou bridge: Perseus, 1999).
em linguagens inferiores. Hacker "pode significar um especialista em programação que,
por meio de estratagemas, consegue driblar os bloqueios e expandir os limites de um sis­ Página 107: Para uma discussão pormenorizada sobre o blecaute do verão de 1996,
tema". Dessa forma, para distinguir dos bem-intencionados hackers, usamos o termo veja D. N. Kosterev C. W. e W. A. Mittlestadt, "Model Validation of the August 10, 1996,
cracker para designar os indivíduos que tencionam atacar a Internet por maldade. Para WSCC System Outage", IEEE Transactions on Power Systems 14 (agosto de 1999):
uma discussão mais detalhada, veja, e.g., Pekka Himanen, The Hacker Ethic and the Spi­ 967-977.
rit of the Information Age (New York: Random House, 2001); Richard Power, Tangled Página 107: Para uma discussão sobre falhas em cascata, veja, e.g., Duncan J. Watts, A
Web: Tales of Digital Crime from the Shadows of Cyberspace (Indianapolis: Que, 2000); Simple Model of Fads e Cascading Failures, http://www.santafe.edu/sfi/publicati­
Steven Levy, Hackers: Heroes of the Computer Revolution (New York: Penguin Books, ons/Abstracts/00-12-062abs.html.
1994).
Página 104: A fragilidade das redes a ataques foi discutida pela primeira vez, na
mesma publicação, como tolerância a erro, i.e., Réka Albert, Hawoong Jeong e D ÉCIMA CONEXÃO: Vírus e Modismos
Albert-László Barabási, "Attack and Errar Tolerance of Complex Networks", Nature 406
(2000) : 378. Página 111: A história de Gaetan Dugas como Paciente Zero é relembrada em Randy
Página 105: Para uma abordagem analítica do problema dos ataques, veja, e.g., Reu­ Shilts, And the Band Played On (New York: St. Martin's Press, 2000), crônica ágil e
ven Cohen, Keren Erez, Daniel Ben-Avraham e Shlomo Havlin, "Breakdown of the Inter­ estarrecedora do dia a dia da epidemia de Aids. Para um dossiê atualizado da situação
net under Intentional Attack", Physical Review Letters 86 (2001) : 3682; D. S. Callaway, da Aids, veja ''Nature Insight - AIDS", Nature 410, n. 9 (2001): 961-1007.
M. E. J. Newman, S. H. Strogatz e D. J. Watts, "Network Robustness and Fragility: Per­ Página 112: A história <ie Mike Collins e do cartum das cédulas eleitorais da Flórida é
colation on Random Graphs", Physical Review Letters 85 (2000) : 5468-5471. contada por Collins a Robb Mandelbaum em "Only in America", New York Times Maga­
Página 106: Para a resiliência da rede proteica a mutações e ataques medicamentosos, zine (26 de novembro de 2000).
veja Hawoong Jeong, Sean Mason, Albert-László Barabási e Zoltán N. Oltvai, "Lethality Página 114: Para informação sobre epidemias e doenças, veja Rob DeSalle, ed., Epide­
and Centrality in Protein Networks", Nature 411 (2001): 41-42. mie! The World ofInfectious Disease (New York: New Press, 1999).
Página 106: Para uma discussão sobre colapso dos ecossistemas em virtude da remo­ Página 114: Note que há diferenças importantes entre os vários processos de difusão,
ção de espécies fundamentais, veja, e.g., Ricard V. Sole e José M. Montoya, Complexity como a disseminação de ideias ou vírus. Por exemplo, alguém pode se curar de várias
and Fragility in Ecological Networks, http://xxx.lanl.gov/abs/cond-mat/0011196; Fer­ doenças, sem transmitir o vírus, ou desenvolver imunidade, para não ser infectado de
renc Jordán e István Scheuring, "Can Keystones Help in Background Extinction?" novo. Com relação às ideias, embora possa rejeitá-las, umas vez aceitando-as, o indiví-

'222 '223
duo continua a propagá-las. Da mesma maneira, alguns vírus, como o E�?la, pode� des­ uma perspectiva desses resultados, veja Alun L. Lloyd e Robert M. May, "How Viruses
truir rapidamente seus hospedeiros, só lhes dando tempo de transrmtt-�os, fen�m:no Spread Among Computers and People", Seienee 292 (2001) : 1316.
que novamente se encontra ausente da disseminação da maio�a do� mo�1smos e 1�e1as.
_ Página 123: Fredrik Liljeros, Christopher R. Edling, Luis A. Nunes Amaral, H. Eugene
Apesar dessas diferenças, muitos dos traços fundam:n:rus da dissemmaçao de modismos
� Stanley e Yvonne Aberg, "The Web of Human Sexual Contacts", Nature 41 1 (2001):
e vírus biológicos e computacionais são bastante similares, razao pela qual frequente­
mente os confundimos. 907-908. A história da descoberta de Stockholm-Boston me foi relatada por Frederik Lil­
jeros e Christopher R. Edling, os dois primeiros autores do estudo.
Página 115: O estudo dos fazendeiros de Iowa encontra-se publicado em B�c� Ryan e
,
Neal c. Gross, "The Diffusion of Hybrid Seed Com ln Two Iowa Commumttes , Rural Página 124: O estudo de Trieste prevê que o limiar para difusão em uma· rede sem
Soeiology 8, n. 1 (1943) : 15-24. escala se esvanece quando o expoente do grau, y, é menor que 3. Para expoentes maio­
res que esse valor crítico, tal limiar ressurge e o comportamento é similar àquele visto
Página 1 15: Para uma descrição simples da curva de sino e seu impacto sobre bochi­ nas redes randômicas, i.e., vírus menos contagiosos extinguir-se-ão. Os expoentes obti­
cho e marketing, veja Emanuel Rosen, The Anatomy of Buzz (New York: Doubleday, dos pela colaboração Stockholm-Boston não fornecem orientação única a esse respeito.
2000) : 94-95. Para dados de um ano, eles obtiveram y = 3,54 ± 0,2 (femininos) e y = 3,31 ± 0,2 (mas­
Página 116: Para o estudo dos médicos, veja James Coleman, Elihu Katz e Herbert culinos), enquanto dados mais extensos (embora potencialmente também mais enviesa­
Menzel 'Toe Diffusion of an Innovation Among Physicians", Soeiometry 20, n. 4 (1957): dos) sobre todos os parceiros fornecem y = 3,1 ± 0,3 (femininos) e y = 2,6 ± 0,3 (mas­
253-270. Para um estudo prévio sobre os líderes de opinião, veja Elihu Katz e Pa� �­ culinos) . Enquanto os dois primeiros expoentes são claramente maiores do que 3, os
Lazarsfeld, Personal Infiuenee: the Part Played by People in the Flow of Mass Commumeact­ dois últimos são menores ou se encontram no limite. É patente a necessidade de pesqui­
ons (Glencoe, III: Free Press, 1955). sas mais extensas para chegar-se a uma resposta definitiva.
Página 118: Para os modelos de limiar, veja Mark Granovetter, "Threshold Models of Página 124: As famosas 20 mil linhas são de Wilt Chamberlain, A View from Above
Collective Behavior'', Ameriean Joumal of Sociology 83, n. 6 (1978): 1420-1443. P�a (New York: Villard Books, 1991).
uma revisão geral do tema, veja também Thomas W. Valen�e, Network Models o� the Dif­ Página 124: Para uma pesquisa sobre as duas longas décadas da epidemia de Aids e
fusion of Innovations (Cresskill: Hampton Press, 1995� ; En: Abrahamson e Lon �osen­ seu impacto sobre a sociedade, veja, e.g., Sharon Begley, "Aids at 20", Newsweek (11 de
_
kopf, "Social Network Effects on the Extent of lnnovatJ.on D1ffus10n: a Computer Srm�a­ junho de 2001).
tion", Organization Seienee 8, n. 3 (1997): 289-309.
Página 125: Para uma descrição detalhada das leis que governam a disseminação dos
Página 1 19: Para uma crônica do Love Bug destinada ao público em geral, veja Lev vírus, veja Martin A. Nowak e Robert M. May, Virus Dynamics: Mathematieal Principles of
Grossman, "Attack of the Love Bug'', Time (15 de maio de 2000). Immunology and Virology (Oxford: Oxford University Press, 2000) .
Página 119: Vírus de computador transmitidos por e-mail, como o Love Bug, dissemi­ Página 126: E;tritamente falando, nossas simulações admitiram que os hubs, uma vez
nam-se em uma rede social cujos nós são os usuários de e-mail, conectados se costuma­ tratados, poderiam ser novamente infectados se entrassem em contato com um outro nó
rem enviar e-mails uns aos outros. Recentemente, os cientistas alemães mostraram que contaniinado. Como a situação subsiste hoje, aqueles tratados com a medicação atual­
essa é uma rede sem escala. -Veja Holger Ebel, Latz-lngo Mielsch e Stefan Bornholdt, mente disponível terão, realmente, uma quantidade menor de vírus e, portanto, menor
Scale-Free Topology of E-mail Networks, http://xxxlanl.gov/abs/cond-mat/0201476. probabilidade de disseminar a enfermidade. Quando se trata da Aids, há muitos outros
Página 121: Para um artigo geral sobre a disseminação de vírus d: co��uta?or, veja detalhes que se deve ter em mente. Quisemos apenas mostrar que o limiar epidêmico
Jeffrey o. Kephart, Gregory B. Sorkin, David M. Chess e Steve R. White, F1g�ttng Com­ retornará se o enfoque incidir sobre os hubs. Por conseguinte, independentemente dos
puter Viruses", Scientifie Ameriean (nov. 1997) : 88-93. Para abordagens I?-rus detalha­ pormenores do processo de disseminação, a cura dos hubs será uma política mais efetiva
das, veja Jeffrey O. Kephart, Gregory B. Sorkin, William C. Arnold, Da_vid M. Chess, do que a distribuição aleatória de medicamentos, supondo-se que o número de curados
Gerald J. Tesauro e Steve R. White, "Biologically Inspired Defenses Against Computer seja limitado. A meta, evidentemente, seria obter a cura de quem quer que dela precise.
Viruses" em Maehine Leaming and Data Minning: Methods and Applieations, ed. R. S. Para nosso estudo, veja Zoltán Derzsó e Albert-László Barabási, Can We Stop the AIDS
Michalski (New York: John Wiley, 1998); Steve R. White, "Open Problems in Vírus Rese­ Epidemie?, http://xxx.lane.gov/abs/cond-mat/0107420. Veja também Romualdo Pas­
arch", Intemational Virus Bulletin (Munich, 22-23 de outubro de 1998). tor-Santorras e Allesandro Vespignani, "lmmunization of Complex Networks", Physieal
Review, E 65 (2002) : 036104.
Página 121: A ausência de limiar na disseminação em uma rede sem escala foi des­
crita em Romualdo Pastor-Santorras e Alessandro Vespignani, "Epidemie Spreading in
Scale-Free Networks", Physieal Review Letters 86 (2001) : 3200-3203; Epidemie Dynamics
and Endemie States in Complex Networks, Physieal Review, E 63 (2001) : 0066117. Para

224 225
r'

D ÉCIMA PRIMEIRA CON EXÃO: Despertar da Internet Página 133: Para uma melhor noção do trabalho da colaboração da Caida, veja, e.g. K.
C. Claffy, T. Monk e D. McRobb, "Internet Tomography'', Nature Ganeiro de 1999), dis­
ponível em http://www.nature.com/nature/webmasters/.
Página 129: A citação de Baran encontra-se em John Naughton, A Brief History of the
Future (Woodstock: Overlook Press, 2000) : 93. Para maiores informações sobre a vida Página 133: Para uma descrição vívida e detalhada dos esforços envolvidos no mapea­
deBaran, veja capítulo 6 do livro de Naughton. mento da Web e da Internet, veja Martin Dodge e Rob Kitchin, Atlas of Cyberspace (New
York: Addison-Wesley, 2002). Veja também Martin Dodge e Rob Kitchin, Mapping
Página 130: Recentemente, uma série de livros e artigos tem enfocado a história da Cyberspace (London: Routledge, 2000) .
Internet. Além do já citado livro de Naughton, veja, e.g., James Gillies e Robert Cailliau,
How the Web Was Bom: the Story of the World Wide Web (Oxford: Oxford University Página 133: Para uma discussão geral sobre o efeito da auto-organização na topologia
Press, 2000) . O último ressalta principalmente a Web, embora contenha também alguns da Internet, veja, e.g.; Albert-László Barabási, "The Physics of the Web", Physics World
elementos da história da Internet. Gulho de 2001): 33-38.
Página 131: Os históricos memorandos RAND de PaulBaran estão disponíveis na Web Página 134: Para o surgimento do correio eletrônico, veja John Naughton, A Brief His­
em http://www.rand.org/publications/RM/baran.list.html. O que nos interessa, no tory of the Future (Woodstock: Overlook, 2000).
tocante à topologia de rede, é Paul Baran, Introduction to Distributed Communications Página 135: Vem Paxson e Sally Floyd, "Why We Don 't Know How to Simulate the
Networks, RM-3420-PR, disponível na mesma página da Web. A figura 11.1 foi extraída Internet", Proceedings of the 1997 Winter Simulation Conferece, ed. S. Andradottir, K. J.
desse ensaio. Healy, D. H. Withers eB. L. Nelson. A expressão "sucesso desastroso" também se origina
Página 132: Note que a gênese da comutação de pacotes tem sido objeto de disputa desse ensaio (veja p. 149).
nos últimos tempos. Alguns acreditam que Leonard Kleinrock também chegou à ideia Página 135: A descoberta de que a Internet possui uma distribuição de grau de lei de
independentemente de Baran e Davies. Para uma discussão sobre a querela histórica, potência foi reportada em M. Faloutsos, P. Faloutsos e C. Faloutsos, "On Power-Law
veja Katie Hafner, "A Paternity Dispute Divides Net Pioneers", New York Times (8 de Relationships of the_Intemet Topology'' [ACM SIGCOMM 99, comp.] Computer Commu­
novembro de 2001). nications Review 29 (1999) : 251. Para avaliações mais recentes, confirmando essa desco­
Página 132: Como James Gillies e Robert Cailliau discutem no já citado How the Web berta em amostras mais amplas, veja, e.g., R. Succ e H. Tangmunarunkit, "Heuristics for
Was Bom, a despeito de todas as aparências, o princípio funcional da Internet asse11:1-e­ Internet Map Discovery'', Proceedings ofInfocom (março de 2000).
lha-se mais ao do correio do que ao da rede telefônica. No tradicional sistema telefômco Página 136: Para a linha do tempo dos primeiros nós da Internet, veja John Naugh­
analógico, quando telefonamos para alguém, nosso telefone é conectado por uma série ton, A BriefHistory of the Future.
de fios e comutadores diretamente ao telefone da pessoa com quem desejamos falar.
Uma vez estabelecida essa conexão, a linha física é compartilhada inteiramente a serviço Página 137: Note que o primeiro modelo de Internet foi introduzido em Bernard M.
de nós dois, inacessível à chamada de qualquer outra pessoa, independemente de dizer­ Waxman, "Routing Multipoint Connections", IEEE Joumal on Selected Areas in Communi­
mos algo ou não. O sistema postal funciona com base em um princípio diferente. Os cor­ cations 6 (dezembro 1988) : 1617-1622. Waxman estabeleceu um grande número de nós
reios são conectados por uma rede de rodovias. As correspondências coletadas por cada em um plano e os interconectou aleatoriamente. Até aí, não diferia do modelo randô­
agência são classificadas segundo sua destinação e colocadas em caminhões e aviões que mico de Erdós e Rényi. Entretanto, consciente dos altos custos de fiação, ele quis desen­
transportam todas as cartas que compartilham a mesma rota. Em contraste com o sis­ corajar links muito extensos. Por esse rríotivo, admitiu que a probabilidade de que dois
tema telefônico, jamais teríamos um único caminhão que levasse nossa carta direta­ nós na Internet sejam conectados decai exponencialmente com a ·distância entre eles. O
mente de nossa residência a seu destinatário. De maneira semelhante, na Internet, os modelo simples de Waxman dominou a modelagem da Internet durante décadas. Só foi
computadores se comunicam por mensagens que se fragmentam em minúsculas parcelas posto em xeque em 1999, quando se descobriu a natureza sem escala da Internet. Con­
chamadas pacotes. A exemplo de uma correspondência, cada pacote contém informação tudo, a distância de dependência exponencial abriu caminho, com o crescimento e a
acerca de seu destino. Toda vez que um rotl;'!ador recebe um pacote, ele observa o ende­ conexão preferencial, também para modelos mais modernos de Internet. Em primeiro
reço e o envia para o roteador mais próximo de seu destino. Pacotes da mesma mensa­ lugar, as simulações apontam que com essa drástica distância de dependência, como
gem frequentemente trafegam por diferentes rotas, pois há diversos caminhos que propõe o modelo de Waxman, as redes sem escala não podem desenvolver-se. Em
conectam qualquer fonte e destino. Quando todos os pacotes chegam, o computador segundo lugar, e até mais importante, as mensurações de Yook e de Jeong indicam que a
recipiendário reúne-os, criando uma mensagem de correio eletrônico ou a Webpage que probabilidade de conectar dois nós à distância d de cada um decrescia linearmente com
aparece na tela de nosso computador. d - dependência muito mais fraca do que a forma exponencial admitida por Waxman.
Página 137: A presença de conexão preferencial na Internet é abordada em diversas
publicações. Veja, e.g., Soon-Hyung Yook, Hawoong Jeong e Albert-László Barabási,

226 227
Modeling the Internet 's L arge Scale Top o logy, http ://xxx. lanl. gov/abs/ Página 141: Para uma detalhada discussão sobre computação distribuída, veja, e.g.,
cond-mat/0107417; Hawoong Jeong, Zoltán Néda e Albert-László Barabási, Measuring Ian Foster, "Internet Computing and the Emerging Grid", Nature (dez. 2000), disponível
Preferential Attachment for Evo lving Netw orks, http ://xxx.lanl. gov/abs/ em http://www.nature.com/nature/webmasters.
cond-mat/0104131; Romualdo Pastor-Santorras, Alexei Vasquez e Alessandro Vespig­
nani, "Dynamical and Correlation Properties of the Internet'', Physical Review Letters 87 Página 142: Para uma interessante discussão sobre o envoltório eletrônico que se
(2001) : 258701. desenvolve em torno da Terra, veja Neil Gross, "The Earth Will Don and Electronic
Skin", Business Week (30 de agosto de 1999): 68-70.
Página 137: Admitindo-se que os nós surjam proporcionalmente à densidade popula­
cional e que a probabilidade de que um nó se conectará a um outro nó com k links situa­
do a uma distância r é proporcional a k/Â-", onde cr é um parâmetro livre que nos per­ D ÉCIMA SEGUNDA CONEXÃO: Rede Fragmentada
mite ajustar o efeito do componente espacial: se cr é grande, então a distância é muito
importante, ao passo que se cr = O, então a conexão preferencial importa para a evolu­
ção da Internet. As simulações ofereceram uma resposta mais clara: sempre que cr for Página 144: Para a reação dos mecanismos de busca no estudo do NEC, veja o traba­
menor que 2, surgirá uma rede sem escala. Contudo, se cr for maior que 2, então o efeito lho de Thomas E. Weber, "Fast Forward: Media in Motion", Wall Street Joumal (3 de
restritivo da distância prevalecerá, e a rede desenvolverá uma distribuição de grau expo­ abril de 1998).
nencial. Nossas mensurações indicaram claramente isso para a Internet cr =l, expli­ Página 144: Para o Inquirus, veja Steve Lawrence e C. Lee Giles, "Inquirus: the NECI
cando por que, apesar dos custos do estabelecimento de cabos mais extensos para obter Meta Search Engine", Seventh International World Wide Web Conference, Brisbane,
maior largura de banda; a topologia sem escala sobrevive. Além de explicar por que a Australia (Amsterdam: Elsevier Science, 1998): 95-105.
Internet é uma rede sem escala, esses resultados também indicaram quão importante é
Página 145: As descobertas do grupo NEC foram publicadas em dois trabalhos: Steve
descobrir, em termos quantitativos, os diferentes princípios concorrentes que presidem a
Lawrence e C. Lee Giles, "Searching the World Wide Web", Science 280 (1998): 98-100;
evolução de rede. Veja Soon-Hyung Yook, Hawoong Jeong e Albert-László Barabási,
Steve Lawrence e C. Lee Giles, "Accessibility of Information on the Web", Nature 400
Modeling the Internet 's Large-Scale Topology, http://lanl.gov/abs/cond-mat/0107417.
(1999) : 107-109.
Página 137: Para outros recentes modelos de Internet que incorporam a topologia sem
Página 146: Para uma detalhada discussão sobre o tamanho da Web, veja http://sear­
escala da Internet, veja Alberto Medina, Ibrahim Matta e John Byers, "On the Origin of
chengine.com/. Para as últimas estatísticas sobre tamanho de ferramentas de busca, veja
Power Laws in Internet Topologies", [ACM SIGCOMM] Computer Communications
Review 30, n. 2 (2000) : 18-28; G. Caldarelli, R. Marchetti e L. Pietronero, "The Fractal o ensaio de Sullivan, "Search Engine Sizes", Search Engine Report, 15 de agosto de 2001,
disponível em http://searchengine.com/reports/sizes.html; veja também "Numbers,
Properties of the Internet", Europhysics Letters 52 (2000) : 386; K.I. Goh, B. Kahng, D.
Numbers - But What Do They Mean?", Search Engine Report (3 de março de 2000),
Kim, Universal Behavior of Load Distribution in Scale-Free Networks, Physical Review of
Letters 87 (2001); 278701: A. Capocci, G. Caldarelli, R. Marchetti e L. Pietronero, "Gro­ http://searchengjne.com/sereport/00/03-numbers.html.
wing Dynamics of Internet Providers", Physical Review E 64 (2001): 035101. Página 148: A estrutura fragmentada da Web é conhecida como a teoria da gravata­
borboleta e foi observada pela primeira vez em A. Broder, R. Kumar, F. Maghoul, P. Rag­
Página 137: Os fractais, objetos autossimilares com propriedades geométricas não tri­
havan, S. Rajagopalan, R. Stata, A. Tomkins e J. Wiener, "Graph Structure in the Web",
viais, foram introduzidos por Benoit Mandelbrot. Posteriormente, verificou-se que des­
creviam muitos objetos naturais, de flocos de neve a colônias de células. Veja, e.g., B. Ninth International World Wide Web Conference, Amsterdam,
http://www9.org/w9cdrom/160/l60.html.
Mandelbrot, The Fractal Geometry of Nature (New York: W. H. Freeman, 1977) . Para
uma revisão mais recente, veja T. Vicsek, Fractal Growth Phenomena (Singapore: World Página 149: À medida que envelhecem e se tornam conhecidas, as páginas da Web
Scientific, 1992). naturalmente atravessam os continentes. Sua posição é determinada conjuntamente pelo
criador da página da Web e pelo interesse da comunidade Web pelo conteúdo das pági­
Página 138: A falha de roteamento em MAI foi descrita em diversas reportagens.Veja,
nas. Como os links e as páginas da Web são constantemente adicionados, removidos,
e.g., "Router Glitch Cuts Net Access", CNET (25 de abril de 1997).
modificados e enriquecidos e subtraídos de links, a população desses continentes encon­
Página 139: Para uma discussão sobre o verme de computador Código Vermelho, veja tra-se em constante fluxo, comparado ao qual os grandes fluxos da Europa para os Esta­
Carolyn Meinel, "Code Red for the Web", Scientific American (outubro de 2001) : 42-51. dos Unidos, no final do século XIX e começo do século XX, são eventos pequenos, des­
Página 140: Para computação parasitária, veja Albert-László Barabási, Vincent W. prezíveis. Um único link bem situado pode determinar o destino e a localização de
Freeh, Hawoong Jeong e Jay B. Brockman, "Parasitic Computing'', Nature 412 (2001) : milhares de páginas da Web, sendo todo o território reorganizado por pequenas ou gran­
894-897. Para mais informações, veja http://www.nd.edu/-parasite/. des avalanches.

228 229
Página 150: Pará recente pesquisa sobre as propriedades das redes direcionadas, veja Só há uma maneira de deter essa trágica história e a criatividade hospedada na Web dos
S. N. Dorogovtsev, J. F. F. Mendes e A. N. Samukliin, Giant Strongly Connected Compo­ dias atuais. Devemos arquivar tudo o que existe aí para as gerações vindouras. Devemos
nent of Directed Networks, http://xxx.lanl.gov/abs/cond-mat/0l03629; M. E. J. New­ fazer um esforço compenetrado, talvez com o apoio do governo, no sentido de ir além
man, S. H. Strogatz e D. J. Wats, "Random Graphs with Arbitrary Degree Distributions dos objetivos e dos meios do Internet Archive e mapear toda a Web. Cada página dela.
and Their Aplications", Physical Review E 64 (2001) : 026118; B. Tadic, "Dynamics of Devemos tomar seu passado e seu conteúdo atual instantaneamente disponíveis para
Directed Graphs: The World Wide Web", Physical A 293 (2001) : 273-284. qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo.
Página 150: Cass R. Sunstein, Republic.com (Princeton: Princeton University Press, Página 158: Muito embora enfoquemos neste capítulo sobretudo a topologia da Web,
2001). recentemente uma série de trabalhos investigou nossos padrões de navegação e nosso
comportamento dinâmico na Web, descobrindo maiores evidências de comportamento
Página 151: A citação do juiz Stewart sobre pornografia aparece em diversos lugares.
emergente e ·de leis de potência. Veja Bernardo A. Huberman, Peter L. T. Pirolli, James
Veja, e.g., "The Task of Defining What 's Too Explicit to Be Seen", USA Today, 26 de E. Pitkow e Rajan M. Lukose, "Strong Regularities in World Wide Web Surfing", Science
janeiro de 1999, disponível em http://www.usatoday.com/life/cyber/tech/ctb1l4.htm. 280 (1998) : 95-97; Anders Johansen e Didier Sornette, Download Relaxation Dynamics
Página 152: Para o trabalho do NEC sobre comunidades na Web, veja Gary William on the WWW Following Newspaper Publication of URL, http://xxx.lanl.gov/abs/
Flake, Steve Lawrence e C. Lee Giles, "Efficient Identification of Web Communities", Pro­ cond-mat/9907371; Bernardo A. Huberman, The Laws of the Web (Cambridge: MIT
ceedings of the Sixth Intemational Conference on Knowledge Discovery and Data Mining Press, 2001).
(Boston: ACM Special Interest Group on Knowledge Discovery in Data and Data Mining,
August, 2000), 156-160. Diversos outros grupos vêm trabalhando sobre problemas
semelhantes. Veja David Gibson, Jon Kleinberg e Pranhakar Raghavan, "Infering Web DÉCIMA TERCEIRA CONEXÃO: Mapa da Vida
Communities from Link Topology'', Proceedings of the 9th ACM Conference on Hypertext
and Hypermedia (1988); e Ray R. Larson, Bibliometrics of the World Wide Web: an Explo­
Página 159: Para causas determinantes de morte nos Estados Unidos (incluindo
ratory Analysis of the Intellectual Structure of Cybespace, http://sherlock.berke­
ley.edu/asis96/asis96.html. depressão), veja o Website dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC),
http://webapp.cdc.gov/.
Página 152: Para uma discussão dos problemas completos de NP, veja M. Garey e D.
Página 159: Para pesquisa especificamente sobre depressão maníaca, veja Nick Crad­
S. Johnson, Computers and Intractability: a Guide to the Theory of NP-Completeness (San
Francisco: H. W. Freeman, 1979) . dock e Ian Jorres, "Molecular Genetics of Bipolar Disorder", British Joumal o- f Psychiatry
174, supl. 41 (2001): 128-133. Para pesquisa sobre depressão com discussão também
Página 152: Lada A. Adamic, "The Small World Web", Proceedings of ECDL '99, LNCS sobre depressão maníaca, veja Charles B. Nemeroff, "The Neurobiology of Depression",
1696 (Springer, 1999) : 443-452. Veja também Lada A. Adamic e Eytan Adar, Friends Sdentific Ameri-can Gunho de 1998).
and Neighbors on the Web, http://www.hpl.hp.com/research/idl/papers/web10/.
Página 160: A decodificação do genoma humano teve ampla cobertura da imprensa,
Página 153: Lawrence Lessig, Code and Other Laws of Cyberspace (New York: Basic tanto por ocasião do anúncio oficial da Casa Branca, em 26 de junho de 2000, como em
Books, 1999). virtude da publicação do genoma em 15 e 16 de fevereiro de 2001. Veja Sdence 291
Página 156: Para conhecer mais sobre o Internet Archive, visite seu Website em
(fev. de 2001) e Nature 409 (fevereiro de 2001).
http://www.archive.org/. Página 161: Para uma recente discussão sobre biologia pós-genômica e as visões cam­
Página 157: Boa parte de nossa vida criativa está se voltando para a Web. O fotógrafo
biantes do papel do gene, veja Evelyn Fox Keller, The Century of the Gene (Cambridge:
Harvard University Press, 2000).
moderno utiliza uma câmera digital e manipula os bits para melhor expressar sua visão.
Algumas dessas imagens serão impressas e expostas em galerias. Muitas, contudo, só Página 161: Para uma excelente introdução à biologia celular, veja Bruce Alberts,
estão disponíveis em formato eletrônico na Web. A maioria dos poemas já não é publi­ Dennis Bray, Julian Lewis, Martin Raff, Keith Roberts e James D. Watson, Molecular Bio­
cada em antologias; está disponível nos arquivos Web. Esta é o meio primordial para um logy of the Cell (New York: Garh:µid, 1994) .
crescente número de artistas visuais cuja obra não pode ser apreciada sem um navega­
Página 161: A pesquisa sobre metabolismo remonta ao século XIX, respondendo à
dor. Tudo isso, porém, se perderá irreversivelmente em razão de sites malcuidados, com­
putadores quebrados e re=sos em extinção. Não teremos Van Goghs no futuro porque necessidade dos fabricantes de vinho francês de controlar as etapas pelas quais as célu­
sua obra, se não for apreciada por seus contemporâneos, não sobreviverá para as futuras las da levedura transformam glicose em álcool e bolhas de dióxido de carbono. Essa
gerações. A genialidade criativa do mundo virtual será alavancada com atualizações linhagem é preservada no nome enzima, cuja raiz significa "em levedo". Desse modo, a
computadorizadas ou mudanças tecnológicas, não em séculos, mas em curtíssimos anos. bioquímica pode ser vista com um gigantesco projeto de mapeamento que tenta criar

230 231

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um inventário de todas as possíveis substâncias e reações químicas presentes na célula. "Centrality and Lethality of Protein Networks", Nature 411 (2001) : 41-42. Esse ensaio
Para uma detalhada história do mapeamento do metabolismo, veja Horace Freeland contém ainda a discussão sobre as relações entre letalidade e topologia. Para uma pers­
Ju<lson, The Eighth Day of Creation: Makers of the Revolution in Biology (Plainview: Cold pectiva acerca dos resultados, veja o artigo "News and Views", que acompanha o traba­
Spring Harbor Laboratory Press, 1996). lho. J. Hasty e J. J. Collins, "Protein Interactions - Unspinning the Web", Nature 411
(2001) : 30-31.
Página 162: Note que várias sub-redes, como a metabólica ou a rede de interação de
proteína, não são independentes entre si. Com efeito, as proteínas da rede reguladora Página 167: Para confirmação independente das leis de potência na rede de proteína
catalisam as reações químicas, controlando assim os links da rede metabólica. De manei­ da levedura, bem como para o potencial link para a duplicação genética, veja Andreas
ra similar, interações gene-proteína frequentes conjugam a rede de interação proteica Wagner, "Toe Yeast Protein Interaction Network Evolves Rapidly and Contains Few
com os genes e o DNA. Redundant and Duplicate Genes", Molecular Biology and Evolution 18 (2001) :
1283-1292.
Página: 163: A citação de Watson foi extraída de James D. Watson, Molecular Biology
ofthe Gene, 2ª ed (New York: W.A. Benjamin, 1970): 99. Página 168: Para os resultados sobre redes de domínio de proteína, veja Stefan
Wuchty, "Scale-Free Behavior in Protein Domain Networks", Molecular Biology and Evo­
Página 164: WIT (What Is There?) é um sistema integrado de análise comparativa de
lution 18 (2001) : 1694-1702. Para uma abordagem diferente sobre a rede de proteína
genomas sequenciados. O importante para nós é que ele também embasa a reconstitui­
da levedura também demonstrando uma estrutura sem escala, veja Jong Park, Michael
ção metabólica da sequência de dados. Pode ser acessado por sua Webpage
Lappe e Sarah A. Teichman, "Mapping Protein Family Interactions: Intramolecular and
http://www.unix.mcs.anl.gov/compbio/.
Intermolecular Protein Family Interaction Repertoires in the PBD and Yeast'', Joumal of
Página 164: Nossos resultados sobre a natureza sem escala do metabolismo foram Molecular Biology 307 (2001): 929-938. Para resultados sobre a rede de proteína do H.
publicados em H. Jeong, B. Tombor, R. Albert, Z. N. Oltvai e A.-1.Barabási, "Toe pylori, veja Hawoong Jeong, Sean Mason, Albert-László Barabási e Zoltán N. Oltvai,
Large-Scale Organization of Metabolic Networks", Nature 407 (2000) : 651-654. "Centrality and Lethality of Protein Networks", Nature 411 (2001): 41-42.
Página 165: A obra de Andreas Wagner e de David A. Fell sobre metabolismo foi Página 168: Sobre duplicação genética e seu papel evolutivo, veja John Maynard
publicada como "The Small World Inside Large Metabolic Networks", Proceedings of the Smith e Eõrs Szathmáry, The Origins ofLife (Oxford: _Oxford University Press, 1999).
Royal Sodety, London B 268 (2001) : 1803-1810.
Página 169: Os ensaios que, de maneira independente, sugerem a duplicação genética
Página 166: A comparação da rede metabólica de diferentes organismos pode ilumi­ como fonte da topologia sem escala nas redes reguladoras são A. Bhan, D. J. Galas e T.
nar igualmente as relações evolutivas entre diferentes espécies. Veja J. Podáni, Z. N. G. Dewey, "A Gene Duplication Growth Model of Scaling in Gene Expression Networks
Oltvai, H. Jeong, B. Tombor, A.-1. Barabási e E. Szathmáry, "Comparable System-Level (no prelo); A. Vasquez, A. Flammini, A. Maritan e A. Vespignani, Modeling of Protein
Organization of Archaea and Eukaryotes", Nature Genetics 29 (2001) : 54-56; C. V. Interaction Neb,yorks (http://xxxlanl.gov/abs/cond-mat/0108043) ; R. V. Solé, R. Pas­
Forst e K Schulten, "Phylogenetic Analysis of Metabolic Pathways", Joumal of Molecular tor-Santorras, E. D. Smith e T. Kepler, "A Mode of Large-Scale Proteome Evolution"
Evolution 52 (2001): 471-489. (Santa Fe Preprint, disponível em http://www.santafe.edu, 2001). Veja também J.
Giam, N. M. Luscombe e M. Gerstein, "Protein Family and Fold Occurrences in Geno­
Página 167: A técnica do duplo lubrido da levedura foi desenvolvida em S. Fields e O.
mes: Power-law Behavior and Evolutionary Model", Joumal of Molecular Biology 313
Song, "A Novel Genetic Systém to Detect Protein-Protein Interactions", Nature 340
(2001): 673-681. Note que os modelos de duplicação genética possuem uma série de
(1989) : 245-246. Para recentes desenvolvimentos na técnica, veja também Li Zhu e Gre­
propriedades fascinantes da perspectiva da teoria de rede. Para uma discussão mais
gory J. Hannon, eds., Yeast Hybrid Methods (Natick: Eaton, 2000).
detalhada, veja J. Kim, P. L. Krapivsky, B. Kahng e S. Redner, "Evolving Protein in Inte­
Página 167: O mapa da interação abrangente da levedura foi publicado por P. Uetz et ractive Networks", http://xxx.lanl.gov/abs/condmat/0203167.
al. em "A Comprehensive Analysis of Protein-Protein Interactions in Saccharomyces cere­
Página 169: Lane, Levine e Vogelstein vêm conquistando todas as láureas e prêmios
visiae", Nature 403 (2000) : 623-627; T. Ito et al., "Toward a Protein-Protein Interaction
possíveis no campo da medicina, levando muitos a acreditar que é apenas uma questão
Map of the Budding Yeast: a Comprenhensive System to Examine Two-Hybrid Interacti­
de tempo para que ganhem também o Nobel. De fato, David Lane, hoje um dos cientis­
ons in ali Possible Combinations Between the Yeast·Proteins", Proceedings of the National
tas mais importantes e citados no Reino Unido, foi agraciado com o título de Sir David
Academy of Sdences 97 (2000) : 1143-1147; "A Comprehensive Two-Hybrid Analysis to
Lane pela rainha Elizabeth em 2000. Arnold J. Levine, atualmente presidente da presti­
Explore the Yeast Protein Interactome", Proceedings of the National Academy of Sdence
giosa Universidade Rockfeller, em Nova York, foi o primeiro ganhadÓr do Prêmio Albany
98 (2001) : 4569-4574.
Medical Center, de 500 mil dólares, o segundo entre os prêmios da área médica, abaixo
Página 167: A natureza sem escala das redes de interação de proteína na levedura é apenas do Nobel em termos financeiros. Vogelstein, atualmente pesquisador Howard
discutida em Hawoong Jeong, Sean Mason, Albert-László Barabási e Zoltán N. Oltvai, Hughes da Johns Hopkins School of Medicine, continua a produzir um veio inédito de

232 233
descobertas significativas, e três de suas publicações se classificam atualmente entre os Pattems Underlying Gene Expression Profiles: Simplicity from Complexity'', Proceedings
dez ensaios mais citados da medicina. of the National Academy of Sciences 97 (2000) : 8409-8414; Orly Alter, Patrick O. Brown
Página 170: Para a sugestão de que as redes desempenham papel fundamental na e David Botstein, "Singular Value Decomposition for Genome-Wide Expression Data Pro­
compreensão do câncer, veja Bert Vogelstein, David Lane e Arnold J. Levine , "Surfing cessing and Modeling", Proceedings of the National Academy ·of Sciences 97 (2000) :
the p53 Network'', Nature 408 (2000) : 307-310. Vale observar que esse ensaio não faz 10101-10106.
uma análise quantitativa da rede; antes, apresenta argumentos empíricos indisputáveis Página 174: Vale observar que embora haja apenas cerca de 30 mil genes ou mais no
sobre a natureza sem escala das redes. Posteriormente analisamos a topologia da rede, genoma humano, o número de proteínas pode ser muito maior. Isso se deve a um pro­
verificando que, de fato, com boa aproximc!-ção, é sem escala (Hawoong Jeong, D. A. cesso chamado splicing alternativo, em que o RNA mensageiro é cortado e reatado de
Mongru, Z. N. Oltvai e A.-L. Barabási, inédito) . várias maneiras diferentes, criando proteínas diversas. Desse modo, nas eucariontes o
Página 172: A tecnologia do microarranjo, introduzida em 1991 por Stephen Fodor e número de proteínas é muito maior do que o número de genes, desafiando o dogma do
seus colaboradores (veja S. P. A. Fodor, J. L. Read, M. C. Pirrung, L. Stryer, A. T. Lu e D. um gene-uma proteína da biologia molecular, válido na bactéria.
Solas, "Light-Directed, Spatialy Addressable Parallel Chemical Synthesis", Science 251 Página 174: Para uma discussão sobre a complexidade do genoma e o papel da rede
[1991] : 767-773), p(;!rmite aos pesquisadores decifrar a dinâmica das interações dos genética, veja Jean-Michel Claverie, "What If There Are Only 30,000 Human Genes?",
genes no interior da célula. As consequências desse avanço tecnológico já alter�am fim­ Science 291 (2001) : 1255-1257.
damentalmente a forma como se faz biologia na maioria dos laboratórios. E só uma
questão de tempo para que ocorra uma mudança generalizada, da maneira como se pro­
cede ao diagnóstico no consultório do médico à produção do medicamento. Um chip de DÉCIMA QUARTA CON EXÃO: Economia em Rede
DNA, ou microarranjo, é um silício ou lâmina de wafer padronizada com uma tecnologia
utilizada por fabricantes de chip de computador. Máquinas fotolitográficas produzem
um arranjo de minúsculos orificios de largura suficiente para permitir que braços de Página 176: Para uma discussão geral sobre o papel das redes nas empresas e na eco­
robô se introduzam nesses estreitos orifícios dos filamentos de DNA, cada um dos quais nomia, veja E. Bonabeau, The Alchemy ofNetworks: Network Science Applied to Business.
contém um gene diferente. Assim, com 30 mil orificios, é possível inserir uma cópia de Página 176: A fusão Time Wamer e AOL é descrita em detalhes em Daniel Okrent,
cada gene do genoma humano em um único chip. Quando o DNA em uma célula gera "Happily Ever After'', Time (4 de janeiro de 2000). Veja também a extensa entrevista
proteína, um gene é primeiramente copiado em uma única molécula do RNA mensageiro conjunta de Steve Case, da AOL, e Jerry Levin, da Time-Wamer, na mesma edição da
(mRNA), que posteriormente será traduzida em uma proteína. Dessa forma, o número e revista.
o tipo de moléculas do mRNA em uma célula obedecem estritamente às ordens dadas
pelo DNA. Cada molécula do mRNA pode se encaixar apenas em um orificio de microar­ •página 177: Para o relato da fusão da Daimler-Benz e da Chrysler, veja Bill Vlasic e
ranjo, aquele que contém o segmento correspondente de DNA que primeiramente pro­ Bradley A. Stertz, Taken for a Ride: How Daimler-Benz Drove Off with Chrysler (New
duziu a molécula de mRNA. Se um biólogo, estudando uma rara enfermidade, introduzir York: William Morrow, 2000) .
uma cultura das células afetadas no chip de DNA, os orificios correspondentes aos genes Página 177: Nem todas as fusões são resultado de um mercado e de uma economia
ativos serão preenchidos com filamentos de RNA, ao passo que todos os outros orificios em expansão - a primeira onda de fusões de fato começou após a depressão mundial de
ficarão vazios. Uma leitora a laser escaneará cada orificio, indicando quais genes estão 1883. Para uma sucinta perspectiva histórica das fusões, veja David Besanko, David Dra­
ocupados produzindo proteínas. A avaliação nos indicará então quais genes estão fun­ nove e Mark Shanley, Economics of Strategy (New York: John Wiley, 2000) : 198-199.
cionando normalmente e quais os que estão avariados em razão de algum distúrbio
genético. Página 178: A organização hierárquica tem uma história de mais de um século. "Em
nosso esquema, não exigimos que nossos trabalhadores tenham iniciativa... Tudo o que
Página 173: Para uma discussão bastante ampla sobre o efeito das novas ferramentas queremos deles é que óbedeçam às ordens que lhes damos, façam o que dizemos, e
biológicas - como os microarranjos - no futuro da medicina e na produção de medica­ rápido", assim escreveu Frederick Winslow Taylor, o pai da administração científica, nos
mentos, veja o número especial da revista Time (15 de janeiro de 2001), intitulado primórdios do· século XX, sintetizando uma filosofia que é responsável pela riqueza e
"Drugs of the Future". pela cultura material como hoje a conhecemos. Como escreve Brink Lindsey em The Man
Página 173: Uma maravilhosa demonstração da capacidade que tem o microarranjo with the Plan (Reason Online, 1998, http://www.reason.com), antes de Taylor, a indús­
de acompanhar os genes que se encontram ativos ou inativos é retratada por diversos tria adotava o sistema artesanal, cujos segredos eram bem preservados e transmitidos a
ensaios recentes que identificaram grupos de genes que são simultaneamente ativos contragosto pelo mestre ao aprendiz. A verdadeira obra potencial da fábrica era ciosa­
durante diferentes estágios do ciclo celular. Veja Neal S. Holter, Madhusmita Mitra, mente conservada pelos artesãos porque o sistema de compensação baseava-se no
Amos Maritan, Marek Cieplak, Jayanth R. Banavar e Nina V. Fedoroff, "Fundamental número de peças produzidas e não nos soldos por hora. Taylor, utilizando um cronôme-

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tro, sozinho, mudou isso. Segmentou todos os procesos fabris em unidades simples, Página 178: Para uma discussão geral sobre a mudança dentro da firma rumo a uma
padronizando as tarefas e o sistema de remuneração. A abordagem da terra arrasada1 organização em rede, veja a edição dupla especial de BusinessWeek, ''The 21st Century
que imprimiu à manufatura transformou a Bethlehem Steel na fábrica mais moderna do Corporation" (21 a 28 de agosto de 2001).
mundo, reduzindo a jarda dos trabalhadores de 500 para 140, ao mesmo tempo que
duplicava a produção. Vítima do próprio sucesso, Taylor finalmente foi demitido como Página 179: Para uma concisa revisão das teorias de rede para organi�ações, veja
resultado do ódio provocado pela dispensa dos trabalhadores. Apesar disso, depois dele Peter R. Monge e Noshir S. Contractor, "Emergence of Communication Networks", em
nenhuma fábrica conseguiu competir sem adotar plenamente seus métodos. Taylor The New Handbook of Organizational Communication, ed. Fredric M. Jablin e Linda L.
introduziu uma nítida separação de níveis, reduzindo os trabalhadores a meros executo­ Putnam (Thousand Oaks: Sage Publications, 2001): 440-502.
res de ordens. Inventou o trabalhador do colarinho-branco, responsável pelo planeja­ Página 179: Para o papel desempenhado por Jordan no escândalo Clinton-Lewinsky,
mento de cada etapa do processo produtivo e por sua fiel execução por parte dos traba­ veja Eric Pooley, "The Master Fixer Is a Fix", Time (2 de fevereiro de 1998).
lhadores. Seu mais importante legado é o que chamamos de organização vertical, que
fixou por todo um século a estrutura da rede da empresa. A vida e a obra de Frederick Página 180: Para um exemplo local dos conselhos de admínistração intercruzados na
W. Taylor têm sido objeto de diversas biografias e de monografias científicas. Veja área de Chicago, veja Melissa Allison, "Directors Weave a Complex Web", Chicago Tri­
Robert Kanigel, The One Best Way: Frederick Winslow Taylor and the Enigma of Efficiéncy bune (17 de junho de 2001), seção 5, pp. 1-2.
(New York: Viking Penguin, 1997). Para uma biografia-padrão, veja Frank Barkley Página 180: Para uma detalhada discussão sobre a rede corporativa, veja o ensaio de
Copley, Frederick W. Taylor, Father of Scientific Management, 2 vols. (New York: Taylor Gerald F. Davis, Mina Yoo e Wayne E. Baker, "The Small World of the Corporate Elite"
Society, 1923). A obra influente de Taylor é Princípios de Administração Científica (New (fevereiro de 2001).
York: Harper & Brothers, 1915: reimpressão, Mineola: Dover, 1998).
Página 181: Para uma análise matemática da rede de conselhos de administração, veja
Página 1 78: Note que as fábricas da Ford também desempenharam papel crucial no M. E. J. Newman, S. H. Strogatz e D. J. Watts, "Random Graphs with Arbitrary Degree
surgimento da moderna indústria. Foi lá que se desenvolveu a linha de montagem Distributions and Their Applications", Physical Review E 64 (2001) : 026118.
móvel, componente-chave de todas as plantas de produção em massa. Para uma recen­
são da história dos desenvolvimentos ocorridos na Ford e dos protagonistas desses des­ Página 181: Para os passos de Jordan no mundo corporativo, veja capítulo 12 em Ver­
dobramentos na linha de montagem, veja Joseph B. White, The Line Starts Here non E. Jordan, autobiografia de Jr., com Annette Gordon-Reed, Vemon Can Read (a
(http://www.wsj.com/public/current/articles/SB915733342173968000.htm., W,111 Memoir) (New York: Public Affairs, 2001), e a obra anteriormente citada de Davis, Yoo e
Street Journal Interactive, 2000). Baker.
Página 178: A teoria econômica clássica encara organizações, firmas e corporações Página 182: Para o poder das redes no Vale do Silício, veja Emilio J. Castilla, Hokyo
como redes otimizadas cujo objetivo é realizar o máximo resultado financeiro com míni­ Bwang, Ellen Granovetter e Mark Granovetter, "Social Networks in Silicon Valley'', em
mos recursos. Esse é o legado de Taylor, para quem a administração de uma companhia The Silicon Valley Edge: a Habit for Innovation and Entrepreneurship, ed. Chong-Moon
é um processo de otimização que tem por objetivo a maximização dos lucros. Essa otimi­ Lee, William F. Miller, Marguerite Gong Hancock e Henry S. Rowen (Cambridge: Cam­
zação voltada para o lucro favorece uma estrutura em árvore. De fato, se a produção é o bridge University Press, 2001) : 218-247.
objetivo primordial da compaaj:ti.a, os custos podem ser significativamente reduzidos Página 183: Walter W. Powell, Douglas White e Kenneth W. Koput, "Dynamics and
pela alocação de todas as tarefas repetitivas, especializadas, a trabalhadores de remune­ Movies of Social Networks in the Field of Biotechnology: Emergent Social Structure and
ração mais baixa. Recentes estudos indicam que a informação também é mais eficiente­ Process Analyses" (12 de abril de 2001).
mente gerenciada dentro de uma organização hierárquica, pois a árvore evita a duplica­
ção desnecessária de informação e comunicação. Como cada atividade da firma é uma Página 184: Para uma detalhada análise matemática das redes da indústria farmacêu­
combinação de produção e gestão da informação, a estrutura piramidal desponta aqui tica, veja M. Riccaboni, F. Pammolli e G. Caldarelli, "Complexity of Connections in
para ficar. Para uma detalhada discussão sobre a árvore hierárquica dentro da empresa, Social and Economical Structures" (2001).
veja Patrick Bolton e Mathias Dewatriport, "Toe Firm as a Communication Network", Página 184: Para um outro exemplo de mundos pequenos na economia, veja Bruce
Quarterly Joumal of Economics 109 (novembro de 1994) : 809-839. Kogut e Gordon Walker, "The Small World of Germany and the Durability of National
Networks", American Sociological Review 66 (2001) : 317-335.
Página 184: Além ser sem escala, uma economia em rede revela também clusteriza­
ção. Há, em primeiro lugar, uma sólida clusterização com base na geografia, onde as
1 Política da terra arrasada é o nome dado a uma estrátegia de guerra que consiste em, caso ocorra companhias possuem mais conexões com os clientes locais. Globalização, a palavra da
uma invasão inimiga, destruir tudo o que não possa ser levado durante a retirada Utiliza-se essa moda da última década, significa efetivamente a proliferação de links de larga escala
prática para evitar que o invasor aproveite bens deixados para trás em sua própria companhia.

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que desafiam a geogr?fia - companhias que identificam clientes e fornecedores não Página 186: Ecónomic Report of the President (Washington: US Govemment Printing
localmente, mas em âmbito mundial. Há, em segundo lugar, a clusterização baseada na Office, 1999).
indústria - companhias que atuam no mesmo mercado ou negócio compartilhando mui­
tos links, os quais, embora geograficamente enviesados, recortam facilmente longas dis­ Página 1 8 6 : Paul Krugman, What Happened to Asia? Uaneiro de 1 998),
tâncias. A natureza clusterizada da economia foi documentada recentemente em Bruce http://web.mit.edu/krugman/www/DISINTER.html.
Kogut e Gordon Walker, "The Small World of Germany and the Durability of National Página 187: Para uma detalhada discussão dos efeitos da terceirização e da história da
Networks", American Sodological Review 66 (2001) : 317-335. Eles investigam a proprie­ Cisco, da Compaq e de outros apóstolos da economia em rede, veja Bill Lakenan, Darren
dade empresarial na Alemanha, mapeando os links entre cinco corporações não financei­ Boyd e Ed Frey, "Why Cisco Fell: Outsourcing and Its Perils", Strategy + Business (3rd
ras, 25 bancos e 25 seguradoras. Nessa rede, duas empresas são conectadas se possuem quarter 2001) : 54-65.
um controlador comum. A rede obtida de uma maneira é muito semelhante à rede de
Página 189: A história do Hotmail é descrita por Steve Jurvetson, o parceiro · na
atores, na qual os atores correspondem às companhias e os filmes, aos controladores.
Um controlador típico possui múltiplas companhias, da mesma maneira como há muitos empresa de capital de risco que garantiu o capital inicial para a empresa, em "Turning
atores em um único filme. A análise obtida da rede da companhia indica claramente que Customers into Sales Force", Business 2.0, 1 º de novembro de 1998. Veja também a des­
as empresas alemãs são parte de um mundo pequeno. O diâmetro da rede é de 4,81, ou crição de· Sabeer Bhatia em Stuart Whitmoíe "Driving Ambition", Asiaweek.com,
seja, a maioria dessas empresas é conectada por uma cadeia de quatro controladores. http://www.asiaweek.com/asiaweek/technology/990625/bhatia.html.
Kogut e Walker também detectaram um enorme coeficiente de clusterização. Se as com­ Página 191: Observe que existe um interesse crescente na literatura acadêmica pelas
panhais fossem formar uma rede randômica, a probabilidade de que se encontrasse um redes econômicas. Para alguns exemplos representativos do trabalho nessa área, veja
link entre dois vizinhos de uma _certa companhia é de 0,5%. Em contrapartida, na rede Matthew O. Jackson e Alison Watts, "The Evolution of Social and Economic Networks",
real dois vizinhos de qualquer empresa têm 67% de probabilidade de possuir um contro­ Joumal of Economic Literature (2001) ; Alison Watts, "A Dynamic Model of Network For­
lador comum. Trata-se claramente de uma diferença significativa ·que subjaz ao grau mation", Games and Economic Behavior 34 (2001): 331-341; Matthew O. Jackson e Ali­
muito elevado de clusterização que caracteriza a economia. son Watts, "On the _Formation of Interaction Networks in Social Coordination Games",
Joumal of Economic Literature (2001); Venkatesh Bala e Sanjeev Goyal, "A Noncoopera­
Página 185: Walter W. Powell, "Inter-Organizational Collaboration in the Biotechno­
tive Model of Network Formation", Econometrica 68 (2000) : 1181-1229; "Learning, Net­
logy Industry'', Joumal ofInstitutional and Theoretical Economics 512 (1996): 197-215.
work Formation and Coordination" (2001); "A Strategic Analysis of Network Reliabi­
Página 185: Um dos pioneiros da ideia de que a economia deve ser vista como uma lity'', Review ofEconomic Design 5 (2000) : 205-228; Nigel Gilbert, Andreas Pyka e Petra
rede evolutiva é Alan Kirman, da Universidade de Aix-Marseille. Seu ensaio oferece uma Ahrweiler, "Innovation Networks: a Simulation Approach", Joumal ofArtifidal Societies
discussão realmente excelente sobre a insuficiência do atual pensamento econômico e o and Social Simulation 4, n. 3 (2001); Lawrence E. Blume e Steven N. Durlauf, The Inte­
papel das redes nas teorias econômicas. Veja ''Toe Economy as an Evolving Network", ractions-Based Approach to Socioeconomic Behavior, http://www.ssc.wisc.edu/econ/
Joumal of Evolutionary Economics 7 (1997): 339-353; "Agregate Activity and Economic archive/wp2Ó01.html; Nicholas Economides, "Desirability of _Comparability in the
Organization", Revue Europeenne des Sciences Sociales 37, n. 1 13 (1999) : 189-230; ''Toe Absence of Network Externalities", American Economic Review 78 (1989) : 108-121;
Economy as an Interactive System", em Economy as an Evolving Complex System II (Pro­ "Compatibility and the Creation of Shared Networks", em Electronic Services Networks: a
ceedings of the Santa Fe Institute Studies in the Sciences of Complexity, vol. 27), _ed. W. Business and Public Policy Challenge, ed. Margaret Guerin-Calvert e Steven Wildman
Brian Arthur, Steven _N. Durlauf e David A. Lane (Reading: Addison-Wesley, 1997): (New York, 1991); "Network Economics with Application to Finance", Financial Markets,
491-532. Institutions & Instruments 2 (1993) : 89-97; Nicholas Economides e Steven C. Salop,
"Competition and Integration Among Complements and Network Market Structure",
Página 185: A crise econômica da Ásia foi amplamente documentada na imprensa e
Joumal of Industrial Economics 40, n. 1 (1992): 105-123. Veja também D. McFadzean,
também em artigos acadêmicos. Para uma cronologia da crise, veja o Website mantido
D. Stewart e L. Tesfatsion, "A Computational Laboratory for Evolutionary Trade Net­
por Nouriel Roubini, professor associado de economia e assuntos internacionais da Stern
works", IEEE Transactions on Evolutionary Computation· 5 (2001) : 546-560; L. Tesfat­
School da New York University. O site, intitulado "Chronology of the Asian Currency Cri­
sion, "A Trade Network Game with Endogenous Partner Selection", em Computational
sis and Its Global Contagion", encontra-se disponível em http://www.stern.nyu.edu/
Approaches to Economic Problems, ed. H. M. Amman, B. Rustem e A. B. Whinston (Klu­
-nroubini/asia/AsiaChronology.html. Para uma discussão sobre as origens da crise, veja
wer Academic, 1997) : 249-269. Veja também os Websites de Leigh Tesfatsion,
Giancarlo Corsetti, Paolo Pesenti e Nouriel Roubini, "What Caused the Asian Currency
http ://www.econ.iastate.edu/tesfatsi/netgroup.htm, e Nicholas Economides,
and Financial Crisis?", Japan and the World Economy (setembro de 1999): 305-373.
http://www.stern.nyu.edu/networks/site.html, com numerosos links para pesquisadores
e ensaios que enfocam as economias em rede.

238 239
Página 191: Admita que um campo rapidamente em expansão dentro da física pre­ Página 197: A obra de Christo e Jeanne-Claude é tema de muitos livros e monografias.
tende abordar fenômenos econômicos em termos quantitativos, utilizando as ferramen­ Veja Jacob Baal-Teshuva, Christo and Jeanne-Claude (Cologne: Taschen, 2001). A
tas da mecânica estatística. Para uma sucinta introdução, veja Rosário N. Mantegna e H. expressão "revelação pelo ocultamento" foi extraída de David Bourdon, Christo (New
Eugene Stanley, An Introduction to Econophysics: Correlations and Complexity in Finance York: Abrahams, 1970).
(Cambridge: Cambridge University Press, 2000); Jean-Phillipe Bouchaud e Marc Potters,
Theory of Financial Risk: from Statistical Physics to Risk Management (Cambridge: Cam­ Página 197: Note que complexidade é um tema abrangente, e muitos pesquisadores,
bridge University Press, 2000). Veja também J. Doyne Farmer, "Physicists Attempt to de físicos a matemáticos e biólogos, estão trabalhando em várias direções para tratá-la.
Scale the Ivory Towers of Finance", IEEE Computing in Science and Engineering (nov-dez Para uma bibliografia que reúne diferentes abordagens, veja notas no capítulo 1.
1999): 26-39. Boa parte dessa rede enfoca as propriedades das variações de ações. Para
a relação entre redes e mercado de capitais, veja Hyun-Joo Kim, Youngki bee, Im-mook
Kim e Byungnam Kahng, "S cale-Free Networks in Financial Correlations",
http://xxx.lanl.gov/abs/cond-mat/0107449.
Página 191: Muitas companhias estão experimentando a incorporação de ideias. de
rede sob vários modelos de negócio. Por exemplo, a Ecrush.com quer saber se amamos
alguém. Com base nessa informação, eles enviam uma mensagem de amor secreta para
a pessoa que indicamos, dizendo "alguém te ·ama", e convidam-na a registrar-se. Se a
pessoa se registrar e nos indicar como alma gêmea, o programa fará as correlações. Se a
pessoa não nos indicar como alma gêmea, a empresa jamais poderá descobrir quem fez
a abordagem. A ICQ.com, outra incubadora obcecada por rede que se orgulha de um
extraordinário contingente de 116 milhões de usuários, é menos ambiciosa e mais
realista. Oferece um ambiente para ativar eficientemente nossos links. Um software livre
monitora nossa lista de amigos, informando qual deles está on-line, permitindo-nos,
assim, acessar essa pessoa instantaneamente.
Página 191: Para uma discussão sobre as interações entre instituições econômicas e
formulação de políticas, veja P. Cooke e K Morgan, "The Networks Paradigm: New
Departures in Corporate and Regional Development'', Environment and Planning, D:
Society and Space 11 (1993) : 543-564.
Página 191: Para uma discussão sobre redes políticas, veja David Marsh, ed. Compa­
ring Policy Networks (Buckingham: Open University Press, 1998); Dirk Messner, The Net­
work Society (London: Frank Cass, 1997); Manuel Castell, The Rise of the Network Society
(London: Blackwell, 1996).

ÚLTIMA CONEXÃO: Teia sem Aranha

Página 195: Para uma discussão acerca da rede que opera a célula terrorista responsá­
vel pelos ataques de 11 de setembro, veja www.orgnet.com, Website de"Valdis Kreb. Veja
também Thomas A Steward, "Six Degrees of Mohamed Atta", Business 2. O (dezembro de
2001): 63.
Página 196: Para uma discussão sobre formas de combater organizações em rede em
guerra em rede, veja John Arquilla e David F. Ronfeldt, eds, Networks and Netwars
(Santa Mônica: RAND Corp., 2001); Thomas A. Steward, "Americas ' Secret Weapon",
Business 2.0 (dezembro de 2001): 58-68.

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Albert-László Barabási é professor E
T. Hofinan de Física na Universidade
Notre Dame e dirige pesquisas
networks complexas. Seu trabalho
divulgado em quase toda a mí
científica e comercial, incluindo Sciem
The New York Tín

Nasceu em 30 de março de 196


cientista e, atualmente, professor ilus
e diretor nomeado do Centro de Ciêr:
de Redes da Universidade
Northeastem e membro associado
Center of Cancer Systems Biology (CC:
no Dana Farber Cancer Institute,
Universidade de Harvard Em 19
introduziu o conceito de redes sem esc
(scale-free network) e propôs o mod
Barabási para explicar sua am
emergência em catástrofes natur.
tecnológicas e soei�

Tem contribuído muito par


desenvolvimento da teoria de rede
mundo real, com vários outros cientis
de física, matemática e ciência
computaç

Barabási verificou que os sites e


formam a world wide web (www) t
determinadas propriedades matemáti,
que dependem de três condições p,
ocorrer. A primeira é que a rede tem
se expandir, crescer. Tal condição
crescimento· é muito importante, ass
como a ideia de emergência qu
acompanha. Está em constante evolui
e adaptação e existe acentuadame1
com a rede (www). A segunda refere-s
conexões preferenciais, ou seja, nm
integrantes vão querer ligar-se a hu
que participam da rede com m
conexões. A terceira denomina
aptidão competitiva, que, em termos
rede, implica sua taxa de atraç

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