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Nicolás José Isola (/colunas/nicolas-jose-isola/)

Filósofo, mestre em Educação, doutor em Ciências Sociais, coach executivo e consultor


em storytelling.

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A profunda crise do sistema de


saúde privado
Comando de hospitais passou de médicos a engenheiros, economistas
e investidores, que decidem muitas vezes só olhando o lucro

25.mar.2023 às 11h27

Nicolás José Isola (https://www1.folha.uol.com.br/autores/nicolas-jose-isola.shtml)


Mauro Tamagno

O sistema de saúde (https://www1.folha.uol.com.br/folha-topicos/saude/) de um país é uma


engrenagem complexa e delicada que precisa ser cuidada. No Brasil, esses
mecanismos estão cada vez mais descalibrados numa tensão que é um risco
para a sociedade.

A pandemia (https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/coronavirus/) gerou um impacto enorme


nesse sistema, não só pela demanda que nos últimos três anos padeceu, quanto
pelas amplias mudanças que tem atravessado a saúde privada que pode
impactar no sistema público.

Paciente com Covid é atendido em UTI , no Hospital da Santa Casa de Misericórdia, em Araraquara (SP) -
Rubens Cavallari/Folhapress

Hoje, 50,3 milhões de brasileiros têm planos de saúde


(https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painelsa/2023/02/setor-de-planos-de-saude-preve-alta-de-preco-com-remedio-de-r-6-

milhoes.shtml). Desse total, 41,4 milhões (82%) estão ligados a empresas. Assim,
apenas 8,9 milhões encaixam-se nas categorias "individual" ou "familiar". Com
a demissão de funcionários e o cancelamento de benefícios de saúde, fruto da
crise econômica doméstica e mundial, as operadoras ficaram com menos
pessoas para diluir o risco.

As receitas auferidas com contraprestações, ou seja, mensalidades, não têm


sido suficientes para sustentar as despesas assistenciais das empresas do setor.
Já são seis trimestres consecutivos de prejuízos operacionais, o que equivale a
dizer que, desde abril de 2021, o negócio plano de saúde não consegue se pagar.
Um brutal aumento de custos assistenciais seja por procedimentos represados
pela pandemia ou pela inflação dos insumos hospitalares, está por trás destas
dificuldades.

Apenas em 2022, até setembro, o rombo acumulado


(https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painelsa/2022/12/rombo-dos-fundos-de-pensao-em-2021-sera-discutido-em-grupo-de-

trabalho.shtml) chegou a R$ 11 bilhões. Além disso, no terceiro trimestre a


sinistralidade dos planos assistenciais –que representa quanto do que as
operadoras arrecadam é repassado para pagar prestadores– chegou a 93,2%.
Os resultados do quarto trimestre das empresas ligadas a saúde com capital
aberto, mantem essa tendência.

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Nas últimas semanas, por exemplo, a operadora


(https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/03/hapvida-perde-quase-r-12-bi-depois-de-anunciar-queda-de-56-no-lucro-

anual.shtml)Hapvida (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/03/hapvida-perde-quase-r-12-bi-depois-de-anunciar-

queda-de-56-no-lucro-anual.shtml),
uma das maiores do país, divulgou balanço com prejuízo
líquido de R$ 316,7 milhões, revertendo o lucro de R$ 200 milhões alcançado
no mesmo período, em 2021. As ações despencaram mais de 30% em um único
dia, o que corresponde a uma perda de R$ 12 bilhões do valor da empresa.

Na avaliação de especialistas, o balanço da Hapvida não é um fato isolado e


prenuncia números sofríveis que devem marcar o setor nos próximos meses.

Quando comparada às demais profissões, a medicina segue como uma das


mais rentáveis (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2023/03/administradora-do-medicos-pelo-
brasil-empregou-amigos-e-parentes-com-salarios-de-r-20-mil-sugere-relatorio.shtml). Entretanto, grande parte
dos médicos depende da sua força de trabalho para se manter. É um mito achar
que todos são ricos.

Ao longo dos últimos 20 anos, mudanças ocorreram na área médica. Os lucros


dos consultórios diminuíram em decorrência da redução nos ganhos e do
aumento nos gastos. A concorrência é maior, tanto pelo aumento do número
de escolas médicas quanto pela entrada de profissionais oriundos de outros
países que revalidam. Com o surgimento das operadoras de saúde, o paciente
disposto a pagar por um serviço privado praticamente desapareceu e o
consumidor tem, agora, os seus direitos regulamentados.

Muitos profissionais da área estão sentindo as mudanças de um mercado de


saúde privado onde os principais investidores eram médicos bem-sucedidos,
que nos últimos anos venderam os hospitais
(https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2021/10/com-divida-santa-casa-de-sao-paulo-vende-operacao-do-hospital-santa-

para grandes grupos econômicos que acharam que a saúde era um


isabel.shtml)

negócio rentável.

Assim, a cenografia da diretoria desses hospitais passou de médicos a


engenheiros, economistas e investidores, que tomam decisões, muitas vezes só
olhando o lucro.

Face a entrada de investidores fora da área médica e o encarecimento da


assistência à saúde em todo o mundo, a única coluna da planilha de custos que
os administradores acreditam que pode ser reduzida é a remuneração médica
(https://www1.folha.uol.com.br/folha-topicos/medicina/). Todas as mudanças têm contribuído para

uma contínua redução no salário dos médicos, acompanhado por um grau


maior de exigência, tanto na capacidade técnica quanto na administrativa.

Preocupada, a Comissão Nacional de Saúde Suplementar, encabeçada pela


Associação Médica Brasileira e Associação Paulista de Medicina, apresentaram
o balanço das negociações com as operadoras de planos de saúde
(https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/02/clientes-ganham-6-a-cada-10-acoes-contra-planos-de-saude-na-justica-de-

sp.shtml) em relação aos honorários médicos em 2022 e alertaram que "o cenário
na saúde suplementar continua inalterado e a legislação é a mesma com a Lei
13.003/2014, que prevê reajuste anual, mas nunca definiu exatamente qual
seria esse valor e muitos não respeitam". Para que a calça feche, apertam aos
médicos.

Para ajudar a criar a tempestade perfeita, existe um aumento no número de


faculdades e profissionais de saúde (https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2023/01/mec-mantem-trava-
a-novos-cursos-de-medicina-em-meio-a-pressao-de-empresas.shtml), de baixa qualidade. Profissionais
mal preparados aumentam os custos, solicitando avaliações e exames
desnecessários ou realizando procedimentos sem indicação. Dos recém-
formados avaliados pelo Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado
de São Paulo) em 2016, mais da metade foi reprovada , mostrando não ter
conhecimentos básicos de situações cotidianas do atendimento médico.

Assim, o sistema privado atravessa uma crise aguda ainda não percebida pela
maioria da sociedade brasileira, mas padecida pelo pessoal da saúde, da
enfermagem e da medicina.

Se o sistema de saúde privado continua nessa tendência, o Sistema Único de


Saúde (https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2022/10/apoio-ao-sus-e-prevencao-de-pandemias-inexistem-em-
planos-de-governo-diz-estudo.shtml) começará a receber mais destes pacientes expulsos pela

crise que atravessam as empresas do setor. Uma revisão e reforma profunda


precisa ser realizada imediatamente. Sobrevivemos a uma pandemia, não
precisamos nem falar da prioridade que o sistema de saúde tem em nossas
vidas.
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profunda-crise-do-sistema-de-saude-privado.shtml

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