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Engenharia Civil

Interdisciplinar
Autor: Prof. Clovis Chiezzi Seriacopi Ferreira
Colaboradores: Prof. Ricardo Tinoco
Prof. José Carlos Morilla
Professor conteudista: Clovis Chiezzi Seriacopi Ferreira

Engenheiro civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e mestre em Arquitetura e Urbanismo
pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, com pesquisa e dissertação sob o tema “A casa dos sonhos:
necessidades, aspirações, símbolos - uma avaliação de residências unifamiliares idealizadas, planejadas e empreendidas
pelos próprios usuários em Alphaville, região metropolitana de São Paulo”, apresentada em 2006.

Possui atualização em Planejamento de Programas e Projetos – Modelo e Prática pela Fundação Getulio Vargas
(FGV), com ênfase em planejamento e gestão de programas governamentais, tais como a instalação de Poupatempo e
de novas unidades prisionais para o Governo do Estado de São Paulo, em 2009.

Professor da Universidade Paulista (UNIP) desde 2006. Atua na elaboração de projetos e na gestão de projetos
complementares e de obras.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

F383e Ferreira, Clovis Chiezzi Seriacopi.

Engenharia Civil Interdisciplinar / Clovis Chiezzi Seriacopi


Ferreira. – São Paulo: Editora Sol, 2019.

112 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXV, n. 2-127/19, ISSN 1517-9230.

1. Solos e fundações. 2. Recursos hídricos. 3. Metais e madeira.


I. Título.

CDU 624.131

W503.23 – 19

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
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Unip Interativa – EaD

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Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Bruna Baldez
Juliana Muscovick
Sumário
Engenharia Civil Interdisciplinar

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................8

Unidade I
1 CONCEPÇÃO DA OBRA DE ENGENHARIA CIVIL, PROJETO E EXECUÇÃO.................................... 11
2 NOVO PROCESSO DE CONCEBER, PROJETAR E REALIZAR............................................................... 17
3 SOLOS E FUNDAÇÕES..................................................................................................................................... 29
4 ESTRUTURAS...................................................................................................................................................... 48

Unidade II
5 GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS............................................................................................................. 61
5.1 Ações de águas pluviais...................................................................................................................... 61
5.2 Previsão de intensidade e de volumes de águas pluviais..................................................... 67
6 VAZÃO DE PROJETO PARA GESTÃO DE ÁGUAS PLUVIAIS................................................................ 74
6.1 Previsão de variações máximas de vazão.................................................................................... 76
6.2 Previsão de vazões médias................................................................................................................ 80
7 ESTRUTURAS METÁLICAS E DE MADEIRA.............................................................................................. 82
8 CONHECIMENTOS BÁSICOS INTERDISCIPLINARES............................................................................. 93
APRESENTAÇÃO

Para compreender o caráter interdisciplinar da engenharia civil, basta um olhar para o seu campo
de atuação e para os beneficiários das suas obras. Toda e qualquer atividade humana é realizada em
obras de engenharia civil, seja na habitação, no trabalho, no lazer, na educação, nos cuidados da saúde e,
sobretudo, no exercício do ir e vir. Invariavelmente, tudo ocorre em edificações projetadas e construídas
pela engenharia civil.

Ainda que o ir e vir seja realizado por aviões, navios, automóveis ou trens, que são meios de transportes
projetados e construídos por profissionais de outras especialidades da engenharia, sempre são necessários
aeroportos, portos, rodovias e ferrovias, além das próprias instalações para a sua fabricação.

Não existe, portanto, um campo de atuação mais amplo e diversificado que o da engenharia civil. E é
exatamente por tal amplitude e diversidade que o engenheiro civil, além dos conhecimentos profundos
de uma eventual especialidade, também deve ter uma visão multi e interdisciplinar de todo o âmbito
de sua atividade.

Esse mesmo campo de atuação é compartilhado pela arquitetura e pelo urbanismo, que devem
agir juntos com a engenharia civil, de forma similar à outra face de uma mesma moeda. A arquitetura,
bem como o urbanismo, ao dar forma e organização ao nosso mundo material, provê as pré‑condições
materiais para as nossas atividades e os nossos movimentos, para a nossa convivência e a nossa
privacidade. Mais ainda, essas pré‑condições materiais podem ser as próprias geradoras, ou inibidoras,
de todas as nossas relações sociais (HILLIER; HANSON, 1984, apud FERREIRA, 2006).

Pode‑se dizer que a engenharia civil torna reais, materializa e insere no ambiente as edificações
concebidas pela arquitetura ou pelo urbanismo. É bem verdade que, de um ponto de vista formal, nem
todas as obras são concebidas por um arquiteto ou urbanista. Há, também, edificações que nem mesmo
são construídas por um engenheiro.

Contudo, mesmo um usuário final para fazer a autoconstrução da sua moradia, por exemplo, com a
ajuda de amigos e vizinhos em sistema de mutirão, ao pensar na distribuição dos espaços necessários, na
locação das paredes, portas e instalações dos diversos cômodos estará pensando como um arquiteto. Da
mesma forma, ao pensar em como nivelar o terreno, em executar os alicerces, escorar e moldar pilares,
vigas e lajes, instalar tubulações para água, esgoto e energia elétrica, ele estará pensando e atuando
como um engenheiro civil.

Sendo assim, a primeira relação interdisciplinar da engenharia civil é com a arquitetura. Ambas
sempre atuam no mesmo objeto; a diferença está apenas no ponto de vista, na forma de tratar o objeto.

O foco do arquiteto está no objeto pronto, em como organizar a edificação de modo que as pessoas
possam utilizá‑la e por ela transitar da melhor forma possível. O engenheiro olha para o objeto concebido
e, então, passa a tratar de todas as providências necessárias para transformar o espaço existente na
edificação desejada. Por isso, o arquiteto deve sempre considerar a viabilidade da execução das suas
concepções, assim como o engenheiro nunca deve relevar a finalidade da construção.
7
Por mais que sejam necessários, os sistemas construtivos, os métodos e as técnicas são apenas meios.
O fim não é a edificação em si, mas o ambiente construído, que foi pensado para facilitar a realização de
atividades, o trânsito, a convivência, enfim, todas as relações sociais dos seus usuários.

Além dessa íntima relação entre a engenharia civil e a arquitetura e o urbanismo, toda construção
tem alguma influência no entorno do local onde ela é executada. Em algumas situações, tais influências
devem ser avaliadas por especialistas de outras disciplinas, isto é, de outras áreas do conhecimento,
principalmente em relação às questões ambientais.

É possível que, nessas ocasiões, o engenheiro civil tenha que pôr em prática toda a sua capacidade
de visão e de coordenação interdisciplinar para orientar a busca pela melhor solução.

Em qualquer processo multidisciplinar, a solução ideal sempre será o resultado de um consenso entre
diversas posições, quase sempre conflitantes. Em geral, a solução ideal nunca será excelente, talvez nem
mesmo ótima, para nenhum dos especialistas envolvidos.

Por força da própria especialização, não é raro encontrar especialistas cuja tendência seja considerar
sua área como a mais importante do processo. No entanto, ao final de qualquer processo conciliatório,
quando uma das partes obtém o máximo, certamente as demais obterão menos do que o razoável.

Assim, a busca por uma conciliação interdisciplinar harmoniosa, sobretudo entre exigências
conflitantes, será sempre essencial na atuação da engenharia civil, tanto pela amplitude do seu campo
de trabalho quanto pela abrangência dos seus efeitos.

A partir da consideração de tais aspectos, já se torna desnecessário lembrar que uma obra de
engenharia civil começa muito antes da instalação do canteiro de obras. Em países mais desenvolvidos, a
quantidade de horas técnicas despendidas nas fases de projeto e de planejamento é muito mais elevada
que a utilizada na construção propriamente dita.

O principal objetivo desta disciplina, é, portanto, dar início ao processo de desenvolvimento


dessa visão multi e interdisciplinar, indispensável para todo engenheiro civil, independentemente da
especialidade que ele venha a eleger como área principal de atuação.

INTRODUÇÃO

O engenheiro, de acordo com as concepções mais populares, é um profissional que precisa dominar
cálculos complexos e conhecer tecnologias sofisticadas. No entanto, muito embora tais conhecimentos
sejam importantes para o exercício da boa engenharia, a sua essência é a engenhosidade.

A principal atividade da engenharia é encontrar formas engenhosas, contando apenas com suas
habilidades pessoais, para tornar possível a realização de qualquer coisa que seria impossível para um
ser humano realizar.

8
Produzir e distribuir alimentos em quantidade suficiente para uma grande população, apesar das
variações climáticas que ocorrem naturalmente ao longo das estações do ano e, também, ao longo dos
anos, são bons exemplos de conquistas da engenharia. Prover abrigo para essas populações, produzir
água potável e energia, ampliar as possibilidades do ir e vir por meio de diversas modalidades de
transporte rápido, bem como viabilizar a comunicação a distância, são outros bons exemplos de como a
engenharia vem ampliando as capacitações naturais do ser humano.

Desse modo, torna‑se inevitável concluir que uma qualidade essencial para um engenheiro é a
imaginação. O objeto do seu trabalho sempre é algo que ainda não existe, e o seu objetivo é definir as
operações necessárias para que esse algo se torne real.

É provável que, observando os pássaros, um homem sentiu vontade de também poder voar, algo que
seria impossível levando em consideração suas habilidades naturais. Porém, utilizando sua imaginação
com engenhosidade, empregando e ampliando conhecimentos científicos, ele criou a tecnologia
necessária para poder superar suas limitações pessoais. Menos de um século depois, o ser humano já
podia voar, não só para qualquer parte do planeta, mas também até a Lua e outros planetas.

Esse mesmo processo criativo ocorre diariamente em todos os campos da engenharia. Da bússola ao
GPS, passando por teodolitos e réguas, os meios de localização vêm se aperfeiçoando continuamente.

Das fundações diretas às estacas de grandes profundidades, moldadas em qualquer tipo de solo, da
construção artesanal aos sistemas construtivos mais industrializados, inclusive com processos do tipo
Just in time e instalações hidráulico‑sanitárias pré‑fabricadas, a evolução vem sendo a consequência
natural diante de qualquer limitação encontrada.

Portanto, a imaginação e a engenhosidade, sendo as motivadoras do emprego do conhecimento científico


e da evolução da tecnologia, tornam‑se as principais qualidades necessárias à boa prática da engenharia.

Os conhecimentos básicos necessários a qualquer engenheiro civil, por questões didáticas, são
apresentados em diferentes disciplinas, agrupadas em diversas áreas. Em geral, há um grupo de disciplinas
ligadas à mecânica dos solos, à geotécnica e às fundações; há outro de disciplinas ligadas à resistência
dos materiais e às estruturas de concreto, metálicas ou de madeira; outro, das disciplinas ligadas aos
recursos hídricos; e, por fim, outro de disciplinas ligadas ao relevo da superfície terrestre e aos modos de
locação e posicionamento das obras de engenharia.

A prática da engenharia civil, contudo, sempre requer a consideração e a utilização simultânea de


conhecimentos das diversas áreas. Uma questão teórica relativa a uma estrutura de concreto armado,
por exemplo, não se limita, na prática, apenas à questão de estrutura de concreto, mas também à questão
das suas fundações, das eventuais contenções necessárias, das suas instalações hidráulico‑sanitárias,
dos equipamentos de prevenção e combate a incêndio, de telecomunicações ou de climatização, entre
tantas outras.

Para tanto, é indispensável ao engenheiro, seja na fase do projeto ou da execução, ter uma visão
interdisciplinar e integrada de todas essas questões. Em muitas situações, será necessária a intervenção
9
de diversos especialistas, tanto das diferentes áreas da própria engenharia civil quanto de outros campos
do conhecimento cientifico e tecnológico. E os profissionais da engenharia civil, além dos conhecimentos
profundos da sua especialidade, também devem pôr em prática os conhecimentos básicos das demais
áreas envolvidas.

É nesse contexto que esta obra se desenvolve. Os assuntos e os conceitos aqui presentes, muito
embora tratados sempre em nível básico, são todos fundamentais, porém, nem todos os conceitos
básicos da engenharia estejam aqui expostos, o que seria demasiada pretensão.

10
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Unidade I
1 CONCEPÇÃO DA OBRA DE ENGENHARIA CIVIL, PROJETO E EXECUÇÃO

Toda obra de engenharia civil tem um propósito que, em geral, significa um ou vários benefícios
para os usuários dessa obra. Ao mesmo tempo, porém, cada obra sempre implica efeitos, positivos e
negativos, que podem afetar muitas outras pessoas a curto, médio e longo prazo.

Saber reagir rápida e eficazmente a quaisquer circunstâncias é uma característica importante para
o engenheiro civil, mas não deve ser a sua principal atuação. É próprio da engenharia definir toda a
sequência de execução, prever cada situação, imaginar as soluções possíveis, analisar as vantagens e as
desvantagens de cada uma, selecionar a solução mais adequada para cada tarefa e detalhar a melhor
forma, os melhores meios e métodos para executá‑las.

Qualquer realização da engenharia civil começa por uma intenção. A partir dela, desenvolve‑se um
plano. Do plano, segue‑se um projeto. A construção propriamente dita deve ser, via de regra, apenas a
fiel execução de tudo o que foi definido e detalhado no projeto.

Esse processo representa a própria essência da engenharia. Significa analisar, prever, definir e
detalhar todo o conjunto de atividades que serão necessárias para atingir a situação desejada, a partir
da situação atual.

Conhecimentos teóricos profundos, domínio de técnicas e evolução da tecnologia são fundamentais,


mas a imaginação para relacioná‑los e prever os seus efeitos e implicações é essencial.

Até as últimas décadas do século XX, aproximadamente, a elaboração de um projeto considerava


basicamente duas questões fundamentais:

• O que fazer para atingir uma situação desejada?

• Como atingir a situação desejada, a partir da situação atual?

Em geral, a análise das possibilidades e a definição de o que fazer costumavam atender apenas aos
critérios de possibilidade técnica e de conveniência econômica. O que fazer, por exemplo, para melhorar
a ligação entre duas regiões, duplicar a rodovia existente, construir uma rodovia totalmente nova ou
construir uma ferrovia?

Ainda a título de exemplo, o que seria melhor fazer para gerar energia elétrica utilizando os recursos
hídricos de determinada bacia hidrográfica, como a esquematicamente ilustrada na figura a seguir?
Construir apenas uma grande usina hidrelétrica ou diversas usinas de médio porte ao longo do mesmo
conjunto de cursos d’água?
11
Unidade I

600
B

Seção de C
controle A
510
520 D
530
540
550
560
570
580 590

Figura 1 – Levantamento planialtimétrico da bacia hidrográfica de um rio com seus afluentes

Observando a figura anterior, é possível verificar que há duas pequenas vilas, representadas por A
e B, uma cidade de pequeno porte, representada por C, e uma cidade de porte médio, parcialmente
representada por D, nessa região da bacia hidrográfica, a montante da seção de controle considerada.

Sendo assim, há diversas opções a serem analisadas tecnicamente, em função das áreas que serão
inundadas a partir da construção de uma grande represa ou de várias represas menores.

A opção por apenas uma grande usina hidroelétrica, construída nas proximidades da seção de
controle indicada na figura anterior, poderia implicar economia de escala na construção tanto da
barragem quanto das instalações de produção, de transformação e de transmissão.

Entretanto, para o seu máximo aproveitamento, com o lago formado pela represa chegando até
as proximidades da cidade D, como ilustrado na figura a seguir, a cidade de pequeno porte e as duas
pequenas vilas ficariam submersas e, portanto, deixariam de existir.

600
B

Seção de C
controle A
510
520 D
530
540
550
560
570
580 590

Figura 2 – Represa formada para a construção de uma usina hidroelétrica grande

12
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Outra opção, situada no extremo oposto das possibilidades, seria preservar todos os aglomerados
habitados. Tal solução implicaria a construção de até três represas para três usinas de pequeno porte,
cujas áreas inundadas são representadas na figura a seguir.

Uma represa seria construída na seção de controle adotada, com uma altura útil calculada para que
a cota máxima da área inundada fosse inferior à cota do rio principal, a jusante do povoado A.

Outra represa seria construída a montante desse povoado, com altura útil calculada para que a cota
máxima da área inundada fosse inferior tanto à cota do rio principal, a jusante da cidade C, quanto à
cota do seu afluente, a jusante do povoado B.

A terceira represa seria construída a montante da cidade C, com altura útil calculada para que a cota
máxima da área inundada fosse inferior à cota do rio principal, a jusante da cidade D.

600
B

Seção de C
A
controle
510
520 D
530
540
550
560
570
580 590

Figura 3 – Represas para três usinas hidroelétricas de pequeno porte

Já uma opção intermediária poderia consistir apenas na preservação da cidade de pequeno porte.
Na seção de controle, seria construída uma represa para uma usina hidroelétrica de médio porte, com
altura útil calculada para que a cota máxima da área inundada fosse inferior à cota do rio principal, a
jusante da cidade C. A outra represa seria construída a montante dessa cidade, com altura útil calculada
para que a cota máxima da área inundada fosse inferior à cota do rio principal, a jusante da cidade D,
como ilustra a figura a seguir.

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Unidade I

600

Seção de C
controle A
510
520 D
530
540
550
560
570
580 590

Figura 4 – Represas para duas usinas hidroelétricas, de médio e pequeno porte

Observando a figura anterior, é possível verificar que o pequeno povoado representado por B também
seria preservado, ficando acima da área inundada com a criação das represas.

Após a análise das possibilidades técnicas, evidentemente muito mais aprofundada do que o que foi
resumidamente explanado até aqui, a definição por uma das opções era realizada apenas com base em
critérios econômicos.

Em geral, nessas situações, não era raro comparar apenas a economia de escala representada por
uma única grande usina hidroelétrica com os custos de indenização, remoção e eventual recolocação da
população das áreas inundadas.

Resolvida a primeira questão, passava‑se para a segunda, que tratava de como atingir a situação
desejada a partir da situação atual. Era o início da fase de projeto, na qual era estabelecida a sequência
lógica de estudos e de tomadas de decisões relativas a como realizar a obra. Durante a elaboração do
projeto, também eram definidos os meios, métodos e sistemas construtivos mais adequados a cada
etapa da construção.

A elaboração do projeto costumava ser um processo linear, com profissionais de diversas especialidades
trabalhando em paralelo e, ao mesmo tempo, em etapas consecutivas, nas quais os resultados de uma
etapa eram os dados de partida para a seguinte.

Esse processo pode ser melhor compreendido observando‑se uma ferramenta de planejamento que
representa bem o típico pensamento da época. Trata‑se da Rede CPM, expressão gráfica do Critical Path
Method, que significa Método do Caminho Crítico, resumidamente apresentada na figura a seguir.

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ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Projeto Projeto
estrutural fundações
4
Estudos Sondagens
hidrológicos Definição de turbinas
e demais equipamentos
Projeto obra de terra
Estudos Compatibilização
Início 1 topográficos 2 3 Projeto de laboratórios de controle 5 dos projetos 6
(intenção) Obra
Projeto Projeto do canteiro de obras
Estudos pré-executivo
geotécnicos Projeto hidráulico sanitário
Projeto elétrico
Projeto viário

Figura 5 – Rede CPM simplificada para o projeto de uma usina hidroelétrica

Os estudos preliminares hidrológicos para o conhecimento dos regimes de vazão, topográficos e


geotécnicos podem ser realizados em paralelo por equipes especializadas em cada área.

Já a definição do tipo e da quantidade de turbinas, bem como dos demais equipamentos e dos anteprojetos
e projetos pré‑executivos, só pode ser iniciada após a conclusão dos referidos estudos preliminares.

Praticamente todos os projetos executivos podem ser elaborados em paralelo por diferentes
equipes, cada uma especializada na sua respectiva área. Uma das exceções é o projeto de fundações das
estruturas de concreto, que depende, além de sondagens mais específicas do subsolo local, da definição
das cargas provenientes dessas estruturas.

Considerando que essas equipes trabalhavam em paralelo, mesmo quando bem dirigidas e
coordenadas, após a conclusão dos detalhamentos, sempre era necessária uma verificação para assegurar
que todos os projetos complementares compatíveis entre si.

Não era raro, também, que parte do detalhamento e até mesmo algumas definições relativas a
sistemas ou métodos construtivos se estendessem pela fase de execução da obra.

Exemplo de aplicação

Visando reduzir enchentes em certa região urbana, devido a precipitações de elevada intensidade, foi
considerado o uso de barragens no curso d’água, a montante da área a ser protegida. A altura da crista da
barragem deve ser igual à soma da altura do volume de água retido (Hn) com a altura da lâmina d’água do
ladrão (H1), acrescida da folga (f), como ilustrado na figura a seguir.
N. A. MÁX
H = Hn + H1 + f f
H1

Hn

Perfil longitudinal

Figura 6 – Perfil esquemático do vertedor e da barragem

15
Unidade I

O valor assumido para H1 pode ser igual a 1 m, e a folga (f) recomendada deve ser de, no mínimo,
0,50 m (Enade 2011, Engenharia, questão 25, adaptada).

O gráfico da figura a seguir, elaborado pela equipe de topografia, apresenta os valores de volume de
água acumulada na bacia, em m3 (x 106), em função das cotas de nível da área inundada.
100
90
Volume acumulado (x 106 m3)

80
70
60
50
40
30
20
10
0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Cota de nível da área inundada z (m)

Figura 7

A) Determinar o valor da altura total da barragem para reter um volume de cerca de 35 milhões de m3.

B) Determinar o volume retido por uma barragem com 10 m de altura total.

Resolução

A) Observando o gráfico, verifica‑se que, para reter um volume da ordem de 35 milhões de m3, ou
35 x 106 m3, a altura necessária é Hn = 6 m.

100
90
Volume acumulado (x 106 m3)

80
70
60
50
40
30
20
10
0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Cota de nível da área inundada z (m)

Figura 8

16
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Nas condições da questão, a altura da barragem deve ser igual à altura do volume retido (Hn)
somado à altura da lâmina d’água no ladrão (Hf) e à folga (F):

H = Hn + H1 + f = 6,00m + 1,00m + 0,50m = 7,50m

B) Para uma barragem com 10 m de altura, descontando‑se a folga (F) e a altura da lâmina d’água
no ladrão (Hf), a altura do volume retido (Hn) seria:

Hn = H − H1 − f = 10,00m − 1,00m − 0,50m = 8,50m

Observando-se o gráfico, verifica‑se que o volume retido para uma altura Hn = 8,50 m seria de cerca
de 70 x 106 m3, ou seja, 70 milhões de m3.

100
90
Volume acumulado (x 106 m3)

80
70
60
50
40
30
20
10
0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Cota de nível da área inundada z (m)

Figura 9

Lembrete

Uma obra de engenharia civil começa muito antes da instalação do


canteiro de obras. Nas fases de concepção e elaboração do projeto principal e
dos projetos complementares devem ser realizadas as análises, as definições
e os detalhamentos. A construção propriamente dita, via de regra, deve ser
apenas a fiel execução de tudo o que foi definido e detalhado no projeto.

2 NOVO PROCESSO DE CONCEBER, PROJETAR E REALIZAR

Mais recentemente, a partir de meados da década de 1980, uma terceira questão vem se impondo à
engenharia civil, provocando uma mudança radical nesse tradicional procedimento, linear e sequencial,
constituído basicamente por concepção, projeto e execução.
17
Unidade I

Essa nova questão, cuja importância tem crescido progressivamente, a ponto de se tornar o
principal condicionante para as duas anteriores, o que fazer e como fazer, é a questão da preservação
ambiental. A nova prioridade, desde então, passou a ser a obtenção do mínimo dano possível ao
meio ambiente.

A implicação imediata dessa mudança é que os empreendimentos já não podem ser instalados
em qualquer lugar, apenas em função da necessidade, da utilidade, da rentabilidade ou de quaisquer
outros motivos considerados razoáveis para empreender. A necessidade do empreendimento terá que
ser plenamente justificável em face dos eventuais danos ambientais que ele possa provocar.

A segunda implicação, que afeta diretamente os principais paradigmas da prática da engenharia


civil, é que o procedimento habitual, de concepção, definição, detalhamento e execução, ainda que
realizado em uma sequência lógica bem estabelecida, precisou ser substancialmente modificado.

Antes de dar início à etapa de construção propriamente dita, todos os procedimentos, construtivos
ou operacionais, terão que ser aprovados pelo órgão ambiental competente, visando eliminar ou, pelo
menos, minimizar os danos que possam causar ao meio ambiente.

Desse modo, além do empreendimento não poder mais ser concebido da forma tradicional,
com base apenas nos critérios de possibilidades técnicas e de conveniência econômico‑financeira,
nenhuma definição ou detalhamento, de qualquer natureza, poderá ser postergada para a fase de
execução da obra.

Para as áreas definidas como de proteção ambiental, qualquer intervenção, seja construção, reforma
ou ampliação, só será permitida caso o empreendimento apresente comprovada necessidade e relevância
para o desenvolvimento social e econômico.

Nesse novo contexto, cada procedimento executivo, meio, método e sistema construtivo, antes de
serem adotados, serão objetos de minuciosa análise por parte de um grupo multidisciplinar do agente
ambiental, especificamente em função de suas implicações e efeitos sobre o meio ambiente.

Além dessas condições prévias, para cada dano ambiental que for aceito como mínimo inevitável, o
órgão ambiental irá impor algumas medidas de compensação, ou de mitigação, em linguagem técnica,
que deverão ser devidamente detalhadas e incorporadas ao projeto executivo.

A aprovação do detalhamento das medidas de mitigação, por parte do órgão ambiental, também
será condição indispensável para a autorização do início de obra, bem como objeto de constante
monitoramento durante as fases de construção e de operação do empreendimento.

18
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Saiba mais

Para compreender melhor a legislação ambiental brasileira, leia a


Cartilha de Licenciamento Ambiental, elaborada pelo Tribunal de Contas da
União, que resume de forma clara e simples o espírito que a norteia, e está
disponível em:

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Cartilha de licenciamento ambiental.


2. ed. Brasília, 2007. Disponível em: <https://portal.tcu.gov.br/biblioteca‑digital/
cartilha‑de‑licenciamento‑ambiental‑2‑edicao.htm>. Acesso em: 5 jun. 2019.

Por ser assim, o novo processo de concepção, definição e detalhamento do projeto executivo teve
que se tornar cíclico e ser conduzido em âmbito interdisciplinar, ainda que elaborado por equipes
multidisciplinares, atuando em um conjunto de atividades simultâneas, integradas e retroalimentadas.

Com tantos novos aspectos a considerar, é indispensável lembrar que não existe apenas uma solução para
cada questão, bem como observar que a opção por uma solução para certa etapa, em geral, afeta outras etapas.

A análise dos efeitos de cada solução possível, negativos ou positivos, realimenta as análises de
outras decisões e, às vezes, também pode exigir ou sugerir mais estudos complementares.

Na prática profissional, para que esse complexo processo de projetar possa produzir soluções
satisfatórias, é cada vez mais necessário que o engenheiro civil consiga relacionar os conhecimentos
básicos de diferentes disciplinas com a devida agilidade.

Exemplo de aplicação

Considerando as fotos a seguir e os seus conhecimentos em relação a sistemas construtivos, avalie


as afirmativas apresentadas (Enade 2011, Engenharia, questão 16, adaptada).

Figura 10 – Ponte da Normandia (vão central 856 m)

19
Unidade I

Figura 11 – Ponte do estreito de Akashi (vão central 1991 m)

I – Os tabuleiros das pontes do tipo pênsil são suportados por cabos verticais tracionados, presos aos
cabos principais, que se apoiam nos mastros e são ancorados em terra firme, em ambas as extremidades,
também sujeitos a tração.

II – Os tabuleiros das pontes estaiadas são suportados por cabos tracionados, apoiados nos mastros
e ancorados em segmentos do próprio tabuleiro, em geral situados em posições simétricas em relação
ao mastro que lhes dá suporte.

III – As pontes do tipo pênsil são mais utilizadas para a travessia de braços de mar, enquanto as
pontes estaiadas apresentam melhor aplicação na travessia de rios de médio e grande porte.

IV – A construção de pontes estaiadas requer um canteiro de obras bem mais amplo do que o
necessário para as pontes tipo pênsil, acarretando maiores danos ambientais e, por isso, medidas de
compensação com custo mais elevado.

É correto o que se afirma em:

A) I, II e III apenas.

B) II e III apenas.

C) I, III e IV apenas.

D) I e II apenas.

E) I, II, III e IV.

20
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Resolução

Resposta correta: alternativa D.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

O esquema estrutural de uma ponte pênsil é semelhante ao de uma viga contínua suportada por
inúmeros apoios. Esses apoios correspondem aos tirantes verticais, que são suportados pelo cabo
principal, como ilustrado na figura a seguir.

Figura 12 – Esquema estrutural de uma ponte pênsil

A estabilidade dos cabos principais, por sua vez, é dada pelos apoios sobre os mastros e a tração axial,
assegurada pela ancoragem em terra firme.

II – Afirmativa correta.

O esquema estrutural de uma ponte estaiada é, também, semelhante ao de uma viga contínua
suportada por inúmeros apoios. Esses apoios correspondem aos estais, que são suportados pelo mastro
e ancorados em segmentos do tabuleiro, como ilustrado na figura a seguir.

Figura 13 – Esquema estrutural de uma ponte estaiada

21
Unidade I

III – Afirmativa incorreta.

As pontes pênsil e estaiada podem ser utilizadas tanto sobre rios quanto sobre o mar. Em geral, as
estaiadas podem vencer vãos maiores do que pontes do tipo pênsil, uma vez que todos os cabos, ou
estais, suportam, aproximadamente, a mesma carga. Já para as pontes do tipo pênsil, quanto maior o
vão entre os mastros, maior será a carga suportada pelo cabo principal.

IV – Afirmativa incorreta.

Tanto para pontes tipo pênsil quanto estaiadas, praticamente todos os componentes podem ser
pré‑fabricados. Sendo assim, a área necessária para o canteiro de obra depende mais da forma de
produção e de instalação dos componentes do que do tipo de ponte.

Além de ter habilidade para relacionar conhecimentos básicos de diferentes disciplinas, o engenheiro
civil precisa ser capaz de examinar, verificar e identificar, com a devida agilidade, eventuais falhas ou
equívocos de colaboradores, tanto na fase de concepção e de detalhamento do projeto quanto na fase
de execução da obra.

A execução da obra deve ser uma fiel e simples realização de tudo o que já foi definido no projeto
executivo. Qualquer modificação decidida durante a construção pode afetar outras partes do projeto e causar
danos imprevistos.

Nesse novo contexto de projeto, eventuais modificações podem afetar as condições impostas na
própria licença de instalação e até mesmo comprometer a licença de operação para o empreendimento.

Contudo, tais implicações jamais podem ser justificativas para que qualquer parte da obra seja
executada com erros ou de forma equivocada. O engenheiro civil residente, encarregado da construção,
sendo uma última instância antes da execução dos trabalhos, deve verificar e avaliar os projetos que
recebe e que passará para os executores.

É importante salientar que qualquer equívoco ou falha jamais pode ser corrigido na obra, ainda que
o responsável técnico pela obra tenha capacidade suficiente para realizar tal correção. O engenheiro
responsável pelo projeto sempre deve ser comunicado para que verifique a questão e, se for procedente,
se encarregue de elaborar a correção e encaminhar a solução correta para a execução.

Além das recentes questões relativas à proteção ambiental, qualquer alteração construtiva,
realizada sem o conhecimento e a expressa aprovação do autor do projeto, pode comprometer toda
a cadeia de responsabilidades.

Portanto, talvez mais do que qualquer outro profissional, o engenheiro civil precisa manter os
conhecimentos fundamentais de todas as disciplinas da engenharia para desenvolver uma visão ampla
de todas as áreas do saber, ainda que decida se especializar em algum setor. E, caso se especialize,
também deverá atualizar, ampliar e aprofundar os conhecimentos específicos do setor escolhido.
22
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Hoje, as questões impostas à prática da construção civil vêm exigindo cada vez mais um amplo leque
de soluções, para que cada situação específica tenha uma solução viável sob diversos pontos de vista,
além do técnico e do econômico.

Lembrete

O engenheiro civil residente, encarregado da construção propriamente


dita, por ser uma última instância antes da execução dos trabalhos, é
responsável pelos projetos que encaminha para os executores.

Exemplo de aplicação

Considere um reservatório com capacidade para 20.000 litros de água potável, construído em
concreto armado com 5 m de comprimento, 4 m de largura e 1,20 m de altura. A espessura das lajes
de fundo e de cobertura será de 20 cm e de 12 cm, respectivamente, e a espessura das quatro paredes
será de 15 cm. Esse reservatório será suportado por 4 pilares de 5 m de altura, com seção transversal
quadrada, de 30 cm x 30 cm. Considerando 25 kN/m3 o valor do peso específico do concreto armado e
10 kN/m3 o da água, avalie as afirmativas a seguir (Enade 2011, Engenharia, questão 17, adaptada).

I – O valor do peso próprio do tanque será de cerca de 267 kN.

II – O valor da carga total na base de cada pilar será de cerca de 67 kN.

III – Supondo que a capacidade de suporte do solo, onde o reservatório será construído, seja de 200 kN/m2,
é possível adotar fundações diretas com sapatas de base quadrada, com lado de 0,60 m.

É correto o que se afirma em:

A) I apenas.

B) II apenas.

C) III apenas.

D) I e II apenas.

E) I, II, III.

Resolução

Resposta correta: alternativa A.

23
Unidade I

Para solucionar uma questão de engenharia civil, é importante desenhar. Não é necessário nem
deve ser um desenho técnico preciso, pode ser apenas um esboço, um rascunho, sem escala, mas que
represente a situação real, como o reservatório da questão, representado na figura a seguir.
,15 5 ,15
,12
,15

1,20

,20
4

5
,15

Planta Corte

Figura 14 – Esboço do reservatório em planta e corte

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

O valor do peso próprio do tanque pode ser obtido pelo volume total de concreto (V) multiplicado
pelo valor do peso específico (γ) do concreto armado.

Pconcreto = γ concreto × Vconcreto

O volume de concreto do reservatório deve ser calculado para todos os componentes, isto é, para as
lajes e as paredes.

V = Vlaje de fundo + Vlaje de cobertura + Vparedes

Vlaje de fundo = 5,30m × 4,30m × 0,20m = 4,56m3

Vlaje de cobertura = 5,30m × 4,30m × 0,12m = 2,74m3

Vparedes = (2 × 5,30m + 2 × 4,00m) × 1,20m × 0,15m = 3,35m3

Pconcreto = γ concreto × Vconcreto

kN
P = 25 3
× (4,56m3 + 2,74m3 + 3,35m3 ) = 266,25 ≅ 267kN
m

24
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

II – Afirmativa incorreta.

Como o perímetro do reservatório tem a forma de um retângulo e cada pilar está em um dos cantos,
o valor da carga suportada pela base de cada pilar será igual ao peso próprio do tanque, somado ao peso
do volume total de água, dividido por quatro pilares, mais o peso próprio do pilar.
Preservatório + Págua
P= + Ppilar
4
O peso do reservatório já foi estimado anteriormente:

P ≅ 267kN

O valor do peso da água pode ser obtido pelo valor do volume total de água (V) multiplicado pelo
valor do peso específico (γ) da água.

Vágua = 20.000l = 20m3

kN
Págua = γ água × Vágua = 10 3
× 20m3 = 200kN
m

O valor do peso próprio do pilar também pode ser obtido do mesmo modo:

Vpilar = 5,00m × 0,30m × 0,30m = 0,45m3


kN
Ppilar = γ concreto × Vpilar = 25 3
× 0,45m3 = 11,25kN
m
Assim, a carga na base de cada pilar será:

Preservatório + Págua
P= + Ppilar
4
266,25kN + 200kN
P= + 11,25kN = 127,76kN ≅ 128kN
4

III – Afirmativa incorreta.

A capacidade de suporte do solo, isto é, o valor máximo da tensão admissível para tal solo (σadm),
é da ordem de 200 kN/m2, o que significa que cada m2 desse solo pode suportar, sem deformação
significativa, cerca de 200 kN.

O peso na base de cada pilar será de cerca de 128 kN, sem contar o peso próprio da sapata.

25
Unidade I

Para que o valor da pressão aplicada no solo seja inferior à sua capacidade de suporte, será necessário:
P
≤ σadm , ou seja,
A

P 128kN
A≥ ≥ ≥ 0,64m2
σadm 200 kN
m2
Mesmo sem calcular o peso próprio das sapatas, já é possível verificar que os lados do quadrado
devem ter mais que 0,80 m de extensão.

Sendo assim, apenas a afirmativa I é correta.

O exemplo apresentado trata apenas de algumas das verificações básicas que devem ser realizadas
tanto pelo revisor ou pelo coordenador do projeto quanto pelo engenheiro responsável pela execução.

Ainda caberia sugerir ao calculista da estrutura uma verificação do cálculo dos pilares em relação ao
índice de esbeltez, já que uma seção transversal de 0,30 m x 0,30 m, à primeira vista, parece pequena
para um pilar com 5 m de altura.

Sempre é bom lembrar que tais revisões não precisam ser realizadas de forma detalhada pelo
construtor. Ao perceber uma possibilidade de equívoco, ele deve sugerir que o autor do projeto faça
a revisão, e esse sendo o autor do projeto, sendo um bom profissional, acatará a sugestão, inclusive
agradecendo pela oportunidade de corrigir um eventual engano.

Mais importante ainda é jamais esquecer que toda e qualquer correção deve ser feita apenas pelo
autor do projeto ou, em casos mais simples, com a sua concordância manifestada por escrito.

Essa postura perante o exercício da profissão sempre teve importância absoluta. Atualmente,
porém, face aos novos condicionantes impostos pela legislação referente à proteção do meio ambiente,
tornou‑se uma postura vital.

Verificar projetos complementares não é uma tarefa fácil. Em geral, essa atividade requer certa
experiência, que cresce com a prática, além de capacidade de observação aliada ao hábito de recorrer a
conhecimentos básicos de cada disciplina aprendida.

Esse conjunto de características pessoais, que vai se aperfeiçoando com a prática profissional, deve
ser cultivado e desenvolvido pelo próprio engenheiro civil, não só a partir do início da carreira, mas
desde a época de estudante.

Mais um típico exemplo de verificação necessária, simples e importante ao mesmo tempo, é o que
se refere ao posicionamento e às especificações das armaduras de aço nas peças de concreto armado,
transmitidos ao construtor por meio de desenhos específicos dos projetos executivos.

26
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Para verificar se a armadura de aço de um reservatório, semelhante ao que foi objeto do exercício
anterior, está correta, é preciso se lembrar tanto dos efeitos dos esforços atuantes na estrutura quanto
da própria forma e da magnitude de tais esforços.

Observação

Tensão, que significa o valor de uma força por unidade de área, é uma
das grandezas que representam os esforços atuantes em uma estrutura,
habitualmente variáveis conforme a posição examinada.
Força
Tensão =
Área
No estudo da hidrostática, aprende‑se que a pressão (p) em um ponto qualquer no interior de um
líquido em repouso é aplicada igualmente em todas as direções e que o seu valor é igual ao valor do
peso específico (γ) desse líquido multiplicado pelo valor da profundidade (z) desse ponto em relação à
superfície livre do líquido.

Esse conhecimento básico é suficiente para determinar a forma e os valores da pressão ou da tensão
aplicada pelo líquido em cada ponto das paredes do reservatório, como ilustra a figura a seguir.

p=γ.z

Figura 15 – Valor da pressão em um ponto qualquer do reservatório

Consequentemente, é possível concluir que o valor da pressão (p) sobre a laje de fundo do reservatório
será igual ao valor do peso específico (γ) do líquido multiplicado pelo valor da profundidade útil (h) do
reservatório cheio, ilustrado na figura a seguir.

h p=γ.h

Figura 16 – Valor da pressão sobre a laje de fundo do reservatório

27
Unidade I

Sendo assim, percebe‑se que o valor máximo do momento fletor atuante nas paredes do reservatório
ocorrerá no encontro delas com a laje de fundo. É nesse ponto, portanto, que as tensões internas, de
tração e de compressão, atingirão seu valor máximo.

Como a máxima tensão de tração ocorrerá na face interna da parede, é ali que deve estar concentrada
a maior parte das barras de aço, que constituem a denominada armadura longitudinal, bem como na
face superior da laje de fundo, representadas na figura a seguir.

Distribuição

Figura 17 – Armadura longitudinal tracionada na base das paredes do reservatório

É importante lembrar que as barras que constituem essa armadura devem ser retas, para não causar
novas tensões internas no concreto, tendo apenas a dobra necessária para sua ancoragem. Barras
transversais posicionadas ao longo das dobras, também denominadas barras de distribuição, contribuem
para distribuir as tensões e melhorar a ancoragem.

Quanto maior a profundidade útil do reservatório, mais elevados serão os valores do momento e das
tensões de tração nesse ponto. Um recurso para elevar a resistência à tração, que é provida pelo aço, é
o emprego de mísulas, como a apresentada na figura a seguir.

Mísula
Distribuição

Figura 18 – Armadura para tração, reforçada com mísula, na base das paredes do reservatório

As barras adicionadas em diagonal contribuem para absorver parte da tensão de tração no concreto,
resultante das tensões de tração aplicadas na parede e na laje de fundo. Para ancoragem, as suas
extremidades devem estar nas faces comprimidas, tanto da parede quanto da laje de fundo, e também
devem contar com dobras e barras transversais de distribuição.

A tarefa de verificação de projetos executivos concluídos, como se pode imaginar, não é simples nem
fácil. Sendo assim, não deve ser realizada por apenas uma pessoa, menos ainda por um profissional com
pouca experiência e jamais apenas pelo próprio autor do projeto.
28
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

A prática recente tem mostrado que não são poucos os projetos postos em execução sem a devida
verificação. São comuns as explicações baseadas em falta de tempo ou questões de custos. Os motivos
são diversos: ficarão comprometidos o cliente, público ou privado, que impõe prazos muito curtos, o
empreendimento, que conta com orçamento muito reduzido, a rentabilidade ou o tempo de retorno. E,
sobretudo, um dos argumentos mais fortes é: se o projeto não for executado em tal prazo e por tal valor,
algum concorrente fará.

No entanto, uma simples e breve comparação é suficiente para demonstrar que tanto o custo
quanto o tempo necessário para realizar uma verificação completa, com diversos profissionais já com
certa experiência, são muito inferiores ao custo e ao tempo necessário para reparar a maior parte dos
problemas ocasionados por falhas em projetos.

A comparação simples, apenas considerando prazos e custos diretos, já é mais do que suficiente.
Porém, os prejuízos gerados para as famílias e o meio ambiente costumam ser bem maiores e bem mais
difíceis de serem reparados.

Elaborar um projeto executivo correto é um processo complexo, e, por isso, o projeto deve
necessariamente ser realizado em equipe. A não ser para pequenas obras, não há engenheiro civil
especialista em todas as áreas.

Quanto maior a complexidade do empreendimento, maiores serão suas implicações, seus efeitos
colaterais. Maior, também, será a quantidade e a amplitude das áreas envolvidas e dos diferentes
profissionais necessários. E será ainda maior a necessidade de interação e retroalimentação entre
as diversas disciplinas, desde o início da fase de concepção do empreendimento, em que a questão
é o que fazer.

Embora seja um processo bem mais difícil e trabalhoso, é, sem dúvida, a forma correta de projetar e,
sobretudo, a atitude indispensável ao empreender a partir do terceiro milênio.

Assim como no idioma chinês uma mesma palavra significa tanto “crise” quanto “oportunidade”,
é correto afirmar que, para a engenharia civil, dificuldades ou restrições costumam ter o mesmo
significado de desafio.

3 SOLOS E FUNDAÇÕES

Na prática da engenharia civil, é possível que, em muitas ocasiões, o engenheiro tenha a oportunidade
de realizar obras de pequeno porte. Mesmo pequenas, não significa que tais obras tenham menor
importância e, por isso, exijam menos cuidados. A atitude responsável deve estar presente em quaisquer
empreendimentos e com a mesma intensidade.

Para esse tipo de obra, o engenheiro civil pode precisar empregar conhecimentos básicos de diversas
áreas ao mesmo tempo, além de buscar fórmulas e dados, dos quais ele pouco se lembra ou com os
quais, talvez, nem sequer tenha trabalhado.

29
Unidade I

Nesses momentos, os conceitos básicos de cada disciplina tornam‑se fundamentais. Para saber
onde, como e, sobretudo, o que procurar, é imprescindível possuir um acervo desses conhecimentos.

Uma dessas obras pode ser, por exemplo, a reforma de um pequeno galpão industrial, para
transformá‑lo em um local para eventos, um espaço compartilhado para escritórios diversos ou uma
academia para ginástica. Em casos como esse, é bastante provável que um só engenheiro deverá dirigir
os trabalhos desde as fundações até a cobertura, incluindo verificações e eventuais retificações da
estrutura, das instalações hidráulico‑sanitárias e das águas pluviais, entre outros. Ao mesmo tempo, ele
terá que coordenar os projetos e a execução de serviços especializados, como instalações elétricas e de
equipamentos especiais, instalação de prevenção e combate a incêndio, climatização, telecomunicações
e tecnologia da informação (TI).

Lembrete

Como regra geral, a prática da engenharia civil é realizada em equipes.


Às vezes, porém, em obras de pequeno porte, o engenheiro civil terá que
atuar em diversas especialidades.

Uma questão que sempre está presente em qualquer tipo de obra, seja uma construção nova ou
reforma, é a questão das fundações da edificação. Além disso, qualquer que seja o porte da obra, o
engenheiro civil terá que considerar a questão da estabilidade e do equilíbrio da edificação no terreno
e, também, da estabilidade e do equilíbrio das demais edificações existentes em torno da obra que vai
executar.

Sempre é bom lembrar que esta disciplina trata apenas de conceitos básicos para todo engenheiro civil,
em face do caráter interdisciplinar que a sua atuação profissional sempre terá. Para os conhecimentos
mais profundos e detalhados, necessários ao profissional especialista em cada assunto, existem as
disciplinas específicas, bem como o estudo e a atualização contínua após o período de graduação.

Retomando o exemplo da reforma de um pequeno galpão industrial para mudança de uso,


mencionado anteriormente, as alterações no estado de equilíbrio do prédio no terreno constituem a
primeira questão que o profissional responsável terá que considerar.

Seja para adequar o local para eventos, para um espaço compartilhado para escritórios diversos
ou para uma academia de ginástica, novas paredes terão que ser construídas, novas instalações
hidráulico‑sanitárias devem ser feitas, um novo teto e uma nova iluminação serão, eventualmente,
suportados pela cobertura, assim como serão instalados aparelhos de ar condicionado. Um conjunto de
novas sobrecargas, portanto, será acrescentado à estrutura existente.

É evidente que a estrutura deve ter condições para receber todas essas novas cargas. Porém, antes
dessa verificação e de quaisquer providências para eventuais reforços, é necessário verificar as condições
de suporte do terreno para, também, providenciar reforços para as fundações do edifício.

30
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

O engenheiro, sendo ou não o autor do projeto ou o responsável técnico pela construção, jamais pode
apenas achar que o acréscimo de sobrecargas será pequeno ou que o terreno as suportará sem problemas.

A primeira providência é conhecer a constituição dos solos existentes no terreno sob a edificação.
Não deve ser promovida qualquer alteração no conjunto, que está em equilíbrio, sem ter uma noção
técnica razoável sobre como tais solos se comportarão nas novas condições.

Existem diversas formas de se conhecer a constituição do subsolo de um terreno. A mais simples


delas é denominada análise visual-tátil, que consiste em examinar amostras retiradas do subsolo,
utilizando a visão e o tato do examinador.

Apesar de ser uma análise que requer experiência do profissional que a realiza, e de ser apenas
qualitativa, ou seja, uma análise que não fornece parâmetros numéricos para cálculos de capacidade de
suporte, se for realizada com certo critério, ela representa um bom conhecimento do subsolo, sobretudo
no que se refere à previsão do seu comportamento.

Do ponto de vista do comportamento, os solos não são apenas materiais sólidos e homogêneos. São
materiais compostos, constituídos por partículas sólidas, líquidas e gasosas, cujas proporções variam
continuamente e, por isso, alteram o seu comportamento com regularidade.

Os componentes sólidos são minúsculas partículas que podem ter origem mineral ou orgânica.
O componente líquido é, em geral, a água, e o componente gasoso é, principalmente, o ar e o
vapor d’água, que ocupam os espaços vazios existentes entre as partículas sólidas, ilustradas na
figura a seguir.

Fase gasosa
Fase sólida
Fase líquida
Menisco de água
(ligação eletrolítica)

Figura 19 – Composição típica dos solos

Conforme a variação da proporção entre as quantidades de cada um desses componentes, sobretudo


a variação do grau de umidade, o comportamento do solo pode se modificar significativamente.
A resistência de um solo ao cisalhamento depende, basicamente, da coesão e do atrito entre as suas
partículas sólidas.

A coesão é resultado de uma ligação eletrolítica entre as partículas sólidas através do menisco de
água que se forma nas superfícies de contato entre elas, também ilustrado na figura a seguir.

31
Unidade I

Quanto maior a área de contato entre duas partículas, maior será a intensidade da ligação e, portanto,
a coesão do solo. Pode‑se dizer, de uma forma simples, que os solos coesivos são aqueles cujas partículas
sólidas estão fortemente grudadas umas às outras.

Os solos argilosos, por serem constituídos de partículas com formato lamelar, isto é, em forma de
minúsculas placas, apresentam áreas de contato bastante grandes em relação ao seu peso. Por isso, a
sua coesão é elevada.

Os solos arenosos, por serem constituídos de partículas com formato granular, isto é, em forma de
pequenos grãos, apresentam áreas de contato pequenas em relação ao seu peso. Por isso, a sua coesão
é quase nula.

Os solos siltosos também são constituídos de partículas granulares, mas muito menores do que as
dos solos arenosos. Apresentam áreas de contato pequenas, mas em menor grau em relação ao seu peso.
Por isso, possuem uma certa coesão, ainda que aparente.

Com base nessas informações, torna‑se possível distinguir, utilizando a visão e o tato, os três
principais tipos de solo do ponto de vista geotécnico.

Ao manusear uma amostra de solo argiloso umedecida, as partículas sólidas praticamente não são
sentidas pelo tato e formam uma massa moldável e uniforme. Ao secar, a forma com que a amostra
foi moldada não se modifica. É com solo argiloso que são feitos os tijolos de barro, as telhas e muitos
objetos de artesanato.

Ao manusear uma amostra de solo arenoso, ainda que bem umedecida, as partículas sólidas são
imediatamente sentidas pelo tato. Embora seja possível moldar uma porção de solo arenoso, fazendo
castelinhos, por exemplo, ao perder umidade, a porção perde a forma, tornando‑se uma pilha de areia.

Os solos siltosos, quando umedecidos, também permitem moldagem, mas, quando apertados e
esfregados entre as mãos, tornam‑se esfarelados, e as suas partículas sólidas tornam‑se sensíveis
ao tato.

A argila orgânica, que tem esse nome por se originar de seres orgânicos decompostos, animais ou
vegetais, é facilmente reconhecível por sua consistência pastosa, baixíssima resistência e cor escura. São
os solos que constituem as regiões popularmente conhecidas como brejos.

Para realizar uma análise visual-tátil, o primeiro passo é traçar um plano de locação para, no mínimo,
três furos não alinhados no terreno, adotando um ponto a ser utilizado como referência de nível
(RN = 100) para os resultados obtidos em cada furo, como ilustrado na figura a seguir.

32
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

RN=100

1,80
12
Furo 2

6
4

10
Furo 1
Rua

21
Furo 3

Figura 20 – Plano de locação para retirada de amostras para análise visual-tátil

Os furos podem ser realizados com um trado manual simples, o mesmo utilizado para execução de
brocas, isto é, estacas escavadas e moldadas in loco para pequenas capacidades de carga.

É importante anotar as cotas de nível no início de cada furo e, à medida que se escava, as
profundidades cada vez que o tipo de solo encontrado se altera ou que a sua consistência se modifica.
Também é importante anotar a profundidade atingida pelo lençol freático, mostrada pela presença de
água nas amostras.

A própria força necessária para o operador girar o trado já representa um indicativo da resistência
do solo que está sendo escavado. Deve‑se, também, guardar as amostras em sacos plásticos e com
etiquetas para identificação do furo e da profundidade em que foram retiradas.

Com esses dados, torna‑se possível traçar um esboço do provável perfil do subsolo, desenhando, em
escala, os resultados de cada furo e alinhando‑os com base na referência de nível, como ilustrado na
figura a seguir.

RN = 100
Furo 1 Furo 2 Furo 3
Aterro de argila siltosa, média, vermelha

Silte arenoso, medianamente compacto, vermelho amarelado

Argila pouco siltosa, rija, marrom avermelhada


95 N.A.

Argila siltosa, dura, vermelho amarronzada

Figura 21 – Perfil provável do subsolo, traçado a partir de amostras para análise visual-tátil

33
Unidade I

Como os furos não são alinhados, pode‑se imaginar as tendências e traçar esses perfis em diversas
direções. Quanto maior a quantidade de furos escavados, melhor a visão e a compreensão do subsolo
do terreno.

Essas informações, mesmo sem grande precisão, podem ser úteis para definir as fundações para
novas instalações, desde que as cargas não sejam elevadas e que, com razoável segurança, seja possível
adotar fundações diretas rasas por meio de sapatas simples, associadas ou corridas.

A norma NBR nº 6484:2001 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) apresenta, no seu
Anexo A, uma tabela que relaciona o estado de compacidade ou de consistência dos solos com os
números NSPT, obtidos nos ensaios Standard Penetration Test (SPT), que serão vistos adiante.

Esse tipo de ensaio oferece dados bem mais precisos do que a análise visual-tátil. Sendo assim, a
referida tabela não pode ser utilizada no sentido inverso, isto é, para adotar um valor de NSPT a partir
de uma avaliação subjetiva da compacidade ou da consistência de um solo, feita com base apenas na
experiência relativa de quem analisa a amostra.

Com a devida prudência, no entanto, esses dados podem servir como uma boa referência para melhor
aferir a resistência admitida para cada solo encontrado e, inclusive, para gerar tabelas encontradas na
literatura técnica, como a exemplificada na tabela a seguir.

Tabela 1

Capacidade de suporte ‑ σadm


Solo predominante, tipo e características
kN/m2 tf/m2 kgf/cm2
Areias muito compactas 500 50 5,0
Areias compactas 400 40 4,0
Areias medianamente compactas 200 20 2,0
Argilas duras 300 30 3,0
Argilas rijas 200 20 2,0
Argilas médias 100 10 1,0
Siltes duros ou muito compactos 300 30 3,0
Siltes rijos ou compactos 200 20 2,0
Siltes médios ou medianamente compactos 100 10 1,0

Exemplo de aplicação

A reforma de um antigo galpão prevê a construção de 4 salas para escritórios, representadas em


planta e corte nas figuras a seguir.

As paredes serão de alvenaria estrutural aparente, com blocos de concreto, cujo peso próprio pode
ser considerado 2,8 kN/m2.

34
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

A laje de teto das salas, que servirá de piso para um mezanino, será moldada com vigotas
pré‑fabricadas, tipo treliça, e lajotas de isopor, dimensionada para uma carga total, permanente mais
acidental, de 10 kN/m2, e será suportada apenas pelas paredes laterais das salas.
RN = 100

,50 4 4 4 4 ,50
Rua

4,40

A A

Planta

Figura 22 – Perfil provável do subsolo, traçado a partir de amostras para análise visual-tátil

Mezanino
.15

2,80
4

Sala Sala Sala Sala

Corte A-A

Figura 23 – Perfil provável do subsolo, traçado a partir de amostras para análise visual-tátil

Para definir as fundações dessas salas e do mezanino, o engenheiro responsável técnico pela obra,
que também é o autor do projeto, realizou uma análise visual-tátil do subsolo, com amostras retiradas
de 3 furos não alinhados, feitos no terreno, sob o piso do galpão. A partir dessa análise, ele esboçou o
provável perfil do subsolo, apresentado na figura a seguir.
RN = 100
Furo 1 Furo 2 Furo 3
Aterro de argila siltosa, média, vermelha

Silte arenoso, medianamente compacto, vermelho amarelado

Argila pouco siltosa, rija, marrom avermelhada


95 N.A.

Argila siltosa, dura, vermelho amarronzada

Figura 24 – Perfil provável do subsolo, traçado a partir de amostras para análise visual-tátil

35
Unidade I

Consultando a tabela do Anexo A da NBR nº 6484:2001 (ABNT, 2001) a seguir, apenas como referência,
ele considerou razoável, para as paredes das novas salas, fazer fundações diretas com sapatas corridas
apoiadas na camada de silte arenoso, medianamente compacto.

Tabela 2 – Estados de compacidade e de consistência

Índice de resistência à
Solo Designação
penetração (NSPT)
≤4 Fofo(a)
5a8 Pouco compacto(a)
Areias e siltes 9 a 18 Medianamente compacto(a)
arenosos
19 a 40 Compacto(a)
> 40 Muito compacto(a)
≤2 Muito mole
3a5 Mole
Argilas e siltes 6 a 10 Médio(a)
arenosos
11 a 19 Rijo(a)
> 19 Duro(a)

Fonte: ABNT (2001, p. 17).

Para definir um valor para a capacidade de suporte desse solo, pensando sempre na segurança, o
engenheiro decidiu adotar um valor de tensão admissível (σadm) equivalente a NSPT = 9, que é o menor
valor correspondente a siltes arenosos medianamente compactos.

Aplicando a correlação empírica a seguir, ele obteve:

σadm = 20 × NSPT = 20 × 9 = 180 kN


m2

Considerando essas informações, avalie as afirmativas a seguir (Enade 2017, Engenharia Civil,
questão 25, adaptada).

I – Os valores de carga aplicada pela laje nas paredes centrais e laterais serão, respectivamente, de
40 kN/m e 25 kN/m.

II – O valor da carga distribuída nas fundações, devida apenas ao peso próprio das paredes, será de
cerca de 7,84 kN/m.

III – As larguras das sapatas corridas para essas novas paredes podem ser de 30 cm para as paredes
laterais e de 40 cm para as centrais.

É correto o que se afirma em:

36
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

A) I e II apenas.

B) II e III apenas.

C) I e III apenas.

D) II apenas.

E) I, II, III.

Resolução

Resposta correta: alternativa C.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

As paredes centrais suportarão metade das lajes de cada lado, o que equivale à carga do vão entre
as paredes.

 4,00m 
qLC = 10 kN 2 × 2×
kN
 = 40 m
m  2 

As paredes laterais suportarão, de um lado, metade de uma laje, e, do outro lado, apenas um balanço
de 50 cm.
 4,00m 
qLL = 10 kN 2 × + 0,50m  = 25 kN
m  2  m
II – Afirmativa incorreta.

Como as salas têm 2,80 m de altura e as sapatas corridas apoiadas na camada de silte arenoso
medianamente compacto ficarão cerca de 1,20 m abaixo do piso do galpão, as paredes terão cerca de
4,00 m de altura.

Como o valor do seu peso próprio é de 2,8k N/m2, a carga aplicada será:

pp = 2,8 kN 2 × 4,00m = 11,2


kN
m m
III – Afirmativa correta.

O valor da carga total nas sapatas laterais, devido à laje mais a parede, será:

pL = 25 kN + 11,2 kN = 36,2 kN
m m m

37
Unidade I

O valor da área de sapata será o valor da sua largura (L) multiplicado por 1 metro de extensão. Então,
o valor da sua largura deve ser:

pL pL 36,2 kN
σadm > , ou seja, L > = m = 0,201m
L × 1m σadm 180 kN 2
m
Adotando 0,30 m de largura, 0,20 m de espessura e considerando γ = 25 kN/m3 o peso específico do
concreto armado, o peso próprio da sapata, por metro de extensão, será:

ppS = 25 kN × ( 0,30m × 0,20m) = 1,5 kN


m3 m
O valor da pressão total no solo, por metro de extensão de sapata, será:

36,2 kN + 1,5 kN
m m = 125,7 kN < σ kN
adm = 180
0,30m × 1m m2 m2

Para as sapatas centrais, o valor da carga total será:

pC = 40 kN + 11,2 kN = 51,2 kN
m m m
O valor da largura das sapatas dever ser:

pL 51,2 kN
L> = m = 0,284m
σadm 180 kN 2
m

Adotando 0,40 m de largura, com 0,20 m de espessura, o peso próprio da sapata, por metro de
extensão, será:

ppS = 25 kN × ( 0,40m × 0,20m) = 2,0 kN


m3 m

O valor da pressão total no solo, por metro de extensão de sapata, será:

51,2 kN + 2,0 kN
m m = 133,0 kN < σ kN
adm = 180
0,40m × 1m m2 m2

Para edificações de maior porte, o conhecimento do perfil geotécnico do subsolo terreno precisa ser
mais preciso, ou seja, os dados devem ser mais objetivos e quantitativos. Os ensaios e testes disponíveis
para essa finalidade têm complexidade crescente e requerem equipamentos cada vez mais sofisticados,
conforme cresce a complexidade da obra.

38
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

O mais básico desses ensaios é o Standard Penetration Test, também conhecido apenas pela sigla
SPT. Com padronização internacional, esse ensaio é o mais utilizado no Brasil e no mundo, tanto pela
confiabilidade dos seus resultados quanto pela simplicidade da sua execução e facilidade de transporte
e instalação do seu equipamento, como mostrado na figura a seguir.

Figura 25 – Equipamento tipo Standard Penetration Test utilizado para sondagem do subsolo.

O procedimento completo para a realização desse ensaio, bem como a forma de apresentação
de seus resultados, qualitativos e quantitativos, é padronizado pela norma NBR nº 6484:2001
(ABNT, 2001).

A sua concepção teórica é bastante engenhosa. Visando identificar a constituição e quantificar


a resistência do terreno, um amostrador padronizado é introduzido no subsolo, empregando‑se
sempre a mesma quantidade de energia. A cada metro de profundidade, amostras do solo são
retiradas e é medida a quantidade de energia necessária para o amostrador penetrar certa
profundidade, também padronizada.

Dessa forma, enquanto as amostras fornecem informações qualitativas sobre o tipo de solo, seu
estado de consistência ou de compacidade e sua cor, a quantidade de energia utilizada fornece uma
indicação quantitativa da sua resistência à penetração.

Tais informações, obtidas com pelo menos três furos de sondagem não alinhados, são extremamente
valiosas para se formar uma ideia razoável da constituição do perfil do subsolo de um terreno, como
ilustrado na figura a seguir, imaginar suas variações em diversas direções, definir e dimensionar fundações
e contenções adequadas.
39
Unidade I

Areia siltosa

Argila orgânica

Argila siltosa
Alteração de rocha

Figura 26 – Perfil provável do subsolo, traçado a partir de amostras de sondagem tipo SPT

O equipamento utilizado para o ensaio SPT é composto, basicamente, por um tripé metálico, tubos
de aço, um amostrador e um martelo, todos padronizados. A quantidade de energia padronizada,
empregada para fazer o tubo penetrar no solo, corresponde à energia cinética proveniente da quantidade
de pancadas do martelo, suspenso por uma corda e solto em queda livre, sempre da mesma altura, como
ilustra a figura a seguir.

m = massa padronizada

Energia constante:
h = altura padronizada

E = mgh = mv
2

15 cm
15 cm NSPT = quantidade de golpes nos últimos 30 cm,
15 cm a cada metro de profundidade

Figura 27 – Representação esquemática da conceituação da sondagem tipo SPT

A cada metro de profundidade é medida a quantidade de golpes do martelo, necessária para o tubo
penetrar três séries consecutivas de 15 cm. A soma do número de pancadas dos dois últimos trechos é
denominada NSPT, que é o dado quantitativo referente à resistência do solo naquela profundidade.

Assim, números NSPT baixos indicam solos com baixa resistência ao cisalhamento, enquanto que solos
com resistência elevada correspondem a números NSPT mais elevados.

40
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Há casos em que o solo possui resistência tão baixa que, com um ou dois golpes do martelo, os
primeiros 15 cm já são superados. Em casos assim, o número NSPT é indicado por uma fração, com o
numerador indicando a quantidade de golpes e o denominador indicando o valor da penetração obtida.
Se, por exemplo, com o primeiro golpe a penetração já for de 18 cm a sua representação será:

NSPT = 1
18
Por outro lado, há solos tão resistentes que, mesmo após muitos golpes, nem os primeiros 15 cm
são superados. A sua representação é feita do mesmo modo, em forma de fração. Se, por exemplo, após
27 golpes o avanço chegar a apenas 12 cm, sua representação será:

NSPT = 27
12

Saiba mais

Para conhecer melhor as relações entre os números NSPT e a resistência


do solo, é interessante a leitura do capítulo 7, “Análise, projeto e execução
de fundações rasas”, da seguinte obra:

HACHICH, W. et al. Fundações: teoria e prática. 3. ed. São Paulo: Pini, 2016.

Assim como a superfície de um terreno praticamente nunca é plana, as camadas que constituem seu
subsolo também não são planas nem uniformes. Para que seja possível formar uma ideia tridimensional
a respeito do relevo do subsolo, as sondagens do tipo SPT devem ser realizadas com, pelo menos, três
furos não alinhados no plano horizontal.

O plano ideal para a locação desses furos de sondagem consiste em utilizar o próprio levantamento
planialtimétrico do terreno, adotar um ponto de referência e estabelecer um sistema de coordenadas
cartesianas, como o representado na figura a seguir.

Figura 28 – Locação de furos para sondagem tipo SPT

41
Unidade I

Dessa forma, cada furo estará associado a um conjunto de coordenadas espaciais, x, y e z, assim como
cada cota de nível das camadas do subsolo, com todos os pontos relacionados à mesma Referência de
Nível (RN).

É interessante estabelecer a origem e a referência de nível em um ponto do próprio terreno, que


possa ser preservado até o final da obra. Em geral, a cota de nível de referência passa a ser denominada
RN = 100, apenas por comodidade, para que não seja necessário trabalhar com cotas negativas para as
camadas constituintes do subsolo do terreno.

A quantidade de furos necessária para um determinado lote é definida de forma que a distância
entre dois furos nunca seja superior a 30 m. A apresentação dos resultados das sondagens tipo SPT
é feita por meio dos boletins de cada furo realizado, que devem conter, pelo menos, as informações
apresentadas na figura a seguir.

Standard Penetration Test - SP 01


Profundidade
SPT Nível em relação
d’água Classificação do material
à RN ao furo

Aterro de entulho (tábua, pneu, pet etc.)

Aterro silte argiloso (material escolhido)

Areia média à grossa, pouco siltosa,


Areia média à grossa,
medianamente pouco
compacta, siltosa,
amarelada
medianamente compacta, amarelada

Argila orgânica, muito mole, cinza escura

Argila siltosa, pouco arenosa, mole, cinza

Argila
Argilasiltosa vermelha amarelada
silto arenosa, média, vermelho

Figura 29 – Boletim típico de resultados de um furo de sondagem tipo SPT

42
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

É indispensável a apresentação dos números SPT, ou NSPT, obtidos a cada metro de profundidade, do
nível d’água do lençol freático, da profundidade em que ocorreu a alteração do tipo de solo encontrado,
tanto em relação à cota de nível do início do furo quanto em relação à RN, bem como uma descrição
qualitativa do material constituinte de cada camada, incluindo a sua cor.

Com base em boletins assim elaborados, torna‑se possível imaginar as tendências do relevo das
camadas que constituem o subsolo de um terreno em diversas direções. Alinhando os boletins em
relação à referência de nível, RN = 100, como mostra a figura a seguir, fica fácil esboçar as linhas que,
mais provavelmente, delimitam as camadas de solos e também indicam o nível do lençol freático.

Figura 30 – Boletins de sondagem tipo SPT alinhados pela Referência de Nível (RN)

Empregando esse procedimento, é possível traçar perfis do subsolo do terreno para definir fundações
ou contenções em qualquer ponto do lote, tais como nos cortes A‑A, B‑B e C‑C, exemplificados nas
figuras a seguir.

Figura 31 – Locação de cortes no terreno para traçar perfis do subsolo

43
Unidade I

Corte A-A

Figura 32 – Perfil provável do subsolo, traçado ao longo do corte A‑A

Observando boletins assim alinhados, é possível verificar como variam as espessuras das camadas
e até mesmo quando uma determinada camada pode terminar dentro do próprio lote. É possível
compreender, também, que cada seção do perfil do subsolo será diferente das demais.

Corte B-B

Figura 33 – Perfil provável do subsolo, traçado ao longo do corte B‑B

Corte C-C

Figura 34 – Perfil provável do subsolo, traçado ao longo do corte C‑C

Lembrete

Na maior parte dos terrenos, o mais provável é que as espessuras das


camadas do perfil do seu subsolo sejam diferentes de um ponto para outro.
44
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Exemplo de aplicação

O levantamento topográfico de um terreno, onde será construído um prédio com uma loja no andar
térreo, escritórios no andar superior e um estacionamento no andar abaixo do térreo, é representado
pela figura a seguir.

Figura 35 – Levantamento topográfico planialtimétrico do terreno

A figura a seguir representa, em planta, a área ocupada pelos andares térreo e superior desse prédio.
O andar de estacionamento ocupará todo o terreno, exceto a faixa de recuo frontal.

Figura 36 – Planta de ocupação do terreno com indicação de cortes

Os cortes longitudinais e transversais, indicados em planta, como A‑A, B‑B, C‑C e D‑D, lançados no
perfil natural do terreno (PNT), são representados nas figuras a seguir.

45
Unidade I

Figura 37 – Corte A‑A do prédio com o perfil natural do terreno (PNT)

Figura 38 – Corte B‑B do prédio com o perfil natural do terreno (PNT)

Figura 39 – Cortes C‑C e D‑D do prédio com o perfil natural do terreno (PNT)

Uma estimativa de cargas, elaborada com base no estudo preliminar das áreas de influência, indicou
que as cargas mais elevadas estarão nos pilares centrais e seus valores serão da ordem de 1.400 kN.

Para conhecer a constituição do subsolo desse terreno, foi realizada uma sondagem do tipo SPT,
composta por três furos não alinhados em planta. Seus resultados, apresentados em boletins individuais,
foram alinhados pela Referência de Nível (RN = 100) e utilizados para traçar um perfil longitudinal do
terreno, esquematicamente representado na figura a seguir.

46
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Figura 40 – Perfil esquemático provável das camadas do subsolo do terreno, alinhado pela RN = 100

Com base nessas informações, avalie as afirmativas a seguir, lembrando que é possível definir a
capacidade de suporte de um solo utilizando a correlação empírica.

σadm = 20 × NSPT , em kN
m2
I – A solução mais econômica para as fundações desse prédio é adotar sapatas rasas, apoiadas cerca
de 1 m abaixo do seu pavimento mais baixo, ou seja, aproximadamente na cota 98 m.

II – Os índices de resistência à penetração NSPT ficam bem mais elevados e estáveis logo no início
da camada de areia siltosa, muito compacta, cinza amarelada, indicando que é necessário dimensionar
tubulões a céu aberto nessa região para saber qual solução é mais econômica.

III – Considerando sapatas apoiadas cerca de 1 m dentro da camada de argila siltosa, mole, marrom
avermelhada, a base da maior delas, se for quadrada, deverá ter cerca de 2,80 m x 2,80 m.

É correto o que se afirma em:

A) I e III apenas.

B) II e III apenas.

C) I apenas.

D) III apenas.

E) I, II, III.

47
Unidade I

Resolução

Resposta correta: alternativa D.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa incorreta.

Observando os boletins com atenção, verifica‑se que, na cota 98 m, parte das sapatas ficaria apoiada
em aterro com entulho.

II – Afirmativa incorreta.

Observando os boletins, verifica‑se que, só para chegar ao início da camada de areia siltosa, muito
compacta, cinza amarelada, antes de alargar a base, seria necessário escavar até 5 m dentro d’água.

III – Afirmativa correta.

Observando os índices de resistência à penetração NSPT, cerca de 1 m dentro da camada de argila


siltosa, mole, marrom avermelhada, verifica‑se que é possível adotar o valor NSPT = 9, a favor da segurança.

Com a correlação indicada, tem‑se:

σadm = 20 × NSPT =180 kN


m2
Para o pilar com a carga mais elevada, P = 1.400 kN, a pressão sobre a sapata, com 2,80 m x 2,80 m, seria:

P 1.400kN
p= = = 178,6 kN 2 < σadm = 180 kN 2
A 2,80m × 2,80m m m

4 ESTRUTURAS

Um dos aspectos mais importantes de qualquer estrutura é a sua concepção. O dimensionamento


e o detalhamento de uma estrutura bem concebida têm probabilidade muito maior de conduzir a uma
solução eficaz e econômica, por mais complexa e trabalhosa que seja essa tarefa.

Nesse contexto, torna‑se fundamental o conhecimento dos princípios básicos assumidos no processo
de concepção, seja de estruturas de concreto, metálicas ou de madeira, tanto para o comportamento
dos materiais quanto para o comportamento das suas ligações ou vinculações.

Sabe‑se que o concreto, por exemplo, é um material que apresenta certa resistência a esforços de
tração. No entanto, para a concepção e o dimensionamento de estruturas de concreto, seja armado ou
protendido, assume‑se que a sua resistência a tração seja nula.

48
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

O exemplo mais simples de peça estrutural é o de uma viga sobre dois apoios, submetida a uma
carga concentrada no centro do vão livre, como a utilizada por Mörsch, no início do século XX, para os
primeiros estudos relativos ao concreto, representada na figura a seguir.

Figura 41 – Viga sobre dois apoios com carga concentrada no centro do vão livre

Elevando gradualmente o valor da carga (P), Mörsch observou, antes da ruptura, o surgimento de
fissuras na parte inferior da peça, ou seja, na região tracionada da sua seção transversal, como ilustra a
figura a seguir.

Figura 42 – Fissuração típica na viga ensaiada

A partir de estruturas conhecidas, cuja definição e dimensionamento já eram bem dominados à


época, tais como a representada na figura a seguir, Mörsch idealizou uma treliça para desenvolver um
modelo para o concreto armado.

Figura 43 – Ponte Marechal Hermes

O esquema estrutural estático de uma treliça, metálica ou de madeira, é composto de peças


tracionadas e peças comprimidas, ilustradas na figura a seguir.

49
Unidade I

Banzo comprimido Bielas comprimidas

Banzo tracionado Montantes tracionados

Figura 44 – Componentes de uma treliça metálica

Com base nesse esquema estático, considerando que o concreto resiste muito bem à compressão,
mas pouco à tração, Mörsch imaginou utilizar um material com elevada resistência à tração, o aço, para
complementar o trabalho do concreto nas regiões tracionadas, e criou o modelo que ficou conhecido
como a Treliça de Mörsch, ilustrado na figura a seguir.

Banzo comprimido Bielas comprimidas


concreto concreto

Banzo tracionado Montantes tracionados


aço - armadura longitudinal aço - armadura transversal

Figura 45 – Representação esquemática da Treliça de Mörsch

A partir desse modelo, torna‑se possível imaginar, conceber, definir e dimensionar qualquer estrutura
de concreto armado.

A concepção começa, em geral, pelas lajes, que constituem os pisos, nos quais habitualmente
vivemos, e os tetos, que nos protegem. As lajes se mantêm nos devidos lugares, suportadas por vigas,
que também suportam as paredes que nos abrigam das intempéries. As vigas, por sua vez, mantêm‑se
nos seus devidos lugares, suportadas por pilares.

Toda essa estrutura, representada na figura a seguir, deve ser definida, dimensionada e detalhada
para se manter em equilíbrio estático sobre o terreno, suportada pelas fundações da edificação.

50
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Figura 46 – Estrutura predial de concreto armado

A concepção é elaborada, principalmente, com imagens tridimensionais, obtidas da memória e da


imaginação de quem concebe. Os desenhos em três dimensões, no entanto, não são bons instrumentos
para transmitir informações técnicas, precisas e inequívocas como a engenharia necessita.

Para a etapa de definições e de detalhamentos, as imagens em três dimensões precisam ser traduzidas
em desenhos com duas dimensões, tais como plantas, cortes e vistas.

As plantas representam, em um plano horizontal, todos os componentes da estrutura, com suas


respectivas denominações e dimensões, como as ilustradas esquematicamente na figura a seguir.

Figura 47 – Representação em planta de lajes, vigas e pilares

Nesse desenho, L1, L2, L3, L4, e assim por diante, representam as lajes, também denominadas panos
de laje; V1, V2, V3, V4 etc. representam as vigas; e P1, P2, P3, P4 etc. representam os pilares. Quando
uma viga é contínua, isto é, quando se prolonga e é suportada por diversos pilares, cada segmento entre
dois pilares é denominado tramo e identificado por letras minúsculas em sequência, como: V4a, V4b,
V4c, V4d e V4e.
51
Unidade I

As plantas não são suficientes para transmitir todas as informações de forma inequívoca. Para
representar as formas, as dimensões e os níveis em plano vertical, são necessários os cortes, tais como o
corte A‑A, indicado na figura anterior e representado na figura a seguir.

Figura 48 – Representação da laje em corte

A partir de todas essas definições de formas, dimensões, níveis e dos respectivos apoios, torna‑se
possível definir o esquema estático de cada peça estrutural, bem como definir e dimensionar as cargas
que ela deverá suportar, esquematicamente representados na figura a seguir.

Figura 49 – Esquema estático da viga V4

Conhecendo o esquema estático, é possível imaginar as deformações que a peça sofrerá e identificar
as regiões em que ela estará submetida à tração ou compressão, exageradamente ilustradas na figura
a seguir.

Figura 50 – Deformações e fissuração da viga V4

Saiba mais

Há uma série de artigos referentes a limites estabelecidos para o controle


de abertura de fissuras em estruturas de concreto armado em serviço, bem
como referentes à proteção de suas armaduras de aço, em ambientes com
diferentes graus de agressividade, disponíveis em:
FRANCESCH, L. Limites normativos para fissuração em serviço. QiSuporte: 2018.
Disponível em: <https://suporte.altoqi.com.br/hc/pt-br/articles/115004581774-
Limites-normativos-para-fissura%C3%A7%C3%A3o-em-servi%C3%A7o>.
Acesso em: 5 jun. 2019.

O dimensionamento e o detalhamento da estrutura podem, então, ser iniciados. São calculados os


principais valores dos momentos fletores e dos esforços cortantes e, a seguir, desenhados os respectivos
diagramas, representados, nesse caso, pelas duas figuras a seguir.

52
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Figura 51 – Diagrama de momentos fletores para a viga em estudo

Figura 52 – Diagrama de forças cortantes para a viga em estudo

A partir desses valores, são definidas as posições e dimensionados os diâmetros e as quantidades


necessárias para a armadura de aço.

A armadura de aço, em geral, é constituída de peças longitudinais e transversais, que também devem
ser representadas em dois cortes da viga, um longitudinal e outro transversal, como ilustrados na figura
a seguir.

Figura 53 – Posicionamento das armaduras longitudinais e transversais

Todas as informações sobre o formato correto, o diâmetro, a quantidade e o posicionamento de cada


peça de aço são transmitidas por meio desses dois cortes verticais, que devem ser lidos e compreendidos
em conjunto.

Como em todas as representações gráficas utilizadas na engenharia civil, cada corte,


isoladamente, contém apenas parte das informações. Em conjunto, as informações se completam
de modo único e inequívoco.

A figura a seguir mostra outra viga, mais curta do que a anterior, apenas a bem da clareza, com a
representação completa da armadura de aço e todas as informações necessárias para a sua execução.

53
Unidade I

Figura 54 – Detalhamento das peças da armadura de aço

No primeiro corte, longitudinal, isto é, feito ao longo do eixo da viga, são representadas as barras da
armadura longitudinal, com seu formato e sua posição. Também são representados o posicionamento,
a quantidade e o espaçamento da armadura transversal, ou seja, dos estribos. Cada barra é redesenhada
fora do desenho da viga, acima ou abaixo desse corte, conforme a sua posição na viga, com a sua
identificação, a quantidade de peças, o diâmetro e os seus detalhes, como comprimento reto, dobras e
comprimento total.

No corte ao lado, transversal ao eixo da viga, são representados os estribos, com seu formato, suas
dimensões, seu diâmetro e comprimento. Também são representadas as informações complementares
sobre o posicionamento exato da armadura longitudinal.

Os dois cortes, com as respectivas indicações de cada representação, são ilustrados na figura a seguir.

Figura 55 – Especificações de cada peça da armadura de aço

54
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Observação

Com as especificações de cada peça da armadura de aço, é possível


cortar o aço, dobrar as peças e montar a armadura exatamente como ela
foi projetada.

É possível também calcular as quantidades de aço necessárias


por diâmetros, multiplicando os comprimentos de cada peça pela sua
quantidade e somando todos os valores de cada diâmetro.

Exemplo de aplicação

Segundo a definição da NBR nº 6118:2014 (ABNT, 2014), vigas são elementos lineares nos quais a
flexão é preponderante. Sua função é, basicamente, vencer vãos e transmitir as ações nela atuantes para
os apoios. Para tanto, as armaduras das vigas são, geralmente, compostas por estribos, chamados de
“armadura transversal”, e por barras longitudinais, chamadas de “armadura longitudinal”.

Considere a viga representada na figura a seguir e avalie as afirmativas (Enade 2014, Engenharia
Civil, questão 21, adaptada).

Figura 56

I – O diagrama de momentos fletores, que deu origem à armadura dessa viga, tem forma semelhante
à representada na figura a seguir:

55
Unidade I

Figura 57

II – O comprimento total de todas as barras de 12,5 mm utilizadas nessa armadura será de 26,25 m.

III – O comprimento total de todas as barras de 10 mm utilizadas nessa armadura será de 25,60 m.

IV – Sabendo que na parte em balanço dessa viga foram especificados sete estribos tipo N5, o
comprimento total de aço de 6,3 mm necessários para a armadura transversal dessa viga será de 41,60 m.

Com base nas afirmações anteriores, é correto o que se afirma em:

A) I, II, III e IV.

B) Apenas I, II e III.

C) Apenas I, II e IV.

D) Apenas I, III e IV.

E) Apenas II, III e IV.

Resolução

Resposta correta: alternativa D.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

A posição dos valores de momentos fletores nos diagramas indica as regiões da peça onde ocorrerão
as tensões de tração e, portanto, a posição em que devem ser colocadas as barras de aço para resistir a
tais tensões.

Observando a figura que representa a armadura da viga e comparando com a figura apresentada
para o diagrama de momentos fletores, verifica‑se que a maior quantidade de barras longitudinais se
concentra nas mesmas regiões que apresentam os maiores valores de momento fletor.

56
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

II – Afirmativa incorreta.

O comprimento total de barras de 12,5 mm é:

L = 3 × N3 + 2 × N4=3 × 7,25m+2 × 4,50m=30,75m

III – Afirmativa correta.

O comprimento total de barras de 10 mm é:

L = 2 × N1 + 3 × N2=2 × 7,40m+3 × 3,60m=25,60m

IV – Afirmativa correta.

O comprimento total de barras de 6,3 mm é:

L = 25 × N5 + 7 × N5=32 × 1,30m=41,60m

Resumo

Nesta unidade foi apresentado o caráter interdisciplinar das obras


de engenharia civil. Uma estrutura de concreto armado, por exemplo,
não é uma obra em si, mas apenas parte de um conjunto de atividades e
realizações que se destinam a um propósito.

A obra de engenharia civil pode ser destinada à moradia, ao trabalho,


aos cuidados com a saúde, à locomoção, ao suprimento de água potável,
à produção de energia elétrica, à cultura, ao entretenimento ou a uma
infinidade de outras necessidades ou aspirações humanas.

Em conjunto com os benefícios, no entanto, qualquer obra sempre causa


efeitos colaterais, positivos e negativos, que podem atingir proporções de
grande amplitude. Sendo assim, cada obra deve ser concebida, projetada e
construída sob um enfoque amplo, multi e interdisciplinar.

O tradicional processo linear, constituído de concepção, elaboração do


projeto e execução da obra, vem sendo substituído por um novo processo
cíclico e retroalimentado, no qual toda a concepção, o projeto e os sistemas,
os meios e os métodos construtivos devem estar definidos e, também,
aprovados por órgãos ambientais antes do início da obra.

57
Unidade I

Diante desse panorama, qualquer que seja sua área de especialização,


todo engenheiro civil precisa manter e aperfeiçoar seus conhecimentos
básicos referentes a todas as demais áreas da construção. Por fim,
foram vistos alguns dos principais conceitos básicos relativos a sistemas
estruturais, solos, fundações e estruturas.

Exercícios

Questão 1. (Enade 2014, adaptada) Os reservatórios têm por finalidade acumular parte das
águas disponíveis nos períodos chuvosos como forma de prevenir a falta de água nos períodos de
seca (estiagem). Um reservatório, sob o ponto de vista de sua forma, possui níveis e volumes d’água
característicos, bem como capacidade de reserva.

Com relação aos níveis e volumes dos reservatórios, avalie as seguintes afirmativas:

I – O nível de água máximo operacional de um reservatório corresponde à cota máxima permitida


para a operação normal do reservatório.

II – O nível de água mínimo operacional de um reservatório corresponde à cota mínima necessária


para a operação do reservatório.

III – O volume morto de um reservatório corresponde à parcela do seu volume total inativa ou
indisponível para fins de captação de água, compreendido entre o nível de água mínimo operacional e
o nível de água máximo operacional, que deve ser preservado para emergências.

IV – O volume útil de um reservatório corresponde ao volume compreendido entre os níveis de água


mínimo operacional e o máximo operacional, descontado o volume morto.

É correto o que se afirma em:

A) IV, apenas.

B) I e II, apenas.

C) III e IV, apenas.

D) I, II e III, apenas.

E) I, II, III e IV.

Resposta correta: alternativa B.

58
ENGENHARIA CIVIL INTERDISCIPLINAR

Análise das afirmativas

I – Afirmativa correta.

Justificativa: de acordo com Lopes e Santos (2017), o nível máximo é o máximo permitido para
o reservatório.

II – Afirmativa correta.

Justificativa: o nível mínimo operacional é o menor nível em que pode estar a superfície d’água
para a perfeita operação do reservatório. Vale lembrar que o ponto de captação está abaixo desse
nível, para evitar a formação de vórtices. Assim, embora exista água entre o nível mínimo e o ponto
de captação, esse volume faz parte do volume morto.

III – Afirmativa incorreta.

Justificativa: o volume morto é o volume de água encontrado abaixo do nível mínimo operacional.
O volume entre o nível mínimo e o nível máximo é o volume útil.

IV – Afirmativa incorreta.

Justificativa: o volume útil é o volume compreendido entre o nível mínimo e o nível máximo.
O volume morto fica abaixo do nível mínimo.

Questão 2. (Enade 2013) A figura mostra a área de influência direta do Aproveitamento Hidrelétrico
(AHE) de Belo Monte, delimitada em amarelo. As planícies aluviais existentes fora da calha do rio Xingu
estão representadas em vermelho, das quais 43% encontram‑se recobertas por florestas aluviais.
340000 360000 380000 400000 420000 440000

9660000 9660000

9640000 9640000

9620000 9620000

9600000 9600000

9580000 9580000
340000 360000 380000 400000 420000 440000

Figura 58

Adaptada de: <http://licenciamento.ibama.gov.br>.


Acesso em: 20 jul. 2013.

59
Unidade I

Considerando o contexto, avalie as seguintes afirmativas e a relação proposta entre elas:

I – As planícies de inundação mais significativas e com maior cobertura vegetal, na Área de Influência
Direta, encontram‑se nos afluentes da margem direita do Rio Xingu, sobretudo ao longo do Rio Bacajá.

PORQUE

II – Após a confluência do Rio Xingu com o Rio Bacajá, as planícies de inundação são mais escassas,
apresentando maior número na margem esquerda, na área do reservatório dos canais, e maior área nas
proximidades de Belo Monte.

A respeito dessas afirmativas, assinale a opção correta.

A) As afirmativas I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I.

B) As afirmativas I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa correta da I.

C) A afirmativa I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.

D) A afirmativa I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

E) As afirmativas I e II são proposições falsas.

Resolução desta questão na plataforma.

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