Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
e do Mobiliário
Autores: Profa. Ana Elena Salvi
Prof. Ricardo Granata
Colaboradoras: Profa. Patrícia Scarabelli
Profa. Tânia Sandroni
Professores conteudistas: Ana Elena Salvi / Ricardo Granata
Graduada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP) em 1976 e pela mesma
instituição fez o Mestrado e o Doutorado (em 2001 e 2006 respectivamente). Exerceu cargo de arquiteta e urbanista na
Secretaria de Obras e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, na Prefeitura do Município de São Paulo e em escritório
próprio. Iniciou carreira docente em 1987 na Universidade Católica de Santos (Unisantos) e, a partir de 1994, na
Universidade Paulista (Unip), na qual exerce o cargo de Coordenadora Geral dos cursos de Arquitetura e Urbanismo e
Design de Interiores, colaborando com a elaboração de material didático nessas áreas.
Ricardo Granata
Arquiteto e urbanista formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Fundação Álvares Penteado (FAAP)
em 1996. Possui mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP), em 2004. Docente, com
ênfase em tecnologia, em diversas instituições de ensino superior de Arquitetura e Urbanismo no estado de São Paulo,
bem como em cursos superiores tecnológicos de Design de Interiores, entre elas na Universidade Paulista (Unip). Atua
como arquiteto e é sócio-diretor de empresa de arquitetura com ênfase em projetos de Arquitetura e Urbanismo,
Design de Interiores e em gerenciamento de obras.
CDU 74
U501.47 – 19
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Jaci Albuquerque de Paula
Talita Lo Ré
Sumário
História do Design e do Mobiliário
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E O SURGIMENTO DO DESIGN..............................................................9
1.1 Indústria e design.....................................................................................................................................9
1.2 Organização industrial: primórdios...................................................................................................9
1.3 A organização industrial e sua expansão.................................................................................... 11
2 O INÍCIO DO DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL: O ARTS AND CRAFTS, O
ART NOUVEAU E O DEUTSCHER WERKBUND........................................................................................... 17
2.1 O arts and crafts.................................................................................................................................... 17
2.2 O art nouveau......................................................................................................................................... 20
2.3 O Deutscher Werkbund....................................................................................................................... 21
Unidade II
3 AS FUNÇÕES DO DESIGN.............................................................................................................................. 33
4 O MODERNISMO E O LAR............................................................................................................................. 35
4.1 Bauhaus..................................................................................................................................................... 37
4.1.1 As aulas na Bauhaus e os ateliers..................................................................................................... 40
4.2 Le Corbusier e o design de mobiliário na França..................................................................... 43
4.3 Cozinha de Frankfurt........................................................................................................................... 45
4.4 Design na Escandinávia...................................................................................................................... 47
Unidade III
5 HENRY FORD E O SISTEMA NORTE-AMERICANO DE MANUFATURA.......................................... 52
5.1 O lar norte-americano........................................................................................................................ 55
5.2 Henry Dreyfuss ...................................................................................................................................... 59
6 O DESIGN NO ENTREGUERRAS E NO PÓS-SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
NORTE-AMERICANO........................................................................................................................................... 61
6.1 Charles and Ray Eames....................................................................................................................... 62
Unidade IV
7 A CONTEMPORANEIZAÇÃO DO DESIGN................................................................................................. 71
7.1 O design italiano.................................................................................................................................... 71
7.2 Memphis e o design radical da irreverência............................................................................... 76
7.3 Dieter Rams e a Braun........................................................................................................................ 80
8 O DESIGN NO BRASIL..................................................................................................................................... 83
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO
Depois mostramos uma produção industrial de objetos, ainda na Europa, nas três primeiras décadas
do século XX, já transformada em relação às suas formas e materiais e, principalmente, quanto ao modo
de produção, inserido no contexto do modernismo.
Seguimos apresentando a maneira como a indústria de produtos para o cotidiano se desenvolve nos
Estados Unidos no pré segunda guerra mundial e no pós-guerra, o “sistema americano de manufaturas”
e o papel do design na indústria e no lar.
7
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Unidade I
1 A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E O SURGIMENTO DO DESIGN
O design surge e se consolida entre a segunda metade do século XVIII e o fim do século XIX, em meio
à Revolução Industrial, como resultante de três fatores básicos: sua ligação com a indústria, seu papel
como instrumento de reforma dos ideais e o desenvolvimento da estética mecânica (SPARKE, 2009,
p. 19, tradução nossa).
Alguns autores, como Cardoso (2008, p. 22-23), ainda o entendem, nessa análise da forma na qual
se transformou e se apresenta hoje, como um fruto da ocorrência de três processos concomitantemente
interligados, em escala mundial, entre os séculos XIX e XX: “a reorganização da fabricação e distribuição
de bens para abranger um leque cada vez maior e mais diversificado de produtos e consumidores”; “a
ampliação e adequação das concentrações de populações em grandes metrópoles, acima de um milhão
de habitantes”; e a globalização, na qual “a integração de redes de comércio, transportes e comunicação,
assim como dos sistemas financeiro e jurídico que regulam o funcionamento das mesmas”.
Ao longo do século XVII e logo no início do século XVIII, já havia uma organização institucional
de manufaturas ligada e, por bem dizer, controlada e financiada pela Coroa. Dessas instituições, que
atendiam às demandas da Coroa, destaca-se a de Gobelin, na França, como pode ser visto na figura a
seguir, com suas produções de tapetes, móveis e objetos, com destaque para a tapeçaria.
9
Unidade I
Podemos ver grandes séries que impõem uma nova divisão de tarefas no modo de produção, como
a confecção do modelo, o tingimento dos fios e a tessitura. Vale lembrar ainda que, no século XVIII,
a tapeçaria ganha ares de uma arte francesa, pois a partir do Renascimento e do “estilo novo”, as
tecelagens buscam representações e tonalidades aos modos da pintura.
Dessas organizações controladas pela coroa, como a de Gobelein, se destaca também, nesse período,
a de Meissen, na Saxônia, marcada pela pesquisa e produção de utensílios de porcelana. Exemplo desse
tipo de porcelana pode ser visto na figura a seguir.
10
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Por séculos e até o século XVIII, os fashionistas ricos da elite buscavam peças e objetos feitos à mão
que refletissem e mantivessem seu status na sociedade elitizada. Marceneiros como Thomas Chippendale,
George Hepplewhite e Thomas Sheraton eram os produtores de móveis que sanavam essas aspirações
dessa elite na Inglaterra. Esses móveis e os desenvolvidos na sequência – inspirados e motivados por eles –
podem até ser considerados as versões vitorianas e contemporâneas do estilo Luís XV e Luís XVI da França.
Observação
As produções de Luís XV e Luís XVI sucederam à produção de Luís XIV,
que, nas mãos do seu superintendente de construções, Jean-Baptiste
Colbert, eram consideradas o mais completo sistema de manufaturas reais.
Foi, portanto, Chippendale, que em 1754, trabalhando de forma exclusiva e individual para cada cliente,
publicou o livro intitulado The Gentleman and The Cabinet. Este, uma espécie de catálogo, apresentava e
ofertava os modelos de seus móveis, que eram previamente desenhados – algumas vezes por arquitetos,
como Robert Adam – e posteriormente executados à mão por seus artesãos. Foram seus modelos, esse seu
livro e sua movimentada loja em Londres que possibilitaram a divulgação extrema de seu trabalho, e com
isso a produção e venda de peças na maior quantidade possível. Esse seu “modelo de negócios” foi o que o
design e a indústria logo adotaram como práticas normais.
Observação
Robert Adam foi um arquiteto, decorador e designer de mobiliário na
segunda metade do século XVIII no Reino Unido, considerado por muitos
autores como o maior arquiteto da época. Adam foi o líder na retomada do
Neoclássico por volta de 1760 na Inglaterra.
11
Unidade I
Saiba mais
Assista ao vídeo “How To Spot a Genuine Thomas Chippendale”
(3:38 min.), sobre detalhes de um sofá original produzido por Thomas
Chippendale em 1765, com projeto de Robert Adam, para a sala da casa
de Sir Lawrence Dundas em Londres.
HOW TO SPOT whether it’s a genuine Thomas Chippendale. Christie’s.
Londres, 2018. Disponível em: <https://www.christies.com/features/How-to-
spot-a-genuine-Thomas-Chippendale-9281-3.aspx>. Acesso em: 21 dez. 2018.
Em 1804, Joseph-Marie Jacquard, como será visto mais adiante, trouxe uma grande contribuição à indústria
de seda em Lyon, com o desenvolvimento de um novo tear. Nos Estados Unidos, a manufatura moderna
progrediu já no final do século XIX, nas mãos de John D. Rockefeller, Andrew Carnedgie e Cornelius Vanderbilt.
Observação
Esse modelo de associação, criador-indústria, continua existindo até
hoje na produção fabril, em que o processo de projeto e produção de
um objeto exclusivo traz possibilidades ao consumidor de possuir itens
exclusivos, com maior valor agregado, contudo muitas vezes mais acessível
graças às atuais possibilidades tecnológicas de fabricação.
12
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Nesse momento da história, as atenções são dadas mais ao produto, design, do que ao criador,
designer. Sendo assim, o híbrido “artesão-designer”, ou aquele trabalho exclusivo, nessa altura, fora
substituído por uma equipe de manufatura desqualificada ou semiqualificada que operava parte de
um sistema dividido de trabalho, com processos de criação e moldagem, no qual diversas pessoas
estavam envolvidas. Na indústria da cerâmica, o trabalhador que preparava os protótipos era intitulado
modelador (modeller) e, na indústria têxtil, existia uma espécie de desenhista de padrões (pattern-
drawers), que, na verdade, desenvolvia infinitas variações de um mesmo tema. Esses profissionais ainda
deveriam trabalhar dentro das possibilidades oferecidas pelas máquinas, ainda que a tecnologia das
máquinas possibilitasse manter a complexidade dos desenhos. O tear da Jacquard foi praticamente o
precursor mecânico do computador, o que possibilitou a produção em massa.
Ainda, e também, na metade do século XVIII, a mecanização da produção já era impulsionada por
empreendedores, como o engenheiro Mathew Boulton e Josiah Wedgwood, na Inglaterra.
Para Boulton, “o produto industrial deveria ser diversificado em modelo e estilo, deixando a possibilidade
de opção por parte do consumidor final” e chegou a ter um estúdio dentro de sua empresa, servindo
13
Unidade I
de modelo para outros empresários (SPARKE, 2009, p. 31, tradução nossa). Mathew Boulton financiou
a máquina a vapor de James Watt. Manufaturava em grande escala, na sua fábrica, pequenos produtos
domésticos em metal, como pinças, paliteiros, tinteiros, correntes para relógios, dentre outros, que eram
chamados de “brinquedos” (toys), baseados em um livro de modelos, e eram modificados por uma tecnologia
específica de sua fábrica. Esse tipo de livro, que também já existia na Itália e na Alemanha no século
XVI, começa a ter grande importância e eram produzidos em larga escala graças aos novos métodos de
impressão mecanizada. Por volta de 1770, esses livros se tornaram catálogos, com uma função importante
de promoção nos pontos de venda, apresentando os produtos com o intuito de despertar o interesse e o
desejo no consumidor. “Boulton e Wedgwood entenderam bem o poder de venda da arte direcionada às
pessoas comuns da mesma forma como à elite” (SPARKE, 2009, p. 31, tradução nossa).
Josiah Wedgwood investia na experimentação e na melhora dos materiais. Um dos exemplos mais
marcantes de sua produção é a cerâmica Queen’s ware ou creamware, de 1763 (MORAES, 1999, p. 23‑24).
Figura 6 – Prato desenvolvido com a técnica Creamware, Queen’s ware, com transfer/impressão
em esmalte preto, de 1780-1790, por Josiah Wedgwood and Sons Ltd., pertencente ao V&A Museum (nº 2302-1901)
14
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Sendo assim, Wedgwood ainda trabalhava em duas esferas: a produção exclusiva para os consumidores
ricos e a produção em grande quantidade dos produtos funcionais, do dia a dia.
Lembrete
A industrialização começa a adentrar a Europa no fim do século XVIII, partindo para França, Alemanha
e Itália, impulsionada pelas ferrovias e locomotivas a vapor, e também para os Estados Unidos, com um
destaque aos produtos de vidros moldados, como a New Glass Company, em Boston.
No fim do século XVIII, a grande quantidade de fábricas abertas aumenta a procura pelos produtos,
o que acarreta um crescimento na quantidade de lojas abertas e também no número de vendedores
viajantes, fazendo com que a produção se amplie cada vez mais.
Os artefatos produzidos pelos artesãos tinham seu público. O comprador, em potencial, dos produtos
industrializados precisava vê-los na loja para comprá-los, dessa forma os designers tinham que tornar
os produtos desejáveis e visíveis.
Com isso, o projeto das manufaturas estava muitas vezes desassociado da forma de produção, da
sua manufatura, visando a atender o desejo dos consumidores, que outrora não tinham a oportunidade
de adquiri-los. A produção industrializada ficava cada vez mais dotada de uma superornamentação
ostentativa, para atender os novos consumidores e os novos ricos. Isso muitas vezes fugia dos ideais
mantidos na forma de produção dos artesãos, infringindo princípios como a “verdade dos materiais”
ou a “forma segue a função”, despertando a crítica por parte de reformistas como William Morris,
principalmente após a grande mostra de 1851.
Em 1851, com vistas mercadológicas dentro de um cenário de expansão industrial, se deu em Londres,
no Hyde Park, a Primeira Exposição Internacional – A Grande Exposição dos Trabalhos da Indústria de
Todas as Nações –, inaugurada em 1º de maio, com a duração de 140 dias, expondo trabalhos industriais
de todas as nações, divididos em quatro grupos: matérias-primas, produtos manufaturados, maquinaria
e “artes liberais” ou “mecânicas”. A exibição se deu no Crystal Palace, nome dado ao edifício construído
especificadamente para a exposição, graças à quantidade de ferro e vidro utilizado na obra, que foi
projeto de Joseph Paxton.
Joseph Paxton era um jardineiro construtor de estufas para jardim. Ao receber a incumbência
do projeto do Palácio de Cristal, adotou um processo construtivo inovador, a partir da produção dos
elementos estruturais em ferro produzidos industrialmente e da montagem desses elementos, com
o fechamento em vidro em apenas 15 dias. Na oportunidade, esse edifício não era considerado um
exemplo arquitetônico, mas a história da arquitetura o inseriu no rol das grandes invenções e inovações
do século XIX. Autores como Nikolaus Pevsner apontam para o início do desenho moderno exatamente
como sendo a construção desse pavilhão.
16
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
A exposição de 1851 foi o primeiro ensaio de uma série de eventos expositivos que
a cada “edição” arrastaria para o centro dos países europeus em desenvolvimento
o desejo de expandir seu comércio e travar contato, não apenas com
consumidores, mas com produtos até então desconhecidos. [As exposições são
muitas vezes associadas] ao aumento do comércio, mas ele não deixa explícito
como se daria o funcionamento entre uma coisa e outra. Para que as Exposições
Universais cumprissem seu projeto “mercantil” era preciso que elas fossem
também internacionais, sendo necessário, portanto, a integração de várias nações
de continentes diversos, naturezas diferentes e estágios de desenvolvimento
industriais variados (SANTOS, 2013, [s.p.]).
No final do século XIX, outro tema da aliança entre design e indústria surge quando da simplificação
dos objetos para sua inserção no mundo moderno, em contraste com a Inglaterra da era vitoriana,
colocado principalmente por Christopher Dresser e nas mãos de Peter Behrens, na Alemanha, e Frank
Lloyd Wright, nos Estados Unidos.
Três movimentos marcaram o início do desenvolvimento industrial: o arts and crafts, na Inglaterra; o
art nouveau, surgido em Glasgow, na Escócia, e desenvolvido em Bruxelas, na Bélgica, na segunda metade
do século XIX, sendo disseminado em diversas cidades europeias, mas inicialmente e principalmente em
Paris, Viena, Moscou, Berlim e Milão; e o Deutscher Werkbund, o terceiro movimento do processo de
industrialização, surgido em Berlim, na Alemanha, em 1907, indo para outras cidades alemãs, e da Europa,
até Londres, “berço da industrialização e do movimento Arts and Crafts” (MORAES, 1999, p. 23 a 31).
Lembrete
O movimento inglês intitulado de arts and crafts, ou artes e ofícios, trabalhava em defesa do
artesanato e em alternativa à mecanização e à produção em massa impostas pela indústria. De caráter
social, questionava o abuso da intensificação do trabalho nos avanços da indústria, desejando imprimir
os traços dos artesãos-artistas – que mais tarde se tornariam os designers (ARTS AND CRAFTS, 2018).
Trazia, então, já as primeiras tensões existentes até hoje, entre o design comercial, focado no consumidor,
e o design conceitual, com premissas sociais. Criticavam principalmente a produtividade anônima que
a Revolução Industrial disseminava e a baixa qualidade dos produtos industrializados, pregando o
17
Unidade I
retorno ao modelo anterior para manutenção da autenticidade da produção em série. Colocavam que
a decoração e o ornamento não deveriam estar ligados ao status social, como vinha acontecendo, mas
à definição das propriedades do objeto – na comunicação de suas funções. Defendiam a ética entre
consumo e produção. Teve à frente William Morris e foi influenciado pelo romântico John Ruskin.
O movimento teve influência sobre o art nouveau, e diversos autores o relacionam aos movimentos
seguintes, definindo-o como as raízes ou um protomodernismo no design gráfico, no desenho industrial
e na arquitetura. Alguns autores o consideram uma importante influência da Bauhaus, que assim
como os ingleses, entendiam que o ensino e a produção do design deveriam estar estruturados em
comunidades diminutas de artesãos e artistas sob a orientação dos mestres, cuja assinatura dos artesãos
teria um exaltado valor simbólico.
Observação
18
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Figura 10 – Tela bordada com moldura em mogno, desenhada por John Henry Dearle
e produzida por Morris & Co., em 1885-1910, pertencente ao V&A Museum (nº CIRC.848-1956)
William Morris foi um designer e escritor inglês que deu origem a diversos empreendimentos
comerciais e divulgou a importância do design. Sua primeira empresa foi aberta junto a sócios em
1861, produzindo objetos decorativos, azulejos, tapetes, vitrais e papéis de paredes, obtendo sucesso
nas décadas de 1860 e 1870, na decoração de igrejas, residências e edifícios públicos, com ênfase numa
estratégia de mercado que pontuava a qualidade e o bom gosto de seus produtos, desenvolvidos pelo
próprio Morris e também por artistas renomados da época.
Em 1875, após a dissolução da sociedade, Morris abriu sob sua própria direção a Morris e Company,
mantendo fabricações artesanais, sob a própria fiscalização de Morris, fabricações mecanizadas
em sua pequena fábrica e também estabelecendo parcerias com grandes indústrias terceiras.
Essa flexibilidade no modo de produção garantia que seus produtos tivessem diversos preços e não
fossem apenas artigos de luxo.
No fim de sua vida, Morris se dedicou à impressão de livros, o que o tornou expressivo no campo do
design gráfico, sendo que seu trabalho atingiu uma grande repercussão no final do século XIX e início
do século XX (CARDOSO, 2008, p. 79-80).
Saiba mais
MEMORIES of The Future: John Ruskin and William Morris. Dir. Michael
Dibb. Inglaterra. 1984. 108 minutos.
19
Unidade I
O art nouveau foi o segundo movimento importante no processo de industrialização. Como dito
anteriormente, apareceu na segunda metade do século XIX, em Glasgow, na Escócia. Desenvolveu-se
em Bruxelas, na Bélgica, e depois se estendeu para Paris, Viena, Moscou, Berlim, Milão e outras
cidades da Europa. O movimento surgiu em meio à uma alteração econômica, que partia da economia
tradicionalmente de base agrícola para o trabalho fabril. Essa alteração marcava o início do emprego no
setor terciário e o aumento relativo do contingente da classe média na Europa (MORAES, 1999, p. 26)
Nesse cenário, originou-se a ideia de se criar algo que promovesse a libertação dos estilos anteriores,
rompendo-se com o academicismo até então praticado e, portanto, libertando-se de estilos como o
greco-romano.
Surge então o art nouveau, proposto por arquitetos e artistas, como Henry van de Velde,
Emille Gallé, Arthur Heygate Mackmurdo, Hector Guimard, Paul Hankar, Victor Horta e Gustave
Serruirier-Bovy, voltados para a natureza, com inspirações orientais provenientes da China e do
Japão e também influenciados pela botânica, biologia e fisiologia.
Observação
O movimento art nouveau recebeu diversas denominações na Europa
em função de sua geografia. Como exemplo, na Áustria ou na Alemanha foi
conhecido como Jugendstil, na Itália como Liberty, até mesmo Arte Nova
em português.
Em concordância com o art nouveau, designers como Van der Velde buscavam transformar a
natureza em ornamentos, enquanto outros tendiam a reduzi-los a símbolos. A complexidade de Van
der Velde mostrou-se muito exigente e desenvolveu uma complexidade nos objetos projetados por ele,
com figuras menos puras, como curvas das plantas e do corpo feminino, propagaram-se de forma mais
abrangente no mundo industrializado.
Como o art nouveau era proposto como um estilo de industrialização mais fácil e necessária, em
virtude da corrente aglomeração vista nas grandes cidades europeias, lançavam mão de materiais de
mais fácil reprodução e/ou fundição, como o ferro, o vidro, o bronze, dentre outros, para que seus
ornamentos fossem comercialmente exploráveis. Dado que o movimento tinha a intenção da união
entre originalidade e utilidade, buscava, portanto, também representar o desenvolvimento da indústria
na época, atendendo às ânsias da burguesia por produtos de arte aplicada.
O movimento conseguiu, com um êxito marcante, que a arte fosse absorvida e acessada pela
população através da “arte impressa”, proporcionada pelos avançados meios de reprodução como a
litografia, como nos cartazes de Jules Chèret e Henry de Toulouse-Lautrec; veja figuras a seguir.
A arte levada à população tinha a intenção de elevar o nível cultural, através de um novo estilo
de inspiração coletiva de arte. Sendo assim, o art nouveau aparecia também como um representante
20
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
em arte e arquitetura de um novo estilo de vida compatível aos avanços e surgimentos dos bondes, da
fotografia, do metrô, das redes canalizadas etc. (MORAES, 1999, p. 28).
Como visto anteriormente, desde a primeira Exposição Universal de 1851, ocorrida na Inglaterra,
na qual vários países expuseram os produtos mais recentes da produção industrial da época, os
artistas ingleses William Morris e John Ruskin questionavam a produção industrial, pois para eles
os objetos produzidos dessa maneira não tinham a mesma qualidade dos produtos realizados
artesanalmente. Para eles, o artesão trabalhava com satisfação, ao passo que o operário fazia um
trabalho mecânico, sem o prazer que o trabalho artesanal podia conferir, isto é, era um trabalho
alienado. O arquiteto alemão Gottfried Semper também percebeu, nessa exposição, a inferioridade
dos produtos alemães, pois eram produzidos por meios mecânicos, sem o cuidado que um objeto
artesanal podia apresentar em seu acabamento.
Saiba mais
Para conhecer melhor a Exposição Universal de 1851 e o movimento
arts and crafts, leia o livro:
PEVSNER, N. Pioneiros do desenho moderno. São Paulo: Martins
Fontes, 2002.
Após a unificação da Alemanha, em 1871, entrou na pauta econômica e da política externa a melhora
da produção e a ampliação do mercado exportador.
21
Unidade I
Em 12 de maio de 1906, foi realizada a III Exposição de Artes e Ofícios Alemães, na cidade de
Dresden. Essa exposição trazia novidades quanto aos objetos expostos, pois os artistas ali presentes
tinham refutado acompanhar as formas do passado. O arquiteto Richard Riemerschmid apresentou pela
primeira vez móveis executados a partir da produção mecânica.
Mas somente em 1907, na cidade de Munique, na Alemanha, foi fundado o Deutscher Werkbund,
com a finalidade principal de melhorar a qualidade das mercadorias produzidas pela indústria
alemã para recuperar uma “cultura harmônica” perdida por causa dos processos de urbanização e
da industrialização. A proposta era associar os artistas e arquitetos, por um lado, e por outro os
empresários das indústrias, de modo a garantir a qualidade dos objetos produzidos industrialmente,
principalmente quanto à sua qualidade figurativa. O mentor e fundador do Deutscher Werkbund, o
arquiteto Hermann Muthesius, apoiava os arquitetos Hans Poelzig e Peter Behrens. No mesmo ano
da fundação do Deutscher Werkbund, Behrens alia-se à AEG (Allgemeine Electricitätsgesellschaft),
a empresa de eletricidade alemã. Projeta para essa empresa todos os artefatos produzidos, desde
lâmpadas, embalagens, comunicação visual, enquanto identidade corporativa, a primeira da história
do design (GEGNER; METZ, 2014, p. 24), e até o projeto arquitetônico do complexo industrial, bem
como o anúncio do produto acabado. A associação de doze artistas e de doze empresas tinha o intuito
também de tratar da educação da população a partir de objetos “bem” concebidos (GEGNER; METZ,
2014, p. 22). Entre os fundadores do Deutscher Werkbund estavam: Richard Riemerschmid, Joseph M.
Olbrich, Josef Hoffmann, Bruno Paul, Fritz Schumacher, Wilhelm Kreis, Peter Behrens, Theodor Fischer,
Paul Schultze-Naumburg, Adelbert Niemeyer, Max Läuger e J. J. Scharvogel.
Em 1911, no Congresso do Werkbund, o arquiteto Muthesius em seu discurso lança suas ideias para o
futuro do design alemão. Para ele, “a estética podia independer da qualidade material; introduziu a ideia de
padronização enquanto uma virtude, e da forma abstrata como base da estética do design de produtos”
(BANHAM, 1975, p. 101). Nessa oportunidade, jovens arquitetos ouviram-no e acabaram dando forma ao
design e arquitetura alemães do pós-guerra. São eles: Mies van der Rohe, Bruno Taut e Walter Gropius. Mas
entre os alemães encontrava-se também um jovem suíço, Charles Edouard Jeanneret, mais tarde conhecido
22
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
como Le Corbusier. “Tratava-se de infundir conteúdos intelectuais e artísticos nos produtos industriais, de
transformar conquistas técnicas em bens culturais através do design” (GEGNER; METZ, 2014, p. 28).
Saiba mais
O filme proposto permite conhecer o interior de uma casa de Le
Corbusier na América Latina, em especial na cidade de La Plata, Argentina.
O HOMEM ao lado. Dir. Gastón Duprat e Mariano Cohn. Argentina. 2009.
110 minutos.
Para o arquiteto Muthesius, a padronização significava o objetivo primordial para garantir a produção
mecanizada dos produtos industriais. Essa ideia gerou uma querela com o arquiteto Henry van de Velde,
que era contrário à padronização e defendia a liberdade e a individualidade do artista e do designer. Mas,
com o início da Primeira Grande Guerra em 1914 e a necessidade de atender à indústria bélica, ficou
comprovada a tese de Muthesius sobre a padronização e ficou criado o sistema DIN-Format (Deutsches
Institut für Normung).
Observação
O sucesso do Deutscher Werkbund nos primeiros anos de funcionamento fez eclodir em várias
cidades de outros países o mesmo tipo de organização; surge na Áustria, Suíça, Checoslováquia,
Hungria e até mesmo na Suécia. A organização alemã publicou diversos catálogos com os produtos
23
Unidade I
industrializados para divulgação junto à população, mas, principalmente, com a função educativa do
que seria uma “boa” forma.
A partir dos anos 1920, a premência habitacional na Alemanha era forte, em função da necessidade
da reconstrução do pós-guerra. Portanto o tema “habitação” passa a ser a principal pauta dessa década.
Assim, o Deutscher Werkbund propõe na cidade de Stuttgart um bairro novo com diversas tipologias
habitacionais. O planejador do bairro foi o arquiteto Mies van der Rohe e sua assistente Lilly Reich, em cuja
parte mais alta do terreno implantou o maior edifício em lâmina com quatro pavimentos. É nesse bairro
de Weissenhof, em Stuttgart, que Le Corbusier define os cinco pontos da arquitetura moderna. Os cinco
pontos da arquitetura formulados por ele são: edifício sobre pilotis (colunas), para liberar o terreno que
deve ser público; estrutura independente, isto é, as paredes não são mais estruturais; planta livre, isto é, a
planta passa a ser flexível, sua distribuição pode ser modificada; janelas horizontais e contínuas (em fita);
e, por último, terraço-jardim, como área de uso coletivo na laje de cobertura (não existe mais o telhado).
Saiba mais
Para maiores informações sobre as teorias e obras de Le Corbusier, leia
sua compilação completa de obras:
BOESIGER, W.; STONOROV, O. Le Corbusier: Complete Works (Oeuvre Complete)
in Eight Volumes. 11. ed. Basileia: Birkhäuser Architecture, 2006. (E-book)
24
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Nessas casas, havia uma nova relação dos móveis com o espaço – havia móveis projetados por
Ferdinand Kramer nas casas de J. J. P. Oud e Mies Van der Rohe e também móveis projetados pelo próprio
Mies Van der Rohe. O lema da forma sem ornamentos perdurou pelo menos até 1933.
Figura 16 – Edifício de habitação de Mies van der Rohe, no bairro Weissenhof, em Stuttgart
25
Unidade I
Figura 18 – Mobiliário de Weissenhof, projetado por Mies van der Rohe: Cadeira MR10 (1927)
Figura 19 – Mobiliário de Weissenhof, projetado por Mies van der Rohe: Cadeira MR20 (1927)
26
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Da mesma maneira, Hermann Gretsch trabalhou para a fábrica de porcelana Arzberg, cujos
produtos de algumas linhas, como a 1382 ou 1495, ainda são produzidas até hoje. Gretsch (apud)
entendia que:
27
Unidade I
Lembrete
28
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
Resumo
Exercícios
Figura 24
I – A tirinha tem como objetivo apontar a falta de originalidade no design das peças produzidas
industrialmente.
Porque
II – A tirinha critica a divisão do trabalho na linha de produção industrial, que provoca a alienação
do operário em relação àquilo que produz.
30
HISTÓRIA DO DESIGN E DO MOBILIÁRIO
I – Asserção falsa.
Justificativa: a tirinha sequer faz menção ao design. O objetivo do texto é criticar o modelo de linha
de produção.
II – Asserção verdadeira.
Justificativa: na linha de produção, há a divisão do trabalho, o que faz com que o trabalhador tenha
conhecimento de apenas uma fase do processo produtivo, como se vê na tirinha.
Figura 25
31
Unidade I
I – Pessoas na vida noturna da cidade e a divulgação de espetáculos eram temas comuns nos cartazes
de Toulouse-Lautrec.
III – Observam-se, no cartaz, elementos que caracterizaram a art nouveau, como a litografia, o
academicismo e a valorização da arte clássica.
A) Afirmativas I, II e III.
D) Afirmativa I, apenas.
32