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Percepção Visual: Teoria e

Psicologia das Cores


Autora: Profa. Ana Letícia Guimarães Garcia
Colaboradoras: Profa. Patrícia Scarabelli
Profa. Ronilda Iyakemi Ribeiro
Professora conteudista: Ana Letícia Guimarães Garcia

Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Uberaba (MG). Trabalhou em construtoras como
HM Engenharia (Grupo Camargo Corrêa) e MRV Engenharia, desenvolvendo estudos de implantação para novos
empreendimentos conforme a legislação urbana de cada município, além de projetos executivos atrelados ao mercado
imobiliário. Também elaborou e executou projetos de design de interiores dos decorados a serem lançados pela
empresa na região metropolitana de Campinas e proximidades, acompanhando a montagem junto aos fornecedores e
administrando os custos do setor.

Realizou o mestrado, também em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Campinas (Unicamp),


com foco no Distrito Industrial de Campinas e nas ocupações ilegais do entorno, comparando a qualidade dos
espaços urbanos das áreas analisadas. Posteriormente, enveredou, profissionalmente, pelo campo acadêmico,
atuando desde 2012 como professora na Universidade Paulista (UNIP). Na instituição, ministra aulas no curso
de Arquitetura e Urbanismo, tendo também participado da docência em Engenharia Civil e atualmente se
concentrando nos cursos de Arquitetura e Design de Interiores.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

G216p Garcia, Ana Letícia Guimarães.

Percepção Visual: Teoria e Psicologia das Cores / Ana Letícia


Guimarães Garcia. - São Paulo: Editora Sol, 2018.

168 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIV, n. 2-108/18, ISSN 1517-9230.

1. Teoria das cores. 2. Combinações harmônicas. 3. Contexto da


cor. I. Título.

CDU 659.123.2

U502.61 – 19

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
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Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Marcilia Brito
Elaine Pires
Sumário
Percepção Visual: Teoria e Psicologia das Cores

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................... 11

Unidade I
1 O CARÁTER FÍSICO DA COR (A NATUREZA DA COR).......................................................................... 13
1.1 O processo visual................................................................................................................................... 14
1.1.1 Mescla aditiva (cores-luz) e subtrativa (cores-pigmento)...................................................... 16
1.1.2 O espectro da luz visível........................................................................................................................ 21
1.1.3 Características da cor............................................................................................................................. 27
2 A TEORIA DAS CORES..................................................................................................................................... 30
2.1 Johannes Itten........................................................................................................................................ 32
2.2 Josef Albers.............................................................................................................................................. 36
2.3 Wassily Kandinsky................................................................................................................................. 40
2.4 Johann Wolfgang Von Goethe......................................................................................................... 42
2.5 Leonardo da Vinci.................................................................................................................................. 44
2.6 Karl Gerstner........................................................................................................................................... 45

Unidade II
3 NOMENCLATURA DAS CORES (FENÔMENO DO CROMATISMO)................................................... 51
3.1 Combinações harmônicas.................................................................................................................. 52
3.1.1 Trios harmônicos...................................................................................................................................... 53
3.1.2 Quartetos, quintetos e sextetos harmônicos................................................................................ 53
3.1.3 Acromático................................................................................................................................................. 54
3.1.4 Cores neutras............................................................................................................................................. 55
3.1.5 Cores monocromáticas.......................................................................................................................... 56
3.1.6 Cores quentes e frias.............................................................................................................................. 58
3.1.7 Cores complementares divididas....................................................................................................... 61
3.1.8 Cores análogas.......................................................................................................................................... 62
3.1.9 Cores análogo-complementares (duplo)........................................................................................ 63
3.1.10 Policromia................................................................................................................................................. 63
3.1.11 A árvore de Munsell (Modelo de cor tridimensional)............................................................. 64
3.1.12 Modelo CIE............................................................................................................................................... 66
4 FENÔMENOS DE CONTRASTE...................................................................................................................... 68
4.1 Contraste de tom.................................................................................................................................. 70
4.2 Contraste claro-escuro........................................................................................................................ 71
4.3 Contraste quente-frio......................................................................................................................... 72
4.4 Contraste de cor complementar..................................................................................................... 73
4.5 Contraste simultâneo.......................................................................................................................... 74
4.6 Contraste de qualidade....................................................................................................................... 75
4.7 Contraste de quantidade.................................................................................................................... 76

Unidade III
5 O CARÁTER SUBJETIVO DA COR................................................................................................................. 82
5.1 O contexto da cor................................................................................................................................. 82
5.1.1 A cor nas cidades..................................................................................................................................... 83
5.1.2 A cor na história, cultura e religião.................................................................................................. 85
5.1.3 A cor nas marcas, publicidade e estabelecimentos comerciais............................................. 88
5.1.4 A cor na mídia........................................................................................................................................... 93
5.1.5 A cor na música........................................................................................................................................ 95
5.1.6 A cor no gosto........................................................................................................................................... 97
5.1.7 A cor na moda........................................................................................................................................... 98
5.1.8 A cor na natureza.................................................................................................................................... 99
5.1.9 A cor na medicina..................................................................................................................................100
5.1.10 A cor na arquitetura...........................................................................................................................101
5.1.11 A cor na arte..........................................................................................................................................104
5.1.12 A cor no design de interiores......................................................................................................... 115
6 A PSICOLOGIA DAS CORES.........................................................................................................................119
6.1 Impressão psíquica das cores do espectro solar.....................................................................120

Unidade IV
7 AS FORÇAS PERCEPTIVAS...........................................................................................................................125
7.1 Percepção espacial..............................................................................................................................125
7.1.1 Percepção do espaço por meio da cor......................................................................................... 127
7.1.2 Percepção das texturas e dos materiais........................................................................................131
7.1.3 Percepção por uso e funcionalidade............................................................................................. 133
8 ILUMINAÇÃO....................................................................................................................................................135
8.1 Luz natural.............................................................................................................................................136
8.2 Luz artificial...........................................................................................................................................137
APRESENTAÇÃO

Este livro‑texto é voltado aos estudantes do curso de Design de Interiores EaD. Com uma sistematização
instrutiva e, ao mesmo tempo, ilustrativa, busca fornecer um conjunto teórico com repertório visual e
sugestões capazes de instigar as ideias de cada educando. Conhecimentos pertinentes à compreensão
das competências do designer e dispositivos capazes de auxiliá-lo no desempenho de suas tarefas serão
apresentados através de contribuições tangíveis à vivência profissional do aluno.

Associados a este embasamento, serão apresentados exercícios, referências bibliográficas


complementares e experimentações que incitem a criatividade perante a interpretação dos dados e o
encontro de respostas a problemas explicitados, pois a ampliação do acervo de memória que criamos
se torna base de consulta às produções futuras. Do mesmo modo que um indivíduo se torna mais
preparado para tomar decisões com o passar dos anos e a partir das experiências vividas, o profissional
também se torna mais experiente ao longo de sua carreira.

Portanto, conseguir entender e perceber as diferenças entre os trabalhos e conceitos existentes


sobre a temática do design no país e no mundo firma um registro que engrandece e enriquece o campo
de soluções individuais frente aos obstáculos do dia a dia da profissão. Para isso, este material irá
recorrer à interpretação de descobertas e análises metodológicas dos mais diferentes períodos históricos,
propiciando uma contextualização não limitada à ordem cronológica.

O papel do designer de interiores dentro do âmbito de formação é amplo. A gama de possibilidades


de atuação no mercado de trabalho é vasta e exige comprometimento de seus profissionais.
Há oportunidades voltadas desde a elaboração de espaços internos residenciais, comerciais, de
serviços e industriais até a concepção de cenários para novelas, ambientação de shows e peças de
teatro, por exemplo.

Reconhecer a área de interesse e trabalhar no que se deseja é uma bela e importante iniciativa.
Tenha em mente que sempre será necessário se atualizar e buscar novos conhecimentos. Impasses,
dúvidas e contratempos aparecerão. Saiba identificar suas potencialidades e deficiências, pois isso é
sinal de sabedoria. Que este livro-texto lance luz sobre dois pequenos, porém, importantes temas do
design: a teoria das cores e a percepção visual. Ao mesmo, espero que esta ferramenta seja um eficiente
canal de comunicação e revele um prisma de significantes informações sobre o assunto.

A cor é uma ocorrência fascinante. Dentro do domínio do que é visível, sua existência desempenha
incontestável magnetismo sobre nós, provocando estímulos, sensações e encantamento. Vivemos em
um mundo moldado pela influência da cor. Os que trabalham com imagem, produção de cenários e
comunicação visual sabem a pertinência deste tema como poderosa ferramenta de transmissão de
ideias, emoções e atmosferas. A cor capta a atenção do público de forma forte e expressa, sutil ou
progressiva, seja no projeto arquitetônico, cinematográfico, fotográfico ou de design.

No entanto, a complexidade de trabalhar com as cores é muito maior do que se pode imaginar. A
busca por combinações cromáticas que disponham de tons adequados para um contexto específico
continua a representar um grande desafio aos especialistas. Pois, se por um lado, é simples o
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interesse por esse assunto, por outro, aprofundar-se em seus fenômenos e relações torna-se um
trabalho muito abrangente, que engloba desde a fisiologia do nosso aparelho visual, a composição
química dos pigmentos, os estudos da física da luz até as questões de classificação das cores. Isso
sem reportar a outras linhas de raciocínio, como psicológicas e de assimilação ou de estética e de
associações simbólicas.

O maior obstáculo para os estudos da cor talvez seja a sua natureza efêmera, não podendo ser
considerada matéria (pigmento), já que depende da luz e dos nossos olhos para existir. A constatação
da sua instabilidade diante das oscilações da luz e das influências das superfícies vizinhas contribui para
criar uma sensação de insegurança em relação ao controle dos seus efeitos visuais.

Portanto, o objetivo geral deste livro-texto é discutir algumas das propriedades das cores e
qualidades da visão e, através disso, ajudar a revigorá-las e dirigi-las. É preciso treinar os olhos,
pois toda a visão se encontra no campo do psicológico, e ninguém ainda discutiu os processos de
criar ou experimentar arte, design e arquitetura sem falar de psicologia. Já o objetivo específico
deste tipo de estudo é desenvolver – através da experiência, por tentativa e erro – a percepção
da cor. O que se propõe é a busca de um íntimo diálogo capaz de auxiliar no encontro rumo ao
relativo caminho das cores.

As análises aqui propostas, como qualquer outro objeto de estudo, requerem um tipo de
conhecimento íntimo que só nasce através de um amor prolongado e de uma devoção paciente.
Dentre as nossas escolhas deve haver um equilíbrio entre razão e emoção, entre objetividade
e subjetividade. O tatear na incerteza é tão improdutivo quanto a cega obediência a regras.
É preciso achar a constância entre o intelecto e a intuição, entre a sensação e a razão, entre
a natureza da cor e a sua cor inexistente. Portanto, para estabelecer alguma ordem nesta rica
exuberância será primordial planejar e deduzir os princípios relacionados à percepção visual e à
teoria das cores.

Este livro-texto, em muitos momentos, não seguirá uma concepção acadêmica de teoria e prática.
A inversão dessa ordem colocará a prática antes da teoria. Exercícios demonstrarão, através do engano
cromático (ilusão), a relatividade e a instabilidade das cores. Ou seja, a experiência ensinará que, na
percepção visual, há uma discrepância entre o fato físico e o efeito psíquico.

Para não fugir à necessidade que criamos de sedimentar nossas ideias em um embasamento
teórico – afinal a prática não é precedida, mas seguida pela teoria – este livro-texto começará a
partir da óptica e fisiologia da percepção visual, assim como pela apresentação da física da luz e
do comprimento de onda. Todavia, tenha em mente que do mesmo modo que o conhecimento da
acústica não torna ninguém musicalmente apto – nem no aspecto produtivo, nem no da apreciação –,
também não há sistema de cores que possa, por si só, desenvolver a sensibilidade para a cor.

Com o intuito de criar uma sequência lógica e didática, este livro-texto aborda aspectos diferentes
sobre as cores, evidencia suas singularidades, como se relacionam, seus meios de representação e suas
possíveis aplicabilidades.

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Primeiramente, serão apresentados os seguintes itens de base teórica: descrição dos tipos de cores
que vemos e quais os mecanismos perceptivos que se devem levar em consideração para os fatos visuais.
Não se aprofundar nessa análise deixaria todo o existencial truncado e sem significado. Não há motivo
para que as cores visualmente apreendidas pelo olhar se desassociem daquilo que nos dizem. Essa é a razão
pela qual devemos constantemente percorrer entre os padrões percebidos e o significado que comunicam,
pois quando se considera formas e cores numa análise isolada, como um vácuo, isso nada mais é do que
um modo de evitar a arte. Não há razão para que as formas visuais se separem daquilo que elas nos dizem.

Portanto, serão feitas análises sobre os valores físicos e fisiológicos da cor. A abordagem da cor
se fará enquanto linguagem, como componente de uma pragmática da comunicação. Tudo isso será
apresentado a partir de um repertório enriquecedor de imagens de diversos estudos elaborados por
influentes pensadores e desenvolvedores da teoria das cores que hoje conhecemos, como Leonardo da
Vinci, Johannes Itten, Josef Albers, Goethe, Kandinsky, dentre outros. Múltiplos pontos de vista serão
focados e servirão de fonte de criatividade e de resultados de funcionalidade.

A teoria da cor que será apresentada, inicialmente, tenderá à construção de seu significado, com
resultados visuais objetivos e dentro de parâmetros pré-definidos. Essa linguagem independe de um
idioma, pois é universal. Alicerça-se através da física, química, geometria das cores etc. Se dá na
capacidade de elaboração de raciocínio lógico daquilo que somos capazes de perceber espacialmente.

Depois, abordaremos a sintaxe da cor, estudaremos as funções e relações entre a composição das
formas cromáticas complexas e atentaremos à constituição formal de unidades cromáticas superiores
à cor única. A constituição de formas cromáticas ocorre, convencionalmente, mediante as escalas
de intervalores de cor referenciadas ao sólido de representação de cores. Esses intervalos poderão
ser monocromáticos, análogos, complementares, análogos complementares duplos, complementares
divididos, policromáticos, de tríade de primários e secundários, de quartetos, quintetos ou sextetos
harmônicos, de cores neutras, quentes e frias, ou de fenômenos de contraste.

As estruturas cromáticas se consolidam mediante uma sistemática de análise dos elementos


dominantes, transitórios e de subordinação. Nessa fase, sedimenta-se uma teoria galgada a um processo
de agrupamento progressivo da forma cromática. Autônoma quanto a seu significado, recebe o nome
de forma cromática complexa.

Em seguida, propõe-se a busca em raízes históricas profundas sobre eventos, marcos que definem
um significado ou se agregam a um núcleo central de interpretação de uma cor. Não se esquecendo, ao
mesmo tempo, que esses valores simbólicos também se fundem à realidade biofísica e, a rigor, bebem
nela sua primeira e mais remota inspiração.

Portanto, estudaremos a semântica da cor. Em nível de análise da linguagem da cor, nos


ocuparemos do significado das formas cromáticas em sua entidade psíquica arbitrária e inerente.
A linha de arbitrariedade é a que configura a cor como símbolo, e a linha da inerência configura a
cor como signo propriamente dito. Geralmente, o fato de vivermos num mundo cheio de códigos faz
com que efetuemos leituras simbólicas da cor a todo instante seja através da publicidade, imagens de
outdoors, filmes ou imagens de TV.
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Os meios de comunicação, a nossa cultura, religião e política influenciam de tal modo o nosso
inconsciente que nos fazem dar às cores um significado já preestabelecido. Ir contra essa realidade
é muito difícil, mesmo quando nos damos conta desses fatos. Em oposição a essa corrente de
ideias já estabelecidas, nos direcionaremos a interpretações psíquicas das cores. Uma série de
sensibilizações as quais nos colocaremos em contato com o aspecto mais livre da cor, ou seja,
mais puro.

Naturalmente, não há como dissociar esses dois tipos de comunicação: psíquica ou vivencial. Cada
cor receberá um significado correspondente, mas é evidente que o encontro dos significados estará
atrelado aos diferentes sistemas sociais e culturais. Nessa linguagem das cores, que podemos denominar
como natural, uma única cor pode receber vários significados, assim como um mesmo significado pode
ser direcionado a várias cores.

Sendo assim, a utilização da linguagem simbólica da cor centra-se, sobretudo, nas sensações, como
apreciar uma música, uma obra de arte ou vivenciar cada elemento visual à nossa frente. As sensações
nos proporcionam um repertório de recordações, que formarão as únicas experiências com as cores.
Saiba que o plano simbólico das cores é muito particular, mesmo sofrendo a influência das interferências
externas de símbolos que se transformam numa velocidade vertiginosa diante de nossos olhos.

Por fim, iremos tratar da percepção visual: como as forças perceptivas se fazem dentro das
condicionantes vivenciadas pelo profissional de design de interiores. Elementos que relacionam o uso
das cores com a noção de ampliação, estreitamento, alargamento ou redução de um espaço serão
abordados. O emprego de texturas e materiais criando contextos de uniformidade e integração será
apresentado como recurso projetual que pode ir de encontro com a realidade das unidades habitacionais
produzidas no Brasil.

Os métodos de aplicação da iluminação vislumbrarão a conscientização do profissional quanto ao


poder que essa preciosa ferramenta representa nos projetos de design. A utilização dessa fonte em
áreas comerciais pode influenciar o fluxo de compras de uma rede de atacado, assim como pode criar
atmosferas de aconchego ou de repulsão em uma sala de estar.

Por fim, este livro-texto busca orientar um ciclo de estudos que, de forma natural, introduza uma
leitura de mundo, represente situações, questões, percepções e pontos de vista sobre determinados
conteúdos relacionados às cores. Este material visa a permitr que o futuro profissional de design
crie sua própria interpretação das cores, totalmente embasada em referências que regem o
processo de criação.

Que este livro-texto seja um registro de uma maneira experimental de estudar e ensinar cor, assim
como um convite ao florescimento do leitor. Que o material combine elementos-chave da teoria e da
prática da cor para fornecer não só um guia, mas também uma fonte de compreensão sobre o assunto
e desempenhe o papel de transmitir conhecimento com maestria.

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INTRODUÇÃO

Este material trata sobre a teoria das cores e a percepção visual e suas vertentes de representação,
desenvolvendo estratégias de catalogação das cores e de transformação de modelos cromáticos;
simultaneamente, insere conceitos sobre o ponto de vista da arte, design, arquitetura e religião,
capturando segmentos da produção cultural que possam se relacionar aos aspectos da produção e
interpretação das cores e buscando dar amplitude e profundidade à análise cromática, seja ela objetiva
ou subjetiva.

A cor, de pronto, sempre foi objeto de pesquisa quanto a seus elementos e suas interferências. Esta é
passível de análise através de teorias diversas, as quais podem ir da filosofia à psicologia, passando pela
fisiologia, física, estética etc. Ou seja, pode assumir um caráter mais abstrato e psicológico e ter uma
conotação técnica associada à física óptica e à química dos pigmentos.

Não foram poucos os que se propuseram a averiguar intensamente as cores, a visão ou a óptica. Se,
anteriormente, o estudo da cor era a inquietude de alguns artistas e filósofos, hoje ele é fundamental
a profissionais de diversas áreas, do maquiador ao designer, do cabeleireiro colorista ao organizador
de festas e eventos. Em diferentes estágios de complexidade, esses profissionais devem entender as
noções básicas da cor e desenvolver a capacidade de perceber suas interações e os efeitos das diferentes
combinações, enfim, precisam lidar com a cor como ferramenta importante em seu dia a dia de ofício.

Atualmente, com todos os meios de que dispomos, seja a computação gráfica, sejam os inúmeros
tons oferecidos pelas indústrias de tintas, dentre muitas outras melhorias, a função de combinar as cores
e de escolher os tons adequados para um contexto específico continua a representar uma grande tarefa.

Em nenhuma outra época a cor foi tão amplamente empregada como nos dias atuais. As grandes
indústrias de corantes e de iluminação tornam cada vez mais prósperas as possibilidades cromáticas por
meio de novidades nas tintas sintéticas, plásticas e acrílicas. Simultaneamente, no emprego estético,
as cores surgem com novas especialidades na comunicação visual. As mensagens dos mais variados
tipos, sempre mais coloridas, inauguram uma era cultural em que a luz alucinante e psicodélica dos
aglomerados urbanos parece ter como único objetivo a poluição visual.

Mas esse desregramento no uso da cor nasce de fatores sociais e não estéticos. Cada propaganda,
cada anúncio luminoso, cada vitrine, cada imagem colorida de TV e até as vestimentas de um bombeiro,
de um enfermeiro ou de um político são longamente estudadas em seus contrastes e harmonias de
cores. O que não impede que o conjunto visual da maioria das cidades, por falta de planejamento
cromático, possa dar a ideia de um imenso caos aterrorizante.

O mais inesperado em tudo isso é que sempre que alguém, em qualquer lugar, por qualquer motivo,
toma um lápis para colorir uma folha em branco, seu espírito utiliza consciente ou inconscientemente
o resultado de escolhas e opções remotamente preparadas para este instante fascinante. Cada cor traz
consigo uma extensa história.

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PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Unidade I
1 O CARÁTER FÍSICO DA COR (A NATUREZA DA COR)

Yuri Gagarin, em 12 de abril de 1961, foi o primeiro homem a orbitar a Terra, o que propiciou para
a União Soviética os créditos diante da corrida espacial. Este feito, futuramente, abriria caminhos para
novas descobertas espaciais, por exemplo, a viagem para a Lua e as análises do solo de Marte. Porém,
mais do que o ocorrido, um dos eventos de maior importância na história da humanidade, o que nos
interessa, neste momento, é a frase que marcou a visita espacial de Gagarin.

Diante da vista, o homem de 27 anos proferiu o seguinte comentário: “A Terra é azul”. Essa foi a
descrição de Gagarin sobre a primeira visão que teve do nosso planeta, de fora dele. A frase, eternizada
como a reação mais espontânea do homem diante da magnitude deste novo prisma obtido, nos revela
muito sobre a teoria das cores. E é a partir desse ponto de vista, no qual compreendemos a cor como
propriedade ou como qualidade natural das coisas, que iniciaremos nossas análises.

Figura 1 – Vista da Terra

Apesar da exclamação de Yuri Gagarin, a cor não tem existência material. Ela é, tão somente,
uma sensação provocada pela ação da luz sobre o órgão da visão. Epicuro, há mais de 2.300 anos,
desenvolvendo o raciocínio de que “a cor guarda íntima relação com a luz, uma vez que, quando falta luz,
não há cor”, afirmou que a coloração dos objetos varia de acordo com a luz que os ilumina, concluindo:
“os corpos não têm cor em si mesmos” (PEDROSA, 2009, p. 19).

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Unidade I

1.1 O processo visual

A visão representa uma das preciosidades que o homem recebeu da natureza. É um dos sentidos
que nos faz vibrar, pensar, gozar e desfrutar as coisas do mundo que nos rodeia. Os olhos, através
dos quais se processa a visão, constituem os órgãos de ligação entre o mundo interior do homem e o
mundo exterior que o circunda. Essa ligação, como já mencionado, somente se realiza quando há luz.
Portanto, ela é a grande intermediária entre a natureza e o homem, pois representa todos os detalhes
à percepção do ser humano numa multifacetada gama de sensações visuais coloridas ou não.

Para entendermos como a percepção visual funciona, iniciaremos com a teoria do funcionamento
da visão humana. Nossos olhos abrangem uma área pouco inferior a 180° ao redor do nosso corpo.
O nosso aparelho visual recebe a imagem das coisas exteriores em forma invertida, na retina; essa
inversão muda automaticamente quando alcança o cérebro, através do nervo óptico, ficando assim
endireitada a imagem no centro visual do cérebro.

Imagem Imagem correta


invertida no cérebro

Figura 2 – O funcionamento do nosso aparelho visual

Na parte da frente de nosso olho encontra-se a íris, que funciona como diafragma, limitando os raios
luminosos que penetram em seu interior para atingir a retina. A superfície da retina é composta de duas
áreas distintas: a central, denominada fóvea retiniana, e o nervo óptico. A primeira é formada por cerca
de 7 milhões de fibrilas nervosas, denominadas cones, responsáveis pela visão em cores.
Luz

A luz é o estímulo

A sensação é a cor

Figura 3 – Ao atingir o córtex occipital, na parte posterior do cérebro, os efeitos da luz provocam a sensação de cor

A parte da retina que circunda a fóvea é constituída por cerca de 100 milhões de bastonetes,
sensíveis às imagens em preto e branco. No centro da retina se encontra o nervo óptico, responsável
pela transmissão ao cérebro das sensações captadas pelos cones e bastonetes.
14
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Observação

No interior da retina, um arranjo de células processa as informações


dos fotorreceptores (bastonetes e cones). O número relativamente baixo de
cones azuis exerce, proporcionalmente, na visão uma reação à cor.

Figura 4 – Esquematização da retina humana. Ao centro está a fóvea retiniana


(azul, amarelo, vermelho e verde) sensível às cores. A sua volta estão os
bastonetes, responsáveis pela visão em preto e branco. O pequeno círculo
branco central corresponde à localização do nervo óptico

Bastonetes
Cones

Células horizontais
Células bipolares
Células amácrinas

Células ganglionares

Figura 5 – Interior da retina e seu complexo de células fotorreceptoras

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Unidade I

1.1.1 Mescla aditiva (cores-luz) e subtrativa (cores-pigmento)

Quando a luz atravessa a pupila e o cristalino, atingindo os cones e bastonetes que compõem
a fóvea e a mácula da retina no fundo do olho, ocorre a decomposição do feixe luminoso em três
grupos de comprimento de onda que caracterizam as cores-luz (visão tricromática): vermelho, verde e
azul‑violetado, cor esta cuja melhor denominação, em português, é índigo. Não existem cones específicos
para a percepção do amarelo. Essa cor só é percebida pela sensibilização simultânea dos cones vermelhos
e verdes. Em cor-luz o amarelo é uma cor secundária, ou seja, mistura de duas primárias.

Córnea Fóvea
Cristalino
Luz
Pupila
Humor aquoso Nervo ótico

Íris

Humor vítreo

Figura 6 – Esquema do olho e incidência de luz

No início do século XIX, Thomas Young, postulador da teoria da visão tricromática, percebeu que um
infinito número de partículas seria necessário para cobrir totalmente o espectro de cores. Mas, como
isso, obviamente, não seria possível às propriedades dos olhos, o físico descobriu que os receptores
deveriam, como mencionado, ser sensíveis a apenas um número limitado de cores.

A partir daí, ele identificou a combinação das três cores primárias da luz que são capazes de recriar
todo o espectro e recebem a denominação, atualmente, de mistura aditiva.

Começando pela ausência de luz (escuridão), a luz de cada cor primária é adicionada para produzir
progressivamente tons mais leves, variando a proporção para criar cores diferentes. Misturando igual
quantidade de cada uma das cores primárias, obtém-se luz branca. É possível notar a mistura aditiva em
ação na TV, na tela do computador ou do cinema, por exemplo.
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PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Azul

+ = Amarelo

Verde

Azul

Azul

+ = Magenta Verde = Branco

Vermelho +
Vermelho
Verde

+ = Ciano

Vermelho

Figura 7 – A cor é reconstruída pelos olhos e pelo cérebro humano a partir de três estreitas bandas
de comprimento de onda a que os cones fotorreceptores da retina são sensíveis

O verde e o vermelho, em proporções iguais, produzem o amarelo; o vermelho e o azul, o magenta;


e o verde e o azul produzem o ciano. Combinando as três cores iniciais, igualmente, obtém-se um cinza
neutro, que, quando muito brilhante, é branco.

Figura 8 – Mistura aditiva (modelo RGB – cores-luz primárias)

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Unidade I

Embora ainda não tenhamos um modelo completo da forma pela qual a informação da cor é
processada pelo olho e pelo cérebro, testes mostram que um “processo complementar” também está
funcionando. Nos anos de 1870, Ewald Hering estudou a impressão subjetiva da cor. Ele ressaltava que
o amarelo, que se supõe ser produzido por uma combinação de vermelho e verde, é, de fato, percebido
como uma cor elementar, não como um verde avermelhado ou um vermelho esverdeado, pois não
temos condições físicas de visualizar tais combinações.

Na prática, podemos comprovar sua teoria com uma atividade simples. Pegue uma caixa de lápis de
cor e misture o vermelho com o verde. Esta combinação não nos dará como resultado o amarelo (cor
esta que vimos, anteriormente, ser resultado da mistura de cores-luz verde e vermelha). A mescla das
camadas de cor dos lápis irá produzir um marrom cor de lama.

Essa teorização fez Hering rejeitar o modelo tricromático em favor de um sistema de sensações
de quatro cores: amarelo, vermelho, azul e verde, além do preto e branco. Pesquisas subsequentes
mostraram que tanto a teoria tricromática como a teoria do processo complementar está correta. Elas
se ocupam com o que acontece em estágios diferentes do processo visual no olho e no cérebro. Assim,
os sistemas de cor baseados nos dois modelos ainda são usados por cientistas, artistas, ilustradores e
designers, cada qual com seu propósito. Porém, por que isso ocorre?

É preciso entender que o processo complementar está relacionado à cor enquanto pigmento. Já
a teoria de Young é referente às cores enquanto luz. Ou seja, quando a luz bate em uma superfície
pigmentada, alguns comprimentos de onda são absorvidos e outros refletidos. Os comprimentos de
onda refletidos é que determinam a cor que vemos.

O mesmo acontece com o experimento dos lápis coloridos e suas sobreposições de camadas
(vermelho e verde, que não originaram o amarelo). As cores existentes nas minas dos lápis de cores se
tratam de cores-pigmento. E, as cores como são percebidas pelo olho humano são cores-luz.

Sendo assim, o que classificamos como tinta vermelha é a superfície que absorve todos os raios
verdes e azuis da luz incidente e reflete, para os nossos olhos, onda de luz vermelha. Continuando, a
superfície verde absorve os raios vermelhos e azuis, refletindo os verdes. A superfície azul absorve os
raios vermelhos e verdes, enviando para os nossos olhos os azuis. O preto, absorvendo todos os raios
luminosos, não envia nenhuma luz para os nossos olhos.

18
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Luz branca

Luz branca
Luz branca

Luz branca

Figura 9 – Superfícies com suas cores-pigmentos e a absorção ou reflexão de cores-luz

As cores-pigmento podem ser opacas ou transparentes e são misturas subtrativas. As cores-pigmento


básicas subtrativas opacas são: o amarelo, o vermelho e o azul. Cada uma delas reflete dois terços do
espectro e absorve um terço. O azul, por exemplo, reflete a zona relativa ao azul e ao verde, mas absorve
o vermelho. A parte absorvida de luz corresponde sempre à cor complementar, já que a parte refletida e
absorvida formam a luz branca.

19
Unidade I

Luz refletida Luz refletida Luz refletida

Luz absorvida Luz absorvida Luz absorvida

Figura 10 – Relação de cores absorvidas e refletidas, conforme pigmentação de superfície

Portanto, as cores-pigmento opacas (vermelho, amarelo e azul) são cores que, na mistura aditiva,
constituem cores compostas pela soma de duas luzes primárias.

Figura 11 – Mistura subtrativa opaca (cores-pigmento opacas)

Já as cores de superfícies produzidas pela propriedade de alguns corpos químicos de filtrar os raios
luminosos incidentes, por efeitos de absorção, reflexão e transparência, são comumente encontradas
nas aquarelas, nas películas fotográficas e nos processos de impressão gráfica em que as imagens são
produzidas por retículas e por pontos nos processos computadorizados. Esse sistema é denominado
mistura subtrativa transparente.

A mistura das cores primárias, em igual quantidade, também gera o preto. O que difere da outra
mescla subtrativa é que suas cores primárias são: magenta, ciano e amarelo. Sua demonstração
teórica e sugestão de inclusão às duas consagradas publicações de misturas partiu de Israel
Pedrosa, em 1956.

Por que, então, essa teoria foi apresentada bem depois e não foi seguida pelos pintores e artistas
de épocas passadas? Uma razão é a disponibilidade de pigmentos adequados. As tradicionais cores
20
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

primárias vermelho, amarelo e azul estão disponíveis há muito tempo, enquanto o magenta e o ciano
são mais difíceis de encontrar. Outra hipótese é a de que o vermelho e o azul parecem ser cores mais
fortes e mais úteis, em si próprias, do que o magenta e o ciano.

Entenda melhor a dificuldade em obter o ciano e o magenta com a seguinte explanação do passo
a passo de misturas de cores necessárias para a definição destas variações cromáticas: o acréscimo
de pigmento branco a qualquer cor-pigmento opaca aumenta imensamente o leque de impressões
possíveis de uma cor. A partir desta amplificação da paleta de uma determinada cor-pigmento foi
possível ter a existência do azul-claro (mistura de branco com azul). Em estudos posteriores, a cor
azul‑clara recebeu um toque de amarelo cujo resultado produziu o ciano.

Percebe-se, portanto, que a mistura subtrativa opaca mais o branco em pigmento resulta em cores
da mistura subtrativa transparente. Este caminho exigiu bem mais análises e manipulações do que o das
misturas subtrativas opacas.

Figura 12 – Mistura subtrativa transparente (cores-pigmento transparentes)

Logo, baseado na explanação sobre cor-luz e cor-pigmento, é admissível de aceitação o fato de


que os raios luminosos são porções de energia solar que atingem um objeto e que, consequentemente,
são refletidos em todas as direções. Dependendo da quantidade de luz que penetre em nossos olhos,
veremos as coisas iluminadas, muito iluminadas ou escuras.

1.1.2 O espectro da luz visível

Os efeitos luminosos, constituídos por radiações eletromagnéticas, são porções de energia solar que
nos fazem perceber o mundo exterior. Temos ainda raios diferentes da energia solar, que se identificam
como: ondas de rádio, ondas de televisão, ondas de raios X, raios infravermelhos, raios ultravioletas e
raios cósmicos.

Sendo assim, o espectro eletromagnético é um campo vastíssimo de ondas, das quais apenas
algumas são percebidas pelo olho humano. O que caracteriza e diferencia cada uma dessas ondas
é seu comprimento. A luz branca proveniente do Sol ou então de outra fonte de luz artificial é o

21
Unidade I

resultado da radiação eletromagnética dentro de comprimentos de ondas que se situam entre 400 e
800 nm (nanômetros).

Cada faixa de comprimento corresponde a uma luz de determinada cor. A variação é contínua, mas,
convencionalmente, admite-se a seguinte caracterização: o vermelho possui um comprimento de onda
de 630 nm; o laranja, amarelo, verde, azul e violeta, respectivamente, possuem comprimentos de onda
de 590 nm, 570 nm, 500 nm, 450 nm e 380 nm. Os raios que estão além dos 800 nm são chamados
infravermelhos, e os que se distanciam menos de 400 nm são os ultravioletas. Ambos não são percebidos
pela visão humana.
Radiação solar

Raios infravermelho
radiocomunicação

Luz visível

Raios ultravioleta
Ondas usadas em

Raios cósmicos
Raios X

Espectro eletromagnético

Figura 13 – Da imensa área de radiação solar a vista humana alcança apenas uma pequena faixa compreendida
entre os raios infravermelhos e os ultravioleta, cujos limites extremos são, de um lado, o vermelho, com
700 mµ (milimícrons) e, do outro, o violeta, com cerca de 400 mµ de comprimento de onda

Os raios ultravioleta possuem comprimentos de onda que variam de 300 a 400 nm, contendo todo
o seu poder químico e bactericida. São utilizados na medicina para descobrir alimentos alterados ou
estragados. As radiações ultravioleta são responsáveis pelas queimaduras da pele, quando o indivíduo
se expõe muito tempo aos raios intensos do Sol. Já os raios infravermelhos possuem comprimentos de
onda que variam de 800 a 3.000 nm, dos quais resulta toda sua ação radiante e seus efeitos térmicos.
Por exemplo, os raios utilizados em radares para captura da velocidade de um automóvel.

As cores, dessa maneira, são classificadas conforme a capacidade de cada indivíduo reconhecê‑las,
quando se tratam de órgãos visuais sadios. Quando essas cores são produzidas por disfunções ou
enfermidades, passam a pertencer ao rol das cores patológicas.

Os elementos cones, de um olho normal, são chamados de L, M e S. Os três, na ordem citada,


reconhecem, principalmente, os comprimentos de onda longos (vermelho), médios (verde) e os
curtos (azul). A maior parte das deficiências na visão da cor afetam os cones L ou M, sendo as
22
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

anomalias mais severas causadas pela ausência total de um tipo de cone. Todas estas deficiências
são denominadas dicromatismo, pois permanecem apenas em dois receptores de cor.

Se o cone L é acometido, o problema é classificado como protanopsia; se o cone M é acometido,


o nome recebido é deutanopia (ou deuteranomalopia). A tritanopia, ou inexistência do cone S, é
extremamente rara, assim como a acromatopsia, a completa incapacidade de perceber a cor.

Esses tipos de inaptidão visual são mais frequentes nos homens do que nas mulheres.
Aproximadamente oito por cento de todos os homens possuem algum tipo de deficiência na visão
das cores, enquanto nas mulheres a ocorrência fica por volta de meio por cento. O acometimento
dos cones L e M é conhecido como defeito vermelho-verde, já que há a redução na habilidade
em distinguir estas duas cores. A rara ausência do cone S algumas vezes chamada de defeito
azul‑amarelo, torna difícil diferenciá-las uma da outra.

Figura 14 – A percepção de um jardim de flores

Alguém com protanopsia veria os tons mais azuis nas flores roxas, e não veria o vermelho; as flores
vermelhas se tornariam verdes como as folhas, com tons mais escuros. Alguém que tivesse deutanopia
também não veria o vermelho. Para essa pessoa, as flores vermelhas pareceriam amarelo-esverdeadas
– mais vivas que no caso anterior, mas ainda apenas alguns tons mais claros que as folhas – enquanto
as flores roxas pareceriam azuis.

Alguns métodos permitem revelar as doenças da visão. A seguir, apresentaremos exemplos simples
de testes que um indivíduo pode realizar para identificar, ou não, sua capacidade de percepção de certas
cores. Os testes para daltônicos são usados normalmente para identificar defeitos vermelho-verde.
Mostram-se aos pacientes imagens com números, por exemplo, pedindo-lhes que identifiquem nelas os
numerais obtidos com pontos de várias cores. Os portadores de visão de cor anômala podem não ver o
desenho. Certas doenças, entretanto, ocorrem à medida que se envelhece. A perda de sensibilidade ao
azul, devido a uma alteração química do cristalino, é uma destas situações. Um adulto discerne menos
tonalidades do azul do que uma criança.
23
Unidade I

Figura 15 – Testes Stilling-Hertel adotados por oftalmologistas para conhecer as deficiências


na percepção visual das cores de seus pacientes

A cegueira e a deficiência visual às cores se devem sempre a um funcionamento anormal dos


cones. Um dos defeitos visuais que algumas pessoas apresentam é a cegueira noturna, que está
associada à carência de vitamina A no organismo. Mas é importante entender que o olho humano,
de modo geral, já funciona mal com pouca luz, por isso em tais condições os bastonetes assumem a
função de perceber as cores. O resultado disto é que os bastonetes não distinguem os comprimentos
de onda, então a visão se torna monocromática, criando o mundo visual azul-esverdeado que
associamos à noite.

Com relação ao mundo animal, apesar das inúmeras experiências desenvolvidas em vários
laboratórios no mundo, ainda temos um conhecimento relativo sobre suas percepções de cor. Como a
fisiologia deles é diferente, eles não veem as cores da mesma forma que nós. Muitas vezes, se afirma
que os cães enxergam em preto e branco, mas isso não é rigorosamente verdadeiro. Enquanto a visão
humana é tricromática, os cães e a maioria dos mamíferos possuem visão dicromática. Isso significa
que não podem distinguir algumas cores, como os indivíduos com daltonismo severo. Os roedores são
acromatópticos, completamente daltônicos.

Alguns insetos noturnos podem identificar as cores. Peixes, aves e répteis possuem boa
visão delas. Libélulas e abelhas, por exemplo, enxergam de longe as cores das flores desejadas.
As mariposas‑elefantes, com seus três receptores, divididos em azul, verde e ultravioleta, conseguem
perceber flores artificiais amarelas e azuis por um processo de seleção que inclui tons de cinza.
Porém, até o momento, não é possível avaliar em que ponto se encontra e em que medida resulta a
evolução visual dos animais. O registro que aqui se faz é simplesmente para destacar o quão curioso
é o modo de percepção das cores no mundo animal.

Qualquer coisa que provoque uma reação em algum órgão do sentido é um estímulo. Quando um
indivíduo responde a um estímulo determinado é porque o discriminou entre outros. Os estímulos
visuais têm características próprias, como tamanho, proximidade, iluminação e cor. Conhecer
essas propriedades é de fundamental importância aos que se valem da relação com o mundo
exterior. As explicações a seguir estão relacionadas com as cores: como elas funcionam e como
as compreendemos. Para isso, alguns estudiosos são apresentados com a missão de continuar nos
auxiliando no entendimento do assunto.

24
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Depois de desenvolver a lei da gravitação universal, Isaac Newton (1642-1727) se interessou pelas
teorias da luz e da cor. Em 1665, Newton realizou seus experimentos com prismas e refração de luz;
atividade esta em alta pelos cientistas do século XVII. Diferentemente do que a maioria dos pesquisadores
vinha supondo, que o prisma colore a luz, Newton mostrou que o prisma estava dividindo o feixe de luz
que o penetrou em cores do arco-íris.

A teoria de Newton explicou ainda a reflexão e refração da luz, assim como o aparecimento de
sombra. As propriedades refratoras de vários corpos já eram de conhecimento da humanidade desde a
Antiguidade. Todavia, coube a Newton, em 1959, desmistificar que o surgimento das cores do espectro era
fruto da propriedade do corpo refrator, mudando a cor da luz. Apoiado em seus êxitos de investigações
sistemáticas, Newton pode concluir que um prisma não muda a cor branca, mas a decompõe, ou seja, a
luz que adentra o prisma, ao sair, é dissociada em suas partes mais simples. Além disso, Newton seguiu
o estudo e percebeu que os raios luminosos constitutivos da luz branca, ao atravessarem um segundo
prisma, agora investido, recompõe a luz branca original.

Figura 16 – Refração do raio de luz branca

Demonstrando que a dispersão resultava da variedade de graus de refração das faixas coloridas que
compõem a luz branca, ele possibilitou a entrada das manipulações e aferições da refração no domínio
dos conceitos objetivos. Nas primeiras experiências, Newton colocou um prisma de vidro interceptando
um raio de sol que entrava num quarto escuro, produzindo as cores do espectro solar. Essa dispersão
da luz pelo prisma já havia sido produzida intencionalmente por outros experimentadores – esse tipo
de experimento estava sendo amplamente estudado pelos pesquisadores da época –, mas Newton foi o
primeiro a realizar a experiência adicional de recombinar as cores do espectro por meio de um segundo
prisma invertido. O fato de a luz branca ter sido produzida pela recombinação levou-o a concluir que
todas as cores do espectro estavam presentes no raio de sol.

25
Unidade I

Figura 17 – Cores do espectro solar decompondo-se e recompondo-se

Na experiência de Newton, vemos que a luz, ao atravessar o prisma que a decompõe, é refratada
em raios de cores que formam o espectro. Nessa refração, é possível observar que as ondas de maior
comprimento, as vermelhas, sofrem menos desvio, ao contrário das violetas, que, sendo de menor
comprimento, estão sujeitas a um desvio maior. Os raios vermelhos desviam menos que os laranjas, os
laranjas menos que os amarelos, os amarelos menos que os verdes e assim por diante.

No espaço vazio, a luz caminha facilmente. Quando tem de atravessar qualquer outro meio
transparente (vidro, água, bolha de sabão), sua velocidade se modifica e fica reduzida. Essa redução vai
ser a causa de um desvio do raio luminoso ao sair de um meio e penetrar em outro diferente. A esse
desvio damos o nome de refração.

Os raios luminosos se propagam no vácuo a uma velocidade de 300.000 km/s, aproximadamente.


No ar e em outros meios gasosos, essa velocidade permanece mais ou menos idêntica, mas se modifica
ao atravessar meios sólidos e líquidos.

Figura 18 – Fenômeno de refração

26
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

1.1.3 Características da cor

A propriedade da cor associada com o comprimento de onda é conhecida como matiz, é a mais
difícil de descrever. Embora todos percebam as cores mais ou menos da mesma maneira (a menos que
tenham algum tipo de daltonismo) e concordem que certa cor é vermelha e não verde, a ideia da maior
parte das pessoas sobre o verde é levemente mais amarelada, enquanto o vermelho é ligeiramente mais
laranja do que o vermelho no modelo tricromático.

Também podemos referir o brilho (em oposição à escuridão) de uma cor como valor. Um pigmento
de dada nuança pode ser clareado ou escurecido adicionando-se branco ou preto, dando um matiz.
Nuanças não matizadas, como representadas nos círculos cromáticos, são chamadas matizes puros.
Todavia, eles não compartilham do mesmo valor, por isso pode ser preciso adicionar branco ou
preto a um deles para torná-lo semelhante a outro em brilho. Por exemplo, o verde puro precisa
ser escurecido para combinar com o vermelho puro. Ajustando o valor de um matiz da maneira
oposta – por exemplo, acrescentando branco ao azul ou preto ao amarelo –, cria-se o que artistas e
ilustradores chamam de discordância.

Figura 19 – Variações de brilho sobre as cores (acima)

“No círculo da esquerda, o brilho foi reduzido a 50% nos matizes. Enquanto que no círculo da direita
o brilho foi reduzido a zero; resultando na cor preta (direita)” (FRASER; BANKS, 2007, p. 35).

Variações no valor conferem luz, sombra e profundidade às pinturas. Se as cores de uma área tiverem
valor semelhante, ela tenderá a parecer chata, mesmo que os matizes difiram. Os valores mais escuros e
27
Unidade I

mais claros podem ser usados para adicionar sombras e realces, dando a ilusão de objetos tridimensionais
sobre a superfície bidimensional.

O aspecto ou dimensão final de uma cor é a saturação, sendo que o termo alternativo, intensidade,
deve ser evitado, pois também pode se referir à luminosidade. As cores mais saturadas podem ser
descritas como mais claras, mais fortes ou mais vívidas. Os matizes puros, incluindo os primários, são
completamente saturados. As cores não saturadas são mais acinzentadas e, como isso sugere, podem ser
misturadas como pigmentos pela adição tanto de preto como de branco a matizes puros. O resultado é
que certa quantidade de luz é refletida, e a maior parte atravessa o espectro completamente visível; os
comprimentos de onda que constroem o matiz desejado dominam apenas marginalmente.

Figura 20 – Matizes arranjados em torno do círculo cromático, com cores menos saturadas no centro, graduando para matizes puros
(totalmente saturados) na borda externa

Figura 21 – Colunas de grau de saturação – apresentação individual por cores

Os matizes misturados com cinza são chamados tons. Na mistura aditiva, as cores não saturadas
têm porcentagens quase equivalentes de vermelho, verde e azul, com pequenas variações que

28
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

produzem a impressão enfraquecida de matiz. Outras técnicas para produzir cores não saturadas
subtrativamente envolvem dois ou três matizes.

A tonalidade é a fusão do matiz com o cinza. A saturação é compreendida entre a cor pura (saturada)
e a não saturada; suas variações são obtidas acrescentando à cor pura um ou dois complementos de cor.
Já a luminosidade está relacionada à quantidade de branco ou preto que se adiciona à cor.

Exemplo de aplicação

Construa escalas de valores tonais para cada cor do espectro solar. Para isso, inicie delimitando
o espaço da régua e seus respectivos retângulos (assim como o modelo apresentado em saturação).
Em seguida, especifique a quantidade de sobreposição de camadas conforme a quantidade de retângulos
criados na régua. Em uma extremidade, insira, por exemplo, sete camadas sobrepostas de cor-pigmento,
sendo seis de amarelo e uma de cinza. Com a mudança para o retângulo adjacente, permaneça com
as sete camadas, porém, desta vez, com cinco camadas de amarelo e duas de cinza. Deste modo, na
extremidade oposta da régua, você estará realizando seis camadas de cinza e uma de amarelo. Utilize, se
possível, lápis aquarela, sem adicionar água. Pois este é mais macio e suporta mais mesclas de cores do
que um lápis de cor convencional. Assim ficará mais fácil reconhecer as qualidades e interferências que
as cores sofrem.

O fenômeno da cor, portanto, provém da refração da luz branca; não é uma matéria, nem uma
fração da luz, é uma sensação e, como tal, depende do nosso sistema visual e nervoso. Fora a luz solar,
o homem manipula inúmeras luzes produzidas por ele. Mas nada se compara ao espetáculo de força e
beleza do colorido da natureza provocado pela luz solar incidente sobre os elementos físicos e químicos,
no interior da atmosfera terrestre, por efeitos de absorção, dispersão, reflexão e refração.

É sabido que a cor oferece infinitas possibilidades de ser trabalhada como elemento criativo. Dentro
do espectro visível, temos a liberdade de combinar tons, misturando os matizes e produzindo composições
atrativas, impactantes ou tranquilizantes.

O maior obstáculo para os estudos da cor talvez seja a sua natureza efêmera, não podendo ser
considerada matéria (pigmento), já que depende da luz e dos nossos olhos para existir. A constatação
da sua instabilidade diante das oscilações da luz contribui para criar uma sensação de insegurança em
relação ao controle dos seus efeitos visuais.

Internacionalmente, não existe um acordo para a definição de cor. O Comitê de Colorimetria da


Sociedade Americana de Ótica define a cor como característica da luz, resultante das heterogeneidades
no espaço e no tempo, sendo a luz o aspecto da energia radiante que o observador humano constata
pelas sensações visuais que decorrem do estímulo da retina.

Diante destes apontamentos, pode-se dizer que, até o momento, uma definição para cor pode ser feita
com os seguintes componentes: o objeto, a luz, o órgão da visão e o cérebro. A cor é, por consequência,
uma informação visual, causada por um estímulo físico, percebida pelos olhos e decodificada pelo

29
Unidade I

cérebro. O estímulo físico, ou meio, carrega consigo a materialidade de uma das fontes, ou causas da
cor – a cor-luz ou a cor-pigmento. O cérebro – e o órgão da visão como sua extensão – é o suporte que
decodificará o estímulo físico, transformando a informação da causa em sensação, provocando, assim,
o efeito da cor.

Lembrete

O fenômeno do cromatismo define-se através de três características:


tonalidade, saturação e luminosidade.

2 A TEORIA DAS CORES

Após a explicação de como funciona a nossa visão diante dos estímulos de cor, seguiremos adiante
com conceitos relacionados à teoria das cores. Imagine-se no meio de uma área de planalto ou montanhas,
distante da agitação das cidades e do bloqueio visual ocasionado pelas edificações do aglomerado.
A grama sob seus pés estende-se pelas montanhas, formando um grande tapete vegetal. Essa forração
adjacente, que se apresenta em um verde vívido, refletindo até uma luminosidade proveniente dos
últimos raios de Sol que projetam sua superfície, se transforma, ao longe, em uma relva de coloração
mais escura, em um azul-violetado. Mas por que isto acontece?

Figura 22 – A paisagem, seu horizonte e suas cores

Essa variação de percepção das cores é o que nos faz compreender a noção de profundidade do
mundo que nos cerca. Leonardo da Vinci explicava esse fenômeno através dos conceitos de perspectiva
aérea – nome derivado da quantidade de ar que se interpõe entre o olho e o objeto visto. Em suas
descrições, considerava ser a perspectiva aérea aquela que, por degradação dos matizes no ar, torna‑se
30
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

sensível à distância dos objetos; servindo então para a criação da sensação de distâncias variadas. As
camadas de neblina que interpõem o olho do observador e o item analisado influem na leitura que
fazemos das cores de superfície dos corpos iluminados a distância.

Leonardo da Vinci ainda sugeriu que a noção de profundidade se dá não apenas pela variação
cromática, mas também por diferenças no tamanho e na qualidade de visualização dos corpos.
Ou seja, quanto mais distantes, menor é a relação de medidas perceptíveis. O mesmo ocorre com o grau
de elementos notados. Objetos mais próximos do observador são percebidos com riqueza de detalhes,
enquanto os mais afastados são notados em seus volumes, maciços.

Sendo assim, a partir da compreensão de que há uma diminuição das figuras e dos contornos, da mesma
maneira como uma atenuação das cores dos elementos, Da Vinci captou a essência da noção de profundidade.

Figura 23 – As cores e suas relações com a ação do ar entreposto

Saiba mais

Sobre a cor e o espaço e o efeito de luz e sombra leia o livro a seguir:

COLE, A. Cor: o guia visual essencial à arte da cor, desde a pintura na


Renascença até os meios modernos atuais. São Paulo: Manole, 1994.

Por efeito da aeração, quando os elementos são mais escuros que a área em que se destacam, estes
parecerão menos escuros à medida que se distanciarem; já os elementos mais claros que a área em
que se destacam parecerão menos claros à medida que se distanciarem do olho. Ou seja, as coisas mais
escuras e as mais claras que a área em que se projetam, a longa distância, trocam de cor, porque a clara
fica mais escura e a escura torna-se mais clara.

31
Unidade I

Exemplo de aplicação

Exercite a manipulação do efeito longe e perto e perto e longe, iniciada por Leonardo da Vinci em
seus manuscritos sobre a perspectiva aérea.

Materiais: papel, pincéis e tinta guache nas cores vermelho, azul ciano e branco.

Descrição: desenhar linhas como montanhas e pintar os espaços, no sentido de baixo para cima,
do vermelho ao azul ciano. Deve-se acrescentar o azul ao vermelho de forma crescente, a ponto que a
última faixa seja inteiramente azul. Observe a imagem e perceba o quanto o azul agrega o significado
da distância em relação ao vermelho, reforçando a perspectiva.

Seriam esses os únicos recursos para distinguir as cores? Podemos ter certeza daquilo que
vemos? Quando é que o azul começa a se tornar violeta? Por que será que a mesma cor muda
dependendo do fundo em que se encontra? Inúmeras condições ambientais nos mostram as cores
de maneiras diferentes, por exemplo, a roupa vermelha que compramos na loja pode parecer
laranja quando a vestimos em casa.

A utilização da cor de forma eficaz só se faz possível quando compreendemos o que ela é e como
funciona. Para isso, alguns estudiosos serão apresentados com a missão de continuar nos auxiliando no
entendimento deste assunto.

2.1 Johannes Itten

Johannes Itten nasceu na Suíça, em 1888. Após estudar pintura em Stuttgard e receber os
ensinamentos de seu professor, educador e teórico da cor, Adolf Hölzel (1853-1934), partiu para a
Áustria, onde, em 1916, montou e dirigiu sua própria escola de arte em Viena.

Entre o período de 1919 e 1925, Itten foi convidado para lecionar na Bauhaus. Lá desenvolveu
seu curso preliminar de cor e forma. O legado de seu trabalho é, ainda hoje, a espinha dorsal de
cursos de teoria da cor em escolas de arte. Sua obra não se limitou a examinar a cor cientificamente,
experimentando com ondas de luz e reflexos, ou a uma perspectiva de designer, explorando as relações
entre as cores e efeitos visuais. Seguindo a tradição iniciada por Goethe e de acordo com o trabalho de
Kandinsky, ele estava convencido de que as cores poderiam ter efeitos psicológicos e espirituais sobre as
pessoas e influenciar ativamente o modo como se sentiam.

Itten ensinou seus estudantes a apreciar a harmonia das cores através de um “equilíbrio, uma simetria
de forças”. Isso se conseguia apenas quando as cores eram misturadas não para produzir uma nova cor,
mas para criar o cinza. Ele acreditava que a harmonia das cores é inteiramente subjetiva e, dado o
tempo para experimentar, cada pessoa, no final, desenvolvia sua própria paleta. Ele testou suas ideias
nos alunos e encontrou confirmação no fato de que eles todos trabalhavam com diferentes paletas de
cor, que usavam repetidamente (ITTEN, 1973 apud BARROS, 2011).

32
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Além disto, Itten (1973 apud BARROS, 2011) criou o conceito de dois círculos cromáticos.
Ambos baseados nas seguintes relações de cores:

• Cores primárias ou geratriz: são cada uma das três cores (amarelo, vermelho e azul) indecomponíveis
e que, misturadas em proporções variáveis, produzem todas as cores do espectro.

• Cores secundárias: são aquelas formadas em equilíbrio ótico (laranja, verde e violeta) por duas
cores primárias.

• Cores terciárias: são aquelas (laranja-avermelhado, vermelho-violetado, violeta-azulado,


azul‑esverdeado, verde-amarelado e amarelo-alaranjado) cuja posição consiste em ser
intermediária entre as cores secundárias e qualquer uma das primárias que lhes dão origem.

Figura 24 – Cores primárias

Figura 25 – Mescla de cores primárias, formando as secundárias (ao meio)

Figura 26 – Cores terciárias

A primeira representação visual dessas relações se fez através de uma estrela de doze pontas
que mostra tintas de luz no centro, progredindo para cores mais escuras nas bordas. A segunda
elaboração apresenta uma borda externa com um triângulo central das três cores primárias e
triângulos intermediários das secundárias complementares. O resultado final é uma amostragem
de todas as matizes de cores.

33
Unidade I

Figura 27 – Estrela de cores desenvolvida por Itten

Figura 28 – Círculo cromático desenvolvido por Itten

Para compreender melhor as propriedades físicas e químicas das cores dispostas no círculo
cromático de Itten, segue uma breve descrição de cada matiz de cor primária e secundária apresentadas
no círculo cromático (ITTEN, 1973 apud BARROS, 2011):

O vermelho é uma das sete cores do espectro solar, sendo por isso denominado cor fundamental
ou primitiva. É cor primária (que não se decompõe), tanto em cor-luz como em cor-pigmento. Possui
elevado grau de cromaticidade e é a mais saturada das cores, decorrendo daí sua maior visibilidade em
comparação com as demais. Seu escurecimento em mistura com o preto tem como pontos intermediários,
entre o vermelho e o preto, vários tons de marrom. É a única cor que não pode ser clareada sem perder
suas características essenciais. Clareado com a mistura do amarelo, produz o laranja, e dessaturado
34
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

pela mistura com o branco, produz o rosa. A complementar do vermelho, em cor-luz, é o ciano e, em
cor‑pigmento, o verde. Sua aparência mais bela e enérgica é conseguida quando aplicada sobre fundo
preto, funcionando como área luminosa. Sobre fundo branco, torna-se escuro e terroso. Ao lado do
verde, forma a dupla de cores complementares mais vibrantes, atingindo até a brutalidade, dependendo
das proporções empregadas e da forma das áreas coloridas.

O amarelo, amplo e ofuscante, é a mais desconcertante das cores, transbordando dos limites onde se
deseja encerrá-lo, parecendo sempre maior do que é na realidade, devido a sua característica expansiva.
Assim como o vermelho, também é uma cor primitiva. Em cor-pigmento é uma das três cores primárias.
Tem como sua complementar o violeta. Em cor-luz, é cor secundária, formada pela mistura do vermelho
com o verde, sendo a complementar do azul. É a mais clara das cores e a que mais se aproxima do branco
numa escala de tons. Misturado ao vermelho, exalta-se, produzindo o laranja; enquanto misturado ao
azul, esfria-se e produz o verde. Escurecido com o preto, torna a coloração esverdeada, próxima do
verde‑oliva. Clareado com o branco, não perde subitamente as qualidades intrínsecas. É pouco visível
quando aplicado sobre fundo branco, por isso os pintores e decoradores contornam a área amarela com
um filete escuro (debrum), para ressaltá-la. Sobre fundo preto ganha força e vibração. Em contraste
com o cinza se enriquece em qualidade cromática e beleza. Em cor-luz, o amarelo forma com o azul um
par complementar cuja mistura, em partes ópticas equilibradas, produz o branco, denominando-se tal
fenômeno mistura aditiva. Em cor-pigmento, o amarelo exige como complementar o violeta. Essas duas
cores, quando misturadas, produzem o cinza-neutro por mistura subtrativa.

O azul é a cor mais escura das três cores primárias, tem analogia com o preto. Funciona bem como
sombra na pintura de corpos opacos, numa escala de tons. É indecomponível, tanto em cor-luz como
em cor-pigmento. Nas luzes coloridas, sua complementar é o amarelo. Misturado ao vermelho, produz o
magenta, e ao verde, o ciano. Em cor-pigmento, sua complementar é o laranja. Com o vermelho produz
o violeta e com o amarelo, o verde. Todas as cores que se misturam com o azul esfriam-se por ser ele a
mais fria das cores. Na natureza, as cores tendem a mesclar-se com o azul do ar atmosférico, influindo
nas mutações cromáticas. Como visto anteriormente, Leonardo da Vinci estudou vários aspectos deste
fenômeno através da perspectiva aérea.

O verde é uma das três cores primárias em cor-luz. Sua complementar é o magenta. Misturado ao
azul, produz o ciano, e ao vermelho, o amarelo. No espectro solar, encontra-se entre os matizes amarelos
e azuis. Em cor-pigmento, é cor secundária, formada pela mistura do amarelo com o azul, sendo,
complementar do vermelho. É o ponto ideal de equilíbrio da mistura do amarelo com o azul. Escurecido
com o preto descaracteriza-se, tornando-se acinzentado. Escurecido com o azul, cria possibilidades de
enriquecimento cromático. Já clareado com o amarelo, torna-se mais ativo e penetra pela variada gama
de verdes-limão. Dessaturado com a mistura do branco, ganha em qualidade luminosa.

Violeta é o nome genérico que se dá a todas as cores resultantes da mistura do vermelho com o azul.
Esta cor é também comumente chamada de roxo. Em pigmento é cor secundária e complementa o amarelo.
Rebaixado com o preto, torna-se desagradável e sujo. Escurecido pela mistura com o azul, esfria-se, oferecendo
possibilidades tonais de extrema riqueza cromática. Dessaturado com o branco forma a extensa gama dos
lilases, produzindo tonalidades de intensa luminosidade. O violeta é a cor extrema do espectro visível, possui
a mais alta frequência e o menor comprimento de onda dentre todas as cores.
35
Unidade I

Já o laranja, quando produzido por luzes coloridas, é considerado dentro do grupo das terciárias,
com a proporção ótica de 2/3 de vermelho e 1/3 de verde. Em pigmento é cor binária, complementar
do azul. Resultado da mistura do vermelho com o amarelo, em equilíbrio ótico. Por sua estrutura, não
pode ser escurecido. Rebaixado com o preto, torna-se sujo, indo em direção às colorações terrosas.
Misturado com o vermelho, consegue-se um escurecimento tonal relativo, mas surge uma cor mais
enérgica e agressiva que o laranja equilibrado (vermelho alaranjado). Clareado com o amarelo,
ilumina-se, aumenta em vibração, mas perde em consistência. Dessaturado com o branco, ganha em
luminosidade, criando variada gama de tonalidades agradáveis à visão.

Lembrete

Na definição de Itten, as cores-pigmento primárias são vermelho,


amarelo e azul. As cores-pigmento secundárias são laranja, verde e
violeta. Por fim, as cores-pigmento terciárias são laranja-avermelhado,
vermelho-violetado, violeta-azulado, azul-esverdeado, verde-amarelado
e amarelo-alaranjado.

2.2 Josef Albers

Josef Albers produziu um estudo denominado A interação da cor, que expandiu continuamente o
modo como as cores são usadas e percebidas. Na época, seus experimentos, como todo mergulho no
desconhecido, foram considerados, por muitos, como objetos de polêmica e contestação.

A abordagem do livro era revolucionária, trazia a investigação para o primeiro plano. Questionava as
noções tradicionais de gosto estético. Procurava atrair, em vez de meramente informar.

A maior contribuição de Albers ao ensino da cor foi, sem dúvida, o desenvolvimento de uma
metodologia didática indutiva, cujos resultados expressavam as interações cromáticas. Seus
experimentos partiam da necessidade de trabalhar dentro de um contexto cromático figura-fundo,
ou seja, estabelecendo sempre uma inter-relação entre as cores. Em outras palavras, Albers relacionou
a compreensão de uma determinada cor a partir do seu contexto direto.

Figura 29 – Os dois quadrados pequenos são da mesma cor, mas parecem ser diferentes pela variação das cores de fundo

36
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Isso significa, especificamente, observar a ação das cores e sentir a relação que se estabelece entre elas.
Albers enfocava a vivência do aluno e induzia-o a interpretar as próprias experimentações através de uma
tentativa de superação dos resquícios de educação acadêmica baseada na imposição do conhecimento.
Seu princípio pedagógico era o do aprendizado surgido da experiência, pelo método de tentativa e erro.

Os exercícios propostos por Albers em seu livro Interaction of Color exploram o aprendizado
das cores por meio da percepção direta, e não por teorias ou sistemas cromáticos. Com a
percepção das interações cromáticas, a cor se revela um mecanismo autônomo, que funciona
independentemente das formas.

O objetivo de sua metodologia era conscientizar o aluno da relatividade e da interatividade das


relações cromáticas. Tudo começa com a ideia de que é impossível o estudo isolado das cores, pois elas
estão sempre envolvidas no contexto de um cenário, onde as figuras são percebidas em contraste com
os planos de fundo.

Imagine a seguinte situação: ao analisar a obra de Matisse, você se preocupa com quantas manchas
vermelhas podemos encontrar na pintura. E se, sistematicamente, seguisse estabelecendo uma lista de
ordenamento contendo todas as formas redondas, angulosas, as linhas paralelas, os exemplos de sobreposição
e os esquemas de gradiente. Ao final dessa quantificação, seria possível entender a obra de arte?

Observação

Assim como as cores, para entender uma obra de arte é necessário


encará-la como um todo, com o seu contexto. É preciso avaliar o clima
das cores e a dinâmica das formas. A composição faz uma afirmação antes
mesmo de qualquer análise.

Fazendo um paralelo com a sensação tátil de temperatura, Albers introduz a noção das falsas
sensações que o nosso corpo pode nos transmitir em decorrência da adaptação sofrida pelos nossos
sentidos. Sabemos que, se colocarmos a mão esquerda num recipiente com água quente e, ao mesmo
tempo, a mão direita em um vasilhame com água fria e, em seguida, ambas num recipiente com água
morna, teremos a sensação de que a água é fria para a mão esquerda e quente para a direita. Verifica‑se
uma discrepância entre o fato físico e o efeito físico: a água é morna, mas a sentimos fria com a mão
esquerda e quente com a direita. Portanto, do mesmo modo que as sensações táteis nos enganam, as
ilusões óticas também o fazem. Elas levam os indivíduos a crer e ver as cores de uma maneira diferente
da que são.

Entender como as ilusões de ótica ocorrem é o principal fator da metodologia didática de Albers.
Para isto, ele criava exemplos desafiadores de mudanças na cor. O formato de seus exercícios era único,
criando condições eficazes de avaliação dos efeitos ilusórios. Dois pequenos retângulos da mesma
cor devem ser colocados sobre grandes fundos de cores bem diferentes. “Para que dois pedaços do
mesmo papel, portanto da mesma cor, pareçam diferentes, devemos compará-los sob condições iguais”
(BARROS, 2011).
37
Unidade I

Esses estudos eram depois expostos para demonstrar com clareza os efeitos alcançados pelos alunos,
provando que uma cor podia ser influenciada pela cor circunvizinha.

Cor 1
(igual para as duas figuras)

Cor 2 Cor 3
(1º fundo) (2º fundo)

Figura 30 – Uma cor tem muitas faces (base dos exercícios de experimentação de Albers)

A partir dessas experimentações foi possível avaliar que tons mais indefinidos, acinzentados, são
facilmente transformados por fundos de cores fortes e contrastantes, ao passo que as cores intensas e
saturadas, que exercem maior influência, são as mais difíceis de mudar, quando no papel das figuras.

No exemplo a seguir uma cor pode ser transformada em duas de acordo com o fundo que lhe
circunda. O fundo altera a luminosidade da cor de centro. No fundo mais claro, o retângulo interno
parece mais escuro; no fundo mais escuro, o retângulo parece mais claro.

a)

b)

c)

Figura 31 – A cor e sua luminosidade em relação a diferentes fundos

38
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Já no exemplo que segue, a relação com o fundo irá transformar duas cores em uma. Quando se
comparam as duas diagonais, simultaneamente, isto é, não em sequência, mas concentrando o olhar
na parte intermediária que as separa, elas parecem muito semelhantes, ou mesmo iguais. Mas elas são
precisamente iguais às listras horizontais abaixo delas, o que as torna, de fato, tão diferentes quanto as
cores na parte inferior, o ocre e o amarelo de Nápoles. O fundo mais escuro clareia a figura que está em
diagonal à esquerda, enquanto o fundo claro escurece a figura em diagonal. Essa influência equilibra as
diferenças entre as duas imagens, tornando-as similares.

Figura 32 – Transformação de duas cores em uma

Ao examinar o estudo no sentido contrário, de baixo para cima, nota-se a diferença entre as cores.
Elas irão parecer ainda mais diferentes se visualizadas de forma invertida, sobre os fundos contrastantes
do par intermediário.

Na prática da decoração, o mesmo tom de verde azulado pode ser percebido de maneira diferente.
Imerso em uma composição de cores quentes pode parecer frio, já em uma composição de cores frias

39
Unidade I

pode parecer quente. Um vermelho magenta pode parecer quente numa composição de cores frias ou
frio em uma composição de cores quentes.

Figura 33 – A cor e seu fundo

2.3 Wassily Kandinsky

Um triângulo vermelho é diferente de um triângulo amarelo, assim como um quadrado azul é


diferente de um quadrado verde. Mas por que seus resultados perceptivos são diferentes?

Figura 34 – A diferença entre um triângulo amarelo e um laranja em seus resultados perceptivos

Durante muito tempo, o estudo das cores enquanto teoria caminhou paralelamente ao estudo da
forma, sem interação alguma. Na maior parte das vezes, a relação entre essas duas teorias se deu
de maneira intuitiva e empírica. Buscando resposta para a questão de que cor corresponderia a que
forma, alguns autores como Wassily Kandinsky, Karl Gerstner e Johannes Itten tentaram estruturar
metodologicamente essas correlações.

40
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Kandinsky, apesar das inúmeras críticas recebidas, fazia associações entre cores, formas básicas e
suas transmissões de emoções. Afirmava que a cor é a tecla, o olho é o martelo e a alma é o piano de
inúmeras cordas, logo, o pintor considerava a cor um instrumento. Ele acreditava que a cor e a forma
eram os dois meios pelos quais a pintura deveria atingir seus objetivos e, por isso, deveria existir uma
relação inevitável entre cor e forma.

O artista tinha uma forma peculiar de escrever, invocando os sentimentos e a razão ao mesmo
tempo. Ele dizia que a forma, mesmo quando abstrata e geométrica, possui o seu próprio som interior.
Há na forma um ser espiritual, dotado de qualidades e de um perfume próprio, cujas características a
diferenciam e a enriquecem em suas nuances, como em uma emissão harmônica sonora. Ao mesmo
tempo, Kandinsky relata que, apesar das interferências que criam o perfume de tal elemento, seu fundo
permanece inalterável.

Por causa desse primeiro pensamento, Kandinsky tinha um conceito diferente de harmonia.
Ele acreditava que a eventual dissonância entre a forma e a cor não deveria ser considerada uma desarmonia.
Ao contrário, poderia representar uma possibilidade nova e, portanto, até uma causa de harmonia.

Baseando-se neste pensamento, Kandinsky observou que um triângulo pintado de amarelo, um


círculo azul, um quadrado verde, outro triângulo verde, um círculo amarelo, um quadrado azul e assim
sucessivamente eram muito diferentes uns dos outros e, como tais, produziam efeitos receptivos também
bastante diferenciados, isto é, as cores se realçavam em valor dentro de certas formas, assim como se
apagavam dentro de outras.

Observação

A partir de alguns experimentos, a principal observação de Kandinsky,


sem dúvida, foi a de que cores puras têm um som mais adequado em
formas puras.

Se havia cores primárias e formas primárias, teria de haver uma relação coerente entre elas,
onde se iluminassem mutuamente. A primeira correlação entre a forma e a cor observada foi entre
as cores-pigmento opacas primárias (amarelo, vermelho e azul) e as formas primárias (triângulo,
quadrado e círculo).

Figura 35 – Correlações entre as cores e as formas de acordo com Kandinsky

41
Unidade I

Segundo seus conceitos, o amarelo estaria relacionado ao triângulo por sua propriedade de emanar
a coloração que avança em todas as direções. Essa cor também representa, para Kandinsky, o calor, a
energia e a claridade. Assume a primazia do lado aditivo das cores, em oposição à passividade, frigidez
e obscuridade representadas pelo azul. Olhando-o fixamente, é possível perceber que o amarelo irradia,
realizando um movimento excêntrico, se aproximando do observador.

É importante perceber no pensamento de Kandinsky que o fundamental não é pintar os triângulos


necessariamente de amarelo, mas sim notar que as cores e as formas têm um caráter próprio,
independente do que representam em significado. Além do mais, as características de umas apresentam
interações muito concretas com as outras, por exemplo, a concordância apresentada do amarelo com o
triângulo, o que ele denominou de Princípio da Necessidade Interior.

O verde absoluto representa a cor mais calma que existe. Não representa movimento, não se
acompanha nem de alegria, nem de tristeza, nem de paixão. Não solicita nada, não lança nenhum apelo.
Esta imobilidade é uma qualidade preciosa.

O azul em seu movimento, para Kandinsky, é, ao mesmo tempo, algo que lança e converge o homem
para o seu próprio centro, em um despertar de desejo de pureza e de sede pelo sobrenatural.

Sendo também um pintor e professor de teoria da cor na famosa escola de arte alemã dos anos
1920, a Bauhaus, Kandinsky possuía liberdade e experiência para afirmar que a arte age através da
sensibilidade e intuição e, mesmo que se partisse das mais exatas proporções, pesos ou medidas, não se
poderia proporcionar um resultado justo, e que o equilíbrio e as proporções se encontram no próprio
artista. Assim, a intuição era a base de suas pesquisas na correlação entre as cores e as formas.

2.4 Johann Wolfgang Von Goethe

No final do século XVIII, um nome famoso na literatura apareceu no cenário dos estudos sobre o
fenômeno das cores: Johann Wolfgang von Goethe. Nascido em 1749, tendo a juventude imersa em
intensa inquietação intelectual e cultura clássica sua paixão pela ciência das cores data desta época,
quando se inicia na prática da pintura e do desenho.

Goethe não conseguia se convencer das ideias de Newton e, partindo disso, dedicou vários anos
de sua vida a demonstrar sua intuição na utilização de experimentos com prismas e lentes. A luz para
ele era o ser mais simples, indivisível e homogêneo. Sendo assim, ela não poderia ser dividida em luzes
coloridas, como afirmou Newton, pois uma luz colorida seria sempre mais escura que a luz incolor.

Newton e Goethe começaram suas experimentações da cor a partir de pontos de vista totalmente
diferentes. Goethe não estava interessado em estabelecer critérios para a produção da cor enquanto
fenômeno físico, como Newton. Ao contrário, defendia a ideia de que a cor também existia enquanto
fenômeno além da física. Para ele, não bastava concluir que a cor surgia da luz branca, mas também a
influência dos aspectos fisiológicos na visão cromática. Portanto, a diferença entre as interpretações de
Goethe e Newton passa também pelos critérios e métodos de comparação.

42
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Goethe também encarava as cores como ideias subjetivas ou coisas que existiam apenas em nossa
percepção. Esse modo de pensar ajuda-nos a entender a classificação que ele deu para o fenômeno
cromático. Ele realizou a divisão das cores em fisiológicas, físicas e químicas. As cores fisiológicas
eram as cores que pertenciam aos olhos e que dependiam diretamente da sua capacidade de ação
e reação. As cores físicas eram aquelas cuja origem se devia a fontes de luz refletidas pelos objetos
coloridos, hoje denominadas cores-luz. Por fim, as cores químicas, que formam os objetos, hoje são
denominadas cores-pigmento.

As derivações do branco e do preto também foram equacionadas. Encontrado no mundo vegetal,


através da combustão e do carvão, o preto é considerado pelo estudioso como menos primordial que o
branco. Já o branco, em sua concepção, ao escurecer, tornava-se amarelo. O preto, ao clarear, tornava-se
azul e se intensificava à medida que saturava.

O círculo cromático de Goethe é um dos fundamentos de sua doutrina. Nele o azul e o amarelo e o
verde e o púrpura estabelecem entre si uma relação de complementaridade e indicam as possibilidades
de combinação entre as cores básicas, formando as cores intermediárias.

Goethe acreditava que o verde era uma cor composta da combinação do amarelo e do azul, e não
uma cor simples, espectral, como defendia Newton. Na verdade, como apresentado anteriormente, os
dois estavam corretos em suas afirmações. Por um lado, Newton discorria sobre as cores-luz, explicadas
em síntese aditiva, enquanto Goethe estudava as cores-pigmento, que sob a síntese subtrativa têm o
amarelo e o azul produzindo o verde.
(++)
Púrpura

(++) (+-)
Laranja Violeta

(+++) (---)
Amarelo Azul

(++)
Verde
(++) Branco (+-) Cinza (-) Preto

(+) Luz (-) Sombra

Figura 36 – O círculo cromático de Goethe

O triângulo de Goethe, no vasto universo da cor, trata-se provavelmente do mais condensado e


claro sistema de representação de uma ordem essencial. Dentro das duas dimensões de um triângulo
43
Unidade I

equilátero – subdividido em nove triângulos iguais – encontram-se três cores primárias, três secundárias
e (inesperadamente) três terciárias, todas colocadas com muita sensatez.

O primeiro dos três trios, que contém os contrastes cromáticos mais fortes, mostra-se
extremamente separado, nos limites extremos, nos três ângulos. De modo pertinente, o amarelo e
o azul (aos quais Goethe se referia como as duas únicas cores puras) e o contraste primordial se
situam na base. E o vermelho (o meio entre eles) aparece no ponto mais alto, no ápice, uma vez
mais separado, mas em posição intermédia. As cores secundárias, menos opostas, ficam no meio
dos lados do triângulo, e as terciárias, mais próximas ou menos diferentes, acham-se naturalmente
em posição mais central ainda.

Figura 37 – Triângulo de Goethe

2.5 Leonardo da Vinci

Leonardo da Vinci viveu entre 1452 e 1519. Foi uma das principais figuras do chamado Renascimento
italiano e produziu obras que são bastante conhecidas e imitadas, como a Mona Lisa e a Santa Ceia.
Além do seu trabalho artístico em pinturas, o artista foi um dos primeiros a reunir os dados existentes
em direção à criação de uma teoria da cor.

Definiu as cores primárias chamando-as de “cores simples”, como aquelas que não podem ser feitas
pela mescla de outras cores. São cores simples para ele: o branco, o amarelo, o verde, o azul, o vermelho
e o preto (DA VINCI, 1970 apud SILVEIRA, 2011, p. 24).

Nessa definição estão as três cores primárias físicas e as três cores primárias químicas, somando-se a
elas o preto e o branco. Sua insistência na inclusão do preto e do branco como cores primárias na escala
cromática se deve, segundo seus escritos, a ser única maneira de se obter a característica do valor da cor
expressa em grau de luminosidade. Muito tempo mais tarde, Chevreul, Ostwald e Munsell viriam a apoiar
os enunciados de Da Vinci, colocando o preto e o branco como pontos referenciais em seus sólidos de cor.

Ele foi o pintor renascentista mais preocupado com o estudo de sombra e luz, percebendo
que entre a luz e as trevas há um meio de revelação dos fenômenos cromáticos. Assim, abriu
44
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

caminho para as futuras teorizações das sombras coloridas, sombras de coloração complementar
à cor do fundo.

A afirmação de que o branco é o resultado da somatória de outras cores foi feita por Da Vinci muito
antes de Newton. O que a física chama hoje de síntese aditiva, ele, já havia descoberto, provando ser o
branco a soma de duas cores complementares. Toda a teoria cromática dos tempos modernos baseia-se
nessa descoberta.

Leonardo da Vinci era um sonhador, capaz de idealizar elementos especulativos em projetos


avançados das ciências e das artes, impossíveis de concretizar em nível prático de desenvolvimento
técnico e social de seus dias. Visionário, suas pesquisas e soluções correspondem muito mais aos anseios
futuros da sociedade moderna do que às necessidades do século em que viveu.

2.6 Karl Gerstner

Outro artista e pesquisador que trabalhou com as cores e as formas, além de Kandinsky, foi Karl
Gerstner. O triângulo, o quadrado e o círculo eram, indiscutivelmente, para ele as formas primárias.
Porém, seu pensamento foi além. Pensando num possível círculo para as formas, Gerstner concluiu
que o quadrado poderia derivar-se tranquilamente do triângulo, apenas colocando-se uma aresta a
mais, mas o círculo não derivava facilmente do quadrado. Entre eles existiam infinitos polígonos, como
pentágonos, hexágonos e assim sucessivamente.

Lembrete

Assim como Kandinsky, Gerstner também estudou a relação da cor com


as formas.

Para Kandinsky não havia estados intermediários entre o triângulo amarelo e o quadrado vermelho,
enquanto para Gerstner entre o quadrado vermelhe e o círculo azul existia um número infinito de
formas intermediárias.

Figura 38 – Intervalo entre as formas

A partir dessa primeira colocação, as formas sólidas de Gerstner evoluíram sozinhas. Aparando
as arestas do tetraedro amarelo, ele obteve os estados intermediários que queria, chegando ao cubo
vermelho. A partir daí chegou até a esfera, se não em um sentido geométrico exato, ao menos
bastante aproximado.
45
Unidade I

Figura 39 – Evolução tridimensional de Gerstner

Não foi difícil para Gerstner aceitar as correspondências entre cores e formas dadas por Kandinsky.
A relação entre o azul e o círculo, por exemplo, parecia acertada, pois o azul, para Gerstner, era tão
estático e passivo quanto o círculo.

A correspondência entre o vermelho e o quadrado também parecia razoável, porém o vermelho


tinha características contraditórias que, para Gerstner, não estavam expressas na correlação de
Kandinsky. Tanto a forma do quadrado como a cor vermelha expressavam claridade, firmeza e certeza,
mas ao mesmo tempo o vermelho expressava características opostas às do quadrado, exibindo tensão,
atividade e vibração.

Seguindo os apontamentos de Kandinsky da correlação entre a linha horizontal e o branco, entre


a vertical e o preto, Gerstner chegou à conclusão de que o vermelho corresponderia à diagonal.
Esta estaria firmemente apoiada na superfície e manifestaria uma grande tensão interna, o que
daria base para a correlação entre a diagonal e o vermelho. Sendo assim, o estudioso solucionou
a questão, colocando o quadrado vermelho de Kandinsky em posição diagonal, obtendo a tensão
correspondente ao vermelho.

Figura 40 – Quadrado na diagonal

46
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

A correlação entre o amarelo e o triângulo também não estava totalmente coerente para o
pesquisador. A forma e a posição do triângulo eram elementos determinantes e possuíam uma
personalidade definida. Procurou então, uma forma que fosse mais independente de sua posição,
para que pudesse se correlacionar com o amarelo. Encontrou a combinação de dois triângulos,
que formariam uma estrela de seis pontas, evoluindo para oito pontas para possuir eixos de
simetria. Para ele, as formas eram elementares em sua expressão, e não em sua geometria. Elas
deveriam, assim como as cores, representar mais que a sua própria sonoridade interna. Assim, a
estrela potencializava as características do triângulo.

Saiba mais

Ainda sobre as cores e suas relações com as formas, veja:

GAGE, J. Color y cultura: la práctica y el significado del color de la


antigüedad a la abstracción. Madrid: Siruela, 1993.

Seu trabalho passa a corresponder entre cores primárias e formas primárias, o que definiu como
“sinais da cor”. Misturando formas primárias com cores primárias obtêm-se sinais de cor intermediários,
situando-os, logicamente, em um círculo de cores.

Figura 41 – Sinais da cor

Os resultados de seus estudos demonstravam que os sinais de cores tinham origens heterogêneas. Por
exemplo, o violeta, como forma intermediária de dois polígonos regulares, era outro polígono regular, o
octógono. O laranja era uma forma mista, formada a partir de dois quadrados. O verde era uma forma
sem definição geométrica, mas que se derivava logicamente do amarelo e do azul.

47
Unidade I

Resumo

O termo cor é utilizado com várias significações diferentes de acordo


com a área de estudo. Para os fisiologistas cor refere-se à sensação
consciente de um observador cuja retina se encontra estimulada pela
energia radiante. Os físicos, por vezes, utilizam-na pra indicar uma
radiação monocromática visível. Em sentido vulgar, a mesma palavra
é empregada para indicar uma propriedade de um objeto como, por
exemplo, quando se diz: este livro é azul.

Luz e cor são intimamente ligadas; sem luz não há cor. Todos os corpos nas
trevas são negros. A cor de um corpo é sua capacidade de modificar a cor da luz
que sobre si incide. Os corpos não luminosos podem ser mistos pela transmissão
ou pela reflexão da luz. Assim, por exemplo, uma lâmina de vidro vermelho,
atravessada pela luz branca, só deixa passar o componente vermelho dessa luz,
por isso, na transmissão, todos os demais componentes são absorvidos.

Uma folha de papel vermelho, opaco e iluminado pela luz branca


mostra‑se vermelha, porque, na reflexão, são absorvidos todos os
componentes dessa luz, exceto o vermelho, que é refletido. A cor de um
objeto, portanto, provém da transmissão ou da reflexão da luz incidente.

Exercícios

Questão 1. Ao tratarmos das propriedades da cor, é preciso considerar os seguintes aspectos:


comprimento de onda (matiz), valor (mais difícil de descrever), jogo luz e sombra (brilho), variações do
valor (que conferem luz, sombra e profundidade às pinturas) e saturação (cores mais saturadas podem
ser descritas como mais claras, mais fortes ou mais vívidas; matizes puros, incluindo os primários, são
completamente saturados).

Considerando as propriedades da cor, podemos afirmar que:

I. para definir o fenômeno do cromatismo, é preciso referir-se a três de suas características:


tonalidade, saturação e luminosidade.

II. a fusão do matiz com o cinza é denominada “tonalidade”.

III. as variações resultantes da mistura de uma cor saturada (pura) com outra não saturada é
denominada “saturação”.

VI. a intensidade de luz (claridade do dia) que interfere na percepção das cores é denominada “luminosidade”.

48
PERCEPÇÃO VISUAL: TEORIA E PSICOLOGIA DAS CORES

Está correto o afirmado em:

A) I e II somente.

B) I e III somente.

C) II e IV somente.

D) I, II e III somente.

E) I, II, III e IV.

Resposta correta: alternativa D.

Análise das afirmativas

I. Afirmativa correta.

Justificativa: são essas as três propriedades da cor às quais devemos nos referir quando pretendemos
definir o fenômeno do cromatismo.

II. Afirmativa correta.

Justificativa: “tonalidade” é a denominação correta para o fenômeno de fusão do matiz com o cinza.

III. Afirmativa correta.

Justificativa: “saturação” é a denominação correta para as variações resultantes da mistura de uma


cor saturada com outra não saturada.

IV. Afirmativa incorreta.

Justificativa: ao nos referirmos às propriedades da cor, a luminosidade não é entendida como a


intensidade de luz (claridade do dia) que interfere na percepção de determinada cor, mas, sim, como a
quantidade de branco ou preto adicionada a ela.

Questão 2. Johann Wolfgang von Goethe, um dos nomes mais importantes da literatura do final do
século XVIII, também desenvolveu uma relevante teoria sobre o fenômeno das cores. Sua compreensão
do fenômeno, aliás, é distinta da compreensão de Newton.

Considere as afirmativas abaixo e assinale a correta.

A) Para Goethe, a luz é um ser simples, indivisível e homogêneo; para Newton, a luz pode ser dividida
em luzes coloridas, pois uma luz colorida é mais escura que a luz incolor.
49
Unidade I

B) Newton não estava interessado em estabelecer critérios para a produção da cor enquanto
fenômeno físico, mas Goethe, sim.

C) Newton defendia a ideia de que não basta concluir que a cor surge da luz branca: é preciso
considerar também a influência de aspectos fisiológicos na visão cromática.

D) Newton classificou as cores em fisiológicas, físicas e químicas.

E) Cores físicas são as pertencentes aos olhos, sendo dependentes diretamente da capacidade de
ação e reação visuais; cores fisiológicas são aquelas que têm por fonte as luzes refletidas por
objetos coloridos; cores químicas, por sua vez, são aquelas que formam os objetos.

Resolução desta questão na plataforma.

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