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Língua Portuguesa:

Sintaxe da Frase ao
Texto
Profª. Iara de Oliveira

2013
Copyright © UNIASSELVI 2013

Elaboração:
Profª. Iara de Oliveira

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

469
04821 Oliveira, Iara de
Língua portuguesa: sintaxe da frase ao texto / Iara de Oliveira.
Indaial:Uniasselvi, 2013

216 p. : il

ISBN 978-85-7830-704-2

1. Língua portuguesa. 2. Sintaxe. 3. Texto.


I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.

Impresso por:
Apresentação
Há muito tempo escutamos estudantes e não estudantes dizerem que
nossa língua é difícil (o que é um grande erro: não há uma língua mais difícil
que a outra!), não segue uma lógica, porque para cada regra existem várias
exceções, a gramática atrapalha porque há muitas informações que não servem
para nada e outros tantos equívocos que, pouco a pouco, vão se consolidando
entre nós. Talvez a origem destas afirmações se deva, em boa parte, ao ensino
falho de língua portuguesa que tivemos no Ensino Fundamental e Médio,
baseado em manuais descontextualizados e ministrado por professores
desmotivados ou com formação deficitária. O fato é que, hoje, as pessoas
“detestam” o português e os profissionais desta área são desvalorizados ou
alvos de constantes questionamentos.

Dentre os aspectos gramaticais que estão envolvidos nesta “rede de


intrigas”, a sintaxe é a que mais sofre ataques. Isso se deve ao fato de que
ela estuda as relações inter e extraenunciados e a comunicação humana;
definindo de forma superficial, constitui-se de enunciados. Como muitas
vezes os profissionais da área não conseguem relacionar adequadamente
a prática enunciativa com as funções sintáticas, geram-se os conflitos e
os rótulos que circulam por aí. Nesse sentido, é importantíssimo que os
profissionais da língua portuguesa, atuantes no ensino formal ou informal,
tenham um conhecimento profundo e reflexivo deste campo gramatical,
para que possam mostrar seu funcionamento e sua importância para os
estudantes de nosso idioma.

Tentando manter este foco, tornamos público este Caderno de Estudos.


Seu objetivo primeiro e principal é trazer os fundamentos da sintaxe para os(as)
futuros(as) professores(as), a fim de que os entendam (não podemos ensinar o
que não sabemos!) e consigam definir estratégias eficientes e eficazes para seu
ensino. Por isso, traz, em detalhes, as estruturas sintáticas, dialogando com
renomados gramáticos da língua portuguesa, como Napoleão Almeida (2005),
Domingos Cegalla (2008), Evanildo Bechara (2009), entre outros. Além disso,
aventura-se em reflexões sobre as relações sintáticas e suas implicações no
Ensino Fundamental e Médio. Assim, o caderno divide-se em três unidades.

Na primeira unidade estudaremos o que é a sintaxe, suas principais


estruturas, funções e relações. Trabalharemos, também, os conceitos de frase,
oração e período, buscando sempre exemplos nos textos de nosso cotidiano
e tentando refletir sobre seu uso. Além dos dois temas mencionados, nos
ocuparemos dos termos que constituem os períodos simples, iniciando pelos
termos essenciais, passando pelos termos integrantes e finalizando com os termos
acessórios e vocativo. Haverá também atividades e leituras complementares
para que possamos consolidar os conhecimentos que construirmos.

III
A segunda unidade é dedicada aos períodos compostos.
Exploraremos sua estrutura e como se estabelecem as relações coordenativas
e subordinativas. Assim como na primeira unidade, traremos as bases teóricas
encontradas nas gramáticas de nossa língua e tentaremos traçar algumas
linhas reflexivas que nos permitam entender o funcionamento do sistema e
sua lógica. Também aqui exporemos exemplos, apresentaremos atividades
e leituras complementares que permitam a consolidação do conhecimento.

Já a terceira unidade se voltará para o ensino da sintaxe. Nela


poderemos refletir sobre nossa condição de professores de língua portuguesa,
nossas formas de ensinar a sintaxe em sala de aula e como podemos tornar
este processo prazeroso, estimulante e vinculado à nossa prática enunciativa
diária. Para tanto, traremos algumas propostas ou sugestões que possam
dinamizar o ensino da sintaxe e que permitam iniciar, ou continuar, o
processo de retirá-la, assim como a gramática em geral, do rol dos “mais
rejeitados” no Ensino Fundamental e Médio.

Vale reforçar que todas as unidades deste Caderno de Estudo se


articulam com o intuito de aprofundar nossos conhecimentos acerca da
sintaxe, refletir sobre sua dinâmica de funcionamento e traçar estratégias
para seu ensino. Reconhecemos que o caminho é árduo, mas não significa
que não possamos trilhá-lo. Esperamos que você consiga fazer bom uso das
informações que apresentamos e que tenha um ótimo estudo!

Profª. Iara de Oliveira

IV
Iara de Oliveira

Possui graduação em Letras com habilitação em língua portuguesa, língua


espanhola e suas respectivas literaturas. Fez mestrado e doutorado em Literatura,
na Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente trabalha na UNIASSELVI,
ministrando as disciplinas de Comunicação e Expressão e Língua Portuguesa
em diversos cursos de graduação da instituição, bem como as disciplinas de
Metodologia da Pesquisa Científica e Metodologia do Artigo Científico na pós-
graduação. Tem ampla experiência na área da literatura, em que possui artigos
publicados e trabalhos apresentados em eventos, da metodologia científica, da
produção de textos e da Língua Portuguesa com que trabalha diretamente em
sala de aula e nos processos de revisão de textos.

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é
veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA...................... 1

TÓPICO 1 – ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS....................................... 3


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 3
2 O ESTUDO DA SINTAXE................................................................................................................ 3
3 ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS............................................................ 6
4 ENUNCIADOS DA LÍNGUA.......................................................................................................... 8
4.1 FRASE............................................................................................................................................ 8
4.2 ORAÇÃO....................................................................................................................................... 13
4.3 PERÍODO...................................................................................................................................... 14
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 17
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 23
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 24

TÓPICO 2 – ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DAS ESTRUTURAS SIMPLES..................... 29


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 29
2 TERMOS ESSENCIAIS DA ORAÇÃO.......................................................................................... 29
2.1 SUJEITO........................................................................................................................................ 30
2.1.1 Tipos de sujeito..................................................................................................................... 32
2.2 PREDICADO............................................................................................................................... 38
2.2.1 Tipos de predicados............................................................................................................. 39
2.2.2 Predicação verbal e sua classificação................................................................................. 43
3 TERMOS INTEGRANTES DA ORAÇÃO..................................................................................... 47
3.1 COMPLEMENTOS VERBAIS............................................................................................... 48
3.1.1 Objeto direto.......................................................................................................................... 48
3.1.2 Objeto indireto...................................................................................................................... 51
3.2 COMPLEMENTO NOMINAL.............................................................................................. 51
3.3 AGENTE DA PASSIVA........................................................................................................... 52
4 TERMOS ACESSÓRIOS DA ORAÇÃO........................................................................................ 56
4.1 ADJUNTO ADNOMINAL..................................................................................................... 57
4.2 ADJUNTO ADVERBIAL........................................................................................................ 58
4.3 APOSTO........................................................................................................................................ 59
5 VOCATIVO.......................................................................................................................................... 60
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 64
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 69
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 71

UNIDADE 2 – A SINTAXE DA LÍNGUA PORTUGUESA: ESTRUTURAS FRASAIS


COORDENADAS E SUBORDINADAS................................................................ 75

TÓPICO 1 – ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DAS ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS


COMPOSTAS.................................................................................................................. 77
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 77
2 O PERÍODO COMPOSTO............................................................................................................... 77
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 84

VII
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 91
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 92

TÓPICO 2 – ESTRUTURAS FRASAIS COORDENADAS........................................................... 95


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 95
2 PERÍODO FORMADO POR COORDENAÇÃO......................................................................... 95
2.1 ORAÇÕES COORDENADAS ASSINDÉTICAS............................................................. 96
2.2 ORAÇÕES COORDENADAS SINDÉTICAS................................................................... 97
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 106
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 112
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 113

TÓPICO 3 – ESTRUTURAS FRASAIS SUBORDINADAS.......................................................... 117


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 117
2 PERÍODO FORMADO POR SUBORDINAÇÃO........................................................................ 117
2.1 CLASSIFICAÇÃO DAS ORAÇÕES SUBORDINADAS.............................................. 120
DESENVOLVIDAS................................................................................................................... 120
2.1.1 Orações subordinadas substantivas................................................................................... 121
2.1.2 Orações subordinadas adjetivas:........................................................................................ 127
2.1.3 Orações subordinadas adverbiais...................................................................................... 130
2. 2 ORAÇÕES SUBORDINADAS REDUZIDAS................................................................. 135
2.2.1 Orações reduzidas de infinitivo.......................................................................................... 136
2.2.2 Orações subordinadas reduzidas de gerúndio................................................................ 138
2.2.3 Orações subordinadas reduzidas de particípio................................................................ 139
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 141
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 148
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 149

UNIDADE 3 – MÉTODOS E TÉCNICAS DE ENSINO DA SINTAXE DA LÍNGUA


PORTUGUESA............................................................................................................ 153

TÓPICO 1 – A SINTAXE E A SALA DE AULA................................................................................ 155


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 155
2 SINTAXE EM SALA DE AULA: NORMA OU USO?.................................................................. 155
2.1 O ESTUDO DA GRAMÁTICA.............................................................................................. 157
2.2 O(A) PROFESSOR(A) DE LÍNGUA PORTUGUESA E O ENSINO
DE SINTAXE............................................................................................................................... 160
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 166
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 173
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 174

TÓPICO 2 – MÉTODOS E TÉCNICAS DE ENSINO DA SINTAXE.......................................... 177


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 177
2 ENSINANDO SINTAXE E OUTRAS COISAS MAIS................................................................. 177
2.1 O TEXTO VERBAL ESCRITO............................................................................................... 179
2.2 AS TIRINHAS E AS CHARGES........................................................................................... 183
2.3 AS PROPAGANDAS................................................................................................................ 191
2.4 AS MÚSICAS............................................................................................................................... 195
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 201
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 207
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 208
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 213

VIII
UNIDADE 1

ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA
LÍNGUA PORTUGUESA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Ao final desta unidade você deverá ser capaz de:

• identificar as estruturas, relações e funções sintáticas dos enunciados em


língua portuguesa;

• relacionar os conceitos de frase, oração e período;

• analisar os elementos constitutivos do período simples;

• relacionar os elementos constitutivos do período simples, observando


suas aplicações na prática enunciativa.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está divida em dois tópicos e no final de cada um deles você
encontrará atividades que reforçarão o seu aprendizado.

TÓPICO 1 – ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

TÓPICO 2 – ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DAS ESTRUTURAS


LINGUÍSTICAS SIMPLES

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

1 INTRODUÇÃO
Você vem estudando a Língua Portuguesa ao longo deste curso e,
certamente, já aprendeu a forma como está estruturada e os elementos que a
constituem. Na morfologia, as estruturas foram vistas isoladamente, para que se
pudessem identificar seus processos de formação e suas significações individuais.
A partir de agora, estudaremos essas estruturas e as relações que estabelecem
entre si com o intuito de estabelecer comunicação, ou seja, estudaremos as
relações sintáticas.

Neste primeiro tópico, nossa preocupação será entender o conceito de


sintaxe e reconhecer as estruturas, as relações e as funções sintáticas. Para isso,
veremos os conceitos de frase, oração e período. Pronto(a) para começar? Então,
vamos ao estudo!

2 O ESTUDO DA SINTAXE
Observe as seguintes estruturas:

1. De gosto eu chocolate.
2. Ed osgot ue ctehoolca.

Pense: da forma como está, a informação faz sentido nas estruturas 1 e 2?


Não, é claro!

Embora consigamos identificar o sentido das palavras isoladamente


na forma 1 e reconheçamos o alfabeto da língua portuguesa na estrutura 2, a
maneira como estão dispostas nos causa estranheza e desconforto. Isso prova
que a língua, além de composta por um grande número de vocábulos, também
apresenta regras de como combiná-los para que possam atingir seu objetivo
comunicativo, formando, assim, um enunciado.

3
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

E
IMPORTANT

“Enunciado é tudo aquilo que é dito ou escrito. É uma sequência de palavras


de uma língua que costuma ser delimitada pAor marcas formais: na fala, pela entonação;
na escrita, pela pontuação. O enunciado está sempre associado ao contexto em que foi
produzido” (ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 505).

É importante lembrar que, embora a língua apresente regras para a junção


das palavras, isso não significa dizer que exista apenas uma possibilidade de
combinação. Essas regras são o que, a grosso modo, denominamos sintaxe.

Voltemos para as estruturas que havíamos visto anteriormente, agora


acrescidas de outra, organizada diferentemente das demais:

1. De chocolate, eu gosto.
2. Eu, de chocolate, gosto.
3. Eu gosto de chocolate.

Perceba, caro(a) acadêmico(a), que conseguimos transmitir a mesma ideia


de três formas diferentes, ou seja, fazendo três combinações distintas.

E
IMPORTANT

Acredita-se que na Grécia Antiga se desenvolveu inicialmente a morfologia


e, em seguida, a análise gramatical. Embora entre os estudiosos gregos houvesse uma
preocupação com as relações sintagmáticas entre os vocábulos, os fundamentos da sintaxe
só avançaram na Idade Média (AZEREDO, 1990).

Portanto, podemos afirmar que a sintaxe estabelece as possibilidades de


associação das estruturas linguísticas para a formação de enunciados, bem como
organiza a estrutura dos sintagmas que se combinarão em uma sentença. Estudar
a sintaxe, nesse sentido, é conhecer as relações que as palavras mantêm entre si
em uma oração.

Mas não é apenas isso. Azeredo (1990, p. 10) traz uma contribuição
importante para nosso estudo:

4
TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

A cada instante pode-se estar pronunciando uma frase nova. Afinal,


ninguém pode garantir que a frase que inicia este parágrafo e a que
estou escrevendo agora não são inéditas. Eu não as tinha memorizadas,
muito menos o leitor, e, apesar disso, não houve qualquer dificuldade
para produzi-las e entendê-las. Nós não apreendemos o significado
de cada uma das frases possíveis como se nada tivessem em comum
umas com as outras. Todas elas, aceitas como estruturas da língua
pelos usuários, se criam graças a um sistema de unidades – sons,
palavras, afixos, acentos – e regras que as combinam.

A sintaxe – numa definição provisória, visto que ambiciosa – é a


parte desse sistema que permite criar e interpretar frases. A sintaxe
do português, por exemplo, compreende as regras que tanto tornam
possíveis enunciados banais como “Hoje é domingo” ou “Que dia
é hoje”, ou excêntricos, como “Napoleão temia que as tartarugas
desovassem no seu imponente chapéu”, quanto impedem sequências
como “Que dia serem hoje?” ou “Seu imponente temia as que chapéu
desovassem Napoleão tartarugas no”.

A sintaxe, portanto, preocupa-se em analisar e explicar as relações entre a


forma e o sentido das orações. Assim, seu estudo permite que conheçamos como
as orações se estruturam em nossa língua e as possíveis relações que estabelecem
entre si e umas com as outras.

Ainda sobre essa questão, Bechara (2009) menciona que alguns usam
o termo morfossintaxe por julgarem que os enunciados podem ser vistos por
sua forma (as palavras e sua estrutura individual) e por suas relações, mas, de
acordo com sua concepção, a pura gramática se baseia na sintaxe, porque ela
já traz consigo a concepção de forma. “Ocorre que, a rigor, tudo na língua se
refere sempre a combinações de ‘formas’, ainda que seja combinação com zero
ou ausência de ‘forma’; assim toda essa pura gramática é na realidade sintaxe, já
que a própria oração não deixa de ser uma ‘forma’ [...].” (BECHARA, 2009, p. 54,
grifos do autor).

DICAS

Considerando o que Bechara (2009) afirma sobre sintaxe e sua relação direta
com a forma, lembre-se, acadêmico(a): para aproveitar melhor os estudos sobre sintaxe, é
importante que você também conheça os aspectos morfológicos de nossa língua. Caso
seja necessário repassar estes conhecimentos, volte ao Caderno de Morfologia da Língua
Portuguesa.

5
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

Atualmente, a sintaxe é objeto de grandes discussões no meio acadêmico,


especialmente no que se refere às questões sobre sintaxe e sala de aula.
Pesquisadores como José Carlos de Azeredo, Maria Helena de Moura Neves,
Luiz Carlos Travaglia, comprovam, em seus estudos, que nossas escolas, embora
tenham avançado consideravelmente neste campo, insistem em apresentar um
sem fim de regras, exemplificadas com exemplos forjados, que só tornam o
estudo dessa área gramatical difícil e sem propósito. Todos defendem a tese de
que é preciso mostrar a utilidade prática da sintaxe, como é seu funcionamento
em nossa produção textual diária porque, assim como a língua está em constante
processo de transformação, as relações sintáticas também se modificam para que
a comunicação ocorra de forma eficiente e eficaz. Assim, defendem o que chamam
de “o ensino da gramática do uso da língua”. Mas antes de aprofundarmos nossas
reflexões nesta direção, vamos, a seguir, estudar o funcionamento da sintaxe: sua
estrutura, relações e funções.

Também vale destacar que com o avanço dos estudos linguísticos, a briga
entre norma e uso vem se tornando cada vez mais acirrada. Linguistas como
Marcos Bagno defendem a perspectiva de valorização da língua falada em sala
de aula, do respeito às variantes linguísticas e do entendimento de que a norma
culta (priorizada pelas gramáticas) é uma das muitas variantes de nossa língua.
E, você, acadêmico(a), como se posiciona a respeito?

DICAS

Para melhor compreender essa proposta da gramática com enfoque no uso


da língua, indicamos a Gramática de usos do português, de Maria Helena de Moura Neves,
de 2011, publicada pela Editora UNESP.

3 ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS


Sabemos que os enunciados “[...] formam unidades linguísticas que
possuem uma estrutura sintática, ou seja, demonstram uma organização
específica, prevista pela língua” (ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p.
505). Para entendermos o que é uma estrutura sintática, precisamos estudar e
compreender o que significa essa relação e função sintática.

Vejamos:

para a de
Maria estudou prova matemática.

6
TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

Ao dizermos Maria estudou para a prova de matemática, estamos estabelecendo


uma relação entre a pessoa de Maria e estudou para a prova de matemática. Afirmamos
que Maria foi agente da ação estudar. Igualmente, estabelecemos uma relação
entre estudou e para prova de matemática porque especificamos qual foi o objetivo
do estudo. E, mais, relacionamos prova com de matemática, pois novamente
especificamos qual o tipo de prova para o qual Maria deveria estudar.

Essas ligações que podemos fazer entre as palavras, identificando uma


lógica, um sentido, são as relações sintáticas.

Agora, observemos:

Predicado verbal do sujeito Maria

Maria estudou para a de


prova matemática.

(Sujeito do verbo estudar) objeto indireto de estudar adjunto adnominal

Cada um dos elementos do enunciado exerce uma função sintática, ou


seja, tem um objetivo específico. Só conseguimos estabelecer a relação entre os
termos e compreendermos seu sentido porque há uma função sintática para cada
um deles.

Sendo assim, é importante entender que:

Relação sintática é a conexão de sentido que se pode estabelecer entre as


partes de um enunciado.

Função sintática é o papel que cada termo desempenha em um enunciado.

Para identificar as funções sintáticas nos enunciados da língua, ou seja,


qual é a ação que cada termo cumpre em um enunciado, fazemos a análise
sintática, que “[...] examina a estrutura do período, divide e classifica as orações
que o constituem e reconhece a função sintática dos termos de cada oração”
(CEGALLA, 2008, p. 319).

Para que possamos analisar um período, estabelecendo quais as


funções que o compõem, precisamos, primeiramente, compreender algumas
características próprias, que nos orientam durante o processo da análise sintática.
É o que veremos a seguir.

7
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

4 ENUNCIADOS DA LÍNGUA
Existem três unidades, com características estruturais próprias,
identificadas quando se estudam os enunciados da língua, que precisamos
conhecer: frase, oração, período. Como forma de tornar nossa reflexão mais
didática, analisaremos cada uma dessas unidades separadamente.

4.1 FRASE
A primeira unidade sintática apresentada pelas gramáticas é a frase. A
frase é definida por Cegalla (2008, p. 319), como “[...] todo enunciado capaz de
transmitir, a quem nos ouve ou lê, tudo o que pensamos, queremos ou sentimos.
Pode revestir as mais variadas formas, desde a simples palavra até o período mais
complexo, elaborado segundo os padrões sintáticos da língua”.

Portanto, frases são enunciados com sentido completo, utilizados no


processo de comunicação.

Observe:

Socorro!
O que será de nós?
Pare!
Há muito tempo o homem luta por reconhecimento social e, para isso, é
capaz de chegar aos limites de sua condição física e psicológica.

Todos os enunciados acima se constituem como frases porque ao lê-los


entendemos seu sentido. Assim, para que não nos esqueçamos, “[...] frase é a
unidade fundacional do discurso, ou seja, da atividade comunicativa que se
realiza por meio da palavra” (AZEREDO, 2008, p. 136).

Sobre a frase ainda é possível afirmar que ela se define não pela extensão que
possui, mas por seu propósito de comunicação. Ela se caracteriza por apresentar
uma entonação inicial e final, na oralidade, e pelo uso da pontuação, na escrita,
facilitando a leitura e, consequentemente, a ampliação de conhecimento. Algumas
frases são tidas como situacionais, porque só podem ser compreendidas dentro do
contexto do qual fazem parte (o escrito ou a situação em que o falante está).

Veja um exemplo:

- Terminar as frases dos outros?

Assim, isoladamente, a frase não parece ter um sentido completo, porque


foi tirada da situação em que estava inserida. Somente no contexto em que foi
produzida fará sentido. Observe:
8
TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

- Eu...
- Queria me dizer uma coisa?
- É. Acho que...
- Esta nossa relação não vai dar certo?
- Isso. Eu simplesmente não...
- Aguenta mais?
- Exato. Esse seu hábito de...
- Terminar as frases dos outros?
- É. É! Eu tentei, mas...
- Não consegue?
- Não consigo. Não é nada...
- Contra mim? É só porque eu termino as suas frases?
- É. Porque você...
- Faço isso...
- É. Sempre termina a...
- Frase dos outros? Porque eu já sei o que vão dizer. Você é o quinto ou
sexto namorado que me diz a mesma coisa.
- Quer dizer que nós nos tornamos...
- Previsíveis? Se tornaram.
- Todos reclamam...
- Da mesma coisa? Reclamam.
- Bom, então é...
- Tchau?
- É.

(VERÍSSIMO, Luís Fernando. Namorados. O Estado de São Paulo, 13 jun.


2004).

Agora ficou fácil entender o que significa, já que conseguimos identificar


o contexto que gerou a frase, por isso é chamada de situacional.

Há, ainda, as frases denominadas de verbais, porque apresentam o verbo


em sua estrutura, e as chamadas de nominais porque se constituem sem o verbo.
Observe:

Cada macaco está em seu galho. = Frase verbal (verbo estar).

Cada macaco no seu galho. = Frase nominal (não há verbos na sua


estruturação).

Alguns gramáticos, dentre eles Cegalla (2008), Napoleão Almeida (2005),


Bechara (2009), estabelecem uma tipologia da frase de acordo com o sentido que
elas podem assumir nos contextos comunicativos.

9
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

Elas podem ser:

Frases declarativas: são aquelas que têm por objetivo afirmar algo,
apresentar um juízo sobre alguém ou alguma coisa, fazer uma declaração. As
frases declarativas podem ser afirmativas, quando encerram uma ideia positiva;
ou negativas, quando encerram uma ideia de negação.

Exemplo:

Fomos ao shopping. = Frase afirmativa.

Não fomos ao shopping. = Frase negativa.

UNI

Qualquer um dos tipos de frases apresentados acima pode exibir uma forma
positiva ou negativa, encerrando afirmações ou negações em sua estrutura.

Frases interrogativas: são aquelas cujo objetivo é interrogar, perguntar,


questionar. São perguntas, questionamentos formulados pelo emissor da
mensagem.

Exemplo:

Que horas são?

Você virá à festa da turma?

Almeida (2005) as subdivide em diretas e indiretas. As frases interrogativas


diretas são aquelas que se expressam em uma oração absoluta.

Exemplos:

Quem trouxe o material, hoje?

Será que chove?

10
TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

As frases interrogativas indiretas são, por sua vez, aquelas cujo “sentido
interrogativo depende de um verbo principal que indique desconhecimento ou
desejo de informação” (ALMEIDA, 2005, p. 408).

Exemplos:

Maria quis saber por que não poderia ir ao baile.

Não sei por que saiu.

Perceba que as orações por que não poderia ir ao baile e por que saiu
indicam uma interrogação, um questionamento, mas aparecem de forma indireta,
auxiliadas pelo verbo saber.

Frases imperativas: seu objetivo é ordenar, exortar, pedir, expressar


proibições, conselhos. Utilizam verbos no modo imperativo.

Exemplo:

FIGURA 1 – TIRINHA

FONTE: Disponível em: <http://blogdastirinhas.blogspot.com.br/2010/12/garfield-n-73-ao-78.


html>. Acesso em: 12 out. 2012.

As frases Pegue aquele rato!, Espere um minuto, Deixe-me colocar meu tênis de
corrida são imperativas, pois expressam ordem (na primeira e segunda) e pedido
(terceira).

Frases exclamativas: seu objetivo é transmitir admiração, surpresa,


espanto, arrependimento etc. Nelas o emissor exterioriza um estado afetivo.

Exemplo:

11
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

FIGURA 2 – TIRINHA

FONTE: Disponível em: <http://www.not1.xpg.com.br/quadrinhos-turma-da-monica-os-mais-


-engracados-e-divertidos/>. Acesso em: 12 out. 2012.

Perceba que as frases Deu certo!! e A cobra está saindo!! demonstram


claramente a surpresa e o entusiasmo da personagem.

Frases optativas: seu objetivo é expressar um desejo.

Exemplo:

Tomara que tudo dê certo!

Bons ventos o tragam!

Frases imprecativas: seu objetivo é expressar uma praga, uma maldição.

Exemplo:

Que um raio caia na minha cabeça se estou mentindo!

Maldita seja aquela que me abandonou!

E
IMPORTANT

É importante ressaltar que essa classificação não é unanimidade entre os


gramáticos e seria bem interessante que você consultasse algumas gramáticas para verificar
como cada uma delas faz a classificação.

Agora que já entendemos o funcionamento das frases, vamos estudar o


conceito de orações.
12
TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

4.2 ORAÇÃO
Na seção anterior, vimos que a frase tem propriedades discursivas, ou
seja, é caracterizada pela relação que estabelece com o contexto comunicativo. Na
frase, o enunciado é analisado por suas ligações com a situação de comunicação.
No entanto, é possível estudar os enunciados levando-se em consideração as
relações entre as palavras e a função que cada uma desempenha. Por isso, sob
esta perspectiva, uma unidade sintática importante é a oração.

A oração é uma estrutura linguística que se articula pela presença de um


predicado. Como o predicado é, em língua portuguesa, introduzido por um verbo,
podemos dizer que a oração se estrutura em torno de um verbo ou locução verbal,
ou seja, em torno do sintagma verbal. Como sua perspectiva é caracterizada pela
presença no verbo, não necessariamente apresenta sentido completo.

Para deixar mais clara a diferença, frase é todo e qualquer enunciado


capaz de estabelecer comunicação (aí se incluem oração e período). Ela pode ser
composta por uma única palavra, substantivos e verbos, só substantivos etc. A
oração, obrigatoriamente, se estrutura em torno do verbo, por isso ela pode ter
sentido completo ou não. A frase não é frase se não tiver sentido completo. Por
isso nem toda frase é uma oração (porque nem sempre haverá o verbo) e nem
toda oração será uma frase, porque em várias situações ela não terá seu sentido
completo, necessitando de outras orações para isso.

Exemplo:

FIGURA 3 – CHARGE

FONTE: Disponível em: <http://falacerto.blogcindario.com/2011/04/


00005-o-papel-do-verbo-na-oracao.html>. Acesso em: 12 out. 2012.

Podemos afirmar que o primeiro balão, Que beleza a cidade de vocês! é uma
frase, pois apresenta um sentido completo na situação em que está inserida,

13
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

mas não apresenta verbo. Já o enunciado do segundo balão, Imagina se tivesse


prefeito!!!, é formado por duas orações porque se estrutura em torno de dois
verbos, “imagina” e “tivesse”.

E
IMPORTANT

Você sabe o que é um sintagma?


Souza e Silva e Koch (2000, p. 14) explicam que: “O sintagma consiste num conjunto de
elementos que constituem uma unidade significativa dentro da oração e que mantêm
entre si relações de dependência e de ordem. Organizam-se em torno de um elemento
fundamental, denominado núcleo, que pode, por si só, constituir um sintagma”. Os principais
sintagmas, segundo, ainda, as autoras, são:
Sintagma verbal é a estrutura cujo núcleo é um verbo.
Sintagma nominal é a estrutura cujo núcleo é um substantivo.
Sintagma adjetival, cujo núcleo é um adjetivo.

Como já estudamos os conceitos de frase e de oração, partamos para o


estudo do período.

4.3 PERÍODO
Existe, ainda, uma terceira unidade sintática prevista pela gramática: o
período. “Período é um enunciado de sentido completo constituído por uma ou
mais orações” (ABAURRE; ABAURRE; PONTARA, 2010, p. 509).

Exemplos:

Fomos à sua casa, mas não havia ninguém. (duas orações: fomos é o
núcleo da primeira, havia é o núcleo da segunda).

Depois de irmos ao cinema, compramos sapatos, visitamos uma amiga


hospitalizada e tomamos um café. (quatro orações: irmos é o núcleo da primeira,
compramos é o núcleo da segunda, visitamos é o núcleo da terceira e tomamos é
o núcleo da quarta).

Os períodos podem ser classificados em simples ou compostos.

Período simples é aquele constituído por uma única oração, ou seja, que
apresenta um só verbo ou locução verbal.

Exemplo:

14
TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

João ofereceu um livro a Joana. (um verbo = ofereceu = um período)

Período composto é aquele constituído por mais de uma oração, quer


dizer, por mais de um verbo ou locução verbal.

Exemplo:

O povo anseia que haja uma eleição justa. (dois verbos = anseia, haja =
dois períodos)

E
IMPORTANT

Lembre-se: a presença de um verbo indica uma oração. Dessa forma, teremos,


no período composto, tantas orações quanto forem os verbos que introduzirem predicados
específicos.

O esquema a seguir ajuda-nos a visualizar as três unidades sintáticas que


estudamos até o momento.

ESQUEMA 1 - FRASE, ORAÇÃO E PERÍODO

FONTE: A autora.

15
UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

DICAS

O professor Fábio Alves tem vários vídeos nos quais ensina os aspectos da nossa
gramática. Indicamos o link do vídeo em que ele expõe as questões de sintaxe que vimos neste
tópico <http://www.youtube.com/watch?v=6R-OYnIvzlQ>.
Além dele, o livro Iniciação à sintaxe do português, de José Carlos de Azeredo, de 1990, publicado
pela Editora Zahar, também traz contribuições significativas para o estudo deste tema.

Para descontrair:

Leia o bem-humorado poema de Paulo Leminski que aborda as questões


relativas à sintaxe:

O assassino era o escriba

Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente.


Um pleonasmo, o principal predicado de sua vida,
regular como um paradigma da 1ª conjugação.
Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial,
ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito
assindético de nos torturar com um aposto.
Casou com uma regência.
Foi infeliz.
Era possessivo como um pronome.
E ela era bitransitiva.
Tentou ir para os E.U.A.
Não deu.
Acharam um artigo indefinido na sua bagagem.
A interjeição do bigode declinava partículas expletivas,
conectivos e agentes da passiva, o tempo todo.
Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça.

FONTE: LEMINSKI, Paulo. Caprichos e relaxos. São Paulo: Brasiliense, 1983. p. 144.

Para ampliar nossos estudos sobre o assunto abordado neste primeiro


tópico, reproduzimos um fragmento do livro Iniciação à sintaxe do português,
de José Carlos de Azeredo (1990), que aborda a questão da frase, da oração e,
consequentemente, dos sintagmas que as constituem. Também, para melhor
compreender e estabelecer algumas relações com os assuntos abordados até aqui,
leia atentamente o texto a seguir, anote as principais ideias e discuta-as com os
colegas no próximo encontro.

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TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

LEITURA COMPLEMENTAR

IV. CATEGORIAS DE DESCRIÇÃO GRAMATICAL

1. Frase e oração

Um conceito-chave em toda a análise gramatical é o de unidade. Fonemas,


sílabas, vocábulos, estrofes, parágrafos, capítulos são unidades de diferentes
planos, níveis, tipos. Nas páginas precedentes abordamos a noção de texto,
definido, não em termos de sua própria constituição interna, mas enquanto
unidade de comunicação. O texto é, portanto, uma entidade pertencente ao
domínio do ato verbal de comunicação, isto é, do discurso. Neste domínio,
portanto, situa-se a frase, que é o menor texto possível.

Na sua realização mais aderente ao contexto situacional, a frase toma


a forma de uma interjeição, a qual representa globalmente a situação a que se
refere. No outro extremo, apresenta normalmente uma estrutura bimembre – a
oração – centrada em um verbo com o qual se faz uma declaração – predicado –
sobre um dado tema – sujeito.

Enquanto representação analítica de um conteúdo, portanto, a oração


articula as funções sujeito e predicado, e, no predicado, o processo verbal e a
época de sua ocorrência relativamente ao momento da enunciação – tomado
como polo do universo comentado -, ou a um momento histórico – tomado como
polo do universo narrado (cf. VII. 1b e VIII. 3).

As interjeições, as inscrições meramente indicativas do tipo saída, Casas


Pernambucanas, as frases imperativas, exclamativas e as interrogativas não
retóricas acham-se necessariamente unidas à situação em que se enunciam.
Ordens e exclamações se exprimem frequentemente por simples interjeições.
Somente frases declarativas podem ser totalmente alheias ao contexto situacional
e, portanto, inteiramente interpretáveis sem o seu respaldo. Elas são típicas de
qualquer texto em que prevaleça a chamada ‘função referencial’ da linguagem.

De qualquer forma, declarativas ou não, as frases que representam


analiticamente um conteúdo fazem-no segundo os princípios sintáticos da língua,
isto é, o sistema de unidades hierarquizadas – palavras, sintagmas, orações – e
relacionadas umas às outras por um conjunto de mecanismos formais.

2. A hierarquia gramatical

A estrutura gramatical do português comporta vários níveis. O morfema


é a menor unidade dessa estrutura; e o período, a maior. Acima do nível dos
morfemas acha-se o dos vocábulos; acima deste, o dos sintagmas, a que se superpõe
o das orações. Esquematicamente, temos:

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UNIDADE 1 | ESTRUTURAS LINGUÍSTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

Período.
Oração.
Sintagma.
Vocábulo.
Morfema.

E exemplificando:
Nível do período ........ os meninos brincavam com uma pazinha.
Nível de oração ......... os meninos brincavam com uma pazinha.
Nível dos sintagmas .. os meninos/ brincavam com uma pazinha.
Nível dos vocábulos .. os/ meninos/ brincavam/ com/ uma/ pazinha.
Nível dos morfemas .. o/s/ menin/o/s brinc/a/va/m com/ um/a pa/zinh/a.

Provisoriamente, diremos que a análise gramatical consiste em identificar


essas unidades e as regras que permitem combiná-las entre si em cada nível.
Tradicionalmente, os compêndios têm-se referido aos níveis da oração e
do período, recobertos pela sintaxe, e aos níveis do morfema e do vocábulo,
recobertos pela morfologia. Manteremos esta distinção, por considerá-la adequada
à descrição da gramática do português. O único problema está em não se ter
explicitado outro nível – o dos sintagmas – que medeia entre os vocábulos e a
oração. Com efeito, os vocábulos não se unem para formar a oração do mesmo
modo que os gomos se unem para formar uma laranja. Os vocábulos não formam
a oração senão indiretamente. Eles se associam em grupos, os sintagmas, que são
os verdadeiros constituintes da oração.

Vamos ilustrar essa afirmação tomando para exemplo o seguinte período:

12. O prisioneiro desatou o nó das cordas com os dentes

Proporemos inicialmente a segmentação desse período nos seguintes


sintagmas: ‘o prisioneiro’, ‘desatou o nó das cordas’, e ‘com os dentes’. Poderíamos
nos perguntar por que os sintagmas são estas e não outras sequências, como: 1 – ‘o
prisioneiro desatou’ e ‘o nó das cordas com os dentes’, 2 – ‘o prisioneiro’, ‘desatou
o nó’ e ‘das cordas com os dentes’, ou 3 – ‘o prisioneiro’ e ‘desatou o nó das cordas
com os dentes’ (que, como se verá, é compatível com a que propusemos).

É que as unidades gramaticais se definem por meio de certas peculiaridades


distribucionais, como posição e mobilidade. Por exemplo, é possível deslocar
para a primeira posição do período toda a sequência ‘com os dentes’.

12b. Com os dentes, o prisioneiro desatou o nó das cordas.

A possibilidade desse movimento é suficiente para provar que esta


sequência é um sintagma. Também pelo deslocamento se identifica como sintagma
o segmento ‘o prisioneiro’.

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TÓPICO 1 | ESTRUTURA, RELAÇÕES E FUNÇÕES SINTÁTICAS

12c. Com os dentes, desatou o prisioneiro o nó das cordas.

Outro procedimento é a substituição da sequência por uma unidade


simples. Observemos:

13. Mandaram amarrar o prisioneiro e apertar bem o nó das cordas, mas


ele (=o prisioneiro) desatou-o (=o nó das cordas) com os dentes.

Sequências que se deixam substituir por unidades simples no interior das


orações também são sintagmas.

Um terceiro (e aqui último) procedimento que vamos adotar é a


interposição de um ‘e’. Normalmente, a presença de um ‘e’ indica a união de duas
unidades pertencentes ao mesmo nível. Isto se passa em:

14. O prisioneiro e seu amigo desataram o nó das cordas com os dentes.

15. O prisioneiro desatou o nó das cordas com os dentes e fugiu.

‘Fugir’ é uma unidade funcionalmente (e distribucionalmente) equivalente


à outra a que se une por meio do ‘e’, podendo, por isso, substituí-la, como em 16.
O prisioneiro fugiu.

O ‘e’ inserido em 15 não está, por conseguinte, ligando o verbo ‘desatou’


à forma ‘fugiu’, nem tampouco a forma ‘fugiu’ ao substantivo ‘dentes’ que a
precede; o ‘e’ está unindo sintaticamente toda a sequência ‘desatou o nó das
cordas com os dentes’ à forma capaz de substituí-la, ‘fugiu’. Isto constitui prova
suficiente de que toda esta sequência opera como uma unidade funcional, da
mesma sorte que a unidade simples ‘fugiu’.

Agora que sabemos por que a divisão inicial e as três são compatíveis,
conclui-se que uma unidade de nível mais baixo pode combinar com uma unidade
de nível imediatamente superior para compor outra unidade neste mesmo nível.
É o que se dá em ‘desatou o nó das cordas com os dentes’: ‘desatou’, que é um
vocábulo, combina-se com os dois sintagmas – ‘o nó das cordas’ e ‘com os dentes’
– para formar um sintagma mais complexo: verbo + sintagma + sintagma.

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