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MICROTERRITORIALIDADES NA PRAIA DE IPANEMA/RJ: O EXEMPLO

DOS PRATICANTES DE ALTINHO


Bianca Lyrio1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
bialyriomap@gmail.com

RESUMO

Desde a refuncionalização das praias cariocas, na virada do século XIX para o XX, tais
locais têm sido utilizados de diversas maneiras no âmbito do lazer, e dentre estas formas
se inserem as práticas esportivas, em variado leque de modalidades. Neste sentido, este
trabalho apresenta uma pequena contribuição para o tema das microterritorialidades
dentro do espaço praiano. Logo em seu primeiro mandato, em 2009, o então prefeito do
município do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, através de uma política de ordenamento
territorial, o Choque de Ordem, proibiu as práticas esportivas no espelho d’água em
horário estendido. Sendo assim, notamos que os praticantes deste esporte não se
conformaram com esta imposição arbitrária, sempre contestando este impedimento,
burlando as regras e praticando estas atividades de lazer no espelho d’água fora do
horário permitido.

INTRODUÇÃO

Trataremos aqui sobre a atividade esportiva denominada Altinho (ou Altinha,


como também é conhecida), surgida nas areias da Praia de Ipanema, município do Rio
de Janeiro RJ, a qual apresenta microterritórios móveis, extremamente voláteis, fugazes,
em que não há uma delimitação específica para acontecer, ocorrendo ao longo de toda a
faixa de areia.
É importante salientar também que este artigo é fruto de meu trabalho de
monografia, o qual vem sendo enriquecido a cada novo debate que participo, com as
disciplinas do mestrado e com o próprio Encontro Nacional de Geógrafos (2018).

1
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia da UERJ.
Nosso objetivo consiste em analisar um dos inúmeros exemplos de
microterritorialidades que ocorrem entre os agentes que exercem alguma atividade
esportiva e o meio praiano – o altinho – ou seja, como estes produzem o espaço.
Utilizamos como metodologia o levantamento bibliográfico dos diversos
autores que poderiam vir a contribuir de alguma forma com a nossa temática. Após
leitura minuciosa, selecionamos as obras que de fato nos ajudariam na construção deste
artigo. Além disso, alguns trabalhos de campo foram necessários para que nossa
investigação fosse ainda mais rica nos detalhes. Portanto, nossa pesquisa mescla um
pouco de teoria e empirismo. É importante ressaltar que as conversas com os praticantes
de altinho foram extremamente informais, por isso, preferimos não chamá-las de
entrevistas, visto que este termo carrega alto grau de formalidade. Ademais, buscando
uma maior contribuição para o assunto, acessamos diversos portais de notícia com o
intuito de trazer ainda mais informações que pudessem agregar nossa investigação.
Uma das questões mais polêmicas envolvendo estes agentes foi a proibição
pelo então prefeito Eduardo Paes (2009-2016), ainda em seu primeiro mandato, através
da Operação Choque de Ordem, que tinha por objetivo impor a ordenação urbana à
cidade. Acerca desse tema, analisaremos o controverso impedimento de se praticar tal
esporte no espelho d’água (das oito da manhã até às dezessete horas da tarde), área
tradicionalmente tomada pelos jogadores. Assim, procuramos combinar este tópico com
a temática das microterritorialidades, assunto relativamente incipiente na Geografia.
Este trabalho está dividido em duas partes. A primeira consiste em uma breve
discussão sobre os conceitos de territorialidade e microterritorialidade, buscando uma
base teórica para nosso foco: as disputas de poder que ocorrem entre os praticantes de
altinho e a figura do prefeito, representado pela guarda municipal. A segunda parte
mostrará como a polêmica proibição de esportes na beira do mar afetou a vida dos
frequentadores da praia de Ipanema, promovendo lutas por pequenas parcelas do espaço
praiano – os microterritórios.

SOBRE TERRITORIALIDADES E MICROTERRITORIALIDADES: BREVES


APONTAMENTOS TEÓRICOS
Concordamos com o significado que Sack (1986) dá ao conceito de
territorialidade, sendo este entendido como a estratégia utilizada pelo homem para
exercer o controle sobre pessoas e coisas por meio do domínio de uma determinada área
(que é o território). O autor destaca ainda que a territorialidade ocorre em diversos
níveis e conjunturas sociais, tanto nas relações do dia-a-dia quanto nas organizações
complexas. Como já pode ter sido percebido, nosso trabalho aborda o primeiro tipo, ou
seja, as relações de poder estabelecidas no cotidiano das práticas esportivas construídas
na praia. Enfim, nas palavras do autor, a territorialidade pode ser entendida como “a
tentativa de um indivíduo ou grupo de afetar, influenciar ou controlar pessoas,
fenômenos e relações, através da delimitação e da afirmação do controle sobre uma área
geográfica” (SACK, 1886, p. 22).
Para Raffestin (1993), a territorialidade deve ser entendida através de uma
perspectiva de múltiplas dimensões, em que as relações entre os indivíduos, as quais são
sempre relações de poder, são processo e produto territorial. Assim, podemos apreender
que a territorialidade é intrínseca às relações vividas em sociedade. Nas palavras do
autor

De acordo com a nossa perspectiva, a territorialidade adquire um valor bem


particular, pois reflete a multidimensionalidade do "vivido" territorial pelos
membros de uma coletividade, pelas sociedades em geral. Os homens
"vivem", ao mesmo tempo, o processo territorial e o produto territorial por
intermédio de um sistema de relações existenciais e/ou produtivistas. Quer se
trate de relações existenciais ou produtivistas, todas são relações de poder,
visto que há interação entre os atores que procuram modificar tanto as
relações com a natureza como as relações sociais (RAFFESTIN, 1993, p. 14).

Através das concepções sobre territorialidades dos dois autores supracitados,


podemos traçar alguns paralelos com nosso trabalho. Primeiro, a compreensão de Sack
(1986) desse conceito, entendido como as estratégias usadas pelos homens para exercer
o controle sobre o território. Segundo, a concepção de Raffestin (1993) sobre a
territorialidade, percebida como reflexo multidimensional do espaço vivido pela
sociedade. As territorialidades exercidas pelos jogadores de altinho exprimem o
conjunto do que se vive no cotidiano dessas pessoas.
Outro autor que trabalha o conceito de territorialidade e também o tema das
microterritorialidades nas cidades é Angelo Serpa (2013 p. 62). Este autor, citando Lévi
e Lussat (2003 p. 919) aponta que a territorialidade está intimamente ligada ao conceito
de território, com ampla aplicação na ciência geográfica. Este conceito demonstra a
ação e a existência de uma autoridade, legítima ou não, sobre uma área determinada. Os
autores afirmam que

A territorialidade consolida, portanto, um controle político sobre o espaço,


mas abarca outras dimensões, exprimindo-se também através de valores
culturais e sociais, identitários e simbólicos, identidades essas que
apresentam diferentes facetas: existencial (geograficidade), psicológica,
sociocultural e mesmo poética (LÉVI; LUSSAT, 2003, p. 919 apud SERPA,
2013 p. 62).

Percebemos que assim como Raffestin, Lévi e Lussat abordam o tema da


territorialidade sobre uma visão de múltiplas dimensões, não só através da visão
tradicional ligada à política e ao Estado-Nação. Em nosso recorte empírico, as (micro)
territorialidades dos praticantes de altinto em Ipanema, estas abarcam os valores
culturais, sociais, identitários e simbólicos, conforme estes colocam.
Sobre a temática das microterritorialidades, Serpa (2013) e Heidrich (2013),
em trabalhos distintos, analisam que o espaço público vem perdendo sua dimensão
política. O primeiro autor aponta que o conceito de território “é cada vez mais utilizado
em face de um espaço e de uma sociedade cada vez menos politizados”. Desta maneira,
ele entende que se o espaço perde sua extensão política e em contraposição, o território
ganha força, pois o espaço público se torna local de “justaposição de diferentes
territórios, todos juntos, mas, de fato, separados” (SERPA, 2013, p. 63-64). Isto é, para
Serpa, os territórios se inserem dentro do espaço público, juntos, porém separados por
limites e barreiras simbólicas. Já o segundo autor, apesar de também conceber que “as
ações e concepções de espaço público apoiadas no modelo político” vem perdendo
significado, este pondera essa visão, afirmando que a cultura é o elemento que nos dias
atuais mais dá sentido as diversas territorialidades expressas no espaço público
Todavia, não se que dizer que a política desapareça numa oposição à cultura.
O que de fato ocorre é a aparição cada vez mais enfática do cultural, que vai
adentrando um mundo em que ele ocupa posições e se apresenta com
intencionalidade (HEIDRICH, 2013, p. 81).

Outros dois autores que dão sentido ao tema em pauta são Benhur Pinós da
Costa e Antonio Bernardes (2013). Estes autores entendem que as microterritorialidades
estão associadas à apropriação de pequenos pedaços do espaço público por indivíduos
que irão produzir o espaço de acordo com determinadas identidades, as quais darão
sentido aos microterritórios estabelecidos. Para os autores

(...) microterritorializações, em que pequenas parcelas do espaço – “cantos” e


“pedaços” de praças e ruas, rotas de deslocamento, determinados
estabelecimentos, como bares e até mesmo instalações públicas – são
tenuemente apropriadas por um agregado de sujeitos que nelas se reúnem e
desenvolvem certas práticas (COSTA & BERNARDES, 2013, p. 36).

Neste sentido, a segunda parte deste trabalho irá analisar como a política
conhecida como Choque de Ordem interferiu na dinâmica espacial da orla de Ipanema.
Isto é, investigaremos tal apropriação de pequenas partes do espaço praiano pelos
jogadores de altinho e como a nova política de ordenamento do território modificou a
produção deste espaço.

O ALTINHO E A POLÊMICA PROIBIÇÃO DE SUA PRÁTICA NO ESPELHO


D’ÁGUA

Como já comentado anteriormente, o altinho é uma prática esportiva que


possui microterritórios móveis, isto é, não há uma delimitação específica para esta
atividade acontecer e ela ocorre ao longo de toda a faixa de areia. Seus microterritórios
são impostos no espaço praiano através da própria prática em si, em que seus
participantes se fecham em grupos, ou duplas no caso do frescobol, fixando assim
limites em que os demais transeuntes não podem ultrapassar – um banhista que
ultrapassa está sujeito a ser acertado por uma bola, por exemplo. Os próprios corpos
humanos são o limite destes territórios, como percebemos na foto contida no final deste
trabalho (imagem 1).
No mesmo ano em que assumiu seu primeiro mandato, em 2009, o então
prefeito do município do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, criou a Operação Choque de
Ordem, que, como o próprio nome já mostra tem por objetivo impor uma ordenação
urbana à cidade. No portal da prefeitura, há uma breve descrição sobre tal política

Um fim a desordem urbana.

A desordem urbana é o grande catalisador da sensação de insegurança


pública e a geradora das condições propiciadoras à prática de crimes, de
forma geral. Como uma coisa leva a outra, essas situações banem as pessoas
e os bons princípios das ruas, contribuindo para a degeneração, desocupação
desses logradouros e a redução das atividades econômicas.

Com o objetivo de pôr um fim à desordem urbana, combater os pequenos


delitos nos principais corredores, contribuir decisivamente para a melhoria da
qualidade de vida em nossa Cidade, foi criada a Operação Choque de Ordem.

São operações realizadas pela recém-criada Secretaria de Ordem Pública, que


em um ano de existência vem conseguindo devolver à ordem à cidade2.

Dentre as várias proibições implementadas pelo Choque de Ordem está a


suspensão das práticas de frescobol e altinho no espelho d’água em todas as praias
cariocas, entre 08h e 17h

Prefeitura do Rio de Janeiro - SEOP - Secretaria Especial da Ordem Pública.


Ordenamento das praias
Com o objetivo de ordenar as areias do Rio de Janeiro, a operação da Seop de
combate à desordem chegou às praias cariocas em dezembro de 2009
mostrando que a orla - do Flamengo à Grumari - é de todos e que por isso,
precisava de ordenamento e cuidados especiais. (...) As operações da Seop
em combate à desordem também deram fim a uma situação que tanto
incomodava turistas e cariocas nas praias: a prática de frescobol e altinho.
Esses esportes, agora, só podem ser praticados na beira da água após as 17h.
Uma questão de bom senso e segurança, que protege crianças e adultos das

2
Disponível em <http://www.rio.rj.gov.br/web/guest/exibeconteudo?article-id=87137>. Acesso em
11/07/2018.
boladas. Cachorro na areia, que comprometia tanto a saúde das pessoas
quanto a do próprio animal, também está terminantemente proibido.
As ilegalidades foram contidas por uma operação que mobiliza diariamente
cerca de 400 homens entre GMs e fiscais. O objetivo é oferecer ao carioca e a
todos que chegam à cidade uma praia mais nota de limpa e organizada 3.

Não só a questão da proibição destas práticas esportivas é polêmica, como


tantas outras operações realizadas pela SEOP também são muito questionáveis, tendo
em vista que não houve consulta à população para a implantação de tais medidas. Além
do fato de termos percebido em nossos trabalhos de campo, o quanto as opiniões a favor
e contra se dividem, não só entre praticantes e guardas municipais, como dos próprios
banhistas. Muitos acreditam que a prática poderia ser liberada pelo menos nos dias de
semana, tendo em vista que a quantidade de pessoas que frequenta as praias, mesmo no
verão, diminui bastante de segunda à sexta-feira.
Logo, acreditando que esta proibição tenha sido feito de forma arbitrária,
inúmeros conflitos irão surgir a partir daí, principalmente, entre guardas municipais e
praticantes de frescobol e altinho, sobretudo desta última, tendo em vista que engloba
mais praticantes de uma só vez, isto é, num único microterritório móvel criado, pode
haver um grupo com mais de 10 participantes, por exemplo.
Um exemplo de subversão às regras impostas pela prefeitura, e, portanto, de
disputa pelo controle do espaço, ocorreu em outubro de 2012, na praia de Ipanema,
quando praticantes do altinho e guardas municipais entraram em confronto devido à
insubordinação dos praticantes às regras impostas. O acontecimento foi reportado no
portal de notícias G1 e em outros veículos de comunicação. Também inserimos ao final
do artigo uma foto (imagem 2) da briga relatada a seguir

3
Disponível em
<http://prefeitura.rio/web/seop/exibeconteudo;jsessionid=A71CFD809C170552F46AB2F49892D5A4.life
rayinst4?p_p_id=exibirconteudoportlet_WAR_conteudoportlet_INSTANCE_9H2x&p_p_lifecycle=0&p_
p_state=pop_up&p_p_mode=view&p_p_col_id=column2&p_p_col_pos=2&p_p_col_count=3&_exibirc
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ortlet_WAR_conteudoportlet_INSTANCE_9H2x_id=1740821&_exibirconteudoportlet_WAR_conteudo
portlet_INSTANCE_9H2x_viewMode=print>. Acesso em 11/07/2018.
Banhistas e guardas municipais se envolveram numa confusão, na tarde desta
terça-feira (9), na Praia de Ipanema, na Zona Sul do Rio. De acordo com o relato
de um surfista que estava na praia, a briga teve início quando os guardas
municipais tentaram proibir jovens de jogar altinho — brincadeira em que se
forma uma roda e os participantes tentam não deixar a bola cair — na beira do
mar. Em nota, a Guarda Municipal (GM) confirma a repressão ao jogo, mas diz
que já foi recebida com barras de ferro, pedaços de madeira, cocos e cadeiras de
praia arremessados.
Um rapaz de 25 anos, identificado como João Pedro, foi para a 14ª DP (Leblon) e
os demais teriam fugido. Ainda segundo a GM, testemunhas estiveram na
delegacia e confirmaram as agressões.

O surfista, que pediu para não ser identificado, disse ao G1, no entanto, que os
guardas começaram as agressões com cassetetes. Segundo ele, os banhistas teriam
revidado o ataque atirando objetos e cocos nos guardas. Dois jovens foram feridos,
de acordo com a testemunha.
"Parecia um corredor de baile funk ou uma briga de torcida. A confusão foi
generalizada. Os guardas chegaram de uma forma muito mais ríspida que o
normal. Eles já chegaram com o cassetete na mão. Os meninos que jogavam
altinho foram espancados, um deles ficou caído no chão, cheio de marcas
vermelhas pelo corpo. Todo mundo ficou muito assustado", contou o surfista.

Um rapaz de 25 anos, identificado como João Pedro, foi para a 14ª DP (Leblon) e
os demais teriam fugido. Ainda segundo a GM, testemunhas estiveram na
delegacia e confirmaram as agressões.
O surfista, que pediu para não ser identificado, disse ao G1, no entanto, que os
guardas começaram as agressões com cassetetes. Segundo ele, os banhistas teriam
revidado o ataque atirando objetos e cocos nos guardas. Dois jovens foram feridos,
de acordo com a testemunha.
"Parecia um corredor de baile funk ou uma briga de torcida. A confusão foi
generalizada. Os guardas chegaram de uma forma muito mais ríspida que o
normal. Eles já chegaram com o cassetete na mão. Os meninos que jogavam
altinho foram espancados, um deles ficou caído no chão, cheio de marcas
vermelhas pelo corpo. Todo mundo ficou muito assustado", contou o surfista.
A briga aconteceu na Praia de Ipanema, entre as ruas Maria Quitéria e Joana
Angélica, por volta das 16h304.

Ao menos através da reportagem, podemos depreender que as agressões


partiram dos guardas municipais (mesmo estes relatando o contrário), pois o surfista que
comenta o ocorrido, aparentemente não parece fazer parte da briga, ou seja, é uma
pessoa neutra na situação.
Assim, constatamos que existe uma resistência por parte dos praticantes de
altinho (e também do frescobol) em tentar manter seus antigos (micro) territórios, por
meio do não cumprimento das regras impostas. Em um de nossos trabalhos de campo
conversamos com alguns praticantes do altinho, um deles, Fábio, de 22 anos, afirmou
que às vezes, ele e seu grupo de amigos tentam jogar no espelho d’água no horário não
permitido. E se a praia não estiver muito cheia, até conseguem continuar a jogar no
mesmo local, mas isso depende do local e dos responsáveis pela vigilância, mas o
normal é terem que se deslocar para cima (ou pararem de jogar, caso o calor não
permita a prática no momento).
Aplicando o que Sack (1986) entende como territorialidade, entendemos que
existe uma disputa por pequenas porções de espaços do espelho d’água – os
microterritórios móveis – antes dominados pelos praticantes de frescobol e altinho e que
desde 2009 a Guarda Municipal, a serviço da SEOP e da Prefeitura da cidade do Rio de
Janeiro, vem tentando dissolver, muitas vezes através da força e não do diálogo. As
estratégias dos praticantes de altinho, isto é, as microterritorialidades destes grupos para
tentarem manter suas atividades esportivas no local mais agradável e com temperatura
mais amena, são a subversão e/ou o diálogo, os quais muitas vezes não obtêm sucesso, e
assim, tem seus microterritórios desfeitos.

4
Disponível em <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/10/guardas-sao-acusados-de-agredir-
jovens-em-briga-na-praia-de-ipanema.html>. Acesso em 11/07/2018.
Imagem 1: Espelho d’água na praia de Ipanema Imagem 2: Briga entre praticantes do altinho e
dominado por praticantes de altinho. guardas municipais na praia de Ipanema,
Fonte: National Geographic. ocorrida em 09 de outubro de 2012.
Fonte: G1.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Portanto, podemos afirmar que o altinho é uma das práticas de lazer que produz
relações de poder bem específicas. Os conflitos que se desenvolvem pela disputa destes
microterritórios são sem dúvida uma das maiores formas de contestação por
determinadas parcelas do espaço que encontramos em nosso recorte empírico (já
estudamos outros esportes e podemos assim traçar paralelos).
É importante observar que apesar da proibição abarcar todas as práticas
esportivas presentes nesta parte da praia, o fato de em uma única roda de altinho, existir
a possibilidade de juntar muitos indivíduos de uma vez só, isso faz com que estes
tenham mais voz/ força na hora de enfrentar os guardas municipais no momento em que
irão disputar seus territórios. De qualquer forma, vale lembrar que outras atividades
também são praticadas no espelho d’água, como o frescobol e até mesmo a peteca.
Entendemos assim que as transformações trazidas pelo Choque de Ordem
alteraram bastante, e de forma negativa, a dinâmica do espaço praiano, afetando a vida
dos tradicionais jogadores de altinho na praia de Ipanema. Deste modo, concluímos este
artigo esperando ter contribuído com as discussões sobre o conteúdo das
microterritorialidades, bem como com os estudos da produção do espaço pelos
praticantes de altinho na orla de Ipanema.

REFERÊNCIAS

COSTA, B. P. ; BERNARDES, A. ; Microterritorializações homoafetivas na cidade de


Presidente Prudente-SP: o lazer noturno e as relações de interface. Revista
Cidades Volume 10 Número 17 (2013).
HEIDRICH, A. L. ; Compartilhamento e microterritorialidades do espaço social
metropolitano. Revista Cidades Volume 10 Número 17 (2013).
RAFFESTIN, C. ; Por uma Geografia do Poder. Tradução de Maria Cecília França. São
Paulo (SP): Ática, 1993.
SACK, R. D. ; Territorialidade Humana: sua teoria e história. Cambridge: Cambridge
University Press, 1986.
SERPA, A. ; Microterritórios e segregação no espaço público da cidade contemporânea.
Revista Cidades Volume 10 Número 17 (2013).

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