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Resumo
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MARCUSE, Herbert. O Marxismo Soviético. Rio de Janeiro: Editora Saga, 1969.
sua condição de classe. Nesse sentido, quando uma configuração histórica faz desaparecer
esta base de massas, o agente histórico não tem mais como constituir sua identidade
revolucionária. Assim, a forma partido pensada pelo marxismo não estaria em cheque?
Sobre uma nova fase do capitalismo, em 1958, Marcuse indica que houve uma série
de produções teóricas marxistas tratando sobre o que seria sua fase imperialista. Este
imperialismo entendido de modo mais geral permitia concordâncias, porém, quando a
discussão se voltava para as tendências históricas, davam-se sérias discordâncias, que
poderiam ser mais bem compreendidas, segundo ele, mediante a abordagem de duas linhas
principais. Por um lado, o “campo reformista”: tendo como exemplo a figura de Bernstein,
este campo - também conhecido como revisionista - acreditava na melhora progressiva do
proletariado dentro do que seria o “capitalismo organizado”, uma forma do sistema que
permitia que a luta socialista se desse por instrumentos democráticos. Por outro lado, o
“campo ortodoxo”: Marcuse via em Lenin seu representante máximo, interpretando a
estabilização enquanto uma condição transitória do capitalismo, a teoria leninista
desenvolveu compreensões - entendidas por Marcuse como insuficientes - como a de
aristocracia do trabalho, para explicar uma série de modificações na classe trabalhadora.
O maior problema da teoria leninista, na visão marcuseana, foi reconhecer certas
mudanças fundamentais nas condições históricas e, ainda assim, manter velhas concepções
teóricas: “De fato, a recusa em se extrair as consequências teóricas da nova situação
caracteriza todo o desenvolvimento do Leninismo, e é uma das principais causas da
distância que separa a teoria da prática no Marxismo soviético2” (Ibid.: 37-38). Para
Marcuse, com a teoria da vanguarda revolucionária e da aristocracia do trabalho, o
leninismo procurou reformular as perspectivas de desenvolvimento capitalista na era
imperialista procurando manter a noção clássica do proletariado revolucionário. Assim,
não contemplava verdadeiramente a situação dada porque “antes mesmo da Primeira
Guerra Mundial, tornou-se claro que a parte ‘colaboracionista’ do proletariado era
quantitativa e qualitativamente diferente de uma pequena camada que havia sido
corrompida pelo capital monopolista, e que o Partido Social Democrático e a burocracia
sindicalista eram mais que ‘traidores’ (...).” (Ibid.: 38).
Partindo destes equívocos, a constituição do partido leninista enquanto
“representante real do proletariado” demonstrava “a distância entre a nova estratégia e a
velha concepção teórica” (Ibid.: 39). Ocorria, então, uma mudança do agente da revolução,
“que deixou de ser o proletariado conscientizado para ser o Partido centralizado, o qual
passou a desempenhar a função de vanguarda proletária” (Ibid.: 46). Assim o era, para
Marcuse, porque, ainda que quisesse manter a noção de proletariado revolucionário de
Marx, Lenin não mais tinha condições materiais que a sustentasse. Neste âmbito, Marcuse
aponta para sua tentativa em trazer o campesinato para esta órbita justamente quando
declinava o potencial revolucionário do operariado industrial em todos os países de
capitalismo avançado. Esta situação histórica teria forçado o marxismo – dentro dele, o
leninismo - a enfatizar sua atuação nos “países atrasados, predominantemente agrícolas,
cuja fraqueza do setor capitalista parecia oferecer melhores oportunidades para uma
revolução” (Ibid.: 37). Observando que esta noção está mais presente em Trotsky, Marcuse
não deixa de ressaltar como foi orientadora para o leninismo em seu interesse em se voltar
para os camponeses. E o que era uma concepção “dirigida à ‘imaturidade’ do proletariado
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Pode-se dizer que Marcuse, no texto de 1958, examina o vínculo entre o leninismo e o stalinismo pintando
como pano de fundo as dramáticas situações históricas desse contexto. O leninismo é muito criticado por ele,
principalmente, por ter sido, a seu ver, a base do marxismo soviético, considerando que a “teoria soviética
não se voltou às fontes primeiras da teoria marxista.” (Ibid.: 45).
russo tornou-se um princípio de estratégia internacional, face à persistente atitude
reformista do proletariado ‘maduro’ dos países industrializados” (Ibid.: 46).
A partir disto, pode-se avaliar a perspectiva de Marcuse sobre a possiblidade do
engajamento via partido: dentro destas novas condições, o partido se configura como uma
opção anacrônica que não oferece instrumentos para encarar os desafios sociais colocados
à emancipação. Por um lado, a ideia de partido revolucionário de Marx não condiz mais
com a modificação histórica ocorrida ao se centrar na concepção da classe revolucionária
do proletariado; por outro, a formulação leninista não é uma opção para o problema da
organização do proletariado e do desenvolvimento da consciência de classe nesta nova
situação, exatamente por seu apego a noção clássica de revolução. Acerca da perspectiva
leninista, desenvolver-se-ia uma noção autoritária de partido, pois “a fim de contrabalançar
a integração, ao sistema capitalista, de vastos setores do trabalho organizado, o ‘fator
subjetivo’ da estratégia revolucionária é monopolizado pelo Partido, o qual assume o
caráter de organização revolucionária profissional, dirigindo o proletariado”. (Ibid.: Idem).
O Partido leninista teria a função de subordinar os interesses subjetivos imediatos
aos interesses reais de classe até o momento em que, mediante crises e depressões, o
capitalismo se desequilibre de modo tal que conduza o proletariado à radicalização e, por
fim, faça coincidir interesses imediatos e reais. Preocupado com a distância entre teoria e
realidade, Marcuse questiona sobre a possibilidade deste momento de “crise final” não
acontecer e, ainda, sobre a parte mais substancial do proletariado não querer abrir mão de
seus interesses imediatos, auxiliando na configuração de uma relação apaziguadora entre as
classes. O caráter problemático da alternativa do leninismo à nova situação histórica foi
intensificado ainda, de acordo com Marcuse, pela concepção de socialismo em um só país,
de graves consequências para as formulações teóricas e, principalmente, para as opções
políticas levadas a cabo dentro do período stalinista.
Marcuse acredita que não se pode mais contar com condições objetivas para o
crescimento da conscientização da classe proletária. Encaminha-se para o entendimento de
que o proletariado se torna cada vez mais parte interessada para a continuidade desta forma
social. Falta clareza se, ao chegar a essas conclusões, Marcuse de fato coloque em xeque o
interesse de classe tal qual levantado por Marx e Lenin, pois ele continua a tratar sobre a
relevância da alienação do trabalho enquanto um descaminho para a vida social humana,
além de continuar a tematizar a urgência da revolução, mesmo que seja sobre novos
moldes desarraigados desta perspectiva classista de luta política. Tal falta de clareza talvez
demonstre como a abordagem marcuseana sobre esta questão em 1958, prenda-se mais à
forma falsa da consciência do proletariado, ou seja, a sua dimensão subjetiva, pois trata do
aspecto objetivo por uma perspectiva mais fenomênica, mais relacionada ao mundo da
aparência diretamente vinculada ao impacto subjetivo desta condição social. A dimensão
do problema é visto por um aspecto mais político, tomado pela desestruturação dos
comportamentos políticos frente à nova configuração do sistema. Esta novidade não é tão
discutida em sua transformação no âmbito econômico constitutivo para as relações sociais:
estas transformações haveriam rompido com a lógica histórica-mundial do capital?
O interesse de classe, em seu tratamento marxiano, deve se desfazer do ocultamento
da essência do trabalhador, esclarecendo sua dimensão objetiva: sua importância para a
produção social da vida humana. É a centralidade do trabalho produtivo para a constituição
objetiva da vida social que dá o papel histórico à classe proletária. Perdendo isto de vista,
Marcuse não teria superestimado a capacidade do capitalismo de resolver seus
antagonismos? Até que ponto estas compreensões de Marcuse ferem a noção de classes
sociais em sua validade analítica central para a teoria marxista?