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º 1
Trimestral
Abril de 2023
Coordenador: Wilson Salvador
ADILSON SEQUEIRA
Iva aplicado ao sector petrolífero angolano
SIMÃO SALUWANDA
Política Fiscal Para Promoção de Investimentos Via Mercados Regulamentados (Bolsa de Valores)
EDSON MARTINS
O Imposto sobre os Veículos Motorizados
WILSON SALVADOR
O Dossier Fiscal
WILSON SALVADOR
Da (im)possibilidade de aceitação do furto ou roubo de dinheiro como custo fiscal em sede de Imposto Industrial
2
Editorial
Criada no ano de 2022, a Revista de Fiscalidade Angolana (RFA) publica em 2023 a sua
primeira edição e cumpre com o objectivo de preencher as lacunas doutinárias existentes em
Angola à nível de Fiscalidade e outras ciências afins (Contabilidade, Auditoria, Finanças Públicas,
Direito Fiscal, Direito Administrativo, etc.) que se dedicam ao estudo dos Impostos e da sua
aplicação.
Esta primeira edição, espelha alguns rumos da fiscalidade angolana percorridos desde o início
da reforma fiscal até à actualidade.
Longe de ser uma edição perfeita, o que se pretende é a partilha de informações relevantes ao
entendimento de determinados temas actuais da nossa fiscalidade, analisadas pelos diversos
autores. Esta análise é efectuada a partir de diversas perspectivas, e certamente que os temas
ora apresentados não se esgotam nestas linhas.
Neste contexto, cumpre-me agradecer aos autores que com empenho produziram os artigos
que constam nesta edição, bem como de muitos outros que foram propostos para
publicação.
Ao Hilton dos Santos, agradeço o acolhimento da presente publicação da RFA bem como o
empenho na sua valorização.
O Coordenador da Revista
Wilson Salvador
3
Os autores conservam os direitos de autor e concedem à revista o direito de
primeira publicação.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana _ Iva aplicado ao sector petrolífero angolano
É sabido que as principais receitas orçamentais em Angola, advêm dos impostos petrolíferos
que têm características muito especiais, quer no plano fiscal, quer no plano administrativo.
Por isso, aconselha a prudência, que os Estados produtores de petróleo preparem novas
fontes de receita, para sustentar os níveis de receitas futuras, o que implica uma maior atenção
aos impostos indirectos. Neste contexto, houve necessidade de se alterar o paradigma
existente no domínio da tributação da despesa, mediante a introdução no sistema fiscal do
IVA em substituição do imposto de consumo em Angola.
1
Perito Contabilista da Ordem dos Contabilistas e Peritos Contabilistas de Angola (OCPCA) e Docente Universitário. É
Mestrando em Direito Fiscal, na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto (UAN), é Licenciado em
Contabilidade e Auditoria, na Faculdade de Economia da Universidade Agostinho Neto (UAN), é Licenciado em Direito, na
Universidade Lusíadas de Angola (ULA); e é Bacharel do Curso Superior em Matemática, no Instituto Superior de Ciências
da Educação (UAN).
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana _ Iva aplicado ao sector petrolífero angolano
Quanto ao regime do IVA Cativo, às aquisições de bens e serviços nas quais suporte o
Imposto sobre o Valor Acrescentado quando efectuadas pelas Sociedades Investidoras
Petrolíferas e as Empresas Executoras que se destinem exclusiva e directamente à execução
das operações do Projecto Angola LNG devem obrigatoriamente cativar (reter na fonte) a
totalidade do IVA contido nas facturas ou documentos equivalentes emitidos pelos
fornecedores enquadrados no Regime Geral de Tributação do IVA aquando da transmissão
de bens ou prestações de serviços.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana _ Iva aplicado ao sector petrolífero angolano
(i) Locação de máquinas ou outros equipamentos, em que uma das partes se obriga a
proporcionar a outra o gozo temporário destes bens, mediante retribuição, excluindo
a locação de máquinas ou outros equipamentos que, pela sua natureza, dêem lugar a
pagamento de royalties, conforme definido no Código do Imposto sobre a Aplicação
de Capitais;
Também são considerados “impostos não dedutíveis” o IVA contido nas facturas ou
documentos equivalentes dos fornecedores enquadrados no Regime Geral de Tributação do
IVA, adquiridos pelas Sociedades Investidoras Petrolíferas quando classificados como “custos
próprios” e em quaisquer custos adquiridos pelas Empresas Executoras das operações do
Projecto Angola LNG, nomeadamente:
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
Sumário
1 Introdução.............................................................................................................................. 10
2 Mercados Regulamentados ..................................................................................................... 11
2.1 A BODIVA – Sociedade Gestora de Mercados Regulamentados, SA. .................................... 12
3 Ofertas Públicas de Distribuição ............................................................................................. 12
3.1 O Prospecto ........................................................................................................................... 13
4 A promoção de investimentos via Mercados Regulamentados e o Plano Nacional deInclusão
Financeira ............................................................................................................................... 13
5 A política Fiscal ...................................................................................................................... 14
6 A tributação de lucros distribuídos ou dividendos ................................................................... 16
6.1 A isenção (participation exemption) ............................................................................................. 16
7 Benefícios Fiscais sobre lucros distribuídos a investidores via MercadosRegulamentados ....... 17
ARTIGO 3.º .............................................................................................................................. 18
ARTIGO 3.º .............................................................................................................................. 19
8 Considerações finais ............................................................................................................... 19
9 Referências Bibliográficas ....................................................................................................... 20
1 Introdução
Mercado de Capitais, bolsa de valores e realidades afins têm sido assuntos recorrentes em
Angola. O processo de privatização de empresas do sector público, bem como a negociação
de acções de algumas instituições financeiras bancárias já cotadas, têm a sua cota parte neste
facto.
1 Advogado & Consultor Fiscal, Mestrando em Direito Financeiro e Fiscal pela Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa (FDUL), Pós-graduado em Direito Fiscal pelo IDEFF|FDUL.
Contacto: saluwanda@gmail.com
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
2 Mercados Regulamentados
O Regime Jurídico dos mercados regulamentados em Angola, bem como os demais institutos
que compõem o Direito dos valores mobiliários, está estabelecido no Código dos Valores
Mobiliários, abreviadamente C.V.M., aprovado pela Lei n.º 22/15 de 31 de agosto.2
Nos termos da alínea j) do n.º 2 do CVM, entende-se por “mercados regulamentados – qualquer
espaço ou sistema multilateral situado ou a funcionar em Angola em que se possibilite de forma organizada o
encontro de interesses relativos a valores mobiliários e instrumentos derivados com vista a celebração de negócios
sobre os mesmos”.
Segundo António Pereira de Almeida3, os mercados regulamentados estão sujeitos a dois
princípios de interesse público: princípio da segurança do mercado e princípio da defesa do
investidor.
O princípio da segurança do mercado faz depender a autorização para a abertura de regras
rigorosas, sujeitas à supervisão em matéria de organização, idoneidade dos membros e da
entidade gestora, divulgação de informação, transparência e regular função de preços,
liquidação e prevenção de risco sistémico. Enquanto o princípio de defesa dos investidores
traduz-se no acesso à informação adequada, segurança nas transações, fundos de garantias,
responsabilidade dos auditores e intermediários financeiros, associação de defesa de
investidores e acção popular.
Em Angola o organismo de supervisão dos mercados regulamentados é a Comissão de
Mercado de Capitais, doravante CMC aprovada pelo Decreto Presidencial n.º 54/13 de 6
de junho.
A CMC tem como atribuições a regulação, supervisão, a fiscalização e a promoção do
mercado de capitais e das actividades que envolvam todos os agentes que nele intervenham,
directa ou indirectamente, tendo em vista a realização dos seguintes objectivos: (i) proteger
os investidores; (ii) assegurar a eficiência, o funcionamento regular e a transparência do
mercado de capitais, máxime mercado de valores mobiliários; (iii) prevenir o risco sistémico.
2
Os artigos que indicarmos sem menção do diploma referem-se ao C.V.M.
3
António Pereira de Almeida, António Pereira de Almeida. Sociedades Comerciais, Valores Mobiliários,Instrumentos Financeiros e
Mercados. Vol. II. Lisboa: Almedina, 2022, pag. 177.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
A cotação de uma empresa em bolsa (going public; flotation) constitui um meio para obtenção de
financiamento através de capitais próprios de forma mais alargada e este processo
normalmente anda associado à oferta pública de subscrição ou oferta pública de acções,
que no direito anglo-saxónico, corresponde à IPO: Initial Public Offer9.
Quanto ao funcionamento do mercado de valores mobiliários, podemos distinguir as
operações em mercado primário e em mercado secundário.
Mercado primário é relativo à subscrição pública de valores mobiliários, quer inicial, na
constituição de sociedades anónimas com recurso à subscrição pública, quer subsequente,
como forma de financiamento nos aumentos de capital. Por outro lado, mercado secundário
diz respeito a operações de compra e venda de valores mobiliários anteriormente emitidos
no mercado primário.10
De modo a concretizar os princípios da segurança do mercado e da defesa do investidor, a
admissão à negociação em Mercado Regulamentado está condicionada a observância de
requisitos severos (artigo 249.º), incluindo a exigência de apresentação do prospecto que a
seguirdescrevemos.
3.1 O Prospecto
Prospecto é um documento de informação relativo a oferta pública ou à admissão à
negociação em mercados regulamentados (alínea m), n.º 2.º do artigo 2.º, artigos 307.º e ss.,
311.º e ss. do C.V.M.).
O prospecto é uma peça crucial no processo das ofertas públicas em geral, bem como as
ofertas públicas de distribuição, máxime IPOs, pois é através dele que se fornece informação
completa sobre os valores mobiliários e respectivos emitentes, de modo a proteger os
investidores e a reforçar a confiança no mercado.11 /12
Nos termos do artigo 291.º, o prospecto deve conter informação completa, verdadeira,
actual, clara, objectiva e lícita, que permita aos destinatários formar juízos fundados sobre
os valores mobiliários e os direitos que lhes são inerentes, sobre características específicas, a
situação patrimonial, económica e financeira e as previsões relativas à evolução da
actividade e dos resultados do emitente e de um eventual garante, e sobre a oferta pública
no caso de prospecto de oferta pública.
O prospecto deve incluir um sumário resumo que apresente, de forma concisa e numa
linguagem não técnica, as características essenciais dos valores mobiliários, do emitente e da
oferta, também deve fazer advertência de que constitui apenas uma introdução ao prospecto
e que qualquer decisão deve basear-se na informação do prospecto no seu todo (artigo
293.º).
O artigo 301.º e ss., estabelece o regime da responsabilidade civil pelo conteúdo do
prospecto no caso de desconformidade com o disposto no artigo 291.º.
9 Ana Perestrelo de Oliveira. Manual de Corporate Finance. 2.ª. Lisboa: Almedina, 2020, pag. 91.
10 (António Pereira de Almeida, op.cit . pag. 103).
11 Ibidem, pag. 203.
12 (Ana Perestrelo de Oliveira, op.cit., pag. 102).
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
5 A política Fiscal
Política fiscal consiste no uso adequado dos vários impostos e das características que os
recortam (incidência, isenções, taxas, etc,) no sentido de serem prosseguidos os objectivos
económico- sociais definidos. A política fiscal enquanto instrumento das receitas fiscais
(imposto) integra a política orçamental cujos instrumentos são as despesas e as receitas
públicas.16
Os sistemas fiscais não estão apenas limitados à sua função tradicional de arrecadação de
impostos para a satisfação das necessidades financeiras do Estado – finalidade fiscal, mas
também têm a finalidade de regulação económica e social, ao que a doutrina designa por
14
RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
finalidade extrafiscal.17
Esta dupla finalidade do sistema fiscal vem previsto no artigo 101.º da Constituição (CRA)
que estabelece o seguinte: “O sistema fiscal visa satisfazer as necessidades financeiras do Estado e
outras entidades públicas, assegurar a realização da política económica e social do Estado e proceder a uma
justa repartição dos rendimentos e da riqueza nacional.”
Por regra, a finalidade extrafiscal dos impostos é concretizada através da conceção de
benefícios fiscais e incentivos que iremos abordar mais adiante.
Hodiernamente, os sistemas fiscais mais competitivos, dispõem de uma verdadeira política
fiscal externa orientada para o combate à dupla tributação internacional, bem como a
criação de um ambiente fiscal propício à atração de investimento estrangeiro18 e à
internacionalização das empresas nacionais.19
A política fiscal externa visa favorecer o investimento estrangeiro, procurando não
prejudicar o repatriamento de lucros gerados pelas filiais das multinacionais ou
estabelecimentos estáveis de sociedades com residência no estrangeiro. Este desiderato
concretiza-se em duas frentes: na frente internacional com a celebração de convenções de
dupla tributação e na frente interna, através da adopção de medidas unilaterais de combate
à dupla tributação e à incentivação do investimento estrangeiro.20
Um dos assuntos incontornáveis da política fiscal tem a ver com a concretização do
princípio da neutralidade, pelo que o objectivo principal prosseguido pelos sistemas fiscais
modernos é “ser neutral”, isto é, a eliminação de impostos que penalizem mais uma pessoa
em relação a outra. No plano internacional, Richard Musgrave, estabelece uma distinção
entre neutralidade na exportação de capitais (capital export neutrality) – quando o sistema
fiscal não incentiva investimento no território nacional ou estrangeiro e neutralidade na
importação de capitais (capital import neutrality) – quando investidores nacionais e estrangeiros
são tratados igualmente pelo país onde é realizado o investimento.21 /22
A neutralidade na importação de capitais, do meu ponto de vista, é o sistema ideal para
países em desenvolvimento na medida em que precisam de atrair investidores estrangeiros
que com o seu capital, tecnologia e know-how contribuem para o crescimento e
desenvolvimento da economia.
Vejamos a seguir as questões mais concretas, para saber em que medida o sistema fiscal
materializa a política extrafiscal ou política de prossecução de objectivos económicos e
sociais através dos impostos, bem como a neutralidade no contexto internacional.
De lembrar que o foco da nossa abordagem é a fiscalidade inerente ao investimento através
de mercados regulamentados.
17 Américo Fernando Brás Carlos. Impostos - Teoria Geral. 5.ª. Lisbia: Almedina, 2020., pag. 25 - 27 Investimento estrangeiro
directo – o lançamento de uma empresa no País sustentada em capitais estrangeiros ou indirecto que é detenção de
participação social numa empresa nacional, ainda que minoritária (geralmente através da bolsa de valores). Cfr. Fernando
Araújo. Introdução à Economia - II. 4.ª. Lisboa: Almedina, 2022., pag. 621.
18 José Casalta Nabais. Por um Estado Fiscal Suportável - Estudos de Direito Fiscal. Vol. IV. Lisboa: Almedina, 2015, pag.
41-42.
19 Ibidem.
20 Glória Teixeira. Manual de Direito Fiscal. 5.ª. Lisboa: Almedina, 2019, pag. 51 – 52.
21 Paula Rosado Pereira. Convenções de Dupla Tribução no Atual Direito Fiscal Internacional. Lisboa:Almedina, 2022. pag. 52 – 56.
22 O nosso resumo sobre a reforma do imposto industrial operada em 2020. Cfr.
https://www.linkedin.com/posts/simaosaluwanda_os-desafios-da-tributa%C3%A7%C3%A3o-das- empresas-em-activity-
6884106143623352320-bSaf?utm_source=share&utm_medium=member_desktop.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
a) – (…);
b) No caso de rendimentos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º, quando as
participações a que dizem respeito os rendimentos se encontrem admitidas à negociação em
mercado regulamentado;
c) – (…).
4. A redução de taxa prevista na alínea b) do número anterior é aplicável apenas durante 5 (cinco)
anos após a entrada em vigor do presente Código.
Da interpretação da norma descrita, resulta que os dividendos provenientes de sociedades
cotadas são/eram tributados em sede do IAC à taxa de 5% nos 5 anos posteriores à entrada
em vigor do CIAC. Entretanto, é um benefício que já se encontra caducado.
A tributação dos dividendos origina sempre uma situação de dupla tributação económica
que consiste na tributação do mesmo rendimento na esfera de dois contribuintes e pode
acontecer tanto a nível interno como a nível internacional. No caso dos dividendos, são
lucros já tributados em sede do imposto industrial e, por isso, urge a necessidade de se criar
mecanismos de eliminação ou atenuação da dupla tributação económica.
6.1 A isenção (participation exemption)
Nos termos do artigo 13.º, n.º 1, al., a) do CIAC, estão isentos de IAC “os lucros ou dividendos
distribuídos por uma sociedade com sede ou direcção efectiva em território angolano no caso em que a entidade
beneficiária seja uma pessoa colectiva ou equiparada com sede ou direcção efectiva em território angolano
sujeita a imposto industrial, ainda que dele isenta, que detenha no capital social da entidade que distribui os
lucros ou dividendos uma participação não inferior a 25% por um período superior a um ano anterior à
distribuição de lucros.”
Em torno da norma descrita, impõe-se tecer os seguintes comentários:
16
RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
As pessoas colectivas sujeitas a imposto industrial que detenham uma participação social
inferior a 25% numa outra entidade sujeita a imposto industrial, não poderão beneficiar-se
da referida isenção. No entanto, nos termos do artigo 47.º, n.º 1, al., b) do Código do
Imposto Industrial, têm a possibilidade de deduzir os rendimentos que já foram tributados
em sede do IAC, evitando assim a dupla tributação económica. Todavia, prevalece a dupla
tributação económica se o beneficiário de dividendos for uma pessoa singular, e o Código do
IRT que tributa os rendimentos das pessoas singulares não prevê nenhum mecanismo de
atenuação da referida dupla tributação conforme acontece em outros sistemas fiscais.
Os dividendos distribuídos a não residentes (pessoas coletivas e singulares) estão sujeitos à
dupla tributação em Angola, e provavelmente a uma outra tributação no Estado da
residência do beneficiário.
Urge a necessidade de rever o conteúdo do artigo 13.º, n.º 1, al., a) do CIAC de modo a
conformá- lo com a actual prática da fiscalidade internacional, fundada na globalização, livre
circulação de capitais e investimento estrangeiro. Pois, o conteúdo da norma em referência,
apesar de constar de um diploma legislativo aprovado em 2014, ainda conserva um espírito
do século XX em que a política fiscal estava apenas virada aos nacionais ou residentes.
Angola deverá criar uma verdadeira política fiscal externa, para além dos tratados
internacionais, especialmente as convenções de dupla tributação, é de extrema importância
a criação de normas internas ou unilaterais que abordem o fenómeno da dupla tributação
internacional.
Por exemplo, para o artigo em crítica, dever-se-á reduzir a percentagem da particpation
exemption ou isenção pela participação de 25% para 5% e também estender os seus
benefícios para os não residentes tal como é a prática internacional. E consequentemente, o
sistema fiscal angolano tornar-se-á mais competitivo e simpático ao investimento
estrangeiro.
O fulcro da nossa análise é indagar a (in)existência de benefícios fiscais para as pessoas que
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
detenham participação social numa empresa cotada em bolsa aquando da repartição dos
lucros ou dividendos.
Dos 8 capítulos do CBF, é mais provável encontrarmos resposta à nossa questão no
capítulo IV pois, a epígrafe já denuncia. Porém, as duas secções do referido capítulo fazem
referências apenas a benefícios fiscais à poupança e benefícios fiscais à organismos de
investimentos colectivos. Portanto, o CBF não prevê benefícios fiscais para investidores em
mercados regulamentados, mas a lei que aprova o CBF, no seu artigo 3.º faz menção a
benefício fiscal relativo a investimentos em mercado regulamentado que a seguir
reproduzimos:
ARTIGO 3.º
(Rendimentos Decorrentes de Instrumentos negociados em Mercado
Regulamentado)
1. os lucros, seja qual for a sua natureza, espécie ou designação, atribuídos aos sócios ou
accionistas das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, bem como o
repatriamento dos lucros imputáveis a estabelecimentos estáveis de não residentes, referentes
a participações sociais que se encontrem à negociação em mercado regulamentado angolano,
beneficiam de uma redução de 50% da taxa do Imposto sobre a Aplicação de Capitais.
2. A taxa referida no número anterior é aplicável por um período de 5 anos, contados a
partir da admissão das participações sociais a negociações em mercado regulamentado.
3. os lucros ou dividendos distribuídos por uma sociedade com sede ou direcção efectiva em
território angolano no caso em que a entidade beneficiária seja uma pessoa colectiva ou
equiparada com sede ou direcção efectiva em território angolano sujeita a imposto
industrial, ainda que dele isenta, que detenha no capital social da entidade que distribui os
lucros ou dividendos uma participação não inferior a 25% por um período superior a um
ano anterior à distribuição de lucros.
Ora, os números do artigo 3.º da Lei do CBF são uma reprodução mutatis mutandis para não
dizer que é um copy&paste dos artigos do CIAC que analisámos anteriormente. O número 1
corresponde aos artigos 9.º, n.º 1 e 27.º, n.º 3, al., b); o número 2 corresponde ao n.º 4 do
artigo 27.º e o número 3 é cópia fiel do artigo 13.º, n.º 1, al., a) do CIAC, o que é
dispensável.
Posto isto, começa a fazer sentido o facto de uma norma que até tem algum benefício fiscal,
mas, não consta do Código dos Benefícios Fiscais. A ilação que podemos tirar desse
procedimento é que houve apenas uma transposição das normas constantes no CIAC.
Portanto, em bom rigor e em respeito às regras de legística, devia-se apenas proceder a
alteração/actualização do n.º 4 do artigo 27.º.
No que concerne aos aspectos substanciais, coloca-se a questão de saber se o artigo 3.º da
Lei que aprova o CBF vai servir como estímulo para as empresas e a população em geral, no
sentido de investirem em mercados de valores mobiliários. Para as empresas, essa redução
da taxa não influi muito, pois, de qualquer forma, têm o direito de deduzir o rendimento
sujeito a IAC. Quanto às pessoas singulares, o ideal seria mesmo a isenção do imposto,
conforme fez, por exemplo, Cabo Verde aquando da aprovação do seu Código de
Benefícios Fiscais em 2013.
A isenção de dividendos, é o mais recomendável neste estágio embrionário da nossa Bolsa
de Valores. É o benefício fiscal mais eficiente, em comparação com a taxa preferencial ou
reduzida. Por outro lado, a isenção constituiria uma aliança ao plano da CMC e CNEF que
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
ARTIGO 3.º
(Rendimentos Decorrentes de Instrumentos negociados em
MercadoRegulamentado)
1. os lucros, seja qual for a sua natureza, espécie ou designação, atribuídos aos sócios ou
accionistas das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, bem como o
repatriamento dos lucros imputáveis a estabelecimentos estáveis de não residentes, referentes
a participações sociais que se encontrem à negociação em mercado regulamentado angolano,
estão isentos de Imposto sobre a Aplicação de Capitais.
2. A isenção referida no número anterior é aplicável por um período de 5 anos, contados a
partir da admissão das participações sociais a negociações em mercado regulamentado.
8 Considerações finais
O recurso aos mercados regulamentados constitui uma alternativa de financiamento a
empresas, sobretudo as ofertas públicas de distribuição, máxime IPOs. Por outro lado, pode
ser uma boa oportunidade de investimento para a população. Por isso, é indiscutível a
necessidade da sua promoção nesta fase embrionária.
A CMC e o CNEF têm um programa de educação financeira que visa a conscientização da
população sobre os mercados financeiros e as oportunidades de investimento.
Enquanto cidadão e profissional interessado na matéria, coube-me fazer uma descrição das
principais questões atinentes ao mercado dos valores mobiliários e, em seguida, analisar a
fiscalidade inerente ao mercado.
O Código dos Benefícios Fiscais não prevê algum benefício fiscal sobre os rendimentos ou
dividendos provenientes de uma empresa cotada. No entanto, a lei que aprova o CBF
contém uma norma que prevê a redução da taxa do IAC para a metade, que na verdade foi
apenas a actualizaçãoe adaptação das normas que já constam no CIAC.
De qualquer forma, do nosso ponto de vista, a taxa preferencial sobre os dividendos
derivados de uma empresa cotada não vai ajudar a promover o mercado ou servir como
incentivo à população a aderir ao mercado. O ideal é a isenção da taxa que seria um
benefício fiscal mais eficaz e que estaria em consonância com os objectivos da CMC e
CNEF de aumentar a literacia financeira e a cultura de investimentos em mercados
regulamentados.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana : Política fiscal para promoção de investimentos via mercados regulamentados (Bolsa de Valores)
9 Referências Bibliográficas
A. Barreto Menezes Cordeiro; Francisco Satiro. Direito dos Valores Mobiliários e dos Mercados de
Capitais - Angola, Brasil e Portugal. 1.ª. Lisboa: Almedina, 2019. Obra Coletiva.
Américo Fernando Brás Carlos. Impostos - Teoria Geral. 5.ª. Lisbia: Almedina, 2020.
Ana Perestrelo de Oliveira. Manual de Corporate Finance. 2.ª. Lisboa: Almedina, 2020.
António Pereira de Almeida. Sociedades Comerciais, Valores Mobiliários, Instrumentos
Financeiros e Mercados. Vol. II. Lisboa: Almedina, 2022.
Fernando Araújo. Introdução à Economia - II. 4.ª. Lisboa: Almedina, 2022.
Glória Teixeira. Manual de Direito Fiscal. 5.ª. Lisboa: Almedina, 2019.
José Casalta Nabais. Por um Estado Fiscal Suportável - Estudos de Direito Fiscal. Vol. IV.
Lisboa: Almedina, 2015.
Manuel Henrique de Freitas Pereira. Fiscalidade. 5.ª. Lisboa: Almedina, 2014.
Paula Rosado Pereira. Convenções de Dupla Tribução no Atual Direito Fiscal Internacional. Lisboa:
Almedina, 2022.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Imposto sobre os Veículos Motorizados
1. Nota introdutória
Qualquer país, ou economia, sustentam-se, principalmente com a cobrança dos tributos,
dentre outras formas de financiamento que o Estado possa ter, e cá, em Angola, não se foge a
esta regra. Daí que as medidas de cobrança de impostos, devem ser melhoradas
constantemente, e sempre que o contexto económico-social mude, mas estando ajustadas a
realidade de cada região.
Desde de 2020, com entrada em vigor da Lei n.º 24/20, de 13 de Julho, foi introduzido no
ordenamento jurídico angolano, o Imposto sobre Veículos Motorizados, com a sigla (IVM),
que resultou da reestruturação do regime jurídico da taxa de circulação e fiscalização de
trânsito, elevando-o à categoria de imposto, aprovada em Assembleia Nacional.
Este tributo propõe uma distribuição da carga fiscal mais justa, entre os proprietários ou
possuidores (detentores) de veículos motorizados, ampliou as garantias destes contribuintes,
veio de alguma forma alargar a base dos tributos e estender os benefícios fiscais. Tem como
pano de fundo uma plataforma electrónica que permite o cadastro, a liquidação e extração
dos selos dos veículos, dando assim, maior comodidade ao contribuinte. E como essa
inovação, foi incluída na incidência objectiva às embarcações e às aeronaves, meios que até
então não tinham qualquer imposto sobre estes.
Quanto as isenções, como não há regra sem excepção, estão isentos do pagamento do IVM
em 100%, os tractores destinados exclusivos aos trabalhos agrícolas. Os veículos exclusivos e
destinados ao apoio agricultura (transporte de produtos agrícolas) e para pesca artesanal,
(transporte de pescado), bem como, os veículos eléctricos todos estes têm a taxa do imposto
reduzido em 50%. Para as embarcações de pesca artesanal a redução é 75%, mas carecem
sempre da aprovação das entidades competentes (fiscalizadoras), e da validação da AGT, para
que possam gozar destes benefícios fiscais.
1Formado em Gestão e Marketing, na especialidade de Marketing, pela Universidade Óscar Ribas. Curso extensivo em
Direito Tributário, pela Universidade agostinho Neto.
21
RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Imposto sobre os Veículos Motorizados
Geral Tributária.
Imposto: é o tributo com natureza unilateral, em virtude da sua obrigação não constituir
a contrapartida de qualquer prestação individualizada do Estado e demais entes
públicos.
É necessário que se entenda que estes conceitos, para que se deixe de confundir, o que é
imposto e o que é taxa.
3. Veículos Motorizados
Todos veículos a motor de propulsão ou eléctrico, que circulam por si, destinados ao
transporte de pessoas e bens, são considerados como veículos motorizados.
5. Portal do IVM
Esta plataforma on-line, de fácil manuseio, permite o acesso de qualquer contribuinte, desde
que estejam devidamente cadastrados no portal, assim, cada um pode fazer o cadastro, a
liquidação, e a extração dos os selos dos respectivos veículos ou seja, fazer gestão dos seus
veículos no sistema, para singulares ou colectivos, de ordem pública ou privada.
6. Transmissão de propriedade
Quanto a transmissão de titularidade, muitos são os contribuintes, que após a transmissão
(alienação) de um veículo a terceiros, não têm tido o cuidado de registarem essas transações,
junto dos órgãos competentes. A título de exemplo, um determinado veículo, pode passar por
vários proprietários, sem que se formalize essas transmissões (vendas), nesses casos, os
documentos de registo inicial continuam em nome do primeiro proprietário, ficando a cargo
destes o ónus do pagamento deste imposto, pelo facto do veículo ainda estar registado em seu
nome.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Imposto sobre os Veículos Motorizados
7. Expurgação de veículo
O mesmo acontece, quanto a expurgação dos veículos do parque motorizado a nível nacional,
os proprietários deixam de ter em sua posse efectiva um determinado veículo ou por estar
obsoleto, perda total ou por exportação, ou por roubo, ou por outras razões, e não se
informar aos órgãos competentes, para o cancelamento da matrícula (veículos terrestres) ou
do registo de propriedade (veículos náuticos e aéreos), se assim não for procedido, os
proprietários correm sempre o risco de terem sobre si, o ónus do pagamento deste tributo até
a sua regularização.
9. Matéria colectável
A matéria colectável em sede de IVM recai sobre:
a) cilindrada (cc) do motor: para automóveis ligeiros, ciclomotores, motociclos, triciclos e
quadriciclos;
b) A potência (kw): para veículos eléctricos;
c) O peso bruto (kg): automóveis Pesados;
d) O peso máximo autorizado à descolagem (kg): para aeronaves;
e) A potência de propulsão (hp) do motor e tonelagem de arqueação bruta (kg): para embarcações.
Essas informações podem ser tiradas dos documentos de registo, nos livretes ou documentos
equivalentes dos veículos.
12. Fiscalização
2 Automatic Teller Machine
3 Point Of Sale
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Imposto sobre os Veículos Motorizados
É outro “calcanhar de Aquiles” com a entrada do IVM, para além da Administração Geral
Tributária, existem outros órgãos que passam a fazer a fiscalização, cada uma na sua área de
jurisdição. Assim, as entidades legalmente previstas para a fiscalização do cumprimento das
obrigações em sede de IVM são:
• Administração Geral Tributária, para todos os veículos motorizados de uma forma
geral;
• A Direcção de Trânsito e Segurança Rodoviária (DTSER), para os motociclos ligeiros
e pesados;
• A Agência Marítima Nacional (AMN) para as embarcações; e
• Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), para as aeronaves.
Este imposto tem uma particularidade muito interessante, é dos tributos com o prazo mais
alargado de pagamento, dentre os existentes no país, que é de 6 meses (janeiro a junho),
dando assim, uma margem mais do que suficientes para que os contribuintes possam honrar
com os seus compromissos tributários.
Tão logo faça a venda do seu veiculo, os contribuintes devem informar junto da entidade
competente, para que passe esse ónus ao novo proprietário e deve dar a conhecer a AGT
com os respectivos comprovativos.
14. A Comunicação
As entidades públicas devem comunicar entre si de forma mais eficiente, isso em 3 eixos:
i. a nível de competências e responsabilidades;
ii. a nível de sistemas; e
iii. a nível de procedimentos.
A título de exemplo, existem ainda muitos motociclistas que não conseguem proceder ao
registo dos seus motociclos por falta de documentos de identificação, outros há que nem os
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Imposto sobre os Veículos Motorizados
Esta situação se verifica por um lado, por existirem muitas entidades envolvidas nos
processos de licenciamento, e por ouro lado, pelas burocracias institucionais. Há necessidade
urgente de se reverter este quadro, vamos acreditar que o Projecto Simplifica, venha para
resolver estas questões.
15. Desafios:
a) Estreitar a comunicação entre entidades, para que os resultados se tornem mais
eficazes e mais eficientes;
b) As entidades fiscalizadoras, têm de garantir uma interação mais afinada para a troca de
dados, bem como a fiscalização de facto;
c) Melhorar o alinhamento de procedimentos entre as entidades, quanto as questões
administrativas, bem como quem deve fazer o quê;
d) Garantir que o contribuinte tenha a destreza na utilização do aplicativo.
16. Bibliografia:
Lei que aprova o Código Geral Tributário (CGT)
Lei do sobre o Imposto sobre os Veículos Motorizados.
Lei dos Benefícios Fiscais.
Lei n.º 7/11, de 16 de Fevereiro, lei que aprova o Regime Geral das Taxas.
https://portaldocontribuinte.minfin.gov.ao (Portal do Contribuinte).
https://ivm.minfin.gov.ao (Site do IVM).
https://agt.minfin.gov.ao/PortalAGT/#!/servicos-eletronicos (SITE da AGT).
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Dossier fiscal
O DOSSIER FISCAL1
1. Introdução
A relação jurídica tributária é, em regra, uma relação entre dois sujeitos, composta por direitos
e obrigações. O cumprimento destas obrigações, são fundamentais para a realização dos
obejctivos do Estado enquanto ente com a responsabilidade de dar resposta a satisfação das
necessidades colectivas por meio da arrecadação de receitas.
Ora, cabe aos Contabilistas e Peritos Contabilistas, inscritos na Ordem dos Contabilistas e
Peritos Contabilistas de Angola (“OCPCA”) preparar a documentação/informação do
dossier, incluindo os documentos que devam ser elaborados pela gerência ou administração
da empresa por forma a que este fique completo e esteja sempre disponível nos
estabelecimentos ou instalação situada em território nacional na morada que consta do
cadastro do contribuinte. Esta “obrigação” abrange todos os sujeitos passivos de Imposto
Industrial (“II”) e os sujeitos passivos de Imposto sobre os Rendimentos do Trabalho
(“IRT”) que possuam ou sejam obrigados a possuir contabilidade organizada, e deve ser
mantido em boa ordem, durante o prazo de 5 anos.
2. Conceito
O Dossier Fiscal é um conjunto de documentos organizados por um contabilista que
armazena todos os documentos da administração da empresa referentes ao ano fiscal, com
relevância fiscal e contabilística, que demonstram o cumprimento das obrigações fiscais e
contabilísticas ao longo do ano. Nele contém documentos que fazem parte do calendário
fiscal anual.
3. Objectivos da elaboração do Dossier Fiscal
1 O presente artigo serviu de base da formação de Fiscalidade, ministrada pelo autor via online, que teve lugar em janeiro de
2021, na Ordem dos Contabilistas e Peritos Contabilistas de Angola (OCPCA), e que se subordinou ao tema: O Dossier Fiscal.
2 Coordenador da Revista de Fiscalidade Angolana, Licenciado em Contabilidade na Faculdade de Economia da Universidade
Lusiada de Angola, Fiscalista, Formador em Fiscalidade, tendo participado em diversas sessões de formação, incluindo na
Ordem dos Contabilistas e Peritos Contabilistas de Angola – OCPCA, Professor Universitário na disciplina de Fiscalidade.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Dossier fiscal
i. Proporcionar informação acerca da situação fiscal, de uma entidade que seja útil a
um vasto leque de utentes na tomada de decisões;
ii. Garantir o cumprimento atempado das obrigações tributárias das empresas;
iii. Permite dar uma resposta atempada e inequívoca às solicitações de informações da
Administração Geral Tributária, em caso de um procedimento de inspecção,
reclamação, ou Recurso Hierárquico;
iv. Permite dar uma resposta atempada e inequívoca às solicitações de informações do
Tribunal, em caso de Recurso Contencioso Administrativo e/ou Tribuitário;
v. Os utentes das informações do Dossier Fiscal que desejem avaliar o zelo ou a
responsabilidade do órgão de gestão pelos recursos que lhe foram confiados
fazem-no a fim de que possam tomar decisões económicas; estas decisões podem
incluir, por exemplo, deter ou vender o seu investimento na entidade ou
reconduzir ou substituir o órgão de gestão.
4.1. Compreensibilidade
Pretende-se que a informação seja rápida e facilmente compreensível pelos seus utilizadores.
Presume-se que estes possuem um razoável conhecimento contabilístico e fiscal. Porém, não
deve ser excluída qualquer matéria mais complexa com o fundamento de que nem todos os
utentes terão capacidade para a compreender.
4.2. Relevância
A informação reveste-se desta qualidade quando influencia as decisões dos utentes, ao
permitir-lhes avaliar os acontecimentos e/ou confirmar as suas decisões passadas.
4.3. Materialidade
Diz-se que a informação é material quando a omissão ou distorção da mesma tem impacto na
determinação da matéria colectável e consequentemente nos impostos a serem pagos pelos
contribuintes. Porém, a materialidade varia em função da dimensão do erro, considerando as
circunstâncias específicas da sua omissão ou inexactidão.
4.4. Fiabilidade
Aos documentos que compõem o dossier fiscal, exige-se que a informação seja fiável, isto
é, isenta de erros materiais e preconceitos.
5. Utentes
Nos utentes dos documentos que compõem o dossier fiscal, incluem-se investidores actuais e
potenciais, empregados, mutuantes, fornecedores e outros credores comerciais, clientes,
Governo e seus departamentos e o público. Eles utilizam as demonstrações financeiras a fim
de satisfazerem algumas das suas diferentes necessidades de informação. Estas necessidades
incluem o seguinte:
a) Investidores - Os fornecedores de capital de risco e os seus consultores estão ligados ao
risco inerente aos, e ao retorno proporcionado pelos, seus investimentos. Necessitam
de informação para os ajudar a determinar se devem comprar, deter ou vender. Os
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Dossier fiscal
g) Público - As entidades afectam o público de diversos modos. Por exemplo, podem dar
uma contribuição substancial à economia local de muitas maneiras incluindo o
número de pessoas que empregam e patrocinar comércio dos fornecedores locais. As
demonstrações financeiras que compõem o dossier fiscal, podem ajudar o público ao
proporcionar informação acerca das tendências e desenvolvimentos recentes na
prosperidade da entidade e leque das suas actividades.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Dossier fiscal
i. Imposto Industrial
a) Regime Geral:
• Declaração de rendimentos Modelo 1;
• Elementos a serem entregues com a Declaração Modelo 1:
Demonstração de Resultados por Natureza;
Demostração de Fluxo de Caixa;
Balanço;
Balancete do razão e Balancete Geral Analítico, antes e depois dos
lançamentos de rectificação ou regularização e de apuramento dos resultados
do exercício, e respectivos anexos, devidamente assinados pelo contabilista
responsável pela sua elaboração;
Relatório técnico onde, com base em mapas discriminativos, o contabilista
que assinou as demonstrações financeiras e a declaração fiscal deve comentar
sucintamente as reintegrações e amortizações contabilizadas, com indicação
do método utilizado, das taxas aplicadas e dos valores iniciais e actuais dos
diversos elementos sobre os quais aquelas recaíram, as alterações sofridas
pelas existências de todas as categorias e os critérios que presidiram à sua
valorimetria, as provisões constituídas ou as alterações nelas ocorridas, os
créditos incobráveis verificados, as mais-valias realizadas, as variações
patrimoniais ocorridas, os gastos gerais de administração, com especial
referência às remunerações, de qualquer espécie, atribuídas aos corpos
gerentes, bem como a todas as despesas de representação suportadas durante
o exercício, as mudanças nos critérios de imputação de custo ou atribuições
dos proveitos às diferentes actividades ou estabelecimentos da empresa,
quaisquer outros elementos reputados de interesse à justa determinação do
lucro tributável e ao esclarecimento do balanço e da conta de resultados do
exercício ou de ganhos e gastos;
Declaração Modelo 5 de opção pelo regime de tributação de Grupos de
Sociedades;
• Outros elementos/documentos (n.º 1 do artigo 52.º da Lei 19/14 de 22 de Outubro):
Relação dos titulares dos órgãos de gestão;
Cópia da Acta da Assembleia Geral de Aprovação de contas do exercício, ou
documento de aprovação de contas;
Demonstração dos Fluxos de Caixa;
Mapa geral de todos os impostos pagos no decurso do exercício;
3 Nos termos do n.º 7, do artigo 62.º da Lei 21/14, de 22 de Outubro, Lei que aprova o Código Geral Tributário, (…) as
entidades que no País exerçam qualquer actividade empresarial, comercial ou profissional devem conservar todos os documentos e registos relativos às
operações efectuadas nos últimos 5 (cinco) anos.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Dossier fiscal
• Livro de registo de compra e venda e serviços prestados (n.º 1 do artigo 61.º da Lei
26/20, Lei que altera o Código do Imposto Industrial)5.
5 Caso o sujeito passivo tenha optado, para efeitos de determinação da Matéria Colectável, a forma simplificada.
6 Vide (artigo 63.º da Lei 26/20, Lei que altera o Código do Imposto Industrial).
7 Vide (artigo 63.º da Lei 26/20, Lei que altera o Código do Imposto Industrial).
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: O Dossier fiscal
Este dossier, ainda de acordo com o artigo 12.º do decreto presidencial 147/13, deverá ser
sempre elaborado pelos contribuintes cujos proveitos anuais na data de encerramento de
contas do exercício sejam superiores a 7.000.000.000,00 Akz, equivalente a 70.000.000,00
USD.
b) Regime Simplificado
• Declaração do Regime Simplificado;
• Submissão do ficheiro SAFT e Mapa de Fornecedores no Portal do Contribuinte;
• Mapa resumo de pagamento dos impostos.
v. Imposto Predial
• Declaração detenção do imóvel;
• Declaração Modelo 1 pelo senhorio do Imóvel arrendado
• Nas transmissões onerosas sobre bens imoveis - Documentos comprovativos das
respectivas transmissões;
• Mapa resumo de pagamento dos impostos.
8. Conclusão
É nosso entendimento que o dossier fiscal aqui apresentado, constitui uma ferramenta
importante e que visa auxliliar as empresas na organização do seu arquivo, com vista a
satisfação das necessidades de informação das entidades interessasadas, bem como no
cumprimento do dever de colaboração com a Adminstração Tributária.
Deste modo, tão importante como a documentação que a Administração Fiscal obriga os
contribuintes a elaborar, é também a informação disponibilizada aos outros utilizadores da
informação, como sejam a gestão ou administração da empresa que desta forma fica a dispor
de um conjunto de informações completo sobre determinado exercício que poderá consultar,
e disponibilizar a AGT, sempre que necessário.
A informação constante do dossier fiscal deve ser organizada de modos a que qualquer
utilizador a compreenda sem esforço, devendo ser mantida em suporte de papel por um
período de 5 anos, ou em suporte digital, podendo ainda integrar o ficheiro SAF-T.
Uma vez solicitada pela AGT, a referida informação deve ser disponibilizada o mais
rapidamente possível, num prazo não superior a 30 dias, podendo, em alguns casos e após
análise cuidada, ser concedido mais tempo do que o previsto legalmente.
9. Bibliografia
Imposto Industrial - Lei n.º 19/14, de 22 de Outubro, com as alterações introduzidas pela Lei
n.º 26/20, de 20 de Julho.
Regime de Reintegrações e Amortizações - Decreto Presidencial n.º 207/15, de 5 de
Novembro
Regime das Provisões - Decreto Presidencial n.º 204/15, de 28 de Outubro.
Imposto sobre os Rendimentos do Trabalho - Lei n.º 18/14, de 22 de Outubro, com as
alterações introduzidas pela Lei n.º 28/20, de 22 de Julho.
Imposto sobre Aplicação de Capitais - Decreto Legislativo Presidencial n.º 2/14, de 20 de
Outubro.
Imposto sobre o Valor Acrescentado - Lei n.º 7/19, de 24 de Abril, com as alterações
introduzidas pela Lei n.º 17/19, de 13 de Agosto.
Imposto Especial de Consumo - Lei n.º 8/19, de 24 de Abril.
Imposto de Selo - Decreto Legislativo Presidencial n.º 3/14, de 21 de Outubro.
Imposto Predial - Lei n.º 20/20, de 9 de Julho.
Lei 21/14, de 22 de Outubro, Lei que aprova o Código Geral Tributário.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: Da (im)possibilidade de aceitação do furto ou roubo de dinheiro como custo fiscal em sede de Imposto
Industrial
Entende-se por furto2, como sendo a conduta de, com ilegítima intenção de apropriação para
si ou para outra pessoa, subtrair coisa móvel ou animal alheios.
Por outro lado, roubo3 é o acto de subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outro, mediante
grave ameaça ou violência a pessoa (ou não), ou depois de havê-la, por qualquer meio,
reduzido à impossibilidade de resistência4.
Entretanto, no âmbito da relação jurídica tributária, as pessoas colectivas estão sujeitas ao
cumprimento das suas obrigações tributárias, nomeadamente, as obrigações acessórias
(entrega das Declarações de Impostos, bem como os demais documentos fiscalmente
relevantes) e a obrigação principal (pagamento de impostos), sendo que para o efeito, devem
cumprir com as normas relativas a determinação da matéria colectável.
A matéria coletável é determinada, em regra, com base no método directo, ou seja, com base
nos elementos contabilisticos apresentados pelo sujeito passivo, devendo ter em atenção aos
limites no que a consideração de custos dedutíveis ao lucro tributável diz respeito, sendo que
é obrigatória a apresentação de documentos comprovativos de custos.
lha, usando de violência contra uma pessoa ou de ameaça com perigo eminente para a sua vida ou integridade física ou colocando-a na
impossibilidade de se opor à subtracção ou de resistir à entrega é punido com pena de prisão até 5 anos. Vide, ARTIGO 401.º, do Código
Penal Angolano, aprovado pela Lei n.º 38/20, de 11 de Novembro, Lei que aprova o Código Penal Angolano.
4
https://pt.wikipedia.org/wiki/Roubo.
5 Cfr. Artigo 14.º do Código do Imposto Industrial, aprovado pela Lei.º 19/14, de 22 de Outubro, Lei que aprova o Código
do Imposto Industrial.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: Da (im)possibilidade de aceitação do furto ou roubo de dinheiro como custo fiscal em sede de Imposto
Industrial
a) Aqueles que sejam custos incorridos pelos próprios contribuintes, no âmbito da sua
actividade comercial ou industrial;
b) Aqueles que tenham sido incorridos pelo contribuinte, e que tenham um documento
de suporte nos termos da legislação em vigor sobre as facturas e documentos
equivalentes6;
c) Aqueles que tenham sido incorridos pelo contribuinte, e que tenham um documento
de suporte nos termos da legislação em vigor sobre a auto facturação7;
d) Aqueles que sejam tomados pela Administração Geral Tributária (“AGT”), como
indispensáveis à manutenção da fonte produtora ou à realização dos proveitos e
ganhos sujeitos a imposto.
Neste sentido, em regra, os custos apenas são dedutíveis desde que incorridos pelo sujeito
passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a Imposto Industrial, ou seja, aqueles
que são realizados pela empresa para prosseguir a sua actividade e obter o seu rendimento, os
quais devem estar comprovados documentalmente, independentemente da natureza ou
suporte dos documentos utilizados para esse efeito. Além disso, os custos para serem
dedutíveis, têm sempre que ter conexão com a obtenção ou garantia de rendimentos sujeitos a
Imposto Industrial.
Do acima exposto, compreende-se que não se pode inserir o furto ou o roubo no quadro
normal da actividade exercida e, embora não se possa ignorar que esses riscos existem, o que
é certo é que podem ser minimizados8 e haverá sempre que acautelar que a eventual relevância
fiscal de um furto ou roubo não se constitua em via relativamente fácil de evasão fiscal.
Por isso, investir em sistemas de segurança contra furtos e roubos, tornou-se uma questão
“obrigatória” nos dias de hoje.
Embora as tarefas de reestruturar o local de trabalho para protegê-lo contra a acção de
criminosos não sejam fáceis, existem algumas alternativas que podem ajudar a promover a
segurança do património das empresas, nomeadamente as seguintes:
• Elaboração de um plano de gestão de riscos para prevenir a empresa contra furtos e roubos
Conhecer quais são os pontos frágeis da sua empresa é o primeiro passo para identificar os
riscos. Para isso, verifique lugares que estão expostos, como corredores, janelas, entre outras
áreas internas e externas que facilitem a entrada de assaltantes.
• Instalação de um sistema de câmaras e alarmes
As empresas precisam garantir a segurança dos seus activos por meio da instalação de
um sistema de monitoramento, pois além de prevenir furtos e roubos, as câmaras e alarmes
são eficientes para documentar tudo o que acontece na empresa, incluindo a possibilidade de
acionarem à polícia a qualquer instante, caso seja necessário.
• Investimento em iluminação
6 Decreto Presidencial n.º 292/18, de 3 de Dezembro, diploma legislativo que aprova o Regime Jurídico das Facturas e dos
Documentos Equivalentes.
7 Decreto Presidencial n.º 194/18, de 24 de Julho, diploma legislativo que aprova o Regime Jurídico Autofacturação.
8 É necessário que a empresa proceda diligencias no sentido de garantir que os seus activos estejam protegidos de furtos e
roubos e que possa provar a existência desses mecanismos de protecção à AGT, pois prevenir a empresa contra riscos é um
tema muito sério, portanto, não pode estar fora do planeamento estratégico.
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RFA – Revista de Fiscalidade Angolana: Da (im)possibilidade de aceitação do furto ou roubo de dinheiro como custo fiscal em sede de Imposto
Industrial
A falta de iluminação pode tornar o roubo mais fácil, além de não permitir identificar os
meliantes durante as investigações. Nesse sentido, as empresas devem instalar lâmpadas com
sensores de presença, evitando assim gastos excessivos com energia eléctrica.
• Controlo da entrada e saída de pessoas na empresa
Saber quais são as pessoas que frequentam a empresa é importante para identificar suspeitos.
Para afastar qualquer tentativa de roubo, é necessário que as empresas invistam na
contratação de seguranças, sendo necessário ainda ter um controle sobre as entradas e saídas,
oferecendo passes de identificação ou qualquer outro tipo de identificação eletrônica.
• Contratação de seguro contra furtos e roubos
Em algumas situações, mesmo que a empresa se previna de todas as formas, os assaltos são
inevitáveis, por isso, apenas a contratação de seguros pode solucionar possíveis perdas no
património da empresa.
Com efeito, as perdas que resultem de furtos ou roubos não podem ser consideradas como
decorrentes da actividade normal desenvolvida pelos sujeitos passivos, nem são custos que
contribuem para obter ou garantir rendimentos sujeitos a Imposto Industrial, não podendo,
por isso, em regra, aceitar-se para efeitos fiscais, a sua dedutibilidade.
A AGT, no âmbito das suas atribuições, respeita o princípio da legalidade, e como vimos
anteriormente, a lei exige que os custos ou gastos considerados fiscalmente dedutíveis devem
estar comprovados documentalmente, o que não ocorre em situação de furto ou roubo.
Tendo como exemplo as situações de sinistros relacionadas com meios monetários, para que
as respectivas perdas possam ser aceites fiscalmente, entendemos que terão que ser
observadas determinadas condições, nomeadamente, no que respeita à verificação da
necessidade de existir numerário em caixa, que o seu quantitativo seja razoável face ao caso
concreto, e que a ocorrência do sinistro seja devidamente comprovada.
Portanto, no caso de furto ou roubo, para que possa ser aceite como custo ou gasto dedutível,
terão de se verificar circunstâncias muito excepcionais, como um roubo à mão armada por
exemplo, e ainda, a par das condições definidas para os sinistros, outras condições
especificamente previstas para as situações de furto de valores monetários, nomeadamente,
que:
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