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Nada disso era suficientemente forte para impedir que as nações da América do
Sul não pudessem ser consideradas como tal. Elas possuem muitas das características
que compõem uma nação desde os primórdios do século XIX, tendo sido, no entanto,
prejudicadas por suas classes dominantes, que as impediram de desenvolver alguns
importantes aspectos de uma existência nacional ampla.
A resposta foi que, apesar do território imenso, a população ainda era bastante
escassa e as atividades econômicas reduzidas, com atividades coletoras na Amazônia,
algodão no Maranhão, a produção açucareira do Nordeste atravessando um período de
crise, diante da concorrência e das taxas cobradas por Portugal, além da valorização da
mão de obra escrava pela demanda da mineração. Também a mineração, da região
central do país, estava iniciando seu processo de declínio, depois de ter “aberto as
perspectiva de um mercado interno que impulsiona inclusive a circulação terrestre com
os tropeiros, os registros e o sistema fiscal extorsivo imposto pela Coroa”. Num dado
que talvez ajude a entender muito do que marcou a história do Brasil dos anos 30 até
pelo menos 1964, Sodré lembra que dos produtos da época de Brasil colônia, apenas o
charque, do Rio Grande do Sul, tinha como alvo o mercado interno. (SODRÉ: 1960,
pp.12 e 13).
Salvo essa exceção, toda a produção do Brasil colonial era destinada aos
mercados externos. Entre esses produtos, o de maior peso foi o ouro. Foi graças à
mineração que, no século XVIII, a colônia teve uma viragem importante em sua vida.
No binômio que sustentava a economia colonial, formado por terra-escravo, não
existem dúvidas de que o principal elemento era a mão-de-obra escrava, que se
constituía na principal mercadoria. (SODRÉ: 1960, p. 13)
Com isso, nas áreas de produção aurífera, foi quebrada a comunhão de interesses
que nas áreas de exploração açucareira marcava as relações entre a Coroa portuguesa e a
classe dominante da Colônia. Essa contradição entre Coroa e classe dominante vai ser a
responsável pela sucessão de motins e levantes. A Inconfidência Mineira, praticamente
na virada do século XVIII para o XIX, foi bem uma amostra do clima que imperava. Na
região das minas, a população se repartia em senhores de terras, classe dominante. e
escravos, e pessoas livres, que não viviam da exploração do trabalho de seus
semelhantes, constituindo uma camada social instável, sem função ou poder político na
estrutura de então. O crescimento desse setor médio da população, situada entre a classe
dominante da colônia e os escravos (que tinham existência de mercadoria sendo vistos
como meros instrumentos de trabalho) foi o fenômeno de maior importância que
ocorreu na segunda metade do século XVIII. (SODRÉ: 1960, p. 14)
Sodré assinala que é esse setor intermediário que constituiu o mercado interno
surgido no Centro-Sul do País, gerando uma vida urbana ainda incipiente e que vai
formar os quadros administrativos, as funções militar, religiosa e judiciária. Sobre isso,
lembra que a Inconfidência Mineira foi obra de padres, letrados e militares. A crise
açucareira significou o primeiro sinal de desencontro entre a colônia e a metrópole. As
desavenças se agravaram com as tributações impostas à mineração e as ideias de
independência começaram a surgir nos setores intermediários da população. Isso, ainda
segundo Sodré, deve-se ao fato de ser esse setor o mais interessado em alterar o status
quo. Só que o País ainda estava muito fragmentado. Com isso, Portugal pôde tratar cada
motim isoladamente. Além disso, a classe dominante temia correr o risco de contrapor-
se à Coroa. (SODRÉ: 1960, p.15)
O povo era formado por todos aqueles que não viviam da exploração da mão-de-
obra alheia. Isso correspondia, portanto, à grande maioria da população. Só que, nessa
maioria, o número de pessoas interessadas na vida política do país era muito reduzido.
Com a independência de Portugal, a coroa imperial, passou a fazer o papel de
representante dos senhores de terras e escravos, que foram transformados em “barões”.
Esse papel satisfazia as classes dominantes interessadas na manutenção do “status quo”
herdado da estrutura colonial. Com as transformações vividas pelo país, o regime
imperial foi-se tornando anacrônico e perdeu o suporte de grande parte das classes
dominantes, que até então lhe davam sustentação. (SODRÉ: 1960, p. 22).
Sobre isso, Sodré, relembra o apoio popular obtido por Floriano Peixoto,
destacando a defesa da população carioca contra a rebelião da Esquadra. Para ele,
Floriano Peixoto foi o representante por excelência das classes médias, que começavam
naquele momento a disputar o espaço político. Destaca aí a difusão do Positivismo
como saída mais fácil por permitir a defesa de posições progressistas sem o abandono
de valores éticos tradicionais. A aliança entre as classes médias e “a facção
economicamente mais poderosa da classe territorial” não resistiu às contradições do
início do regime republicano. Com isso, os representantes políticos da grande lavoura de
café paulista assumiram o poder e alijaram seus antigos aliados que representavam os
setores intermediários da sociedade brasileira da época. Isso ficou nítido no governo de
Campos Salles, com sua política econômica, e da chamada “política dos governadores”.
(SODRÉ: 1960, p. 24).
Essas três pausas permitiram à estrutura de produção dar três saltos e, mais do
que isso, alterou fundamentalmente a fisionomia econômica do Brasil. Elas propiciaram
a capitalização e um desafogo transitório, em que o país se fortaleceu para enfrentar as
pressões que se seguiram a cada uma delas. A capitalização abriu a possibilidade de se
implantarem indústrias que permitiram a produção de artigos até então importados. Essa
industrialização provocou, mesmo de forma espontânea, importantes reflexos na vida
econômica, social e política. Permitiu também a transferência de recursos entre setores
da economia brasileira. Outra consequência, ainda que também espontânea, foi a
acumulação de recursos no exterior. “A dilapidação impressionante desses recursos,
particularmente depois da Segunda Guerra Mundial, correspondeu a um dos erros
mais clamorosos já cometidos contra o País – e mostrou como a classe dominante não
atendia aos interesses do conjunto, mas apenas aos seus próprios interesses”. (SODRÉ:
1960, pp. 27, 28).
Segundo Sodré, foi a partir desse momento que entrou em cena na vida política
do País o mote da não intervenção do Estado na vida econômica, da necessidade de
neutralidade estatal. É também nesse momento que surgiu, com nitidez, o
“nacionalismo”.
E, conclusivamente:
O Marechal, cuja carreira (da Escola Militar até a campanha d’O Petróleo é
Nosso) se encaixa com exatidão no processo de desenvolvimento do nacionalismo
brasileiro descrito por Sodré, por sua luta pelo monopólio estatal do petróleo, atuação
no Clube Militar, nas fileiras da corporação e na vida pública, notabilizou-se como um
dos mais influentes integrantes da corrente nacionalista das Forças Armadas brasileiras.