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Teoria e

Formação do
oa
Historiador ao
JOSÉ D'ASSUNÇÃO BARROS

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Barros, José D'Assunção


Teoria e formação do historiador / José D'Assunção
Barros. - Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.

Bibliografia.
ISBN 978-85-326-5446-5

1. História - Estudo e ensino 2. História - Teoria


3. Historiografia I. Título. /liEDITORA
Y VOZES
17-02352 CDD-907.2
Petrópolis
Índices para catálogo sistemático:
1. História e historiografia 907.2
Biblioteca Particular
do Prof. Bruno câmara
© 2017, Editora Vozes Ltda.
Rua Frei Luís, 100
25689-900 Petrópolis, RJ
www.vozes.com.br Sumário
Brasil

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CONSELHO EDITORIAL
Introdução, 7

Diretor
Gilberto Gonçalves Garcia
1 Teoria na época da Historiografia ou:
Historiografia na época da Teoria, 15
Editores
Aline dos Santos Carneiro 2 "Teorià: 23
Edrian [osué Pasini
Marilac Loraine Oleniki 3 Teoria x Método, 31
Welder Lacieri Marchini
4 Teoria da História, 43
Conselheiros
5 O surgimento das Teorias da História:
Francisco Morás
Leonardo A.R.T. dos Santos o contraste inicial entre Historicismo e
Ludovico Garmus Positivismo, 55
Teobaldo Heidemann
Volney J. Berkenbrock 6 Materialismo Histórico, 65
Secretário executivo 7 Palavras finais sobre o papel da Teoria da
João Batista Kreuch
História na formação do historiador, 75
Editoração: Flávia Peixoto
Diagramação: Victor Mauricio Bello
Revisão gráfica: Nilton Braz da Rocha Nota sobre o texto, 83
Capa: Renan Rivero
Referências, 85

ISBN 978-85-326-5446-5
Índice onomástico, 93

Editado conforme o novo acordo ortográfico.

Este livro foi composto e impresso pela Editora Vozes Ltda.


Introdução

Os cursos de graduação em História ini-


ciam-se habitualmente, já no primeiro se-
mestre, com uma disciplina chamada Teoria
da História. Alguns currículos universitários
optam por denominá-Ia, alternativamente,
como Introdução aos Estudos Históricos, In-
trodução à História, ou outras designações
que anunciam a necessidade de introduzir o
aluno em um novo modo de ver a História
que é o dos historiadores profissionais. Essa
transi ão é muito im ortante orque, com
oucas exce ões, os alunos que ingressam
em uma universidade com vistas a iniciarem
a sua forma ão de historiadores - se·a ara
se tornarem futuramente esquisadores ou
rofessores de----
História - costumam
-----_. trazer
------
consigo uma concepção de história que é a do
senso comum, mas não é mais propriamente
a dos historiadores profissionais.
Não são raras, mesmOhoje em dia, certas
noções sobre a História muito simplórias, e
mesmo errôneas, as quais são amplamente
difundidas entre aqueles que não estudaram

~~------ ---- ----


mais a fundo as ciências humanas ou que não provar a todos e a todo instante, à maneira de
são leitores da historiografia especializada. um matemático do qual se exigisse que fizesse
Pensa-se, por exemplo, que a principal fun- rapidamente contas mais ou menos compli-
ção do historiador seria apenas a de "contar cadas. Também costumam ser cobrados os
os fatos tal como eles aconteceram': descon- nomes de lugares, ou de reis e figuras ilustres,
siderando-se com isso que a missão essencial por exemplo. Tudo isso constitui um senso
dos historiadores é na verdade a de ~~~ce~ comum sobre a História que ainda hoje nos
~ociedade diversas interpretações proble~ fala, nos meios leigos, de uma História que já
matiz~das sobre o que aconteceu. Os fatos não existe mais na academia e nos ambientes
são obviamente importantes para- os histo- profissionais de pesquisa.
riadores, e sem eles não se faz história; mas o Embora os historiadores que lecionam His-
que precisamos compreender, conforme vere- tória nos níveis fundamental e médio frequen-
mos diversas vezes neste livro, é queo trabalho temente se empenhem em ensinar aos seus
principal dos historiador~s é o de construir as alunos, em algum momento, uma História
interpretações que darão sentidos a estes fatos. problematizada, sabemos como isso é difícil
Pensa-se também, muito habitualmente, nas instituições escolares que desvalorizam
que existe uma verdade única sobre as coisas as ciências humanas frente a outros saberes,
que aconteceram na história, e que a função e que também costumam priorizar a mera ins-
da História - agora entendida como campo trumentalização do estudo de -História com
de saber - é a de revelar essa verdade. Outros vistas a um sucesso apenas performativo na-
pensam que a habilidade central que o histo- queles exames típicos que todos os alunos -
riador deverá aprender com diligência e culti- independentemente de suas futuras escolhas
var ciosamente é a de memorizar datas. Não é profissionais - terão de enfrentar para passar à
incomum que, em festas ou reuniões sociais, etapa do Ensino Superior. O aluno estuda His-
as pessoas se aproximem daqueles que lhes tória para passar em uma determinada prova,
foram apresentados como historiadores ou e não para se conscientizar sobre a história ou
estudantes de História para lhes perguntar sobre as raízes sociais, culturais e políticas do
sobre datas, ou mesmo que tenham o dese- mundo em que vive.
jo de testá -los, como se a habilidade de saber Tampouco se estuda História, nesses con-
datas fosse aquilo que o historiador precisará textos de ensino, para mudar a história. Mais

8 9
d
~
~ recentemente, inclusive, ouvimos falar de pro-
----.."-

) jetos políticos conservadores que têm pla- trabalhar com a História, de pensar a função
j nejado interpor ao trabalho dos professores do historiador na sua sociedade, de conside-
de História a estranha ideia de que eles deve- rar quais são os seus verdadeiros motores, ou
riam, sim, contar o que aconteceu na história, de balancear as relações entre passado, pre-
mas sem "ideologias': Querem dizer com isso sente e futuro. Existem, em um sentido mais
que esses professores não. devem passar aos amplo, muitas e muitas Teoriassobre a História
alunos interpretações sobre a história, mas (sobre este campo de saber que é a História).
sim a história neutra, talvez novamente fac- Muitos dos alunos que adentram a gra-
tual, como se existisse uma única história a duação se assustam ou se encantam ao se-
ser ensinada em uma espécie de "escola sem rem surpreendidos pela questão, ao mesmo
partido': seja lá o que isso for. tempo fascinante e incontornável, de que a
Quando um estudante atinge o nível su- História é um campo de saber extremamen-
perior dos estudos de História, ele às vezes te diversificado nas suas possibilidades. Por
se surpreende ao ser logo informado de que isso, é necessária uma disciplina de transição,
não existe uma única História da Revolução por assim dizer, capaz de apresentar ao futuro
Francesa, e nem tampouco uma única Histó- historiador - ou ao "historiador em forma-
ria da Abolição da Escravidão no Brasil, mas ção" - esse novo mundo de possibilidades,
sim várias histórias da Revolução Francesa e essa flexibilidade com a qual ele terá de lidar
várias histórias do processo abolicionista no a partir dali. Essa disciplina de transição é
Brasil. Em uma palavra, existem "interpre- chamada em muitos currículos universitários
tações" diversificadas sobre esses processos de Introdução aos Estudos Históricos, e em ou-
históricos, sobre por que e como ocorreram, tros é assumida como a primeira de uma série
sobre quais os seus desdobramentos, sobre de disciplinas designada Teoria da História.
as diversas possibilidades de perspectivá -los. A Teoria da História, por outro lado, é
Em termos mais simples, existem distintas também uma área de pesquisa específica - tal
teorias disponíveis para nos aproximarmos como a História do Brasil ou a História da
dos processos históricos e das sociedades his- América - e muitos historiadores dedicam-se
tóricas que queremos compreender. De igual sistematicamente a desenvolver pesquisas
maneira, não existe uma única forma de. se na área de Teoria da História. Estudam o
trabalho dos historiadores de sua época e de
10
11
todos os tempos, os conceitos historiográficos, fundamental para a produção do conhecimen-
os modos de sentir e entender o tempo, os to histórico.) O que é, mais especificamente, a
estilos disponíveis para as narrativas históri- Teoria da História? A obra pretende ser apenas
cas, ao mesmo tempo em que experimentam introdutória, e traz os exemplos simplificados
novas maneiras de abordar a História. Nesse de três paradigmas teóricos distintos da His-
sentido mais restrito, a Teoria da História é tória (embora existam muitos outros, e muitas
um campo especializado dentro da História. variações dentro deles e entre eles).
Não é, de modo nenhum, apenas uma disci- Existe outra obra, deste mesmo autor e já
plina auxiliar para as outras. publicada anteriormente por esta mesma edi-
De qualquer maneira, seja no sentido mais tora, na qual se desenvolve um estudo mais
simples - o de disciplina instrumental para a aprofundado, detalhado e complexo sobre a
História -, mas também considerando o seu Teoria da História. Trata-se da série Teoria da
sentido mais complexo, o de área de estudos História, que até o momento conta com cinco
e de pesquisa à qual podem se dedicar os his- volumes. Este pequeno livro é por um lado um
toriadores, a Teoria da História não deixa de .convite para que seja lida esta obra mais vasta e
ser o portal de entrada e o patamar de perma- aprofundada, e antecipa ou confirma algumas
nência para o tipo de História que se espera das colocações e reflexões que reaparecem nos
dos historiadores profissionais. A Teoria da volumes I, II e III da série acima citada. Tive a
História é, por tudo isso, o primeiro grande iniciativa de publicá-lo porque verifiquei que
desafio a ser enfrentado pelos "historiadores um antigo artigo meu, chamado "Teoria e for-
em formação" (aqui entendidos como os alu- mação do Historiador'", tem sido muito utili-
nos de graduação em História, ou mesmo os zado por professores de Teoria da História nos
diletantes que começam a estudá-Ia fora dos semestres iniciais do curso de graduação. Em
bancos universitários, mas de maneira séria). vista disso, retomei este artigo, corrigi alguns
Este livro é dedicado precisamente aos es- aspectos e o ampliei quando necessário. Minha
tudantes que acabaram de entrar em uma gra- esperança é que este pequeno livro ajude efeti-
duação em História. Seu objetivo essencial é o vamente o aluno que fez a escolha de se tornar
de esclarecer algumas questões fundamentais. historiador, e que fortaleça essa escolha.
O que é Teoria? Em que a Teoria se diferencia,
por exemplo, do Método? (Essa outra instância
1 Publicado na revista Teias em 2010.

12 13
1
Teoria na época
da Historiografia ou:
Historiografia na
época da Teoria

Uma reflexão adequada sobre a Teoria da


História, e particularmente sobre o seu papel
na formação do historiador, pressupõe que
consideremos alguns aspectos. Em primeiro
lugar, será importante definirmos o campo
em análise: o que é a Teoria da História? E,
antes disso, o que é Teoria, de modo mais ge-
ral? Em segundo lugar, será importante que
consideremos, em algum momento de nossas
reflexões, a própria historicidade da Teoria
da História. Quando surge, na história do
pensamento ocidental e na história da histo-
riografia, um campo que já pode ser defi-
nido como Teoria da História? Perguntar
isso, aliás, leva concomitantemente a outra
pergunta ainda mais importante, que já nos
permite abordar a passagem da especulação aquela que indaga sobre as condições que tor-
puramente filosófica para a análise sistemati- nam possível o conhecimento historiográfico.
camente epistemológica: Que condições tor- É o caso, por exemplo, do Paul Veyne de Como
nam possível a Teoria da História? Por fim, se escreve a História (1971). Poderemos mesmo
será possível atingir em seu âmago a questão encontrar autores que, embora concebam a his-
central a que se propõe para reflexão, permi- toriografia como uma forma de arte, nem por
tindo que seja avaliado o papel e a importân- isso deixam de abordar uma sistemática refle-
cia da Teoria, e da Teoria da História em sua xão sobre o que consideram ser uma Teoria da
especificidade, na formação do historiador. História'. De ual uer modo, de uma maneira
Para pontuar uma relação importante, de- ou de outra, o contexto de cieIltif].cidaqe gue se
vemos desde já reconhecer que a ideia de uma ~bre_para as ciências humanas na passagem do
"teoria da história" está intimamente relacio- . sécylo XVIII para o século 2CIXpode ser con-
nada ao surgimento das pretensões de cienti- siderado um mo~ento fundamental para a
ficidade da história, seja naqueles autores que emer ê!!Sia da Teoria da História,
definem a História como Ciência - e teremos Lembraremos um indício inicial que atesta
bem esta passagem da historiografia para essa
aqui um extenso arco que partirá dos primeiros
nova fase em que já se torna possível falar em
historicistas e positivistas e que segue adiante
uma Teoria da História. No século XVIII, o ver-
pelo mundo contemporâneo - até outros que,
bete elaborado por Voltaire (1694-1778) para a
se não definem a história como "ciência': ao
Enciclopédia ainda classificava a História essen-
menos entendem a história como um conhe-
cialmente como um gênero literário. O verbe-
cimento cientificamente produzido". Também
te "História': elaborado pelo filósofo francês,
existirão autores que, mesmo rejeitando o esta-
abre-se sintomaticamente com a frase de que
tuto de cientificidade da história, não deixam
"a história é a narração dos fatos verdadeiros,
de transitar em uma reflexão sobre a Teoria da
ao contrário da fábula, que é narração dos fa-
História pelo simples fato de que já se permitem
tos fictícios': Se prosseguirmos em sua leitura
fazer a pergunta epistemológica fundamental:
3 Aqui, a referência mais significativa estará em algumas
2 Essa posição pode ser representada por Lucien Febvre das obras de Benedetto Croce (1866-1952), em particular
(1878-1956), nos textos incluídos em Combates pela His- o livro Teoria e Historiograjia, mas também em Robin
tória (1953). George Collingwood (1889-1943).

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veremos que, em nenhum momento do ver-
bete, Voltaire expressa-se em termos de "cien- da história, e surgem também aquelas primei-
tificidade" para se referir à História, e tampou- ras correntes de pensamento que já poderemos
co se propõe a discorrer em torno de questões qualificar, não mais no âmbito das "filosofias
teóricas, embora fale, ainda que de maneira da história" - em geral realizações individuais
pouco sistemática, do "método dos historia- empreendidas por filósofos -, mas sim no âm-
dores': A "história útil" também será, para ele, bito das "teorias da história': espaços de refle-
aquela "que nos mostra nossos direitos e deve- xão que já mobilizam e dividem a comunidade
res'", Depois, começaremos a assistir, na meta- de historiadores em torno de reflexões como
de do século XVIII, a emergência de filosofias as relacionadas ao tipo de conhecimento cien-
da História como a de lmmanuel Kant (1724- tífico que a História estaria apta a produzir, se
-t - 1804) ou de Herder (1744-1803), e que já em um conhecimento relacionado a uma cientifi-
~ 1830 culminarão com a filosofia da história de cidade ideográfica ou nomotética (i. é, relativa
, .;~ Friedrich Hegel (1770-1831), o que já consti- ao estabelecimento de leis). Multiplicam-se as
(+) ~ tui um desenvolvimento importante. Mas será
~ questões que indagam pelo tipo de relação que
apenas com a afirmação de uma pretensão à se pode estabelecer entre o sujeito de produ-
cientificidade historiográfica, e com a delimi- ção do conhecimento histórico e o seu objeto
tação de uma nova especialização centrada de estudo; surge a preocupação com a fixação
na figura do historiador - o que incorrerá na de um vocabulário comum, ou mesmo de um
concomitante formação de uma comunidade novo âmbito conceitual; e, por fim, começam a
de historiadores e que já se deixa entrever na se formar paradigmas historiográficos, a prin-
passagem do século XVIII para o século XIX -, cipiar pelo Historicismo e pelo Positivismo,
que se criarão efetivamente as condições epis- logo seguidos pelo Materialismo Histórico".
temológicas para que sejam trazidas para o
centro da discussão historiográfica as questões 5 Mais adiante, abordaremos, ainda que de maneira breve
e apenas exemplificativa, estes três paradigmas, os quais,
teóricas, ao lado das questões metodológícas,
de modo algum, constituem os únicos paradigmas ou al-
Emerge neste momento um campo que já ternativas teóricas que se colocam para os historiadores.
se pode pensar efetivamente como uma teoria Os caminhos teóricos percorridos pelos historiadores, até
hoje e ainda hoje, são muito diversificados, e também
admitem imbricamentos que não poderão ser tratados
4 VOLTAlRE, 2006, p. 272 [original: 1771]. neste pequeno livro. Para um estudo mais aprofundado
do Positivismo e do Historicismo, o leitor poderá ler o

18
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É neste novo contexto que se tornará legítimo Ao lado disso, há também as obras produ-
se falar, mais propriamente, em uma "Teoria zidas pelos filósofos historicistas, como o cé-
da História': lebre ensaio de Wilhelm Dilthey (1833-1911)
Outro indício particularmente impor- escrito em 1883 com vistas a uma Introdução
tante deste novo momento em que os histo- ao estudo das Ciências do Espírito. De igual
riadores passam a se ver como uma comu- maneira, a par do diálogo que já se começa
nidade específica, e como especialistas que a estabelecer em torno de questões historio-
se colocam em diálogos recíprocos e que se gráficas e de ordem teórica, já aparecem nos
agrupam em determinadas redes confor- prólogos das primeiras grandes obras de his-
me seus posicionamentos teórico-metodo- toriadores historicistas as reflexões metodo-
lógicos, é a emergência do gênero historio- lógicas sobre o "fazer historiográfico", procu-
gráfico por excelência: obras nas quais os rando estabelecer um modelo direcionado às
próprios historiadores discorrem sobre a questões de método e crítica documental, tal
própria historiografia e sobre as correntes como ocorre com Leopold von Ranke (1795-
históricas de sua época. Georg Gottfried 1880) em sua História das Nações Latinas e
Gervinus (1805-1871) escreve em 1837 o Teutônicas (1824). Eis aqui o duplo alicerce
ensaio As grandes linhas da História; Hein- da Teoria e do Método a estabelecer, definiti-
rich von Sybel (1817-1895) elabora em 1856 vamente, um novo campo disciplinar.
um estudo intitulado Sobre o estado da mo-
derna historiograjia alemã; Iohann Gustav
Droysen (1808-1884) produz entre 1881 e
1883 o seu Historik.

segundo volume da coleção Teoria da História, publicado


por esta editora com o título Teoria da História, volume
2: Os primeiros paradigmas - Positivismo e Historicismo
(BARROS, 2011a). Para um estudo aprofundado do Ma-
terialismo Histórico e seus desdobramentos no campo
da historiografia, o leitor poderá ler o terceiro volume
da mesma coleção, o qual traz o título Teoria da Histó-
ria, volume 3: Os paradigmas revolucionários (BARROS,
2011b,2011c).

20 21
2
"Teoria "6

Antes de avançarmos na reflexão pertinen-


te aos diversos aspectos pertinentes à Teoria
da História, será oportuno precisar conceitu-
almente o que é "Teoria" Não são raras, por
exemplo, confusões inadvertidas entre "Teo-
ria" e "Método': e mais particularmente entre -f G'
"Teoria da História" e "Metodologia da Histó- ,k i'
ria" embora esses dois âmbitos sejam na ver- ío, r
dade bem diferenciados, ainda que interpene- f .~
trantes um em relação ao outro. Ter uma clara f~
consciência acerca do que é o "teórico" e do ~
r

que é o "metodológíco" e de como essas ins- ~
tâncias se relacionam, será fundamental para T
que avancemos nessa reflexão inicial sobre o
papel da Teoria na formação do historiador.

6 Esta reflexão inicial sobre o que é "teoria", nos seus vá-


rios sentidos possíveis e ainda relativamente aos diversos
campos de conhecimento - e não só na História - está
também registrada no segundo capítulo do livro Teoria da
História, volume 1: Princípios e Conceitos Fundamentais
(BARROS,2011a).
Começaremos por lembrar que uma Teoria a Enciclopédia Einaudi, como naquela época a
é uma Visão de Mundo". É através de teo- ideia de conhecimento estava então muito asso-
rias - que correspondem a um âmbito que ciada à noção de "percepção" de uma realidade
inclui uma série de dispositivos e procedi- subjacente a ser desvelada pelo filósofo ou pelo
mentos que vão dos conceitos à formulação pesquisador, esta "contemplação" que estava
de hipóteses - que os cientistas conseguem implicada na noção de "theoria" abarcava "si-
enxergar a realidade ou os seus objetos de multaneamente a percepção, o conhecimento, e
estudos de modos específicos, seja qual for o a aceitação da ordem das coisas".
seu campo de conhecimento ou de atuação. Pode-se perceber uma variação nessa re-
É muito interessante constatar que a noção lação entre a "teoria" e o "ver" à medida que
de "Teoria" sempre esteve ligada, desde a o conhecimento passa a ser proposto mais
Antiguidade, à ideia de "ver" - ou de "con- como uma "construção" do que como uma
ceber" - o que prossegue até os dias de hoje. "percepção". A constante reformulação do
Por outro lado, na história do pensamento conceito de "teoria" acompanha essa pas-
não deixaram de ocorrer certamente varia- sagem, essa mudança de atitude do homem
ções importantes nesta relação entre a "teo- moderno perante o conhecimento, por assim
ria" e o "ver': por vezes bastante sutis, à medi- dizer. É assim que, já desde o início do sécu-
da que o "conhecimento" foi sendo definido lo XX: e no próprio seio das ciências exatas,
ou compreendido de maneiras diversas. cientistas como Albert Einstein (1879-1955)
Para a maior parte dos filósofos gregos da e filósofos como Karl Popper (1902-1994)
Antiguidade, "theorid' significava "contempla- começaram cada vez mais a chamar atenção
ção': Entrementes, tal como assinala Pierre De- para o fato de que é a nossa Teoria que decide
lattre (1903-1969) em seu verbete "Teoria" para o que podemos observar, ou como observar.
Karl Popper, por exemplo, vale-se da interes-
7 Particularmente nas Ciências Humanas, a palavra "teo-
ria" tem sido empregada de maneira muito diversificada.
sante metáfora de que "as teorias são redes,
Robert Merton já observava que muito frequentemente a
palavra é empregada em sentidos diversos, que abarcam 8 DELATTRE, 1992, p. 224. Os vestígios da ideia da teoria
desde as menores hipóteses de trabalho até as mais amplas como "contemplação" podem ser encontrados em diver-
especulações ou aos sistemas axiomáticos de pensarnen- sas línguas. Em português, frequentemente perguntamos
to, daí decorrendo o cuidado que se deve ter no emprego pelos aspectos que são "contemplados" por esta ou por
desta expressão (MERTON, 1970, p. 51) [original: 1949]. aquela teoria.

24 25
dos eunucos" (1881) 10 e ou o Dilthey de
lançadas para capturar aquilo que denomina- "Introdução às Ciências do Espírito" (1883).
mos 'o mundo': para racionalizá-Io, explicá- Tom Rüsen, em um texto de 1996 sobre "Nar-
-10, dominá-Io'",
ratividade e Objetividade", já observava que
Outro aspecto bastante interessante a con- mesmo em outros historicistas como Sybel
siderar é o fato de que as ciências humanas (1863) e Gervinus (1837) já se considerava
e sociais precedem as ciências exatas nessa o papel do envolvimento do historiador nas
consciência mais aguçada de que, rigorosa- questões de seu tempo e de seus pontos de
mente falando, a teoria transforma a reali- vista na elaboração de uma história que, para
dade observada, ou ao menos revela certos eles, nem por isso deixava de comportar um
aspectos de uma realidade observada e não tipo de objetividade".
outros, conforme essa teoria seja construí- A noção de que o conhecimento é cons-
da de uma maneira ou de outra, ou a partir truído de um ponto de vista, o que leva a uma
de certos pontos de vista e parâmetros mais maior compreensão da "teoria" como visão de
específicos. Além disso, ao menos em algu- mundo, já era algo discutido entre os cientistas
mas das correntes e paradigmas das ciências
humanas que já se afirmam desde os sécu-
los XVIII e XIX - e podem ser citados, por 10 Nesse texto, o historiador alemão Iohann Gustav
Droysen registra as seguintes palavras, em apoio de
exemplo, alguns dos setores mais relativis-
uma perspectiva historiográfica que reconhece a
tas do Historicismo por oposição ao Posi- historicidade do próprio historiador: "Eu não aspiro
tivismo como um todo - tem-se razoavel- a atingir senão, nem mais nem menos, a verdade re-
mente bem desenvolvida uma significativa lativa ao meu ponto de vista, tal como minha pátria,
consciência de que o que se pode perceber minhas convicções políticas e religiosas, meu estudo
da realidade acha-se francamente interferi- sistemático me permitem ter acesso [...] é preciso ter
a coragem de reconhecer esta limitação, e se consolar
do pelo ponto de vista do sujeito que produz
com o fato de que o limitado e o particular são mais
o conhecimento.
ricos que o comum e o geral. Com isso, a questão
Na segunda metade do século XIX isso da objetividade, de atitude não tendenciosa do tão
já parecia claro para alguns historicistas, louvado ponto de vista de fora e acima das coisas, é
como o Droysen do ensaio ''A objetividade para mim relativizada" (DROYSEN. Historik, 1881).

11 RÜSEN, 1996, p. 85.


9 POPPER, 1995, p. 61 [original: 1934].

27
26
que estudavam a sociedade, e de todo modo 1971, já chamava a atenção para o fato de que
o convívio com teorias concorrentes e diver- "a forma ão de novos conceitos é a o era ão
gentes já situava estes pensadores em uma mediante a gual se Rroduz o enri uecimento
perspectiva distinta da dos físicos que ainda se da visão"!'. A essa formulação, o historiador
viam unificados pelo paradigma newtoniano. francês seguia argumentando que Tucídides
Dessa maneira, pode-se dizer que no século (460-400 a.C}, Eginhard (770-840) ou San-
XX as ciências exatas começariam a se apro- to Tomás de Aquino (1225-1274) não teriam
ximar de um tipo de autopercepção acerca dos podido enxergar, nas sociedades de seu tem-
seus próprios processos de construção do co- po, aquilo que hoje nelas procuramos: "clas-
nhecimento que já vinham sendo desenvolvi- ses sociais", "mentalidades': "mobilidade so-
dos na prática pelas diversas ciências sociais e cial': "atitudes econômicas", e tantos outros
humanas, inclusive a História, no século ante- aspectos e fatores que aprendemos a ver
rior. Poderemos lembrar ainda o filósofo aus- nas diversas sociedades históricas através
tríaco Wittgenstein (1889-1951), que mais tar- de conceitos que nós mesmos formulamos
de também iria reforçar essa mesma ideia, mas ou que herdamos, para modificá-los ou não,
já aplicada ao campo semântico e linguístico, de nossos predecessores na análise historio-
ao afirmar que "olimite da minha linguagem é gráfica. É uma determinada teoria - uma
o limite do meu mundo?". certa maneira de ver as coisas - e seus ins-
Será oportuno considerar essa relação entre trumentos fundamentais, os conceitos, que
a Teoria como "visão de mundo" e a redefini- nos possibilitam formular uma determinada
ção da realidade que é através dela observada leitura da realidade histórica e social, enxer-
ou imaginada. Apenas para pontuarmos um gar alguns aspectos e não outros, estabelecer
exemplo inicial, já pertinente à Historiografia, conexões que não poderiam ser estabeleci-
podemos evocar um aspecto fundamental da das sem os mesmos instrumentos teóricos
Teoria que se refere à construção de "concei- de que nos valemos. Desta maneira, a Teoria
tos': Paul Veyne (n. 1930), em seu célebre en- é, à partida, fundamental ara a constituição
saio Como se escreve a História, publicado em de ual uer cam o de conhecimento, o que
inclui a História.
12 Tratactus Lógico-philosophicus (WITTGENSTEIN, 5.6)
[original: 1918]. 13 VEYNE, 1982, p. 106 [original: 1971].

28 29
Teoria X Método

Antes de passarmos mais especificamente


às Teorias da História, será oportuno apro-
fundar a discussão em torno dessa noção
fundamental de que as teorias são visões de
mundo. Isso ficará mais claro de duas manei-
ras: pelo contraste entre Teoria e Método, e
pelo esclarecimento de que, embora as teo-
rias sejam necessariamente visões de mundo,
existem outros tipos de visões de mundo que
nada têm a ver com Teoria. Vejamos cada um
desses aspectos por partes.
A "teoria" remete a uma maneira de ver o
mundo ou de compreender o campo de fenô-
menos que estão sendo examinados. Remete
aos conceitos e categorias que serão emprega-
dos para encaminhar uma determinada leitu-
ra da realidade, à rede de elaborações mentais
já fixada por outros autores (e com as quais o
pesquisador irá dialogar para elaborar o seu
próprio quadro teórico). A "teoria" remete a
generalizações, ainda que essas generalizações
se destinem a serem aplicadas em um objeto um "modo de pensar" (ou de ver), a "meto-
específico ou a um estudo de caso delimitado dologia" refere-se a um "modo de fazer". Esses
pela pesquisa. Por outro lado, a Teoria também dois verbos - "Ver" e "Fazer" - constituem os
implica uma visão sobre o próprio campo de gestos fundamentais que definem, respectiva-
conhecimento que se está produzindo. É por mente, Teoria e Método.
exemplo uma questão teórica a subdivisão de
certo campo de conhecimento em modalida-
des internas (a Física que se desdobra em "ter-
"Modo de Ver"
modinâmica', "ótica" ou "mecânica', por exem-
plo, ou a historiografia que se desdobra em
"história cultural': "história política" "história
econômica" e tantas outras modalidades). En-
fim, a Teoria tanto remete à maneira como se
concebe um certo objeto de conhecimento ou
uma determinada realidade examinada, a par- METODOLOGIA
tir de dispositivos específicos que são os con-
ceitos e fundamentos teóricos de diversos ti-
pos, como também se refere à maneira como o
"Modo de Fazer"
pesquisador ou cientista enxerga a sua própria
disciplina ou o seu próprio ofício.
Já a "metodologia" remete sempre a uma
determinada maneira de trabalhar algo, de Devem-se considerar, evidentemente, as
eleger ou constituir materiais, de extrair algo possíveis interações entre Teoria e Metodo-
específico desses materiais, de se movimen- logia. É verdade, a esse propósito, que uma
tar sistematicamente em torno do tema e dos decisão "teórica" pode encaminhar também
materiais concretamente definidos pelo pes- uma escolha "metodológíca" Reciprocamente,
quisador. A metodologia vincula-se a ações a metodologia - ou uma certa maneira de fa-
concretas, dirigidas à resolução de um pro- zer as coisas - também pode retroagir sobre a
blema; mais do que ao pensamento, remete concepção teórica do pesquisador, modifican-
à ação. Assim, enquanto a "teoria" refere-se a do sua visão de mundo. Frequentemente, há

32 33
referem a aspectos práticos, procedimentos
certas implicações metodológicas a partir de padronizados, técnicas de precisão, e outros
certos pressupostos teóricos, e, inversamen- aspectos. Por exemplo, os arqueólogos estru-
te, quando optamos por certa maneira de fa- turalistas, processualistas, historicistas, posi-
zer as coisas, de enfrentar situações concretas tivistas, marxistas, histórico-culturalistas, ou
apresentadas pela Pesquisa, também estamos vinculados às mais diferenciadas perspecti-
optando por um certo posicionamento teóri- vas ou combinações teóricas, podem susten-
co. Por exemplo, não é raro que o Materia- tar posicionamentos teóricos muito distintos,
lismo Histórico - um dos principais paradig- e em muitos casos inconciliáveis. Mas todos
mas historiográficos contemporâneos - seja provavelmente concordarão, na atualidade,
referido como um campo teórico-metodoló- com certo conjunto de procedimentos me-
gico, uma vez que enxergar a realidade histó- todológicos que devem ser observados pelo
rica a partir de certos conceitos como a "luta arqueólogo no sentido de isolar adequada-
de classes" ou como os "modos de produção" mente o seu sítio, registrar a posição dos obje-
também implica necessariamente uma deter- tos encontrados, fazer medições de espaço,
minada metodologia direcionada à percep- tempo e profundidade na terra, utilizar téc-
ção dos conflitos, das relações entre condi- nicas de datação adequadas para os objetos
ções concretas imediatas e desenvolvimentos encontrados, e tantos outros procedimentos
históricos e sociais. Uma certa maneira de ver para os quais existem determinados consen-
as coisas (uma teoria) repercute de alguma sos entre os arqueólogos com relação ao cor-
maneira numa determinada maneira de fazer reto tratamento das fontes materiais. Já para
as coisas em termos de operações historio- os modos de analisar as fontes, de extrair
gráficas (uma metodologia). Melhor dizendo, delas informações e discursos, ou mesmo de
uma maneira específica de ver as coisas abre pontuar as questões adequadas que permiti- .
certas alternativas ou possibilidades de fazer rão estabelecer uma base para a formulação
as coisas, e pode bloquear ou tornar desne- de interpretações, para esses aspectos existe
cessárias outras. uma gama muito diversificada de possibili-
Pode também ocorrer, para certos aspec- dades metodológicas, e algumas delas podem
tos de uma pesquisa, a independência en- encontrar menor ou maior consonância com
tre procedimentos teóricos e metodológicos, determinadas perspectivas teóricas.
ao menos no caso das metodologias que se
35
34
Também os profissionais de diversos cam- a pesquisa em História, e sua posterior con-
pos de saber que lidam com entrevistas - ainda cretização em Escrita da História (i. é, a apre-
que se vinculem a perspectivas teóricas diferen- sentação dos resultados da pesquisa em for-
ciadas - em certos aspectos dispõem de técni- ma de texto) envolvem necessariamente um
cas que podem ser partilhadas por todos. Os confronto interativo entre teoria e metodolo-
tipos de entrevistas - dirigidas, semidirigidas, gia. O ponto de partida teórico, naturalmen-
livres - os modos de coletar os dados (anota- te, corresponde a uma determinada maneira
ções, gráficos, estatísticas, comparação entre os como vemos o processo histórico (porque há
entrevistados), os procedimentos que obrigam muitas). Podemos alicerçar nossa leitura da
a definir muito bem o perfil dos entrevistados, a História na ideia de que esta é movida pela
observância sistematizada das condições no in- "luta de classes': tal como foi acima proposto
terior das quais se realiza a entrevista, a recolha em consonância com um dos princípios fun-
de autorizações para posterior publicação ou damentais do Materialismo Histórico. Mas se
uso das entrevistas, de modo a atender a legis- quisermos identificar esta "luta de classes" na
lação em vigor e as exigências dos comitês de documentação que constituímos para exami-
ética em pesquisa, todo esse conjunto faz parte nar este ou aquele período histórico especí-
de uma metodologia mais geral de aplicação de fico, teremos de nos valer de procedimentos
entrevistas, e um conjunto básico de preceitos técnicos e metodológicos especiais. Será tal-
da História Oral com os quais concordará a am- vez uma boa ideia fazer uma "análise de dis-
pla maioria dos pesquisadores. curso" sobre textos produzidos por indivíduos
Desse modo, precisamos estar atentos para pertencentes a esta ou àquela "classe social"
o fato de que o âmbito da Metodologia é mui- ("classe social",aliás, é também uma categoria
to vasto, e inclui desde procedimentos téc- "teórica"). Essa análise de discurso poderá se
nicos mais específicos, até métodos voltados empenhar em identificar "contradições", ou
para a análise e interpretação de dados, ou de em trazer a nu as "ideologias" que subjazem
constituição destes mesmos dados, os quais já sob os discursos examinados, e para tal pode-
implicam escolhas que apresentam uma inte- rá se valer de técnicas semióticas, da identi-
ração mais direta com a Teoria. ficação de temáticas ou de expressões recor-
Retornemos à discussão sobre a intera- rentes (análises isotópicas), da contraposição
ção entre Teoria e Metodologia. Também, intertextual entre discursos produzidos por

36 37
indivíduos que ocupam posições de classe di-
ferenciadas, e assim por diante. possíveis para qualquer objeto de investi-
De igual maneira, se acreditamos que as gação ou para qualquer campo de conheci-
condições econômicas e materiais determinam mento examinado, e que as diversas teorias
em alguma instância a vida social e as superes- podem se contrapor, suceder ou se sobrepo-
truturas mentais e jurídicas de uma determina- rem umas às outras. Uma vez que cada teo-
da comunidade humana historicamente locali- ria propõe ou se articula a uma determinada
zada (outro postulado teórico do Materialismo "visão de mundo", ela também corresponde
Histórico) deveremos selecionar ou constituir à formulação de determinadas perguntas, e
metodologias e técnicas capazes de captar os consequentemente abre espaço a um certo
elementos que caracterizariam esta vida ma- horizonte de respostas. Na mesma medida
terial. Dependendo do tipo de fontes históri- em que as teorias se diversificam, também
cas utilizadas poderemos, por exemplo, realizar variam muito as respostas proporcionadas
análisesquantitativas ou seriais,utilizar técnicas por cada teoria em relação a certa realidade
estatísticaspara levantar as condições de vida de ou objeto examinado. Thomas Kuhn, autor
determinados grupos sociaisdentro de uma de- do célebre livro A estrutura das revoluções
terminada população, e assim por diante. científicas (1962), já considerava que uma
De todo modo, apesar das mútuas reper- teoria frequentemente se afirma em detri-
cussões entre teoria e método, não devemos mento de outra precisamente porque res-
confundir uma coisa com a outra. Se há uma ponde a algumas questões que a outra teoria
interpenetração possível entre concepções não respondia. Nessa perspectiva, as mu-
teóricas e práticas metodológicas disponí- danças de teoria (ou as opções por uma ou
veis ao historiador ou a qualquer outro tipo outra teoria) ocorrem porque uma teoria sa-
de pensador/pesquisador, deve-se ter sempre tisfaz mais do que outra: porque as questões
em vista que "teoria" e "método" são coisas a que a teoria adotada dá resposta são consi-
bem distintas, da mesma maneira que "ver" e deradas mais importantes ou relevantes pelo
"fazer" são atitudes verbais e práticas diferen- sujeito que produz o conhecimento. Dito de
ciadas, embora possam se interpenetrar. outra maneira, cada teoria, ao correspon-
Posto isso,deve-se ainda entender que pode der ou equivaler a uma determinada visão de
existir uma grande diversidade de teorias mundo, permite que sejam formuladas de-
terminadas perguntas.
38
39
Bem compreendidas as diferenças entre estudiosos da epistemologia - uma teoria se-
"Teoria" e "Método': outro comentário impor- ria um "conjunto de proposições ligadas 10-
tante é o de que, se toda Teoria é uma "visão de gicamente entre si e que possuem referentes
mundo" nem toda visão de mundo é necessa- em comum"!", Faz parte da ideia de teoria
riamente uma teoria. Uma religião, por exem- a possibilidade de demonstração (de con-
plo, é uma visão de mundo, da mesma manei- firmar ou de extrair consequências daquilo
ra que uma mitologia, ou uma cosmogonia. que é formulado). Para estarmos no âmbito
A Magia - que também propõe uma prática da Teoria também é necessário que o que se
e um modo de agir sobre a vida cotidiana - formula teoricamente seja submetido a um
também está implicada em um tipo de visão diálogo com outras proposições teóricas,
de mundo. Uma concepção artística, do mes- seja para reforço ou para refutação. As di-
mo modo, pode corresponder a um outro versas teorias relacionam-se, por contraste
tipo de visão de mundo. A "teoria", portanto, ou por interação, no interior de um campo
corresponde apenas a um dos vários tipos de conhecimento mais vasto, que é o cam-
de visão de mundo que se disponibilizam ao po científico específico que se tem em vis-
homem no seu permanente esforço de com- ta. Dessa maneira, se uma visão de mundo
preender e recriar o mundo no qual se encon- como a Religião pode se colocar como uma
tra inserido. experiência íntima do ser humano perante
Embora a palavra "teoria" também possa Deus ou o mundo supranatural, já a Ciên-
ser empregada para outros tipos de ativida- cia - e as teorias que nesta estão envolvidas -
des, geralmente as Teorias - e as Teorias da colocam-se necessariamente em um campo
História não são exceção - correspondem, de diálogos.
conforme já foi ressaltado, a um tipo de visão
de mundo que se relaciona ao que hoje en-
tendemos por Ciência. Nesse sentido, uma
Teoria pode ser definida como um corpo
coerente de princípios, hipóteses e concei-
tos que passam a constituir uma determi-
nada visão científica do mundo. Conforme
Mario Bunge (n. 1919) - um dos mais célebres 14 BUNGE, 1982, p. 41.

40 41
4
Teoria da História

Como destaca Iõrn Rüsen (n. 1938) em


sua obra Razão Histórica, teoria da história:
fundamentos da ciência histórica1s, a Teoria da
História se refere ao "pensamento histórico
em sua versão científica".De acordo com essa
perspectiva, pode-se estabelecer uma distin-
ção mais clara entre as "Filosofias da Histó-
ria" e as "Teorias da História" propriamente
ditas, considerando que estas se vinculam ao
novo momento em que a historiografia pas-
sa a reivindicar um estatuto de cientificidade,
chamando a si novas necessidades. É também
o que postula Amo Wehling em seu texto
"Historiografia e Epistemologia Histórica?",
fazendo notar que, obviamente, já existiam
formas de conhecimento histórico bem antes
da passagem do século XVIII ao XIX, neste

15 RUSEN, 2001, p. 14.

16 WEHLING, 2006, p. 181.


momento em que se passa a tomar como pa- ça a manifestar pretensões cientificistas no
râmetro para a historiografia a cientificidade século XIX e a se constituir como disciplina
e no qual, portanto, já se pode falar em "teo- universitária; e, por fim, deve-se considerar
rias da história': Contudo, naqueles momen- que as "teorias da história" podem se referir
tos anteriores - como a antiga Grécia, o mun- a questões particulares. Nesse sentido, pode-
do Romano, a Idade Média, o Renascimento, mos acompanhar as reflexões de Agner Heller
ou o Moderno Absolutismo - apresentavam-se (n. 1929) em seu ensaio Uma Teoria da Histó-
para a historiografia referenciais muito diver- ria (1981), no qual a filósofa húngara sustenta
sos, como "a anamnese grega, o patriotismo que, em termos de teorias da história, pode-
romano, o providencialismo medieval, ou o mos nos referir tanto àquelas que se referem
oficialismo absolutista?". Não é senão em um a objetos historiográficos específicos (eventos
contexto no qual a cientificidade se apresenta ou processos como a Revolução Francesa, o
como um referencial para a historiografia, as- Nazismo, as Crises do Capitalismo) como às
pecto que se afirma mais consistentemente na teorias mais amplas, mais generalizadoras,
passagem do século XVIII para o século XIX, que se referem aos modos de elaborar a his-
que se pode falar da emergência de "teorias toriografia (como o Positivismo, o Historicis-
da História" como grandes sistemas de com- mo, o Materialismo Histórico):
preensão sobre a História e a Historiografia.
Há tipos diversos de teorias: umas mais par-
É importante ressaltar ainda que a expres-
ticularísticas e outras mais genéricas. Os his-
são "Teoria da História" é utilizada geralmente toriadores podem fornecer uma teoria que
em três sentidos distintos: de um lado, pode diga respeito a determinado evento, a uma
significar o conjunto global de artefatos teóri- série de eventos, a um período, ao desenvol-
cos (conceitos, princípios, perspectivas) dispo- vimento de instituições segundo um entre-
cruzamento cultural e assim por diante".
níveis aos historiadores; de outro lado, pode
se referir aos grandes paradigmas teóricos - No limite máximo de generalização, os
como o Historicismo, o Positivismo, ou o Ma- historiadores podem oferecer teorias acerca
terialismo Histórico - que começam a surgir do que seja a própria Historiografia. O que é a
precisamente quando a historiografia come- História, como ela se constrói, quais as tarefas

17Ibid. 18 HELLER,1993,p. 176 [original: 1981).

44 45
de outra. Não são obrigados, os historiadores,
do historiador diante da produção deste tipo a seguirem uma cartilha paradigmática. Ge-
de conhecimento? Para que serve a História? ralmente, há historiadores cuja visão de mun-
Que tipo de conhecimento é a Historiografia? do sobre a história e sobre a historiografia se
É possível, ou desejável, que o historiador faça aproximam, e é isso o que vai dando origem a
previsões do futuro a partir de suas observa- um determinado campo paradigmático. Claro
ções do passado? Que tipo de envolvimento - que, uma vez que os historiadores estão mer-
contemplativo, distanciado, comprometido, gulhados na própria história, com frequência
militante - deve ter o historiador em relação podem se distanciar em suas posições funda-
à História de sua própria época? Deve a His- mentais os historiadores que antes estavam
toriografia ser colocada a serviço de alguma inseridos, por afinidade, no interior de um
causa, ou deve conservar o ideal de constituir mesmo campo paradigmático. Nesse caso, um
um tipo de conhecimento desinteressado? historiador pode migrar ou colocar-se entre
Perguntas como essas são respondidas de dois modelos historiográficos distintos, ou
maneiras diferenciadas pelas várias Teorias pode mesmo vir a construir uma nova teoria
da História - no sentido mais generalizado da geral sobre a História". É importante, de todo
expressão - e terminam por constituir, na es- modo, que consideremos os grandes paradíg-
pecificidade de suas respostas, paradigmas mas historiográficos que abordaremos mais
historiográficos distintos. Por exemplo, o pa- adiante como campos que fornecem modelos
radigma Positivista e o paradigma Historicista ou um determinado horizonte de visibilidade
encaminham teorias da História bem distin- ou de escolhas, mas não como prisões teóricas
tas. Um e outro podem ser contrapostos como às quais teriam de se ajustar necessariamente
modelos bem diversos de historiografia. Claro todos os historiadores.
que, quando se fala em Positivismo e Histori-
19 Já que citamos a filósofa húngara Agner Heller (n. 1929),
cismo, temos modelos limites. Os historiado-
podemos lembrar que ela começa a sua produção filosófica
res específicos, no seu trabalho singular, não como proeminente pensadora marxista, bem situada na li-
precisam se enquadrar diretamente em um ou nha de influência de Lukács, e que depois migra para uma
perspectiva liberal. Para dar um outro exemplo, o historia-
outro desses paradigmas. Podem buscar mes-
dor italiano Benedetto Croce (1866-1952) inicia sua pro-
mo mediações entre os dois, podem propor dução historiográfica como marxista, e depois se desloca
variações, podem responder algumas das p.er- para uma perspectiva francamente historicista.
guntas acima propostas de uma maneira ou
47
46
Outro aspecto relevante a ressaltar é que, leitura definitiva para examinar os processos
em termos de "teorias da história" não exis- históricos. Podemos, como historiadores, optar
te a princípio a possibilidade de se falar em pelo Positivismo, pelo Historicismo, pelo Ma-
algumas teorias ou paradigmas historiográfi- terialismo Histórico, por combinações entre
cos que sejam consensualmente consideradas esses paradigmas, por mediações entre eles,
melhores do que outros. Tal como assinala por uma abordagem weberiana, ou por uma
Agner Heller em seu ensaio Uma Teoria da teoria eclética à base de elementos de proce-
História (1981), as teorias da história com- dências teóricas diversas. Mas isso será sem-
petem entre si, ratificam-se ou retificam-se pre uma opção teórica. Ainda que um histo-
umas às outras, integram-se ou excluem-se riador arrogue-se estar do lado da verdade
mutuamente, apresentam leituras diferentes em termos de escolhas teóricas, jamais haverá
para os mesmos problemas e objetos his- consenso sobre isso. A Teoria da História será
toriográficos. As teorias da história não são sempre uma grande Arena, um eterno campo
deste modo cumulativas: uma não se constrói de disputas e diálogos vários.
necessariamente sobre a outra, integrando-a Trata-se esta de uma situação um pouco
ou refutando-a, como se tivéssemos aqui um distinta da que ocorre, ou pelo menos ocor-
processo cumulativo no qual os saberes vão se reu até tempos recentes, com certos campos
superpondo em um grande crescendo de pre- de conhecimento como a Física. Durante sé-
cisão e refinamento teóricos. Se um historia- culos, vigorou o paradigma newtoniano da
dor tiver por objetivo o de desenvolver uma Física, e as teorias que iam sendo construídas
nova teoria sobre os processos relacionados à dentro desse campo de conhecimento apoia-
Revolução Francesa, jamais poderá dizer que vam-se umas nas outras, ampliando um de-
finalmente chegará com o seu trabalho à teo- terminado horizonte de leitura da realidade
ria correta e definitiva sobre essa questão. De no qual as descobertas e formulações teóri-
igual maneira, ainda que defenda ferrenha- cas feitas no passado tornavam-se bases para
mente o seu modo de conceber a historiogra- novas formulações no presente e no futuro.
fia de modo mais geral, um Positivista jamais Havia também, é claro, aportes teóricos que
poderá dizer que refutou o Historicismo, ou no processo de reflexão e pesquisa dos físicos,
vice-versa, e tampouco o Materialismo His- ao longo da história de seu campo de conhe-
tórico poderá ser colocado como a tábua de cimento, viam-se descartados definitivamente,

48 49
ocorrendo também um certo consenso de
todos eles acerca do desenvolvimento cumu- particularizantes sobre aspectos históricos
lativo de seu campo de conhecimento, de tal específicos - como a Revolução Francesa ou
maneira que se costumava falar em "desco- a passagem do mundo medieval ao mundo
bertas" - algo que se tornava uma conquis- moderno - seja no que se refere a teorias mais
ta definitiva para os físicos. Esse padrão só gerais sobre a própria história - sobre a histó-
começou a ser quebrado com a emergência ria processual como um todo ou sobre os mo-
de novos paradigmas da Física, como a "Teo- dos como se deve escrever a historiografia,
ria da Relatividade" ou a "Física Quântica", por exemplo. Pensadores iluministas diver-
que a rigor trouxeram novos modos de ver o sos ofereceram leituras diferenciadas daquilo
mundo que eram bem distintos do paradig- que consideravam uma tendência da história
ma newtoniano que vigorara durante séculos. universal; historiadores românticos do século
Neste momento, em que se dá na passagem XVIII e historicistas do século XIX criticaram
do século XIX para o XX e nas primeiras dé- precisamente esta ideia de que seja possível
cadas deste novo século, pode-se dizer que ou válido escrever uma história universal, vá-
a Física, enquanto campo de saber específi- lida para todos os povos; entrementes, os po-
co, começou a experimentar algo que já era sitivistas do século XIX logo reinvestiriam na
bem familiar aos historiadores e cientistas busca de leis gerais - e entre eles havia os que
sociais: a convivência de teorias distintas que acreditavam que o desenvolvimento histórico
forneciam padrões distintos de visualização era orientado pelo determinismo geográfico,
dos fenômenos físicos. Os físicos passaram a pelo determinismo biológico, ou pelo deter-
se defrontar, a partir de Einstein e da Física minismo econômico. Em outra linha de re-
Quântica, afora outras diversas teorias, com novações, Friedrich Hegel (1770-1831) intro-
o fato de que várias teorias podem ser apre- duz, na primeira metade do século XIX, uma
sentadas como corretas dentro de um certo leitura dialética da história, de base idealista,
campo de saber, embora fornecendo leituras mas logo Karl Marx (1818-1883) retoma de
bem diversificadas, ou mesmo antagônicas Hegel a proposta dialética para a recolocar sob
entre si, da realidade examinada. uma leitura materialista da História. Já no sécu-
A competição entre teorias historiográficas lo XX, historiadores ligados aos Annales, como
já era antiga - seja no que se refere a teor~as Fernand Braudel (1902-1985), teorizariam so-
bre os padrões múltiplos de temporalidade, in-

50
51
troduzindo o conceito de "duração" nos mo- ros outros historiadores que viam o seu cam-
dos historiográficos de abordar o tempo". Ao po de conhecimento como relacionado a uma
mesmo tempo, no âmbito do Materialismo Ciência ou ao menos a um tipo de conheci-
Histórico, infinitas variações teóricas seriam mento cientificamente conduzido". A Teoria
propostas pelos historiadores que tomaram da História, enfim, nunca deixou de multi-
como linha mestra de orientação os princí- plicar as suas alternativas internas. Abordar
pios estabelecidos por Marx e Engels no sé- a Teoria da História, por isso mesmo, é aden-
culo anterior. Enquanto isso, novas e antigas trar um campo de diálogos, de disputas, de
propostas teóricas e historiográficas não ces- inovações permanentes.
sam de surgir da paleta dos historiadores, seja
repensando os padrões que regeriam o mo-
vimento geral da história, seja examinando
sob novas perspectivas esse próprio campo
de saber que é a História. Assim, historiado-
res como Arnold Toynbee (1889-1975) ou
Oswald Spengler (1880-1936) iriam propor
uma visão de mundo sobre a história das
civilizações que as abordava em termos de
nascimento, ascensão e declínío'". Benedetto
Croce (1866-1952), de sua parte, e também
Collingwood (1889-1943)22, aproximariam a
historiografia da Arte, por oposição a inúme-

20 "O Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo à época de


Filipe Il'' [original: 1949] e "História e Longa Duração"
[original: 1958]. BRAUDEL, 1978, p. 7-10,41-78.

21 TOYNBEE. Um estudo da História [originais: 1934-1961]. 23 Como já ressaltamos, essa costumava ser a posição de
• SPENGLER. O declínio do Ocidente [original: 1918]. Febvre, bem expressa nos Combates pela História (1953) .
Enquanto isso, Paul Veyne, que em Assim se escreve a His-
22 CROCE. A História reduzida ao conceito geral de Arte, tória (1971) afastava-se da leitura da História como ciên-
1893 .• COLLINGWOOD. Uma ideia de História [origi- cia, em 1974, em ''A História conceptualizante", já admite
nal: 1946]. que a história apresenta núcleos de cientificidade.

52 53
5
o surgimento das
Teorias da História: o
contraste inicial entre
Historicismo e Positivismo

A passagem do final do século XVIII ao XIX


é assinalada por uma nova perspectiva do que
deveria ser a História". O acentuado interesse
de transformar a historiografia em um campo
de conhecimento com estatuto científico, e a
emergência da figura do historiador como um
profissional especializado que seria o único
institucionalmente legitimado a escrever his-
tória, estarão aqui acompanhados da inserção
da História entre as cadeiras universitárias.
Um aspecto muito interessante a se con-
siderar nesse processo é lembrado por Amo
Wehling em um texto sobre "Historiogra-
fia e Epistemologia Histórica" (2006). Para

24 RÜSEN, 1996.
que ocorresse a passagem da historiografia O que ocorre é que tanto o Historicismo
ao campo científico, a História - ao contrá- como o Positivismo, cada qual à sua maneira,
rio de outras ciências sociais que já nasceram pretendem considerar a História e as demais
em um contexto de cientificidade - precisou ciências da sociedade do ponto de vista da
passar por uma verdadeira "refundação" sim- produção de um conhecimento científico -
plesmente porque diversas formas de histo- mesmo que divergindo com relação ao tipo
riografia já existiam como campo de saber de conhecimento científico que deveria ser
específico desde a Antiguidade (como, aliás, constituído pela historiografia. O mesmo, ali-
também o Direito e a Geografia, e em con- ás, ocorrerá com a perspectiva que seria tra-
traste com as novas disciplinas que surgem zida pelo Materialismo Histórico. Sutilmente,
nos séculos XVIII e XIX, tais como a Socio- delineia-se aqui a passagem da "Filosofia da
logia, a Antropologia, a Economia Política e História" para a "Teoria da História" Embo-
outras que já nascem no contexto da moder- ra o século XIX siga apresentando filosofias
na cientificidade). da história, e a mais importante delas seria a
O novo momento da historiografia repre- Filosofia da História proposta por Hegel nos
senta de fato uma autêntica refundação, e de ensaios A Razão na História (1837, post) e Pe-
acordo com essa perspectiva podemos com- nomenologia do Espírito (1807), doravante os
preender bem melhor a passagem da época historiadores propriamente ditos preferirão
das "filosofias da história" ao âmbito das "teo- falar de seu campo de estudo em termos de
rias da história': Com a fundação da Universi- "teorias" e "métodos", precisamente porque
dade de Berlim em 1810, que assegura um lu- isso os aproximará mais, de um ponto de vista
gar para a História entre seus demais campos simbólico, das demais Ciências com as quais
de saber, a Escola Histórica Alemã desempe- pretendem ombrear. Os dois novos paradig-
nhará um papel fundamental nessa nova fase mas que emergem já na primeira metade do
da história da historiografia. Além disso, ao século XIX, o Historicismo e o Positivismo,
lado da perspectiva historicista que começa- embora sejam por alguns autores entendidos
rá a se desenvolver a partir da Escola Alemã, como filosofias da História, já tendem a ser
também se afirmará um segundo paradigma discutidos no campo da Teoria da História.
importante com influências significativas para Será interessante discutir esses dois paradíg-
o campo da História: o Positivismo. mas neste momento, pois o confronto entre

56 57
refere ao papel da Objetividade e da Subjetivi-
eles coloca no cerne da discussão sobre a His- dade na produção do conhecimento históri-
tória a questão da relação entre Objetividade co - um aspecto teórico, aliás, particularmen-
e Subjetividade na produção do conhecimen- te importante em vista da sua capacidade de
to histórico. Essa questão fortemente teórica, redefinir a posição do sujeito e do objeto
conforme seja tratada por um ou outro destes de conhecimento histórico. Vejamos os des-
campos, estará na base da reorientação de dobramentos dessa diferenciação teórica en-
toda a historiografia do século XIX. É impor- tre os dois modelos.
tante lembrar ainda que no século XIX emer- Aferrados a um paradigma cientificista
girá também um terceiro campo paradigmá- que procura aproximar ou mesmo fazer coin-
tico, do qual posteriormente trataremos: o cidir os modelos das Ciências Naturais e das
Materialismo Histórico. Ciências Sociais e Humanas, os Positivistas
Podemos iniciar fazendo notar que a dis- tendem a enxergar a subjetividade e a diver-
tinção fundamental entre positivistas e histo- sidade - do mundo humano examinado, mas
ricistas refere-se ao contraste de suas perspec- também do historiador - como um problema
tivas sobre o Homem - percebido consoante a ser resolvido por uma história que postula
uma natureza imutável pelos positivistas, e ocupar seu lugar entre as ciências. Todos os
como um ser em movimento e em processo seus esforços estarão em enxergar a unidade
de constante diferenciação, pelos historicistas. por trás da diversidade humana, em tentar
Essas perspectivas distintas sobre o Homem identificar as regularidades, as leis gerais que
são acompanhadas de perspectivas singulares presidiriam o desenvolvimento das socieda-
também sobre a História: enquanto o Positi- des, e em aproximar das ciências naturais e
vismo teria uma perspectiva universalizante exatas as metodologias historiográficas que
da História - colocando-se neste aspecto em poderiam lograr atingir essas finalidades.
particular como uma corrente herdeira do Para a sua realização, o Positivismo preconi-
Iluminismo, embora a traduzindo para um zará a "neutralidade do historiador" - isto é, a
viés conservador -, já o Historicismo se cons- perspectiva teórica deste poderia se destacar
truirá em torno de uma perspectiva particula- do objeto examinado e analisar imparcial-
rizante da História. mente as sociedades e processos históricos.
Para além disso, os dois paradigmas tam- Concomitantemente, o mesmo modelo pos-
bém se opõem precisamente naquilo que-se
59
58
tulará uma identidade de métodos entre as gerais que regeriam os desenvolvimentos hu-
Ciências Naturais e as Ciências Humanas. manos, seria possível compreender o homem
Para a historiografia, que lida com fontes a partir de três fatores combinados: o meio
históricas como mediadoras entre o sujeito ambiente, a raça, e o que ele chamou de "mo-
que produz o conhecimento e o objeto his- mento histórico':
tórico examinado, essa postura positivista A perspectiva teórica dos Historicistas é
fundamental também produzirá um tipo de radicalmente distinta daquela que é apresen-
aproximação do historiador em relação às ta da pelo Positivismo. No limite, tenderão a
suas fontes. O historiador positivista acre- enxergar a subjetividade não como um pro-
ditará em uma realidade dada por inteiro na blema, mas como uma riqueza, ou mesmo
documentação, cabendo ao historiador recu- como aquilo que precisamente permite à His-
perá-Ia imparcialmente. Com os historiadores tória constituir-se em um conhecimento do-
metódicos das últimas décadas do século tado de uma especificidade própria. Haverá
XIX, uma corrente que traz elementos tanto também, no arco historicista que se inicia no
do Positivismo francês quanto de um histo- século XIX e que segue pelo século XX aden-
ricismo mais conservador inspirado na li- tro, aqueles que, reconhecendo-a, buscam
nha rankeana, isso implicará praticamente a controlar a subjetividade, impor-lhe limites,
ideia de que os documentos podem falar por almejando tanto quanto possível assegurar
si mesmos. Para um historiador positivista uma certa neutralidade do historiador. Mas
mais puro, como o inglês Henry Thomas os maiores nomes das últimas décadas do
Buckle (1821-1862), ocorrerá entre outros século XIX, que estendem sua contribuição
projetos a prédica da valorização de coletas para uma continuidade com os historicistas
estatísticas de dados, que seria uma maneira do século XX, chegam a realizar efetivamente
de aproximar os métodos da História dos de a virada relativista, e a lidar com a subjetivida-
outras ciências". De igual maneira, para Tai- de (inclusive a do próprio historiador) como
ne (1828-1893), um historiador francês que algo que não compromete a cientificidade do
abraça o sonho positivista de encontrar as leis trabalho historiográfico. Em vista disso, será
fundamental para esses historicistas opor o
paradigma explicativo das Ciências Naturais
25 BUCKLE. History ofCivilization in England. In: GARD-
NER, 1995, p. 134-136. (e reivindicado pelos positivistas) ao paradíg-

60 61
ma da Compreensão, aspecto que encontra
a sua mais sofisticada formulação teórica o homem do século XX e além - de todas as
com Whilhelm Dilthey (1833-1911) e que gerações anteriores.
será operacionalizado de maneiras distin- Gadamer define a consciência histórica
tas por alguns historicistas quando contra- como o privilégio de o homem moderno ter
postos entre si. "plena consciência da historicidade de todo o
A principal contribuição do paradigma presente e da relatividade de toda a opinião'?".
Historicista, principalmente através da ver- Eis aqui uma contribuição definitiva do His-
tente relativista que se anuncia com Droysen toricismo, a qual aliás se constituirá também
e Dilthey e que seguirá adiante, foi ter cha- em um dos pilares de outra importante Teo-
mado atenção para a historicidade de todas ria da História: o Materialismo Histórico. Por
as coisas, inclusive da razão humana. Hans- outro lado, no que se refere às transformações
-Georg Gadamer (1900-2002), historiando na Teoria, o Historicismo traria no século XX
uma contribuição hermenêutica que come- notáveis realizações como os ensaios Futuro
ça a adquirir impulso no século XIX a partir Passado, de Koselleck(1979),ou Tempo e Narra-
da abordagem ainda romântica do teólogo tiva, de Paul Ricoeur (1983/1985). Reinhart
Schleiermacher (1768-1834), e que avança Koselleck (1923-2006), por exemplo, introduz
pela hermenêutica historicista de Dilthey até com sua perspectiva historicista sobre os
chegar a O Ser e o Tempo de Heidegger (1927), sistemas conceituais todo um novo campo
indica em sua obra máxima - Verdade e Mé- de atuação para os historiadores, que é o da
todo (1960) -, mas também na série de confe- "história dos conceitos". Com isso, a teoria
rências que foi publicada sob o título A Cons- torna-se ela mesma objeto de uma pesquisa
ciência Histórica (1996), essa singularidade historiográfica.
maior que seria a do homem contemporâ-
neo: a sua "consciência histórica" Apresen-
tada pelo filósofo e teórico historicista não
apenas como um privilégio, mas talvez mes-
mo como um "fardo", a consciência históri-
ca seria uma especificidade que diferencia o
homem contemporâneo - entendido como
26 GADAMER, 1998, p. 17.

62
63
6
Materialismo Histórico

o Materialismo Histórico começa a sur-


gir como campo teórico-rnetodológico - ou
como paradigma, poderíamos dizer - com as
obras fundadoras de Marx e Engels a partir
de meados do século XIX. Seria importante
sintetizar alguns de seus pressupostos e con-
ceitos' pois de fato eles constituem o corpo
de uma nova Teoria da História que passa a
estar disponível para os historiadores já na
segunda metade do século XIX, mas logran-
do atingir as suas maiores realizações no de-
correr do século XX.
Nosso empenho inicial será o de delinear
o Materialismo Histórico a partir de alguns
de seus traços fundamentais. Além da cria-
ção e inovação relacionadas a aspectos vários,
como a descoberta da "mais-valia" para a aná-
lise do Capital, os novos usos para o conceito
que já tinham aparecido a partir de outros
de "Alienação'?", ou ainda a reflexão histo-
autores. A ideia de uma "luta de classes': por
riográfica mais sistemática sobre a "Acumu-
exemplo, já havia sido mencionada por histo-
lação Primitiva'?" - aspectos que não serão
riadores franceses do período da restauração,
tão discutidos aqui, pois estaremos mais inte-
como François Guizot (1787-1874) e Augus-
ressados naquilo que se aplica de modo mais
tin Thierry (1795-1856). A dialética idealista
geral à Teoria da História -, o gênio de Karl
de Friedrich Hegel (1770-1831) foi rigorosa-
Marx atuou desde o princípio de seus textos
mente invertida por Karl Marx de modo a si-
e práticas inter-relacionando, no interior de
tuar o desenvolvimento material como ponto
um sistema teórico inteiramente novo para
de partida da análise histórica em um inédito
a compreensão da História, alguns conceitos
modelo de Materialismo Dialético. A noção
de ideologia tinha já uma pequena história
27 o conceito já aparece em Hegel- referindo-se à contradi- pregressa, cujo desenvolvimento alguns reme-
ção entre existência e essência desenvolvida pelo Espírito na
tem a Napoleão Bonaparte". Com relação à
sua caminhada histórica, ao progredir do estranhamento à
retomada final da autoconsciência. Ludwig Feuerbach (1804-
1872) aplicou a ideia de alienação (estranhamento) à análise
29 Em 1801, o filósofo e político francês Destutt de Tracy
mais específica da questão religiosa, argumentando que a
(1754-1836) havia publicado um livro intitulado Elementos
alienação religiosa era a mãe de todas as alienações e que, "ao
de Ideologia. Nessa obra, utiliza o termo "ideologia" como
criar Deus e projetar um ser idealizado no Céu'; o homem uma expressão genérica, relativa a um novo campo de co-
havia se alienado de si mesmo. Karl Marx, por outro lado, nhecimentos que desejava fundar sob a designação de "ciên-
tanto nos Manuscritos econômico-filosóficos de 1844, como cia das ídeías'; e que teria como objetivo último conhecer a
também em obras posteriores mais voltadas para a alienação "natureza humana': Pouco depois, a expressão "ideologia'; em
no seio da produção capitalista, expandiu o conceito para no- um discurso de 1812, seria empregada pejorativamente por
vas direções. Sobre isto, cf. BARROS, 201lf, p. 223-245. Napoleão Bonaparte contra o próprio Destutt de Tracy e ?u-
tros professores parisienses, que de acordo com o futuro Im-
28 Marx aborda a "acumulação primitiva" - a qual teria perador francês estariam "fazendo ideologia'; no sentido de
permitido a gênese histórica do capitalismo - no capítulo "especulação abstrata, falsa e irresponsável" (WOLKENER,
24 do Livro Ide O Capital (1867), analisando em detalhe o 1995, p. 93). Posteriormente, Marx e Engels se apropriariam
desenvolvimento histórico deste processo na passagem do da expressão transformando-a em conceito importante para
Período Medieval para a primeira Modernidade. Rigoro- a sua perspectiva do Materialismo Histórico, utilizando-a
inclusive no título de uma de suas obras: A Ideologia Alemã
samente falando, o conceito também já aparece em Adam
(1946). O conceito teria cidadania permanente no âmbito
Smith, com a designação "previous accumulation", na In-
deste novo paradigma das ciências sociais, embora admitin-
vestigação sobre a natureza e a causa da riqueza das nações
do diversas variações em seus sentidos a partir das obras de
(1776). A primorosa análise de Marx, contudo, acrescen- Gramsci, Althusser e outros pensadores marxistas.
ta-lhe uma nova perspectiva, realmente inovadora. .

67
66
própria visão materialista do mundo, essa não Vamos considerar, antes de mais nada,
era uma ideia nova, e o século XVIII conhe- aquilo que é realmente inseparável do Mate-
cera desenvolvimentos peculiares na direção rialismo Histórico enquanto campo teórico-
do que Marx consideraria um "materialismo -metodológico específico que permite com-
vulgar': Mesmo o incontornável vínculo entre preender a História e a dinâmica das socie-
Economia e História já havia sido identifica- dades humanas. Deve-se aqui ter em vista os
do por Jerome Adolph Blanqui (1798-1854) três fundamentos centrais do Materialismo
em sua Histoire de l'économie politique em Histórico: a "Dialética", o "Materialismo",
Europe (1843, 2a ed.), e também a Economia e a "Historicidade Radical': Se abstrairmos
Política de Adam Smith já trabalhara direta- qualquer um desses fundamentos, o Materia-
mente com essa correlação, inclusive exami- lismo Histórico deixa de fazer sentido em seu
nando a história a partir das transformações núcleo mínimo de coerência: ou se dissolve,
dos sistemas de economia, tecnologia e tra- ou se desfigura, ou se transforma em uma
balho que logo Marx e Engels chamariam de outra coisa. Por exemplo, se conservarmos
"modos de produção': Quanto ao socialis- apenas as ideias de Dialética e de Historicida-
mo, embora não um "socialismo científico" de Radical, mas descartarmos o fundamento
como proporiam os fundadores do materia- do "Materialismo': facilmente recairemos em
lismo histórico, este era já um horizonte de algo muito próximo do Idealismo Hegelia-
luta para certos grupos radicais da França no. Isso porque o sistema de compreensão do
Revolucionária e um sonho otimista bem mundo proposto por Hegel era também Dialé-
presente no pensamento ainda idealizado de tico e Histórico, embora fosse Idealista (e não
"socialistas utópicos" como Charles Fourier Materialista, conforme já veremos).
(1772-1837), Saint-Simon (1760-1825), Ro- De igual maneira poderíamos pensar um
bert Owen (1771-1858). Todas essas ideias, sistema que fosse Materialista e Histórico, mas
propostas conceituais e posturas práticas - não Dialético, o que seria já qualquer outra
advindas de origens diversas - foram inter- coisa que não o sistema proposto por Marx
-relacionadas de uma maneira inteiramente e Engels. Uma combinação peculiar de Ma-
original para a constituição dos fundamentos terialismo e de Dialética (não no sentido de
daquilo que posteriormente seria chamado "movimento': e sim no que se refere à consi-
de Materialismo Histórico. deração das "contradições"), mas que estivesse

68 69
concomitantemente abstraída da Historicída-
de, possivelmente resultaria em algum tipo de modo de produção articula certas contra-
Estruturalismo. dições internas) e a Historicidade (uma vez
Dialética, Materialismo e Historicidade, que os modos de produção modificam-se de
portanto, constituem aquilo de que não se alguma maneira continuamente, até que fi-
pode prescindir, caso desejemos permane- nalmente se transformam em outros modos
cer nos limites mínimos do Materialismo de produção, já característicos de uma nova
Histórico. Tudo o mais, de alguma maneira, formação social).
poderia ser negociáveL Mas não essas no- Temos no núcleo mínimo do Materialis-
ções basilares. mo Histórico, portanto, três fundamentos
Constituem também parte importante do (Dialética, Materialismo e Historicidade) e
núcleo teórico mínimo três conceitos funda- três conceitos incontornáveis ("práxis': "luta
mentais do Materialismo Histórico, sem os de classes" e "modo de produção"). Para além
quais também resulta bem difícil trabalhar disso, existem outras noções bastante recor-
operacionalmente com a perspectiva do ma- rentes nas diversas correntes relacionadas ao
terialismo histórico. De certa maneira, eles Materialismo Histórico, tal como conceitos
derivam dos fundamentos acima propostos. de "determinismo', "revolução': "ideologia':
A noção de "Práxis" - algo que une teoria e afora diversos outros.
prática, ou pensamento e ação em um todo A História, para o Materialismo Dialéti-
coerente, é de certo modo um desdobramen- co, d~m duas dimensões distintas, mas
to da Dialética. O conceito de "Luta de Clas- interligadas, pois ela é simultaneamente a
ses" desdobra-se diretamente da combinação "História das Lutas de Classe" e a "História da
entre Historicidade e Dialética (no sentido sucessão de Modos de Produção': Só este du-
de que esta envolve, como já veremos, "con- plo enunciado, o primeiro bem apresentado
tradições"). "Modo de Produção", por fim, no Manifesto Comunista (1848), o segundo
constitui um conceito que busca expressar discutido em A Ideologia Alemã (1846), já se-
o núcleo mínimo de Materialidade de uma ria suficiente para alçar Karl Marx e Friedrich
determinada formação social, embora esse Engels como instituidores de um modo de ver
conceito também dependa diretamente dos a História radicalmente novo e diferenciado
outros dois fatores - a Dialética (pois todo em relação à ampla maioria dos historiadores
do seu tempo. Eric Hobsbawm (1917-2012),

70
71
no balanço de 1968 no qual lança a indagação como uma contribuição teórica no seu senti-
sobre "O que os historiadores devem a Karl do mais estendido, aquele no qual a "Teoria"
Marx", mostra como os historiadores do sé- corresponde a um "modo de ver as coisas': de
culo XIX, a exemplo de Ranke, se ocupavam acordo com a etimologia da palavra com base
então de examinar basicamente as Guerras, a no significado já trazido pela palavra desde os
Diplomacia, a vida dos grandes líderes, aqui filósofos da Grécia antiga.
ou ali, eventualmente, a História Institucio- O Materialismo Histórico compreende um
nal, mas sobretudo uma História (da) Polí- campo rico para a percepção da importância
tica. Não uma História Política no moderno da Teoria na História, e, simultaneamente, da
sentido de uma "história do poder", mas uma dinamicidade dessa teoria, pois no decorrer
história da política, ou seja, dos meios polí- de mais de um século e meio, a partir das pri-
ticos e dos homens que a faziam nos Parla- meiras formulações de Marx e Engels, não
mentos e outros órgãos ligados ao estado. cessaram de ocorrer renovações conceituais
Já os fundadores do Materialismo Histórico, no interior desse paradigma, que aliás esten-
ao proporem que "a História é a História da dem as suas contribuições para a historiogra-
Luta de Classes",o que estavam fazendo senão fia como um todo, não se limitando apenas
propor um deslocamento do olhar do histo- aos quadros do Marxismo.
riador para uma dimensão impensada até en- A chamada Escola Inglesa do Marxismo,
tão - a História Social? E, ao mesmo tempo, apenas para dar um exemplo, representa um
ao sustentarem que a História é a "História grupo importante para a renovação teórica
dos Modos de Produção", o que estavam pro- do Materialismo Histórico. O grupo tendeu
pondo senão deslocar o olhar historiográfico a flexibilizar a teoria marxista tal como era
para as bases econômico-sociais e suas con- veiculada por setores mais ortodoxos no
sequências sobre a sociedade e a História? marxismo historiográfico. A desconstrução
Não seria isso, essencialmente, uma inédita da metáfora base/estrutura, que implicava
abertura para a História Econômica? Marx um padrão linear de determinismo, foi re-
e Engels introduzem um novo e duplo olhar discutida por autores como Edward Thomp-
na História: uma atenção para a dimensão son de Miséria da Filosofia (1978) ou Raymond
Econômico-Social. Esse novo modo de ver Williams de Marxismo e Literatura (1971). Tra-
a História pode ser compreendido também zer a cultura para primeiro plano das análises

72 73
marxistas, conectando-a com a política e a
história social, permitiu por exemplo que
fosse rediscutido o próprio conceito de "classe
social': passando a ser entendido não apenas
como uma categoria econômica, mas tam-
bém como uma categoria culturaL
7
Palavras finais sobre o papel
da Teoria da História na
formação do historiador

Os três exemplos desenvolvidos nas seções


anteriores - as perspectivas teóricas do Posi-
tivismo, Historicismo e Materialismo Histó-
rico - constituem apenas pequenas demons-
trações, ~o simplificadas, da extensa e
rica rede de possibilidades paradigmáticas
e teóricas que estão sempre disponíveis aos
historiadores em formação, bem como aos
pesquisadores de História em seu trabalho
diário e na sua realização de pesquisas his-
tóricas específicas. Outros exemplos pode-
riam ser oferecidos e discutidos, um grande
número de outros, mas isso só seria possível
em uma obra de dimensões mais alentadas, e
ainda assim jamais poderia ser concentrado,
mesmo que em diversos volumes, o enorme
caudal de possibilidades teóricas das quais

74
dispõem os historiadores para a realização de De maneira análoga, o historiador que
seus trabalhos de reflexão sobre a história. acredita ter o poder e os meios de se distan-
Um historiador que compartilha de deter- ciar cientificamente da sociedade estudada
minada visão teórica sobre as sociedades a ponto de conseguir examiná-Ia com abso-
humanas e seus processos de desenvolvi- luta neutralidade, tal como um astrônomo
mento, ou que se acerca de certo modo de que observa a distância as estrelas, também
compreender a História enquanto campo apresenta ao seu leitor um mundo distinto
de conhecimento - instrumentalizando em daqueles que podem ser apresentados pelos
cada caso de conceitos específicos e se ex- historiadores que - ainda que observando as
pressando através deste ou daquele vocabu- regras do método e trabalhando com rigor e
lário -, faz se representar para o seu leitor seriedade - consideram as suas próprias pers-
um certo mundo histórico, e não outro. O pectivas produtos da Ristória.
historiador que enxerga a história das socie- São igualmente visões teóricas distintas,
dades humanas como um grande confronto capazes de produzir leituras historiográficas
de grupos sociais, aflorado em conexão com diferenciadas, aquelas que acreditam no pro-
forças econômicas e sociais que desenvol- gresso da humanidade em uma direção defi-
vem e superam contradições essenciais que nida - seja esta o reino da razão absoluta fi-
devem ser estudadas em primeiro plano, nalmente alcançada ou a realização de uma
enxerga um mundo distinto daquele que é sociedade sem classese exploraçõessociais - ou
vislumbrado pelo historiador que examina ainda as leituras do mundo social que enxer-
a história sob a perspectiva de uma grande gam a história a partir de uma perspectiva
conciliação de classes. Ambos, por com- teórica que busca dar a perceber as descon-
preenderem a história como um processo tinuidades. Se lanço mão deste ou daquele
no qual os grupos sociais são os verdadeiros conceito para tentar entender os sistemas
promotores do movimento, os grandes agen- de dominação, os movimentos populares,
tes a serem considerados, enxergam mundos as realizações culturais, as hierarquias por
históricos distintos daquele que é trazido à entre as quais circulam os seres humanos
baila pelo historiador que compartilha da envolvidos em uma mesma sociedade - ou
ideia de que o que move a história são os se conceituo como populismo ou trabalhis-
grandes indivíduos. . mo um certo modelo político, como ditadura

76
77
nos dias de hoje vista como vinculada a "pro-
ou contrarrevolução determinado sistema re-
blemas" - e já vão longe os tempos em que
pressivo -, sempre e sempre, ao pensar e me
se podia simplesmente propor uma história
expressar através dessas e outras categorias e
meramente descritiva -, é a Teoria o que dará
perspectivas teóricas, estarei representando
um lastro essencial aoiliStoriador em forma-
para o leitor um mundo histórico diferente
ção, de modo a que ele construa uma História
de outros que partirem ou chegarem a propo-
realmente problematizada e se prepare para
sições teóricas distintas.
representar os processos históricos com a res-
Os historiadores que constituem os seus
ponsabilidade inerente ao seu ofício.
trabalhos a partir de teorias distintas, ou de
Charles Seignobos (1854-1942), nos úl-
abordagens diferenciadas, veem efetivamen-
timos anos do século XIX, havia formulado
te mundos históricos distintos, ou mesmo
uma frase que ficou célebre: "Sem Documento
vivem em mundos históricos diferenciados.
não há História': Lucien Febvre (1878-1956),
Ao produzirem os resultados de seus traba-
lhos - livros, artigos, conferências, entrevis- no contexto que presidiria a consolidação da
tas, filmes e programas de televisão, ou ainda Escola dos Annales na França, iria, em seus
um bom ensino de história para estudantes Combates pela História (1953), contrapor a
e beneficiários de diversos tipos - também essa frase uma outra: "Sem Problema não há
conduz os seus leitores e espectadores a co- História': Febvre estava alvejando, com este
nhecerem novos mundos, a viverem em no- dito, uma historiografia que considerava fac-
vas realidades históricas, a reconstruírem as tual, meramente descritiva, fetichizadora do
suas próprias vidas e compreensões do mun- documento e do fato histórico, sempre tra-
do de acordo com as novas perspectivas que tado como algo dado previamente e que ca-
lhes foram oferecidas. As escolhas teóricas, ao beria ao historiador apenas desvelar. A pers-
produzirem novos mundos históricos, consti- pectiva de Febvre é que a História deveria
tuem portanto uma grande responsabilidade sempre ser reconstruída a partir do Presente
social dos historiadores. de acordo com um Problema e orientada pela
O papel da Teoria da História na formação formulação de hipóteses. Tratava-se, segundo
do historiador, como se deve ter percebido, é o próprio termo por ele cunhado, de elabo-
fundamental. Se a Historiografia se constrói rar uma "História-Problema':
com Teoria e Método, se a Historiografia é

79
78
o "Documento': ou a "Ponte Histórica',
/
É a Teoria que responde àquilo que Tom
como se diz hoje mais habitualmente, conti- Rüsen, em seu ensaio Razão Histórica, cha-
nua certamente na base do método historio- mou de "carências de orientação no tempo
gráfico. Sem fontes históricas não há cami- presente'?", De igual maneira, através da Teo-
nho possível para que um historiador atinja ria os historiadores estabelecem o seu diálogo,
uma determinada realidade ou processo his- exercem pressões uns sobre os outros, para re-
tórico que pretenda examinar, ou, tampouco, tomarmos as imprescindíveis reflexões de Mi-
não surge a possibilidade de reformular uma chel de Certeau (1925-1986) sobre a Operação
certa visão do Passado em função de questões Historiográjica em seu célebre texto de 1974.
levantadas no Presente. Na base do método Teoria e Método, certamente, são os dois ali-
historiográfico encontra-se certamente a fon- cerces do trabalho historiográfico. "Problemas" e
te histórica, material do qual deverá partir o "Pontes" são imprescindíveis para uma historio-
historiador. Contudo, nos dias de hoje o mé- grafia que apresente o compromisso de corres-
todo e a base empírica devem interagir ativa- ponder realmente a um maior interesse científi-
mente com a Teoria, pois caso contrário não co. Dessa maneira, é fundamental uma atenção
se teria uma história problematizada. especial aos modos de tratamento das fontes
O "Problema', de fato, está precisamente na historiográficas, mas, sobretudo, às concepções
base do que pode ser referido a uma "Teoria e horizontes teóricos que podem orientar e reo-
da História', a uma certa maneira de "ver" a rientar a operação historiográfica. Com a refle-
historiografia de maneira geral ou a um cer- xão Teórica, com o desenvolvimento da capaci-
to modo de conceber determinado processo dade de operacionalizar conceitos e de formular
histórico especificamente. Quando um pro- hipóteses, o historiador em formação completa
blema é formulado pelo historiador, quando o conjunto de requisitos para desenvolver uma
ele propõe certas hipóteses, quando ele ins- contribuição histórica relevante. Torna-se efe-
trumentaliza certos conceitos, reconstrói-se a tivamente responsável pelo que diz e pelo que
história de uma nova maneira. A "Teoria" en- dá a ler aos seus leitores. Torna-se, ele mesmo,
tão, torna-se fundamental para que surja uma parte consciente de uma grande história pacien-
historiografia problematizada, correspondente temente elaborada através dos tempos.
à época e ao contexto em que foi produzida, e
sempre capaz de sucessivas reformulações. 30 RÜSEN, 2001, p. 35.

80 81
Nota sobre o texto

o livro que aqui se apresenta deriva de


um artigo publicado pelo autor na revista
Teias, da Universidade Estadual do Rio de
Janeiro, com o título "Teoria e formação do
historiador" (BARROS. Revista Teias, vol. 11,
n. 23, set.-dez'/2010, p. 41-62). O texto tam-
bém incorpora desenvolvimentos apresenta-
dos, anteriormente, no livro Teoria da Histó-
ria, volumes I, II e III (BARROS, 2011). Na
verdade, pode ser compreendido como uma
instigação inicial para a leitura da Coleção
Teoria da História, publicada em cinco volu-
mes por esta editora.
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