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XII - APELACAO EM MANDADO DE SEGURANCA 2006.51.01.

007847-2

RELATOR DESEMBARGADOR FEDERAL POUL ERIK


DYRLUND
APELANTE JOSE ALBERTO PIRES LAGE
ADVOGADO RUY MEIRELES MAGALHAES E OUTROS
APELADO UNIAO FEDERAL
ORIGEM VIGÉSIMA QUARTA VARA FEDERAL DO RIO
DE JANEIRO (200651010078472)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por JOSÉ ALBERTO PIRES LAGE em


face da sentença proferida nos autos do mandado de segurança impetrado contra
ato do DIRETOR DO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS (SENARM) e do
COMANDANTE DE APOIO REGIONAL DA 1a. REGIÃO MILITAR-
COMANDO MILITAR DO LESTE.

A decisão objurgada resumiu a questão:

“Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida


liminar, impetrado por JOSÉ ALBERTO PIRES LAGE contra ato do
DIRETOR DO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS (SENARM)
objetivando que sejam sustados os efeitos do ato impugnado, qual seja, a
negativa de autorização do porte de arma de uso restrito, de propriedade
do Impetrante.
(...)
Alega que é Delegado da Polícia Civil e que detém a prerrogativa
de colecionador de armas de fogo e de atirador profissional sendo
proprietário das armas de fogo descritas às fls. 03 de petição inicial.
Aduz, ainda, que tais armas são de uso restrito e que foram
devidamente registradas tendo sido permitido ao impetrante apenas
transportar, mas não portá-las com base no título IV e artigo 59 da
Portaria 024 de 25/10/00.
Por fim, argumenta que a negativa da autoridade fere seu direito

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líquido e certo e constitucionalmente protegido de dispor livremente das


armas de sua propriedade, no exercício de sua profissão ou fora dela.
Pretende, em suma, utilizar suas armas de colecionador em suas
atividades de trabalho, sendo tal prática expressamente vedada,
conforme elucidado pela autoridade impetrada às fls. 155/159.”

Decisão às fls. 164/165, indeferindo a liminar.

A magistrada a quo (fls. 178/179) julgou improcedente o pedido, denegando a


segurança, sob o fundamento de que o artigo 6 o, §1o, do Estatuto do
Desarmamento, visa exatamente impedir a circulação de armamento pesado, e que,
apesar de ser possível portar as armas fornecidas por sua corporação, ainda que
fora do horário de serviço, não há falar em direito líquido e certo ao porte daquelas
de uso restrito, de sua propriedade.

Embargos de declaração de fls. 183/186, provido às fls. 190/192.

Irresignada a parte autora interpõe apelo (fls. 195/215) ponderando que com
relação à utilização de armas de fogo de propriedade particular, a lei delegou ao
seu regulamento a forma de uso e utilização para os integrantes dos órgãos
referidos no caput do art. 144 da CRFB/88; que o mencionado regulamento, ao
arrepio da lei, delegou às instituições mencionadas no art. 6 o e seus incisos a
competência para estabelecer as condições para a utilização de arma de fogo de sua
propriedade, nada dispondo sobre o porte e utilização de armas de fogo de
propriedade particular dos integrantes dessas instituições; que os policiais federais
podem se utilizar de armas de uso restrito, conforme previsto pela Portaria 02-G-
LOG, de 23/11/05 do Ministério da Defesa–Departamento Logístico; e que, assim,
a referida Portaria faz dos policiais federais os privilegiando em detrimento dos
policiais estaduais.

Contra-razões de fls. 219/221.

Opina o Ministério Público Federal às fls. 224/230 pelo não provimento do


apelo.

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É o relatório.

POUL ERIK DYRLUND


Relator

VOTO

A decisão objurgada resumiu a questão:

“Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida


liminar, impetrado por JOSÉ ALBERTO PIRES LAGE contra ato do
DIRETOR DO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS (SENARM)
objetivando que sejam sustados os efeitos do ato impugnado, qual seja, a
negativa de autorização do porte de arma de uso restrito, de propriedade
do Impetrante.
(...)
Alega que é Delegado da Polícia Civil e que detém a prerrogativa
de colecionador de armas de fogo e de atirador profissional sendo
proprietário das armas de fogo descritas às fls. 03 de petição inicial.
Aduz, ainda, que tais armas são de uso restrito e que foram
devidamente registradas tendo sido permitido ao impetrante apenas
transportar, mas não portá-las com base no título IV e artigo 59 da
Portaria 024 de 25/10/00.
Por fim, argumenta que a negativa da autoridade fere seu direito
líquido e certo e constitucionalmente protegido de dispor livremente das
armas de sua propriedade, no exercício de sua profissão ou fora dela.
Pretende, em suma, utilizar suas armas de colecionador em suas

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atividades de trabalho, sendo tal prática expressamente vedada,


conforme elucidado pela autoridade impetrada às fls. 155/159.
A autoridade impetrada informa que o impetrante é colecionador
registrado no SERVIÇO DE FISCALIZAÇÃO DE PRODUTOS
CONTROLADOS DA 1a RM (SFPC) sob o nº 5819, conforme
documento de fl. 160, sendo categórica ao afirmar que não cabe a
concessão de porte de arma de fogo a armas de colecionadores, somente
a concessão de porte de trânsito (guia de tráfego) e que esta somente é
feita nos casos previstos no art. 49 da Portaria nº 024-DMB, de 24 de
outubro de 2000 (fl. 158).
E sustenta, aindam que em momento algum o Exército Brasileiro
feriu as prerrogativas constitucionais de porte de arma de fogo de
policiais civis, pois lhe é permitido o porte de arma de fogo para arma
particular de calibre permitido e de arma de uso restrito no calibre
40S&W, conforme legislação específica” fls. 158/159.
Cumpre salientar que o Estatuto do Desarmamento, em seu artigo
6 , §1o, aplicável ao caso, visa exatamente impedir a circulação de
o

armamento pesado e caso permitisse o porte de armas com tal potencial


lesivo, certamente, estaria fomentando ainda mais a violência que o
Estatuto pretende deter.
Portanto, apesar de ser possível portar as armas fornecidas por sua
corporação ainda que fora do horário de serviço, não há falar em direito
líquido e certo ao porte daquelas de uso restrito, de sua propriedade,
impondo-se o indeferimento do pedido.”

Irresignada a parte autora interpõe apelo (fls. 195/215) ponderando que com
relação à utilização de armas de fogo de propriedade particular, a lei delegou ao
seu regulamento a forma de uso e utilização para os integrantes dos órgãos
referidos no caput do art. 144 da CRFB/88; que o mencionado regulamento, ao
arrepio da lei, delegou às instituições mencionadas no art. 6 o e seus incisos a
competência para estabelecer as condições para a utilização de arma de fogo de sua
propriedade, nada dispondo sobre o porte e utilização de armas de fogo de
propriedade particular dos integrantes dessas instituições; que os policiais federais
podem se utilizar de armas de uso restrito, conforme previsto pela Portaria 02-G-

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LOG, de 23/11/05 do Ministério da Defesa–Departamento Logístico; e que, assim,


a referida Portaria faz dos policiais federais os privilegiando em detrimento dos
policiais estaduais.

O Ministério Público Federal, perante esta Corte Regional, ofertou parecer


(fls. 224/230):

“Diz o artigo 6o, parágrafo primeiro, do Estatuto do Desarmamento,


respaldo normativo que lastreou o indeferimento, na seara administrativa, da
pretensão autoral, igualmente refutada na sentença recorrida, com a mesma
referência legislativa:
‘Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território
nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
        I – os integrantes das Forças Armadas;
       II – os integrantes de órgãos referidos nos incisos do
caput do art. 144 da Constituição Federal;
(...)
        § 1 As pessoas previstas nos incisos I, II, III, V e VI deste
o

artigo terão direito de portar arma de fogo fornecida pela respectiva


corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, na forma do
regulamento, aplicando-se nos casos de armas de fogo de propriedade
particular os dispositivos do regulamento desta Lei.
        § 1o-A Os servidores a que se refere o inciso X do caput deste
artigo terão direito de portar armas de fogo para sua defesa pessoal, o
que constará da carteira funcional que for expedida pela repartição a que
estiverem subordinados.
        § 2o A autorização para o porte de arma de fogo dos
integrantes das instituições descritas nos incisos V, VI e VII está
condicionada à comprovação do requisito a que se refere o inciso III do
art. 4o, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei.
  § 4o Os integrantes das Forças Armadas, das polícias federais e
estaduais e do Distrito Federal, bem como os militares dos Estados e do
Distrito Federal, ao exercerem o direito descrito no art. 4 o, ficam
dispensados do cumprimento do disposto nos incisos I, II e III do
mesmo artigo, na forma do regulamento desta Lei.’

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A mera leitura dos dispositivos, ora reproduzidos, conforta a


inteligência chancelada na origem. A regra, em exame, é expressa na
restrição de que o porto de arma de fogo de uso restrito abrangerá
exclusivamente aquela fornecida pela corporação e o legislador,
precavidamente, cuidou de remeter para regulamentação pela autoridade
administrativa a disciplina para os casos de porte de armas de propriedade
particular.
Nesse pressuposto, inexiste direito líquido e certo do Autor, pelo
menos sob a ótica da regência, então aplicável, de transportar consigo, em
qualquer tempo e lugar, as armas de sua coleção privada. É sintomático que
as hipóteses abrangidas pela lei tiveram em conta, na liberação do porte,
notada e precipuamente, o fato dos agente, ali nomeados, exercerem funções
públicas na área da segurança e defesa, a reservar excepcionalmente essa
possibilidade a particulares (empresas de segurança e desportistas), dentro
das limitações regulamentares. Assim, se o Recorrente tem o direito de
portar armas, o faz não como aficionado ou colecionador, mas como
membro da polícia civil.
Alías, a maior evidência de que a legislação, que amparou a negativa
combatida pelo autor, não resguardaria o seu direito, como líquido e certo, se
distingue na recém editada MP nº 379, em 28 de junho do corrente ano, que
modificou a redação do parágrafo primeiro do artigo 6 o do Estatuto do
Desarmamento, para preconizar:
Ԥ1o As pessoas descritas nos incisos I, II, III, v, VI, VII e X do
caput terão direito de portar arma de fogo fornecida pela respetiva
corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, bem como armas de fogo
de propriedade particular, na forma do regulamento, em ambos os casos.’
Em suma, tão apenas com a mudança normativa superveniente passou
a ser contemplado o porte da arma de fogo de propriedade particular, ‘pelas
pessoas descritas nos incisos’, ali relacionados, com a menção à necessidade
suplementar do regulamento a ser expedido pelas autoridade competentes na
área.
Dessarte, expedido o ato dito coator em consonância com o Direito
Positivo, ao tempo vigorante, (vide, RE-DE nº 117323/DF, em DJ, 8/11/02,
p. 22 – ‘inaplicabilidade de dispositivo de lei superveniente à impetração,

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dado que a autoridade coatora a respeito de sua aplicação não expediu


qualquer ato ilegal’), que não previa a novidade, colhida na MP nº 379/07,
ainda pendente de regulamentação, somos pelo improvimento do recurso.

Correto o parecer, o qual adoto como razão de decidir.

Assim sendo, conheço do recurso, e o desprovejo.

É como voto.

POUL ERIK DYRLUND


Relator

E M E N TA

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ESTATUTO DO


DESARMAMENTO. LEI Nº 10.826/03. PORTE DE ARMA DE USO
RESTRITO. COLECIONADOR. ATIRADOR PROFISSIONAL. DELEGADO
DA POLÍCIA CIVIL.
1. Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar,
impetrado por Delegado da Polícia Civil contra ato do DIRETOR DO SISTEMA
NACIONAL DE ARMAS (SENARM) e do COMANDANTE DE APOIO
REGIONAL DA 1a. REGIÃO MILITAR-COMANDO MILITAR DO LESTE,
objetivando sustar os efeitos da negativa de autorização do porte de arma de uso
restrito, de propriedade do Impetrante, tendo este a prerrogativa de colecionador de
armas de fogo e de atirador profissional, sendo proprietário de armas de fogo de
uso restrito, devidamente registradas.
2. Inexiste direito líquido e certo do Autor de transportar consigo, em
qualquer tempo e lugar, as armas de sua coleção privada. É sintomático que as
hipóteses abrangidas pela lei tiveram em conta, na liberação do porte, notada e
precipuamente, o fato dos agente, ali nomeados, exercerem funções públicas na
área da segurança e defesa, a reservar excepcionalmente essa possibilidade a
particulares (empresas de segurança e desportistas), dentro das limitações

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regulamentares. Assim, se o Recorrente tem o direito de portar armas, o faz não


como aficionado ou colecionador, mas como membro da polícia civil.
3. Recurso conhecido, porém desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os presentes autos em que são partes as acima indicadas,


acordam os Membros da Oitava Turma Especializada do Tribunal Regional Federal
da 2ª Região, à unanimidade, em conhecer do recurso, para negar-lhe provimento,
nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante do presente
julgado.

Rio de Janeiro, 04 de setembro de 2007 (data do julgamento).

POUL ERIK DYRLUND


Relator

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