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O léxico: seu papel na arquitectura e funcionamento da língua. Lugar do léxico nos estudos da
linguagem. O aprendizado da língua e o vocabulário. Nas últimas décadas, os linguistas não têm
dado muita atenção a problemas de grande relevância relativos ao léxico. Contudo, o
vocabulário exerce um papel crucial na veiculação do significado, que é, afinal de contas, o
objecto da comunicação linguística.
Léxico é palavra familiar a todos, mas de definição menos imediata. Vocabulário, glossário,
dicionário são outros termos que remetem para essa mesma esfera conceitual e frequentemente
todos eles são usados em variação livre, apesar de, por convenção terminológica, poderem
referir dimensões distintas. Essa multiplicidade de designações explica-se por uma longa
tradição de polissemia e pelo fato de se tratar de um conceito complexo que remete para uma
realidade analisável a partir de diversos pontos de vista. Fiquemos, então, com a etiqueta léxico,
que, no domínio dos estudos linguísticos, foi aquela que ganhou o estatuto de designação de um
domínio do conhecimento e disciplinar. Neste capítulo, faremos uma caracterização desta
entidade que ocupa uma posição central na gramática, estabelecendo uma distinção entre o
léxico dos sistemas linguísticos (as línguas, as variedades de uma língua, os dialetos), o léxico
dos falantes e o léxico enquanto componente de um modelo de gramática.
O léxico de uma língua é, pois, uma entidade abstracta que se obtém por acumulação: às
palavras em uso por cada falante, no seio de uma dada comunidade de falantes, juntam-se as
palavras em uso por outras comunidades linguísticas falantes da mesma língua; às palavras em
uso na contemporaneidade, somam-se as que estiveram em uso em sincronias passadas, de
que temos notícia pela documentação escrita e que, por vezes, ressurgem; aos dados da
escrita, unem-se os da oralidade, quando é possível apreendê-la, dada a muito maior fluidez
da oralidade face à escrita. Procurar conhecer o léxico de uma língua a partir do conhecimento
do léxico dos falantes implica compreender o que se passa nessa dimensão. O léxico de cada
falante, que é também chamado de léxico mental, depende da sua apropriação dos estímulos
lexicais a que é exposto, e, portanto, variará muito em função da sua experiência linguística
individual, do que ouve, do que lê, do que fala e do que escreve. Um indivíduo não é falante de
uma dada língua porque nasceu e cresceu no país onde essa é a língua oficial, mas porque
esses foram os dados linguísticos a que foi exposto, enquanto membro de uma dada
comunidade, crucialmente nos seus primeiros anos. A aprendizagem de palavras é uma
possibilidade que acompanha os falantes ao longo de toda a sua vida, mas há também perdas
e esquecimentos motivados pelo desuso. O conhecimento lexical que o falante possui num
dado momento pode, pois, não ser idêntico ao de um momento anterior ou posterior: trata-se
de um saber cumulativo e, também, degradável.
Segundo Aitchison (1987; 1990: 7), o volume de dados que o léxico mental integra é
consideravelmente grande: o léxico de um adulto tem entre 50.000 e 250.000 palavras,
havendo uma distinção básica entre o léxico passivo, mais extenso, e que é usado nas
operações de reconhecimento de enunciados linguísticos, e o léxico activo, mais reduzido, e
que está disponível para a produção. Apesar desse enorme volume de dados, tanto o
reconhecimento como a produção de cada palavra ocorrem muito rapidamente, em fracções
de segundo. Mas a dimensão individual do conhecimento lexical não diz apenas respeito à
quantidade de palavras que cada falante conhece e usa – também há diferenças na qualidade
Colégio Cacilhas Centro
Turma 8.2
Trabalho Colectivo De Língua Portuguesa
do conhecimento das unidades lexicais. Para exemplificar essa última questão pode-se
mencionar a ortografia ou a informação etimológica. Ainda que a escolarização intervenha
actualmente na formação da quase totalidade das populações, e que, portanto, a
aprendizagem da escrita esteja mais ou menos generalizada, sabe-se que continua a haver
franjas de analfabetismo e, mais relevantemente, largos contingentes de analfabetos
funcionais. Nem o desconhecimento da escrita, nem os desvios à norma ortográfica
determinam o grau de conhecimento das restantes propriedades das palavras, nomeadamente
a sua realização fonética ou o seu significado. O mesmo se verifica com o conhecimento
etimológico. Nesse caso, é necessário salvaguardar, desde logo, que boa parte da etimologia
do léxico das línguas está ainda por estudar. Mesmo nos casos em que as hipóteses conhecidas
são plausíveis e estão documentadas, não sendo conjecturais e, portanto, polémicas, a maior
parte dos falantes desconhece-as.
Ouvir uma palavra pode, pois, permitir a realização do seu registo gráfico, mas a ortografia das
palavras é também um conhecimento independente e bastante fértil em imprevisibilidades e é
essa imprevisibilidade que permite que uma única grafia, como por exemplo a de , possa servir
de lugar de encontro a tantas pronúncias diversas.