Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
I - INTRODUÇÃO –
3
Cf.: Almeida, Alfredo Wagner B. de – “Os quilombos e as novas etnias”, 2002, p 47.
4
Ibidem, p.48.
3
as origens e representações do próprio “eu” devem ser consideradas e levadas a sério pelo
antropólogo. Compreendendo isso é que no processo de produção deste Relatório Técnico-
Científico procurei de maneira sistemática e rigorosa, levantar informações concernentes às
origens da comunidade, às relações sociais e simbólicas, ao estilo de vida e sobre
genealogias de parentescos; entre outros dados que julguei também ter importância para a
compreensão um pouco melhor da realidade dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca - a
evocar o passado e o presente -, bem como colocar em evidência a intenção e o desejo dos
moradores locais de afirmarem a identidade delas como remanescentes de quilombos.
Oportunidade que surge para elas neste momento valioso em que o “Instituto de Terras do
Estado de São Paulo – ITESP” está empenhado em cumprir com o dever que é da
competência desse órgão: “promover a identificação e demarcação das terras ocupadas por
remanescente das comunidades de quilombos, para fins de regularização fundiária”7.
Isto posto, gostaria apenas de enfatizar que este Relatório Técnico-Científico é fruto de um
trabalho de pesquisa antropológica intensiva, realizada junto às comunidades
remanescentes dos quilombos dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca, dentro de um
período de aproximadamente quatro meses8. Este trabalho antropológico possibilitou o
levantamento de dados significativos para a produção, na íntegra, deste Relatório Técnico-
Científico que se apresenta estruturado em 6 capítulos.
7
Este compromisso diz respeito ao “Inciso IV do artigo 3º. Da Lei Estadual n.10.207/99”
Cf.Edital de Pregão n.20/2006; Processo n.0630/2005 – anexo IV(Memorial Descritivo).
8
O trabalho consistiu das seguintes atividades: a) levantamento e consulta documental junto ao ITESP e na
comunidade (leituras de mapas com o auxilio – e a quem agradeço a generosidade - da funcionária do ITESP ,
Maria Ignês Mariconde -, consulta a certidões de cartório, denúncia policial, etc); b) consulta bibliográfica
(leituras de publicação e Relatórios Técnicos-Científicos diversos produzidos junto ao ITESP, entre outros
artigos e livros que seguem na “Referência Bibliográfica” deste trabalho.); e, c) pesquisa de campo
propriamente dito, que compreendeu: c.1 - visitas esporádicas à comunidade (com permanência in locu por
períodos que variaram entre quatro dias ou uma semana); c.2 - observação direta da vida cotidiana; c.3 -
entrevistas gravadas com pessoas mais velhas e lideranças locais e que possibilitou o registro da história oral;
c.4 - conversas informais com diferentes interlocutores e que tanto contribuíram para acrescentar informações
sobre o passado da comunidade, quanto fornecer esclarecimentos sobre a realidade atual (com destaque para
as dificuldades enfrentadas na vida cotidiana, situações de conflito, e as alternativas criadas na tentativa de
superá-las), além de permitir a apreensão do imaginário social e as formas de representação dos sujeitos
interlocutores enquanto pessoa e coletividade; c.5 – entrevista dirigida com responsáveis da família para
levantamento de informações sobre genealogia de parentesco; c.6 – visita domiciliar para conferir e/ou
complementar de dados sobre genealogia de parentesco; c.7 – acompanhamento direto do trabalho geográfico
de localização dos pontos referenciais – com recurso de GPS – de configuração da área ocupada pela
comunidade (casas, roças, engenhos etc).
5
9
A propósito de uma discussão mais aprofundada sobre a noção de “terras tradicionalmente ocupadas” a
referência sugerida é Almeida, Alfredo Wagner B. de – Terras de quilombo, terras indígenas e fundos de
pasto: terras tradicionalmente ocupadas, 2006.
6
E como não poderia deixar de ser, o último capítulo - o sexto – consiste na conclusão final
deste Relatório Técnico-Científico.
7
- Capítulo II -
A – O Vale do Ribeira -
A região do Vale do Ribeira fica localizada entre os Estados de São Paulo e Paraná; sendo
compreendido por uma extensa faixa territorial que abrange desde municípios no entorno
da capital paulista até os limítrofes de Curitiba. E pelo litoral, desde as proximidades de
Peruíbe, no ponto mais ao norte, até próximo do Paranaguá, no ponto mais ao sul10.
A ocupação do Vale do Ribeira começou pela área litorânea. Na altura do século XVI
portugueses e espanhóis disputaram a colonização desta vasta região. Em 1504, por
exemplo, a esquadra comandada por Américo Vespúcio deixou nas praias da Ilha Cardoso
um bacharel degredado. Depois, em 1508, foi a vez da expedição de Vicente Yanez Pinzon
abandonar na mesma ilha mais sete castelhanos. Aventureiros que foram encontrados mais
tarde, no ano de 1551, pela expedição de Martin Afonso ao ancorar no lugar tendo em vista
a procura de metais preciosos, como ouro e prata.
10
Cf. Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório Técnico-Científico sobre os quilombos remanescentes da
comunidade de quilombo do Galvão, municípios de Eldorado e Iporanga – SP, 2000, p. 13.
8
A exploração da força do trabalho escravo, representada pela mão de obra indígena e dos
africanos e/ou seus descendentes, tiveram importância capital no contexto destes dois ciclos
econômicos, conforme descrito por Carvalho e Schmitt11: “já no século XVI, não era
incomum a existência concomitante de escravos negros e indígenas nas expedições que
partiam para o interior de São Paulo”.
Entretanto, observa-se que pouca atenção foi prestada a este fato pelos estudiosos da
sociedade escravista no estado de São Paulo. Isso é o que se insinua nas críticas tecidas por
Carril contra a interpretação de alguns historiadores que, segundo ela, defendem a tese de
que o trabalho escravo no estado paulista só foi introduzido de forma significativa a partir
do empreendimento da monocultura cafeeira12. Através da sua crítica esta autora fez alertar
para a carência de estudos historiográficos sistemáticos e aprofundados produzidos sobre o
Vale do Ribeira, então enfrentada por ela.
Mas é preciso reconhecer que esta restrição há algum tempo já vem sendo superada, graças,
inclusive, aos trabalhos de produção de Laudos Antropológicos vinculados ao Ministério
Público Federal13 - voltados para a identificação e mapeamento de comunidades
tradicionais remanescentes de quilombos localizadas no Vale do Ribeira -, e, da mesma
11
Carvalho, Maria C.P. de e Schmitt, Alessandra – Relatório Técnico-Científico sobre a comunidade de
quilombo do Nhunguara, localizada nos municípios e Eldorado e Iporanga/SP, 2000, p.22.
12
Apud. Carvalho e Schmitt, Ibidem.
13
A referência principal aqui é ANDRADE, Tânia et alli (eds) – [2ª ed.] Negros do Ribeira: reconhecimento
étnico e conquista do território....
9
14
Trata-se dos RTCs citados em notas de rodapé ao longo deste documento e com referência completa ao
final do mesmo.
15
Apud.: Turatti, Maria Cecília M. – Relatório Técnico-Científico sobre remanescentes da comunidade de
quilombo de Morro Seco/Iguape-SP, 2006, p.15.
10
16
Carvalho e Schmitt – Op. Cit., p. 23; Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório Técnico-Científico sobre
remanescentes da comunidade de quilombo do Galvão – Eldorado e Iporanga-SP, 2000, pp.15 -16.
11
Este resumo permite entrever que as características geográficas do Vale do Ribeira (serras e
rios de difícil navegação) ofereceram ambiente propício para o refúgio e abrigo de escravos
negros e indígenas que buscavam escapar, corajosamente, às condições subumanas de
trabalhador cativo. Mas é preciso acrescentar que a formação de agrupamento negros no
Vale do Ribeira também se originou de forma diversa desta; como serve para demonstrar os
registros sobre a libertação de cativos ou simplesmente o abandono dos sujeitos nessa
condição, pelos seus senhores no Vale do Ribeira, com o advento da descoberta de ouro em
terras das Minas Gerais17.
Como será demonstrado mais adiante, de acordo com a história oral da comunidade
remanescente de quilombo em foco neste RTC - Ribeirão Grande/Terra Seca -, nas
narrativas de origem deste agrupamento rural também é evocada a imagem de um ancestral
que no passado teria sido abandonado pelo senhor dele no alto do Vale do Ribeira.
Estes dois bairros19 vizinhos ficam localizados geograficamente na zona rural deste
município de Barra do Turvo. A história desta localidade ainda está por ser aprofundada;
17
Carvalho, Schmitt, OP. Cit.
18
A quilometragem descrita aqui está de acordo com o Mapa do estado de São Paulo. Entretanto, é preciso
mencionar que em documentos consultados o endereço da localidade diferencia um pouco do referido acima
ao indicar o Km “552” e o número da Rodovia “230” (“552/230”). Vide “Livro de Atas n. 1. Folhas n
1,2,3,4,5,6,7... Associação dos Remanescentes dos Quilombos dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca” –
Documentos anexo/ “Ata de Assembléia”.
19
Esta forma de expressão é a mais freqüentemente utilizada pelos meus interlocutores para se referirem às
localidades de Ribeirão Grande e Terra Seca. A noção de bairro empregada aqui também pode ser traduzida
12
sendo raras as informações encontradas sobre as suas origens, realidade social e dinâmica
cultural no contexto passado e presente.
Notadamente, esta “pista” sobre as origens do município deve ser levada a sério e fica por
merecer, todavia, uma pesquisa sistemática e mais aprofundada. Garimpando dados sobre a
história do município, a informação que parece mais consistente sugere que a fundação de
Barra do Turvo teve como personagem principal um senhor cujo nome registrado é Antonio
Bueno Sampaio. Ele migrou de Iporanga para o lugar na altura do ano de 1852. Nesta
localidade ele se instalou definitivamente e dedicou tempo e trabalho investidos na
atividade da criação de suínos e na plantação de lavoura. A boa fertilidade da terra
compensava o problema da característica geográfica da região - formada por terreno
acidentado em altos relevos - e tornava a lavoura produtiva.
no sentido observado por Antônio Candido, ou seja, como um “agrupamento de algumas ou muitas famílias,
mais ou menos vinculadas pelo sentimento de localidade, pela convivência, pelas práticas de auxílio mútuo e
pelas atividades lúdico-religiosas”. (Cândido, 2003, p.81). Mas é preciso acrescentar a esta definição a
particularidade dos bairros em estudo, cujo sentimento de pertencimento é reforçado ainda pela rede de
parentesco que entrelaçam a maior parte das famílias de uma e outra localidade mencionada acima.
20
Pedro, um dos representantes da “Associação dos Remanescentes de Quilombo dos Bairros Ribeirão
Grande e Terra Seca”, em conversa informal, comentou comigo que já encontrou diversos pedaços de pote
quebrado, entre outras peças, que acredita fazer parte de utensílios pertencente a povos indígenas que
habitaram a região no passado. Um jovem professor do ensino de primeiro e segundo graus da rede municipal
de Barra do Turvo, que se apresentou a mim como sendo formado em biologia pela USP e mestre nesta área
pela mesma instituição, também fez menção aos indícios de sítios arqueológicos, ainda não explorados, nos
domínios do município de Barra do Turvo, que são sugestivos quanto ao fato da ocupação no passado de
povos indígenas naquela localidade.
21
Fonte Internet
13
Provavelmente, este foi um dos fatores que também veio contribuir para a vinda de pessoas,
em seguida, e a fixação de agrupamentos familiares naquelas terras entre as margens dos
rios Pardo e Turvo. O surgimento dos quilombos que aos poucos se multiplicaram por esta
localidade do alto Vale do Ribeira talvez possa ser, em certo sentido, explicado por esse
motivo.
22
Fonte Internet: Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira
23
Ibidem
14
Entre os anos 1910 e 1930 foi quando Barra do Turvo teve a sua “maior fartura”. Isso,
graças ao aumento da “produção agrícola e pecuária” que era, em grande parte,
“transformada no próprio município”, através da “fabricação da rapadura, aguardente e
farinha de mandioca”24. Entretanto, pelo que insinuam os registros este salto produtivo foi
passageiro e não garantiu a prosperidade ou o enriquecimento da localidade.
Mas é preciso considerar, todavia, o fato de Barra do Turvo até a primeira metade dos anos
de 1960 pertencer ao município de Iporanga. Segundo fonte consultada, foi em 30 de
novembro do ano de 1938 que se criou, através do Decreto-Lei Estadual n. 9775, o
“Distrito com a denominação de Barra do Turvo, no município de Iporanga”. E só mais
tarde, através da Lei-Estadual de n.8092 de 28 de fevereiro de 1964 é que Barra do Turvo
teve a sua autonomia, ao ser desmembrada de Iporanga e elevada à categoria de
município25.
Semelhante aos tempos passados, Barra do Turvo continua nos dias de hoje a ser um
município predominantemente rural. Com uma população estimada em 2004 de
aproximadamente 8.613 pessoas, 68% estão concentrados na área rural e apenas 32%
fixadas na área urbana da sede municipal. Entretanto, não obstante esta característica da
distribuição populacional a principal fonte de arrecadação de Barra do Turvo não provém
da atividade econômica vinculada ao setor rural e, sim, do “setor de serviços”. E isso não
deixa de gerar sérios problemas econômicos e sociais para o município. Conforme
explicita-se nesta fonte consultada26:
Os municípios dependentes basicamente dos serviços apresentam, em
geral, os mais baixos valores per capita. São áreas em que as
atividades industrial e agropecuária não possuem destaque e, em
24
Fonte Internet: op. cit. Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira
25
Fonte Internet: op. cit. Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira
26
Fonte Internet: OTANI, Malimiria Norico et alli – “Breve perfil dos municípios rurais do Estado de São
Paulo”. In.: Portal do governo de São Paulo/Instituto de Economia Agrícola – IEA. (Artigo registrado no
CCTC-IEA sob o n. HP – 86/2005).
15
Esta citação contribui para demonstrar que os problemas enfrentados pelo município de
Barra do Turvo – e que sem dúvida refletem diretamente na qualidade de vida e condições
da sobrevivência da sua população. Trata-se de uma realidade concreta que obriga o poder
público local a pensar em alternativas que sejam viáveis para o desenvolvimento sócio-
econômico do município, sem perder de vista a questão da preservação do meio-ambiente e
a necessidade de promover políticas favoráveis à melhoria da qualidade de vida da
população constitutiva do lugar. O empenho na valorização e preservação do meio-
ambiente, o investimento planejado no potencial turístico oferecido pelas benesses da
natureza (Mata Atlântica, relevos, grutas, rios e cachoeiras etc.)27, bem como o apoio á
demarcação das terras ocupadas pelas comunidades tradicionais remanescentes de
quilombos locais, talvez seja uma boa saída para a prosperidade de Barra do Turvo e
revigorar as esperanças no futuro das gerações vindouras deste município.
27
Em portal na Internet do município de Barra do Turvo há destaque para o eco-turismo, a pesca e a prática
de esportes radicais - como o vôo livre.
16
- Capítulo III -
A reconstituição histórica destes dois povoados seria praticamente impossível sem o auxílio
imediato ao recurso da oralidade. Neste trabalho antropológico foi imprescindível dedicar
tempo para ir ao encontro dos mais velhos da comunidade ouvir deles os relatos de muitas
lembranças boas da infância e juventude, assim como as recordações mais tristes que
incomoda - experiências vividas, distrações e divertimentos, labutas do cotidiano, nome de
pessoas antigas, e parentes próximos já falecidos. O auxílio dos meus interlocutores ao
mediar o meu contato com virtuais entrevistados ou disponibilizar sem restrições, para este
antropólogo, informações obtidas por eles anteriormente - foi igualmente de enorme valia
para o rendimento da pesquisa28.
Assim, a exposição que se segue abaixo - e como não podia deixar de ser - é na verdade
uma reinterpretação das versões da história dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca que
os interlocutores ao expor para este antropólogo não evitaram demonstrar que, mediado
pela pessoa do curioso ouvinte, a vontade deles de alguma maneira se concretizava, qual
seja contar sobre eles para eles mesmos, num esforço reflexivo e voltado, sobretudo, para o
processo de construção identidade de afro-descendente que eles querem reafirmar no
contexto situacional deste momento específico, em que estão reivindicando o direito ao
título de propriedade das terras desde antes ocupadas pelos seus ancestrais.
E sendo assim, não obstante as elipses, rasuras e emendas suspeitas – parafraseando Geertz
-, o conteúdo da exposição em pauta não deixa de ser, a bem da verdade, uma reprodução -
quase literal - de textos na forma oral e escrita cuja autoria é dos próprios interlocutores e
lideranças reconhecidas pelas comunidades tradicionais das referidas localidades no alto
Vale do Ribeira. Pessoas acolhedoras com quem, durante a empreitada do trabalho de
28
Esclareço que entre as fontes que recorri para escrever este capítulo menciono dois textos redigidos por
Nilce de Pontes Pereira coordenadora da “Associação dos Remanescentes de Quilombos dos Bairros Ribeirão
Grande e Terra Seca”, em forma de rascunho. Um primeiro, rascunhado à mão e, um segundo, ao que parece
uma reelaboração deste anterior, em versão digitada em computador.
17
Miguel de Pontes Maciel, Benedito Rodrigues de Paula, Pacífico Morato de Lima, são
nomes e sobrenomes invariavelmente evocados no discurso dos interlocutores como
referencias importante na história das comunidades Ribeirão Grande e Terra Seca. Como
demonstração expressiva de uma consciência identitária assumida, é que os interlocutores
relembram com orgulho ao relatar que estes sujeitos, com nome e sobrenome sempre
destacados, são os “ancestrais”29; os “antepassados” deles que em séculos passados foram
os primeiros a abrir “capuava”30 e fixar com suas famílias naquelas terras a ermo do Vale
do Ribeira, às margens do rio Turvo. Numa saga empreendedora, como as de muitos outros
escravos negros fundadores de quilombos que se ramificaram pelo interior desta
encantadora região de Mata Atlântica do Estado de São Paulo.
Entre os três, é de Miguel de Pontes Maciel que os meus interlocutores sabem contar com
mais detalhes sobre a origem. De acordo com os relatos, Miguel de Pontes Maciel era Filho
de ex-escravo. O pai dele veio para o Vale do Ribeira juntamente com a leva de
trabalhadores braçais forçados que foram introduzidos na região a propósito da atividade
extrativa de aluviais de ouro, perseguidos nas encostas e beiras de rios da região. Depois,
com a descoberta das promissoras minas de ouro e diamante entre as montanhas distantes
29
Termo que se observa ser empregado com freqüência no discurso dos interlocutores.
30
Esta palavra é de origem tupi, conforme traduzido pelo Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua
Portuguesa “capuava” significa: “local apropriado para plantação, roça ... Do tupi kapï’ aua’ ”. (Cunha, 1996,
p.152). Antônio Cândido aponta o uso do termo “capuava” também como “Designação corrente de moradia”.
(Cândido, 2003 p.78).
18
das Minas Gerais, contam que o pai de Miguel, chamado Joaquim de Pontes Maciel, foi
abandonado pelo senhor dele, um aventureiro que decidiu partir rumo à Minas, também
atraído pelas notícias que ecoaram longe dos achados da riqueza mineral naquelas terras ao
longe.
Esse procedimento é descrito nos Laudos dos antropólogos do Ministério Público e RTCs31
vinculados ao ITESP como tendo sido procedimento comum entre os donos de escravos da
região do Vale do Ribeira quando perderam o interesse na atividade da mineração de outro
nesta localidade. Sonhando com a riqueza fácil, os senhores partiam para Minas levando
consigo apenas os escravos que se avaliava estarem aptos para a longa viagem e agüentar,
depois, o serviço pesado da mineração aurífera (portanto, em condições físicas saudáveis e
com todo o vigor da juventude); sem hesitar, pois, em deixar para traz, entregues à própria
sorte, os doentes e idosos.
Esta teria sido a sorte, também, de Joaquim de Pontes Maciel. Uma vez na condição de
homem livre, Joaquim de Pontes Maciel teve que arriscar o sustento da família mudando de
lugar e plantação de roça, entre as localidades de Xiririca (hoje Eldorado) e Iporanga. Neste
estilo de vida de característica nômade, depois de percorrer diferentes localidades da região,
incluindo um lugar chamado Indaiatuba, ele foi parar nas proximidades de Barra do Turvo,
no povoado hoje conhecido pelo nome de “Reginaldo” 32. Acredita-se que a chegada dele
neste lugar foi por volta do ano de 181733 .
Segundo relato prestado pelo neto de Joaquim de Pontes Maciel, Anésio de Lima34, o avô
teve várias mulheres e muitos filhos. Miguel de Pontes Maciel era o quarto da família
formada por 11 filhos - a contar com dois outros que o entrevistado apontou como sendo
“ilegítimos” ou “particulares”.Os três nascidos antes do Miguel chamavam-se,
31
Sigla de Relatório Técnico-Científico.
32
Segundo a tradição oral, esta denominação popular do bairro presta homenagem a um dos primeiros
moradores do povoado pelo grande feito dele de ter construído uma “canoa” – de maneira insinuada como
tendo sido a primeira - naquele lugar.
33
Estou considerando aqui a data indicada nos textos esboçado por Nilce de Pontes Pereira.
34
Estou reproduzindo aqui o depoimento gravado por mim, em 01/11/2006, prestado pelo Morador do bairro
Reginaldo, o senhor Anésio Ribeiro de Lima, de 71 anos de idade, neto de Joaquim de Pontes Maciel. Ele é o
coordenador da “Associação dos Remanescentes de Quilombo do Reginaldo”. A primeira entidade desta
natureza fundada na região do município de Barra do Turvo.
19
Este quarto filho de Joaquim de Pontes, Miguel de Pontes aparece nos relatos como um tipo
de personagem principal e cuja imagem que se constrói do mesmo é sugestiva da posição
de liderança desse antepassado no processo de ocupação das localidades de Ribeirão
Grande e Terra Seca.
De acordo com os relatos, Miguel de Pontes Maciel ainda jovem deixou a casa do pai no
“Reginaldo” e foi morar em Indaiatuba; onde se casou com a primeira esposa, chamada
Verônica. Ela faleceu cedo e o casal não teve filhos. Ainda em Indaiatuba ele se casou pela
segunda vez, com Josefa Xavier Rocha, cuja irmã, Maria Xavier da Rocha, era esposa do
Benedito Rodrigues de Paula.
Mediado por esta relação cruzada de parentesco Miguel de Pontes Maciel e Benedito
Rodrigues de Paula e Miguel se conheceram e tornaram desde então grandes amigos.
Parceiros de caminhada, e sempre juntos na aventureira labuta pela sobrevivência eles
saíram de Indaiatuba à procura de lugar melhor para o plantio de roça, abrindo picada pela
mata adentro. Como era o costume, partiram com a família. “Essa era a rotina deles –
escreve Nilce Pereira -, viviam como nômades. Faziam as roças, tiravam o sustento e
partiam para outra região. Por esse motivo foi que Miguel e [os] companheiros35 [dele]
formavam os bairros. Dessa forma [é] que os netos dos escravos chegaram nesses locais e
formaram aqui suas famílias, criaram filhos e viram seus netos chegando...”
O estilo de vida nômade é apontado em RTCs do ITESP como tendo sido uma
característica do modo de sobrevivência nesta vasta região interiorana do estado de São
Paulo. Estava relacionado ao método tradicional de cultivo da terra que era empregado na
região, ou seja, a prática das “queimadas” com intercalação de áreas de plantio deixadas em
pousio.36
35
Referindo-se aqui, também, à pessoa de Pacífico Rodrigues de Paula, a quem mencionei no início.
36
Cf.: Laudo dos Antropólogos do Ministério Público Federal, apud.: Turatti, Maria Cecília M. - Relatório
técnico-científico sobre os remanescentes de quilombo de Morro Seco/Iguape - SP, 2006, pp.29-30.
20
Este “lugar das perobas”, apelido antigo do bairro Terra Seca, é descrito nos relatos de
Nilce Pereira como tendo sido o lugar onde, primeiramente, os três ancestrais se instalaram
com a família.
37
A propósito do trabalho etnográfico, cumpre-me informar que consultei dois originais desta autora, Nilce de
Pontes Pereira; ambos, diria, em forma de rascunho. Trata-se, esclareço, de uma versão preliminar anotada à
mão em folha de caderno com pauta e no formato tamanho grande; e uma segunda versão, síntese da primeira,
digitada e impressa.
38
Esta referência aparece nos rascunhos, e a origem do termo pode ser apreendida através deste trecho
digitado: “[...] foi assim que eles chegaram junto com o cunhado (Benedito Rodrigues de Paula) e seus [sic]
filhos do primeiro casamento [...] na terra seca que antes eles batizaram com [o nome] de perola [peroba]
por causa da árvore que tinha no local da 1ª residência: [...] essa planta muito grande e frondosa. [Por isso]
foi chamado de lugar das perobas.” (as intercalações entre colchetes são minhas).
39
Esta referência aparece nos rascunhos, e a origem do termo pode ser apreendida através deste trecho
digitado: “[...] foi assim que eles chegaram junto com o cunhado (Benedito Rodrigues de Paula) e seus [sic]
filhos do primeiro casamento [...] na terra seca que antes eles batizaram com [o nome] de perola [peroba]
por causa da árvore que tinha no local da 1ª residência: [...] essa planta muito grande e frondosa. [Por isso]
foi chamado de lugar das perobas.” (as intercalações entre colchetes são minhas).
21
Nos relatos sobre a origem dos povoados de Ribeirão Grande e Terra Seca um dos detalhes
a meu ver bastante significativo é a recorrência da menção feita aos nomes de municípios
do Vale do Ribeira como “Eldorado”, “Indaiatuba” e “Iporanga”. É preciso lembrar que
nestes municípios também se encontram localizadas diversas comunidades tradicionais
remanescentes de quilombos (algumas delas inclusive foram objetos de RTCs anteriores e
com os quais também estou dialogando no contexto deste documento). Esse detalhe dos
relatos – a referência ao nome de tais municípios - pode ser interpretado como um tipo de
reforço às marcas simbólicas através das quais se busca evidenciar a identidade étnica
quilombola dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca.
Nesse sentido o “Reginaldo” merece aqui destaque especial. A formação deste povoado –
como sugere os relatos – é bem anterior aos demais bairros rurais do município de Barra do
Turvo, identificados como remanescentes de quilombos; além de Ribeirão Grande e Terra
Seca, é preciso mencionar as comunidades do Cedro e Pedra Preta40. Sendo válido
sublinhar que esta comunidade foi a primeira a organizar-se na forma de Associação
comunitária e, até o momento, a única entre as quatro que já obteve junto à Fundação
Cultural Palmares/MINC a “Certidão de Auto-Reconhecimento” como remanescente de
quilombo (Vide Documentos anexos/Certidão de Auto-reconhecimento). A pesquisa
antropológica de campo permite afirmar que o elo entre estes povoados rurais do município
de Barra do Turvo não pode ser explicado somente pelo aspecto da proximidade espacial-
geográfica, ou da afinidade definida pela noção de vizinhança, mas, principalmente, pelo
vínculo familiar estabelecido através de ligações ancestrais de parentesco (vide “Diagrama
de Parentesco” ao final).
40
Além da comunidade alvo deste laudo antropológico, é preciso mencionar que as comunidades
remanescentes de quilombos dos bairros Cedro, Pedra Preta, semelhante ao caso do Reginaldo, ainda
aguardam a consultoria técnica para produção do laudo antropológico exigido no processo para obtenção do
título das terras reivindicadas. No caso da comunidade Pedra Preta o problema é mais complicado pelo fato
deles não terem conseguido, ainda, organizar a Associação representativa da comunidade local.
22
De volta ao relato de Nilce Pereira, outro aspecto detalhado por ela é referente às
dificuldades enfrentadas para sobreviver naquela localidade do Vale do Ribeira. Versão
que, tal como outras passagens do que ela expõe e das narrativas ouvidas de outros
interlocutores locais, articula elementos presentes na história mais ampla do município de
Barra do Turvo. Nesse caso, os meios utilizados para deslocar dentro e fora da comunidade
e as formas do comércio com outras localidades vizinhas:
Seu Miguel, Pacífico e Benedito trabalharam por muito tempo na
região fazendo roça [e] criando porcos para vender em Iporanga, a
troco de sal e mantimentos [que não produzia nas terras deles] nos
entrepostos. O meio de transporte era os cavalos que costumavam
carregar enormes cestas [nas quais] transportavam mercadoria e
criança pequena que ainda não agüentava caminhar por muito tempo.
Nos relatos de Nilce Pereira (mas não apenas a versão dela, é preciso ressalvar) há que se
observar um outro detalhe de tamanha importância, ou seja, a ênfase na relação de
solidariedade e cooperação estabelecida entre os ancestrais fundadores do lugar.
41
Trata-se de um estudo realizado por ele nos anos 1950 focalizando a vida caipira, a sua dinâmica e
transformações.
23
Este trabalho coletivo - o mutirão - era um dos aspectos essenciais, porém, não o exclusivo,
- conforme demonstrou Antônio Cândido -, na sedimentação da rede de relações sociais e
forma da sociabilidade constitutiva dos bairros rurais paulistas, pesquisados por ele em
meados do século passado. Outro aspecto, portanto, também importante para a aproximação
das pessoas e integração da comunidade apontada por Cândido e que, da mesma forma que
a primeira, trazia a “consciência de unidade” local era a prática lúdico-religiosa. Nas
palavras do referido mestre45:
[...] há nos bairros uma solidariedade que se exprime pela
participação nas rezas caseiras, nas festas promovidas em casa para
cumprimento de promessas, onde a parte religiosa, como se sabe, é
inseparável das danças. Quando, por exemplo, é muito grande o
número de inscritos para promover a festa mensal da capela, um
morador que tem promessa a cumprir pode trazer a imagem a sua
42
Cândido, 2003, p.87.
43
Ibidem, p.98.
44
Cândido, 2003, p.87.
45
Ibidem, p.98.
24
Estes aspectos da sociabilidade caipira estão insinuados também na fala das pessoas de
Ribeirão Grande e Terra Seca, nas narrativas dos mais velhos e na versão escrita de Nilce
Pereira. A ênfase nos tipos de crenças e práticas religiosas, expressivas de um catolicismo
popular predominante na comunidade no tempo dos antigos pode também ser extraído do
relato desta última, ou seja:
a – Dança de São Gonçalo:
Conta-se que as tradições antigas, como romaria, eles passavam a
noite ou o dia inteiro cantando e dançando em louvor a São Gonçalo.
Faziam muitas novenas cantadas onde se fazia a mesada de anjo
como costumavam dizer eles colocavam as crianças menores de sete
anos sentados em circulo no chão em cima de esteira de taboa e
faziam uma alimentação farta com doces e salgados[...].
b – Reza de Terço: “Conta-se, também, que a forma com que faziam o terço ou era
cantado ou rezado [falado]. [t]odos [ficavam] de joelho no chão, em forma de penitencia.
Enquanto não terminasse [a reza] ninguém [se] levantava do lugar”;
c - Canto de Quaresma:
Outra tradição era o canto de quaresma. [Todo] ano eles faziam a
cantoria dos mortos nos lugares onde se enterravam os entes
queridos, ou envolta das casas. Essa cantoria ia a noite toda. [Muitas
vezes] as famílias que eram saudadas com os cantos e orações saiam
de suas casas e convidavam as pessoas para entrar e tomar café com
porções de amendoim ou cuscuz ou pamonha ou mesmo paçoca de
carne[...];
25
d – Fandango:
A forma de dançar romaria era em dupla de homem e mulheres, por
volta em torno de 1hora. Como os familiares se reuniam para rezar e
festejar, era na casa de um [certa vez, e na] de outro [em vez
seguinte]. [Por isso, durante] muito tempo os compadres escolheram
o Cedro para fazer [as] suas festividades, [que aconteciam] uma vez
por mês e no 1º domingo[...];
“No dia de são Pedro iam todos para preparar a festa e novena em
louvor ao santo [...]. Conta-se, também, que os restantes de
imigrantes também mantiveram seus costumes. Um desses costumes
era a passeata [sic] da bandeira do divino. [Os andores] dos santos de
cada mês e dia, eram enfeitados com varias fitas coloridas. [E] eles
saiam visitando as casas, cantando e tocando instrumento como
pandeiro viola cavaquinho e congo; fazendo barulho e cantoria. [Por]
onde passavam, todos saiam para ver ou acompanhar [o cortejo] até a
outra casa. Quando chegava a noite, eles dormiam na casa da pessoa
[onde estavam de passagem]. Nesses dias eles ficavam até tarde
cantando. E [aqueles] que tinham ido acompanhar [os dançantes]
voltavam para casa [...]”.
A forte influência do catolicismo nos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca é manifestada,
ainda, na memória evocada do primeiro templo edificado para a prática dos ritos e cultos
expressivos da “fé” nos “deuses e santos”46 dessa religião cristã:
46
Expressão apropriada de Carlos Brandão em O divino, o santo e a senhora, 1978.
26
vez por mês. A família crescia cada vez mais [e] eles [não queriam
deixar perder o] costume de passar [as] suas crenças e devoções aos
filhos. Foi assim que o senhor Bernardinho resolveu que era hora de
fazer uma capela, pois [até então] usavam [a] sala e [o] quintal [da
casa dele], ou seja [o] terreiro para rezar [e onde] fizeram um
pequeno altar [dentro de] uma casa abandonada que só tinha
[algumas] paredes de piri47 e [o material da] cobertura [era] palha de
palmito. Ali [dentro é que] rezavam, sem muita proteção da chuva e
[do] sol. [Por isso] construíram uma capela de barro e sapé que
ficava no lombinho acima [de onde] hoje se localiza o salão
comunitário. Foi passando o tempo e eles construíram várias [outras]
igrejinhas.
47
De acordo com o Aurélio, “piri” é uma “Espécie de junco da família das ciperáceas (Rynchospora
cephalotes), que cresce nos terrenos pantanosos, e do qual se fazem esteiras.” (Cf. Novo dicionário básico da
língua portuguesa, 1988, p. 508).
48
Referência à rodovia 116 – Regis Bittencourt
27
ponte] ele caiu na água. [Molhado, ele teve de] vesti[r] uma roupa
[emprestada] do senhor Bernardo. [Neste dia] a senhora Rosa [esposa
de Bernardo Pontes] coordenou um almoço comunitário em
homenagem ao bispo. Depois da celebração o bispo resolveu visitar a
paróquia que era missionada pelo padre de Iporanga. [No intervalo
em que] ele foi para a cidade a senhora Rosa Marques sofreu um
derrame. [Então] o senhor Bernardo correu para estrada para esperar
[...] o bispo [voltar] para levar ela para o hospital de Pariquera-Açu.
O bispo ficou com ela no hospital, [apesar] do cansaço, ate as 6hs da
manhã do dia seguinte. [Ela] demorou para [se] recuperar; e ele
sempre passava no hospital ou ligava lá para saber como ela estava
passando. Foi dessa forma que eles passar[am] a ser evangelizados
pela diocese de Registro [onde era a sede do] bispo [...].
Ao refletir sobre a articulação do passado com o presente no contexto desta exposição sobre
a história oral dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca, é válido lembrar uma frase
enunciada por João Ubaldo Ribeiro em Viva o Povo Brasileiro: “O segredo da Verdade é o
seguinte: não existem fatos, o que existem são histórias”. Esta citação sugere que a
28
- Capítulo IV -
Com base nos levantamentos preliminares feitos pelos antropólogos do Ministério Público
Federal, juntando a população dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca, o total de famílias
contadas seria 42 famílias49. Entretanto, através do trabalho antropológico empreendido
verificamos que atualmente há um total de, aproximadamente, 77 famílias integrantes
destes dois bairros juntos.
A maior parte destas famílias moram em casas construídas ao longo das margens do rio
Turvo e Ribeirão Grande. A maioria em moradias simples e sem muito conforto;
construídas com paredes de tábua e cobertas com telhado de amianto. Para de ter uma idéia,
em quase todas casas visitadas durante pesquisa de campo, pude observar que os móveis
encontravam-se em condições precárias ou eram rústicos – com destaque especial para o
fogão à lenha feito de taipa, no canto das cozinhas.
O meio de subsistência das famílias é garantido basicamente pelo que é conseguido colher
do plantio de roças - principalmente milho, mandioca, feijão, cana e banana. A criação de
animal para o consumo próprio ou comerciar é mais raro.
O interesse atual das lideranças das comunidades em conseguir manter as nascentes dos
rios dentro dos limites da extensão territorial reivindicada por eles, tem a ver justamente
com a preocupação relativa ao futuro incerto que projetam pela frente, no tocante ao risco
de poluição e, conseqüentemente, destruição da qualidade das águas dos rios locais. Isso
49
Ref.: ITESP/Assistência Especial de Quilombos e outras Comunidades Tradicionais (tabela sobre situação
das comunidades de quilombos até janeiro/2006). Nesta tabela apresenta-se um total de 21 famílias
constitutivas do bairro Ribeirão Grande e, igualmente, 21 do Terra Seca.
30
também foi tema abordado nas conversas informais com os meus interlocutores; pensando a
questão do plantio das roças e a própria situação da sobrevivência das famílias no lugar.
De fato, as condições para a sobrevivência no lugar são muito difíceis na atualidade. Sabe-
se que a plantação de banana tem sido destacada como uma atividade crescente e
economicamente rentável nas regiões do Vale do Ribeira. Entretanto, esta bonança ainda
não faz parte da realidade das comunidades remanescentes dos quilombos de Ribeirão
Grande e Terra Seca. Os interlocutores alegam que não dispõem de uma estrutura adequada
para produzir comercialmente; inclusive no que concerne ao transporte da produção.
Mesmo o que atualmente eles conseguem produzir - e gostariam de negociar fora, como o
feijão, mandioca, fabricação de rapadura etc -, é difícil atrair comprador ou levar para
vender fora do lugar.
A solução deste problema também está vinculada à questão da obtenção do titulo definitivo
de propriedade da terra. Informando que o total da área territorial reivindicada pela
comunidade em pauta até Março de 2006, era de aproximadamente 4.570,00 hectares50.
Incluindo nestes cálculos uma certa fração sobreposta ao PEJ. Na verdade, a demanda por
esta extensa fração territorial tinha a ver não somente com o fato da comunidade entender
que a reivindicação de tal extensão territorial era um direito que lhe cabia, por se tratar de
uma área desde o passado remoto ocupada pelos seus ancestrais, mas, sobretudo, estava
relacionada com a preocupação de se ter resguardado as nascentes dos rios.
E conforme foi enunciado na introdução deste relatório, houve uma série de conversas e
negociações em torno da demarcação dos limites do PEJ e a extensão da área que
continuaria então a ser alvo da reivindicação da propriedade por parte da comunidade
Ribeirão Grande e Terra Seca. As negociações avançaram e o diálogo logrou êxito e se
chegou a um acordo. De um lado, o Grupo Interestadual de Trabalho do PEJ (GT) ∗ e, de
outro, as lideranças da “Associação dos Remanescentes dos Quilombos dos Bairros
Ribeirão Grande e Terra Seca” estes representantes concordaram em ceder um pouco na
exigência referente à extensão total da área em questão. Desse modo, no que concerne
especificamente à área sobreposta ao PEJ incluída no total da fração territorial alvo das
reivindicações pela comunidade houve a aceitação por parte das lideranças comunitárias de
se ter reduzido da mesma, aproximadamente, 768,93hectares 51. E sendo assim, a área total
efetivamente reivindicada pela comunidade passou a corresponder, aproximadamente, a
3.601,80 hectares (ver: “Documentos anexos/configuração em mapas...).
50
Fonte: Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva”/ ITESP - Mapa da
“Proposta de área Reivindicada pelas Comunidades Quilombolas do Município de Barra do Turvo:
Reginaldo, Ribeirão Grande, Terra Seca, Cedro, Pedra Preta (Paraíso) - resultado de reuniões com integrantes
de cada comunidade, Instituto Florestal e ITESP, Março de 2006.
∗
Ao mencionar novamente este grupo utilizarei a sigla GT do PEJ.
51
Fonte: Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva”/ ITESP - Mapa da
“Área Reivindicada pela Comunidade Quilombola Ribeirão Grande, Terra Seca – Município Barra do Turvo -
resultado do acordo entre o Grupo de Trabalho PEJ e a comunidade, no dia 19/08/ 2006.
32
É preciso registrar que no dia 25 de Outubro de 2006 foi realizada uma reunião do
Conselho Consultivo do PEJ52. A proposta desse encontro era debater o novo mosaico do
PEJ juntamente com as comunidades tradicionais e demais sujeitos envolvidos na questão
– “posseiros” inclusive. Nesta reunião foi apresentado em telão o novo mosaico do PEJ de
modo a facilitar o acompanhamento da explanação feita pelo representante do Conselho, e
esclarecer aos presentes, através da configuração em mapas, a localização das áreas
identificadas como estando dentro e nas adjacências da divisa do PEJ. De volta para
Ribeirão Grande, à noite depois de passada a reunião, nas conversas com os representantes
da “Associação...” que participaram da mesma pude perceber que, embora eles
manifestassem estarem satisfeitas com o acordo negociado com o GT do PEJ, algumas
dúvidas relacionadas ao assunto haviam ficado e os estavam preocupando bastante os
interlocutores. Este incômodo estava relacionado á questão das categorias APA (Área de
Proteção Ambiental) e RDS (Reserva de Desenvolvimento Sustentável). É preciso ressalvar
que tais dúvidas estavam incomodando não somente os remanescentes quilombolas de
Ribeirão Grande e Terra Seca, mas também os demais representantes das comunidades
vizinhas – Reginaldo, Cedro e Pedra Preta. Portanto, a questão que se levantava era quanto
ao esclarecimento do sentido jurídico e as implicações que tais categorias enunciadas (APA
E RDS) poderia ou não trazer para as comunidades remanescentes de quilombos da região;
particularmente no que diz respeito ao fato de lhes serem concedidos ou não, pelo governo
paulista, o título definitivo de propriedade das áreas reivindicadas, porém, sobrepostas ao
PEJ53.
Entre as dúvidas apontadas, uma delas não está relacionada – pelo menos a princípio - com
a situação das comunidades tradicionais, ou seja, a questão da categoria APA (Área de
Proteção Ambiental); a outra, sim, sendo esta concernente à categoria RDS (Reserva de
Desenvolvimento Sustentável). Com o intuito de obter um esclarecimento melhor sobre o
52
Esta reunião foi realizada no Núcleo do Cedro (Sede Florestal do Parque Estadual Jacupiranga), localizado,
aproximadamente, no Km 442 da Br 116.
53
Com efeito, no momento em que escrevo estas linhas acabo de atender, em minha casa, o interurbano da
coordenadora da “Associação...”, Nilce Pereira. O assunto principal é a confirmação da proposta de reunião
para o final desta semana, dia 19 de janeiro de 2007; entretanto, ela aproveita a oportunidade para comentar
brevemente sobre a reunião que fizeram ontem, 14 de janeiro, juntamente com as comunidades vizinhas
(Reginaldo e Cedro) e na qual, ao que me transpareceu na conversa, foi consensual o desacordo com
referência a esta categoria “RDS”, justamente por isto que foi enunciado acima.
33
Embora os ocupantes das áreas cuja proposta de classificação é expressa pela categoria –
APA –, possam vir a adquirir o direito de permanecer no lugar, a exploração e o uso do solo
(plantação de roças, instalação de equipamentos etc) estarão, não obstante, condicionadas
às normas e regras legais estabelecidas para proteção do meio ambiente e preservação
florestal.
54
Através do telefonema que recebi da coordenadora da Associação quilombola de Ribeirão Grande e Terra
Seca, Nilce Pereira, anteontem, 23 de novembro de 2006, primeiro para comunicar-me que havia dado a luz
ao quinto filho na noite anterior, 22 de novembro de 2006, fui informado que esta reunião aconteceria de fato,
no lugar, na data de 24/11/2006.
55
Turatti, Maria Cecília M. – OP. Cit., 2006, p.31.
34
Esta restrição à qualidade de vida o antropólogo foi colocado a par desde os primeiros
contatos com a comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca; e pude conhecer de perto a
extensão do problema ao percorrer a localidade e ter contato com lideranças das outras
comunidades vizinhas – Cedro e Reginaldo. Semelhante à instalação da luz elétrica, a
comunidade Ribeirão Grande/ Terra Seca reclama de outros problemas e situações
particulares, direta ou indiretamente relacionados à questão da regularização da propriedade
da terra. Trata-se de problemas que gerou inúmeras perguntas dirigidas a um funcionário
representante do ITESP, no contexto de uma reunião mensal da “Associação...”57, apenas
56
O local da reunião foi o Parque do Horto Florestal, em São Paulo, capital. O assunto principal da colocado
em pauta era a discussão da minuta de leis proposta para “Alterar os limites do Parque Jacupiranga”; sendo
esclarecido no início do documento: “Artigo 1º.- As alterações e reclassificações das áreas que compõem o
território especialmente protegido pelo Parque Estadual Jacupiranga, criado pelo Decreto Lei, n.145 de 08 de
Agosto de 1969, bem como as novas áreas protegidas que ora se instala, passam a ser regidas pelas
disposições da presente lei, observadas as normas ambientais vigentes, especialmente às contidas da Lei
n.9985 de 18 de Julho de 2000 (SNUC) e seu regulamento Decreto n.4340 de 22 de Agosto de 2002.” (Trecho
anotado pelo antropólogo da “minuta” exibida em telão durante a reunião do “Grupo Intersecretarial de
Trabalho” em 13/09/2006).
57
Refiro-me, aqui, a reunião realizada em 18/09/2006, para a qual fui especialmente convidado a participar,
pela coordenadora da “Associação...”, que entendeu ser ocasião oportuna para a apresentação da pessoa deste
antropólogo à comunidade.
35
para mencionar de passagem: situação das pessoas que “pagavam [imposto] ao Incra”;
“relação com a agrofloresta”; a necessidade “empreendimento social” junto à comunidade,
entre outros.
Conforme a versão ouvida: em um dia de festa na comunidade este ancião não quis que os
parentes o levasse ao local da reunião e preferiu ficar em casa sozinho assistindo televisão.
Aproveitando da situação, assaltante invadiram a casa, amarraram o idoso à cama do quarto
e fugiram em seguida, levando todo o dinheiro recebido por aquele da aposentadoria como
trabalhador rural. As suspeitas levantadas é que os assaltantes eram pessoas de fora que
chegaram no lugar com desculpa de construir casa e plantar dentro da área considerada da
comunidade, uma vez que estes suspeitos desapareceram da localidade desde então. A
partir desse dia este senhor mais velho da comunidade, vitima indefesa dos assaltantes,
decidiu apoiar a fundação imediata da “Associação...” por entender que organizados dessa
forma eles conseguiriam obter o título da terra ocupada e, desse modo, teriam mais
condições de evitar a invasão do lugar por pessoas estranhas ou indesejadas pela
comunidade.
A narrativa deste episódio dramático não deixa de ser expressiva dos receios da
comunidade quanto a situações de violência, entre outras ameaças que poderá ficar exposta,
ao terem o seu lugar de origem invadido por terceiros e com interesses desconhecidos.
36
A comunidade, porém, não tem muito como controlar a invasão das terras por ela ocupada
tradicionalmente. Devido também ao fato de não possuir o título definitivo de propriedade
da mesma. Entretanto, com a esperança que ora surge da possibilidade de resolver esta
situação, a comunidade tem buscado se mobilizar e, conjuntamente com os representantes
dos povoados vizinhos – Cedro e Reginaldo –, recorrer às instituições que entendem ter a
competência e autoridade para mediar a situação e/ou impedir o abuso dos atos de invasões
ao seu território: o ITESP e a polícia (ver: Documentos anexos/Ocorrência Policial e
Correspondências Oficiais).
58
Este termo é empregado pelos próprios interlocutores ao fazerem referência a pessoas que não são bem
aceitas pela comunidade, por motivo mesmo de invasão de faixas territoriais reivindicada por aquela ao
governo paulista. Trata-se de pessoas que mantém uma relação conflitiva com a comunidade, conforme
apontei no diagrama de parentesco (vide final do texto).
37
um caso isolado e particular da comunidade que pertencem; mas problemas estruturais cuja
solução depende em grande parte da mediação do poder público, sem dispensar o apoio
generoso de instituições civis voltadas para o trabalho social, tais como ongs, igreja,
movimentos sociais etc. Tendo claro, todavia, que a capacidade da mobilização interna da
comunidade, bem como a união em parcerias locais é fundamental para multiplicar as vozes
e ampliar o eco das suas denúncias e reivindicações.
Mas esta consciência que parece estar sendo tomada atualmente na comunidade Ribeirão
Grande e Terra Seca (e válido também para as demais já mencionadas – Reginaldo e
Cedro) é fruto, sem dúvida, de um trabalho que começou muito antes junto a população
rural do município de Barra do Turvo representado por agentes pastorais ligados à Igreja
Católica, entidades não governamentais de proteção às populações ribeirinhas, e agentes do
movimento negro. Como bem observou Carvalho em RTC sobre a comunidade quilombola
do Galvão59 - “Em muitas comunidades do Vale, onde existe a atuação da Pastoral da Igreja
Católica e do Movimento Negro, a identidade quilombola foi assimilada pela população,
aparecendo como fator positivo na elaboração de lutas políticas”. De fato, foi isso também
que se verificou na comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca através da pesquisa
antropológica realizada.
E para terminar é válido acrescentar que a partir da menção feita diretamente acima, ou
insinuada em capítulos anteriores, sobre a recorrente interlocução entre as comunidades
remanescentes de quilombos do município de Barra do Turvo, torna-se possível evidenciar
não apenas a “consciência de unidade local” destas comunidades, construídas no processo
de luta pela conquista do título definitivo de propriedade das terras tradicionalmente
ocupadas por aquelas, mas também formas de sociabilidade estabelecidas na localidade.
Quanto a esse aspecto, é oportuno ressaltar que elementos da cultura tradicional do meio
rural paulista ainda fazem parte do cotidiano dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca.
Desse modo, a prática do trabalho coletivo – o mutirão – é uma das formas de cooperação e
sociabilidade que se tem buscado preservar dentro da comunidade Ribeirão Grande e Terra
59
Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório técnico-científico sobre os remanescentes da comunidade
quilombo Galvão... . 2000, p.11.
38
Esta festa reúne toda comunidade – e também a vizinhança. A rainha é escolhida entre as
pessoas mais jovens – pode ser criança ou adolescente, sendo a ganhadora do concurso é
sempre aquela que consegue vender mais rifas para a comunidade. O dinheiro arrecadado é
sempre revertido para a organização do evento. Além do ritual de eleição da “Rainha do
Quilombo”, a festa ainda é animada com barraquinhas, bailes e o sorteio de prendas61.
60
Durante período do trabalho de campo, mais especificamente no dia 27 de novembro de 2006, mais de 20
pessoas, entre homens e mulheres, jovens e adultos, moradores nos bairros tanto de Ribeirão Grande quanto
Terra Seca se organizaram em mutirão para cooperar na plantação de cana e mandioca da roça de Nilce
Pereira. Ela estava grávida, aproximando dos nove meses de gestação, e o marido trabalhando fora, em
fazenda distante embora na própria região. Enquanto o grupo trabalhava no campo, algumas mulheres ficaram
na casa ajudando no preparativo da comida, que foi servida comunitariamente depois de terminado a tarefa.
Aproveitei também a ocasião para entrevistar pessoas, e desse modo, registrar informações sobre a genealogia
de parentesco, bem como fotografar os trabalhadores. Momento em que as pessoas fizeram questão de posar
segurando em mãos as suas ferramentas de trabalhos ou montados em lombo dos animais ou em bicicletas.
61
Este ano de 2006, o pároco local – padre Leonardo - foi sorteado com um bezerro, que prometeu doar,
numa oportunidade vindoura, para um banquete reunindo a comunidade e amigos.
39
- Capítulo V -
Ao iniciar este capítulo eu quero chamar a atenção do leitor, logo de início, para a citação
destacada no capítulo introdutório deste Relatório e cujo conteúdo gira em torno da
discussão do termo “Remanescente de Quilombo”62. Através da análise do conteúdo da
referida citação verifica-se que a conceituação descritiva - “Remanescente de Quilombo” -
compreende implicitamente a própria noção de identidade étnica. A referência principal dos
estudos que introduzem a noção de identidade étnica é o antropólogo inglês Fredrik Barth.
Em 1969 Barth escreveu um artigo no qual chamou atenção para a noção de “fronteira”,
entendida como elemento fundamental na demarcação da “diferença entre culturas” e
definição do chamado “grupo étnico”. Nas palavras de Barth63: “As diferenças entre
culturas, assim como suas fronteiras e vínculos históricos, receberam muita atenção (até
então pelos cientistas daquela época); contudo, a constituição dos grupos étnicos e natureza
de suas fronteiras não foram examinadas tão sistematicamente”.
62
Vide Introdução, página 3 deste Relatório...
63
Barth, Fredrik, 1997, p188.
42
exemplos que poderia ser citado, interessa mencionar de início os nomes dos antropólogos
Roberto Cardoso de Oliveira e Manuela Carneiro da Cunha, pela importância deles como
referência obrigatória nos estudos sobre a questão da identidade étnica no Brasil.
Cardoso de Oliveira esclareceu que a identidade étnica para ser afirmada depende sempre
da presença do outro. Esta construção se processa em situações específicas de confronto
interétnico nas quais determinado grupo minoritário encontra-se ameaçado por um outro
dominante – no plano cultural ou mesmo fisicamente – e tem a percepção quanto ao risco
que corre de ser efetivamente dizimado. No contexto desta relação de dominação e conflito,
traduzida através da expressão “situação de fricção interétnica”, é que a identidade étnica,
segundo Cardoso de Oliveira, tende a emergir como uma forma de resistência à dominação
que determinado grupo étnico minoritário toma a de consciência de ter-lhe sida imposta
historicamente. Nesse sentido é que a identidade étnica – de acordo com o referido
antropólogo – ao ser construída exige a demarcação intencional das “fronteiras étnicas” de
modo a evidenciar as diferenças entre o “nós” e os “outros”.
64
Trata-se de pesquisas realizadas nos anos 1970, no norte do país, abordando a problemática da situação de
conflito envolvendo de um lado as populações indígenas, ameaçada da perda das terras por elas ocupadas
tradicionalmente, além da própria vida e, de outro lado, os regionais – fazendeiros interessados na apropriação
das terras ocupadas pelos primeiros.
65
A referência é o artigo deste autor publicado em 1969, intitulado Ethnic groups and boundaries, pela
Bergen-Oslo, Universiteta Forlaget. Londres, George Allen & Unwin.
66
Destaca-se como referência principal o livro intitulado Custom and politics in urban África, em Londres,
pela Routledge and Kegan Paul, primeira publicação também em 1969.
43
67
Ver: Cunha, Manuela C. da – Negros estrangeiros..., 1985; Antropologia do Brasil..., 1986.
68
Ibidem, 1986, p. 85-119.
69
Ibidem, p. 100.
44
De um modo geral, da perspectiva teórica dos autores acima enunciados a identidade étnica
deve ser entendida como uma modalidade de identidade contrastiva, situacional e que
depende da presença do outro para ser construída. Trata-se de uma atitude política,
assumida por determinado grupo étnico que se sente ameaçado cultural e/ou fisicamente de
extinção dentro de determinada fronteira territorial e cujos interesses - sejam eles de ordem
econômica, comercial ou política – estão efetivamente colocados em jogo.
Portanto se, por um lado, as reflexões teóricas desenvolvidas por Cardoso de Oliveira
deram destaque, sobretudo, para o fenômeno da identidade étnica compreendida da
perspectiva de Barth, ou seja, com ênfase na idéia do grupo étnico pensado como um tipo
de “organização social”; por sua vez, Cunha destacou o aspecto político desta modalidade
identitária traduzida a partir da definição de grupo étnico em conformidade com a definição
de Abner Cohen, ou seja, um tipo de “organização política”.
A historiadora e antropóloga Lilia Shwarcz ao criticar Cunha observa que essa autora deixa
insinuado na sua forma de interpretação uma ênfase demasiada na predominância da
racionalidade no processo de construção da etnicidade, em detrimento a outros aspectos
subjacentes ao mesmo, conforme ela sugeriu: “[a] identidade não pode ser exclusivamente
definida, dessa forma, como um fenômeno da mais pura imposição e manipulação externa.
Ou seja, apesar de ser objeto potencial de manipulação ideológica, sem a existência interna
de uma ‘comunidade de sentidos’ toda a construção de identidades e tradições tende a
resultar em um imenso vazio70.”
Embora a observação dessa historiadora mereça ser levada em consideração, com efeito, os
escritos de Cunha dialogando com Cardoso de Oliveira, trouxeram contribuições
inovadoras para a antropologia brasileira. Sobretudo no que concerne a referenciais teórico-
metodológicos indispensáveis, principalmente, para os estudos dos segmentos
populacionais indígenas e negros no meio rural - e mesmo no contexto metropolitano –
conforme se pode verificar através dos inúmeros estudos de comunidades, desenvolvidos
70
Shwarcz, L.K.M. – “Complexo de Zé Carioca – sobre uma certa ordem da mestiçagem e da
malandragem”,1995, p.60.
45
Diferentemente disso, para Stuart Hall os indivíduos na “pós-modernidade” estão cada vez
mais numa posição de “deslocamento” ou “descentramento” identitários: “as identidades
modernas – salienta Hall - estão sendo ‘descentradas’, isto é, deslocadas ou
fragmentadas”72. Esta não seria, porém, uma experiência exclusiva das identidades
emergentes no contexto da “pós-modernidade”; sendo que a intensificação desse fato nos
dias de hoje oferece maior condição para se reavaliar a pertinência do conceito de
identidade e atentar, sobretudo, para o que, na realidade, pode estar em jogo neste processo
de construção ou identificação cultural. Em sendo assim, o aspecto da politização das
afirmações identitárias torna-se um elemento fundamental73.
Stuart Hall procura argumentar que as identidades são construções provisórias, inacabadas
e incompletas. Assim, escreve o autor, “deveríamos falar de identificação, e vê-la como um
processo em andamento. A identidade surge não tanto da plenitude da identidade que já
está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é ‘ preenchida’ a
71
Hall, Stuart – A identidade cultural na pós-modernidade, 1998.
72
Ibidem, p.8.
73
Ibidem, p.21.
46
partir de nosso exterior pelas formas através das quais nós imaginamos ser vistos por
outros”74.
Estas referências teóricas enunciadas acima auxiliam-nos a entender melhor a posição dos
nossos interlocutores, no contexto hodierno em que se torna imprescindível para eles
assumirem a identidade de remanescente de quilombos; tendo claro que ora está em jogo é
a possibilidade ou não de adquirirem do governo do estado paulista o titulo definitivo das
terras tradicionalmente ocupadas75 pelos mesmos. Com efeito, ao evocarmos
anteriormente os estudos sobre a identidade étnica ou etnicidade a intenção é dar idéia das
motivações possíveis que podem levar as pessoas a buscarem em determinada situação
específica, contexto particular e momento chegado da sua vida a afirmar para si esta
modalidade identitária distintiva, bem como os recursos utilizados para garantir a
visibilidade e marcar de maneira valorativa e positivamente a sua diferença em relação aos
“outros”, ou seja - a manipulação de elementos culturais significativos e operacionais,
como é o caso dos chamados “sinais diacríticos”.
Sem com isso, no entanto, querer insinuar que estou interpretando a comunidade
remanescente de quilombo em foco neste relatório como “grupo étnico”. É para evitar essa
possibilidade de apreensão que chamei atenção na presente exposição também para as
reflexões do antropólogo Stuart Hall em torno da problemática da crise de identidades no
contexto da “pós-modernidade”. Válido salientar o que ele escreve: “A etnia é o termo que
utilizamos para nos referirmos às características culturais – língua, religião, costume,
tradições, sentimento de ‘lugar’ que são partilhadas por um povo. É tentador, portanto,
tentar usar a etnia dessa forma ‘fundacional’. Mas essa crença acaba, no mundo moderno,
74
Ibidem, p.39.
75
A propósito desta expressão Alfredo Wagner B. de Almeida esclarece o seguinte: “[...]as terras indígenas
são definidas como bens da União e destinam-se à posse permanente dos índios, evidenciando uma situação
de tutela e distinguindo-se, portanto, das terras das comunidades remanescentes de quilombos, que são
reconhecidas na Constituição de 1988 como de propriedade definitiva dos quilombolas. Não obstante esta
distinção relativa à dominialidade, pode-se afirmar que ambas são consideradas juridicamente como ‘terras
tradicionalmente ocupadas’ seja no texto constitucional ou nos dispositivos infraconstitucionais e enfrentam
na sua efetivação e reconhecimento obstáculos similares. De igual modo são consideradas como ‘terras
tradicionalmente ocupadas’ e enfrentam obstáculos à sua efetivação, aquelas áreas de uso comum voltadas
para o extrativismo, a pesca, a pequena agricultura e o pastoreio, focalizadas por diferentes instrumentos
jurídicos, que buscam reconhecer suas especificidades[...]” ([destaque do autor] Almeida, Terras de
quilombo, terras indígenas..., 2006, p.28.).
47
por ser um mito. [...]. As nações modernas são, todas, híbridos culturais.”76 Isso significa
compreender que as identidades ou processos de identificação também se dão a partir da
articulação com outras referências a partir do exterior e/ou no interior do próprio sujeito –
não obstante as contradições presentes77.
Lembro-me aqui de algumas situações observadas durante o trabalho de campo que servem
para ilustrar o que acabo de escrever. Duas delas estão relacionadas com a identificação das
pessoas da comunidade com o antropólogo. Em primeiro lugar cito o meu contato inicial
com a comunidade. Estava acompanhado da equipe do ITESP e ao descer do carro e ser
apresentado por uma representante desse órgão à coordenadora da “Associação...”, a
mesma exclamou para um grupo de lideranças da comunidade que estavam à porta da
cozinha comunitária, próxima a sede desta entidade: “Então, o antropólogo é um de nós...”.
E todos concordaram com um gesto de aceno de cabeça e um sorriso nos lábios. Num
segundo momento, durante conversa informal – e divertida – com um interlocutor, esse,
depois de desculpar-se pelo “modo de falar”, devido à “falta de estudo”, indagou-me de
repente:“Ôh Rubens... ‘ocê também é descendente de quilombola, não é?!”78.
Outra situação que me chamou atenção foi o contexto de conversa descontraída entre
algumas pessoas que iriam participar do “mutirão” para plantação de roça da representante
da “Associação...”. Uma pessoa, em tom de brincadeira, disse algo mais ou menos assim:
“para ser quilombola precisava ser negro”. A coordenadora reagiu de modo inesperado ao
gracejo, repreendendo de maneira enfática o falante: “É bom parar com estas ‘brincadeiras’
de quilombo ser formado só por negro. Têm muita gente branca que mora aqui; chega
desses um aí e vai sentir que está sendo discriminado. O quilombo é de todos associados;
não importa se é branco ou negro!”.
76
Ibidem, p.62.
77
Conforme bem esclarece esta citação de Stuart Hall: “[...] A identidade [é] definida historicamente, e não
biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são
unificadas ao redor de um ‘eu’ coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em
diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas”. (Hall,
ibidem, p.13.).
78
Acrescentando de passagem a minha reação. Respondi de maneira humorada que “sim!”; mas só não sabia
onde ficava as terras... E rimos junto, o interlocutor e eu.
48
Por fim, a expressão de uma certa crise de identidade presente na fala da coordenadora da
“Associação...” durante conversa informal com o antropólogo em um final de tarde: “eu sou
remanescente de quilombo, mas só pelo lado materno...”.
79
É inovadora e crescente o debate em torno desta categoria no campo das ciências sociais, particularmente
destacando o cenário da antropologia. Entre as principais referencias a frente desta discussão acadêmico-
científica destaca-se o NAPEDRA – Núcleo de Antropologia da Performance e do Drama, da Universidade de
São Paulo/USP.
49
principais de origem são os três ancestrais relembrados: Miguel de Pontes Maciel, Benedito
Rodrigues de Paula e Pacífico Morato de Lima.
- Capítulo VI -
É com base nesse trabalho de pesquisa antropológica intensivo que se tornou possível
comprovar a origem quilombola da Comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca. Ficou
demonstrado que quase a totalidade das famílias que formam esta comunidade é
descendente de ex-escravos, a repetir aqui os nomes de Pacífico Morato de Lima, Benedito
Rodrigues de Paula e Miguel de Pontes Maciel. Esse último descrito como filho de um
escravo que se tornou livre ao ser abandonado na região pelo seu senhor, quando esse
decidiu partir para Minas interessado no empreendimento da mineração aurífera, naquelas
paradas. É com orgulho, pois, que os mais velhos da comunidade relembram os nomes
destes ancestrais para os filhos e netos, com a esperança, talvez, que eles guardem a
imagem vivificada destes antepassados memória e como referência exemplar da maneira de
ser e agir no mundo indiferente aos obstáculos que a vida oferece.
Esta memória ainda viva dos antepassados, com certeza, foi o que fortaleceu o ânimo e deu
coragem para as lideranças atuais da “Associação das Comunidades Remanescentes dos
Quilombos dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca” insistirem na organização e registro
dessa entidade sem fins lucrativos. Um passo importante e significativo para eles
manifestar decididamente a intenção e o desejo emergente de valorizar a sua diferença
histórica e social, como indivíduo e coletividade rural, e, desse modo, afirmar
positivamente e fazer reconhecida a especificidade da sua identidade étnica.
51
É com ênfase nesta afirmação identitária étnico-quilombola, portanto, que neste Relatório
Técnico-Científico sustenta-se o argumento de que é justa a reivindicação feita pela
Comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca ao governo paulista - e direito incontestável da
mesma – a obtenção do título definitivo de propriedade dos 3.601, 80 hectares,
aproximadamente, da terra tradicionalmente ocupada no município de Barra do Turvo,
localizado no alto do Vale do Ribeira.
80
Vide nota de rodapé n.1.
52
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ALMEIDA, Alfredo Wagner B de – “Os quilombos e as novas etnias”. In.: Leitão (org.)
Direitos territoriais das comunidades negras rurais. São Paulo, Instituto Sócio-
Ambiental, 1999.
ANDRADE, Tânia et alli (eds) – [2ª ed.] Negros do Ribeira: reconhecimento étnico e
conquista do território – São Paulo: ITESP; Páginas e Letras – Editora gráfica
(Cadernos do ITESP; 3), 2000.
COHEN, Abner - Custom and politics in urban africa : a study of hausa migrants in
yoruba towns. [1ª.ed.1969]London: Routledge & Kegon Paul, 1974.
OLIVEIRA, Roberto Cardoso de - Identidade, etnia e estrutura social. São Paulo: Livraria
Pioneira Editora, 1976.
SILVA, Aracy Lopes da - Nomes e amigos: da pratica xavante a uma reflexão sobre os je.
São Paulo: FFLCH/USP, 1980 (Tese de Doutorado).
Internet:
- Diagrama de Parentesco -
O diagrama de configuração da genealogia de parentesco que será apresentado mais abaixo
foi elaborado com a finalidade única e exclusiva – e não mais que isto – de indicar quais
são as famílias que possuem vinculo direto de parentesco com os ancestrais reconhecidos
como fundadores dos povoados rurais de Ribeirão Grande e Terra Seca.
Válido mencionar, ainda, que juntamente com a atividade descrita neste segundo momento,
também foi feito levantamento dos pontos de referencia da área ocupada, com o recurso de
GPS operado pelo geógrafo da equipe, Rogério G. Gama. Todo o trabalho deste segundo
momento foi acompanhado de perto pelo técnico do ITESP, Luiz Baeta∗, representante do
“G.T.C. Formação-Pariquera-Açu”.
∗
A quem agradeço imensamente a generosa colaboração neste e outras situações do trabalho de campo.
57
portanto, poder gozar de todos direitos bem como usufruir as garantias oferecidas por esse
documento legal.
Enfim, a legenda que segue abaixo ajudará o leitor a decifrar os códigos e a entender
melhor a exposição feita e o que está sendo dito através das figuras geométricas e cores
constitutivas deste diagrama de parentesco.
58
LEGENDA
REFERENTE SÍMBOLO
Independe do sexo
Feminino
Masculino
Filiação
Separação
Viuvez
Irmãos
Pessoa falecida
Faltou Informação ?
Famílias Cores
Família de Miguel]
Pontes Maciel
Família de Benedito
Rodrigues de Paula
Família de Pacífico
Morato de Lima
Agregados
Trabalhando fora
(1)
Joaquim
de
Pontes
Maciel
? ?
Paulo Frausminda Luciano Maria Pedro Joana Geraldo Antônia Sebastião Bernardino
(Referências ancestrais)
Miguel Benedito R. P
1 2 3 4 5
(1º.Geração) 6
(Referência ancestral)
Sebastiana Dias
(1º.Geração)
(2)
- Casa 1 -
Referência : Angelina Pontes Maciel
Viuva.
Gonçalo 5 Angelina
..............................................................................................................................................................................................................
(3)
- Casa 2 -
Referência: Anízia de Pontes Morato
Viúva.(?).
?
7 Anisia
14 Sebastiana 15 16
13
Aparecida André Marcia
15 Jéssica
(4)
- Casa 3 -
Referência: Alexandra de Lima.
Viúva.
17
Francisco 18 Ana
19 Alexandra
20 21 22 23 24
Jandira Aristide Natair Josefir Rosana
..............................................................................................................................................
(5)
Referência: José Morato Pontes de Lima.
9 José
...................................................................................................................................................
(6)
Referência: Renato Rodrigues dos Santos.
Cônjuge: Balbina Belemer.
...................................................................................................................................................
62
(7)
- Casa 6 -
Referência: José Pedroso.
Cônjuge: Alcina de Moura.
27 28
José Alcina
29 30 31 32 33 34 35 36 37
Mário Rosa João Doriti Tereza Antonio Rafael Maurício Santina
...................................................................................................................................................
(8)
38 José
...
................................................................................................................................................(
63
9)
Referência: Camilo Pontes Maciel.
Cônjuge: Maria Rosa.
- Casa 8 -
Bernardo Rosa
M. Rosa
39 40 41 42 43 44
55 56 57 ? 58 59 60 ? 61
Tairis Ramon Mateus Felipe Marcelo
Obs.:
58 – Mateus: aos cuidados dos avós.
..................................................................................................................................
(10)
Referência: Luiz Rodrigues dos Santos
Cônjuge: Maria José dos Santos
- Casa 9 -
62 63
Luiz Maria
...................................................................................................................................................
64
(11)
Referência: Renato Rodrigues dos Santos
Cônjuge: Balbina Belemer
- Casa 10 -
64 65
Renato Balbina
...................................................................................................................................................
(12)
- Casa 11 -
Referência: Antenor Lemos dos Santos.
Cônjuge – Roseli Aparecida Maciel dos Santos.
66 67
Antenor Rosely
72 73 74
68 69 70 71
Silvia M. Lourdes Sheila Renata Cristian Talia Ray
...................................................................................................................................................
65
(13)
- Casa 12 -
Referência: Abraão de Pontes Maciel.
Cônjuge – Osminda Lemes dos Santos Maciel.
42 75
Abraão Osminda
87 88 89 90 91 92 93 94
? ? ? ? ? ? Lucas
?
...................................................................................................................................................
(14)
- Casa 13 -
95
Francisca
...................................................................................................................................................
(15)
Referência: Miguel dos Santos.
Cônjuge: Isabel de Fátima Vieira.
- Casa 14 -
96 97
Miguel Isabel
98
?
...............................................................................................................................................
66
(16)
- Casa 15 -
Referência: José Pereira de Freitas.
Cônjuge – Joana de Freitas.
99 100
José Joana
105 Lucas
...................................................................................................................................................
(17)
- Casa 16 –
Referência: Alcides Xavier Rocha.
Separado.
Manoel Clara
Marines
106 107 108 109 110
111 112
Cristina Izaque
.............................................................................................................................................
67
(18)
- Casa 17 -
Referência: Pedro Gonçalves Pedroso.
Viúvo.
BeneditoRP
PedroGP
Josefa P. Maria XR
Benedito Benedita
Wanderley Rudney
116 117 118 119 120
Zeneide Creide Dolíria
..................................................................................................................................................
(19)
- Casa 18 -
Referência: Zeneide Xavier Pedroso.
Cônjuge – Wanderley Rodrigues de Paula.
116 117
Zeneide Wanderley
121 122
Reroldy Meireane
...................................................................................................................................................
68
(20)
- Casa 19 -
Referência: Francisca Xavier da Rocha Pontes.
Cônjuge – Eduardo da Rocha Pedroso.
Manoel Clara
124 123
Eduardo Francisca
126 Edralf
130
Tainar
...................................................................................................................................................
(21)
- Casa 20 -
Zenilta da Costa Pedroso.
Cônjuge – Edralf Gonçalves.
125 126
Zenilta Edralf
130
Tainar
.................................................................................................................................................
(22)
Referência: Dasil
Cônjuge: Anilda de Paula Pereira.
Dasil Anilda
...................................................................................................................................................
69
(23)
- Casa 22 -
133 134
Vitório Paula
...................................................................................................................................................
(24)
Referência: Dona Nena.
Dona Nena
...................................................................................................................................................
(25)
Referência: Inocêncio.
136
Inocêncio
...................................................................................................................................................
(26)
Referência: Lucia Rute Pereira de Paula.
Cônjuge: Sebastião de Paula.
- Casa 25 -
137 138
Sebastião Luci
...................................................................................................................................................
70
(27)
...................................................................................................................................................
(28)
Casa 27
Referência: Juvenal de Lima.
Cônjuge – Genir de Paula Pereira.
1
Francisco Ana Dias
Obs.
148 – Aparecida: Bisneta do Pacifico Morato de Lima.
155 – Zenaide: Bisneta de Miguel de Pontes Maciel.
.........................................................................................................................................
71
(29)
Casa 28
Referência: Antônio de Paula.
Conjuge Zenaide Batista Moreira.
177 178
Antônio Zenaide
179 180
Jeferson Carlos
...................................................................................................................................................
(30)
Referência: Nadir Ursolino de Moura.
- Casa 29 -
181
Nadir
...................................................................................................................................................
(31)
Referência: Francisco França de Lima.
.................................................................................................................................................
(32)
Referência: Luis Dantas.
...................................................................................................................................................
72
(33)
- Casa 32 -
Referência: Zenóbio Pereira da Cruz.
Cônjuge – Conceição
184 185
Zenobio Conceição
...................................................................................................................................................
(34)
- Casa 33 -
Referência: Waldomiro de Lima.
Cônjuge - Claresdina Alves dos Santos.
186 187
Valdomiro Claresdina
Obs.
189 - Levi: filho de Camilo
(35)
Casa 34
Referência: Eva Rodrigues Barbosa.
Viuva.
João Francisca
Gentil Eva
(36)
- Casa 35 -
Referência: Marinelma Rodrigues de Paula. –
Cônjuge - Cláudio Ursulina de Moura.
José Maria
214 213
Claudio Marinelma
215 216
Cláudia Alisson
...................................................................................................................................................
74
(37)
Referência: Lauredir Pereira.
Cônjuge: Esmanilda da Costa Pedroso.
- Casa 36 -
217 218
Lauredir Esmanilda
...................................................................................................................................................
(38)
Referência: Maria.
?
Maria
..................................................................................................................................................
(39)
- Casa 38 -
Referência: Doliria Rodrigues de Paula.
Cônjuge – Daucides Marques Reis.
José Maria
220 219
Daucides Dolíria
228 229
? Wende
...................................................................................................................................................
75
(40)
Referência: Gabriel de Paula.
Cônjuge: Oracilda.
- Casa 39 -
230 231
Gabriel Oracilda
...................................................................................................................................................
(41)
- Casa 40 -
Referência: Reinaldo Rodrigues de Paula.
Cônjuge – Maria do Carmo.
Simão Maria
Reinaldo
232 233
Maria
237
234 235 236 ? Helio
238
Zenilta Zenilda Regina
(42)
Referência: Zenilda Rodrigues de Paula
Cônjuge:
- Casa 41 -
241 242
? Zenilda
...................................................................................................................................................
76
(43)
Referência: Regina Rodrigues de Paula
Cônjuge: Hélio
- Casa 42 -
243 244
Hélio Regina
...................................................................................................................................................
(44)
Referência: Laudimir Marques Reis.
Cônjuge: Aurora Pereira.
244 245
Laudimir Aurora
...................................................................................................................................................
(45)
- Casa 44 -
Framcisco Ana
262
?
Obs.:
250 – Lauredir: filho de José de Pontes/Casa 43.
(46)
- Casa 45 -
Referência: Vanilda Aparecida dos Santos.
Cônjuge – Antonio de Paulo.
264 263
Antônio Vanilda
265 266
Gilson Cristiane
Obs.:
264 – Antônio: vínculo de parentesco nas casas 27, 28, 29.
................................................................................................................................................
(47)
- Casa 46 -
Referência: Maria Aparecida Santos.
Cônjuge – Augusto de Souza Santos.
268 267
Augusto Maria
269 Vanilda Jânea Arlete 272 Daniel 274 Natael Josiel Heloisa Rafael José
280 281
Ricardo Janaina
Obs.:
267 – Maria: filha de Sebastiana 6 (Casa 47).
.............................................................................................................................................
78
(48)
- Casa 47 -
Referência: Sebastiana Rodrigues de Paula.
Viúva.
Benedito GP 6 Sebastiana
...............................................................................................................................................
(49)
- Casa 48 -
Referência: Arlete Aparecida Souza Santos.
Cônjuge – Jose Pedro dos Santos.
286 285
José Arlete
Obs.:
Joaquim Nadir
...................................................................................................................................................
79
(51)
Referência: Zacarias Lima França.
292
Zacarias
...................................................................................................................................................
(52)
293
Ednéia
...................................................................................................................................................
(53)
Cláudia Lima.
Claudia
.........................................................................................................................................
(54)
Referência: Delmira Pereira da Cruz da Rocha.
Cônjuge – Mauro Xavier da Rocha.
- Casa 53 -
296 295
Mauro Delmira
297 298
Vinicius Vanessa
Obs.
295 – Delmira: filha de Zenóbio 184 (Casa 32).
(55)
- Casa 54 -
Referência: Jaldir de Pontes Maciel.
Cônjuge – Nadir Ursulina de Moura.
2
Antônio Madalena
298 299
Jaldir Nadir
.
301 Santino 306 307
303 304 305
300 302
Alessandra Luís Ana Daniele Tatiane Luis F.
Obs.
299 – Nadir : filha de Joana (mora no Cedro e é neta do Pacífico Morato de Lima).
Oswaldo Paulina
(57)
- Casa 56 -
Referência João Miguel.
Cônjuge – Maria de Paula.
2
Antônio Madalena
313 314
João Maria
.
..................................................................................................................................................
(58)
- Casa 57 -
Referência: Izaíra Pontes Maciel.
Viúva.
43 Izaíra
Pedro Odair
Obs.:
315 – Rosa: filha de Alcina (mãe mora no Cedro/bisneta do Pacífico M. de Lima).
.................................................................................................................................................
82
(59)
- Casa 58 -
Referência: Marilda Pontes Pereira.
Cônjuge – Ednelson Alves Martins.
321 327
Marilda Ednelson
328 Mariela
..................................................................................................................................................
(60)
- Casa 59 -
Referência: Nilce de Pontes Pereira.
Cônjuge - Oscar Rodrigues Santos.
318 329
Nilce Oscar
...................................................................................................................................................
83
(61)
- Casa 60 -
Valfrido de Pontes Maciel.
Cônjuge - Paulina Pontes Salgado.
335
José Elisa
336
Valfrido 337 338
Valdivino
Paulina
340 ? 341 Eva 343 Waldir 344 Saito 346 347 348
339 349
Elói 342 Rosineia Célia 345 Silvano Waldemir Zélia Versita
Roseli
353 - Kalis;354 - Keteler; 355 - Patrich; Andréia – 356: aos cuidados dos avos.
(62)
Referência: Oriel Pontes Pereira
Cônjuge: Rosa Rodrigues Morato
- Casa 61 –
314 315
Oriel Rosa
(63)
Referência: Reinaldo Batista Moreira.
Cônjuge: Maria Lúcia Moreira.
- Casa 62 -
359 360
Reinaldo Maria L.
...................................................................................................................................................
(64)
Referência: Domingos Pereira da Silva.
- Casa 63 –
361
Domingos
...................................................................................................................................................
(65)
- Casa 64 –
362 363
Sebastião Ivanilda
...................................................................................................................................................
85
(66)
Referência: Natalio Rosa.
Cônjuge: Liversina Barbosa Santos Rosa.
- Casa 65 –
364 365
Natálio Liversina
...................................................................................................................................................
(67)
Referência: Abraão de Pontes Maciel.
Cônjuge: Osminda Lemes dos Santos
- Casa 66 –
42 75
Abraão Osminda
...................................................................................................................................................
(68)
Agamenon
...................................................................................................................................................
(69)
Referência: Luiz Cardoso.
367
Luiz
...................................................................................................................................................
86
(70)
Referêcia: Moacir Belemer.
368
Moacir
(71)
Referência: Antenor Lemes dos Santos.
Cônjuge: Roseli Aparecida Maciel dos Santos.
Antenor Aparecida
...................................................................................................................................................
(72)
Referência: Pedro Ferreira Belemer.
Cônjuge: Francisca Soares de Lima.
- Casa 71 –
371 372
Pedro Francisca
................................................................................................................................................
(73)
Referência: Sebastião Belemer.
Cônjuge: Vanilda Rodrigues de Jesus da Cruz.
- Casa 72 –
373 374
Sebastião Vanilda
..................................................................................................................................................
87
(74)
Referência: Claudemir Belemer.
Cônjuge: Lauredir Belemer.
- Casa 73 –
375 376
Claudemir Lauredir
...................................................................................................................................................
(75)
Referência: Valdomiro de Lima.
Claresdina Alves dos Santos.
- Casa 74 –
377 378
Valdomiro Claresdina
...................................................................................................................................................
(76)
- Casa 75 -
379 380
Alessandra Santino
381
Leticia
.................................................................................................................................................
(77)
- Casa 76 - 381
Ana
88
382 Marco
..................................................................................................................................................
(78)
- Casa 77 -
383 384
Tatiane ?
385 Rian
89
- Lista de Associados∗ -
01 - Abraão de Pontes Maciel 49 - Luis Carlos de Moura
02 - Adriano Aparecido dos Santos 50 - Lauredir Belemer
03 - Alcides Xaviel da Rocha 51 - Luis Rodrigues dos Santos
04 - Alcina de Moura 52 - Maria Alves Belemer Dias
05 - Alexandra Aparecida Maciel 53 - Maria Aparecida de Lima
06 - Alexandra de Lima 54 - Maria Aparecida dos Santos
07 - Ana Rosa Maciel 55 - Maria do Socorro Sampaio
08 - Ângela Maria Maciel 56 - Maria José dos Santos
09 - Angelina de Pontes Maciel 57 - Maria Lucia Moreira
10- Anísia Pontes Morato 58 - Miguel dos Santos
11 - Antenor Lemes dos Santos 59 - Miguel dos Santos Júnior
12 - Antônio de Paula 60 - Nadir Ursulino de Moura
13 - Antônio Miguel 61 - Nair Rosa dos Santos
14 - Aristide de Paula (?) 62 - Natanael de Souza Santos
15 - Augusta Souza Santos 63 - Nilce de Pontes Pereira
16 - Áurea Alves dos Santos 64 - Nilton Pereira da Cruz
17 - Camilo Pontes Maciel 65 - Oriel Belemer
18 - Carmelina de Lima 66 - Oscar Rodrigues dos Santos
19 - Cícero Adriano de Paula 67 - Osminda Lemes dos Santos
20 - Claresdina Alves dos Santos 68 - Osvaldo Alves Belemer
21 - Claudemir de Pontes Maciel 69 - Paulino Pontes Maciel
22 - Cleide da Rocha Pedroso 70 - Pedrina de Pontes Lima Américo
23 - Cleuza Aparecida dos Santos 71 - Pedro Gonçalves Pedroso
24 - Daniel de Souza 72 - Regina Rodrigues de Paula
25 - Darcir Rodrigues dos Santos 73 - Reinaldo Batista Moreira
26 - Delmiro Pereira da Cruz 74 - Rosana Batista Moreira
27 - Dimas Morato de Lima 75 – Sebastiana Rodrigues de Paula
28 - Doliria Rodrigues de Paula 76 - Sebastião Belemere
29 - Edi Carlos Pedroso 77 - Valdivino de Pontes Reis
30 - Eliza Marques dos Reis 78 - Vanderci Belemer
31 - Elzita dos Santos Moura 79 – Valdomiro de Lima
32 - Esmanilda Aparecida de Lima 80 - Valerino de Lima
33 - Esmanildo da Costa Pedroso 81 - Valfrides de Pontes Maciel
34 - Francisca Xaviel da Rocha Pedroso 82 - Vanildo A. Souza Santos Paulo
35 - Isaíra de Pontes Maciel 83 - Valdinei Dias Belemer
36 - Ivanildo Rodrigues de Jesus da Cruz 84 - Zenaide Batista Moreira
37 - Jaldir de Pontes Maciel 85 - Zeneide Maciel dos Santos
38 - Jandira dos Santos Maciel Reis 86 - Zeneide Xavier da Rocha
39 - Jane Aparecido Souza Santos 87- Zenilda Rodrigues de Paula
40 - João Belemer 88 - Zenillto Rodrigues de Paula
41 - João Miguel 89 - Zenóbio Pereira da Cruz
42 - José Pereira de Freitas
43 - José de Pontes Maciel
44 - Juvenal de Lima
45 - Ivanildo de Pontes Maciel
46 - Leonel de Pontes Pereira
47 - Leversino Barbosa dos Santos Rosa
48 - Luciana Batista Moreira
∗
Informação fornecida por Nilce Pereira - Coordenadora da “Associação dos Remanescentes dos Quilombos
dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca – Municipio de Barra do Turvo/SP”.
90
Documentos Anexos
91
Ata de Assembléia
(“Ata da Assembléia Geral Extraordinária para ‘Constituição e Fundação” e
‘Aprovação do Estatuto Social’ da Associação dos Remanescentes de Quilombo dos
bairros Ribeirão Grande e Terra Seca)
92
∗
Agradecemos a colaboração do “Instituto Florestal/Secretaria do Meio Ambiente” e da “PPI - Procuradoria
do Patrimônio Imobiliário” pela liberação de material técnico (mapa e foto aérea anexados).
93
Registro de Imóveis
94