Você está na página 1de 95

1

I - INTRODUÇÃO –

Este Relatório Técnico-Científico1 consiste numa fonte de documentação antropológica que


pretende oferecer subsídios indispensáveis à tramitação do processo para obtenção do título
definitivo da propriedade da terra ora reivindicada por moradores dos bairros Terra Seca e
Ribeirão Grande, pertencente ao município de Barra do Turvo - localizado na região do alto
Vale do Ribeira. Trata-se de uma comunidade tradicional que se auto-reconhece como
remanescente de quilombo e está empenhada atualmente não apenas em afirmar-se como
portadora da identidade afro-descendente e a origem quilombola, mas também ter
reconhecido pelo governo do estado de São Paulo, o seu justo direito de permanecer na
terra ocupada desde o passado pelos seus ancestrais e, porquanto, receber o título definitivo
de propriedade da mesma. Reivindicação que está de acordo com o Artigo 68 do Ato das
Disposições Transitórias instituída pela Constituição Federal de 1988, que diz: “Aos
Remanescentes das Comunidades de Quilombos que estejam ocupando suas terras é
reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado, emitir-lhes os respectivos títulos”2.

Esclareço logo de início que ao apropriar-me aqui da expressão “comunidade tradicional”


estou fazendo uso de uma noção antropológica, cujo significado pretende evocar a idéia de
agrupamento familiar ou pessoa individual que embora não possua documentação escrita
que comprove a posse indiscutível de determinada área territorial, onde se encontra
estabelecido e reivindica direito à propriedade, está vinculada desde as origens mais
1
A criação desta categoria de investigação denominada Relatório Técnico Científico, bem como os
parâmetros que o norteiam, são resultantes dos esforços do Grupo de Trabalho criado pelo Governo do Estado
de São Paulo por meio do Decreto n. 40.723, de 21 de março de 1996, que tinha por objetivo fazer
proposições visando a plena aplicabilidade dos dispositivos constitucionais conferentes do direito de
propriedade aos remanescentes das comunidades de quilombos em território paulista. Foi integrados por
representantes da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, Instituto de Terras do Estado de São Paulo
“José Gomes Silva”, Secretaria do Meio Ambiente, Procuradoria Geral do Estado, Secretaria de Governo e
Gestão Estratégica, Secretaria de Cultura, Conselho de Defesa do patrimônio Histórico, Arqueológico,
Artístico e Turístico, Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra no Estado de Sã
Paulo, Subcomissão do Negro da Comissão de Direitos Humanos da ordem dos Advogados do Brasil –
Secção São Paulo e Fórum Estadual de Entidades Negras. Os trabalho deste Grupo levaram à criação: a) do
Programa de Cooperação Técnica e Ação Conjunta para identificação, discriminação e legitimação de terras
devolutas do Estado ocupadas por remanescentes de comunidades de quilombos visando sua regularização
fundiária, implantado medidas sócio-econômicas, ambientais e culturais e b) de um Grupo Gestor para
implementação do Programa. O Programa e o Grupo Gestor foram criados por meio do decreto n. 41.774 de
13 de maio de 1997.
2
Cf.: Andrade, Tânia et. alli.(edts) - Negros do Ribeira: reconhecimento étnico e conquista do território,
2000, p. 3.
2

remotas ao lugar. Em síntese, o lócus espacial onde os antepassados habitaram,


trabalharam, criaram família e formaram rede extensiva de parentesco.

Da mesma perspectiva, o termo “quilombo” é empregado no contexto deste relatório com


sentido mais abrangente e atualizado no campo das ciências humanas e sociais. A partir de
inúmeras reflexões e debates ocorridos no decorrer dos anos 1990, compartilhados por
cientistas sociais, historiadores, intelectuais e militantes de movimentos negros em torno da
noção de “quilombo”, buscou-se reavaliar criticamente o emprego dessa categoria e
redefinir o sentido conceitual da sua aplicação no campo das ciências humanas e sociais;
levando-se em consideração, sobretudo, o aspecto da diversidade das formas da
organização social, dos estilos de vida, das alternativas criadas para a sobrevivência, das
práticas culturais e simbólicas relacionadas aos diferentes tipos de agrupamento familiar -
rural ou urbano - formado por ex-escravos africanos e os seus descendentes no contexto
histórico da sociedade brasileira. Conforme nos esclarece o antropólogo Wagner de
Almeida3:
Os primeiros estudos levaram a uma referência histórica do período colonial.
Quase todos os autores consultados, do presente ou do passado – desde o
clássico de Perdigão Malheiro, A escravidão no Brasil: ensaio histórico,
jurídico, social, que é de 1866, até os recentes trabalhos de Clóvis Moura, de
1996 -, trabalhavam com o mesmo conceito jurídico-formal de quilombo, um
conceito que ficou, por assim dizer, frigorificado. Esse conceito, composto
de elementos descritivos, foi formulado como uma ‘resposta ao rei de
Portugal’ em virtude de consulta feita ao Conselho Ultramarino, em 1740.
Quilombo foi formalmente definido como ‘toda habitação de negros fugidos,
que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos
levantados e nem se achem pilões nele’.

Ao discutir sobre a apropriação do “conceito jurídico-formal de quilombo” por


reconhecidos estudiosos da história da escravidão negra no Brasil Almeida4 procurou
sintetizar cinco elementos básicos que ele observou estarem contidos na definição mais
popularizada dessa categoria descritiva: 1 – fuga: noção de “quilombo vinculada a escravos
fugidos”; 2 – versão que todo “quilombo comportaria uma quantidade mínima de fugido”;
3 – “isolamento geográfico” dos quilombos e sempre localizados em local de difícil acesso;

3
Cf.: Almeida, Alfredo Wagner B. de – “Os quilombos e as novas etnias”, 2002, p 47.
4
Ibidem, p.48.
3

4 – sugestão de “rancho” instalado; 5 – consideração da “premissa”: ‘nem que achem pilões


nele’, significando, no contexto em questão, “símbolo do autoconsumo e da capacidade de
reprodução”.

Esta descrição de “quilombo”, apoiada quase exclusivamente numa acepção conceitual -


jurídico-formal – antiga, compreende-se hoje que é bastante restrita e não permite a
apreensão fidedigna desta realidade histórica em toda sua complexidade e nuanças. Com
efeito, pesquisas de campo - vinculadas principalmente à produção de laudos
antropológicos – contribuem hoje para demonstrar que os quilombos variaram no aspecto
enquanto modelo organização social e tipo de relacionamento com a sociedade envolvente,
como esclarece Bandeira e Dantas5: “A palavra quilombo, portanto, não se refere apenas a
esconderijo de escravos fugidos. Essa era a acepção dada ao termo pelos colonizadores. A
palavra quilombo origina-se etimologicamente da língua africana quimbundo, em que a
palavra kilombo tem, entre outros, significados de povoação, união.”

A partir de reflexões teóricas como as enunciadas acima, baseadas em pesquisas de campo


e tendo como preocupação central a problemática da demarcação de terras das chamadas
populações ou povos tradicionais – negras ou indígenas – é que a comunidade
antropológica discutiu e propôs - em reunião da Associação Brasileira de Antropologia
[ABA ] – a seguinte definição conceitual:
O termo Remanescente de Quilombo (destaque do autor), conforme
deliberado pela ABA – Associação Brasileira de Antropologia, em encontro
realizado nos dias 17 e 18 de outubro de 1.994, no Rio de Janeiro, embora
tenha um conteúdo histórico, designa ‘hoje a situação presente dos
segmentos negros em diferentes regiões e contextos e é utilizado para
designar um legado, uma herança cultural e material que lhe confere uma
referência presencial no sentimento de ser e pertencer a um lugar e a um
grupo específico6.

Esta citação é sugestiva, inclusive, quanto à importância de se atentar para as marcas


simbólicas que os sujeitos interlocutores evocam para afirmar a sua diferença como pessoa
e coletividade - o que está sendo dito, as sutilezas das respostas, as narrativas tecidas sobre
5
Bandeira, M de L. e Dantas, T. de V. S. – “Furnas de Dionísio (MS)”, 2002, p.217.
6
Informação repassada ao ITESP em 1995, por José Milton Garcia, da Procuradoria do Patrimônio
Imobiliário de São Paulo, através de ofício. Cf: Andrade, Tânia et. alli.(edts), Op. Cit., 2000, p. 7.
4

as origens e representações do próprio “eu” devem ser consideradas e levadas a sério pelo
antropólogo. Compreendendo isso é que no processo de produção deste Relatório Técnico-
Científico procurei de maneira sistemática e rigorosa, levantar informações concernentes às
origens da comunidade, às relações sociais e simbólicas, ao estilo de vida e sobre
genealogias de parentescos; entre outros dados que julguei também ter importância para a
compreensão um pouco melhor da realidade dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca - a
evocar o passado e o presente -, bem como colocar em evidência a intenção e o desejo dos
moradores locais de afirmarem a identidade delas como remanescentes de quilombos.
Oportunidade que surge para elas neste momento valioso em que o “Instituto de Terras do
Estado de São Paulo – ITESP” está empenhado em cumprir com o dever que é da
competência desse órgão: “promover a identificação e demarcação das terras ocupadas por
remanescente das comunidades de quilombos, para fins de regularização fundiária”7.

Isto posto, gostaria apenas de enfatizar que este Relatório Técnico-Científico é fruto de um
trabalho de pesquisa antropológica intensiva, realizada junto às comunidades
remanescentes dos quilombos dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca, dentro de um
período de aproximadamente quatro meses8. Este trabalho antropológico possibilitou o
levantamento de dados significativos para a produção, na íntegra, deste Relatório Técnico-
Científico que se apresenta estruturado em 6 capítulos.

7
Este compromisso diz respeito ao “Inciso IV do artigo 3º. Da Lei Estadual n.10.207/99”
Cf.Edital de Pregão n.20/2006; Processo n.0630/2005 – anexo IV(Memorial Descritivo).
8
O trabalho consistiu das seguintes atividades: a) levantamento e consulta documental junto ao ITESP e na
comunidade (leituras de mapas com o auxilio – e a quem agradeço a generosidade - da funcionária do ITESP ,
Maria Ignês Mariconde -, consulta a certidões de cartório, denúncia policial, etc); b) consulta bibliográfica
(leituras de publicação e Relatórios Técnicos-Científicos diversos produzidos junto ao ITESP, entre outros
artigos e livros que seguem na “Referência Bibliográfica” deste trabalho.); e, c) pesquisa de campo
propriamente dito, que compreendeu: c.1 - visitas esporádicas à comunidade (com permanência in locu por
períodos que variaram entre quatro dias ou uma semana); c.2 - observação direta da vida cotidiana; c.3 -
entrevistas gravadas com pessoas mais velhas e lideranças locais e que possibilitou o registro da história oral;
c.4 - conversas informais com diferentes interlocutores e que tanto contribuíram para acrescentar informações
sobre o passado da comunidade, quanto fornecer esclarecimentos sobre a realidade atual (com destaque para
as dificuldades enfrentadas na vida cotidiana, situações de conflito, e as alternativas criadas na tentativa de
superá-las), além de permitir a apreensão do imaginário social e as formas de representação dos sujeitos
interlocutores enquanto pessoa e coletividade; c.5 – entrevista dirigida com responsáveis da família para
levantamento de informações sobre genealogia de parentesco; c.6 – visita domiciliar para conferir e/ou
complementar de dados sobre genealogia de parentesco; c.7 – acompanhamento direto do trabalho geográfico
de localização dos pontos referenciais – com recurso de GPS – de configuração da área ocupada pela
comunidade (casas, roças, engenhos etc).
5

Em síntese, o primeiro compreende-se por esta Introdução. Já o segundo capítulo – “A


localização geográfica das comunidades remanescentes de quilombos dos bairros Ribeirão
Grande e Terra Seca” -, trata-se de uma abordagem mais historiográfica, com destaque, na
primeira seção, para o processo de ocupação do Vale do Ribeiro. Na segunda seção a
exposição gira em torno do surgimento do município de Barra do Turvo, os aspectos
sociais, econômicos e político dessa localidade no passado.

O terceiro capítulo é dedicado exclusivamente à discussão sobre a história dos povoados


remanescentes de quilombos Ribeirão e Grande Terra Seca. A partir da oralidade procuro
destacar os nomes de personagens e descrever a aventura empreendedora dos ancestrais que
deram origem a estes povoados rurais.

A abordagem do quarto capítulo é centrada no contexto do presente. A exposição gira em


torno das condições de vida e existência das pessoas de Ribeirão Grande e Terra Seca. A
dinâmica das relações sociais, as formas de cooperação, situações de conflito, as formas de
representação e práticas simbólicas são mencionadas neste capítulo.

Já no quinto capítulo procurei desenvolver ao longo do mesmo uma discussão sucinta em


torno do conceito de identidade étnica. A tentativa foi de prestar certo esclarecimento ao
leitor sobre a aplicação desta categoria analítica no campo das ciências sociais e as críticas
suscitadas em torno da mesma. Em certo sentido, a proposta do capítulo é repensar noção
de identidade étnica considerando as reflexões teóricas mais recentes, focadas na questão
da crise das identidades no contexto atual da chamada “pós-modernidade”. A relevância do
assunto tratado neste capítulo explica-se, principalmente, pela centralidade desta noção -
identidade étnica - no contexto das discussões em torno da problemática da demarcação e a
concessão, pelo Estado, do titulo definitivo de propriedade das terras tradicionalmente
ocupadas9 pelas comunidades remanescentes de quilombos (e indígenas) no Brasil.

9
A propósito de uma discussão mais aprofundada sobre a noção de “terras tradicionalmente ocupadas” a
referência sugerida é Almeida, Alfredo Wagner B. de – Terras de quilombo, terras indígenas e fundos de
pasto: terras tradicionalmente ocupadas, 2006.
6

E como não poderia deixar de ser, o último capítulo - o sexto – consiste na conclusão final
deste Relatório Técnico-Científico.
7

- Capítulo II -

A LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DAS COMUNIDADES REMANESCENTES DE


QUILOMBOS DOS BAIRROS RIBEIRÃO GRANDE E TERRA SECA.

A – O Vale do Ribeira -

A região do Vale do Ribeira fica localizada entre os Estados de São Paulo e Paraná; sendo
compreendido por uma extensa faixa territorial que abrange desde municípios no entorno
da capital paulista até os limítrofes de Curitiba. E pelo litoral, desde as proximidades de
Peruíbe, no ponto mais ao norte, até próximo do Paranaguá, no ponto mais ao sul10.

A ocupação do Vale do Ribeira começou pela área litorânea. Na altura do século XVI
portugueses e espanhóis disputaram a colonização desta vasta região. Em 1504, por
exemplo, a esquadra comandada por Américo Vespúcio deixou nas praias da Ilha Cardoso
um bacharel degredado. Depois, em 1508, foi a vez da expedição de Vicente Yanez Pinzon
abandonar na mesma ilha mais sete castelhanos. Aventureiros que foram encontrados mais
tarde, no ano de 1551, pela expedição de Martin Afonso ao ancorar no lugar tendo em vista
a procura de metais preciosos, como ouro e prata.

Os municípios do Vale do Ribeira conhecidos como Cananéia e Iguape são descritos em


RTCs produzidos por antropólogos contratados pelo ITESP - apoiados em Laudos
Antropológicos vinculados ao Ministério Público Federal - como sendo as localidades de
referência inicial da ocupação colonizadora do Vale do Ribeira.

A ocupação das áreas interioranas do Vale do Ribeira ocorreu posteriormente. No decorrer


do século XVII, motivada particularmente pela descoberta de ouro em depósito aluvião,
pelos aventureiros que adentraram a mata atlântica seguindo o curso dos rios. O movimento
provocado por tal descoberta levou à organização do primeiro povoado surgido no alto do
Vale do Ribeira, como é o caso de Xiririca (hoje conhecida pelo nome de Eldorado).

10
Cf. Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório Técnico-Científico sobre os quilombos remanescentes da
comunidade de quilombo do Galvão, municípios de Eldorado e Iporanga – SP, 2000, p. 13.
8

A descoberta do ouro em depósito aluvião deu impulso ao primeiro ciclo econômico


marcante da região. A mineração aurífera perdurou no Vale do Ribeira do século XVI até o
século XIX; mas enquanto atividade econômica principal o movimento derradeiro foi ao
final do século XVII. A partir deste período a atividade mineradora entra em declínio nesta
região devido à descoberta de atrativos veios auríferos nas encostas e leitos de rios entre as
montanhas da próspera Capitania das Minas Gerais. Em substituição à exploração mineral
ganhou destaque economicamente, no Vale do Ribeira, uma atividade até então secundária,
ou seja, a rizicultura.

A exploração da força do trabalho escravo, representada pela mão de obra indígena e dos
africanos e/ou seus descendentes, tiveram importância capital no contexto destes dois ciclos
econômicos, conforme descrito por Carvalho e Schmitt11: “já no século XVI, não era
incomum a existência concomitante de escravos negros e indígenas nas expedições que
partiam para o interior de São Paulo”.

Entretanto, observa-se que pouca atenção foi prestada a este fato pelos estudiosos da
sociedade escravista no estado de São Paulo. Isso é o que se insinua nas críticas tecidas por
Carril contra a interpretação de alguns historiadores que, segundo ela, defendem a tese de
que o trabalho escravo no estado paulista só foi introduzido de forma significativa a partir
do empreendimento da monocultura cafeeira12. Através da sua crítica esta autora fez alertar
para a carência de estudos historiográficos sistemáticos e aprofundados produzidos sobre o
Vale do Ribeira, então enfrentada por ela.

Mas é preciso reconhecer que esta restrição há algum tempo já vem sendo superada, graças,
inclusive, aos trabalhos de produção de Laudos Antropológicos vinculados ao Ministério
Público Federal13 - voltados para a identificação e mapeamento de comunidades
tradicionais remanescentes de quilombos localizadas no Vale do Ribeira -, e, da mesma

11
Carvalho, Maria C.P. de e Schmitt, Alessandra – Relatório Técnico-Científico sobre a comunidade de
quilombo do Nhunguara, localizada nos municípios e Eldorado e Iporanga/SP, 2000, p.22.
12
Apud. Carvalho e Schmitt, Ibidem.
13
A referência principal aqui é ANDRADE, Tânia et alli (eds) – [2ª ed.] Negros do Ribeira: reconhecimento
étnico e conquista do território....
9

forma, os Relatórios Técnicos-Científicos14, produzidos por antropólogos contratados pelo


ITESP e cuja finalidade é produzir documentação relevante ao processo para obtenção do
titulo definitivo de propriedade das terras tradicionalmente ocupadas nesta referida
localidade do estado de São Paulo. Sem esquecer, em acréscimo, da contribuição dos
trabalhos científicos-acadêmicos recém produzidos em universidades como USP, Unicamp,
entre outras.

Sobre a exploração da mão-de-obra escrava do africano e seus descendentes no contexto da


atividade da mineração aluvial no Vale do Ribeira a citação do Laudo Antropológico do
MPF é esclarecedora: “(...) o Vale do Ribeira recebeu já no século XVI os primeiros
contingentes negros que foram a mão-de-obra de sustentação para o desenvolvimento da
atividade mineradora.(...), eles foram levados também às outras localidades situadas
Ribeira acima”15 (grifos meus).

O resumo parcial do Laudo de autoria de antropólogos do MPF, apresentado no contexto de


RTCs anteriores vinculados ao ITESP, também é válido agora citar justamente por fornecer
informações preciosas para a compreensão da peculiaridade da ocupação negra no Vale do
Ribeira, conforme segue abaixo:
“1 - O vale do rio Ribeira de Iguape já era habitado por populações indígenas no
período pré-colombiano, constituindo-se em área de passagem para aqueles que,
no inverno, desciam do planalto em direção ao litoral em busca da pesca.
2 – As populações indígenas tiveram grande importância na dinâmica da formação
dos contingentes populacionais do Vale e aparecem como importante referência
nas narrativas sobre a origem das comunidades negras da região.
3 – após o início da colonização portuguesa, a região ao longo do rio Pardo, com
uma formação geográfica que torna o aceso extremamente difícil, constituiu-se
em importante área de refúgio para as populações originais e também para os
indígenas fugitivos que chegavam de Cananéia e da Ilha do Cardoso.

14
Trata-se dos RTCs citados em notas de rodapé ao longo deste documento e com referência completa ao
final do mesmo.
15
Apud.: Turatti, Maria Cecília M. – Relatório Técnico-Científico sobre remanescentes da comunidade de
quilombo de Morro Seco/Iguape-SP, 2006, p.15.
10

4 – A constituição geográfica do Vale do Ribeira, com áreas protegidas pelas serras


e inúmeros rios de navegação perigosa, atraiu para a região populações
indígenas perseguidas pelo bandeirantismo escravagista.
5 – O processo de expulsão dos índios no litoral do Vale do Ribeira começou logo
nas primeira décadas do século XVI, considerando que a disputa por novas
terras, iniciada por Portugal e Espanha, motivou o apossamento precoce de áreas
contíguas ao litoral. A ilha de Cananéia, palco dessas primeiras disputas,
fundada por um espanhol refugiados e povoadas por portugueses, foi o primeiro
porto da capitania de São Vicente, fundada após a chegada da esquadra de
Martim Afonso de Souza em 1531.
6 – Desde o século XVI, Cananéia e Iguape funcionaram como ‘cabeças de ponte’
para a penetração de mineradores em direção ao interior do Vale do Ribeira,
sendo que os primeiros núcleos de povoamento rio acima foram Ivaporunduva,
Xiririca (atual Eldorado), Iporanga, Apiaí e Paranapanema.
7 – A mineração nessa região esteve apoiada na mão-de-obra do escravo negro, que
começou a ser introduzida ainda no século XVI com as bandeiras de mineração
que partiam do litoral sul de São Paulo em direção ao interior do Vale. Contudo,
foi a partir de meados do século XVII que as incursões para o interior da região,
via rio Ribeira de Iguape, tornaram-se mais freqüentes.
8 – Embora tenha perdurado até meados do século XIX, quando se esgotaram os
últimos depósitos de ouro de aluvião conhecidos, a atividade mineradora na
região entrou em descenso no século XVIII, época da descoberta das jazidas de
Minas Gerais, para onde afluíram grandes contingentes de mineradores com
seus plantéis de escravos.
9 – Na primeira década do século XIX, especialmente após a chegada ao Brasil da
corte do D. João VI, o ciclo da mineração no Vale, já decadente, dá lugar a um
ciclo econômico agrícola, voltado principalmente para a produção de arroz, o
qual, através do porto de Iguape, era vendido principalmente para o rio de
janeiro e secundariamente para outras províncias.” 16

16
Carvalho e Schmitt – Op. Cit., p. 23; Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório Técnico-Científico sobre
remanescentes da comunidade de quilombo do Galvão – Eldorado e Iporanga-SP, 2000, pp.15 -16.
11

Este resumo permite entrever que as características geográficas do Vale do Ribeira (serras e
rios de difícil navegação) ofereceram ambiente propício para o refúgio e abrigo de escravos
negros e indígenas que buscavam escapar, corajosamente, às condições subumanas de
trabalhador cativo. Mas é preciso acrescentar que a formação de agrupamento negros no
Vale do Ribeira também se originou de forma diversa desta; como serve para demonstrar os
registros sobre a libertação de cativos ou simplesmente o abandono dos sujeitos nessa
condição, pelos seus senhores no Vale do Ribeira, com o advento da descoberta de ouro em
terras das Minas Gerais17.

Como será demonstrado mais adiante, de acordo com a história oral da comunidade
remanescente de quilombo em foco neste RTC - Ribeirão Grande/Terra Seca -, nas
narrativas de origem deste agrupamento rural também é evocada a imagem de um ancestral
que no passado teria sido abandonado pelo senhor dele no alto do Vale do Ribeira.

No Vale do Ribeira os bairros Ribeirão Grande e Terra Seca encontram-se localizados no


município de Barra do Turvo. Este município fica a 320 Kms de distância da cidade de São
Paulo e a 150 de Curitiba. Saindo de ambas localidades, a via principal de acesso a estes
povoados é a Br 116 (“Régis Bittencourt”). Para chegar a estes povoados, saindo de carro
da metrópole de São Paulo, é preciso seguir pela Br 116 até a altura do Km 551, onde o
condutor deverá entrar à direita e continuar a viagem pela Rodovia SP 287, que dá acesso
aos municípios de Barra do Turvo (31Km) e Iporanga (75 Km); devendo parar entre os
Kms 9 e 1018.

Estes dois bairros19 vizinhos ficam localizados geograficamente na zona rural deste
município de Barra do Turvo. A história desta localidade ainda está por ser aprofundada;

17
Carvalho, Schmitt, OP. Cit.
18
A quilometragem descrita aqui está de acordo com o Mapa do estado de São Paulo. Entretanto, é preciso
mencionar que em documentos consultados o endereço da localidade diferencia um pouco do referido acima
ao indicar o Km “552” e o número da Rodovia “230” (“552/230”). Vide “Livro de Atas n. 1. Folhas n
1,2,3,4,5,6,7... Associação dos Remanescentes dos Quilombos dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca” –
Documentos anexo/ “Ata de Assembléia”.
19
Esta forma de expressão é a mais freqüentemente utilizada pelos meus interlocutores para se referirem às
localidades de Ribeirão Grande e Terra Seca. A noção de bairro empregada aqui também pode ser traduzida
12

sendo raras as informações encontradas sobre as suas origens, realidade social e dinâmica
cultural no contexto passado e presente.

B - Uma breve incursão na história do Município de Barra do Turvo -

Pesquisas arqueológicas empreendidas no Vale do Ribeira têm comprovado que em tempos


remotos esta região era habitada por populações indígenas. No município de Barra do
Turvo os vestígios da existência de povos indígenas também podem ser encontrados. Isso
foi insinuado pelos meus interlocutores20 e, também, aparece em escritos sobre o
município: “[há] notícias de que o início do povoamento da região dos rios Pardos e Turvo,
próximo à confluência de ambos ter-se-ia dado na metade do século XVII, quando aí
chegaram os jesuítas para estabelecer catequese dos índios, fato comprovável pelos
vestígios deixados pelo empreendimento”21.

Notadamente, esta “pista” sobre as origens do município deve ser levada a sério e fica por
merecer, todavia, uma pesquisa sistemática e mais aprofundada. Garimpando dados sobre a
história do município, a informação que parece mais consistente sugere que a fundação de
Barra do Turvo teve como personagem principal um senhor cujo nome registrado é Antonio
Bueno Sampaio. Ele migrou de Iporanga para o lugar na altura do ano de 1852. Nesta
localidade ele se instalou definitivamente e dedicou tempo e trabalho investidos na
atividade da criação de suínos e na plantação de lavoura. A boa fertilidade da terra
compensava o problema da característica geográfica da região - formada por terreno
acidentado em altos relevos - e tornava a lavoura produtiva.

no sentido observado por Antônio Candido, ou seja, como um “agrupamento de algumas ou muitas famílias,
mais ou menos vinculadas pelo sentimento de localidade, pela convivência, pelas práticas de auxílio mútuo e
pelas atividades lúdico-religiosas”. (Cândido, 2003, p.81). Mas é preciso acrescentar a esta definição a
particularidade dos bairros em estudo, cujo sentimento de pertencimento é reforçado ainda pela rede de
parentesco que entrelaçam a maior parte das famílias de uma e outra localidade mencionada acima.
20
Pedro, um dos representantes da “Associação dos Remanescentes de Quilombo dos Bairros Ribeirão
Grande e Terra Seca”, em conversa informal, comentou comigo que já encontrou diversos pedaços de pote
quebrado, entre outras peças, que acredita fazer parte de utensílios pertencente a povos indígenas que
habitaram a região no passado. Um jovem professor do ensino de primeiro e segundo graus da rede municipal
de Barra do Turvo, que se apresentou a mim como sendo formado em biologia pela USP e mestre nesta área
pela mesma instituição, também fez menção aos indícios de sítios arqueológicos, ainda não explorados, nos
domínios do município de Barra do Turvo, que são sugestivos quanto ao fato da ocupação no passado de
povos indígenas naquela localidade.
21
Fonte Internet
13

Provavelmente, este foi um dos fatores que também veio contribuir para a vinda de pessoas,
em seguida, e a fixação de agrupamentos familiares naquelas terras entre as margens dos
rios Pardo e Turvo. O surgimento dos quilombos que aos poucos se multiplicaram por esta
localidade do alto Vale do Ribeira talvez possa ser, em certo sentido, explicado por esse
motivo.

Desde os seus primórdios as atividades econômicas principais de Barra do Turvo sempre


estiveram relacionadas ao plantio de lavoura e a criação de animais. Produção cuja
circulação em forma de mercadoria dependia ora das demoradas caminhadas a pé, cortando
os sertões, ou longas viagens em lombo de mulas ou em canoas - conforme ilustra a citação
seguinte:
[n]aquela época tudo era muito difícil e o transporte mais usado era o
de tração animal: no lombo de burros e mulas, ou, canoas de madeira
[...]. Criadores de porcos conduziam suas manadas as vezes com mais
de 500 cabeças a Itapeva, rumo aos frigoríficos, cortando sertões em
viagens que duravam 20 a 25 dias para chegar a seu destino. Tropas
de mulas partiam em direção à Iporanga, Apiaí, Eldorado e Iguape,
levando produtos agrícolas22.

As condições para o estabelecimento das relações de troca econômicas e culturais são


também eram limitadas ao recurso dos tipos de transportes mencionados acima:
“Utilizavam-se também canoas como meio de transporte até Iguape, onde iam buscar
mercadorias ou à Tradicional Festa do Bom Jesus”23.

Ao longo da sua história as tentativas de empreendimentos econômicos no contexto de


Barra do Turvo variaram no tocante ao tipo de atividade priorizada. Em torno das
atividades extrativistas e agropecuárias Barra do Turvo experimentou historicamente

22
Fonte Internet: Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira
23
Ibidem
14

momentos de altas e baixas, marcantes dos principais ciclos econômicos do município:


porcos, milho, feijão, palmito jussara, bovinos e buffalo.

Entre os anos 1910 e 1930 foi quando Barra do Turvo teve a sua “maior fartura”. Isso,
graças ao aumento da “produção agrícola e pecuária” que era, em grande parte,
“transformada no próprio município”, através da “fabricação da rapadura, aguardente e
farinha de mandioca”24. Entretanto, pelo que insinuam os registros este salto produtivo foi
passageiro e não garantiu a prosperidade ou o enriquecimento da localidade.

Mas é preciso considerar, todavia, o fato de Barra do Turvo até a primeira metade dos anos
de 1960 pertencer ao município de Iporanga. Segundo fonte consultada, foi em 30 de
novembro do ano de 1938 que se criou, através do Decreto-Lei Estadual n. 9775, o
“Distrito com a denominação de Barra do Turvo, no município de Iporanga”. E só mais
tarde, através da Lei-Estadual de n.8092 de 28 de fevereiro de 1964 é que Barra do Turvo
teve a sua autonomia, ao ser desmembrada de Iporanga e elevada à categoria de
município25.

Semelhante aos tempos passados, Barra do Turvo continua nos dias de hoje a ser um
município predominantemente rural. Com uma população estimada em 2004 de
aproximadamente 8.613 pessoas, 68% estão concentrados na área rural e apenas 32%
fixadas na área urbana da sede municipal. Entretanto, não obstante esta característica da
distribuição populacional a principal fonte de arrecadação de Barra do Turvo não provém
da atividade econômica vinculada ao setor rural e, sim, do “setor de serviços”. E isso não
deixa de gerar sérios problemas econômicos e sociais para o município. Conforme
explicita-se nesta fonte consultada26:
Os municípios dependentes basicamente dos serviços apresentam, em
geral, os mais baixos valores per capita. São áreas em que as
atividades industrial e agropecuária não possuem destaque e, em

24
Fonte Internet: op. cit. Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira
25
Fonte Internet: op. cit. Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira
26
Fonte Internet: OTANI, Malimiria Norico et alli – “Breve perfil dos municípios rurais do Estado de São
Paulo”. In.: Portal do governo de São Paulo/Instituto de Economia Agrícola – IEA. (Artigo registrado no
CCTC-IEA sob o n. HP – 86/2005).
15

geral, são dependentes dos serviços públicos ou de transferência de


recursos Os 10 municípios com os menores PIBs per capita do
Estado têm como atividade principal o setor de serviços. Estes se
concentram basicamente no Vale do Ribeira (Barra do Turvo, cuja
renda per capita R$ 2.197,00 é a menor do Estado, Iporanga,
Cananéia, Miracatu e Barra do Chapéu) e no Vale do Paraíba. [...]
Estes municípios oferecem condições sociais bastante
insatisfatórias à população, dado que 70% deles situam-se entre os
grupos 4 e 5. Ou seja, apresentam baixo nível de riqueza e de
indicadores sociais.

Esta citação contribui para demonstrar que os problemas enfrentados pelo município de
Barra do Turvo – e que sem dúvida refletem diretamente na qualidade de vida e condições
da sobrevivência da sua população. Trata-se de uma realidade concreta que obriga o poder
público local a pensar em alternativas que sejam viáveis para o desenvolvimento sócio-
econômico do município, sem perder de vista a questão da preservação do meio-ambiente e
a necessidade de promover políticas favoráveis à melhoria da qualidade de vida da
população constitutiva do lugar. O empenho na valorização e preservação do meio-
ambiente, o investimento planejado no potencial turístico oferecido pelas benesses da
natureza (Mata Atlântica, relevos, grutas, rios e cachoeiras etc.)27, bem como o apoio á
demarcação das terras ocupadas pelas comunidades tradicionais remanescentes de
quilombos locais, talvez seja uma boa saída para a prosperidade de Barra do Turvo e
revigorar as esperanças no futuro das gerações vindouras deste município.

27
Em portal na Internet do município de Barra do Turvo há destaque para o eco-turismo, a pesca e a prática
de esportes radicais - como o vôo livre.
16

- Capítulo III -

- RIBEIRÃO GRANDE E TERRA SECA: O PASSADO -

A reconstituição histórica destes dois povoados seria praticamente impossível sem o auxílio
imediato ao recurso da oralidade. Neste trabalho antropológico foi imprescindível dedicar
tempo para ir ao encontro dos mais velhos da comunidade ouvir deles os relatos de muitas
lembranças boas da infância e juventude, assim como as recordações mais tristes que
incomoda - experiências vividas, distrações e divertimentos, labutas do cotidiano, nome de
pessoas antigas, e parentes próximos já falecidos. O auxílio dos meus interlocutores ao
mediar o meu contato com virtuais entrevistados ou disponibilizar sem restrições, para este
antropólogo, informações obtidas por eles anteriormente - foi igualmente de enorme valia
para o rendimento da pesquisa28.

Assim, a exposição que se segue abaixo - e como não podia deixar de ser - é na verdade
uma reinterpretação das versões da história dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca que
os interlocutores ao expor para este antropólogo não evitaram demonstrar que, mediado
pela pessoa do curioso ouvinte, a vontade deles de alguma maneira se concretizava, qual
seja contar sobre eles para eles mesmos, num esforço reflexivo e voltado, sobretudo, para o
processo de construção identidade de afro-descendente que eles querem reafirmar no
contexto situacional deste momento específico, em que estão reivindicando o direito ao
título de propriedade das terras desde antes ocupadas pelos seus ancestrais.

E sendo assim, não obstante as elipses, rasuras e emendas suspeitas – parafraseando Geertz
-, o conteúdo da exposição em pauta não deixa de ser, a bem da verdade, uma reprodução -
quase literal - de textos na forma oral e escrita cuja autoria é dos próprios interlocutores e
lideranças reconhecidas pelas comunidades tradicionais das referidas localidades no alto
Vale do Ribeira. Pessoas acolhedoras com quem, durante a empreitada do trabalho de

28
Esclareço que entre as fontes que recorri para escrever este capítulo menciono dois textos redigidos por
Nilce de Pontes Pereira coordenadora da “Associação dos Remanescentes de Quilombos dos Bairros Ribeirão
Grande e Terra Seca”, em forma de rascunho. Um primeiro, rascunhado à mão e, um segundo, ao que parece
uma reelaboração deste anterior, em versão digitada em computador.
17

campo e objetivando à produção deste Relatório Técnico-Científico, pude ter contatos e


conversar informalmente em diferentes momentos ou, em alguns casos particulares, manter
um contato mais breve chegado de surpresa com o gravador em punho. Este foi o
procedimento adotado na maioria das vezes nas entrevistas com os mais velhos.

Miguel de Pontes Maciel, Benedito Rodrigues de Paula, Pacífico Morato de Lima, são
nomes e sobrenomes invariavelmente evocados no discurso dos interlocutores como
referencias importante na história das comunidades Ribeirão Grande e Terra Seca. Como
demonstração expressiva de uma consciência identitária assumida, é que os interlocutores
relembram com orgulho ao relatar que estes sujeitos, com nome e sobrenome sempre
destacados, são os “ancestrais”29; os “antepassados” deles que em séculos passados foram
os primeiros a abrir “capuava”30 e fixar com suas famílias naquelas terras a ermo do Vale
do Ribeira, às margens do rio Turvo. Numa saga empreendedora, como as de muitos outros
escravos negros fundadores de quilombos que se ramificaram pelo interior desta
encantadora região de Mata Atlântica do Estado de São Paulo.

De fato, conforme verificado através do recolhimento de informações sobre a genealogia de


parentesco das famílias constitutivas dos povoados rurais de Ribeirão Grande e Terra Seca,
verifiquei que a maior parte desta população pertence a uma rede comum e extensiva de
relações entrelaçadas de parentesco, cuja ascendência invariavelmente remete aos nomes de
um ou outro daqueles pioneiros no povoamento da localidade.

Entre os três, é de Miguel de Pontes Maciel que os meus interlocutores sabem contar com
mais detalhes sobre a origem. De acordo com os relatos, Miguel de Pontes Maciel era Filho
de ex-escravo. O pai dele veio para o Vale do Ribeira juntamente com a leva de
trabalhadores braçais forçados que foram introduzidos na região a propósito da atividade
extrativa de aluviais de ouro, perseguidos nas encostas e beiras de rios da região. Depois,
com a descoberta das promissoras minas de ouro e diamante entre as montanhas distantes

29
Termo que se observa ser empregado com freqüência no discurso dos interlocutores.
30
Esta palavra é de origem tupi, conforme traduzido pelo Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua
Portuguesa “capuava” significa: “local apropriado para plantação, roça ... Do tupi kapï’ aua’ ”. (Cunha, 1996,
p.152). Antônio Cândido aponta o uso do termo “capuava” também como “Designação corrente de moradia”.
(Cândido, 2003 p.78).
18

das Minas Gerais, contam que o pai de Miguel, chamado Joaquim de Pontes Maciel, foi
abandonado pelo senhor dele, um aventureiro que decidiu partir rumo à Minas, também
atraído pelas notícias que ecoaram longe dos achados da riqueza mineral naquelas terras ao
longe.

Esse procedimento é descrito nos Laudos dos antropólogos do Ministério Público e RTCs31
vinculados ao ITESP como tendo sido procedimento comum entre os donos de escravos da
região do Vale do Ribeira quando perderam o interesse na atividade da mineração de outro
nesta localidade. Sonhando com a riqueza fácil, os senhores partiam para Minas levando
consigo apenas os escravos que se avaliava estarem aptos para a longa viagem e agüentar,
depois, o serviço pesado da mineração aurífera (portanto, em condições físicas saudáveis e
com todo o vigor da juventude); sem hesitar, pois, em deixar para traz, entregues à própria
sorte, os doentes e idosos.

Esta teria sido a sorte, também, de Joaquim de Pontes Maciel. Uma vez na condição de
homem livre, Joaquim de Pontes Maciel teve que arriscar o sustento da família mudando de
lugar e plantação de roça, entre as localidades de Xiririca (hoje Eldorado) e Iporanga. Neste
estilo de vida de característica nômade, depois de percorrer diferentes localidades da região,
incluindo um lugar chamado Indaiatuba, ele foi parar nas proximidades de Barra do Turvo,
no povoado hoje conhecido pelo nome de “Reginaldo” 32. Acredita-se que a chegada dele
neste lugar foi por volta do ano de 181733 .

Segundo relato prestado pelo neto de Joaquim de Pontes Maciel, Anésio de Lima34, o avô
teve várias mulheres e muitos filhos. Miguel de Pontes Maciel era o quarto da família
formada por 11 filhos - a contar com dois outros que o entrevistado apontou como sendo
“ilegítimos” ou “particulares”.Os três nascidos antes do Miguel chamavam-se,
31
Sigla de Relatório Técnico-Científico.
32
Segundo a tradição oral, esta denominação popular do bairro presta homenagem a um dos primeiros
moradores do povoado pelo grande feito dele de ter construído uma “canoa” – de maneira insinuada como
tendo sido a primeira - naquele lugar.
33
Estou considerando aqui a data indicada nos textos esboçado por Nilce de Pontes Pereira.
34
Estou reproduzindo aqui o depoimento gravado por mim, em 01/11/2006, prestado pelo Morador do bairro
Reginaldo, o senhor Anésio Ribeiro de Lima, de 71 anos de idade, neto de Joaquim de Pontes Maciel. Ele é o
coordenador da “Associação dos Remanescentes de Quilombo do Reginaldo”. A primeira entidade desta
natureza fundada na região do município de Barra do Turvo.
19

respectivamente - Paulo, Fausminda e Luciano -, e os nascidos depois -, Maria, Pedro,


Joana, Antônio e Geraldo. Os dois “particulares”: Sebastião Dias e Bernardinho.

Este quarto filho de Joaquim de Pontes, Miguel de Pontes aparece nos relatos como um tipo
de personagem principal e cuja imagem que se constrói do mesmo é sugestiva da posição
de liderança desse antepassado no processo de ocupação das localidades de Ribeirão
Grande e Terra Seca.

De acordo com os relatos, Miguel de Pontes Maciel ainda jovem deixou a casa do pai no
“Reginaldo” e foi morar em Indaiatuba; onde se casou com a primeira esposa, chamada
Verônica. Ela faleceu cedo e o casal não teve filhos. Ainda em Indaiatuba ele se casou pela
segunda vez, com Josefa Xavier Rocha, cuja irmã, Maria Xavier da Rocha, era esposa do
Benedito Rodrigues de Paula.

Mediado por esta relação cruzada de parentesco Miguel de Pontes Maciel e Benedito
Rodrigues de Paula e Miguel se conheceram e tornaram desde então grandes amigos.
Parceiros de caminhada, e sempre juntos na aventureira labuta pela sobrevivência eles
saíram de Indaiatuba à procura de lugar melhor para o plantio de roça, abrindo picada pela
mata adentro. Como era o costume, partiram com a família. “Essa era a rotina deles –
escreve Nilce Pereira -, viviam como nômades. Faziam as roças, tiravam o sustento e
partiam para outra região. Por esse motivo foi que Miguel e [os] companheiros35 [dele]
formavam os bairros. Dessa forma [é] que os netos dos escravos chegaram nesses locais e
formaram aqui suas famílias, criaram filhos e viram seus netos chegando...”

O estilo de vida nômade é apontado em RTCs do ITESP como tendo sido uma
característica do modo de sobrevivência nesta vasta região interiorana do estado de São
Paulo. Estava relacionado ao método tradicional de cultivo da terra que era empregado na
região, ou seja, a prática das “queimadas” com intercalação de áreas de plantio deixadas em
pousio.36

35
Referindo-se aqui, também, à pessoa de Pacífico Rodrigues de Paula, a quem mencionei no início.
36
Cf.: Laudo dos Antropólogos do Ministério Público Federal, apud.: Turatti, Maria Cecília M. - Relatório
técnico-científico sobre os remanescentes de quilombo de Morro Seco/Iguape - SP, 2006, pp.29-30.
20

Ao sair de Indaiatuba, segundo os relatos, Miguel de Pontes Maciel e Benedito Rodrigues


de Paula passaram pela localidade do “Reginaldo”, onde permaneceram por algum tempo,
conforme sugerem os escritos de Nilce Pereira37. E, lá, conheceram “Pacífico Morato e
juntos foram para o‘ perovado’ou (...) “lugar das perobas”, apelido antigo do bairro Terra
Seca e por onde teve início a ocupação da localidade pelos três ancestrais38. Segundo a
narrativa de Nilce Pereira:

Miguel de Pontes vivia em Indaiatuba e resolveu, em conjunto com o


cunhado [...] Benedito deixa[rem] Indaiatuba [e] ficaram uns dias no
Reginaldo[...]. Chegando no Reginaldo pegaram Pacífico Morato -
[ele que já] morava no Reginaldo [e] tinha a sua família formada [no
lugar, concordando que] era hora de mudar de lugar, resolveu subir
com eles [Miguel e Benedito]; carregando esposa e filhos nos lombos
de cavalos e tocando porcos. Foi assim que Miguel, Pacífico [e]
Benedito no chegaram no ‘ perovado’39.

Este “lugar das perobas”, apelido antigo do bairro Terra Seca, é descrito nos relatos de
Nilce Pereira como tendo sido o lugar onde, primeiramente, os três ancestrais se instalaram
com a família.

Conta-se que depois de instalar o senhor Benedito e família lá [no


perovado (sic) - Terra Seca], onde ele próprio também ficou e teve

37
A propósito do trabalho etnográfico, cumpre-me informar que consultei dois originais desta autora, Nilce de
Pontes Pereira; ambos, diria, em forma de rascunho. Trata-se, esclareço, de uma versão preliminar anotada à
mão em folha de caderno com pauta e no formato tamanho grande; e uma segunda versão, síntese da primeira,
digitada e impressa.
38
Esta referência aparece nos rascunhos, e a origem do termo pode ser apreendida através deste trecho
digitado: “[...] foi assim que eles chegaram junto com o cunhado (Benedito Rodrigues de Paula) e seus [sic]
filhos do primeiro casamento [...] na terra seca que antes eles batizaram com [o nome] de perola [peroba]
por causa da árvore que tinha no local da 1ª residência: [...] essa planta muito grande e frondosa. [Por isso]
foi chamado de lugar das perobas.” (as intercalações entre colchetes são minhas).
39
Esta referência aparece nos rascunhos, e a origem do termo pode ser apreendida através deste trecho
digitado: “[...] foi assim que eles chegaram junto com o cunhado (Benedito Rodrigues de Paula) e seus [sic]
filhos do primeiro casamento [...] na terra seca que antes eles batizaram com [o nome] de perola [peroba]
por causa da árvore que tinha no local da 1ª residência: [...] essa planta muito grande e frondosa. [Por isso]
foi chamado de lugar das perobas.” (as intercalações entre colchetes são minhas).
21

outros filhos, Miguel se instalou com a sua família no Ribeirão


[Grande] - que sempre teve o nome Barra do Córrego e córrego do
salto. Pacifico Morato [...] trouxe seus filho já grandes e instalou-se
no Cedro, ajudado também por Miguel e Benedito.

Nos relatos sobre a origem dos povoados de Ribeirão Grande e Terra Seca um dos detalhes
a meu ver bastante significativo é a recorrência da menção feita aos nomes de municípios
do Vale do Ribeira como “Eldorado”, “Indaiatuba” e “Iporanga”. É preciso lembrar que
nestes municípios também se encontram localizadas diversas comunidades tradicionais
remanescentes de quilombos (algumas delas inclusive foram objetos de RTCs anteriores e
com os quais também estou dialogando no contexto deste documento). Esse detalhe dos
relatos – a referência ao nome de tais municípios - pode ser interpretado como um tipo de
reforço às marcas simbólicas através das quais se busca evidenciar a identidade étnica
quilombola dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca.

Nesse sentido o “Reginaldo” merece aqui destaque especial. A formação deste povoado –
como sugere os relatos – é bem anterior aos demais bairros rurais do município de Barra do
Turvo, identificados como remanescentes de quilombos; além de Ribeirão Grande e Terra
Seca, é preciso mencionar as comunidades do Cedro e Pedra Preta40. Sendo válido
sublinhar que esta comunidade foi a primeira a organizar-se na forma de Associação
comunitária e, até o momento, a única entre as quatro que já obteve junto à Fundação
Cultural Palmares/MINC a “Certidão de Auto-Reconhecimento” como remanescente de
quilombo (Vide Documentos anexos/Certidão de Auto-reconhecimento). A pesquisa
antropológica de campo permite afirmar que o elo entre estes povoados rurais do município
de Barra do Turvo não pode ser explicado somente pelo aspecto da proximidade espacial-
geográfica, ou da afinidade definida pela noção de vizinhança, mas, principalmente, pelo
vínculo familiar estabelecido através de ligações ancestrais de parentesco (vide “Diagrama
de Parentesco” ao final).

40
Além da comunidade alvo deste laudo antropológico, é preciso mencionar que as comunidades
remanescentes de quilombos dos bairros Cedro, Pedra Preta, semelhante ao caso do Reginaldo, ainda
aguardam a consultoria técnica para produção do laudo antropológico exigido no processo para obtenção do
título das terras reivindicadas. No caso da comunidade Pedra Preta o problema é mais complicado pelo fato
deles não terem conseguido, ainda, organizar a Associação representativa da comunidade local.
22

De volta ao relato de Nilce Pereira, outro aspecto detalhado por ela é referente às
dificuldades enfrentadas para sobreviver naquela localidade do Vale do Ribeira. Versão
que, tal como outras passagens do que ela expõe e das narrativas ouvidas de outros
interlocutores locais, articula elementos presentes na história mais ampla do município de
Barra do Turvo. Nesse caso, os meios utilizados para deslocar dentro e fora da comunidade
e as formas do comércio com outras localidades vizinhas:
Seu Miguel, Pacífico e Benedito trabalharam por muito tempo na
região fazendo roça [e] criando porcos para vender em Iporanga, a
troco de sal e mantimentos [que não produzia nas terras deles] nos
entrepostos. O meio de transporte era os cavalos que costumavam
carregar enormes cestas [nas quais] transportavam mercadoria e
criança pequena que ainda não agüentava caminhar por muito tempo.

Nos relatos de Nilce Pereira (mas não apenas a versão dela, é preciso ressalvar) há que se
observar um outro detalhe de tamanha importância, ou seja, a ênfase na relação de
solidariedade e cooperação estabelecida entre os ancestrais fundadores do lugar.

Conta-se que Miguel viveu no Indaiatuba [e] no Reginaldo. Quando


[ele] chegou no Ribeirão Grande, ele também trazia um filho de 15
dias de nascimento, hoje conhecido como seu Chico - pois chama se
Francisco Xavier de Pontes. [...]. Desde de 1886 que eles
trabalhavam e sobreviviam aqui. Seu Miguel sustentou sua primeira
família tirando sua alimentação dos trabalhos que os três compadres
faziam juntos.

Esta relação de solidariedade e cooperação mútua enunciada no trecho acima é sugestiva,


pois, da forma de organização social e estilo de vida tradicional dos bairros rurais do
interior paulistas, conforme apontou Antônio Cândido em os Parceiros do Rio Bonito41, ao

41
Trata-se de um estudo realizado por ele nos anos 1950 focalizando a vida caipira, a sua dinâmica e
transformações.
23

discutir sobre as formas da sociabilidade “caipira”, então representadas pela prática do


“mutirão”42 e as manifestações lúdico-religiosas. Elementos culturais que, segundo ele,
serviam de reforço à “consciência de unidade” local43. Ao discutir a noção de bairro rural
Antônio Candido44 explicou o seguinte:
Pode-se falar de autarquia, portanto, com referencia ao bairro; não as
relações de família no sentido estrito. E um dos elementos de sua
caracterização era o trabalho coletivo. Um bairro poderia, deste
ângulo, definir-se como o agrupamento territorial, mais ou menos
denso, cujos limites são traçados pela participação dos moradores em
trabalhos de ajuda mútua. É membro do bairro quem convoca e é
convocado para tais atividades. A obrigação bilateral é aí elemento
integrante da sociabilidade do grupo, que desta forma adquire
consciência de unidade e funcionamento. Na sociedade caipira a sua
manifestação mais importante é o mutirão...

Este trabalho coletivo - o mutirão - era um dos aspectos essenciais, porém, não o exclusivo,
- conforme demonstrou Antônio Cândido -, na sedimentação da rede de relações sociais e
forma da sociabilidade constitutiva dos bairros rurais paulistas, pesquisados por ele em
meados do século passado. Outro aspecto, portanto, também importante para a aproximação
das pessoas e integração da comunidade apontada por Cândido e que, da mesma forma que
a primeira, trazia a “consciência de unidade” local era a prática lúdico-religiosa. Nas
palavras do referido mestre45:
[...] há nos bairros uma solidariedade que se exprime pela
participação nas rezas caseiras, nas festas promovidas em casa para
cumprimento de promessas, onde a parte religiosa, como se sabe, é
inseparável das danças. Quando, por exemplo, é muito grande o
número de inscritos para promover a festa mensal da capela, um
morador que tem promessa a cumprir pode trazer a imagem a sua

42
Cândido, 2003, p.87.
43
Ibidem, p.98.
44
Cândido, 2003, p.87.
45
Ibidem, p.98.
24

casa: há reza, distribuição de alimentos e, depois, fandango.


Geralmente a primeira parte se desenvolve durante o dia, a segunda, à
noite.

Estes aspectos da sociabilidade caipira estão insinuados também na fala das pessoas de
Ribeirão Grande e Terra Seca, nas narrativas dos mais velhos e na versão escrita de Nilce
Pereira. A ênfase nos tipos de crenças e práticas religiosas, expressivas de um catolicismo
popular predominante na comunidade no tempo dos antigos pode também ser extraído do
relato desta última, ou seja:
a – Dança de São Gonçalo:
Conta-se que as tradições antigas, como romaria, eles passavam a
noite ou o dia inteiro cantando e dançando em louvor a São Gonçalo.
Faziam muitas novenas cantadas onde se fazia a mesada de anjo
como costumavam dizer eles colocavam as crianças menores de sete
anos sentados em circulo no chão em cima de esteira de taboa e
faziam uma alimentação farta com doces e salgados[...].

b – Reza de Terço: “Conta-se, também, que a forma com que faziam o terço ou era
cantado ou rezado [falado]. [t]odos [ficavam] de joelho no chão, em forma de penitencia.
Enquanto não terminasse [a reza] ninguém [se] levantava do lugar”;

c - Canto de Quaresma:
Outra tradição era o canto de quaresma. [Todo] ano eles faziam a
cantoria dos mortos nos lugares onde se enterravam os entes
queridos, ou envolta das casas. Essa cantoria ia a noite toda. [Muitas
vezes] as famílias que eram saudadas com os cantos e orações saiam
de suas casas e convidavam as pessoas para entrar e tomar café com
porções de amendoim ou cuscuz ou pamonha ou mesmo paçoca de
carne[...];
25

d – Fandango:
A forma de dançar romaria era em dupla de homem e mulheres, por
volta em torno de 1hora. Como os familiares se reuniam para rezar e
festejar, era na casa de um [certa vez, e na] de outro [em vez
seguinte]. [Por isso, durante] muito tempo os compadres escolheram
o Cedro para fazer [as] suas festividades, [que aconteciam] uma vez
por mês e no 1º domingo[...];

e – Festa de São Pedro, Festa do Divino e o Congo:

“No dia de são Pedro iam todos para preparar a festa e novena em
louvor ao santo [...]. Conta-se, também, que os restantes de
imigrantes também mantiveram seus costumes. Um desses costumes
era a passeata [sic] da bandeira do divino. [Os andores] dos santos de
cada mês e dia, eram enfeitados com varias fitas coloridas. [E] eles
saiam visitando as casas, cantando e tocando instrumento como
pandeiro viola cavaquinho e congo; fazendo barulho e cantoria. [Por]
onde passavam, todos saiam para ver ou acompanhar [o cortejo] até a
outra casa. Quando chegava a noite, eles dormiam na casa da pessoa
[onde estavam de passagem]. Nesses dias eles ficavam até tarde
cantando. E [aqueles] que tinham ido acompanhar [os dançantes]
voltavam para casa [...]”.

A forte influência do catolicismo nos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca é manifestada,
ainda, na memória evocada do primeiro templo edificado para a prática dos ritos e cultos
expressivos da “fé” nos “deuses e santos”46 dessa religião cristã:

[...] com o passar do tempo os mais velhos foram ficando cansado e


[com] os filhos todos crescendo resolveram que era hora de fazer
uma capela no Ribeirão Grande; pois para ir no Cedro, só iam uma

46
Expressão apropriada de Carlos Brandão em O divino, o santo e a senhora, 1978.
26

vez por mês. A família crescia cada vez mais [e] eles [não queriam
deixar perder o] costume de passar [as] suas crenças e devoções aos
filhos. Foi assim que o senhor Bernardinho resolveu que era hora de
fazer uma capela, pois [até então] usavam [a] sala e [o] quintal [da
casa dele], ou seja [o] terreiro para rezar [e onde] fizeram um
pequeno altar [dentro de] uma casa abandonada que só tinha
[algumas] paredes de piri47 e [o material da] cobertura [era] palha de
palmito. Ali [dentro é que] rezavam, sem muita proteção da chuva e
[do] sol. [Por isso] construíram uma capela de barro e sapé que
ficava no lombinho acima [de onde] hoje se localiza o salão
comunitário. Foi passando o tempo e eles construíram várias [outras]
igrejinhas.

A instituição oficial da prática religiosa do catolicismo local está, também, guardada na


memória de um tempo passado e quando a primeira geração nascida no povoado já ocupava
o lugar dos ancestrais, e se tornava, por sua vez, a referência moral e dos valores que
deveriam ser preservados na comunidade:
Conta se que o primeiro Bispo a chegar ao Cedro e Ribeirão [Grande]
foi o bispo Dom Aparecido. Ele vinha de carro até a br48 e descia [o
restante do caminho] a cavalo, até [chegar ao] Cedro e ao povo do
Ribeirão Grande e Terra Seca. Ele vinha de Registro. O senhor
Bernardo de Pontes se deu muito bem com o bispo, e eles ficaram
muito amigo. [Quando já] havia as estradas cortadas, ele veio fazer
oração na capelinha e chegou de fusca. [Mas para] chegar até a
capelinha tinha que [seguir] à pé por um caminho de tropeiro e
atravessar [a] água, [passando por uma] ponte [que] era feita de uma
tora de madeira. Ele deixou o carro [á beira da estrada seguiu o
caminho]. Como ele não tinha o costume de atravessar [este tipo de

47
De acordo com o Aurélio, “piri” é uma “Espécie de junco da família das ciperáceas (Rynchospora
cephalotes), que cresce nos terrenos pantanosos, e do qual se fazem esteiras.” (Cf. Novo dicionário básico da
língua portuguesa, 1988, p. 508).
48
Referência à rodovia 116 – Regis Bittencourt
27

ponte] ele caiu na água. [Molhado, ele teve de] vesti[r] uma roupa
[emprestada] do senhor Bernardo. [Neste dia] a senhora Rosa [esposa
de Bernardo Pontes] coordenou um almoço comunitário em
homenagem ao bispo. Depois da celebração o bispo resolveu visitar a
paróquia que era missionada pelo padre de Iporanga. [No intervalo
em que] ele foi para a cidade a senhora Rosa Marques sofreu um
derrame. [Então] o senhor Bernardo correu para estrada para esperar
[...] o bispo [voltar] para levar ela para o hospital de Pariquera-Açu.
O bispo ficou com ela no hospital, [apesar] do cansaço, ate as 6hs da
manhã do dia seguinte. [Ela] demorou para [se] recuperar; e ele
sempre passava no hospital ou ligava lá para saber como ela estava
passando. Foi dessa forma que eles passar[am] a ser evangelizados
pela diocese de Registro [onde era a sede do] bispo [...].

O passado se articula com o presente de várias maneiras. As frases sublinhadas acima


servem para exemplificar isso. Primeiramente, destaco as “pontes feitas com tora de
madeira”. Estas pinguelas continuam a servir nos dias de hoje como caminho de passagem
para atravessar os rios e córregos que separam casas e dá acesso a estrada (SP/287) que
corta os bairros Ribeirão Grande e Terra Seca.

Quanto às cidades de Registro e Pariquera-Açu, são dois municípios vizinhos de Barra do


Turvo que, em relação a esse último, possuem uma condição de infra-estrutura um pouco
melhor, ou seja, em termos de comércio, escolas e hospitais. Relacionada à questão da
saúde são para estes dois municípios que são encaminhadas, mais freqüentemente, as
gestantes às vésperas de dar a luz e as pessoas com sintomas de doença grave ou então
acidentadas e que necessitam com urgência da intervenção cirúrgica.

Ao refletir sobre a articulação do passado com o presente no contexto desta exposição sobre
a história oral dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca, é válido lembrar uma frase
enunciada por João Ubaldo Ribeiro em Viva o Povo Brasileiro: “O segredo da Verdade é o
seguinte: não existem fatos, o que existem são histórias”. Esta citação sugere que a
28

reconstituição do passado é uma questão de interpretação de acontecimentos, fatos ou


versões que se considerou importante ou significativos para demonstrar algo que se tornou
interessante, sobretudo, porque auxilia a dar sentido á vida das pessoas ou de determinada
coletividade. Nesse sentido, é preciso considerar que as versões exploradas ao longo deste
capítulo são significativas e ganham importância maior, ainda, porque vêm expressar o
ecoar de vozes que muitas vezes foram ignoradas ou mesmo desqualificadas - e, desse
modo, a impedir que os seus protagonistas tivessem a oportunidade de contar a seu modo e
repensar sem constrangimento a sua própria história. Enfim, como sabemos a construção da
identidade depende também da reflexão a partir da memória evocada do passado. E como
tem sido demonstrado é nesse processo que estão envolvidos de corpo e alma os meus
interlocutores e remanescentes dos quilombos Ribeirão Grande e Terra Seca.
29

- Capítulo IV -

- RIBEIRÃO GRANDE E TERRA SECA: O PRESENTE -

Com base nos levantamentos preliminares feitos pelos antropólogos do Ministério Público
Federal, juntando a população dos bairros Ribeirão Grande e Terra Seca, o total de famílias
contadas seria 42 famílias49. Entretanto, através do trabalho antropológico empreendido
verificamos que atualmente há um total de, aproximadamente, 77 famílias integrantes
destes dois bairros juntos.

A maior parte destas famílias moram em casas construídas ao longo das margens do rio
Turvo e Ribeirão Grande. A maioria em moradias simples e sem muito conforto;
construídas com paredes de tábua e cobertas com telhado de amianto. Para de ter uma idéia,
em quase todas casas visitadas durante pesquisa de campo, pude observar que os móveis
encontravam-se em condições precárias ou eram rústicos – com destaque especial para o
fogão à lenha feito de taipa, no canto das cozinhas.

O meio de subsistência das famílias é garantido basicamente pelo que é conseguido colher
do plantio de roças - principalmente milho, mandioca, feijão, cana e banana. A criação de
animal para o consumo próprio ou comerciar é mais raro.

O interesse atual das lideranças das comunidades em conseguir manter as nascentes dos
rios dentro dos limites da extensão territorial reivindicada por eles, tem a ver justamente
com a preocupação relativa ao futuro incerto que projetam pela frente, no tocante ao risco
de poluição e, conseqüentemente, destruição da qualidade das águas dos rios locais. Isso

49
Ref.: ITESP/Assistência Especial de Quilombos e outras Comunidades Tradicionais (tabela sobre situação
das comunidades de quilombos até janeiro/2006). Nesta tabela apresenta-se um total de 21 famílias
constitutivas do bairro Ribeirão Grande e, igualmente, 21 do Terra Seca.
30

também foi tema abordado nas conversas informais com os meus interlocutores; pensando a
questão do plantio das roças e a própria situação da sobrevivência das famílias no lugar.

De fato, as condições para a sobrevivência no lugar são muito difíceis na atualidade. Sabe-
se que a plantação de banana tem sido destacada como uma atividade crescente e
economicamente rentável nas regiões do Vale do Ribeira. Entretanto, esta bonança ainda
não faz parte da realidade das comunidades remanescentes dos quilombos de Ribeirão
Grande e Terra Seca. Os interlocutores alegam que não dispõem de uma estrutura adequada
para produzir comercialmente; inclusive no que concerne ao transporte da produção.
Mesmo o que atualmente eles conseguem produzir - e gostariam de negociar fora, como o
feijão, mandioca, fabricação de rapadura etc -, é difícil atrair comprador ou levar para
vender fora do lugar.

A carência financeira é apontada, também, como um dos problemas enfrentados e que


obriga grande parte da população mais jovem a abandonar o trabalho rural, na comunidade,
e migrar rumo aos grandes centros urbanos, à procura de ocupação temporária ou algum
emprego mais estável. O destino da maioria é o estado do Paraná, principalmente a cidade
de Curitiba. Poucos vão tentar a sorte na metrópole de São Paulo. E como a formação
escolar é limitada (de acordo com as informações, é raro quem tem o segundo grau
completo), em geral as mulheres tendem a procurar emprego de domésticas e os homens
em serviços braçais dos mais variados tipos. Com o salário que conseguem receber
trabalhando nas grandes cidades é que muitas filhas e filhos do Ribeirão Grande e Terra
Seca tentam ajudar na complementação do orçamento da família que não desanima de
arriscar a sorte trabalhando na roça.

Entre as muitas dificuldades enfrentadas pela comunidade é preciso registrar o problema da


falta de luz elétrica. Esta é uma das reclamações mais freqüentes que se ouve entre os
moradores do lugar. Os principais atingidos por esta limitação à qualidade de vida são os
moradores das casas que ficam situadas em áreas adjacentes ou no interior do PEJ. Devido
ao controle voltado para proteção do meio ambiente, sobretudo a destruição da mata nativa,
há normas estabelecidas e que proíbem a instalação de rede elétrica nesse local.
31

A solução deste problema também está vinculada à questão da obtenção do titulo definitivo
de propriedade da terra. Informando que o total da área territorial reivindicada pela
comunidade em pauta até Março de 2006, era de aproximadamente 4.570,00 hectares50.
Incluindo nestes cálculos uma certa fração sobreposta ao PEJ. Na verdade, a demanda por
esta extensa fração territorial tinha a ver não somente com o fato da comunidade entender
que a reivindicação de tal extensão territorial era um direito que lhe cabia, por se tratar de
uma área desde o passado remoto ocupada pelos seus ancestrais, mas, sobretudo, estava
relacionada com a preocupação de se ter resguardado as nascentes dos rios.

E conforme foi enunciado na introdução deste relatório, houve uma série de conversas e
negociações em torno da demarcação dos limites do PEJ e a extensão da área que
continuaria então a ser alvo da reivindicação da propriedade por parte da comunidade
Ribeirão Grande e Terra Seca. As negociações avançaram e o diálogo logrou êxito e se
chegou a um acordo. De um lado, o Grupo Interestadual de Trabalho do PEJ (GT) ∗ e, de
outro, as lideranças da “Associação dos Remanescentes dos Quilombos dos Bairros
Ribeirão Grande e Terra Seca” estes representantes concordaram em ceder um pouco na
exigência referente à extensão total da área em questão. Desse modo, no que concerne
especificamente à área sobreposta ao PEJ incluída no total da fração territorial alvo das
reivindicações pela comunidade houve a aceitação por parte das lideranças comunitárias de
se ter reduzido da mesma, aproximadamente, 768,93hectares 51. E sendo assim, a área total
efetivamente reivindicada pela comunidade passou a corresponder, aproximadamente, a
3.601,80 hectares (ver: “Documentos anexos/configuração em mapas...).

50
Fonte: Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva”/ ITESP - Mapa da
“Proposta de área Reivindicada pelas Comunidades Quilombolas do Município de Barra do Turvo:
Reginaldo, Ribeirão Grande, Terra Seca, Cedro, Pedra Preta (Paraíso) - resultado de reuniões com integrantes
de cada comunidade, Instituto Florestal e ITESP, Março de 2006.

Ao mencionar novamente este grupo utilizarei a sigla GT do PEJ.
51
Fonte: Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva”/ ITESP - Mapa da
“Área Reivindicada pela Comunidade Quilombola Ribeirão Grande, Terra Seca – Município Barra do Turvo -
resultado do acordo entre o Grupo de Trabalho PEJ e a comunidade, no dia 19/08/ 2006.
32

É preciso registrar que no dia 25 de Outubro de 2006 foi realizada uma reunião do
Conselho Consultivo do PEJ52. A proposta desse encontro era debater o novo mosaico do
PEJ juntamente com as comunidades tradicionais e demais sujeitos envolvidos na questão
– “posseiros” inclusive. Nesta reunião foi apresentado em telão o novo mosaico do PEJ de
modo a facilitar o acompanhamento da explanação feita pelo representante do Conselho, e
esclarecer aos presentes, através da configuração em mapas, a localização das áreas
identificadas como estando dentro e nas adjacências da divisa do PEJ. De volta para
Ribeirão Grande, à noite depois de passada a reunião, nas conversas com os representantes
da “Associação...” que participaram da mesma pude perceber que, embora eles
manifestassem estarem satisfeitas com o acordo negociado com o GT do PEJ, algumas
dúvidas relacionadas ao assunto haviam ficado e os estavam preocupando bastante os
interlocutores. Este incômodo estava relacionado á questão das categorias APA (Área de
Proteção Ambiental) e RDS (Reserva de Desenvolvimento Sustentável). É preciso ressalvar
que tais dúvidas estavam incomodando não somente os remanescentes quilombolas de
Ribeirão Grande e Terra Seca, mas também os demais representantes das comunidades
vizinhas – Reginaldo, Cedro e Pedra Preta. Portanto, a questão que se levantava era quanto
ao esclarecimento do sentido jurídico e as implicações que tais categorias enunciadas (APA
E RDS) poderia ou não trazer para as comunidades remanescentes de quilombos da região;
particularmente no que diz respeito ao fato de lhes serem concedidos ou não, pelo governo
paulista, o título definitivo de propriedade das áreas reivindicadas, porém, sobrepostas ao
PEJ53.

Entre as dúvidas apontadas, uma delas não está relacionada – pelo menos a princípio - com
a situação das comunidades tradicionais, ou seja, a questão da categoria APA (Área de
Proteção Ambiental); a outra, sim, sendo esta concernente à categoria RDS (Reserva de
Desenvolvimento Sustentável). Com o intuito de obter um esclarecimento melhor sobre o

52
Esta reunião foi realizada no Núcleo do Cedro (Sede Florestal do Parque Estadual Jacupiranga), localizado,
aproximadamente, no Km 442 da Br 116.
53
Com efeito, no momento em que escrevo estas linhas acabo de atender, em minha casa, o interurbano da
coordenadora da “Associação...”, Nilce Pereira. O assunto principal é a confirmação da proposta de reunião
para o final desta semana, dia 19 de janeiro de 2007; entretanto, ela aproveita a oportunidade para comentar
brevemente sobre a reunião que fizeram ontem, 14 de janeiro, juntamente com as comunidades vizinhas
(Reginaldo e Cedro) e na qual, ao que me transpareceu na conversa, foi consensual o desacordo com
referência a esta categoria “RDS”, justamente por isto que foi enunciado acima.
33

significado preciso e as implicações ou não destas categorias para as comunidades


tradicionais foi que lideranças locais decidiram convocar uma reunião específica para tratar
desses assuntos, com a participação das referidas comunidades rurais pertencentes ao
município de Barra do Turvo – e demais interessados -, a ser realizada na sede da
“Associação...”, Ribeirão Grande. Esta reunião de fato ocorreu na data de 24 de Novembro
de 200654.

Como mencionei anteriormente, a situação das comunidades tradicionais, incluindo as


remanescentes de quilombos, é diferente e não estava sendo proposta pelo Conselho de PEJ
sob a inscrição da categoria APA. É preciso esclarecer que a categoria APA diz respeito às
áreas ocupadas por terceiros, ou seja, pessoas ou grupo familiar que invadiram áreas do
PEJ, após a data de fundação do mesmo. Conforme a explicação localizada em RTC do
ITESP55, “Segundo dados de 1996 (e posteriormente atualizados), há 12 Unidades de
Conservação no Vale do Ribeira, compreendendo em torno de 979.949,48 ha. de terra.
Conservação, consubstanciadas em parques ou APA’s (Áreas de Proteção Ambiental),
agem no sentido de preservar a flora e a fauna do Vale do Ribeira, mas empreendem, por
outro lado, um efeito nocivo sobre as comunidades camponesas”.

Embora os ocupantes das áreas cuja proposta de classificação é expressa pela categoria –
APA –, possam vir a adquirir o direito de permanecer no lugar, a exploração e o uso do solo
(plantação de roças, instalação de equipamentos etc) estarão, não obstante, condicionadas
às normas e regras legais estabelecidas para proteção do meio ambiente e preservação
florestal.

No caso particular das Comunidades Tradicionais, no sentido mais amplo, ou seja, os


agrupamentos familiares que reivindicam áreas sobrepostas ao PEJ que, de fato, foram
ocupadas por eles em época anterior à fundação do Parque, a proposta é de serem

54
Através do telefonema que recebi da coordenadora da Associação quilombola de Ribeirão Grande e Terra
Seca, Nilce Pereira, anteontem, 23 de novembro de 2006, primeiro para comunicar-me que havia dado a luz
ao quinto filho na noite anterior, 22 de novembro de 2006, fui informado que esta reunião aconteceria de fato,
no lugar, na data de 24/11/2006.
55
Turatti, Maria Cecília M. – OP. Cit., 2006, p.31.
34

classificadas na categoria RDS ou, traduzindo novamente a sigla: “Reserva de


Desenvolvimento Sustentável”.

Em reunião do GT do PEJ, realizada no dia 13 de Setembro de 200656, foi enfatizado o


reconhecimento pelo governo de São Paulo no que concerne ao direito de ocupação do PEJ
pelas comunidades tradicionais. Sendo esclarecido publicamente que através desta
categoria - Comunidade Tradicional – dever-se-ia compreender tanto os agrupamentos
familiares remanescentes de quilombos, quanto a situação de pessoas individuais ou grupos
que se instalaram dentro do PEJ em época que antecedeu á criação desse Parque. Ao deixar
isso claro é que nesta reunião se confirmou que o compromisso do GT, ao propor a
demarcação territorial do PEJ, ia além da busca de solução imediata para os problemas
relacionados com os interesses do Parque - a segurança e preservação desta extensa área
florestal de Mata Atlântica -, mas, também, tinha como meta propor alternativas voltadas
para garantia da qualidade de vida e o futuro das comunidades tradicionais envolvidas na
questão.

Esta restrição à qualidade de vida o antropólogo foi colocado a par desde os primeiros
contatos com a comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca; e pude conhecer de perto a
extensão do problema ao percorrer a localidade e ter contato com lideranças das outras
comunidades vizinhas – Cedro e Reginaldo. Semelhante à instalação da luz elétrica, a
comunidade Ribeirão Grande/ Terra Seca reclama de outros problemas e situações
particulares, direta ou indiretamente relacionados à questão da regularização da propriedade
da terra. Trata-se de problemas que gerou inúmeras perguntas dirigidas a um funcionário
representante do ITESP, no contexto de uma reunião mensal da “Associação...”57, apenas

56
O local da reunião foi o Parque do Horto Florestal, em São Paulo, capital. O assunto principal da colocado
em pauta era a discussão da minuta de leis proposta para “Alterar os limites do Parque Jacupiranga”; sendo
esclarecido no início do documento: “Artigo 1º.- As alterações e reclassificações das áreas que compõem o
território especialmente protegido pelo Parque Estadual Jacupiranga, criado pelo Decreto Lei, n.145 de 08 de
Agosto de 1969, bem como as novas áreas protegidas que ora se instala, passam a ser regidas pelas
disposições da presente lei, observadas as normas ambientais vigentes, especialmente às contidas da Lei
n.9985 de 18 de Julho de 2000 (SNUC) e seu regulamento Decreto n.4340 de 22 de Agosto de 2002.” (Trecho
anotado pelo antropólogo da “minuta” exibida em telão durante a reunião do “Grupo Intersecretarial de
Trabalho” em 13/09/2006).
57
Refiro-me, aqui, a reunião realizada em 18/09/2006, para a qual fui especialmente convidado a participar,
pela coordenadora da “Associação...”, que entendeu ser ocasião oportuna para a apresentação da pessoa deste
antropólogo à comunidade.
35

para mencionar de passagem: situação das pessoas que “pagavam [imposto] ao Incra”;
“relação com a agrofloresta”; a necessidade “empreendimento social” junto à comunidade,
entre outros.

Entre os graves problemas enfrentados na comunidade detecta-se outro ainda mais


delicado. Trata-se dos conflitos existentes em torno das áreas invadidas por terceiros e que
estão dentro dos limites territoriais reivindicados pelos remanescentes de quilombos ao
governo paulista. Uma situação que parece recorrente e que tende a colocar em risco a
segurança e o controle da ordem internamente na comunidade. Um caso dramático que me
foi narrado pela coordenadora da “Associação...” merece registro. O episódio envolveu um
ancião da localidade e foi motivo que o levou a aceitar a idéia da auto-identificação da
comunidade como remanescente de quilombo.

Conforme a versão ouvida: em um dia de festa na comunidade este ancião não quis que os
parentes o levasse ao local da reunião e preferiu ficar em casa sozinho assistindo televisão.
Aproveitando da situação, assaltante invadiram a casa, amarraram o idoso à cama do quarto
e fugiram em seguida, levando todo o dinheiro recebido por aquele da aposentadoria como
trabalhador rural. As suspeitas levantadas é que os assaltantes eram pessoas de fora que
chegaram no lugar com desculpa de construir casa e plantar dentro da área considerada da
comunidade, uma vez que estes suspeitos desapareceram da localidade desde então. A
partir desse dia este senhor mais velho da comunidade, vitima indefesa dos assaltantes,
decidiu apoiar a fundação imediata da “Associação...” por entender que organizados dessa
forma eles conseguiriam obter o título da terra ocupada e, desse modo, teriam mais
condições de evitar a invasão do lugar por pessoas estranhas ou indesejadas pela
comunidade.

A narrativa deste episódio dramático não deixa de ser expressiva dos receios da
comunidade quanto a situações de violência, entre outras ameaças que poderá ficar exposta,
ao terem o seu lugar de origem invadido por terceiros e com interesses desconhecidos.
36

Relacionado ainda ao comportamento de “invasores” 58, uma acusação que os interlocutores


fazem contra estes sujeitos é que eles não têm preocupação com a preservação do meio
ambiente. Destroem a floresta com prática de queimadas e derrubada abusiva de árvores,
para plantação de roças entre outras atividades relacionadas ao uso do solo. Queixam que
esse modo dele agirem coloca a comunidade numa situação delicada perante as autoridades
responsáveis pela fiscalização do PEJ, uma vez que a tendência é a culpa pelo dano
ambiental recair sobre as costas da população remanescente de quilombos, ao contrário dos
considerados “invasores”, efetivamente morar no lugar (ver: “Diagrama de Parentesco”, ao
final do texto).

A comunidade, porém, não tem muito como controlar a invasão das terras por ela ocupada
tradicionalmente. Devido também ao fato de não possuir o título definitivo de propriedade
da mesma. Entretanto, com a esperança que ora surge da possibilidade de resolver esta
situação, a comunidade tem buscado se mobilizar e, conjuntamente com os representantes
dos povoados vizinhos – Cedro e Reginaldo –, recorrer às instituições que entendem ter a
competência e autoridade para mediar a situação e/ou impedir o abuso dos atos de invasões
ao seu território: o ITESP e a polícia (ver: Documentos anexos/Ocorrência Policial e
Correspondências Oficiais).

A interlocução sugerida acima da comunidade de Ribeirão Grande/Terra Seca com as


vizinhas, Reginaldo e Cedro, já insinuada também em parágrafos anteriores – é prática
comum que advém desde o início do processo de mobilização e organização dos
seguimentos populacionais camponeses remanescentes de quilombos do município de
Barra do Turvo. Através deste processo dialogal estas comunidades têm descoberto que a
proximidade entre elas não está apenas restrita a elos de vizinhança e amizade, mas é
demarcada também por laços familiares e de parentesco. Além disso, esta interlocução veio
contribuir para ampliar a percepção das pessoas e levá-las a compreender que a maioria dos
problemas enfrentados no dia-a-dia por elas não é algo inevitável do destino individual ou

58
Este termo é empregado pelos próprios interlocutores ao fazerem referência a pessoas que não são bem
aceitas pela comunidade, por motivo mesmo de invasão de faixas territoriais reivindicada por aquela ao
governo paulista. Trata-se de pessoas que mantém uma relação conflitiva com a comunidade, conforme
apontei no diagrama de parentesco (vide final do texto).
37

um caso isolado e particular da comunidade que pertencem; mas problemas estruturais cuja
solução depende em grande parte da mediação do poder público, sem dispensar o apoio
generoso de instituições civis voltadas para o trabalho social, tais como ongs, igreja,
movimentos sociais etc. Tendo claro, todavia, que a capacidade da mobilização interna da
comunidade, bem como a união em parcerias locais é fundamental para multiplicar as vozes
e ampliar o eco das suas denúncias e reivindicações.

Mas esta consciência que parece estar sendo tomada atualmente na comunidade Ribeirão
Grande e Terra Seca (e válido também para as demais já mencionadas – Reginaldo e
Cedro) é fruto, sem dúvida, de um trabalho que começou muito antes junto a população
rural do município de Barra do Turvo representado por agentes pastorais ligados à Igreja
Católica, entidades não governamentais de proteção às populações ribeirinhas, e agentes do
movimento negro. Como bem observou Carvalho em RTC sobre a comunidade quilombola
do Galvão59 - “Em muitas comunidades do Vale, onde existe a atuação da Pastoral da Igreja
Católica e do Movimento Negro, a identidade quilombola foi assimilada pela população,
aparecendo como fator positivo na elaboração de lutas políticas”. De fato, foi isso também
que se verificou na comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca através da pesquisa
antropológica realizada.

E para terminar é válido acrescentar que a partir da menção feita diretamente acima, ou
insinuada em capítulos anteriores, sobre a recorrente interlocução entre as comunidades
remanescentes de quilombos do município de Barra do Turvo, torna-se possível evidenciar
não apenas a “consciência de unidade local” destas comunidades, construídas no processo
de luta pela conquista do título definitivo de propriedade das terras tradicionalmente
ocupadas por aquelas, mas também formas de sociabilidade estabelecidas na localidade.
Quanto a esse aspecto, é oportuno ressaltar que elementos da cultura tradicional do meio
rural paulista ainda fazem parte do cotidiano dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca.
Desse modo, a prática do trabalho coletivo – o mutirão – é uma das formas de cooperação e
sociabilidade que se tem buscado preservar dentro da comunidade Ribeirão Grande e Terra

59
Carvalho, Maria Celina P. de - Relatório técnico-científico sobre os remanescentes da comunidade
quilombo Galvão... . 2000, p.11.
38

Seca60. E nesse sentido, as práticas do catolicismo popular merecem aqui ficarem


registradas; tais como a festa em homenagem a São Sebastião, rezas de terço e novenas -
que marcam a dimensão simbólica da comunidade. Mas é preciso ressaltar que outros
elementos culturais também foram criados mais recentemente no lugar, a configurar
espaços da sociabilidade e reforço à integração grupal, como é o caso da festa de eleição da
“Rainha do Quilombo”.

Esta festa reúne toda comunidade – e também a vizinhança. A rainha é escolhida entre as
pessoas mais jovens – pode ser criança ou adolescente, sendo a ganhadora do concurso é
sempre aquela que consegue vender mais rifas para a comunidade. O dinheiro arrecadado é
sempre revertido para a organização do evento. Além do ritual de eleição da “Rainha do
Quilombo”, a festa ainda é animada com barraquinhas, bailes e o sorteio de prendas61.

Portanto, é possível afirmar finalmente que a dimensão lúdica, religiosa e política se


articulam no processo de construção identitária dos povoados Ribeirão Grande e Terra Seca
ao servir de reforço para a consciência e sentimento de unidade entre estes dois bairros
rurais do município de Barra do Turvo e que podem ser traduzidos pela expressão no
singular: comunidade remanescente de quilombo Ribeirão Grande/Terra Seca.

60
Durante período do trabalho de campo, mais especificamente no dia 27 de novembro de 2006, mais de 20
pessoas, entre homens e mulheres, jovens e adultos, moradores nos bairros tanto de Ribeirão Grande quanto
Terra Seca se organizaram em mutirão para cooperar na plantação de cana e mandioca da roça de Nilce
Pereira. Ela estava grávida, aproximando dos nove meses de gestação, e o marido trabalhando fora, em
fazenda distante embora na própria região. Enquanto o grupo trabalhava no campo, algumas mulheres ficaram
na casa ajudando no preparativo da comida, que foi servida comunitariamente depois de terminado a tarefa.
Aproveitei também a ocasião para entrevistar pessoas, e desse modo, registrar informações sobre a genealogia
de parentesco, bem como fotografar os trabalhadores. Momento em que as pessoas fizeram questão de posar
segurando em mãos as suas ferramentas de trabalhos ou montados em lombo dos animais ou em bicicletas.
61
Este ano de 2006, o pároco local – padre Leonardo - foi sorteado com um bezerro, que prometeu doar,
numa oportunidade vindoura, para um banquete reunindo a comunidade e amigos.
39

Imagens de Ribeirão Grande e Terra Seca/Passado e Presente


40

Mapa da Ocupação Fundiária


41

- Capítulo V -

- DAS IDENTIDADES: A IDENTIDADE QUILOMBOLA EM QUESTÃO -

Ao iniciar este capítulo eu quero chamar a atenção do leitor, logo de início, para a citação
destacada no capítulo introdutório deste Relatório e cujo conteúdo gira em torno da
discussão do termo “Remanescente de Quilombo”62. Através da análise do conteúdo da
referida citação verifica-se que a conceituação descritiva - “Remanescente de Quilombo” -
compreende implicitamente a própria noção de identidade étnica. A referência principal dos
estudos que introduzem a noção de identidade étnica é o antropólogo inglês Fredrik Barth.
Em 1969 Barth escreveu um artigo no qual chamou atenção para a noção de “fronteira”,
entendida como elemento fundamental na demarcação da “diferença entre culturas” e
definição do chamado “grupo étnico”. Nas palavras de Barth63: “As diferenças entre
culturas, assim como suas fronteiras e vínculos históricos, receberam muita atenção (até
então pelos cientistas daquela época); contudo, a constituição dos grupos étnicos e natureza
de suas fronteiras não foram examinadas tão sistematicamente”.

A ênfase na “fronteira” estava relacionada ao fato de Barth compreender o “grupo étnico”


como um tipo de “organização social”. Nesse sentido Barth salientou:
“Então, um traço fundamental torna-se [...] a característica da auto-
atribuição ou da atribuição por outros a uma categoria étnica. Uma
atribuição categórica é uma atribuição étnica quando classifica uma pessoa
em termos de sua identidade básica mais geral [...]. Na medida em que os
atores usam identidades étnicas para categorizar a si mesmos e outros, com
objetivos de interação, eles formam grupos étnicos neste sentido
organizacional”, e acrescenta: “As características que são levadas em
consideração não são a soma das diferenças ‘objetivas’, mas somente
aquelas que os próprios atores consideram significantes”. (grifos meus)
(ibidem, 189-190).

A partir da contribuição de Barth os estudos focados na problemática da identidade étnica


se multiplicaram e as discussões referentes a esse conceito puderam ser aprofundadas à luz
dos dados empíricos produzidos através das investigações de campo em lugares diversos,
comunidades diferentes, situações específicas e contextos variados. Entre os vários

62
Vide Introdução, página 3 deste Relatório...
63
Barth, Fredrik, 1997, p188.
42

exemplos que poderia ser citado, interessa mencionar de início os nomes dos antropólogos
Roberto Cardoso de Oliveira e Manuela Carneiro da Cunha, pela importância deles como
referência obrigatória nos estudos sobre a questão da identidade étnica no Brasil.

O antropólogo Roberto Cardoso de Oliveira (1976) foi quem introduziu, primeiramente, na


antropologia brasileira as reflexões sobre a noção de identidade e chamou atenção para o
conceito de identidade étnica. Cardoso de Oliveira procurou demonstrar com base em
pesquisas empíricas64, e apoiado nas contribuições teóricas de Fredrick Barth65 e Abner
Cohn66, que a identidade étnica é uma modalidade de identidade contrastiva e situacional;
configurando, pois, uma “forma de organização social” e da afirmação do “nós” em
oposição aos “outros”.

Cardoso de Oliveira esclareceu que a identidade étnica para ser afirmada depende sempre
da presença do outro. Esta construção se processa em situações específicas de confronto
interétnico nas quais determinado grupo minoritário encontra-se ameaçado por um outro
dominante – no plano cultural ou mesmo fisicamente – e tem a percepção quanto ao risco
que corre de ser efetivamente dizimado. No contexto desta relação de dominação e conflito,
traduzida através da expressão “situação de fricção interétnica”, é que a identidade étnica,
segundo Cardoso de Oliveira, tende a emergir como uma forma de resistência à dominação
que determinado grupo étnico minoritário toma a de consciência de ter-lhe sida imposta
historicamente. Nesse sentido é que a identidade étnica – de acordo com o referido
antropólogo – ao ser construída exige a demarcação intencional das “fronteiras étnicas” de
modo a evidenciar as diferenças entre o “nós” e os “outros”.

A antropóloga luso-brasileira, Manuela Carneiro da Cunha é outra referência importante no


avanço das reflexões e debates sobre o conceito de identidade étnica no campo da

64
Trata-se de pesquisas realizadas nos anos 1970, no norte do país, abordando a problemática da situação de
conflito envolvendo de um lado as populações indígenas, ameaçada da perda das terras por elas ocupadas
tradicionalmente, além da própria vida e, de outro lado, os regionais – fazendeiros interessados na apropriação
das terras ocupadas pelos primeiros.
65
A referência é o artigo deste autor publicado em 1969, intitulado Ethnic groups and boundaries, pela
Bergen-Oslo, Universiteta Forlaget. Londres, George Allen & Unwin.
66
Destaca-se como referência principal o livro intitulado Custom and politics in urban África, em Londres,
pela Routledge and Kegan Paul, primeira publicação também em 1969.
43

antropologia brasileira. O estudo desenvolvido por esta antropóloga sobre a população de


ex-escravos retornados do Brasil para a cidade de Lagos, em África, na metade do século
XIX, teve grande repercussão e trouxe acréscimos significativos para a compreensão,
sobretudo, do aspecto político que tende a envolver o jogo da afirmação da identitária
étnica ou – nos termos da antropóloga – a “etnicidade”.

Manuela Carneiro da Cunha67 retomou as discussões de Cardoso de Oliveira e a partir das


contribuições dos mesmos autores de referência desse etnólogo, Fredrik Barth e Abner
Cohen, ela procurou chamar atenção para o papel operacional dos elementos culturais
traduzidos na expressão “sinais diacríticos”. Elementos culturais manipulados
intencionalmente no processo de construção etnicidade. Os “sinais diacríticos”, segundo
explicou a antropóloga, são elementos retirados da própria cultura do grupo cuja identidade
étnica está em questão, porém, de modo selecionado tendo em vista servir
operacionalmente ao contraste com “outros do mesmo tipo”. É através dos “sinais
diacríticos” – esclareceu a antropóloga - que o grupo busca “explicitar marcadamente” as
diferenças entre o “nós” e os “outros”68.

Conforme a explicou Cunha, a escolha dos “sinais diacríticos” não se dá de maneira


arbitraria. Ao contrário, o grupo que quer marcar a sua diferença em relação aos “outros”
irá depender sempre dos elementos que se encontram disponíveis em um “repertório
cultural” limitado – uma vez que é impossível o indivíduo ou grupo levar “na bagagem”
toda a cultura do lugar de origem, de onde teve que sair ou por força das circunstancias
econômica ou política. Os “sinais diacríticos” funcionam como signos de linguagem, sendo
a escolha dos mesmos condicionadas, segundo a antropóloga, à possibilidade de permitirem
certa inteligibilidade da comunicação: “os sinais diacríticos – escreveu Carneiro da Cunha -
devem poder se opor, por definição, a outros do mesmo tipo (...), assim como roupa deve
ser contrastada com roupa, religião deve ser contrastada com religião” 69.

67
Ver: Cunha, Manuela C. da – Negros estrangeiros..., 1985; Antropologia do Brasil..., 1986.
68
Ibidem, 1986, p. 85-119.
69
Ibidem, p. 100.
44

De um modo geral, da perspectiva teórica dos autores acima enunciados a identidade étnica
deve ser entendida como uma modalidade de identidade contrastiva, situacional e que
depende da presença do outro para ser construída. Trata-se de uma atitude política,
assumida por determinado grupo étnico que se sente ameaçado cultural e/ou fisicamente de
extinção dentro de determinada fronteira territorial e cujos interesses - sejam eles de ordem
econômica, comercial ou política – estão efetivamente colocados em jogo.

Portanto se, por um lado, as reflexões teóricas desenvolvidas por Cardoso de Oliveira
deram destaque, sobretudo, para o fenômeno da identidade étnica compreendida da
perspectiva de Barth, ou seja, com ênfase na idéia do grupo étnico pensado como um tipo
de “organização social”; por sua vez, Cunha destacou o aspecto político desta modalidade
identitária traduzida a partir da definição de grupo étnico em conformidade com a definição
de Abner Cohen, ou seja, um tipo de “organização política”.

A historiadora e antropóloga Lilia Shwarcz ao criticar Cunha observa que essa autora deixa
insinuado na sua forma de interpretação uma ênfase demasiada na predominância da
racionalidade no processo de construção da etnicidade, em detrimento a outros aspectos
subjacentes ao mesmo, conforme ela sugeriu: “[a] identidade não pode ser exclusivamente
definida, dessa forma, como um fenômeno da mais pura imposição e manipulação externa.
Ou seja, apesar de ser objeto potencial de manipulação ideológica, sem a existência interna
de uma ‘comunidade de sentidos’ toda a construção de identidades e tradições tende a
resultar em um imenso vazio70.”

Embora a observação dessa historiadora mereça ser levada em consideração, com efeito, os
escritos de Cunha dialogando com Cardoso de Oliveira, trouxeram contribuições
inovadoras para a antropologia brasileira. Sobretudo no que concerne a referenciais teórico-
metodológicos indispensáveis, principalmente, para os estudos dos segmentos
populacionais indígenas e negros no meio rural - e mesmo no contexto metropolitano –
conforme se pode verificar através dos inúmeros estudos de comunidades, desenvolvidos

70
Shwarcz, L.K.M. – “Complexo de Zé Carioca – sobre uma certa ordem da mestiçagem e da
malandragem”,1995, p.60.
45

no meio acadêmico-científico tomando como referência os estudos destes mencionados


antropólogos.

Interessado em refletir sobre a problemática da “identidade cultural na modernidade tardia”


(traduzido também nos termos de “pós-modernidade”), Stuat Hall71 buscou discutir
criticamente no livro A identidade cultural na pós-modernidade sobre as teorias da
identidade (individual e coletiva) clássicas, argumentando que as mesmas tendem a
convergir no mesmo sentido de pensar este fenômeno como algo “permanente”, “coerente”,
fixa e estável, tendendo sempre à “continuidade” no espaço e no tempo. Desde a noção de
identidade individual presente no pensamento filosófico iluminista, até as concepções
sociológica e antropológica sobre o processo de construção das identidades sociais
construídas coletivamente, esta idéia aparece de forma recorrente.

Diferentemente disso, para Stuart Hall os indivíduos na “pós-modernidade” estão cada vez
mais numa posição de “deslocamento” ou “descentramento” identitários: “as identidades
modernas – salienta Hall - estão sendo ‘descentradas’, isto é, deslocadas ou
fragmentadas”72. Esta não seria, porém, uma experiência exclusiva das identidades
emergentes no contexto da “pós-modernidade”; sendo que a intensificação desse fato nos
dias de hoje oferece maior condição para se reavaliar a pertinência do conceito de
identidade e atentar, sobretudo, para o que, na realidade, pode estar em jogo neste processo
de construção ou identificação cultural. Em sendo assim, o aspecto da politização das
afirmações identitárias torna-se um elemento fundamental73.

Stuart Hall procura argumentar que as identidades são construções provisórias, inacabadas
e incompletas. Assim, escreve o autor, “deveríamos falar de identificação, e vê-la como um
processo em andamento. A identidade surge não tanto da plenitude da identidade que já
está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é ‘ preenchida’ a

71
Hall, Stuart – A identidade cultural na pós-modernidade, 1998.
72
Ibidem, p.8.
73
Ibidem, p.21.
46

partir de nosso exterior pelas formas através das quais nós imaginamos ser vistos por
outros”74.

Estas referências teóricas enunciadas acima auxiliam-nos a entender melhor a posição dos
nossos interlocutores, no contexto hodierno em que se torna imprescindível para eles
assumirem a identidade de remanescente de quilombos; tendo claro que ora está em jogo é
a possibilidade ou não de adquirirem do governo do estado paulista o titulo definitivo das
terras tradicionalmente ocupadas75 pelos mesmos. Com efeito, ao evocarmos
anteriormente os estudos sobre a identidade étnica ou etnicidade a intenção é dar idéia das
motivações possíveis que podem levar as pessoas a buscarem em determinada situação
específica, contexto particular e momento chegado da sua vida a afirmar para si esta
modalidade identitária distintiva, bem como os recursos utilizados para garantir a
visibilidade e marcar de maneira valorativa e positivamente a sua diferença em relação aos
“outros”, ou seja - a manipulação de elementos culturais significativos e operacionais,
como é o caso dos chamados “sinais diacríticos”.

Sem com isso, no entanto, querer insinuar que estou interpretando a comunidade
remanescente de quilombo em foco neste relatório como “grupo étnico”. É para evitar essa
possibilidade de apreensão que chamei atenção na presente exposição também para as
reflexões do antropólogo Stuart Hall em torno da problemática da crise de identidades no
contexto da “pós-modernidade”. Válido salientar o que ele escreve: “A etnia é o termo que
utilizamos para nos referirmos às características culturais – língua, religião, costume,
tradições, sentimento de ‘lugar’ que são partilhadas por um povo. É tentador, portanto,
tentar usar a etnia dessa forma ‘fundacional’. Mas essa crença acaba, no mundo moderno,

74
Ibidem, p.39.
75
A propósito desta expressão Alfredo Wagner B. de Almeida esclarece o seguinte: “[...]as terras indígenas
são definidas como bens da União e destinam-se à posse permanente dos índios, evidenciando uma situação
de tutela e distinguindo-se, portanto, das terras das comunidades remanescentes de quilombos, que são
reconhecidas na Constituição de 1988 como de propriedade definitiva dos quilombolas. Não obstante esta
distinção relativa à dominialidade, pode-se afirmar que ambas são consideradas juridicamente como ‘terras
tradicionalmente ocupadas’ seja no texto constitucional ou nos dispositivos infraconstitucionais e enfrentam
na sua efetivação e reconhecimento obstáculos similares. De igual modo são consideradas como ‘terras
tradicionalmente ocupadas’ e enfrentam obstáculos à sua efetivação, aquelas áreas de uso comum voltadas
para o extrativismo, a pesca, a pequena agricultura e o pastoreio, focalizadas por diferentes instrumentos
jurídicos, que buscam reconhecer suas especificidades[...]” ([destaque do autor] Almeida, Terras de
quilombo, terras indígenas..., 2006, p.28.).
47

por ser um mito. [...]. As nações modernas são, todas, híbridos culturais.”76 Isso significa
compreender que as identidades ou processos de identificação também se dão a partir da
articulação com outras referências a partir do exterior e/ou no interior do próprio sujeito –
não obstante as contradições presentes77.

Lembro-me aqui de algumas situações observadas durante o trabalho de campo que servem
para ilustrar o que acabo de escrever. Duas delas estão relacionadas com a identificação das
pessoas da comunidade com o antropólogo. Em primeiro lugar cito o meu contato inicial
com a comunidade. Estava acompanhado da equipe do ITESP e ao descer do carro e ser
apresentado por uma representante desse órgão à coordenadora da “Associação...”, a
mesma exclamou para um grupo de lideranças da comunidade que estavam à porta da
cozinha comunitária, próxima a sede desta entidade: “Então, o antropólogo é um de nós...”.
E todos concordaram com um gesto de aceno de cabeça e um sorriso nos lábios. Num
segundo momento, durante conversa informal – e divertida – com um interlocutor, esse,
depois de desculpar-se pelo “modo de falar”, devido à “falta de estudo”, indagou-me de
repente:“Ôh Rubens... ‘ocê também é descendente de quilombola, não é?!”78.

Outra situação que me chamou atenção foi o contexto de conversa descontraída entre
algumas pessoas que iriam participar do “mutirão” para plantação de roça da representante
da “Associação...”. Uma pessoa, em tom de brincadeira, disse algo mais ou menos assim:
“para ser quilombola precisava ser negro”. A coordenadora reagiu de modo inesperado ao
gracejo, repreendendo de maneira enfática o falante: “É bom parar com estas ‘brincadeiras’
de quilombo ser formado só por negro. Têm muita gente branca que mora aqui; chega
desses um aí e vai sentir que está sendo discriminado. O quilombo é de todos associados;
não importa se é branco ou negro!”.

76
Ibidem, p.62.
77
Conforme bem esclarece esta citação de Stuart Hall: “[...] A identidade [é] definida historicamente, e não
biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são
unificadas ao redor de um ‘eu’ coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em
diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas”. (Hall,
ibidem, p.13.).
78
Acrescentando de passagem a minha reação. Respondi de maneira humorada que “sim!”; mas só não sabia
onde ficava as terras... E rimos junto, o interlocutor e eu.
48

Por fim, a expressão de uma certa crise de identidade presente na fala da coordenadora da
“Associação...” durante conversa informal com o antropólogo em um final de tarde: “eu sou
remanescente de quilombo, mas só pelo lado materno...”.

As identidades ou “processos de identificações” tendem a emergir em situações de crise,


tendo como referência, sobretudo, o modo particular como o indivíduo é “interpelado” ou
“representado” pelos outros, sugeriu Stuart Hall. As situações empíricas enunciadas acima
admitem em certo sentido este tipo de interpretação. E sugerem, também, que os sujeitos da
comunidade ao refletir sobre a(s) identidade(s) dele(s) também colocam a questão do risco
dessa coletividade se imaginar ou querer se fazer reconhecida como um grupo fechado,
endogâmico ou avesso a diversidade étnica e cultural. Atitude que tendem a repudiar
inclusive pela própria experiência particular deles como sujeitos e coletividade afro-
descendentes, alvo potencial e historicamente do racismo na sociedade brasileira.

A afirmação identitária da comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca pode ser apreendida a


partir de falas e comentários como estes selecionados acima, entre outros ouvidos pelo
antropólogo no trabalho de campo. Mas é preciso não esquecer neste contexto, sobretudo,
das versões narrativas da história oral sobre a origem dessa comunidade, apresentadas no
capítulo III. A análise do conteúdo destas versões de origem bem como da sua
performance79 narrativa possibilita apreender as marcas simbólicas evocadas para afirmar a
diferença identitária étnica da comunidade, no cenário até, mais amplo, da sociedade
brasileira.

O cruzamento das versões de origem da comunidade com os dados levantados sobre


genealogia de parentesco, durante a pesquisa antropológica de campo, contribui para
verificar que, de fato, a maior parte dos moradores dos bairros rurais Ribeirão Grande/Terra
Seca pertencem a umas redes entrelaçadas e extensivas de parentesco, cujas referências

79
É inovadora e crescente o debate em torno desta categoria no campo das ciências sociais, particularmente
destacando o cenário da antropologia. Entre as principais referencias a frente desta discussão acadêmico-
científica destaca-se o NAPEDRA – Núcleo de Antropologia da Performance e do Drama, da Universidade de
São Paulo/USP.
49

principais de origem são os três ancestrais relembrados: Miguel de Pontes Maciel, Benedito
Rodrigues de Paula e Pacífico Morato de Lima.

Ao afirmar a sua identidade de remanescente de quilombo, os sujeito interlocutores buscam


articular a relação de continuidade entre o passado e o presente da comunidade Ribeirão
Grande/Terra Seca. Desse modo, atestando que é justa a reivindicação feita por eles, através
da “Associação dos Remanescentes de Quilombos dos Bairros Ribeirão Grande e Terra
Seca”, ao governo paulista da obtenção do título definitivo de propriedade da terra
tradicionalmente ocupada por esta coletividade.
50

- Capítulo VI -

Ao chegar o momento desta conclusão eu gostaria de reenfatizar que o propósito deste


Relatório Técnico-Científico foi apresentar um estudo sistemático e rigoroso sobre a
comunidade de Ribeirão Grande/Terra Seca, localizada no município de Barra do Turvo,
estado de São Paulo. Procurou-se, desse modo, fazer o levantamento das origens históricas
dessa comunidade, as configurações sociais e simbólicas da sua organização, bem como
evidenciar as condições de vida e de existência que caracterizam a realidade atual da
mesma.

É com base nesse trabalho de pesquisa antropológica intensivo que se tornou possível
comprovar a origem quilombola da Comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca. Ficou
demonstrado que quase a totalidade das famílias que formam esta comunidade é
descendente de ex-escravos, a repetir aqui os nomes de Pacífico Morato de Lima, Benedito
Rodrigues de Paula e Miguel de Pontes Maciel. Esse último descrito como filho de um
escravo que se tornou livre ao ser abandonado na região pelo seu senhor, quando esse
decidiu partir para Minas interessado no empreendimento da mineração aurífera, naquelas
paradas. É com orgulho, pois, que os mais velhos da comunidade relembram os nomes
destes ancestrais para os filhos e netos, com a esperança, talvez, que eles guardem a
imagem vivificada destes antepassados memória e como referência exemplar da maneira de
ser e agir no mundo indiferente aos obstáculos que a vida oferece.

Esta memória ainda viva dos antepassados, com certeza, foi o que fortaleceu o ânimo e deu
coragem para as lideranças atuais da “Associação das Comunidades Remanescentes dos
Quilombos dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca” insistirem na organização e registro
dessa entidade sem fins lucrativos. Um passo importante e significativo para eles
manifestar decididamente a intenção e o desejo emergente de valorizar a sua diferença
histórica e social, como indivíduo e coletividade rural, e, desse modo, afirmar
positivamente e fazer reconhecida a especificidade da sua identidade étnica.
51

É com ênfase nesta afirmação identitária étnico-quilombola, portanto, que neste Relatório
Técnico-Científico sustenta-se o argumento de que é justa a reivindicação feita pela
Comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca ao governo paulista - e direito incontestável da
mesma – a obtenção do título definitivo de propriedade dos 3.601, 80 hectares,
aproximadamente, da terra tradicionalmente ocupada no município de Barra do Turvo,
localizado no alto do Vale do Ribeira.

A partir da investigação antropológica empreendida pude de perto verificar o profundo


vínculo prático-simbólico da Comunidade de Ribeirão Grande/Terra Seca com o espaço-
territorial que ocupa, sendo oportuno ressaltar a importância de sua garantia para a
implementação de formas de produção que venham promover melhorias na qualidade de
vida e condições dignas de sobrevivência para esta referida comunidade. Isso está de
acordo, inclusive, com a posição do Grupo de Trabalho criado pelo Governo do Estado de
São Paulo por meio do Decreto n.40.723, de 21 de março de 199680 quando salienta: “[...]
que o território, em todo seu perímetro, necessário à reprodução física e cultural de cada
grupo étnico/tradicional só pode ser dimensionado à luz da interpretação antropológica e
em face da capacidade suporte do meio ambiente circundante tendo em vista as necessidade
de garantir a melhoria de qualidade de vida de seus habitantes, através da implementação
de projetos econômicos adequados, conservando-se os recursos naturais para as gerações
vindouras”. E queremos ressaltar, ainda, antes de concluir este Relatório Técnico-Científico
que estamos considerando as posições deste G T referido acima, as quais são as seguintes:
- que é a “vontade política e visão social do governo paulista de atender e interpretar
o mandamento constitucional, não como obrigação estatal imposta pela lei, mas
principalmente como um ideal da democracia, de proteção aos direitos humanos e respeito
às minorias, a ser perseguido permanentemente”;
- o reconhecimento do GT quanto à necessidade de tratar de forma diferenciada a
identificação dos territórios de comunidades quilombolas, visto que “o cadastro rural
previsto pelo INCRA ou mesmo o cadastro de terras do patrimônio imobiliário estadual
usado para a ‘legitimação de posse e para embasar as ações discriminatórias são incapazes
de detectar apropriações comunais extensas que compõem territórios tradicionais”;

80
Vide nota de rodapé n.1.
52

- que uma das diretrizes do GT destaca a “necessidade de rever procedimentos


técnicos e jurídicos dos órgãos afetos à questão do ordenamento fundiário, agrário,
territorial e ambiental para reconhecer e incorporar as diferenças étnicas e culturais
proporcionando o reconhecimento e a proteção, pelo Estado, dos segmentos portadores
dessas referências e de seus direitos”.

É, portanto, considerando estas posições do GT e os resultados da pesquisa antropológica


realizada que concluímos que a Comunidade Ribeirão Grande/Terra Seca é
remanescente de quilombo, de acordo com as definições que embasam os critérios oficiais
de reconhecimento adotados pelo Estado de São Paulo. Salientando, para terminar, que por
ocasião da titulação das terras a Procuradoria do Estado, juntamente com o ITESP, devem
promover amplos debates com a comunidade a respeito do tratamento a ser dado pelo
Estado à situação dos pequenos posseiros que moram, possuem imóvel ou trabalham no
lugar para que o processo de titulação não gere desavença ou venha acirrar a situação de
conflito já existente - o que, com certeza, poderá ser evitado através do diálogo e
negociação bem conduzidos.

Rubens Alves da Silva


Antropólogo
53

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ALMEIDA, Alfredo Wagner B. de – Terras de quilombo, terras indígenas e fundos de


pasto: terras tradicionalmente ocupadas. Manaus: PPGSCA-UFAM, 2006.

ALMEIDA, Alfredo Wagner B de – “Os quilombos e as novas etnias”. In.: Leitão (org.)
Direitos territoriais das comunidades negras rurais. São Paulo, Instituto Sócio-
Ambiental, 1999.

ANDRADE, Mário de (coord. Alvarenga, Oneida; Toni, F. Camargo) – Dicionário musical


brasileiro. Belo Horizonte: Itatiaia; [Brasília, DF]: Ministério da Cultura; São Paulo:
Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo. (Coleção reconquista do Brasil. 2ª série; v. 162), 1999.

ANDRADE, Tânia et alli (eds) – [2ª ed.] Negros do Ribeira: reconhecimento étnico e
conquista do território – São Paulo: ITESP; Páginas e Letras – Editora gráfica
(Cadernos do ITESP; 3), 2000.

ASSUNÇÃO, M.R. – “Quilombos maranhenses”. In.: Reis J. R e Gomes, F.S (org.) –


Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo, Cia. das Letras,
1996.

BANDEIRA, Maria de L. - Território negro em espaço branco – estudo antropológico de


Vila Bela. São Paulo: Brasiliense, 1988.

BARTH, Fredrik – “Grupos étnicos e suas fronteiras”. In.: POUTIGNAT, Philippe;


STREIFF-FENART, Jocelyne. Teorias da etnicidade. São Paulo: UNESP, 1997.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues – Olhares cruzados: visões e versões sobre a vida, o


trabalho e o meio ambiente no Vale do Ribeira. São Paulo: Instituto Sócio-Ambiental

BRANDÃO, Carlos Rodrigues - O divino, o santo e a senhora. Funarate/Campanha de


defesa do folclore brasileiro. Rio de Janeiro, 1978.

CANDIDO, Antônio – Os parceiros do rio bonito: estudo sobre o caipira paulista e a


transformação dos seus meios de vida. São Paulo: duas cidades; ed 34, 2003.

CARVALHO, Maria Celina P. de Relatório Técnico-Científico sobre os quilombos


remanescentes da comunidade de quilombo do Galvão, Municípios de Eldorado e
Iporanga – SP. São Paulo: ITESP, 2000.

CARVALHO, Maria Celina P. de e Schmitt - Relatório Técnico-Científico sobre os


quilombos remanescentes da comunidade de quilombo do Nhunguara, localizada nos
Municípios de Eldorado e Iporanga – SP. São Paulo: ITESP, 2000 – mímeo.
54

COHEN, Abner - Custom and politics in urban africa : a study of hausa migrants in
yoruba towns. [1ª.ed.1969]London: Routledge & Kegon Paul, 1974.

CUNHA, Antônio G. da – Dicionário etmológico nova fronteira da língua portuguesa. [2ª


ed.]. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996.

CUNHA M. C. da – Antropologia do Brasil: mito, história, etnicidade. São Paulo:


Brasiliense/EDUSP, 1986.

CUNHA, M. Manuela Carneiro L. C. da – Negros estranhgeiros – os escravos libertos e


sua volta à África. São Paulo: Brasiliense/EDUSP, 1985.

FERNANDES, Francisco – Dicionário de sinônimos e antônimos da língua portuguesa.


[35ª ed]. São Paulo: Editora Globo, 1996.

FERREIRA, Aurélio Buarque de H. e J.E.M.M (eds) – Dicionário Aurélio básico da língua


portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira S/A., 1988.

FOX, Robin – Parentesco e casamento – uma perspectiva antropológica. Lisboa: Editora


Vega, 1986.

HARVEY, David – Condição Pós Moderna. São Paulo: Loyola,1998.

HALL, Stuart – A identidade cultural na pós-modernidade. [2ª.ed] Rio de Janeiro: DP&A,


1998.

LIMA, Henyo T. B. e FILHO, Carlos de S. (Orgs.) – Antropologia e identificação – os


antropólogos e a definição de terras indígenas no Brasil, 1977-2002. Rio de Janeiro:
Contra Capa Livraria /LACED /CNPq/ FAPERJ/ IEB, 2005.

MARCUS, George. “Identidades passadas, presentes e emergentes: requisitos para


etnografias sobre a modernidade no final do século XX ao nível mundial”. In.: Revista
de Antropologia. São Paulo: USP, 1991.

OLIVEIRA, Roberto Cardoso de - Identidade, etnia e estrutura social. São Paulo: Livraria
Pioneira Editora, 1976.

PAULA, Luis Roberto de - Reconhecimento da comunidade de quilombo do Camburi,


localizada no Município de Ubatuba – SP. São Paulo: ITESP, 2005.

QUEIROZ, Maria Isaura P. – Vale do Ribeira: pesquisas sociológicas. São Paulo:


DAEE/USP, 1967.

SHWARCZ, Lilia K.M. – “Complexo de Zé Carioca – sobre uma certa ordem da


mestiçagem e da malandragem”. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. São Paulo:
ANPOCS, nº 29, ano 10, 1995.
55

SILVA, Aracy Lopes da - Nomes e amigos: da pratica xavante a uma reflexão sobre os je.
São Paulo: FFLCH/USP, 1980 (Tese de Doutorado).

SILVA, Rubens Alves da – Negros católicos ou catolicismo negro?Um estudo sobre a


construção da identidade negra no congado mineiro. Belo Horizonte: Departamento de
Sociologia e Antropologia/Universidade Federal de Minas Gerais, 1999 (Dissertação de
Mestrado em Sociologia – ênfase: Sociologia da Cultura).

STUCHHI, Deborah (coord.) – Laudo antropológico. Comunidades negras de


Ivaporunduva, São Pedro, Sapatu, Nhunguara, André Lopes, Maria Rosa e Pilões. São
Paulo: Ministério Público Federa de São Paulo, 1998.

TURATTI, Maria Cecília M. - Relatório Técnico-Científico sobre os quilombos


remanescentes da comunidade de quilombo de Morro Seco/Iguape – SP. São Paulo:
ITESP, 2006.

Internet:

Barra do Turvo/ Copright 2004 – Vale do Ribeira


Wikipédia, a enciclopédia livre.
56

- Diagrama de Parentesco -
O diagrama de configuração da genealogia de parentesco que será apresentado mais abaixo
foi elaborado com a finalidade única e exclusiva – e não mais que isto – de indicar quais
são as famílias que possuem vinculo direto de parentesco com os ancestrais reconhecidos
como fundadores dos povoados rurais de Ribeirão Grande e Terra Seca.

As informações para elaboração deste diagrama foram levantadas em dois momentos


distintos. Primeiramente, com a colaboração da Coordenadora da “Associação...”,
convidamos um dos responsáveis pela família (pai ou mãe - mas deixando livre a escolha
de outro representante) para nos prestar informação na casa desta liderança.

Em um segundo momento eu procurei revisar as informações preliminares através de visita


domiciliar. Aproveitei, ainda, para completar o registro com novos dados obtidos. A forma
da exposição do diagrama – por casa –, foi inspirado no método utilizado pela etnóloga e
professora já falecida da USP, Dra Aracy Lopes da Silva, em sua tese de doutorado -
Nomes e amigos... (vide Referência Bibliográfica).

Válido mencionar, ainda, que juntamente com a atividade descrita neste segundo momento,
também foi feito levantamento dos pontos de referencia da área ocupada, com o recurso de
GPS operado pelo geógrafo da equipe, Rogério G. Gama. Todo o trabalho deste segundo
momento foi acompanhado de perto pelo técnico do ITESP, Luiz Baeta∗, representante do
“G.T.C. Formação-Pariquera-Açu”.

Importante ressaltar que as famílias configuradas neste diagrama genealógico de parentesco


são aquelas cujo(s) responsável(is) é (ou são) filiado(s) à “Associação...”. Condição exigida
pela comunidade para a pessoa ou grupo – independente de ser descendente ou não dos
ancestrais fundadores dos povoados de Ribeirão Grande e Terra Seca – tornar-se aceito e
reconhecido como um parceiro na luta pela obtenção do título de propriedade definitiva da
terra tradicionalmente ocupada pelos remanescentes de quilombos dessas localidades; e,


A quem agradeço imensamente a generosa colaboração neste e outras situações do trabalho de campo.
57

portanto, poder gozar de todos direitos bem como usufruir as garantias oferecidas por esse
documento legal.

Enfim, a legenda que segue abaixo ajudará o leitor a decifrar os códigos e a entender
melhor a exposição feita e o que está sendo dito através das figuras geométricas e cores
constitutivas deste diagrama de parentesco.
58

LEGENDA

REFERENTE SÍMBOLO

Independe do sexo

Feminino

Masculino

Filiação

União (casado ou amigado)

Separação

Viuvez

Irmãos

Pessoa falecida

Faltou Informação ?

Famílias Cores
Família de Miguel]
Pontes Maciel

Família de Benedito
Rodrigues de Paula

Família de Pacífico
Morato de Lima

Agregados

Relação de conflito com a comunidade

Trabalhando fora

Reside em outra localidade


59

Diagrama de referência aos ancestrais e à primeira geração dos Remanescentes de


Quilombo dos bairros Ribeirão Grande/Terra Seca, município de Barra do Turvo - SP.

(1)
Joaquim
de
Pontes
Maciel
? ?

Paulo Frausminda Luciano Maria Pedro Joana Geraldo Antônia Sebastião Bernardino

(Referências ancestrais)
Miguel Benedito R. P

(1º.Geração) Verônica Josefa X.R. Maria X.R

1 2 3 4 5

Francisco José Bernardo Antonio Miguel Sebastião Angelina Madalena

(1º.Geração) 6

Izaltino João Pedro Francisca Sebastiana Clara Maria Benedita

Pacifico Morato de Lima

(Referência ancestral)
Sebastiana Dias

(1º.Geração)

Marco Gonçalo Francisco Feles Miguel Amâncio Maria Luiza


60

Diagrama de referência aos agrupamentos familiares atualmente ocupantes dos bairros


Ribeirão Grande/ Terra Seca e sua relação de parentesco ancestral, distribuídos por casas.

(2)

- Casa 1 -
Referência : Angelina Pontes Maciel
Viuva.

Gonçalo 5 Angelina

7 Anisia 8 Maria 9 José 10 Carlos 11 Lourdes 12 Dimas

..............................................................................................................................................................................................................

(3)
- Casa 2 -
Referência: Anízia de Pontes Morato
Viúva.(?).

?
7 Anisia

14 Sebastiana 15 16

13
Aparecida André Marcia

15 Jéssica

Obs.: 15 – Jéssica : Aos cuidados da avó.


...................................................................................................................................................
61

(4)

- Casa 3 -
Referência: Alexandra de Lima.
Viúva.

17
Francisco 18 Ana

19 Alexandra

20 21 22 23 24
Jandira Aristide Natair Josefir Rosana
..............................................................................................................................................

(5)
Referência: José Morato Pontes de Lima.

- Casa 4 - (Não Associado)

9 José

...................................................................................................................................................

(6)
Referência: Renato Rodrigues dos Santos.
Cônjuge: Balbina Belemer.

- Casa 5 - (Não associado). 25 26


Renato Balbina

...................................................................................................................................................
62

(7)

- Casa 6 -
Referência: José Pedroso.
Cônjuge: Alcina de Moura.

27 28
José Alcina

29 30 31 32 33 34 35 36 37
Mário Rosa João Doriti Tereza Antonio Rafael Maurício Santina

...................................................................................................................................................
(8)

Referência: José Vieira Sampaio.

- Casa 7 - (Não Associado).

38 José
...

................................................................................................................................................(
63

9)
Referência: Camilo Pontes Maciel.
Cônjuge: Maria Rosa.
- Casa 8 -

Bernardo Rosa

M. Rosa
39 40 41 42 43 44

Ivanilda Neuzita Camilo Abraão Izaíra José

45 46 Erisvaldo 47 48 Maria A. 49 50 Debora 52 53 54 Marcelo


Aparecida
Inês Levi Claudemir
Elizete

55 56 57 ? 58 59 60 ? 61
Tairis Ramon Mateus Felipe Marcelo

Obs.:
58 – Mateus: aos cuidados dos avós.

41 – M. Rosa: Irmã de Luiz 62 (Casa 9).

..................................................................................................................................

(10)
Referência: Luiz Rodrigues dos Santos
Cônjuge: Maria José dos Santos
- Casa 9 -

62 63
Luiz Maria

Obs.: 62 Luiz: vínculo de parentesco nas casas 8;11; 12; e 59.

...................................................................................................................................................
64

(11)
Referência: Renato Rodrigues dos Santos
Cônjuge: Balbina Belemer

- Casa 10 -
64 65
Renato Balbina

...................................................................................................................................................

(12)

- Casa 11 -
Referência: Antenor Lemos dos Santos.
Cônjuge – Roseli Aparecida Maciel dos Santos.

66 67
Antenor Rosely

72 73 74
68 69 70 71
Silvia M. Lourdes Sheila Renata Cristian Talia Ray

...................................................................................................................................................
65

(13)

- Casa 12 -
Referência: Abraão de Pontes Maciel.
Cônjuge – Osminda Lemes dos Santos Maciel.

42 75
Abraão Osminda

Aroldo Edinho Néia Zeca 85 Luis 86


76 77 78 79 80 81 82 83 84

Jandira Zeneide Lauridir Anilda Ilza Estélio

87 88 89 90 91 92 93 94
? ? ? ? ? ? Lucas
?

Obs: 75 – Osminda: Irmã de Luiz 62 (Casa 9).

...................................................................................................................................................

(14)

Referência: Francisca Bezerra da Conceição de Paula.

- Casa 13 -
95
Francisca

...................................................................................................................................................

(15)
Referência: Miguel dos Santos.
Cônjuge: Isabel de Fátima Vieira.

- Casa 14 -

96 97
Miguel Isabel

98
?
...............................................................................................................................................
66

(16)

- Casa 15 -
Referência: José Pereira de Freitas.
Cônjuge – Joana de Freitas.

99 100
José Joana

101 102 103 104


Márcio Marcos Maurício Márcia

105 Lucas

...................................................................................................................................................

(17)

- Casa 16 –
Referência: Alcides Xavier Rocha.
Separado.

Manoel Clara

Marines
106 107 108 109 110

Henrique José Alcides Francisca Mauro

111 112

Cristina Izaque

.............................................................................................................................................
67

(18)

- Casa 17 -
Referência: Pedro Gonçalves Pedroso.
Viúvo.

BeneditoRP

PedroGP
Josefa P. Maria XR

Benedito Benedita

112 113 114 115

Raul Francisco Antério Pedro Rita

Wanderley Rudney
116 117 118 119 120
Zeneide Creide Dolíria

121 122 123 124

Reroldy Meireane Gledson Ana

..................................................................................................................................................

(19)

- Casa 18 -
Referência: Zeneide Xavier Pedroso.
Cônjuge – Wanderley Rodrigues de Paula.

116 117
Zeneide Wanderley

121 122

Reroldy Meireane

...................................................................................................................................................
68

(20)

- Casa 19 -
Referência: Francisca Xavier da Rocha Pontes.
Cônjuge – Eduardo da Rocha Pedroso.

Manoel Clara

124 123
Eduardo Francisca

126 Edralf

125 127 128 129


Zenilta Edcardo Davi Edvalto

130
Tainar
...................................................................................................................................................

(21)

- Casa 20 -
Zenilta da Costa Pedroso.
Cônjuge – Edralf Gonçalves.
125 126

Zenilta Edralf

130
Tainar

.................................................................................................................................................

(22)

Referência: Dasil
Cônjuge: Anilda de Paula Pereira.

- Casa 21 - (Não associados). -


131 132

Dasil Anilda

...................................................................................................................................................
69

(23)

Referência: Vitório Albers.


Cônjuge: Paula Pereira.

- Casa 22 -

133 134
Vitório Paula

...................................................................................................................................................

(24)
Referência: Dona Nena.

- Casa 23 - (Não associada). 135

Dona Nena

...................................................................................................................................................

(25)
Referência: Inocêncio.

- Casa 24 - (Não associado).

136
Inocêncio

...................................................................................................................................................
(26)
Referência: Lucia Rute Pereira de Paula.
Cônjuge: Sebastião de Paula.

- Casa 25 -

137 138

Sebastião Luci
...................................................................................................................................................
70

(27)

Referência: Ozico Pereira.


Cônjuge: Paula Pereira.

- Casa 26 – (Não Associados).


139 140
Ozico Paula

...................................................................................................................................................

(28)

Casa 27
Referência: Juvenal de Lima.
Cônjuge – Genir de Paula Pereira.

1
Francisco Ana Dias

Juvena 142 Genir 143 144 145 146


141
Valdomiro Benedito Alexandra Pedrina Roque Miguel

Aparecida Sebastião 151 Maria 153 154 Zenaide Adilson


155 156
148 149 150 152 Tereza 157
147 Lúcia Vraldimir Valerino Antônio
Waldir
161 162 163 164 165 166 167 168

Cleiton Suzana Vinicius Fernanda Tatiele Maurício Jéferson Guilherme


158 159 160
Alaina Valdeir Douglas

169 170 171 172 173 174 175 176


Edson Edimir Eliane Edvaldo Waldomiro Tereza Evaí Alinne

Obs.
148 – Aparecida: Bisneta do Pacifico Morato de Lima.
155 – Zenaide: Bisneta de Miguel de Pontes Maciel.

.........................................................................................................................................
71

(29)

Casa 28
Referência: Antônio de Paula.
Conjuge Zenaide Batista Moreira.

177 178
Antônio Zenaide

179 180
Jeferson Carlos
...................................................................................................................................................
(30)
Referência: Nadir Ursolino de Moura.

- Casa 29 -
181
Nadir

...................................................................................................................................................

(31)
Referência: Francisco França de Lima.

- Casa 30 - (Não Associado)


-
182
Francisco

.................................................................................................................................................
(32)
Referência: Luis Dantas.

- Casa 31 - (Não Associado)


183
Luis

...................................................................................................................................................
72

(33)

- Casa 32 -
Referência: Zenóbio Pereira da Cruz.
Cônjuge – Conceição

184 185

Zenobio Conceição

...................................................................................................................................................
(34)

- Casa 33 -
Referência: Waldomiro de Lima.
Cônjuge - Claresdina Alves dos Santos.

186 187

Valdomiro Claresdina

Levi 191Sidnei 193 ? 195 Josimar 197 ? 198 199 200


188
189 190 192 194 196
Maria Osmanilda Áurea Cleuza Adriana Rosilane L.Hernane Luis

201 202 203 204 205


Ramon Lucas Denílson Roger Kauana

Obs.
189 - Levi: filho de Camilo

191 - Sidney : filho de Benigno Morato de Lima.


...................................................................................................................................................
73

(35)

Casa 34
Referência: Eva Rodrigues Barbosa.
Viuva.

João Francisca

Gentil Eva

207 Daniel 209 Regina 211 Leandro ? 216 Mario


213
206 208 210
212 214 215 217
Zenilta Hélio Ruth Tarcisio Vânia Jovania Vilma

? 218 219 ? 210 ? 211 ? 212 ?

Obs. Regina – Filha de Reinaldo da casa 40


................................................................................................................................................

(36)

- Casa 35 -
Referência: Marinelma Rodrigues de Paula. –
Cônjuge - Cláudio Ursulina de Moura.

José Maria

214 213
Claudio Marinelma

215 216
Cláudia Alisson

Obs.: 213 - Marielma: vínculo de parentesco na casa 38 (irmã de Dolíria - 219).

...................................................................................................................................................
74

(37)
Referência: Lauredir Pereira.
Cônjuge: Esmanilda da Costa Pedroso.

- Casa 36 -

217 218
Lauredir Esmanilda

...................................................................................................................................................
(38)
Referência: Maria.

- Casa 37 - (Não associado/casa fechada)

?
Maria

..................................................................................................................................................
(39)

- Casa 38 -
Referência: Doliria Rodrigues de Paula.
Cônjuge – Daucides Marques Reis.

José Maria

220 219
Daucides Dolíria

221 ? 223 Oracilda

220 222 224 225 226 227


Edimilson Gabriel Rosana Eliandro Luciana Lucas

228 229
? Wende

...................................................................................................................................................
75

(40)
Referência: Gabriel de Paula.
Cônjuge: Oracilda.

- Casa 39 -

230 231
Gabriel Oracilda

...................................................................................................................................................

(41)

- Casa 40 -
Referência: Reinaldo Rodrigues de Paula.
Cônjuge – Maria do Carmo.

Simão Maria

Reinaldo
232 233
Maria

237
234 235 236 ? Helio
238
Zenilta Zenilda Regina

? 239 ? 240 ? 241


...................................................................................................................................................

(42)
Referência: Zenilda Rodrigues de Paula
Cônjuge:
- Casa 41 -

241 242
? Zenilda

...................................................................................................................................................
76

(43)
Referência: Regina Rodrigues de Paula
Cônjuge: Hélio

- Casa 42 -

243 244
Hélio Regina

...................................................................................................................................................
(44)
Referência: Laudimir Marques Reis.
Cônjuge: Aurora Pereira.

- Casa 43 - (Não associados)

244 245
Laudimir Aurora
...................................................................................................................................................
(45)

- Casa 44 -

Referência: Pedrina Pontes de Lima.


Cônjuge – Sebastião Américo.

Framcisco Ana

Sebastião 246 Pedrina

248 ? 250 Lauredir 252 ? 253 254 ?


247 249
251
Carmelina Aurora Gilmar Cremilson

256 ? 260 261


255 257 258 259
Daine Isair
? ? ? ?

262
?
Obs.:
250 – Lauredir: filho de José de Pontes/Casa 43.

256 - ?: filho de Francisco Z. Lima/ Casa 50.


...................................................................................................................................................
77

(46)

- Casa 45 -
Referência: Vanilda Aparecida dos Santos.
Cônjuge – Antonio de Paulo.

264 263
Antônio Vanilda

265 266
Gilson Cristiane
Obs.:
264 – Antônio: vínculo de parentesco nas casas 27, 28, 29.
................................................................................................................................................

(47)

- Casa 46 -
Referência: Maria Aparecida Santos.
Cônjuge – Augusto de Souza Santos.

268 267
Augusto Maria

270 271 273 Silmara 275 276 278 279

269 Vanilda Jânea Arlete 272 Daniel 274 Natael Josiel Heloisa Rafael José

280 281
Ricardo Janaina

Obs.:
267 – Maria: filha de Sebastiana 6 (Casa 47).
.............................................................................................................................................
78

(48)

- Casa 47 -
Referência: Sebastiana Rodrigues de Paula.
Viúva.

Benedito GP 6 Sebastiana

282 283 284 267


Aristieu Rubens Raquel Maria

...............................................................................................................................................

(49)
- Casa 48 -
Referência: Arlete Aparecida Souza Santos.
Cônjuge – Jose Pedro dos Santos.

286 285
José Arlete

287 288 289

Jackson Katiele Pablo

Obs.:

285 – Arlete: filha de Maria 267 (Casa 46 e 47).


...................................................................................................................................................
(50)
Referência: Joaquim de Paula.
Cônjuge: Nadir de Paula.

- Casa 49 - 290 291

Joaquim Nadir

...................................................................................................................................................
79

(51)
Referência: Zacarias Lima França.

- Casa 50 - (Não associado).

292
Zacarias
...................................................................................................................................................
(52)

Referência: Ednéia Lima.

- Casa 51 - (Não associada).

293
Ednéia

...................................................................................................................................................
(53)

Cláudia Lima.

- Casa 52 - (Não associada).


294

Claudia

.........................................................................................................................................
(54)
Referência: Delmira Pereira da Cruz da Rocha.
Cônjuge – Mauro Xavier da Rocha.

- Casa 53 -

296 295
Mauro Delmira

297 298
Vinicius Vanessa

Obs.
295 – Delmira: filha de Zenóbio 184 (Casa 32).

296 – Mauro: filho de Clara Xavier da Rocha (1ª.Geração/Rodrigues de Paula).


...................................................................................................................................................
80

(55)

- Casa 54 -
Referência: Jaldir de Pontes Maciel.
Cônjuge – Nadir Ursulina de Moura.

2
Antônio Madalena

298 299
Jaldir Nadir

.
301 Santino 306 307
303 304 305
300 302
Alessandra Luís Ana Daniele Tatiane Luis F.

308 309 310


Leticia Marco Rian

Obs.
299 – Nadir : filha de Joana (mora no Cedro e é neta do Pacífico Morato de Lima).

301 – Santino: Filho de Judite (Irmã de Joana e também mora no Cedro).


...................................................................................................................................................
(56)
Referência: Oswaldo Alves Belemer.
Cônjuge: Paulina de Pontes Maciel.

- Casa 55 - 311 312

Oswaldo Paulina

312 – Paulina: Irmã do Jaldir 298 (Casa 54).

311 – Oswaldo: vínculo de parentesco nas casas 5; 69; 72; e 73.


...................................................................................................................................................
81

(57)

- Casa 56 -
Referência João Miguel.
Cônjuge – Maria de Paula.

2
Antônio Madalena

313 314
João Maria
.

315 316 317 318 319 310 311 312


Wanderley Wanderlúca Wanderléya Juliana Juciléia Vanessa Juciele Lourdes

..................................................................................................................................................
(58)

- Casa 57 -
Referência: Izaíra Pontes Maciel.
Viúva.

43 Izaíra

Pedro Odair

Oriel Rosa 316 Rosana 319 320 Tereza


Nilce Marilda
313 314 315 Leonel 317 318 Ademilson
Rosilene Clenilson 321

322 323 324 325 326 327

Washington Danilo Bruna Xayana Adinilson Vitoria

Obs.:
315 – Rosa: filha de Alcina (mãe mora no Cedro/bisneta do Pacífico M. de Lima).
.................................................................................................................................................
82

(59)

- Casa 58 -
Referência: Marilda Pontes Pereira.
Cônjuge – Ednelson Alves Martins.

321 327
Marilda Ednelson

328 Mariela

..................................................................................................................................................

(60)

- Casa 59 -
Referência: Nilce de Pontes Pereira.
Cônjuge - Oscar Rodrigues Santos.

318 329
Nilce Oscar

330 331 332 333 334


Alana Carlos Victor Jonas Fabio
Obs.
329 – Oscar: filho de Luiz 62 (Casa 9).

...................................................................................................................................................
83

(61)

- Casa 60 -
Valfrido de Pontes Maciel.
Cônjuge - Paulina Pontes Salgado.

335

José Elisa
336
Valfrido 337 338
Valdivino
Paulina

340 ? 341 Eva 343 Waldir 344 Saito 346 347 348
339 349
Elói 342 Rosineia Célia 345 Silvano Waldemir Zélia Versita
Roseli

350 ? 351 352 353 354


Carlos Tiago Kalis Keteler 355 356 357 358
Patrich Andréia Jaíne Jaiane
Obs.

353 - Kalis;354 - Keteler; 355 - Patrich; Andréia – 356: aos cuidados dos avos.

337 – Paulina: vínculo de parentesco na Casa 14.

338 – Valdivino: mora na casa do irmão Valfrido.


...................................................................................................................................................

(62)
Referência: Oriel Pontes Pereira
Cônjuge: Rosa Rodrigues Morato

- Casa 61 –

314 315

Oriel Rosa

322 323 324


Washington Danilo Bruna
.................................................................................................................................................
84

(63)
Referência: Reinaldo Batista Moreira.
Cônjuge: Maria Lúcia Moreira.

- Casa 62 -

359 360
Reinaldo Maria L.

...................................................................................................................................................
(64)
Referência: Domingos Pereira da Silva.

- Casa 63 –

361

Domingos

...................................................................................................................................................

(65)

Referência: Ivanilda Rodrigues de Jesus da Cruz.


Cônjuge: Sebastião Belemer.

- Casa 64 –

362 363
Sebastião Ivanilda

...................................................................................................................................................
85

(66)
Referência: Natalio Rosa.
Cônjuge: Liversina Barbosa Santos Rosa.

- Casa 65 –

364 365

Natálio Liversina

...................................................................................................................................................
(67)
Referência: Abraão de Pontes Maciel.
Cônjuge: Osminda Lemes dos Santos
- Casa 66 –

42 75

Abraão Osminda

...................................................................................................................................................
(68)

Referência: Agamenon Alves.

- Casa 67 – (Não associado e “posseiro”).


366

Agamenon

...................................................................................................................................................
(69)
Referência: Luiz Cardoso.

- Casa 68 – (Não associado e “posseiro”)

367

Luiz
...................................................................................................................................................
86

(70)
Referêcia: Moacir Belemer.

- Casa 69 – (Não associado e “posseiro”)

368
Moacir

Obs.: Relação conflitiva com a comunidade.


...................................................................................................................................................

(71)
Referência: Antenor Lemes dos Santos.
Cônjuge: Roseli Aparecida Maciel dos Santos.

- Casa 70 – 369 370

Antenor Aparecida

...................................................................................................................................................
(72)
Referência: Pedro Ferreira Belemer.
Cônjuge: Francisca Soares de Lima.

- Casa 71 –

371 372

Pedro Francisca

................................................................................................................................................

(73)
Referência: Sebastião Belemer.
Cônjuge: Vanilda Rodrigues de Jesus da Cruz.

- Casa 72 –

373 374

Sebastião Vanilda

..................................................................................................................................................
87

(74)
Referência: Claudemir Belemer.
Cônjuge: Lauredir Belemer.

- Casa 73 –

375 376

Claudemir Lauredir

...................................................................................................................................................

(75)
Referência: Valdomiro de Lima.
Claresdina Alves dos Santos.

- Casa 74 –
377 378

Valdomiro Claresdina

...................................................................................................................................................
(76)

Referencia Alessandra Aparecido Maciel


Cônjuge – Santino Morato Pereira

- Casa 75 -

379 380
Alessandra Santino

381
Leticia
.................................................................................................................................................
(77)

Referencia Ana Rosa Maciel

- Casa 76 - 381
Ana
88

382 Marco
..................................................................................................................................................

(78)

Referencia Tatiane de Moura Maciel.


Cônjuge - ?

- Casa 77 -

383 384
Tatiane ?

385 Rian
89

- Lista de Associados∗ -
01 - Abraão de Pontes Maciel 49 - Luis Carlos de Moura
02 - Adriano Aparecido dos Santos 50 - Lauredir Belemer
03 - Alcides Xaviel da Rocha 51 - Luis Rodrigues dos Santos
04 - Alcina de Moura 52 - Maria Alves Belemer Dias
05 - Alexandra Aparecida Maciel 53 - Maria Aparecida de Lima
06 - Alexandra de Lima 54 - Maria Aparecida dos Santos
07 - Ana Rosa Maciel 55 - Maria do Socorro Sampaio
08 - Ângela Maria Maciel 56 - Maria José dos Santos
09 - Angelina de Pontes Maciel 57 - Maria Lucia Moreira
10- Anísia Pontes Morato 58 - Miguel dos Santos
11 - Antenor Lemes dos Santos 59 - Miguel dos Santos Júnior
12 - Antônio de Paula 60 - Nadir Ursulino de Moura
13 - Antônio Miguel 61 - Nair Rosa dos Santos
14 - Aristide de Paula (?) 62 - Natanael de Souza Santos
15 - Augusta Souza Santos 63 - Nilce de Pontes Pereira
16 - Áurea Alves dos Santos 64 - Nilton Pereira da Cruz
17 - Camilo Pontes Maciel 65 - Oriel Belemer
18 - Carmelina de Lima 66 - Oscar Rodrigues dos Santos
19 - Cícero Adriano de Paula 67 - Osminda Lemes dos Santos
20 - Claresdina Alves dos Santos 68 - Osvaldo Alves Belemer
21 - Claudemir de Pontes Maciel 69 - Paulino Pontes Maciel
22 - Cleide da Rocha Pedroso 70 - Pedrina de Pontes Lima Américo
23 - Cleuza Aparecida dos Santos 71 - Pedro Gonçalves Pedroso
24 - Daniel de Souza 72 - Regina Rodrigues de Paula
25 - Darcir Rodrigues dos Santos 73 - Reinaldo Batista Moreira
26 - Delmiro Pereira da Cruz 74 - Rosana Batista Moreira
27 - Dimas Morato de Lima 75 – Sebastiana Rodrigues de Paula
28 - Doliria Rodrigues de Paula 76 - Sebastião Belemere
29 - Edi Carlos Pedroso 77 - Valdivino de Pontes Reis
30 - Eliza Marques dos Reis 78 - Vanderci Belemer
31 - Elzita dos Santos Moura 79 – Valdomiro de Lima
32 - Esmanilda Aparecida de Lima 80 - Valerino de Lima
33 - Esmanildo da Costa Pedroso 81 - Valfrides de Pontes Maciel
34 - Francisca Xaviel da Rocha Pedroso 82 - Vanildo A. Souza Santos Paulo
35 - Isaíra de Pontes Maciel 83 - Valdinei Dias Belemer
36 - Ivanildo Rodrigues de Jesus da Cruz 84 - Zenaide Batista Moreira
37 - Jaldir de Pontes Maciel 85 - Zeneide Maciel dos Santos
38 - Jandira dos Santos Maciel Reis 86 - Zeneide Xavier da Rocha
39 - Jane Aparecido Souza Santos 87- Zenilda Rodrigues de Paula
40 - João Belemer 88 - Zenillto Rodrigues de Paula
41 - João Miguel 89 - Zenóbio Pereira da Cruz
42 - José Pereira de Freitas
43 - José de Pontes Maciel
44 - Juvenal de Lima
45 - Ivanildo de Pontes Maciel
46 - Leonel de Pontes Pereira
47 - Leversino Barbosa dos Santos Rosa
48 - Luciana Batista Moreira


Informação fornecida por Nilce Pereira - Coordenadora da “Associação dos Remanescentes dos Quilombos
dos Bairros Ribeirão Grande e Terra Seca – Municipio de Barra do Turvo/SP”.
90

Documentos Anexos
91

Ata de Assembléia
(“Ata da Assembléia Geral Extraordinária para ‘Constituição e Fundação” e
‘Aprovação do Estatuto Social’ da Associação dos Remanescentes de Quilombo dos
bairros Ribeirão Grande e Terra Seca)
92

Configuração em Mapas∗ das propostas da área territorial reivindicada através


da “Associação dos Remanescentes dos Quilombos dos Bairros Ribeirão
Grande e Terra Seca”:

- Primeira e segunda propostas de área reivindicada

- Proposta do limite acordada entre o Parque Estadual de Jacupiranga e


as Comunidades Quilombolas

- Proposta da delimitação das áreas quilombolas da “Reserva de


Desenvolvimento Sustentável - RDS”

- Situação fundiária atual da Comunidade remanescente de quilombo


Ribeirão Grande/Terra Seca


Agradecemos a colaboração do “Instituto Florestal/Secretaria do Meio Ambiente” e da “PPI - Procuradoria
do Patrimônio Imobiliário” pela liberação de material técnico (mapa e foto aérea anexados).
93

Registro de Imóveis
94

Mapa e Memorial Descritivo


95

Resumo da publicação no D.O.

Você também pode gostar