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O primeiro processo é a morte clínica que inicia com a (a) parada cardio-
ventilatória. Como o sangue não mais circula o cadáver fica imediatamente pálido
(palor mortis) e sem tônus (flacidez inicial), e após 20 minutos a 3 horas surgem
manchas de sangue (livor mortis) nas partes inferiores do cadáver, que se não for
movimentado após 4 ou 5 horas se tornam fixas com impregnação nos tecidos.
Com a ausência de oxigênio nos tecidos, (b) as mitocôndrias morrem, as
células ficam sem energia [8 vs 38 ATP por molécula de glicose], as proteínas não
são repostas, as funções se desorganizam e as estruturas intracelulares
desintegram-se (autólise). Decorrente disto, os depósitos de cálcio dentro dos
músculos são liberados e os músculos, que ainda tenham depósitos de glicogênio,
se contraem (rigor mortis) com a abertura quase imediata das pálpebras, seguida da
rigidez da mandíbula e, mais notável, cerca 2 a 6 horas após da morte a flexão dos
braços e extensão das pernas. Isto permanece por 36 a 48 horas até que, com o
avanço da decomposição das proteínas musculares, os músculos volta a ficar
flácidos (flacidez secundária). Por este motivo, nos açougues se aplicam choques
elétricos nas carcaças de animais assim que são abatidos, consumindo
imediatamente o glicogênio nos músculos e evitando o rigor mortis.
Apesar de menor implicação arqueológica, estes fenômenos podem estar por
traz da posição em que se encontram remanescentes de cadáveres não contidos.
(b) manchas róseas e lilases (as fotos no artigo original são preto e branco e,
portanto, não ilustram esta característica). Enquanto os canais são
característicos dos ossos mais vascularizados de mamíferos, e aves,
penetrando na sua profundidade. Nos ossos de peixe a degeneração se dá
no tecido mais jovem, superficial, formando rachaduras, por onde bactérias
penetram o osso e o tingem de rosa (citando Piepenbrink, 1986). Associada a
estas manchas ocorreram erosões com bordas irregulares e ‘rasgadas’,
diferentes da coalescência dos canais. Esta alteração é mais nítida nos ossos
cosidos [desmineralizados] e ocorre também em ossos de mamíferos e aves;
(c) o último grupo de lesões são as fissuras transversais que surgem com a
dessecação após a exumação dos ossos, como na descrição de ossos
expostos à superfície por Behrensmeyer. Behrensmeyer entendia que este
tipo de lesão seria exclusivo de ossos expostos à superfície identificando
‘remanescentes transportados’, alóctones. Nicholson questiona esta
afirmação já que as lesões surgem após a exumação de ossos enterradoa.
Um aspecto interessante é que as lesões se concentraram na face
superior dos ossos nas amostras em solos mais permeáveis. Este padrão é
explicado por serem estas superfícies que primeiro reagem com soluções
precipitados no solo, neutralizando-as e, assim, protegendo o material subjacente
(NICHOLSON, 1996, citando EVANS e LIMBREY, 1974).
Os três tipos de lesão, com diferentes intensidades, ocorreram nos quatro
sítios estudados, sugerindo tratar-se de um mesmo processo subjacente, apesar da
provável variação da microbiota nos diferentes microambientes1. Deve-se ressaltar
que este estudo compreendeu apenas quatro tipos de solo, porém todos eles
drenados e na mesma região geográfica, submetidos ao mesmo clima, havendo
outras situações a serem comparadas.
1“In fact, considering external appearance alone many of the features of bone modification appear to
be similar at each of the sites, although the extent of bone loss varied greatly” (NICHOLSON, 1996,
p.524a).
Com a revisão sistemática estes modelos podem ser aperfeiçoados.
Agrupei os conteúdos em três blocos: (a) esqueletização – referente a
decomposição inicial; (b) decomposição das fases inorgânicas e orgânicas do osso –
referente a desintegração óssea; e (c) condicionantes ambientais e decomposição
química.
DECOMPOSIÇÃO INICIAL
# A decomposição óssea é condicionada a esqueletização*
1. O enterramento à 35cm de profundidade reduz a infestação por larvas de insetos
(SIMMONS et al., 2010)
2. o revestimento da carcaça enterrada é um fator de preservação óssea em solos
ácidos arejados (NICHOLSON, 1996)
DECOMPOSIÇÃO ÓSSEA
Devido a fatores intrínsecos dos ossos (geometria, mineralização, porosidade,
tamanho,...) a preservação do esqueleto não é homogênea havendo uma ‘auto-
seleção’ dos mais bem conservados (DJURIC et al., 2011; NICHOLSON, 1996;
BECKETT et al., 2011)
Micro-variações no ambiente do sepultamento também impactariam na variação da
decomposição em diferentes partes do esqueleto (SZOSTEK et al., 2012
14. a preservação histológica é um indicador da preservação do DNA (COLLINS,
2002)
15. a preservação mineralógica é um indicador da preservação do colágeno
(PENKMAN, 2011)
16. a preservação histológica não pode ser prevista pela aparência macroscópica
(NICHOLSON, 1996) nem pela preservação da fase orgânica (DEVIÈSE et
al., 2010)
17. os ossos compactos mais mineralizados apresentam melhor preservação do
DNA (MUNDORFF et al., 2009)
18. alterações microscópicas não são coincidentes
FATORES AMBIENTAIS
18. a dissolução mineral pela chuva (H2CO3) preserva o colágeno (inferido de
MASPERO et al., 2011):
19. A degeneração química do colágeno é proporcional a história térmica e mais
intensa e proteínas desmineralizadas (inferido de PENKMAN et al., 2011),
sendo em parte devido a transformações expontâneas da isomeria óptica dos
aminoácidos
20. a auto-oxidação do colágeno ocorreria no ar atmosférico (inferido de
MORTENSEN e MATTHIESEN, 2013), porém a sua mineralização seria um
fator protetor (inferido de CAVALLARO et al., 2011) COLEÇÕES ÓSSEAS
21. A decomposição de matérial orgânico é propriciada por agentes oxidantes no
solo: (a) oxigênio atmosférico (OS et al., 2012); (b) sulfatos e os óxidos de
ferro e manganês (OS et al., 2012; BEER et al., 2012; GODFREY et al., 2012;
HUISMAN e MAURO, 2012)
22. São fatores ‘protetores’ anti-oxidantes: (a) umidade do solo (anóxia –
HUISMAN e MAURO, 2012); (b) barreiras no curso de águas subterrâneas
(OS et al., 2012; GELBRICH et al., 2012); (c) características texturais do solo
[não especificadas]; e (d) matéria orgânica (competição na oxidação – OS et
al., 2012; BEER et al., 2012; GODFREY et al., 2012; HUISMAN e MAURO,
2012)
23. Há decomposição de matéria orgânica vegetal em profundidades de até 1,25
metros em floresta tropical (DINAKARAN e KRISHNAYYA, 2010)
24. Há aumento da atividade microbiana do solo até 3,0 metros de profundidade
após inundação (LILIE et al., 2012).
25. Há formação de pátina biológica sobre mármore submerso (CRISCI et al.,
2010) deduzindo-se a possível formação de barreira as trocas em um osso
submerso e o ambiente
Simaril
2“(...) larger animal remains (...) may create their own local burial environment to a much greater
extent” NICHOLSON, 1996, p.523
ao invés de pôr ovos, depositam larvas que, ao penetrarem ativa e rapidamente na
carcaça, evitam a sua dessecação.
(c) o sulfeto de ferro (‘pirita’ – FeS2) é apontada (BEER et al., 2012; HUISMAN e
MAURO, 2012) por, ao oxidar-se, formar ácido sulfúrico que acidifica o
ambiente além de formar novos cristais ao reagir com carbonatos presentes
no solo;
CONCLUSÕES
Os trabalhos estudados coadunam com o ‘modelo geral’ proposto, porém
apontam especificidades não esclarecidas. O modelo geral deve ser visto como
tal: um conjunto de princípios comuns, razoavelmente evidenciados, porém sem
poder explicativo para situações concretas específicas. Assim, o estado da arte da
identificação de condições propícias à conservação de vestígios esqueletais em
sítios arqueológicos é incipiente.
Segundo a revisão feita, é mais provável encontrarem-se remanescentes
ósseos em ambientes anaeróbicos e sem influência pluvial, idealmente em
sepultamentos protegidos da necrofagia. Entretanto, esta indicação genérica e
pouco operacional para direcionar a prospecção em campo.
O aperfeiçoamento do modelo depende pesquisas que esclareçam
separadamente os diferentes processos envolvidos na decomposição como também
modelem a interação entre eles, permitindo maior confiabilidade na sua aplicação na
curadoria in situ e ex situ. Inclusive estudos de revisão bibliográfica sistemática,
delimitando mais o objeto e ampliando o período das publicações.
Da revisão, levanto quinze ‘especificidades’ não esclarecidas pelo modelo e
pela revisão bibliográfica realizada.
OBRIGADO !