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INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo esclarecer a relevância médico-legal da Tanatologia,


especialmente a contribuição que os sinais abióticos fornecem ao Direito, no que tange a
respostas de questões envolvendo a morte do indivíduo.
A princípio, estudaremos as condições da evolução da putrefação e fenômenos que podem
ensejar a destruição do cadáver – autólise, maceração, putrefação e fauna cadavérica – e/ou
a sua conservação – mumificação e saponificação.
Cada um desses itens serão explicados e analisados na perspectiva jurídica, de forma que
seja ressaltada a sua importância para o Direito.
Para elaboração do presente trabalho, utilizamos pesquisa doutrinária e internet.
CONDIÇÕES DA EVOLUÇÃO DA PUTREFAÇÃO
A putrefação é o processo de decomposição da matéria orgânica de bactérias e pela fauna
macroscópica, que acaba por devolve-la à condição de matéria inorgânica. A putrefação do
corpo não é um processo resultante do evento morte, apenas. É necessária a participação
ativa de bactérias cujas enzimas, em condições favoráveis, produzem a desintegração do
material orgânico. Daí, que nas condições térmica que impeçam a proliferação bacteriana, ou
pela ação de substancias antissépticas, o cadáver não se putrefaz. As bactérias encarregadas
da putrefação do cadáver, na sua maioria, são as mesmas que, em vida, formam a flora
intestinal do individuo. Algumas das substancias intermediárias formadas durante o processo
de decomposição das proteínas são altamente fétidas, tornando-se as responsáveis pelo
cheiro característico dos corpos em putrefação. A decomposição catalítica dos glúcides e dos
lípides, praticamente não exala odores nauseabundos. Esse processo de decomposição
paulatina é bastante lento. As larvas de insetos todas com atividade necrofagica, se deixadas
agir livremente, podem destruir o cadáver em um tempo bem menor, de quatro a oito
semanas.
Com efeito, em um cadáver exposto à intempérie, a putrefação se ve acelerada, sendo certo
que os corpos enterrados têm a sua decomposição retardada em até oito vezes com relação
aos primeiros.
A putrefação se desenvolve em quatro fases ou períodos distintos e consecutivos, a saber:
Primeira fase – Período cromático (Período de coloração, período das manchas): inicio, em
geral, de dezoito a vinte e quatro horas após o óbito, com uma duração aproximada de sete a
doze dias, dependendo das condições climáticas. Inicia-se pelo aparecimento de uma
mancha esverdeada na pelé da fossa ilíaca direita (mancha verde abdominal), cuja cor é
devida à presença de sulfometahemoglobina. Nos recém-nascidos e nos afogados, a mancha
verde é torácica e não abdominal, com cheiro característico (transformação da hemoglobina).
Segunda fase – Período enfisematoso (Período gasoso, período deformativo): inicia-se
durante a primeira semana e se estende, aproximadamente, por trinta dias. Os gases
produzidos pela putrefação (notadamente gás sulfídrico, hidrogênio fosforado e amônia),
infiltram o tecido celular subcutâneo modificando, progressivamente, a fisionomia e a forma
externa do corpo. Esta distensão gasosa é mais evidente no abdome e nas regiões dotadas
de tecidos areolares como face, pescoço, mamas e genitais externos. Os próprios gases
destacam a epiderme do córion, formando extensas flictenas putrefativas, cheias de liquido
transudado (posição de lutador).
Terceira fase – Período coliquativo (Período de redução dos tecidos): inicia-se no fim do
primeiro mês e pode estender-se por meses ou até dois ou três anos. Caracteriza-se pelo
amolecimento e desintegração dos tecidos, que se transformam em uma massa pastosa,
semilíquida, escura e de intensa fetidez, que recebe o nome de putrilagem.
A atividade das larvas da fauna cadavérica auxilia grandemente na destruição total dos restos
de matéria. Como mencionado, os insetos e suas larvas podem destruir a matéria orgânica do
cadáver com extrema rapidez (quatro a oito semanas).
Quarta fase – Período de esqueletização: no final do período coliquativo, a putrilagem acaba
por secar, desfazendo-se em pó. Desta maneira, surge o esqueleto ósseo, que fica
descoberto e poderá conservar-se por muito tempo. Pela ação da fauna e do meio ambiente
com a destruição dos tecidos, restando apenas o esqueleto, cabelos e dentes (três anos).
Quando o cadáver permanece insepulto e abandonado sobre o solo por razoável tempo, nele
se instalam pequenos animais (principalmente insetos) denominados como fauna cadavérica,
que seguem certa ordem de instalação: moscas comuns, moscas verdes, coleópteros e
lepidópteros.
O estudo da fauna cadavérica pode ser importante para a cronotanatognose, pois o
aparecimento de determinados insetos esta relacionado ao tempo de morte. Parte Medicina
Legal que trata da investigação da data ou do momento da morte, levando em conta o
esfriamento, o enrijecimento, a putrefação do cadáver e outros elementos.
A maceração é o processo de transformação destrutiva em que ocorre o amolecimento dos
tecidos e órgãos quando os mesmos ficam submersos em um meio liquido e nele se
embebem. Ou mais frequente é que aconteça com a agua e o liquido amniótico. Na
maceração, a pelé se torna esbranquiçada, friável, corruga-se e faz com que a epiderme se
solte da derme e possa até se rasgar em grandes fragmentos. Isto é bastante evidente nas
mãos onde a pelé se desprende a modo de “luvas” em ambientes úmidos e quentes,
destruição em meio liquido, comum nos fetos e nos afogados com formação de bolhas de
conteúdo liquido e pardacento, o corpo perde a consistência inicial, o ventre se achata e os
ossos se livram dos tecidos, ficando como se estivessem soltos. Externamente, a derme,
pelas razões acima apontadas, fica exposta, mostrando-se vermelha brilhante, luzidia por
causa do próprio edema que a embebe e a torna túrgida.
FENÔMENOS TRANSFORMATIVOS DESTRUTIVOS
Processo destrutivo
Processo de destruição dos tecidos que ocorre após a morte com a transição dos restos
biológicos até sua fossilização. Os fatores que influem para a ocorrência destes fenômenos
são, principalmente, a temperatura, a aeração, a higroscopia do ar, o peso do corpo, as
condições físicas, a idade do morto e a causa da morte. Podemos observar também a
atividade de bactérias e insetos necrófagos.
Autólise
Caracteriza-se por uma série de fenômenos fermentativos anaeróbicos que ocorrem no
interior das células do individuo após sua morte, ocorrem independentemente de qualquer
ação de outros microrganismos. É o primeiro dos fenômenos cadavéricos.
Na fase latente as mudanças ocorrem apenas no citoplasma da célula, já na fase necrótica o
núcleo celular desaparece. As células deixam de receber nutrientes passando por um
processo de acidificação devido as fermentações que ocorrem. Assim que o aumento do PH
das células de um corpo evidenciam a morte do mesmo.
Os diferentes tecidos do corpo sofrem a autólise em diferentes momentos, dependendo de
suas capacidades enzimáticas. A córnea, por exemplo, por não ter vasos sanguíneos, pode
ser transplantada sem problemas mesmo horas depois da morte clinica.
Putrefação
Consiste na decomposição fermentativa dos tecidos pela ação de diversos seres
microscópicos, em seguida da autólise. O abdômen é onde se inicia este processo, com uma
mancha verde característica, fato que só não ocorre nos recém nascidos.
A velocidade da decomposição varia de acordo com diversos fatores particulares bem como a
condição do cadáver, uma ferida aberta, por exemplo, pode servir de porta de entrada para
larvar, acelerando a decomposição.
O período cromático ou de coloração inicia-se pela mancha verde abdominal, que vai se
espalhando pelo corpo e deixando o cadáver com um aspecto azul esverdeado e vai
escurecendo até o verde-enegrecido. Tal tonalidade é causada pela formação de hidrogênio
sulfurado.
No período gasoso ou enfisematoso é aquele em que do interior do corpo os gases da
putrefação vão formando bolhas na epiderme, o cadáver incha. Há projeção dos olhos e da
língua, bem como a distensão do abdômen.
O período coliquativo ou de liquefação é aquele em que as partes moles se decompõem, a
derme se descola da epiderme e o corpo perde sua forma. Nesta fase há a presença de
larvas e insetos necrófagos em grande número.
Por fim, no período de esqueletização, os ossos se apresentam quase livres, unidos por
algumas articulações. O crânio se destaca do restante do corpo e ainda resta uma massa
denominada putrilagem, resto decomposto das vísceras. Este período dura de 3 a 5 anos, os
ossos resistem muito tempo, porém vão perdendo sua estrutura e peso com o passar do
tempo.
Quando de uma exumação ou perícia em um corpo já morto há algum tempo a fase da
putrefação bem como o estudo da fauna de insetos, bactérias e fungos encontrada pode dar
importantes pistas acerca da causa da morte bem como do tempo em que se sucedeu.
Maceração
A maceração é um fenômeno de transformação que ocorre no cadáver quando em meio
aquoso como nos afogados (maceração séptica), ou pode ocorrer no feto quando morre no
útero da mãe do sexto ao nono mês de gestação (maceração asséptica).
Há o destacamento de amplos segmentos cutâneos, devido ao fenômeno da embebição da
hemoglobina, fazendo com que a epiderme se solte facilmente, além dos órgãos soltarem-se
dentro do ventre.
Apresenta diversos sinais, como o de Spalding (cavalgamento dos ossos da abóboda
craniana), Harley (perda da configuração da coluna vertebral), Damel (halo pericraniano
translucido), Spangler (achatamento da abóboda craniana), entre outros.
Pode se apresentar em graus: a) no primeiro grau há presença de flictenas na epiderme
contendo líquido serosanguinolento (primeira semana de morte); b) no segundo grau há ainda
as flictenas, liquido amniótico sanguinolento e epiderme arroxeada (segunda semana de
morte); c) no terceiro grau há a deformação craniana, infiltração hemoglobínica das vísceras e
córion de tonalidade marrom escura.
FENÔMENOS TRANSFORMATIVOS CONSERVADORES
Mumificação
A mumificação é um processo transformativo conservador do cadáver, que pode ser natural,
artificial ou misto; tem relevante importância médico-legal porque possibilita, mais facilmente
do que nos demais processos, o diagnóstico da causa da morte e a identificação do cadáver.
Os processos naturais exigem condições ambientais – clima quente e seco – que garantam a
desidratação rápida do cadáver, de modo a impedir a ação microbiana responsável pela
putrefação; e pode ser condicionado a fatores como idade, sexo e causa da morte.
Os processos artificiais cuidam da submissão do cadáver a técnicas especiais de
conservação. Entre essas técnicas especiais, destaca-se o embalsamamento, há muito
praticados pelos egípcios, pelos nativos das Ilhas Canárias e pelos incas no Peru. Os
processos artificiais serão sempre realizados a pedido dos familiares, justificado por
motivações piedosas ou por fins didáticos. As duas hipóteses estão disciplinadas por
legislação específica.
Os processos mistos resultam do favorecimento de um processo artificial por fatores
ambientais na conservação do corpo.
O cadáver mumificado apresenta peso reduzido; pelé dura, seca, enrugada e de tonalidade
enegrecida; cabeça diminuída de volume; traços fisionômicos da face vagamente
conservados: os músculos, tendões e vísceras destroem-se pela pressão leve,
transformando-se em pó, e os dentes e as unhas permanecem bem conservados.
Saponificação
A saponificação é um processo transformativo conservador do cadáver que ocorre de forma
espontânea; tem relevante importância médico-legal porque permite realizar uma série de
exames algum tempo depois da morte.
Assim, será possível estudar melhor certas lesões pela conservação maior do tecido celular
subcutâneo, como nas feridas produzidas por ação de projéteis de arma de fogo ou de arma
branca. O mesmo se diga da possibilidade de se estudarem lesões do pescoço quando
produzidas por laços os estrangulamentos e enforcamentos. E, por fim, levando em conta a
razoável conservação das vísceras, podem-se ter contribuições valiosas através de exames
toxicológicos e histopatológicos.
Geneval Veloso de França explica que a saponificação não é um processo inicial: “surge
depois de um estágio mais ou menos avançado de putrefação quando certas enzimas
bacterianas hidrolisam as gorduras neutras, dando origem aos ácidos graxos, os quais em
contato com elementos minerais da argila se transformam em ésteres”.
O processo inicia-se após a sexta semana depois da morte, em meio onde haja água
estagnada e pouco corrente, e solo argiloso, úmido e de difícil acesso ao ar atmosférico.
Também está sujeito a fatores como idade, sexo, obesidade e doenças que originam
degeneração de gordura.
O cadáver saponificado apresenta consistência untuosa, mole e quebradiça, de tonalidade
amarelo-escura, que dão aparência de cera ou sabão. Além disso, exala odor de queijo
rançoso.
A doutrina diverge sobre quais são os tecidos passíveis de saponificação: somente a gordura
normal ou todos os demais tecidos. A primeira tese explica que a putrefação ocorre antes da
saponificação, o que justificaria o desaparecimento dos músculos; contudo, há casos em que
a saponificação compromete apenas a superfície do cadáver.
CONCLUSÃO
A palavra morte vem do grego tanatus e do latim mors, que significam a “extinção da vida” ou
“a cessação definitiva de todas as funções de um organismo vivo”.
Na medicina legal, a morte é caracterizada pela presença dos sinais abióticos que,
apresentados em conjunto, indicam ausência de vida. Logo após dos sinais abióticos
imediatos, onde ocorre a morte encefálica, temos a presença dos sinais abióticos mediatos,
causados a partir da parada da função metabólica do cadáver.
Referida matéria possui interesses nas áreas médicas, sociais, religiosas, jurídicas, filosóficas
e sanitárias. Com relação à área jurídica, podemos afirmar que a morte é um fenômeno que
possui ligação íntima com a matéria, pois a partir do momento da morte de um ser humano,
abre-se um leque de consequências jurídicas como a cessação da personalidade civil
adquirida com o nascimento, término da capacidade jurídica do “de cujus”, extinção de direitos
e de punibilidade.
Ainda, por ter sido o Código Penal criado como um dos instrumentos de controle da conduta
humana, é imprescindível que se esclareça, através da Medicina Forense, todos os atos
de violência ou agressões que possam ter sido cometidos contra o cadáver, uma vez que o
laudo médico será imprescindível para auxiliar os magistrados do Poder Judiciário que tem
como dever aplicar de forma adequada as Normas Legais do Direito ao causador do dano.
Concluímos, então, que a Medicina Forense é uma matéria de suma importância no mundo
jurídico, sendo imprescindível ao jurista seu estudo, a fim de que este esteja apto a avaliar os
laudos que recebe, suas limitações, bem como saber o momento correto de solicitá-los. É
ncessário que este jurista possua noções sobre como ocorrem as lesões corporais e as
conseqüências delas decorrentes, os sinais que aparecem logo após a morte e as alterações
relacionadas a esta, como os fenômenos cadavéricos e os conceitos diferenciais ocasionados
por embriaguez e uso de entropecentes, a fim de excluir as mortes ocasionadas por causas
naturais ou uso indevido de substâncias pelo próprio morto e fazer jus ao direito daquele que
um dia habitou o mundo dos vivos.
Cumprimos todos os objetivos propostos porque respondemos todos os questionamentos
levantados a partir do estudo da Tanatologia e da compreensão de como ela se manifesta em
face das questões que se apresentam à sociedade.
A importância da elaboração do presente trabalho vai além do conhecimento e compreensão
do tema. Esse primeiro contato com a Tanatologia permitiu o desenvolvimento do raciocínio
jurídico, bem como o aperfeiçoamento de competências, como investigação, seleção,
organização e comunicação da informação.

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