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Departamento de Antropologia

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas


Universidade Nova de Lisboa

HERMES REDIVIVO - A ALQUIMIA, SÍMBOLO, MITO E RITO E

SEUS RESSURGIMENTOS ACTUAIS: NOVOS MOVIMENTOS

RELIGIOSOS FRANCESES DE ALQUIMIA OPERATIVO-

LABORATORIAL DO ÚLTIMO QUARTEL DO SÉCULO XX

Tese apresentada para a obtenção do grau


de
Doutor em Antropologia Social e Cultural
por
José Manuel de Morais Anes

Orientador:
Professor Doutor Adolfo Yanez Casal
Lisboa 2008

1
À minha Filha.
À memória dos meus Pais e Avós.
Aos meus Amigos.
Ao Eterno Feminino.

À memória de Eugéne Canseliet,


cujas palavras deram alento
ao meu estudo da Alquimia.

2
AGRADECIMENTOS

Agradeço, entre outros, aos meus amigos Lima de Freitas e Natália Correia (In

Memoriam), Mário de Carvalho, José Carlos Tiago de Oliveira, Paulo Pereira, Maria

Mocho, Paula C. Costa, Carla Pinheiro, Helena Barbas, Cecília Barreira, Manuela

Parreira da Silva, Vítor Mendanha, Luís Ribeiro, António de Macedo, António Telmo,

Antónia de Sousa, Adalberto Alves, Alice Feiteira, Margarida Blasco, Rui Sá Gomes,

Jorge Bacelar Gouveia, Paulo Pereira de Almeida, João Maia Santos, Paulo Noguês,

Rui Pereira, Luís Moita, Guilherme d’Oliveira Martins, Contra-Almirante (e Doutor)

António Silva Ribeiro, Gens. Garcia Leandro e Loureiro dos Santos, os incentivos e

apoios diversos que ao longo destes anos me entusiasmaram a continuar este trabalho.

Agradeço aos meus colegas do Departamento de Antropologia da Faculdade de

Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, todo o seu apoio crítico,

com particular destaque para o meu antigo Orientador, Professor Doutor Augusto

Mesquitela Lima (falecido em 2007) – decano daquele Departamento e depois,

Professor Jubilado -, Homem generoso, aberto e entusiasta, incansável demandador de

uma Ciência do Homem, assente na Transdisciplinaridade. Quero destacar sobretudo a

pronta generosidade do meu actual Orientador Prof. Doutor Yanez Casal (que

rapidamente aceitou substituir o Prof. Mesquitela, em finais de 2007, nestas funções de

orientação) e que – relembro sempre com muita gratidão -, enquanto foi (por duas

vezes) Coordenador do Departamento de Antropologia da FCSH/UN, me convidou para

leccionar a cadeira de Antropologia da Religião nos anos lectivos de 2000-2001 e 2001-

2002 e a de Antropologia da Religião e do Ritual em 2003-2004 (último ano em que

leccionei Licenciaturas na FCSH/UNL). Não posso deixar de referir e agradecer

também o apoio e a generosidade do Prof. Doutor Moisés Espírito Santo que, à frente

3
do ISER – Instituto de Sociologia e Etnologia das Religiões da mesma Faculdade, me

convidou para leccionar, desde 1998, cursos livres sobre Novos Movimentos Religiosos

e História das Correntes Esotéricas.

Agradeço ainda aos meus ex-colegas do Laboratório de Polícia Científica da

Polícia Judiciária, a sua ajuda e compreensão enquanto lá trabalhei – uma vez que desde

1986 e até à minha reforma na PJ, acumulei as funções de Perito Superior de

Criminalística com as de Docente convidado da FCSH da UNL -, agradeço ao Dr. Juíz

Mário Mendes, ex-Director Geral da P.J., um mês de equiparação a bolseiro (para eu

poder realizar trabalho de terreno no estrangeiro junto de grupos alquímicos) e ao Dr.

Juíz Fernando Negrão - último Director Geral da P.J. enquanto eu lá trabalhei - a “luz

verde” para a minha aposentação, o que veio a permitir (indirectamente) agora, a

conclusão deste trabalho, apesar de nunca ter estado tão ocupado com múltiplas tarefas,

como nos últimos anos, já que sempre mantive até hoje a dupla condição de

Criminalista e especialista de Segurança, com a do estudioso da Religião, do Ritual, do

Simbólico e do Mítico, tendo progressivamente desenvolvido também os meus estudos

no domínio da Antropologia Social e Cultural. E, encerrando os agradecimentos

(correndo o risco de ser injusto por omissão), quero registar com gratidão a autorização

do prolongamento, por 4 meses, do prazo de entrega de Tese (pedido feito em 31/3/08),

o qual me foi comunicado em 15/7/08.

Agradeço, muito especialmente, a todos os alquimistas e grupos de alquimistas

que amável e "caridosamente" permitiram, directamente, a realização do meu trabalho,

agradecimento personificado nos "instrutores" e animadores desses grupos, Eugène

Canseliet (+), Bernard Renaud de la Faverie (“La Tourbe des Philosophes”), Patrick

4
Riviére (Spagy-Nature/C.H.R.C.H.M.), Solazaref - que me ofereceu um testemunho

"artístico" da sua Filiação, a “Assemblée des Philosophes” - e Jean Dubuis e Marc-

Gérald Cibard ("Les Philosophes de la Nature"), Roger Caro (+), Elisabeth Demange e

François Devaux ("Fréres Aînés de la Rose-Croix"), Adam McLean (“The Hermetic

Journal”) e Simon H (e o seu grupo), Bernard Fréon (“Ordre des Frères de la Lumière

d’Orient”), Rémi Boyer (“Lésprit des Choses” e C.I.R.E.M.), sem esquecer, no entanto,

a generosidade dos “adeptos” portugueses, nomeadamente de Estêvão Miranda, de

Telémaco Pissarro (Rubellus Petrinus) e de Olímpio Gonçalves.

Por último, “mas não em último lugar”, agradeço àqueles que se dedicaram (ou

dedicam) à exegese e à hermenêutica da Alquimia e do Hermetismo e ao estudo do

Símbolo, do Mito, do Imaginário no âmbito, também, dos Novos Movimentos

Religiosos e do Esoterismo - conseguindo aliar o rigor intelectual ao Amor pela "Arte

de Hermes", como o fez, de um modo pioneiro, o “sorbonnard” René Alleau, tais como

Gilbert Durand (Univ. Grenoble), Antoine Faivre (Paris, EPHE-Sorbonne) – este último

a quem devo um agradecimento muito especial, pela sua amizade, pela sua confiança,

pelo seu apoio e pelas suas críticas a este trabalho e, também, pelas longas conversas

que ajudaram a tornar-me um seu modesto discípulo na “Ciência do Esoterismo” e na

“História das Correntes Esotéricas Ocidentais” -, Yvette Centeno (U.N. Lisboa),

Françoise Bonardel (Univ. Paris I), Wouter J. Hanegraaff (Univ. Amsterdão), Basarab

Nicolescu (Université Pierre et Marie Curie), J.-J. Wunenburger (Univ. Bourgogne),

J.Pierre Sironneau (Univ. Grenoble II), Joel Thomas (Univ. Perpignan), Massimo

Introvigne (CESNUR-Torino-Itália) e J. Gordon Melton (Univ. Santa Barbara- EUA) –

estes dois últimos pelo auxílio no desenvolvimento de uma perspectiva sociológica dos

5
NMR -, os quais tiveram, todos, em alturas diversas da elaboração deste trabalho,

palavras de incentivo e de crítica estimulante.

Em suma, o presente trabalho é grandemente devedor às reflexões de todos estes

pensadores, assim como o é, igualmente, ao testemunho dos “operativos” que - não

temendo "sujar as mãos" - se empenharam na senda "escabrosa" e difícil do “íntimo

comércio com a Matéria”, de que Eugène Canseliet é um paradigma.

Para terminar esta introdução referirei que não estou só ao ter partido da

Química para chegar (assim o espero, através desta humilde Tese) à Antropologia, pois

há (pelo menos) mais um distinto exemplo (muito difícil de seguir para as minhas

limitadas capacidades e experiência antropológica) de um investigador que acumula a

dupla qualidade de Antropólogo e de Químico, o notável antropólogo britânico Ian

Lewis, autor (entre outros trabalhos) do livro sobre xamanismo, Ecstatic Religion

(1971) que cito na Bibliografia, o qual, formado em Química, optou mais tarde pela

Antropologia. Os dois pontos de contacto entre estas duas disciplinas são, no meu caso,

o facto de a Alquimia ser (também, mas não apenas, como veremos) uma fase da

história da Química e, no caso de Ian Lewis, o facto de ser interessante conhecer a

química dos cogumelos e de outras substâncias alucinogéneas, para ajudar a estudar, na

sua dimensão psico-fisiológica, o Xamanismo.

6
"O historiador das religiões deve primeiro
aprender a aceitar o que lhe dizem aqueles
que vivem as suas crenças e tentar em
seguida ver o que isso quer dizer,
de descobrir que espécie de existência humana
se desenvolve numa cultura (...). Se o fizer,
todo um mundo de significações se revela"1

Existe apenas um meio para compreender um fenómeno

cultural estranho à nossa conjuntura ideológica actual,

descobrindo o seu «centro» e instalando-nos aí, para

podermos atingir todos os valores que ele determina.

Colocando-nos na perspectiva do alquimista,

conseguiremos compreender melhor o universo da

alquimia e avaliar a sua originalidade. Impõe-se a mesma

abordagem metodológica em relação a todos os

fenómenos culturais exóticos ou arcaicos: antes de os

julgarmos, devemos compreendê-los bem, assimilar a sua

ideologia, quaisquer que sejam os meios de expressão:

mitos, símbolos, ritos, comportamentos sociais…2

1Mircea Eliade, Tratado de História das Religiões, trad. portuguesa de Natália Nunes e Fernando Tomaz
da edição francesa (Traité d’Histoire des Religions, Paris, Payot, 1970), Lisboa, Cosmos, 1977.
2 Mircea Eliade, Ferreiros e Alquimistas, Lisboa, Relógio de Água, 1987, pp. 10-11 (tradução de Carlos
Pessoa, da edição de 1977 de Forgerons et Alchimistes, Paris, Flammarion)

7
ÍNDICE

I – INTRODUÇÃO – p. 9

II – RELATO AUTOBIOGRÁFICO E ANTROPOLOGIA REFLEXIVA - p. 40

III – A ALQUIMIA NO CONTEXTO DAS CORRENTES ESOTÉRICAS

OCIDENTAIS: HISTÓRIA E FILOSOFIA, IMAGINÁRIO, SÍMBOLO, MITO E

RITO - p. 78

IV – O RENASCER DA FÉNIX: O RESSURGIMENTO DA ALQUIMIA EM

FRANÇA NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX - p. 131

V – A ALQUIMIA OPERATIVO-LABORATORIAL NO ÚLTIMO QUARTEL

DO SÉCULO XX: GRUPOS FRANCESES – p. 161

- “Spagy-Nature” – p. 163

- “Les Frères Aînés de la Rose-Croix” – p. 170

- “Filiation Solazaref” – p. 193

- “Les philosophes de la Nature” - p. 226

VI – NOVOS MOVIMENTOS RELIGIOSOS E ESPIRITUALIDADES

ALTERNATIVAS DA 2ª. METADE DO SÉCULO XX E A SOCIO-

ANTROPOLOGIA DOS GRUPOS ESTUDADOS EM TRABALHO DE

TERRENO - p. 243

VII – CONCLUSÃO – p. 279

BIBLIOGRAFIA – p. 284

ANEXOS – p. 312

- Cronologia da Alquimia em França na 2ª. metade do século XX – p. 313

- Ficha de identificação dos grupos – p. 339

- Pequeno glossário – p. 341

- Documentação diversa referente aos grupos estudados – p. 343

8
I – INTRODUÇÃO

Transformar as notas de estudo descritivo sobre os grupos alquímicos franceses

contemporâneos (já há muito recolhidas, quer fruto de estudo livresco, quer fruto de

trabalho de campo) numa Tese de Antropologia Social e Cultural, eis a tarefa

“alquímica” que o autor se propôs realizar, há já alguns anos. A impossibilidade de uma

dedicação temporal completa a esta empresa, juntamente com a sua natural

impreparação em Antropologia, uma que a actividade do autor deste trabalho estava

centrada numa carreira de 19 anos em Química Forense no LPC/PJ (Laboratório de

Polícia Científica da Polícia Judiciária) e noutra, paralela, de 18 anos de docência em

Matemática e Estatística para as Ciências Sociais e Humanas e de Métodos

Quantitativos, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de

Lisboa (FCSH/UNL), foi adiando essa difícil “transmutação”. No entanto, o fascínio

crescente que a Antropologia em geral e a Antropologia da Religião em particular

exerceram sobre mim e a progressiva consciência de que seria indispensável uma

abordagem no domínio geral das Ciências Sociais e Humanas e antropológica em

particular, para se poder compreender o fenómeno das “novas” religiosidades e

espiritualidades, onde estes grupos se inserem - já que, como veremos, alguns deles

revelam um renascer do interesse pelas espiritualidades antigas, pese embora a aparente

contradição do “novo”, com o carácter ancestral da alquimia - levaram a que eu

começasse a desenvolver um programa de estudos antropológicos, no domínio da teoria

e da metodologia, com mais intensidade a partir de 1996, isto é, já depois de ter

terminado o meu trabalho de terreno junto dos grupos alquímicos estudados, o qual se

realizou entre 1986 e 1996, embora com prolongamentos esporádicos até ao fim de

século. É de salientar que muito ajudou o aprofundamento e a sistematização do meu

9
estudo antropológico neste domínio, a generosa e entusiasmante possibilidade que me

foi oferecida pelo meu actual Orientador de Tese – conhecedor dos meus estudos -,

quando foi (por duas vezes) Coordenador do Departamento de Antropologia da

FCSH/UNL, de poder leccionar (por amável sugestão do meu antecessor, Prof. Doutor

Armando Marques Guedes), durante três anos lectivos (não consecutivos) a cadeira de

Antropologia da Religião durante os anos lectivos de 2000-2001 e 2001-2002 e a de

Antropologia da Religião e do Ritual no ano lectivo de 2004-2005.

Passados mais de um quarto de século sobre o início dos meus estudos sobre um

tema tão fascinante, como o é a história, a filosofia e a prática alquímicas – interesse

que começou a surgir quando eu ultimava a minha licenciatura em Química, na

Faculdade de Ciências de Lisboa -, passados mais de dez anos sobre a minha primeira

inscrição para a realização desta Tese de Doutoramento – tempo característico da lenta

“via húmida”, apropriada para os pacientes (neste caso, não apenas eu, mas também o

meu compreensivo primeiro Orientador, a quem presto homenagem póstuma e

agradecimento) – eis aqui o produto final que não ousarei, de modo algum, denominar

de Pedra Filosofal, mas que, mais apropriadamente, poderá ser alegoricamente descrita

como uma mais humilde Pedra dos Filósofos que agora submeto ao superior critério

científico do Júri.

Este trabalho de Tese difere dos meus anteriores trabalhos sobre a Alquimia3,

pela circunstância de agora pretender, como é próprio de um trabalho científico (em

Antropologia, neste caso), fazer a clara distinção entre o emic – o discurso do crente, ou

“popular”, que deve ser fielmente reproduzido pelo etnógrafo - e o etic – o discurso

3 Incluidos, por exemplo, no livro Re-criações Herméticas, Lisboa, Hugin, 1ª. Ed. 1996, 2ª.ed., 1997.

10
“sapiente” da Ciência do Homem sobre essa crença, que é trabalho do etnólogo e do

antropólogo e que deve prevalecer sobre o primeiro, explicando-o, sem no entanto o

asfixiar ou destruir.4 De facto, enquanto que a maioria dos meus ensaios anteriores

sobre este tema – até 1998 - pode ser considerada (em parte, ou na totalidade) como

sendo um conjunto de ensaios “alquímicos” sobre a Alquimia – ou, mais geralmente,

ensaios “esotéricos” sobre o Esoterismo5 – pretende-se aqui realizar, para podermos

vencer um primeiro obstáculo no domínio da epistemologia, uma distinção clara entre o

que é dito pelos alquimistas e aquilo que a ciência antropológica pode dizer sobre os

discursos e as práticas dos alquimistas. Não nos parece legítimo tentar fazer ciência,

nestes domínios, através de um discurso esotérico sobre o Esoterismo – tradição

equívoca que foi desenvolvida no século XX, entre outros, por um Guénon, ou por um

Evola; esse discurso é perfeitamente legítimo, desde que fique bem claro que é um

discurso esotérico, à margem da ciência, para que não se possa pensar que é ciência – o

que não quer dizer, antes pelo contrário, que não seja interessante de ser estudado como

objecto emic de estudo.

Wouter J. Hanegraaf, anunciou este mesmo propósito – que agora procuro seguir

– no seu livro sobre a “religião da Nova Era”, cujo subtítulo é, significativamente,

Esotericism in the Mirror of Secular Thought6, isto é, não o estudo do esoterismo à luz

do pensamento religioso, mas à luz do “pensamento secular”. Como não se cansa de

repetir Antoine Faivre – o fundador de uma “ciência do Esoterismo” – há que praticar, a

fim de que fiquem bem claras as posições quer dos crentes, quer dos cientistas, esse

4 Ver, p.e., Jean-Pierre Olivier de Sardan, “Émique”, in L’Homme, nº. 147, Juillet-septembre, Paris, 1998.
Pp. 151-166.
5 No entanto na Introdução a esse meu primeiro livro (op. cit., p. 11), indicava claramente que os ensaios
nele contidos não eram “académicos”, ou universitários, mas se desenvolviam antes numa zona de
fronteira entre a ciência e a espiritualidade esotérica ou hermética.
6 Wouter J. Hanegraaff, New Age Religion and Western Culture, Leiden, Brill, 1996, p. 6.

11
agnosticismo metodológico7. Esta postura e este método - também denominado por W.

Hanegraaff de método empírico - são aqueles em que se exerce uma suspensão do juízo

normativo, sendo, portanto, diferentes das abordagens teológica, religiosa e empírico-

reducionista. Como conciliar este “agnosticismo”, esta des-crença com o segundo

momento do método de observação antropológica, a saber o da participação? Poderá

este “agnosticismo” tornar-se num obstáculo a uma empenhada e profunda observação

participante dos discursos, das práticas e das vivências dos crentes (neste caso, dos

alquimistas), correndo o risco de conduzir àquele etnocentrismo cultural que atingiu a

antropologia de um Lévy-Bruhl8, por exemplo? Quanto a nós, esse “agnosticismo

metodológico” deverá limitar-se a ser uma metodologia e não atingir a dimensão de

uma “ideologia”, a qual, essa sim, poderia contaminar o objecto de estudo com essa

postura, rejeitando a “mentalidade primitiva” como “absurda” e pré-lógica e

desqualificando como uma forma menor de humanidade. Claude Lévi-Strauss foi um

dos que mais se notabilizou (particularmente nas suas obras La Pensée sauvage e

Anthropologie Structurale) na dignificação desse pensamento selvagem, afirmando que

o homem sempre pensou assim tão bem e que a lógica do mito e a lógica da Ciência

apresentavam entre si uma semelhança estrutural.

A nossa experiência pessoal, neste trabalho, traduziu-se numa metodologia

particular – não planeada, mas decorrente das próprias condições de vida - onde os dois

tempos vieram a estar separados: primeiramente, depois de um estudo prévio do seu

corpus e da sua história, observei “participantemente” a Alquimia e os alquimistas –

estes, de 1986 a 1989 -, individualmente ou em grupo e só depois estudei criticamente,

7 Cf. J. G. Platvoet, Comparing Religions: A Limitative Approach, The Hague/Paris/New York, Mouton,
1967, citado por W. Hanegraaff, op. cit, p.4.
8 Ver, p.e., Lucien Lévy-Bruhl, La mentalité primitive, Paris, Presses Universitaires de France, …..

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na perspectiva da antropologia, o material previamente observado. Destes dois

momentos do trabalho antropológico, darei conta nesta Tese.

Em relação ao segundo momento quero citar, a propósito, o antropólogo

François Laplantine, que ao referir-se ao modo de conhecimento antropológico, afirma

que ele consiste numa observation directe, par imprégnation lente et continue, de

groupes humains minuscules avec lesquels nous entretenons un rapport personel9. Ora,

segundo este autor, esse conhecimento – por “impregnação lenta e contínua” e através

de uma “relação pessoal” - assenta no facto de l’obervateur-sujet, pour comprendre

son objet, s’efforce de vivre en lui l’expérience de ce dernier, ce qui n’est possible que

parce que cet objet est un sujet au même titre que lui. Esta “vivência da experiência do

outro” situa-se, ainda segundo Laplantine, menos no domínio da “distanciação

sociológica” da “metodologia durkheimiana”, aproximando-se mais da “prática

etnográfica de Malinowski”.

Não temos conhecimento de ter sido realizada, até hoje, uma Tese de

Doutoramento em Antropologia, sobre as práticas da Alquimia. É claro que embora a

tradição antropológica incida sobre sociedades sem escrita, sobre tradições orais em

universos primitivos, o universo alquímico pode ser “primitivo” em relação à ciência

moderna, mas é, desde há muito, livresco e desenvolvido no domínio da teoria e do

pensamento filosófico-religioso pois radica no Hermetismo de Alexandria. Esta

oposição convida a registar uma diferença e uma semelhança:

- diferença, pois a doutrina da alquimia é veiculada por Tratados de grande

complexidade literária e iconográfica, na sua dimensão simbólica e filosófica;

9 Laplantine, François, Clefs pour l’Anthropologie, Paris, Seghers, 1987, p. 21 (o sublinhado é do autor)

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- semelhança pois os grandes “arcanos” da alquimia só se comunicam oralmente,

“de boca a orelha”, sub rosa, de mestre a discípulo, individualmente ou no seio do

grupo alquímico.

Mas não terá sido também o seu aspecto multifacetado – que ao mesmo tempo a

faz cair nas áreas da história da ciência, da arte, da literatura, da psicologia, da religião -

que desencorajou os antropólogos? De facto, foi naqueles campos que se realizaram

importantes estudos sobre a Alquimia: citemos – após uma abordagem inicial positivista

e “cientista” de Marcelin Berthelot, que considerava a Alquimia apenas como uma mera

“pré-química”10 -, os exemplos clássicos dos trabalhos de Gaston Bachelard11, no

domínio da psicanálise do imaginário, os de Carl-Gustav Jung12, no domínio da

“psicologia das profundezas, os de Mircea Eliade13, no domínio da “história das

religiões”, os de René Alleau14, no domínio da “ciência dos símbolos”, os de Henry

Corbin15 no domínio da “fenomenologia”, os de Antoine Faivre16, no domínio da

“ciência do esoterismo”, e também os de de Holmyard17 e Sherwood Taylor18, e a

excelente obra de Jack Lindsay, The Origins of Alchemy in graeco-roman Egypt19 no

domínio da história e filosofia da Química e da Alquimia, mas numa perspectiva,

10 Marcelin Berthelot, Collection des anciens alchimistes grecs, Paris; no entanto, este autor teve o mérito
de dar a conhecer, através de traduções suas, os textos da alquimia grega.
11 Gaston Bachelard, Psychanalyse du Feu, réed. Paris, Gallimard, 1962.
12 Carl-Gustav Jung, Psychologie et Alchimie, Paris, Buchet Chastel, 1960.
13 Mircea Eliade, Ferreiros e alquimistas, Lisboa, Relógio de Água, 1987, tradução,da autoria de Carlos
Pessoa, da obra Forgerons et alchimistes, nouvelle édition corrigée et augmentée, Paris, Flammarion,
1977.
14 René Alleau, Aspects de l’Alchimie Traditionelle, Paris, Les Éditions de Minuit, 1953
15 Henry Corbin, Corps spirituel et Terre Céleste, Paris, Buchet-Chastel, 1979 e L’Alchimie comme Art
Hiératique, Paris, L’Herne, 1986, com prefácio de Pierre Lory.
16 Antoine Faivre, “Pour un approche figuratif de l’Alchimie”, in Alchimie, Paris, Albin Michel, 1978
(Dervy, 1996)
17 E. J. Holmyard, A Alquimia, Lisboa, Ulisseia, s.d. (tradução de M. Marques da Silva da obra inglesa,
Alchemy, Harmondsworth, Penguin, 1957)
18 F. Sherwood Taylor, The Alchemists, G.B., W. Heineman, 1952 (repr. St. Albans, Paladin, 1976)
19 Jack Lindsay, Les Origines de l’Alchimie dans l’Égypte greco-romaine, trad. francesa (da autoria de
Christel Rollinat) do original inglês de 1970, publicada por Éditions du Rocher, Paris, 1986.

14
naturalmente, mais abrangente e compreensiva que a de Berthelot. Mas temos de

compreender que à Antropologia Social e Cultural e à Antropologia da Religião

interessa mais o estudo da Alquimia praticada - da “alquimia praticada”, num quadro

espácio-temporal, por homens e mulheres, individualmente ou em grupos

(relembremos o exemplar título do libro de John R. Bowen, Religions in Practice – An

Approach to the Anthropology of Religion20), embora essa perspectiva não dispense o

estudo dos textos, quer clássicos, quer modernos, no nosso caso particularmente estes,

já que estudámos os grupos alquímicos franceses contemporâneos.

Temos conhecimento, no entanto, de algumas Teses de Doutoramento, sobre

Alquimia21, mas elas situam-se nas áreas da Filosofia, da Literatura ou da História da

Ciência e nenhuma no período histórico que estudámos (segunda metade do século XX

e em particular, no que diz respeito aos grupos alquímicos, o último quartel do século

XX,), qualquer que seja a área geográfica ou a proveniência cultural dos grupos (no

nosso caso, os grupos franceses, embora com ramificações noutros países). Por exemplo

(sem querer ser exaustivo, mas registando apenas as mais importantes), devem referir-

se, na segunda metade do século XX, os trabalhos de Tese de Pierre Pelvet sobre A

Alquimia em França na primeira metade do século XX 22 – é a única tese histórica,

embora outros pequenos trabalhos já tenham surgido depois deste23 -, de Françoise

20 Needham Heights, MA, EUA, Allyn & Bacon, 1998.


21 Também existem diversos estudos sobre outras disciplinas esotéricas, numa perspectiva etnográfica ou
etnológica. Por exemplo (e sem querer exaustivo, por agora), sobre a magia (ver, por exemplo , numa
abordagem etnológica, "La Magie", Jean Servier, Paris, 1993) e a astrologia (numa abordagem
sociológica, ver por exemplo, o trabalho de Edgar Morin e colaboradores, "Le Retour des Astrologues -
Diagnostic sociologique, Paris, 1971). Ver ainda: “Le défi Magique” vols. 1 e 2, apres. de François
Laplantine, CREA - Centre de Recherches et d’Études Anthropologiques, Lyon, 1994, 1995. Mas, quanto
a nós, o trabalho mais importante sobre a moderna magia urbana é o da antropóloga Tanya M. Luhrmann,
Persuations of the Witch’s Craft – Ritual Magic in Contemporary England, Londres, 1989.
22 Pierre Pelvet, L’Alchimie en France dans la première moitié du Xxe siècle, Thèse de Doctorat de
3e.cycle, Université de Nanterre (Paris X), décembre 1980, 380 p., tapuscrit.
23 Refira-se um recente artigo de Richard Caron, “Notes sur l’Histoire de l’Alchimie en France à la fin du
XIXe. Siècle et au début du Xxe. Siècle” in Ésotérisme, Gnoses & Imaginaire symbolique – mélanges

15
Bonardel sobre a Alquimia no “extremo-ocidente”24 – autora que já publicou

importantes trabalhos sobre Hermetismo (L’Hermétisme25) e Alquimia (Philosophie de

l’Alchimie26 e Philosopher par le Feu27) - e aqueles que já foram publicados sob a

forma de livros, o de Paulette Duval sobre as “estruturas do pensamento alquímico”28 e

o da autoria de Patrick Geay, sobre a Alquimia e o Hermetismo e as “imposturas

filosóficas” na hermenêutica contemporânea29. Saliência ainda para os trabalhos,

resultantes de Teses de Doutoramento, de Betty J. Dobbs sobre “os fundamentos da

alquimia de Newton”30 e de Bernard Joly sobre a “racionalidade da alquimia no século

XVII”31.

De notar ainda que, até hoje, as únicas (e sucintas) referências à actividade

alquímica contemporânea (para além da breve referência feita por Mircea Eliade na sua

clássica obra Ferreirosa e Alquimistas), foram feitas por alquimistas e esoteristas:

- em 1986, por Patrick Rivière, que para além de alquimista praticante e

animador de um grupo que referiremos, escreve livros sobre História do Esoterismo e

offerts à Antoine Faivre, Leuven (Belgique), Peeters, 2001, pp.17-25. Também aproximadamente sobre o
mesmo período, temos o capítulo “La pervivencia de la Alquimia desde 1800” do livro de Helmut
Gebelein, Alquimia, Barcelona, Ed. Robinbook, 2001 (tradução da edição original alemã de Alchemie,
Munchen, Heinrich Hugendubel Verlag, de 1991).
24 Françoise Bonardel, Visions du Grand Oeuvre en Extrême-Occident, “Thèse de doctorat d’État
(philosophie) soutenue à l’Université de Grenoble en Juillet 1984. Tapuscrit, 1383 pages”, como é
referido na revista ARIES, nº. 6, Paris, La Table d’Émeraude Éditeur, 1987, pp.45-53, numa nota de
leitura de J-J Wunenburger.
25 Françoise Bonardel, L’Hermétisme,Paris, Presses Universitaires de France, 1985.
26 Françoise Bonardel, Philosophie de l’Alchimie - Grand Oeuvre et modernité, Paris, PUF, 1993
27 Bonardel, Françoise, Philosopher par le Feu – Anthologie de textes alchimiques occidentaux, Paris,
Seuil, 1995.
28 Paulette Duval, La pensée alchimique et le Conte du Graal – recherches sur les structures (Gestalten)
de la pensée alchimique, leurs correspondances dans le conte du Graal de Chrétien de Troyes et
l’influence de l’Espagne mozarabe de l’Ebre sur la pensée symbolique de l’oeuvre,Paris, Librairie
Honoré Champion, 1979. Este livro é a publicação de Tese homónima, defendida pela autora na
Universidade de Lille III, em 1975.
29 Patrick Geay, Hermés Trahi, Paris, Dervy, 1996; este livro resulta da Tese de Doutoramento realizada
pelo autor, sob a orientação do Prof J.-J. Wunenburger, e defendida na Universidade da Borginha, em
1995 (cf., op. cit., p. 13).
30 Betty J. Teeter Dobbs, Les Fondements de l’Alchimie de Newton ou «La chasse au lion vert», trad. do
inglês por Sylvie Girard, Paris, Trédaniel, 1981 (ed. original publicada por Cambridge University Press,
1975).

16
da Alquimia, no Capítulo 7 do seu livro Alchimie et Spagyrie, intitulado «La Spagyrie

dans le monde»32, com um total de cinco páginas dedicadas a Armand Barbault,

Alexandre von Bernus, Albert Riedel (“Frater Albertus”), F.A.R.C., “Les Phuilosophes

de la Nature”, Canseliet e Attorène ;

- em 1988, por Jean-Pierre Giudicelli Cressac de Bachelerie, numa página do seu

livro Pour la Rose Rouge et la Croix d’Or33; refira-se que nesta obra existem excelentes

referências às “alquimias “internas” e “externas” e, em particular aos F.A.R.C. e à

F.T.M. Myriam (que não referiremos por não se tratar de alquimia operativo-

laboratorial, mas sim da “Alquimia Interna”, fisiológica);

- por Joel Tetard, Alchemy in France today, in Alchemy Web site de Adam

McLean, (s.d., mas deve ter sido inserida na Web em 1998); este trabalho de cinco

páginas é baseado, segundo diz o próprio autor, no livro de Geneviève Dubois,

Fulcanelli Dévoilé34;

- por Andrea Aromatico, em 1996, no último capítulo do seu livro Alchimie, le

grand secret35.

Mais recentemente, Geneviève Dubois publicou um livro intitulado Ces hommes

qui ont fait l’Alchimie du Xxe. siècle36, no qual ela refere, para além de Fulcanelli e

Canseliet, um nome que nos interessa particularmente pois trata-se do criador de um

grupo alquímico que vamos referir e que estudámos (embora não em trabalho de

terreno): o de Roger Caro.

31 Bernard Joly, Rationalité de l’Alchimie au XVIIe siècle, Paris, Vrin, 1992.


32 Patrick Rivière, Alchimie et Spagyrie – du Grand-Oeuvre à la médicine de Paracelse, Paris, Éditions
de Neustrie, 1986, pp. 109-113.
33 J.P. Giudicelli de Cressac Bachelerie, Pour la Rose Rouge et la Croix d’Or, Paris, Axis Mundi, p. 64
34 Geneviève Dubois, Fulcanelli Dévoilé, Paris, Dervy, 1992.
35 Andrea Aromatico, Alchimie, le grand secret, Paris, Gallimard, 1996, pp. 110 - 131
36 Geneviève Dubois, Ces hommes qui ont fait l’Alchimie du XXe.sSiècle, Geneviève Dubois Éditions,
Grenoble, 1999.

17
Quanto aos esoterólogos, mencionaremos Serge Hutin, que numa página do seu

livro Histoire de l’alchimie37 e noutra página do seu libro L’Alchimie38, refere, na

segunda metade do século XX, alquimistas como Eugène Canseliet, Alexandre von

Bernus, Armand Barbault, Roger Caro, Patrick Rivière, Jean Dubuis e Solazaref. No

entanto, um livro como Les sociétés secrètes et les sectes, de Jean-Pierre Bayard39 – que

é uma boa, embora sintética, fonte de informação sobre o tema que o título indica, inclui

a Alquimia no capítulo referente à “Magia e grupos psi”, dedicando-lhe apenas três

páginas e não referindo nenhuma actividade contemporânea, nem nenhum grupo actual.

A razão parece estar no próprio texto de Bayard: Il n’y a pas de cénacule alchimique,

pas d’école, pas de confrérie; seuls quelques chercheurs isolés se transmettent

parcimonieusement certaines de ses acquisitions40. Ora isto, como veremos (já que é o

objecto deste nosso estudo) não é verdade. Esta ideia de que a Alquimia é uma

actividade individual pode decorrer, para além de uma visão romântica do alquimista

como “artista” isolado e “maldito”, da sua associação com a magia – a Alquimia não é a

Magia mas, como veremos, participa de uma concepção e de uma atitude mágicas – e de

esta ser considerada por Durkheim uma actividade individual, face ao carácter social da

religião; retornaremos a este tema no Capítulo seguinte, socorremo-nos das reflexões

que o sociólogo da religião, Massimo Introvigne, inclui no seu livro La magie à nos

portes41, a propósito dos grupos mágicos, hoje. No entanto, além de citar apenas autores

do começo do século, como Jollivet-Castellot – que, via Dantine, teria iniciado Spencer

Lewis, o fundador e Imperator da Ordem Rosa-Cruz A.M.O.R.C. -, Fulcanelli, “ao qual

sucedeu Canseliet”, J.-P. Bayard cita um único grupo alquímico no último capítulo

37 Serge Hutin, Histoire de l’alchimie, Marabout Université, Veviers, Belgique, 1971, 240-242.
38 Serge Hutin, L’Alchimie, Paris, P.U.F., col «Que sais-je?», 1995, p. 56.
39 Jean-Pierre Bayard, Les sociétés secrètes et les sectes, Paris, Philippe Lebaud, 1997
40 op. cit., p. 58.

18
intitulado “Organismos diversos”, nos quais são referidos (por meio da designação e da

morada, sem referência à sua vocação religiosa, iniciática ou esotérica específica) uma

parte considerável dos “movimentos sectários” integrados no “Relatório” da Assembleia

Nacional francesa, de 1996. Aqui sim, vemos um único grupo alquímico – não referido

como tal, mas incluído apenas na designação geral de “movimentos sectários de 50 a

500 adeptos” -, aliás com a designação incorrecta: “Philosophe de la Nature”, em vez

da verdadeira designação Les Philosophes de la Nature.

Também, no âmbito da esoterologia, refira-se que no capítulo “Alchemical

esotericism and the hermeneutics of culture”, incluído na obra colectiva Modern

esoteric spirituality42, Francoise Bonardel não menciona nenhuma actividade

alquímico-operativa contemporânea, pois as suas preocupações se centram apenas na

Alquimia como “hermenêutica da cultura” contemporânea. Considera a autora – uma

filósofa da religião - que os trabalhos dos alquimistas operativos se incluem naquilo que

ela denomina, noutro lugar, o “equívoco oculto-hermetista”43, não lhes dando “direito

de cidade” no panorama do esoterismo do século XX, revelando (mais) um exemplo do

menosprezo de certos intelectuais pelas vias espirituais operativas de tipo artesanal, o

que claramente o caso da Alquimia. Ora a Alquimia tem desde sempre, para além da

dimensão espiritual e simbólica, uma vertente “material” inegável que os historiadores,

como Mircea Eliade no seu já citado Ferreiros e alquimistas, puseram em relevo.

A mesma atitude não exibe Antoine Faivre – o mais notável fundador de uma

moderna “Ciência do Esoterismo” assente na “História das correntes esotéricas

41 Massimo Introvigne, La magie à nos portes, Quebec, Fides, 1994


42 Antoine Faivre & Jacob Needleman, Modern esoteric spirituality,London, SCM Press, 1993, pp.71-
100.
43 Françoise Bonardel, L’Hermétisme, Paris, P.U.F., 1985, capítulo III.

19
ocidentais modernas” -, que no seu livro L’Ésotérisme44 tem, no capítulo dedicado aos

“esoterismos do século XX”, um parágrafo em que escreve que, para além dos

sopradores45 “sem pretensão de gnose” – alguns dos quais “se reunem em associações,

de que a «Paracelsus Research Society» de Salt Lake City, dirigida por Frater Albertus,

alias Albert Riedel (+1984), o que me parece um exemplo injusto pois não é nem

menos “gnóstico” do que os outros alquimistas e grupos alquímicos que estudámos46 –

existem alquimistas operativos, no laboratório, com uma dimensão esotérica e iniciática

mais interessante. É, segundo Faivre, o exemplo de “círculos neo-paracelsianos”, como

o de Alexandre von Bernus e é, também, o caso de “verdadeiros «Filósofos»” como

Eugène Canseliet, discípulo de Fulcanelli. Estes casos reportar-se-ão mais a uma

espécie de “religião privada” – qu’elle (l’Alchimie) à toujours tendance à revêtir47 -, do

que à actividade das associações anteriormente referidas. Este mesmo autor, na sua obra

fundamental L’Accès de l’ésotérisme occidental48, cita duas revistas actuais de

Alquimia que agrupam tanto alquimistas “espirituais” como “operativos”: La Tourbe

des Philosophes49, agrupando discípulos de Canseliet e de Fulcanelli – com “muito

artigos, igualmente, sobre a alquimia prática” – e The Hermetic Journal50, de Adam Mc

Lean que, embora falando também da alquimia operativo-laboratorial, dedica a maior

parte dos seus artigos à “alquimia espiritual” e psicológica.

44 Antoine Faivre, L’Ésotérisme, Paris, Presses Universitaires de France, col. “Que sais-je?”, Paris.
P.U.F., 1992
45 Souffleur, é a denominção tradicional dos que só se preocupam com as receitas para a transmutação dos
metais em puro, negligenciando a dimensão iniciática da Alquimia.
46Antoine Faivre, op. cit., p. 99. Tradução nossa de Certains se rassemblent parfois en associations don’t
la «Paracelsus Research Society» de Salt Lake City, dirigée par Albert Riedel, alias Frater Albertus
(+1984), est un exemplr tout à fait caractéristique.
47 Ibidem.
48 Accès de l’Ésotérisme Occidental, Paris, Éditions Gallimard, “Bibliothèque de Sciences Humaines”,
Vol I, 1986, Vol. II, 1996
49 Vide infra (caps. IV).
50 Idem.

20
Pode constatar-se, como já referimos, da parte de alguns destes autores (como o

caso acima citado de Bonardel) uma menor consideração relativamente à Alquimia

“operativa” ou “prática” – que trabalha com plantas, minerais e metais, seguindo os

velhos Tratados dos grandes alquimistas (Flamel, Basílio Valentim, Filaleto, etc.) -, face

à sua componente “espiritual” ou “iniciática”, a mais divulgada junto do público “new

age”, consumidor de “auto-ajudas” diversas, sob a forma de livros, cassettes,

seminários, etc. (a “alquimia da felicidade”, “a alquimia da harmonia”, “a alquimia do

sucesso”)51. No universo das Novas Espiritualidades, maioritariamente psicológico ou

psico-espiritual, não pode no entanto deixar de mencionar-se um aspecto colateral da

alquimia “física” que é o das essências e que constitui um tema de grande consumo no

mundo “new age” (ou do “next age” – vide infra).

Ora é o próprio Antoine Faivre que, com a sua definição de Alquimia - um bom

ponto de partida que iremos experimentar ao longo da Tese -, contempla, com igual

dignidade, as duas vertentes, a material e a espiritual, na verdade duas faces da mesma

moeda. Para Faivre, ela será uma “visão do mundo (...) tendente a reencontrar (...) a

unidade (...) entre a matéria e o espírito”, podendo “essa prática (...) exercer-se (...)

sobre um elemento material cuja «manipulação» supõe a íntima fusão do sujeito e do

objecto”: une «Weltanschauung»52 à la fois cosmologique et eschatologique, dépourvue

de tout dualisme - mais non point de toute dualitude - accompagnée d’une pratique

spirituelle tendant à retrouver l’unité originelle et glorieuse - mais perdue - de la

matière et de l’esprit, cette pratique pouvant cependant s’exercer, à l’occasion, sur un

51 Saliente-se que para além destas duas formas de Alquimia, a Física/Laboratorial (a que nos acupa aqui)
e a Espiritual ou Psico-Espiritual, há ainda uma terceira, menos divulgada, a “Interna”/Fisológica (ou “das
substâncias”), característica do Taoismo, do Tantrismo e do Hermetismo.
52 “visão do mundo”

21
élément matériel dont la “manipulation” suppose la fusion intime du sujet et de

l’objet53.

Logo, a vertente “operativa”, ou “prática” da Alquimia – a alquimia operativo-

laboratorial, como a designamos - encontra, nestas palavras de Faivre, um fundamento

teórico inequívoco. No entanto, insisto, esta perspectiva abrangente e mais

compreensiva não faz esquecer as reservas que se colocam por vezes, em relação ao

aspecto iniciático e “espiritual” da Alquimia “prática”. Como veremos, nos exemplos

estudados nesta nossa Tese, os próprios grupos de Alquimia operativo-laboratorial (pelo

menos os franceses) que apresentam interessantes concepções espirituais de filosóficas

da Arte de Hermes que se articulam harmoniosamente com a sua actividade “prática”,

não deixam no entanto de introduzir nos seus ensinamentos, certas contribuições

espirituais de algumas correntes esotéricas originalmente estranhas à Alquimia, como se

reconhecem implicitamente que a Alquimia por si só tem dificuldade em impor-se aos

seus adeptos (pelo menos aos principiantes) como uma via espiritual de parte inteira. A

questão da espiritualidade das vias artesanais, num Ocidente demasiado racionalizado

ou misticizado, para ser uma questão fulcral a que retornaremos adiante

Não quero deixar de referir, desde já e explicitamente, nesta introdução – tema a

que voltarei adiante, ao longo deste trabalho -, que o estudo dos grupos alquímicos

franceses operativo-laboratoriais cabe bem numa abordagem socio-antropológica ou

antropológica do fenómeno do religioso em geral54, desde o sagrado primitivo da

experiência natural do fogo até ao seu controle tecnológico, passando pela experiência

tecnológica do oleiro e do vidreiro, até aos primórdios da Metalurgia, da Química e da

53A. Faivre, “Pour une approche figurative de l’Alchimie”, in Alchimie, op. cit., Paris, 1978, p. 164

22
Farmácia. Todos estes feitos tecno-científicos são, no homem arcaico, integrados e

acompanhados por uma visão do mundo sagrada, pela qual controlar o fogo, fundir os

metais, misturar e transformar os materiais, etc. se constituem como operações sagradas

que se situam no domínio do mágico-religioso. Na realidade, o alquimista, de ontem e

de hoje, insere-se nesta tradição do técnico e do artista que domina, pelo fogo - seja ele

oleiro, vidreiro, ferreiro, químico ou farmacêuticas -, as técnicas de transformação dos

materiais. O que acontece hoje com a Alquimia no contexto das novas religiosidades e

espiritualidades é a recuperação desse imaginário tecnológico artesanal antigo e

sagrado, numa operação de “reencantamento do mundo” que corresponde a uma

necessidade do Homem moderno – como veremos no capítulo seguinte - e que está no

centro dos Novos Movimentos Religiosos (N.M.R.) e das Espiritualidades Alternativas

(E.A.) que procedem também a uma utilização moderna das “antigas sabedorias” e que

radicam na contracultura dos anos 60 a qual tem uma dimensão ideológica e social com

uma função não muito distinta das “novas espiritualidades”. Essa abordagem

antropológica ou socio-antropológica dos ressurgimentos alquímicos – quer sejam eles

sobrevivências do antigo ou suas actualizações modernas ou pós-modernas – cabe numa

perspectiva do religioso, hoje, e ao mesmo tempo da permanência ou recuperação do

antigo.

Logo, este trabalho de Tese que se segue começará pois, imediatamente, pela

seguinte questão, da qual decorrerão, como veremos a seguir, outras questões relativas a

método:

- poderá a Antropologia da Religião estudar os grupos contemporâneos de Alquimia

operativo-laboratorial, isto é, caberá o estudo desses grupos esotérico-alquímicos no

54como muito bem referiu Mircea Eliade, salientando a dimensão do sagrado em Alquimia, no seu livro
Forgerons et Alchimistes.

23
âmbito do seu objecto de estudo? E o estudo desses grupos contemporâneos caberá no

contexto dos NMR e EA? A ambas estas questões ousaremos dar resposta positiva, quer

no domínio teórico, quer na prática, através da própria realização deste Trabalho.

A abordagem da Alquimia como fenómeno religioso

A Alquimia é uma actividade teórico-prática fundada no Hermetismo de

Alexandria, o qual não é, nem nunca foi, uma instituição religiosa, mas sim uma

filosofia mágico-religiosa que teve por vezes uma expressão prática, aquilo a que se

denomina a alquimia operativa física, laboratorial. A Alquimia situa-se pois num quadro

religioso, entendendo a “religião” não numa visão ocidental das instituições religiosas,

mas numa perspectiva antropológica. No entanto, embora reconhecendo que é difícil

definir a religião no âmbito da Antropologia, propomos, de seguida, algumas

abordagens recentes do objecto de estudo, comecando pela avançada por Rebecca e

Philip Stein, relativa ao “sagrado sobrenatural” e para os quais religion is a system of

beliefs and behaviours that deals with the relationship between humans and the sacred

supernatural55.

Contrariamente a muitas (mas não a todas) as instituições religiosas e religiões, a

Alquimia não postula a existência de “seres não empíricos”, supra-humanos e

metafísicos – por exemplo, a definição antropológica de religião, de Melford Spiro, é a

de que ela é uma institution consisting of culturally patterned interactions with

55Stewin, Rebecca L. e Stein Philip L., The Anthropology of Religion, Magic, and Witchcraft, New York,
Pearson, 2005, p. 19

24
culturally postulated superhuman beings56. A Alquimia não é uma religião nesse

sentido estrito de postular seres sobre-humanos, mas ela postula, de facto, a existência

não de seres, mas de forças sobrehumanas (ver Olav Hammer no artigo citado a seguir)

e sobrenaturais (ver a definição dos Stein, acima indicada), entendendo como

“sobrenatural” aquilo que se concebe como aquilo que está “acima do natural”, ou “para

além do natural”. Aliás, definições socio-antropológicas clássicas da religião

contemplam essa dimensão, como por exemplo:

- a de Frazer que fala em “poderes superiores ao homem”, a propitiation or

conciliation of powers superiors to man which are believed to direct and control the

course of nature and human life57;

- a de Durkheim que concebe a religião como tendo a ver com a crença em

“coisas sagradas”, sendo ela un système solidaire de croyances et de pratiques

relatives à des choses sacrées, c’est-à-dire séparées, interdites, croyances et pratiques

qui unissent en une même communauté morale, appelée Église, tout ceux qui y

adèrent.58

No entanto, há que reconhecer que aplicando a definição de Frazer à Alquimia,

os “poderes superiores” que ela postula e com que ela lida não se estendem a toda a vida

do homem mas à natureza e particularmente ao trabalho de laboratório sobre uma parte

dela. Veremos, no Capítulo sobre a Alquimia e seus conceitos, que esse poder superior

do alquimista e da matéria se pode colocar em analogia com o conceito de mana.

56 Spiro, M. E., “Religion: Problems of Definitions and Explanations”, in Banton, M. ed.,


Anthropological Approaches to the Study of Religion, London, Tavistock, 1966, p. 96, citado por Rebecca
e Philip Stein, op. cit., p. 19.
57 James Frazer, The Golden Bough: a Study in Magic and Religion (1922), N.Y., Macmillan, 1958,
pp.58-9.
58 Émile Durkheim, Les forms élémentaires de la vie religieuse, Paris, Le Livre de Poche, 1991, pp. 108-
109; introdução de Michel Maffesoli.

25
No que diz respeito à definição de Durkheim, não há dúvida de que ela aplica à

Alquimia – as “coisas sagradas, separadas, interditas” -, e embora a designação de

“Igreja” possa parecer demasiado restrita, ela pode aplicar-se no entanto aos grupos

religiosos que não são Igreja mas apresentam comportamentos similares, o que é o caso

dos NMR, das “seitas” e dos “cultos” e dos grupos alquímicos estudados, embora com

um maior ou menor grau de “comunidade moral”. Para Wallace, a religião é um

conjunto de rituais, racionalizados pelos mitos, que mobilizam poderes

sobrenaturais com o fim de conseguirem ou impedirem transformações de estado

no homem e na natureza: a set of rituals, rationalized by myth, which mobilizes

supernatural powers for the purpose of achivieng or preventing transformations of state

in man and in nature.59

Considerando a Alquimia como corpo doutrinário, ela pertence ao universo do

religioso, pois inclui-se claramente na definição de Clifford Geertz, para o qual a

religião é (1) a system of symbols which act to (2) establish powerful, pervasive, and

long-lasting moods and motivations in man by (3) formulating conceptions of a general

order of existence and (4) clothing this conceptions with such an aura of factuality that

(5) the moods and motivations seem uniquely realistic.60

Considerando os grupos alquímicos que estudámos pode ver-se que eles se

incluem numa definição antropológica recente da religião, como a de Ninian Smart,

para a qual há “seis dimensões da religião”:

1. The institutional dimension (the organization, the leadership);

2. The narrative dimension (myths, creation stories, worldview);

59 Anthony Wallace, Religion: An Anthropological View, N.Y., Random House, 1966, p. 107.

26
3. The ritual dimension (rites of passage and other important activities);

4. The social dimension (religion being a group activity that binds people

together);

5. The ethical dimension (customs, moral rules);

6. The experiential dimension (religion involving experiences of a sacred

reality that is beyond ordinary experience).61

Por outro lado, paralelamente à afirmação da sua dimensdão religiosa, é preciso

dizer que a Alquimia não é uma ciência, embora os alquimistas a denominem de

Ciência de Hermes. No entanto, por outro lado, é preciso afirmar de que ela é mais do

que uma “pré-ciência” - como a denominou Marcelin Berthelot – pois contém clara uma

dimensão espiritual e religiosa – o que nos leva de volta ao que dizíamos há pouco.

Convém referir desde logo e neste contexto não científico onde ela se situa que a

“ciência de Hermes” está à margem dos parâmetros de repetibilidade, controle e

verificação das experiências e das hipóteses que presidem à ciência positiva, pois a

Alquimia afirma depender das “condições interiores” do operador e das “condições

exteriores” geográfico-temporais que enquadram a operação – ver por exemplo a

discussão clássica destas condições feita por Canseliet, no Capítulo respectivo incluído

no seu livro L’Alchimie expliquée sur ses textes classiques, ou ainda a sua entrevista que

dá a Robert Amadou em Le Feu du Soleil. De facto, fala-se em Alquimia, de lugares e

de épocas do ano especiais para a realização da Obra e também de condições

particulares do operador que nem sempre se verificam – disto nos falarão os alquimistas

dos grupos que estudámos.

60 Clifford Geertz, The Interpretation of Cultures, Nova Iorque, Basic Books, 1973, p. 90.

27
A possibilidade de uma Antropologia dos NMR e da EA e dos grupos

esotéricos e alquímicos contemporâneos, em particular

É um facto que, contrariamente à Sociologia, a Antropologia não tem tomado a

dianteira dos estudos dos denominados Novos Movimentos Religiosos (NMR). Isto

constitui uma lacuna pois como escreve James R. Lewis na Introdução à obra colectiva,

por ele coordenada, The Oxford Handbook of New Riligious Movements62, a abordagem

antropológica – porque leva a sério a “experiência religiosa” - é indispensável para uma

compreensão dos novos fenómenos religiosos, já que, a sociologia “vê as novas

religiões como decorrentes de forças sociais”, não considerando a “experiência religiosa

como factor motivador independente”: (sociology) however views news religions as

arising out of social forces; as a discipline, sociology does not consider religious

experience as an independent motivating factor for the emergence of new religious

forms. Por isso, a Antropologia não deverá abdicar da sua responsabilidade e

capacidade em estudar a experiência religiosa como factor poderoso e motivador da

criação de novas formas religiosas.

Por seu lado, mas na mesma direcção de pensamento, o sociólogo das religiões

Massimo Introvigne afirma que Les anthropologues et les ethnologues ont certainement

une parole importante à dire dur l’existence même du magique dans les sociétés

contemporaine,63 já que, contrariamente às teses do evolucionismo – exemplificadas

pelo The Golden Bough (1890) de James Frazer (ver bibliografia), o qual retomava a

61 Ninian Smart, Worldviews: Crosscultural Explorations of Human Beleifs, NJ, Prentice Hall, 1999, pp.
8-10, citado por Rebecca e Philip Stein, op. cit., p. 19.
62 Oxford, Oxford University Press, 2004.
63 Massimo Introvigne, La Magie à nos portes, Quebec, Fides, 1994, p.13.

28
ideia de um Comte relativa à evolução da humanidade em três etapas, a magia, a

religião e a ciência -, “constata-se hoje que o mágico não só não desapareceu com o

progresso científico e tecnológico, mas que ele nunca esteve tão presente socialmente”

como nos nossos dias: Aujourd’hui, on constate que le magique n’est absolument pas

disparu avec le progrès de la société scientifique et technologique; au contraire il n’a

jamais été aussi présent socialement dans le monde contemporain64.

No entanto, mesmo a sociologia, segundo Introvigne65, tem tido alguns

problemas em estudar a magia contemporânea por duas ordens de razões:

- uma geral e antiga, devido à “relação problemática das ciências sociais com a

magia”, radicada nas perspectivas positivistas e racionalistas que têm fundado quer a

sociologia quer a antropologia – ver a argumentação, neste sentido, de Susan

Greenwood66;

- outra particular, devido à noção Durkheimiana da magia como “experiência

eminentemente individual” o que chocaria com o estudos dos NMR de tipo mágico,

onde a magia é também, como na alquimia contemporânea, uma experiência colectiva.

No universo de língua francesa – onde se salienta, no contexto da “magia

descendente” (cf. Introvigne67), a abordagem antropológica do mágico-religioso rural

contemporâneo, em J. Favret-Saada com Les mots, la mort et les sorts68 -, referiremos,

já no universo do mágico-religioso urbano contemporâneo, em 2000, o nº. Especial

64 Op. Cit., p. 22.


65 Op. Cit., particularmente o Cap. 3.
66 Susan Greenwood,, Magic, Witchcraft and the Otherworld – an Anthropology, Oxford, Berg, 2000,
p.3.

67 Para Massimo Introvigne é conveniente distinguir a “magia descendente”, a tradicional, a popular e


rural, da “magia ascendente”, urbana e das classes médias.
68 Favret-Saada, J.,Les Mots, la mort, les sorts, Paris, Gallimard, 1977.

29
(colectivo) Les Nouveaux Mouvements Réligieux da revista Ethnologie française69, onde

um grande nome como a socióloga das religiões Françoise Champion constata, no seu

artigo La religion à l’épreuve des NMR, o desinteresse demonstrado pelos etnólogos

(franceses, em particular), pelas novas formas religiosas das sociedades modernas,

desinteresse que não é tão gritante nos países de língua inglesa onde, embora escassas,

surgem obras de referência de Antropologia dos NMR, como o excelente Persuasions of

the Witch’s Craft – Ritual Magic in Contemporary England70 (1989), de Tanya M.

Luhrmann e o Magic, Withcraft and the Otherworld – An Anthropology71 (2000), de

Susan Greenwood.

Em França é de destacar ainda o capítulo “La magie réinterprétée” da 4ª. Parte,

“Les marges de la religion”, do livro Socio-anthropologie des religions (1997) de

Claude Rivière72, Profesor de Antropologia da Sorbonne-Paris V, e os dois volumes da

obra colectiva Le Défi Magique73 (1994), coordenada por Jean-Baptiste Martin, cujo

primeiro volume, Ésotérisme, Ocultisme, Spiritisme, é apresentado pelo antropólogo

François Laplantine, sendo o segundo, Satanisme, Sorcellerie, apresentado pelo

sociólogo das religiões Massimo Introvigne e, para além destas obras, o trabalho de

Maurice Duval Un ethnologue au Mandarom. Enquête à l’intérieur d’une «secte»74

(2002). E se o antropólogo Lionel Obadia no seu recente livro L’anthropologie des

religions (2007)75 explicita algumas reservas quanto à possibilidade de uma

Antropologia dos NMR, reservas assentes sobretudo no objecto de estudo – distante das

“sociedades primitivas”, objecto tradicional da antropologia -, já Richard Lioger, pelo

69 a.v., Les Nouveaux Mouvements Religieux, “Ethologie française”, Paris, P.U.F., 2000/4
70 Blackwell, Londres,
71 Op. Cit.
72 Paris, Armand Colin.
73 Presses Universitaires de Lyon, Lyon.
74 Presses Universitaires de Franca, Paris.

30
contrário, publica em 2001 um artigo intitulado Pour une ethnologie contemporaine des

pratiques de l’alchimie et des sciences ésotériiques76, assunto que nos interessa aqui

sobremaneira.

A Antropologia tem-se, pois, ocupado sobretudo, no que toca à

contemporaneidade religiosa, do estudo de religiosidades rurais ou urbanas quer em

países desenvolvidos, quer no chamado “terceiro mundo” - feitiçaria rural, “ghost

dance”, “snake-handling”, cultos “cargo”, Santeria, Voudou, Brucheria, Regla de Ocha,

Candomblé, etc, No entanto o lugar para os NMR está quase (e ainda) vazio. Como

refere Tanya M. Luhrmann no seu volumoso estudo acima citado, sendo a tarefa

tradicional da Antropologia, to describe and make intelligible, for a large Western

audience, the strange beliefs and experiences of informants who are largely non-

Western, ela tem como objectivo “estudar o simples e o longínquo para

compreender o próximo e o mais complexo”: In all these (previous) phases,

anthropologists have focused on the distant and more primitive, and claimed that

through their very exotism, the near and apparently more complex might be better

understood77.

Mas, de facto, continua a autora, “o mundo mudou” e o objecto de estudo da

Antropologia também, razão pela qual os antropólogos se voltam, do distante e do

primitivo “evanescente”, “para as suas próprias sociedades”: The world has changed

for anthropology. The primitive societies are slowly vanishing (...). Ever more

anthropologists are turning inward to study their own society78. Contudo, apenas o

75 Éd. La Découverte, Paris.


76 In Transversalités festives, “Cahiers de l’Imaginaire”, nº. 19 (2001), pp. 145 – 164.
77 T. M. Luhrmann, op. cit., p. 4
78 Ibid.

31
têm feito, segundo a autora, para “problemas imediatos da vida urbana”: (...) they have

tended to focus on the immediate problems of urban life: ethnicity, acculturation,

religious revitalization79, pelo que Luhrmann constata uma lacuna básica nessa

Antropologia urbana: Few (anthropologists) have continued to ask traditional

anthropological questions, to look for the exotic and learn from it about the familiar,

pois, mesmo estudando o actual – onde encontramos no seu seio, mesmo em sectores

desenvolvidos, o mágico -, teremos sempre de partir desse quadro antropológico

tradicional.

A “questão antropológica tradicional” a que ela quer responder, com o seu

estudo da magia e do ritual em “pessoas normais da classe media inglesa”, é a que ela

sintetiza lapidarmente do seguinte modo: why do they practice” magic when,

accordingly to observers, magic doesn’t work?80. Deixando de lado a postura

afirmativa e crítica relativa à falsidade objectiva da magia, o que lhe tem valido muitas

críticas – postura que não invalida, no entanto, a verdade subjectiva da mesma, tema

que discutiremos no parágrafo seguinte - saliente-se desde já a possibilidade (e a

necessidade!) de uma “antropologia urbana religiosa”, que no entanto, é forçoso dizer,

não tem dado muitos frutos até hoje, como refere, aliás, Lionel Obadia: Certes, la

possibilité de fonder, par exemple, une anthropologie urbaine religieuse qui

s’inscrirait dans la continuité des approches «classiques» de ethnologie, tout en se

nourissant des approches singulières d’une anthropologie urbaine (...), n’a pas donné

lieu à des developpements substantiels sur le plan théorique, l’apport est

essentiellement méthodologique.81

79 Ibid.
80 Ibid.

32
No entanto, enquanto não chegam esses “desenvolvimentos substanciais no

plano teórico”, objectivo ambicioso, diga-se, porque não voltar às questões

fundamentais da Antropologia como o fez, por exemplo, T.M. Luhrmann, no seu

trabalho pioneiro sobre as religiosidades e espiritualidades contemporâneas das

sociedades modernas, concretamente sobre a magia urbana?

Nessa senda, embora com uma maior abertura, face a Luhrmann, em relação ao

objecto de estudo, caminhou a antropóloga Susan Greenwood – que Obadia, embora

mais reservado em relação a uma antropologia dos NMR, cita (não citando, no entanto,

Luhrmann) -, com um trabalho sobre magia urbana, o já citado Magic, Witchcraft and

the Otherworld que, segundo as suas próprias palavras, é “um estudo da tradição

esotérica ocidental (...) na última década do século XX”: This is a study of certain

ideas, philosophies, practices and groups within the Western esoteric tradition in the

last decade of the twentieth century82. Insistindo na questão do objecto de estudo, e na

sua “translacção” desde as “sociedades não ocidentais, em pequena escala ou em

desenvolvimento” até ao objecto do seu estudo localizado num contexto da “contra-

cultura mágico-espiritual ocidental”, a autora afirma: Anthropology has traditionally

been concerned with the translation of cultures usually of non-Western small-scale or

developing societies; but this book is an anthropological study of a Western magico-

spiritual counter-culture commonly termed Paganism83 Continuando, a autora salienta

que a questão do estudo de “uma sociedade complexa” não é “um campo clássico” da

Antropologia e que ele traz “problemas específicos”, já que entre outras coisas, as

pessoas estudadas neste contexto são, contrariamente aos «primitivos», “altamente

educadas e criativas” possuindo “empregos exigentes e de responsabilidade”, sendo a

81 Lionel Obadia, op. cit., pp 85-86.


82 Susan Greenwood, Magic. Witchcraft, and the Otherworld – An Anthropology, Oxford, Berg, p. ix.

33
sua prática mágica “baseada na literatura”: Magic and the study of witchcraft is a

classical anthropological concern; but research in a complex society – a non-classical

field – brings specific problems. Magicians in Britain are usually highly educated and

creative, often holding responsible and demanding jobs. Contemporary magic is a

literary-based practice, and a profusion of books and magazines have been written on

all aspects on magical philosophy and technique.84

Questões metodológicas

O método de investigação que basicamente empregamos neste estudo é – como

já referimos anteriormente - o método fenomenológico, que permite separar o estudo

das religiões, numa perspectiva das ciências humanas e sociais, da (normativa)

abordagem teológica das mesmas. Trata-se de atingir uma neutralidade metodológica -

o agnosticismo metodológico de que fala Ninian Smart, diferente no entanto do

ateísmo metodológico de Peter Berger85 – neutralidade que Evans-Pritchard

proclamava em Theories of Primitive Religion86:

“...the anthropologist (...). He is not concern qua anthropologist, with the truth

or falsity of religious thought. As I understand the matter, there is no possibility of his

knowing whether the the spiritual beings of primitive religions or of any others have

any existence or not, and since that is the case he cannot take the question into

consideration. The beliefs are for him sociological facts, not theological facts, and his

sole concern is with their relation to each other and to other social facts. His

problems are scientific, not metaphysical or ontological. The method he employs is

83 Op. Cit., p. 1.
84 Op. Cit., p. 11.
85 Cf. Fiona Bowie, The Anthropology of Religion, Londres, Blackwell, 2000, p. 29.

34
that now often called the phenomenological one – a comparative study of beliefs and

rites, such as god, sacrament , and sacrifice, to determine their meaning and social

significance.”

Acerca deste método fenomenológico, refere Fiona Bowie:

“This methodological neutrality or agnosticism allows in theory at least,

anthropologists of any or no religious persuasion to examine the religious beliefs and

practices of others without bias. Any cosmological statement or ritual practice is of

interest not because it might or might not be true, but for what it reveals of a coherent

body of thought that constitutes a culture and its social structure.87

Esta neutralidade metodológica que assenta também as suas bases numa

perspectiva comparativa - um “estudo comparativo de crenças e ritos”, como refere

Evans-Pritchard no texto acima citado – deve restituir essas crenças, ritos e textos

sagrados com a maior verdade possível (“emic”), numa primeira etapa, sem alteração

nem deturpação - “with as little comment and judgement as possible88, dirá F. Bowie –

a qual será seguida por uma interpretação (“etic”).

Por vezes alguns antropólogos seguidores de um positivismo e de um

materialismo que eu considero excessivos já que ultrapassam o campo da metodologia

situando-se mais no plano da ideologia (perfeitamente legítima, aliás, como qualquer

outra) começam por este segundo momento de crítica, quase esquecendo o primeiro, tão

desejosos que estão de proclamar a “falsidade” das crenças e das práticas religiosas, não

86 E. E. Evans-Pritchard, Theories of Primitive Religion (1965), Oxford, Oxford University Press, 1972,
p. 17 (o sublinhado é nosso)
87 Fiona Bowie, op. cit., p. 5.
88 Ibidem.

35
deixando sequer ouvir a voz dos crentes e dos praticantes. Diga-se que esta atitude – que

pode configurar alguma arrogância cultural - que assenta no postulado de que sendo a

antropologia uma ciência, “baseada no empirismo e na racionalidade”89, ela tem o dever

de estabelecer o que é verdadeiro e falso no comportamento humano: if something is

demonstrably false, the anthropologist should say so90. Defensores desta postura são por

exemplo James Left: the anthropologists have an intellectual and ethical obligation to

investigate the truth or falsity of religious beliefs91 e Stewart Guthrie, este mais

radicalmente determinado em “provar que toda a religião é um resultado de

antropomorfismo e logo ilusória”92.

Ora, como muito bem diz Fiona Bowie, esta postura está cada vez mais afastada

do espírito antropológico moderno e é dificilmente aplicável à religião uma vez que esta

é de natureza não-empírica e assenta no domínio da fé, logo a sua “verdade ou

falsidade” é “inverificável”. Isto parece-nos válido no que diz respeito às crenças em

mundos e entidades supra-físicas (espíritos, deuses, etc.). No entanto, no que diz

respeito à Alquimia que proclama a crença em “objectos totais” que, embora com uma

dimensão simbólica e mítica, como a Pedra Filosofal e o Elixir das Longa Vida, não

deixam de ter uma expressão material, é mais fácil e mesmo legítimo afirmar que, face à

ciência moderna eles não podem existir. As transmutações são teoricamente possíveis e

praticamente (no quadro da química nuclear), mas não nas condições das experiências

laboratoriais da Alquimia que decorrem a baixas temperaturas e baixas pressões. Neste

sentido poderemos subscrever, no quadro da Alquimia e dos alquimistas, a afirmação de

T.M. Luhrman – “como é que as pessoas continuam a acreditar em coisas que sabemos

89 Tradução de based on empiricism and rationality, cf. Fiona Bwie, op. cit. p. 6
90 ibidem.
91 “Science, religion and anthropology”, in Stephen D. Glazier (ed.), Anthropology of Religion: a
Handbook, Wesport, CT, Greenwood, Press, p. 77.

36
que não existem” - que, embora discutível se aplicada à magia e face à nova atitude

antropológica anteriormente referida , nos parece adequada se aplicada à Alquimia e aos

seus objectos materiais.

Há que referir, no domínio metodológico – e inserida neste novo espírito

antropológico, do qual decorre uma metodologia - a interessante corrente da

Antropologia “reflexiva e experiencial” que inclui relatos autobiográficos dos

etnógrafos. Como declarou Susan Greenwood logo no começo do seu trabalho, My

analysis stresses the importance of a reflexive and experiential fieldwork and I begin

this study with a sort of autobiographical introduction93. Explicitando a problemática

metodológica com que ela se defrontou - a “batalha” entre o emic do crente e o etic do

cientista social - e que suscitou ao mesmo tempo uma opção de “diálogo reflexivo”

entre o trabalho de terreno e a teoria antropológica, escreve ela: Like any

anthropologist, I have to battle with emic and etic interpretations of data (...) my

fieldwork material is constructed through a reflexive dialogue with aspects of

anthropology itself.

Seguirei, pois, neste trabalho, seguindo T. Luhrmann e S. Greenwood, uma

aproximação fenomenológica e uma perspectiva reflexiva e autobiográfica que

antecederá – e complementará - a descrição etnográfica e a interpretação etnológica e

socio-antropológica. De salientar que descrição histórica, que aqui realizamos, da

alquimia francesa da segunda metade do século XX e dos grupos alquímicos franceses

do último quarto do século XX, pode parecer um pouco extensa, mas a tal fui obrigado

92 All religion is a result of anthropomorphism, and therefore illusory, cf. Fiona Bowie, op. cit. p.7.
93 Op. Cit. p. ix.

37
pois não havia até hoje nenhum estudo sobre este tema – estudo histórico de que

apresentamos em anexo uma “cronologia” inédita.

Estrutura deste trabalho

Depois de uma Introdução, no Cap. I, onde são colocadas algumas questões

teóricas e metodológicas prévias e ensaiadas (parcialmente) as suas respostas,

começarei com o Relato autobiográfico centrado numa perspectiva da Antropologia

reflexiva – objecto do Cap. II -, testemunhando o meu diálogo, por um lado, entre o

interesse pelo objecto de estudo (a Alquimia) e a sua vivência e o estudo dos grupos que

o praticam, hoje e, por outro lado, o meu lento caminhar na aprendizagem da

Antropologia (difícil, no meu caso, porque provindo de outras paragens e de outros

universos). No Cap. III tratarei de percorrer brevemente a história da Alquimia,

referindo e estudando a sua filosofia – e inserindo-a no contexto das correntes esotéricas

ocidentais (no sentido de Antoine Faivre) -, os seus símbolos, mitos e ritos. Considero

que a alquimia operativo-laboratorial (a que é objecto deste estudo) é um rito,

intimamente associado a um mito, o mito alquímico que estudarei nesse capítulo e que

está expresso na “Tábua de Esmeralda” do hermetismo alexandrino. Após o estudo do

ressurgimento da Alquimia em França no século XX, particularmente na sua 2ª. metade,

objecto do Cap. IV, estudaremos no Cap. V - onde daremos conta da nossa descrição

das práticas dos grupos alquímicos estudados - as diversas modalidades dos ritos

alquímicos, praticadas pelas diversas correntes e escolas, na verdade variações em torno

do rito principal, ou principial, atrás referido, tal como acontece com as simbólicas e as

mitologias próprias de cada grupo. No Cap. VI faremos o estudo socio-antropologico

destes grupos e da sua estrutura e ideologia, integrando-os naquilo que se denomina

38
hoje de Novos Movimentos Religiosos (ou mágico-religiosos) e Espiritualidades

Alternativas, procurando encontrar as causas da sua emergência e da sua necessidade,

sentida por muitos homens e mulheres dos nossos dias. O Cap. VII será dedicado à

Conclusão ao qual se seguirá a Bibliografia. Nos Anexos incluiremos: uma Cronologia

da Alquimia em França na segunda metade do século XX, uma Ficha de identificação

dos grupos estudados que elaborei com base numa outra proposta por um investigador

(que cito), um pequeno Glossário e, a terminar, Documentação diversa dos diversos

grupos estudados (fotos, cartas, monografias de instrução, revistas, etc.).

Em suma, procurei neste Trabalho de Tese, após dar um testemunho reflexivo e

experiencial, focar a prática da alquimia operativo-laboratorial sob diversas perspectivas

que interessam à Antropologia, começando pela da História e pela do Símbolo, do Mito

e do Rito, e passando à abordagem socio-antropológica da emergência destes

fenómenos das novas religiosidades e espiritualidades – grande parte das quais são

actualizações da tradição e outras “invenções da tradição” – numa perspectiva social,

cultural e religiosa. Terminaremos com o estudo destes grupos alquímicos franceses do

último quartel do século XX com a análise da sua estrutura social e das relações com a

sua ideologia (incluindo a política).

39
II – RELATO AUTOBIOGRÁFICO E ANTROPOLOGIA REFLEXIVA

You are what you study – Van Maanen 94

Il existe toujours quelque relation entre la biographie d’un homme et

l’ensemble de ses curiosités – Émile Poulat95

Comecei a interessar-me pela Alquimia e a estudar a sua história e filosofia

quando a partir de finais de 1970, regressado de Angola onde prestei Serviço Militar

Obrigatório, terminei os meus estudos superiores na Faculdade de Ciências de Lisboa –

o Bacharelato em Química, em 1973 e logo depois os dois anos da Licenciatura no

Ramo Científico de Química-Física. A minha relação com o esoterismo tinha tido um

primeiro momento nos anos 50 quando, com cerca de 14 ou 15 anos, o meu padrinho

me ofereceu um livro traduzido em português (nos Livros do Brasil), Os discos

voadores, seu enigma sua explicação, de Leslie (teósofo e autor da interessante, mas

especulativa, parte sobre civilizações desaparecidas) e Adamski (que se provou, mais

tarde, ser autor de uma célebre fraude sobre discos voadores, iniciada precisamente com

as fotografias que este livro continha). Era eu na altura um católico praticante e filiado

da Mocidade Portuguesa, no Liceu Camões em Lisboa, prática posta em causa e

posteriormente abandonada quando assisti aos episódios de repressão policial, aquando

das eleições gerais de 1959 (onde participou o Gen. Humberto Delgado).

94 J. Van Maanen, Tales of the field: on writing Ethnography, Chicago, Universigty of Chicago Press,
1988, p. 391, citado por J. Burckhead, no seu artigo “Reading «Snake Handling», in Stephen Glazier ed.,
Anthropology of Religion - an Handbook, Praezer, 1997 (1999), p. 23.
95 Émile Poulat, Liberté, laicité, Paris, Cerf/Cujas, 1987, pp. 322-323, citado por Jean-François Mayer na
epígrafe do seu livro Confessions d’un chasseur à sectes, Paris, Cerf, 1990. De referir que Émile Poulat
foi o antecessor de Antoine Faivre na EPHE-École Pratique des Hautes Études (Section de Sciences
Réligieuses), quando erm 1965 criou a cadeira de “Histoire de l’ésotérisme chrétien” que, a partir de

40
Por essa altura (começo dos anos 60) comecei a interessar-me pela literatura e

pela filosofia - com colegas como Eduardo Prado Coelho, Mário de Carvalho, e Rafael

Gomes Filipe –, sucessivamente, Nitcshe, o existencialismo, o surrealismo e depois o

marxismo (numa perspectiva revisionista). Dei conta, numa viagem a Paris, em 1960,

onde comprei, nos “bouquinistes”, uma colecção dos 6 números da revista Surréalisme

même - do enorme interesse que o Surrealismo, nomeadamente o seu mais ilustre

nome, André Breton, teve pela Alquimia, quer pela provocação antiracionalista que

encerrava, quer pela provocação moral, sexual e religiosa (ou antireligiosa) das suas

metáforas – o que veio a chocar com um certo moralismo do marxismo organizado,

onde militei (de 1962 a 1967, no PCP).

Em 1967 fui para Mafra, fazer a recruta para Oficial Miliciano seguindo, como

Aspirante, no começo de 1968, para a Escola Prática, em Vendas Novas. Nos dois anos

que passei em Angola, de Outubro de 1968 a Outubro de 1970, tive uma crise

existencial e mística (talvez devido ao afastamento de Lisboa e ao “stress” das situações

de guerra que, apesar de tudo eu vivia esporadicamente, já que fiquei colocado em

Luanda, fazendo apenas mensalmente colunas de reabastecimento para o Norte de

Angola), com um regresso parcial ao Cristianismo, mas agora numa perspectiva

individual e interior, direi hoje, gnóstica.

Regressado a Lisboa, comecei a frequentar, a partir de começos de 1970 e por

razões de saúde psico-fisiológica, um restaurante macrobiótico, “A Colmeia”, no Largo

de Camões, em Lisboa, onde tomei contacto com a filosofia da Macrobiótica Zen que,

1979, foi substituída pela de “Histoire des courants ésotériques et mystiques dans l’Europe moderne et
contemporaine”, já sob a responsabilidade de A. Faivre.

41
num certo sincretismo típico das “novas religiosidades e espiritualidades”, incluía o

Taoismo e as suas concepções e práticas alquímicas – o que me fascinou bastante.

Entretanto, reli em português (edição da Bertrand) O Despertar dos Mágicos, de Pawels

e Bergier, saído em França em 1960, mas a que não tinha dado uma grande atenção,

talvez por causa do título. Este livro falava do misterioso alquimista Fulcanelli

(vulcano, fogo e helios, sol, logo, sob o signo do “fogo do sol”) – possuidor, talvez,

dos segredos da transmutação alquímica, segundo um dos autores, Jacques Bergier,

físico nuclear -, o que me levou a ler, em 1973 e 1977, na tradução portuguesa primeiro

(nas Edições 70) e depois nas reedições francesas (de 1964 e 1965) as suas duas obras,

respectivamente, O Mistério das Catedrais e As Mansões Filosofais (este numa

excelente tradução, com sábias notas relativas à linguagem cifrada da alquimia, a

“cabala fonética”, da autoria de António Last e do cineasta António Lopes Ribeiro).

Estes livros de Fulcanelli, prefaciados pelo seu discípulo Canseliet (quand sel y est,

“quando o sal aí está”, a Obra pode ser feita) tinham uma dimensão cultural não muito

habitual nos livros de divulgação alquímica da época, fazendo apelo ao conhecimento

que o autor anónimo tinha da arquitectura das catedrais góticas e do simbolismo nelas

contido, ao mesmo que veiculava alguns aspectos da operatividade laboratorial.

Por volta dos anos 70, eu tentava conciliar a minha formação científica com uma

remota crença na longínqua possibilidade das transmutações alquímicas, obtidas num

quadro especial, em condições especiais, por alguém com conhecimentos muito

especiais das antidas sabedoriais (quase) perdidas. O que os livros sobre Alquimia, que

eram publicados na altura (Ranque, etc,), diziam era que alguns mestres alquimistas

conseguiam criar no laboratório condições especiais que dispensavam as condições

drásticas (p.e. temperatura) necessárias às transmutações realizadas no quadro da

42
ciência e da técnica actuais. Mas, as condições espirituais do operador seriam

determinantes neste quadro explicativo da alquimia, pois este interferia na experiência e

influenciaria as evoluções da matéria, suscitadas pelo “espírito”. Nos anos 60 e 70

surgiram em França alguns livros de um cientista francês, Louis Kervran, que dava

testemunho de “transmutações a baixa energia” – não se tratava ainda da problemática

“fusão fria” – com exemplos escolhidos da Biologia e da Mineralogia, o que forneceu (a

alguns) mais uma “persuasão” técnico-científica à possibilidade da alquimia operativo-

laboratorial.

Em 1972 aderi à primeira organização esotérica, a “Ordem Rosa-Cruz

A.M.O.R.C.”, com sede em São José na Califórnia (EUA) e com grande presença em

diversos países, particularmente no Brasil e em França e países francófonos.

Dispensando (mediante uma cotização) um ensino por correspondência em 12 graus

(outros tantos de percurso), a AMORC – que afirmava ter na sua sede um “laboratório

alquímico” - vendia também um “laboratório alquímico” portátil, na verdade pouco

mais do que um estojo escolar de Química para o ensino secundário, o que constituiu

para mim (e para muitos) uma grande decepção.

Ainda nos anos 70 comecei a comprar a revista Nouveau Planète (a Planète

tinha saído no final dos anos 60) – com edições espanhola e brasileira, Planeta – que

referia, no quadro do “realismo fantástico” de Louis Pawels, os segredos perdidos das

civilizações antigas, entre os quais os dos alquimistas, estes apresentados como sendo

os mais secretos e avançados, logo de maior prestígio – prestígio que levou muitos a

interessarem-se pela Alquimia, de entre as diversas “ciências ocultas”. Ainda nos anos

70, começou uma vaga de livros sobre aquilo que mais tarde, Wouter Hanegraaff, em

43
New Age Religion and Western Culture – Esotericism in the Mirror of Secular

Thought96, denominou de “Ciência New Age”, exemplarmente simbolizado pelo livro

de Frijtof Capra, The Tao of Physics (traduzido numa edição brasileira) e que

afirmavam a convergência das ancestrais tradições espirituais e religiosas com os dados

da moderna ciência. Este tema, que não está longe do que algum iluminismo proclamou

- vide Newton, através da Tese de Doutoramento de Betty Dobbs, publicada em França

em 1980, com o título Les fondements de l’alchimie de Newton97 – alimentou nos

espíritos (como o meu) influenciados pela contra-cultura iniciada nos anos 60 e pelos

seus prolongamentos espirituais heteróclitos denominados de “New Age”, o prestígio

das antigas sabedorias e das suas realizações espirituais e técnicas, tema que foi

reforçado por uma vertente mais popular centrada nas “civilizações misteriosas” que já

referimos (“Planète” e muitos outros, Robert Charroux, Erich von Daniken, diversos

títulos da coleção “J’ai Lu”, etc.).

Entretanto a minha formação e a minha vida profissional continuavam. Após ter

trabalhado, primeiro como Bacharel e logo a seguir como Licenciado, como

colaborador de um centro de investigação científica, o Centro de Química-Física e

Radioquímica do Instituto de Alta Cultura, localizado na Faculdade de Ciências de

Lisboa, desde 1973 até 1976 – tendo apresentado uma comunicação ao Congresso

Ibero-americano de Catálise, realizado na Fundação Gulbenkian, em 1976, ao mesmo

tempo que, nesse ano, fui Assistente da cadeira de Biomatemática na Faculdade de

Medicina de Lisboa (H.S.M.) – ganhei uma bolsa de estudos do Governo espanhol e fui

equiparado a bolseiro, tendo estagiado em 1976 e 1977, no Instituto de Catálise do

96 Leiden, Brill, 1996, ver em particular o capítulo III, New Age Science e o capítulo VI, The Nature of
Reality.
97 Dobbs, Betty J, Teeter, Les Fondements de l’Alchinmie de Newton ou «La chasse au lion vert», Paris,
Trédaniel, 1981.

44
Instituto de Química-Física Rocasolano, de Madrid, do “Consejo Superior de

Investigaciones Científicas” e frequentado um curso de pós-graduação na Faculdade de

Ciências da Universidade Cumplutense da mesma cidade. Uma vez que não me foi

renovado o contrato na FML/HSM, não pude continuar em Madrid como equiparado a

bolseiro, para realizar o Doutoramento, uma vez que a bolsa espanhola era pequena. Isto

constituiu uma grande frustração científica e profissional para mim, tendo sido obrigado

a regressar a Lisboa em meados de 1997. Tive a oportunidade de concorrer a um

emprego como Técnico Superior do Estado, tendo sido admitido na Primavera de 1978

no Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária. Mas a frustração científica era

grande, apesar de ter resolvido o meu problema profissional, já que no LPC/PJ se

realizava a aplicação técnica de áreas científicas ao estudo do crime e não se fazia

investigação científica.

De algum modo, o meu interesse pelos universos da alquimia constituiu também,

para além do fascínio próprio que ela sempre exerceu sobre mim, uma espécie de

compensação pela frustração profissional e científica. De algum modo realizei uma

operação psicológica e identitária comum em algumas pessoas que encontrei

posteriormente em grupos alquímicos e que consiste em passar do universo de

conhecimento que não dominamos ou onde não nos sentimos à vontade ou em posição

de relevo, para outro universo de conhecimento menos acessível aos outros e que nós

dominamos, mesmo que ele seja rejeitado pela ciência e pelo senso comum. Olaf

Hammer descreve esta estratégia em Claiming Knowledge. Algumas pessoas irão para a

alquimia por ignorância das realidades científicas, outras vão-no por compensação por

uma questão de centralidade gnoseológica. É claro no entanto que, para muitos

(particularmente numa dimensão popular, mas não apenas), a questão da Longa Vida,

45
proporcionada pelo Elixir alquímico ingerido pelo adepto e do Pó de Transmutação que

pode proporcionar a obtenção de ouro, decorrente da realização da Pedra Filosofal,

serão temas fortes de interesse pela Alquimia e da prática alquímica. Há ainda uma

dimensão esotérica e iniciática associada, não ao ouro material, mas ao Ouro simbólico

decorrente da iluminação alquímica do Adepto que realizou a Pedra, segundo dizem os

Tratados.

Em Madrid tinha tomado contacto com vários livros sobre o tema, publicados

em Espanha e, quando regressei a Lisboa, continuei o estudo da Alquimia. Havia no

final dos anos 70 uma livraria muito boa (propriedade de um jornalista que depois abriu

outra junto a um restaurante vegetariano, na Praceta Cesário Verde), com livros

franceses de grande qualidade, nestes domínios e, de entre eles, adquiri livros de dois

discípulos de Eugène Canseliet, Guy Béatrice e Sévérin Batfroi, publicados pelas

Editions de. La Maisnie. Aqui a Alquimia era apresentada, para além do seu aspecto

operativo, como discurso integrador dos mitos, da história e geografia sagradas –

inaugurado pela revista francesa Atlantis nos anos 30. Béatrice e Batfroi apresentavam

uma espécie da “alquimia generalizada” que dava conta de muitos aspectos do sagrado.

Entretanto eu continuava a estudar a história, a filosofia e o simbolismo da

Alquimia – o qual me interessava profundamente como entusiasta do esoterismo e das

iniciações -, tentando ao mesmo tempo perceber quais eram os materiais e as operações

da alquimia física, o que me interessava sobremaneira como químico. Esta dupla

dimensão da alquimia sempre me interessou e considerei sempre que a alquimia física

sem o seu aspecto espiritual e iniciático, veiculado pelo seu imaginário simbólico, de

pouco valia amputada dessa dimensão, sendo apenas, nessas circunstâncias uma

“bricolage” físico-química com pouco interesse. O livro O Despertar dos mágicos e

46
outros que se lhe seguiram valorizavam muito a figura do alquimista como detentor dos

segredos da transmutação metálica, numa perspectiva físico-química. Canseliet e os

seus discípulos restituíram à alquimia, na linha da tradição veiculada pelos Tratados, a

sua dimensão simbólica e espiritual. Em 1982, resultante das minhas visitas a partir de

1980, à Livraria “La Table d’Émeraude” de Paris (rue de la Huchette) – que reunia os

amantes do esoterismo e da Alquimia -, comprei um exemplar da reedição de Deux

logis alchimiques, de Eugène Canseliet, que o autor amavelmente me dedicou – e que

me deixou muito feliz - com a seguinte frase: Pour José Anes, qui peut tout attendre de

ces Deux logis alchmiiques.

Aparecia eu, por essa altura, ao pequeno grupo de pessoas interessadas, em

Portugal, pelo Esoterismo como um especialista em Alquimia. Assim fui convidado

para uma entrevista sobre Alquimia, num programa no RCP, com António Carlos

Carvalho e realizei uma conferência – fortemente influenciada por um livro que tinha

comprado recentemente na Corunha, La Tabla Redonda de los Alquimistas (1980), de

Manuel Algora Corbi, verdadeira enciclopédia das vias da alquimia operativa e por

outro muito importante nesse domínio, Le laboratoire alchimique (1982), de Atorène,

na senda de um belo livro de Fabrice Bardeau, Les clefs secrètes de la chimie des

anciens (1975) - em finais de 1982 na Sociedade Portuguesa de Eubiose, organização

teosófica muito ligada à tradição portuguesa, com sede, nessa altura, em Sintra. Em

1983 publiquei o meu primeiro artigo numa publicação intitulada “Eldorado”, de “Os 4

Elementos Editores”, animados por Paulo Varela Gomes, Armando Guerreiro e Mário

de Carvalho e onde colaborou também Paulo Pereira e Ana Cristina Leite, sobre o

imaginário simbólico do Mosteiro dos Jerónimos, tema muito em voga na altura – veja-

se, por exemplo as interpretações de Fiama H. Pais Brandão sobre a “história mítica”

47
(Ourique) e a “geografia sagrada” (Batalha) portuguesas - e de algum modo inspirado

pelos livros de Fulcanelli, Canseliet e discípulos. Esta corrente expressou-se a partir dos

anos 70 em Portugal com António Telmo (A História secreta de Portugal) e entrou

pelos anos 80 com António Quadros (Portugal, Razão e Mistério), Lima de Freitas

(Mitolusismos) e Agostinho da Silva (intervenções diversas, nos jornais e na TV). Eu

tive alguma intervenção nela, já em finais dos anos 80, com a interpretação simbólica e

esotérica da Quinta da Regaleira, a qual convida a esse tipo de leituras, de entre as quais

as alquímicas.

Continuava, entretanto, a estudar a Alquimia no domínio da teoria e do símbolo,

mas, a pouco e pouco, decidi começar a praticar os seus rudimentos laboratoriais, dando

seguimento prático às minhas investigações livrescas. Através de um dos números da

revista francesa “L’Autre Monde” ou “Le Monde Inconnu” (ligada à AMORC

francesa), que comprava regularmente, que tomei contacto em 1982 com o grupo de

alquimistas “Les Philosophes de la Nature”, liderados por Jean Dubuis, um quadro

da IBM, tendo começado a receber (mediante uma cotização) as “correspondências”

mensais sobre Espagíria, o que continuou a acontecer durante 10 anos – vide Anexo.

Os LPN também publicavam um boletim mensal, Le Petit Philosophe, com artigos

sobre Espagíria, Alquimia, Cabala e Astrologia e forneciam também um ensino de

Cabala, por correspondência.

Comecei a fazer pequenas experiências preliminares de espagíria na marquise da

minha casa (um 7º. Andar da Av. Almirante Reis, em Lisboa), o que provocou alguma

incompreensão da minha (na altura) mulher e um certo incómodo já que, para além de

ocupar espaço estas minhas actividades, elas davam origem a um intenso cheiro, devido

48
a certas plantas utilizadas na calcinação em Espagíria (Melissa, etc). Esta minha opção

levantou diversas reservas, com algumas excepções, nos meus colegas do LPC/PJ, mas

nada de grave se passou neste contexto. Por outro lado, junto dos esoteristas – mesmo

junto daqueles que desprezavam a alquimia laboratorial – o meu prestígio e poder

simbólico aumentou. Continuando a praticar a Espagíria dos LPN – elaboração de óleos

essenciais, tinturas, “elixires” e “pedras vegetais” – senti necessidade de entrar no

mundo, mais problemático do ponto de vista químico, da prática operativa da Alquimia

mineral.

Em 1982 morre Eugène Canseliet e surge uma disputa entre os seus “herdeiros”

espirituais, Jean Laplace que dirigia desde o nº. 1 a revista alquímica La Tourbe des

Philosophes – ver Anexos -, Bernard Renaud de la Faverie que lhe sucedeu nesse

cargo e que depois comprará a livraria “La Table d’Émeraude” (onde o conheci

pessoalmente) e um ceramista de formação científica, que sob o pseudónimo Pierre

d’Houches, começou a publicar vários artigos de alquimia operativa na “Tourbe”, e que

depois, ao constituir a “Filiação Solazaref” - Solazaref (o sol do ferro?) será o seu

próximo pseudónimo - iria começar a fustigar os “especulativos” que, de facto,

alimentavam grande parte dos artigos da revista. Fascinado pela imagem de “operativo”

competente que ele deixava transparecer nesses artigos, contactei por volta de 1983 um

membro do seu grupo alquímico, Dominique Vadot, o responsável pelas publicações

da “Filiação”, entre as quais a revista Tempête Chymique e diversos livros, como o

Introitus ad Philosophorum Lapidem, nas “Éditions Aux Amoureux de Science” e

pela livraria “La Légende Dorée”, ambas em Riom, Puy de Dôme, zona onde ficava a

sede do grupo de Solazaref, num castelo em Marsat.

49
Uma vez que tinha conhecido, entretanto e a partir de 1983 até 1986, alguns

esoteristas portugueses que se interessavam pela alquimia – na conferência da Eubiose,

e através das entrevistas que dei, quer ao RCP, quer ao “Correio da Manhã” -, partilhei

estes meus contactos com eles. Tratou-se de um pequeno grupo informal constituído por

O. G., licenciado em Filosofia, residente em Lisboa, quadro de uma empresa pública e

dirigente da “Eubiose”, E. M. – que conheci através de seu filho E. que pertencia à

AMORC -, enfermeiro reformado que exerceu a sua profissão durante cerca de vinte

anos na Suíça e que vivia numa moradia em plena Serra da Arrábida, perto de Santana e

ainda T. P., técnico de electrónica e da rádio em Angola, de onde veio para Portugal

(com residência em Queluz) após a descolonização e que mais tarde publicará em

Portugal (seguido de uma tradução francesa), sob o pseudónimo Rubellus Petrinus (“a

pedra rubra”), o livro A Grande Obra Alquímica, com prefácio meu. Quanto à

experiência alquímica anterior destes membros, direi que o que possuía apenas um

conhecimento (não muito desenvolvido) da teoria alquímica, sem uma dimensão prática,

era O.G.. E.M. tinha um laboratório na garagem da sua moradia na Arrábida e na Suíça

terá tido contacto com os F.A.R.C., de Roger Caro. T.P., após anos de leitura dos

clássicos, quer em Angola, mas sobretudo já em Portugal, era o que mais tinha praticado

no laboratório da varanda de sua casa em Queluz, sendo um hábil operativo. Todos eles

encaravam a Alquimia laboratorial como um desafio no que diz respeito à

descodificação da sua linguagem simbólica, para entender que materiais e operações

eram utilizados na alquimia física, mas nem todos tinham em igual plano a ideia de que

a alquimia desprovida da sua dimensão espiritual e iniciática de pouco valia no domínio

do esoterismo. Neste domínio, havia duas posições, a dos que diziam – na linha de

Canseliet – que sem a transformação espiritual do operador a alquimia laboratorial era

impossível, já que era ele, através das interacção dos seus planos subtis com a “alma” da

50
matéria – isto foi claramente afirmado por Mary-Ann Atwood em 1850 no seu livro

“maldito” A Suggesiuve Enquiry into the Hermetic Mystery -, que possibilitava as

transformações e uma outra, privilegiada pelos “operativos”, que sustentava que desde

que se operasse correctamente, a transmutação era possível, desvalorizando a dimensão

espiritual da alquimia laboratorial. O.G. situava-se comigo (embora sem recorrer ás

teses ocultistas de Atwood), na primeira posição, T.P. estava no outro extremo e E.M.

permanecia numa posição intermédia às duas teses. Mas havia uma dimensão comum a

todos eles, eu incluído, que consistia na utilização da alquimia para aumentar o prestígio

e poder simbólico, junto dos outros esoteristas e do público que tinha uma ideia

misteriosa da Alquimia. Na verdade a alquimia era fonte de afirmação identitária para

todos: eu sou um alquimista, ele é um alquimista, eles são alquimistas, tudo isto dava

prestígio. No meu caso, o facto de eu aparecer como estudioso que também pratica a

alquimia para a entender melhor, também era uma afirmação identitária prestigiante,

desde que “negociada”, através de compromissos, comigo próprio e com os outros,

dentro e fora do universo da alquimia.

De qualquer modo, se por um lado angariava prestígio junto dos esoteristas, eu

arriscava a minha imagem junto dos meus colegas do LPC da PJ, amigos e família. Mas

o facto de aparecer como um estudioso da Alquimia, mais do que um praticante,

atenuava esse risco e mesmo quando comecei a praticar em laboratório isso era sempre,

aos olhos dos outros como uma fase indispensável a esse estudo. A verdade é que eu

mantive sempre essa ambiguidade, colhendo os benefícios simbólicos em ambos os

campos. No entanto, apesar de praticar a alquimia no laboratório, eu aparecia sempre

aos alquimistas portugueses e estrangeiros como um estudioso, um investigador e não

como um “operativo”. Mais tarde quanto punha progressivamente em dúvida a realidade

51
das transmutações alquímicas (mesmo considerando, desde sempre, que a realizarem-se

isso seria apenas em condições excepcionais), mais me interessava pelo simbolismo e

pelo imaginário da Alquimia, o que me granjeou uma certa aceitação junto de alguns

universitários, pois isso era um tema de crescente interesse junto da academia, a partir

de finais dos anos 70. No entanto, ainda não tinha começado a minha abordagem socio-

antropológica, a qual só se veio a verificar, progressivamente, a partir de 86 quando

comecei a dar aulas como docente convidado no Departamento de Antropologia da

FCSH da UNL, mas de uma maneira mais consistente, só a partir de meados dos anos

90.

Começamos então a praticar a alquimia no laboratório da Arrábida, logo a seguir

de E.M. ter ido a França pela primeira vez visitar Solazaref e a sua Filiação, a

Assemblée des Philosophes. A imagem de Solazaref teve um grande impacto em todos

nós, pois ele aparecia com um cientista, especialista em física dos plasmas, que se

dedicou à cerâmica artesanal e à alquimia operativa, seguindo a via seca e sobretudo a

“via breve” – que ele dizia descender dos etruscos -, utilizando o raio nos picos do

maciço central francês, na zona du Puy de Dôme, raios que eram captados por um pára-

raios ligado a um grande cadinho que continha as matérias a fundir, quase

instantâneamente. Este era um imaginário fortíssimo, superior ao do ferreiro tradicional,

de que decorre o alquimista, mas agora do herói que domina o raio e que o capta para

provocar as “transmutações”.

EM foi várias vezes à sede da Filiação, em França, devido ao seu profundo

interesse em tornar-se um alquimistas operativo, à sua disponibilidade, pois estava

reformado e à sua capacidade financeira que lhe proporcionava a reforma suíça, o que

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lhe granjeou uma posição de relevo junto de Solazaref. Dessa reunião semi-pública da

FS, onde EM esteve da primeira vez, trouxe-me uma fotografia, tirada por ele, de um

aspecto desse encontro onde se vêm dois membros, um masculino e outro feminino, na

casa dos 30 anos, usando uma túnica preta curta e um cinto (vide Anexo), ambos

próximos de uma bancada onde estavam instrumentos alquímicos. Obtida, por EM, a

autorização para trabalhar com um pequeno grupo (eu e depois, também, O.G.) não na

“via breve”, mas na “via seca” – fundindo os materiais em cadinhos, num forno -, os

trabalhos decorreram, com a minha participação, de 86 a 89. Praticávamos ao fim-de-

semana, um ou dois dias inteiros e almoçávamos amavelmente em casa de E.M.,

comida tradicional acompanhada de vinho, refeições confeccionadas por sua esposa –

que ficava a conviver com a minha mulher, enquanto os homens trabalhavam no

laboratório ou no campo. As mulheres eram uma minoria nos grupos que frequentei. O

grupo português da FS incluiu mais tarde uma médica pediatra, D. C. , antiga Mestre da

Ordem AMORC em Portugal e a esposa (C.) de um dos membros (J.S.) que integravam

a versão mais alargada do primeiro grupo, em finais dos anos 80. Em França, havia

várias, as “Incorruptíveis”, junto ao “mestre” Solazaref (vide foto já citada) e nos LPN,

havia também algumas mas sempre não excedendo uns 20 a 30%. Na imagem do

alquimista como “herói” que trabalha os minerais e metais com o fogo, no forno - na

sequência do ferreiro a trabalhar na forja (vide Mircea Eliade, in Ferreiros e

Alquimistas, citado mais à frente e na Bibliografia) – deve estar a razão desta

participação minoritária das mulheres. Aliás, também a própria tradição alquímica não

regista muitas mulheres em posição de destaque – recordemos Maria a Judia, há mais de

um milénio e a rainha Catarina da Suécia que terá praticado a Arte em Itália – e regista

poucas e em papel coadjuvante, como Perenelle a laboriosa esposa do alquimista

Nicolau Flamel e sua assistente na Obra. De qualquer modo, a posição de privilégio das

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“incorruptíveis” junto de Solazaref poderia significar também uma descriminação face

ao trabalho operativo e revelar uma visão tradicional face ao papel da mulher, mesmo

que numa microsociedade, visão que está patente no opúsculo da Filiação, Notrions sur

l’éveil à la sexualité traditionelle occidentale.

A partir de 86, continuava com as minhas experiências espagíricas (baseadas no

ensino por correspondência dos LPN) no meu laboratório de casa, transferido,

entretanto, para a garagem da residência de fim de semana da minha família (que havia

passado para minha posse, falecidos os meus avós e o meu pai), situada na Costa da

Caparica. A partir de 86 até 90 – sempre com o afã de saber mais sobre alquimia

operativa, segui também as “monografias” de Spagy-Nature de Patrick Rivière, as

quais versavam sobre Espagíria vegetal e a “via seca” de Fulcanelli, esta muito próxima

em linhas gerais da “primeira obra” que Solazaref seguia e propunha aos seus

discípulos, isto é, trabalhando com estibina (sulfureto da Antimónio) e outros materiais

(ferro, sais diversos, etc.). Mas, digamos, a via operativa mais sólida que tive a

oportunidade de seguir foi com o pequeno grupo da FS. Na residência de E.M.

continuavam a ser feitas as experiências preliminares relativas à “primeira obra” da “via

seca”; trabalhos de preparação das matérias, com trituração da estibina, quer comprada

a reformados das minas de Valongo que, assim, tinham mais um pequeno rendimento

complementar para a sua magra reforma, quer obtida em viagens com O.G. a

Albuquerque (guiados por um amigo de Portalegre, poeta surrealista), do outro lado da

fronteira, não longe de Arronches. Estas demandas do “sujeito da obra” eram encaradas

com espírito de aventura romântica e de convívio entre todos, a que não eram alheias

(por vezes) copiosas refeições acompanhadas de vinho. Esta, aliás, era uma

característica que verifiquei nos grupos por onde passei (FS e LPN) e que incluía a

54
celebração do vinho, esse “elixir” alquímico. No entanto, havia espaço para quem não

bebesse ou seguisse dietas vegetarianas ou macrobióticas. Eu próprio, nessa altura

abstémio por razões de saúde, bebia o vinho às refeições de convívio sem receio de que

me fizesse mal...

Os trabalhos de preparação dos materiais incluíam a já referida trituração da

estibina, em almofariz com martelo pilão manejado à mão (durante horas) por cada um

de nós, operação difícil e árdua de separação do metal da sua ganga de quartzo,

sobretudo para quem não está habituado a um trabalho manual pesado de doloroso (os

músculos pouco habituados, ressentiam-se). Aliás era esse um tema forte dos

“operativos” que o trabalho manual de laboratório purificava os “especulativos”,

tornando-os mais próximos da matéria e da Natureza – tema que um certo New Age

neo-pagão, não psicológico, utilizava (cultivo das hortas e dos campos, busca de plantas

medicinais, cozer o próprio pão no forno, etc.). Os “operativos” criticavam os que

interpretavam a alquimia apenas num plano psicológico – lembro-me da “fúria” de

Canseliet contra Bachelard (vide o seu depoimento a Robert Amadou, em Le feu du

soleil) quando este afirmava que os alquimistas eram onanistas já que referiam amiúde o

“oruborus”, a serpente que morde a cauda do hermetismo alexandrino. E criticavam,

ainda Jung – um profundo conhecedor da Arte - e os jungianos como Etienne Perrrot, e

a nossa Ivette Centeno.

Para além da trituração da estibina havia ainda que preparar os sais nas

proporções que a tradição recomendava. Os sais eram, do ponto de vista químico,

indispensáveis à fusão dos minerais e metais e, do ponto de vista alquímico, eram eles

que ajudavam a captar o “espírito universal”, agente verdadeiro da Obra, uma vez que

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muitos eram higroscópios e, expostos ao ar numa noite de orvalhada calma (sem

nuvens, sem chuva e sem vento) absorviam a humidade do ar que, segundo a Tábua de

Esmeralda, “trazia no seu ventre” esse mesmo “espírito” – conceito análogo ao do

“prana” do ioga hindu. Numa das viagens de EM à FS, ele trouxe-me um testemunho da

sua operatividade, oferecido a mim: um cadinho com materiais fundidos cristalizados

num sal verde (talvez vitríolo). Para trabalhos espagíricos e alquímicos, procedia-se à

recolha do orvalho, tal como é indicada nas gravuras do Mutus Liber, o Livro Mudo,

que Canseliet tão bem comentou. Escolhem-se, como vimos, as noites calmas (sem

vento, chuva ou nuvens e antes de aparecerem os primeiros raios da aurora) dos meses

de Primavera – de Abril a Junho, “entre Aries e Gémeos”, os meses de maiores

orvalhadas – estendendo panos de linho em prados não poluídos por adubos químicos

(precaução importante nos dias de hoje) e uma vez repletos de orvalho, torcem-se para

dentro de garrafões de vidro escuro (para não apanhar a luz) que é depois utilizado em

operações alquímicas, para “tornar os materiais filosóficos”. A recolha do orvalho por

alquimistas de ambos os sexos, que se levantam às 4h da manhã e vão pelos campos,

andando pela relva com os pés descalços, era utilizada pela FS e apela para uma

comunhão com a Madre Natura. Na primeira fase da FS, em que é patente um certo neo-

paganismo – enquadrado, diga-se, por um cristianismo integrista -, uma frase muito

utilizada pela Filiação era par Marie, Mère de la Philosophie. Outro processo, como

referiam os LPN, é o de captar o orvalho num prato com um sal higroscópico, por

exemplo carbonato de potássio, e recolher (antes do nascer do sol) o líquido em que o

sal se transformou por dissolução no orvalho. Esse orvalho dá para elaborar preparações

espagíricas (tinturas, elixires, etc.) pois esse líquido – chamado pelos alquimistas “água

dos anjos” – contem o “fogo”.

56
Voltando à Filiação Solazaref, após a confecção dos sais e a sua mistura em

proporções adequadas, estes juntavam-se à estibina desprovida da sua ganga e ao ferro,

em proporções definidas – as “proporções da Arte” – e eram colocadas num cadinho de

material refractário que era introduzido num forno. No nosso caso, o forno ficava no

exterior da garagem de E.M., num prado, a cerca de 50 metros da sua casa da Arrábida,

por razões de segurança: eventuais explosões, intoxicações, etc.. Recorde-se que

Newton – que sempre praticou a Alquimia em segredo, mas cujas actividades

“pirotécnicas”, que lhe consumiam longas noites de estudo e de trabalho operativo,

foram referenciadas pelo seu secretário, nas suas memórias (ver o livro de Betty Dobbs,

Les Fondements de l’Alchimie de Newton) – foi vítima de uma explosão ocorrida no seu

laboratório que ficava num anexo da sua casa de Cambridge, uma explosão que lhe

provocou problemas de saúde devido a intoxicação.

Após uma ida a França, à sede da Filiação (viagem que não pude fazer por

motivos profissionais), de um grupo de portugueses (EM, EmM, OG, TP, J), a “etnia

portuguesa” foi recebendo outros membros (TP, J., J.S. e esposa C., drª. C., uma amiga

de EM), e constitui-se um pequeno grupo com reuniões periódicas (já não na Arrábida,

mas em Lisboa) e tarefas definidas pelo responsável, E.M., que as recebia de Solazaref,

quer epistolarmente, quer aquando das suas idas a Puy de Dôme. Do grupo informal de

amigos do começo (O.G., E.M. e eu), passou a uma organização e a uma hierarquia,

com uma reverência crescente em relação ao Mestre e ao seu delegado, o Instrutor.

Nesta altura, houve dois relatos, transmitidos pelos que foram a França que

confirmaram a prática iniciática “gurdjeviana” que Solazaref seguia, enxertando-a na

Alquimia, a qual era evidente no Introitius quando ele falava de “choques iniciáticos”.

Um desses choques terá ocorrido num jantar que encerrou a jornada de trabalho e

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instrução e onde o Mestre Solazaref insultou e desvalorizou à frente dos outros, EmM, o

filho de EM, depois de uma pergunta que ele lhe fez. Trata-se de um método tradicional

utilizado pelo budismo “chan”, chinês (que deu origem ao budismo “zen” japonês) –

onde o mestre empunha a chibata com a qual bate, por vezes, no discípulo - e pelo

chamado sufismo “do norte” (Afeganistão, etc.), muito violento em relação ao ego que é

preciso “apagar”, fanã. Trata-se, não de uma desconsideração, mas de uma atenção ao

processo iniciático do discípulo. Mas, é claro, que para ocidentais, o método é violento.

Gurdjef – russo ortodoxo que recebeu formação na Ásia Central - criou em França o

“Instituto para o Desenvolvimento Harmonioso do Homem”, por onde passaram vários

intelectuais - Katherine Mansfield e a criadora de Mary Poppins, entre outros – que ele

sujeitava a longas caminhadas pelos bosques, a longas prelecções iniciáticas pela noite

fora (às vezes, depois das caminhadas...), acompanhadas de muito café, e ainda de

algumas invectivas contra os hábitos contra-iniciáticos do homem moderno (”o Homem

não é ainda verdadeiramente Homem, ele apenas reage a estímulos, ele não actua, ele “é

actuado” pelas circunstâncias, o homem é apenas um “zombie”, um autómato, sem

consciência”, etc.). Esta doutrina que pode levar a convergências com a ideia

nietchseana de “super-homem” era seguida por Solazaref e o seu grupo alquímico.

Outro episódio que me relataram foi uma caminhada nocturna da Filiação por um

bosque onde havia lobos e onde o Mestre escolheu um discípulo, ordenando-lhe que ele

comesse uma osga, ao que ele obedeceu. A obediência e a imitação do mestre era um

fenómeno típico sectário em que o “mestre” tem um carisma muito grande que domina

os discípulos - lembro-me de uma vez vi uns membros portugueses de cabelo rapado e a

explicação veio logo de seguida: Solazaref tinha rapado o cabelo. O mesmo aconteceu

com outras situações: se o “mestre” se embebedava, eles embebedavam-se, se o

“mestre” fumava charuto, eles fumavam charuto...

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Uma outra característica evidente foi a divisão dos adeptos da Filiação em

“etnias” periféricas à francesa: a belga, a italiana, a portuguesa, etc., tendo cada “etnia”

uma tarefa distribuída por Solazaref, a elaboração de cada material (o vitríolo, p.e., no

caso português) destinado a ser levado para França para que a Obra alquímica aí

pudesse ser realizada, com as contribuições de todos. Esta divisão de trabalho pelas

“etnias” e a concentração (“imperialista”) de materiais em França para a realização da

Obra, fizeram-me lembrar os meus tempos de jovem comunista e o “socialismo num só

país” de Estaline. Para além da elaboração de instrumentos (cone em aço para fusões

metálicas do “sujeito”, o “régulo de antimónio”) e materiais (estibina, “vitríolos”, i.e.,

sulfato de ferro, etc.) ou sua aquisição (tijolos refractários, retortas em grés, etc.) pela

“etnia” portuguesa foi decidido traduzir para português a obra de Solazaref, Introitus

ad Philosophorum Lapidem. Obra gigantesca, embora divida a tarefa por todos os

membros, essa tradução foi já, em si mesma, uma prova iniciática....

Desde o começo que eu tinha constatado uma visão tradicionalista junto de

Solazaref e a sua Filiação. Mas, de facto, o tradicionalismo existe em muito (não em

todo) do esoterismo e a alquimia não escapa a essa tendência. O que eu verifiquei foi

que, se por lado, só os “Filósofos da Natureza” tinham uma perspectiva filosófica

(quiçá política) mais liberal, os outros grupos poderiam ser conservadores

filosoficamente (talvez politicamente, não verifiquei), mas só um deles assumiu

posturas radicais. Primeiramente era patente, em Solazaref e a sua “Filiação”, uma

sintonia com um catolicismo de tipo integrista mesclado com referência de tipo neo-

pagão, celta e centro-europeu “germano-celta”. Mas em finais dos anos 80, esse

tradicionalismo teve uma expressão política evidente e para mim desagradável, no seu

59
livro Les Bûchers du Xxe siècle (1988), uma vez que se exprimiu por um claro apoio ao

líder da extrema-direita francesa, Le Pen – um italiano membro “sénior” da Filiação, era

denominado pelos seus companheiros do círculo interno do Mestre, o faccio... -, e por

um ataque à Maçonaria a que eu tinha aderido recentemente. Solazaref chegou ao ponto

de dizer e escrever que “Fulcanelli era um maçon infliltrado na alquimia, para a

destruir”. Além disso, esse livro continha vários ataques às outras correntes alquímicas:

aos FARC, acusando-os de homossexuais, aos LPN, acusando-os de seguirem um

“pragmatismo involutivo”. Tudo isto fez-me afastar da Filiação Solazaref e em 1989 a

ruptura foi consumada, não tendo eu já participado na tradução e edição do Introitus.

Reconheço o conhecimento alquímico de Solazaref e a sua valia iniciática, mas as suas

perspectivas políticas para mim inaceitáveis, impediram a continuação da minha

convivência e trabalho junto dos membros da “etnia” portuguesa – que não seguiam em

grande parte a posição políftica de Solazaref, sendo um deles claramente de esquerda. A

FS adquiriu progressivamente uma característica “sectária” e alguns anos depois

desapareceu do grande público – após uma crise grave entre Solazaref e Dominique

Vadot, seguida de cisão, mantendo reservadas as suas actividades. A última actividade

pública de relevo – para além das “peregrinações” da Filiação a Itália, à Bélgica a

Portugal, onde já participei apenas como espectador junto do público – foi uma

conferência de Solazaref nas Nações Unidas, a 13 de Maio de 1993 sobre Métallurgie

Sacrée, evento organizado por iniciativa de um membro japonês, funcionário das N.U.

A partir dessa data comecei a seguir mais os LPN de Jean Dubuis, tendo

frequentado um estágio de fim-de-semana, em 1990 numa casa de um dos membros,

nos arredores de Toulouse, que se seguiu a uma conferência de Jean Dubuis numa

livraria dessa cidade, na 6ª.f à noite. Tudo era bastante diferente nos LPN, face à

60
experiência, um pouco traumatizante da FS: a FS era constituída, no seu núcleo interno,

por “guerreiros da Natureza”, enquanto que os LPN juntavam “filósofos da Natureza”.

Um clima de informalidade, de convivialidade e de simpatia, a ausência de regras

rígidas, a desconstrução, feita pelo próprio Jean Dubuis, da imagem do “mestre”, tudo

isto era diferente da FS. Não que não houvesse convívio junto de Solazaref, mas tudo

era feito com propósitos iniciáticos definidos, sem espontaneidade. Para além do

trabalho espagírico, proposto nas “correspondências” dos Philosophes de la Nature e

em artigos publicados no seu boletim Le Petit Philosophe – extracção de essências das

plantas e elaboração de “tinturas” e “elixires” – os LPN propunham a Astrologia como

complemento à Espagíria, baseando-se na doutrina das “simpatias” de Paracelso

(primeira metade do século XVI) que estabeleciam as correspondências entre os metais,

as plantas, os planetas e os órgãos do corpo humano, reforçada pelas concepções

cabalísticas do alemão alquimista e cabalista Knorr von Rosenroth (meados do século

XVII), que os LPN afirmavam seguir.

O trabalho cabalista dos LPN baseava-se, naturalmente, na Árvore da Vida da

Cabala e nos seus sefirot e nas correspondências que cada sefira tinha com as partes do

corpo humano e, daí, com os planetas, as plantas e os metais. Além disso, a Árvore da

Vida cabalística proporcionava, segundo os LPN, uma meditação e um trabalho sobre

os sonhos – aquilo a que Jean Dubuis chamava “a escola nocturna” - que eram

analisados segundo o seu conteúdo e os dias da semana em que ocorriam,

estabelecendo-se então uma correspondência com um planeta e uma sefira. Então

compensava-se e harmonizava-se a pessoa com “tinturas” espagíricas vegetais desse

planeta ou meditava-se sobre essa sefira.

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Em 1993 e 1994 organizei em Sintra – Várzea de Sintra na residência de um

casal, I.E. e J.C.A. - dois estágios (gratuitos) de fim de semana dos LPN, ambos

antecedidos de uma conferência de divulgação, na 6ª.f , por Jean Dubuis (a de 93

decorreu com grande afluência do público, no Palácio Valenças em Sintra), tendo eu

feito a tradução simultânea para português. Uma vez mais apareci aos olhos dos

interessados como um especialista de alquimia, mais do que um alquimista. O estágio

teve eco na imprensa (“A Capital”). O lugar tenente de Jean Dubuis era Marc-Gerald

Cibard e o grupo dos LPN que veio de França era composto por mais três homens e uma

mulher, todos operativos. O convívio decorreu de uma forma calorosa e informal (vide

foto em anexo). Quanto ao estágio propriamente dito ele teve duas partes, a espagírica

no sábado, com a extracção de óleos essenciais e elaboração de “tinturas” – vide foto

anexa – e a alquímica, no domingo, com a elaboração do “régulo de antimónio”, através

da fusão da estibina com ferro e sais, no forno alquímico a gás – vide foto anexa. As

pessoas observavam e participavam nas operações de preparação, deixando a fusão no

forno para o membro francês dos LPN, já que ela continha mais riscos. O estágio de

1994, a espagíria decorreu no sábado e no domingo as operações alquímicas incidiram

sobre as “sublimações” – ou “pombas de Diana” - do começo da “2ª. Obra de Flamel”.

Neste ano, sábado à noite, Jean Dubuis ofereceu aos estagiários a possibilidade de

discutiram com ele o trabalho cabalístico da “escola nocturna” dos sonhos ou – numa

vertente mais tecnológica, típica de um certo “new age” - experimentarem uma máquina

electrónica de “harmonização das ondas alfa”, para relaxamento cerebral, a qual deu,

talvez por sugestão, bons resultados...

Entretanto, eu com O.G. - que se distanciou progressivamente da FS - e T.P. –

que nunca pertenceu verdadeiramente a ela, já que a sua experiência laboratorial lhe

62
permitia alguma liberdade – fomos a Fraga (Aragão, Espanha) conhecer o alquimista

Simon H., autor de um livro interessante que nos despertou a curiosidade. Ali

contactámos com alguns alquimistas espanhóis que já tinham experiência com outros

grupos. Quanto a Simon H., embora reconhecendo a sua sinceridade, ficámos

desiludidos com a sua limitada dimensão operativa.

A partir de 1996 comecei a seguir o programa de estudos, prévio à prática, dos

Frères Aînées de la Rose-Croix (F.A.R.C.) de Roger Caro (entretanto já falecido).

Esta fase foi orientada pelos “instructores” Elizabeth Demange e, a partir de 1998, por

François Devaux. Os FARC podemos considera-los uns “sacerdotes da Natureza”, até

porque Roger Caro incluiu uma foto de si próprio junto ao seu laboratório, junto ao

oratório – ora et labora - no seu livro Tout le Grand Oeuvre photographié e associou ao

seu grupo alquímico uma igreja cristã gnóstica, L’Église de la Nouvelle Alliance.

Entretanto fui progressivamente interessando-me, a partir de 1994, pelos

aspectos antropológicos que poderiam enquadrar este fenómeno do interesse pelas

antigas espiritualidades, quer numa dimensão sincrónica, quer numa dimensão

diacrónica, do homem contemporâneo em sociedade. Em primeiro lugar pelo

estruturalismo de Lévi-Strauss (La pensée sauvage e Anthropologie structurale) revisto

(em 1998) por um seu brilhante discípulo, Lucien Scubla, autor de Lire Lévi-Strauss,

livro que muito me impressionou e me formou na dimensão antropológica sincrónica,

com as contribuições de Freud, Hocart e Girard (a dimensão sacrificial), entre outros, a

enriquecerem a teoria levistraussiana. Isto era muito importante para compreender o

simbolismo alquímico, a sua estrutura da sua universalidade assente na sexualidade e na

biologia.

63
Já antes, tinha tomado contacto com universitários que estudavam o imaginário

o simbólico e o mítico, desde logo, Gilbert Durand, Doutor honoris causa pela

FCSH/UNL, amigo do falecido Lima de Freitas, que conheci num colóquio de uma

semana sobre a sua obra, em Cerisy-la-Salle (Normandia), em 1991, onde também

conheci outros professores e investigadores universitários seus discípulos, a saber,

Michel Maffesoli (sociologia e autor de Le Temps des tribus, entre outros livros), Jean-

Jacques Wunenburger (filosofia e autor de La raison contradictoire), Françoise

Bonardel (filisofia da religião e autora de L’Hérmétisme e de Philosophie et alchimie -

Grand Oeuvre et modernité). É sabido que a “antropologia do imaginário” de G.

Durand não é aceite pelos antropólogos sociais e culturais. No entanto ela pode,

eventualmente, ser utilizada com alguma utilidade como uma metodologia para analisar

e classificar discursos literários, com os seus “regimes do imaginário” (diurno e

nocturno) e “estruturas do imaginário” (diairrética, sintética e mística).

Conheci também, aquando dessa viagem a Cérisy, Antoine Faivre na sua

residência de Medon, Paris, com quem privei, ao longo dos anos, mais do que com os

outros, já que ele tinha uma aproximação histórica do esoterismo, mais útil para o

trabalho de Tese que eu me propunha fazer, tendo-me incentivado várias vezes a

publicar o meu estudo sobre os grupos alquímicos franceses contemporâneos, já que

nada existia sobre o assunto, com alguma profundidade. No entanto, ultimado o meu

estudo histórico e descritivo sobre estes grupos, defrontava-me com uma questão

fundamental para o meu trabalho de Tese e que tinha a ver com a compreensão

antropológica do fenómeno. A questão fundamental era esta: qual a metodologia e o

enquadramento socio-antropológico mais correcto para estudar este fenómeno de

64
ressurgimento ou de reactualização e recriação da velha alquimia, nos tempos de hoje,

por homens das cidades. A abordagem de Faivre, não sendo antropológica era útil, por

ser histórica, para conhecer a forma de pensamento alquímico no contexto do

“esoterismo ocidental” e a sua evolução ao longo dos tempos até ao século XX.

Professor de “História das correntes esotéricas e místicas na Europa moderna e

contemporânea” na EPHE (Escola Prática de Altos Estudos)/Secção de Ciências

Religiosas (Sorbonne), ele foi o responsável pelo conceito de “esoterismo” e de

“esoterismo ocidental”. Dizia-me ele que a sua primeira preocupação era delimitar o

campo de estudo, o que conseguiu, dando direito de cidade ao ensino e à investigação

universitários sobre o esoterismo. O Prof. Faivre fundou a Associação de Estudos de

Esoterismo, ARIES - e a revista com o mesmo nome, de que fui correspondente em

Portugal enquanto foi editada em França.

O estudo universitário do esoterismo teve um prolongamento – situando o “new

age” como uma manifestação do “esoterismo ocidental” - com cientista da religião

Wouter J. Hanegraaff, da Universidade de Amsterdão, que conheci nessa cidade e

nessa Universidade, onde frequentei um curso de verão, por ele organizado, no Verão de

1996, sobre “Gnose e Hermetismo”, onde leccionaram nomes como A. Faivre, R.

Edighoffer, G. Quispell, J. Godwin, etc. Também encontrei o Prof. Hanegraaff (e o

Prof. Faivre) na Cidade do México, no Verão de 1995, no Congresso da Associação

Internacional da História das Religiões que inclui (pela primeira vez) um painel sobre

Esoterismo, onde apresentei uma comunicação sobre o processo alquímico. No Verão

de 1997 fui a um Congresso sobre a “Alquimia no reinado de Rudolfo II” que se

realizou em Praga e onde estiveram estudiosos da alquimia, quer esoterólogos, quer

esoteristas. Esta dialéctica entre o emic e o etic não é perigosa em si mesma, para a

65
ciência, desde que se saiba claramente quem são uns e outros – o mais saudável era que

os própios afirmassem a sua posição (embora para o estudioso atento não seja difícil

distingui-los). Em 4 e 5 de Dezembro de 1999 estive presente (na Sorbonne- Anfiteatro

Louis Lliard) num Colóquio de Homenagem a Eugéne Canseliet (1899-1992)

alquimista discípulo de Fulcanelli e um dos maiores responsáveis pelo interesse

verificado em França pela Alquimia, na segunda metade do século XX. Ali reencontrei

velhos conhecidos nestas andanças: Patrick Rivière, Fabrice Bardeau, etc., mas não

encontrei ninguém (significativamente) da “Filiação Solazaref”.

No entanto, para além do estudo desta corrente particular de pensamento

religioso – a Alquimia -, da sua filosofia e da sua espiritualidade, é importante estudar

as suas manifestações modernas e compreender as razões da sua emergência e das suas

formas. Nesse sentido, comecei a procurar e a estudar o enquadramento socio-

antropológico deste fenómeno, desde logo aprofundando o meu estudo da sociologia e

da antropologia da religião e também dos Novos Movimentos Religiosos e das

Espiritualidades Alternativas e tomando contacto com dois especialistas de renome, já

em finais dos anos 90, o italiano Massimo Introvigne, sociólogo e Presidente do

CESNUR – Centro de Estudos de Novas Religiões, de Torino, e o norte-americano J.

Gordon Melton, da Universidade de Santa Barbara, Califórnia (EUA), grande

especialista do “new age”. Tive a oportunidade de os convidar – juntamente com A.

Faivre e também de alguns Profs. da FCSH/UNL como Manuela Parreira da Silva

(pessoana) e Paula C. Costa (com a qual tinha feiro um extenso artigo sobre o

esoterismo de Fernando Pessoa) - para um colóquio sobre “Fernando Pessoa, Aleister

Crowley e o Esoterismo”, que organizei em Junho de 2000, em Cascais (Museu Condes

66
Castro Guimarães), para o Pelouro da Cultura da Câmara Municipal – colóquio que

embora passando quase despercebido em Portugal, teve eco na revista ARIES.

E eis que, em virtude destas minhas actividades e estudos, sou chamado pelo

Prof. Yanez Casal, então coordenador do Departamento de Antropologia da FCSH/UNL

e meu actual Orientador de Tese, a substituir um colega que dava a cadeira de

Antropologia da Religião, o que fiz em 2001/2, 2002/3 e 2004/5, tarefa de enorme

responsabilidade para a qual me preparei intensamente e de um modo actualizado. Foi

este um grande impulso para ultimar a abordagem socio-antropológica sobre os grupos

alquímicos que eu estudara anteriormente.

Cheguei pois aos primeiros anos do novo século, procurando integrar

antropologicamente tudo o que tinha vivido e experienciado junto do mundo da

Alquimia, particularmente em França, nos últimos 25 anos do século XX. Foi, como

disse anteriormente, um trabalho a dois tempos em que primeiro “participei” e estudei -

sob o ponto de vista descritivo no domínio da sua História e da interpretação do

simbolismo alquímico - e só depois “observei” na perspectiva da Antropologia Social e

Cultural e, em particular, da Antropologia da Religião.

Para além das razões que têm a ver com a minha vida profissional – em que,

embora reformado da Função Pública, tenho estado superocupado (sobretudo a partir da

minha despensa, como docente convidado, da FCSH/UNL) com diversas actividades

relacionadas com a Segurança, quer na área do ensino, quer na da investigação –

também é de salientar que os estudos socio-antropológicos dos Novos Movimentos

Religiosos, das Espiritualidades Alternativas e das correntes esotéricas modernas e

67
contemporâneas, só começaram a ser mais desenvolvidos de um modo, na minha

opinião, adequado, a partir dos anos 90 e já neste começo do século XX – como aliás

está claramente patente na Bibliografia no fim deste trabalho. De facto, para além do

que aprendi com o Prof. Faivre, livros e trabalhos de nomes como Luhrmann,

Laplantine, Rivière, Bowie, Eller, Greenwood ou os Steiin, no campo da antropologia

da religião, e de Faivre, Lenoir, York, Heelas, Hanegraaff, Introvigne, Melton, Hammer,

Dawson, Partridge ou Lewis, nos domínios da sociologia e da ciência dos NMR, das

EA e ainda da história do esoterismo, influenciaram-me fortemente e deram-me a

perspectiva e formação que eu precisava e que complementasse a orientação generosa

do Prof. Mesquitela. De referir a forte influência que o estruturalismo de Lévi-Strauss

exerceu sobre mim, sobretudo através da “leitura” que dele fez Lucien Scubla (em Lire

Lévi-Strauss) e que me parecia indispensável à compreensão da universalidade do

simbolismo alquímico.

Era chegado agora o tempo de integrar a minha experiência e vivência “émicas”

junto dos grupos estudados, numa perspectica “ética” socio-antropológica, o que

aconteceu, sobretudo a partir de 1998/9. Como se viu anteriormente o imaginário

alquímico não sendo de tipo exclusivamente místico – pese embora o clima inebriante

da “floresta” dos símbolos da Alquimia – tem no entanto algum tipo de racionalidade

interna, tal como a magia – como afirmou, entre outros, Lévi-Strauss -, que o colocam

foras de uma dimensão “nocturna”, característica de alguns universos místicos. Mas o

contacto do alquimista com a matéria faz com que a sua imaginação criadora não seja

totalmente “fantasiosa”, como pode acontecer na mística e em alguns tipos de magia –

recorde-se que Paracelso dizia (ver o livro de Koyré) que a alquimia estava associada a

uma “imaginação verdadeira”, mas não à “fantasia”. Em termos da teoria (literária e

68
filosófica) das Estruturas Antropológicas do Imaginário, de Gilbert Durand – com as

seus dois “regimes” do imaginário, o “diurno” e o “nocturno” e as suas três “estruturas”,

a “diairrética”, associada ao imaginário diurno e a “sintética” e a “mística” associadas

ao imaginário nocturno, sendo a primeira destas a que faz a ponte “hermesiana” entre o

diurno diairrético e o nocturno místico -, podemos dizer que a alquimia tem um

imaginário sintético, fazendo a síntese entre o diurno e o nocturno, entre o espiritual e o

material.

Tratava-se, em qualquer caso, há cerca de 10 anos, de sair das memórias

interiores, muitas delas com uma carga emocional intensa (de afectos e de tensões), das

notas de campo e do estudo histórico que eu tinha feito – e que era inédito – sobre a

alquimia francesa e os seus grupos, no último quartel do século XX, para um diálogo

reflexivo entre essa minha experiência e a perspectiva da ciência social e humana que se

tinha intensificado em mim.

Um trabalho deste tipo envolve sempre algum desafio para o investigador,

particularmente se ele vai utilizar a autobiografia e a reflexividade. É claro, está hoje

explicitado na Antropologia e nas Ciências Sociais, que mesmo no trabalhos

etnográficos mais distanciados do objecto de estudo, era impossível anular a

subjectividade do observador. Mas a autobiografia e a reflexividade implicam mais o

observador, convocam toda a sua experiência e vivência humanas e obrigam-no a uma

espécie de autocrítica científica dessas mesmas vivências e dos discursos que ele

elaborou. Muito está em causa e muito se joga nesta reflexividade autobiográfica: a sua

personalidade, a sua identidade, a sua imagem e a representação que os outros têm dele.

69
Se por um lado eu fui sempre considerado como um “outsider” junto dos grupos

alquímicos que frequentei, pois sempre assumi uma posição inequívoca de estudioso,

embora um estudioso entusiasmado pelo tema – e isso iliba-me, em certa medida, de

alguma problema de ordem ético ao publicar os resultados e as conclusões desses

estudos, mesmo num quadro limitado de trabalho académico -, a verdade é que também

junto da academia eu era também, de algum modo, visto como um “outsider” no

domínio da Antropologia e que, além disso, se interessava por objectos de estudo

estranhos. No entanto, progressivamente, fui conquistando alguma generosa aceitação

científica de uma parte dos meus colegas, a qual culminou com a já referida

possibilidade (dada pelo meu actual Orientador) de leccionar a cadeira de Antropologia

da Religião. Mesmo assim, isso não impediu que fosse dispensado das minhas

responsabilidades lectivas no final da época de 2004-2005, o que me deixou

profundamente abalado e com a necessidade financeira de trabalhar profissionalmente

noutra área. Como tinha uma longa experiência de Criminalista, enveredei pela área,

mais abrangente, da Segurança, desenvolvendo, num domínio mais próximo da minha

área de estudo (e que já tinha abordado na minha cadeira), estudos da violência religiosa

– apoiado nos livros dos sociólogos Mark Juergensmayer (Terror in the Mind of

God) e Charles Selengut (Sacred Fury) -, quer nas chamadas “seitas” (particularmente

crimes rituais), quer nas franjas radicais e extremistas da “grandes religiões”

(particularmente o terrorismo religioso), franjas essas que apresentam comportamentos

do tipo sectário – ver um artigo de Mark Sedgwick, na Nova Religio, a esse respeito.

Um aspecto me surpreendeu nesses estudos de Segurança foi a constatação de

que a socialização e a subjectivação nos grupos sectários e terroristas (descrita, por

exemplo, pelo especialista em violência, o psicólogo espanhol José Sanmartín, no seu

70
livro de 2005, El terrorista – como és. como se hace) era muito semelhante, embora em

menor intensidade, em alguns NMR e EA, fossem eles esotéricos ou não. O caso da

Filiação Solazaref parecia-me um claro exemplo desta situação. Com uma diferença

importante que tem a ver, nestes grupos “esotéricos” (na acepção de Hammer, já

referida), com o facto de a afirmação identitária se poder realizar fora de um grupo e por

vezes de ela ser mais interessante fora de um grupo, o que pode colocar em questão a

dimensão “esotérica” da pessoa em causa e diminuir a afirmação identitária do

“esoterista” perante si mesmo e perante os outros. A socialização feita dentro de um

grupo destes é interessante e estimulante para os que têm tido pouca formação

individual e pouca afirmação identitária. Nestes casos o grupo é útil.

É evidente que as consequências destas subjectivações são drasticamente

diferentes entre si, nos grupos religiosos terroristas e nos NMR. No entanto, é de referir

que alguns NMR esotéricos tiveram desfechos terríveis, como foi o caso dos suicídios

na neo-templária e rosacruciana Ordem do Templo Solar (ver os estudos de Jean-

François Mayer) e do terrorismo da “seita” hindo-budista e cristã-apocalíptica (sincretis

mo típico do New Age), Aum Shinrikyo (a Verdade Suprema), no Japão (ver os estudos

de Ian Reader), para só citar dois exemplos – outros mais, nem todos violentos, mas

todos problemáticos poderemos encontra, por exemplo, na obra colectiva Controversial

New Religions (coordenada por James R. Lewis e Jesper A. Petersen). Saliente-se que

ambos estes grupos, atrás mencionados, citavam a alquimia como objectivo: a Verdade

Suprema numa dimensão tântrica e o Templo Solar numa dimensão psico-espiritual,

mística.

71
É um facto de que apenas só encontrei fenómenos de algum modo semelhantes,

na sua estrutura, mas não nas manifestações violentas, no caso da Filiação Solazaref.

Desde logo, o sentimento muito forte de pertença, neste caso a uma “filiação”, e do

espírito de tribo que é comum a ambos os casos – aliás, outro especialista de uma certa

violência religiosa, o psicólogo Marc Sageman (em Understanding Terror Networks e

Leaderless Jihad), na circunstância o “jihadismo”, considera na sua última obra que um

dos factores determinantes da socialização em grupos terroristas (“sem líder”) é a

camaradagem ente os seus membros (a bunch of friends). Depois, também há a

considerar como factor importante uma tendência a dicotomizar o mundo em dois

grupos antagónicos irredutíveis (os bons e os maus, os sagrados e os profanos, os puros

e os impuros, etc., etc.) e uma atitude de pouca empatia ou mesmo de antipatia face ao

mundo, por vezes mesmo de confronto. Refiro um episódio que foi do domínio público

e que foi protagonizado por elementos da Filiação Solazaref: um ataque e parcial

destruição de um “stand” da revista “La Table d’Émeraude” numa “feira do livro

esotérico” e consequente processo em tribunal, posto pelo proprietário da livraria,

Bernard Renaud de la Faverie, contra os elementos da “filiação”. Aqui é importante

referir a tipologia dos NMR proposta por Roy Wallis, em Elementary Forms of New

Religious Life, a saber, os “que afirmam o mundo” (world affirming), os “que aceitam o

mundo” (world accepting) e os que “rejeitam o mundo” (world rejecting). Claramente,

a “Filiação” rejeita o mundo nos domínios religioso, filosófico, político, social, etc. e

divide o mundo em dois campos irreconciliáveis, projectando sobre a outra parte

contrária – a dos que não aceitam e compreendem a alquimia ou a dos que aceitando-a,

não seguem a visão particular do “mestre” Solazaref, enfim dos que são inferiores,

impuros, profanos -, toda a sua frustração, ressentimento e mesmo ódio.

72
Este universo de intransigência é atractivo e eloquente para os que se sentem

frustrados face ao mundo e por não encontrarem nele projectos mobilizadores que lhes

dêem sentido e por ele não lhes dar sentido às suas vidas, mantendo-os na periferia dos

seus diversos universos, social, político, religioso, filosófico, etc. Esta carência de

projectos existenciais que os mobilizem interiormente e dêem sentido à suas vidas, leva

muitos jovens, e também menos jovens, a aderir estes grupos sectários, sejam eles NMR

ou mesmo, em casos extremos, grupos terroristas, nos quais se socializam e se

subjectivam. Eu, no meu caso, sempre reagi claustrofobicamente a estes universos de

“obediência” quase cega que, além de me repugnarem sob o ponto de vista psicológico

e filosófico, me parecem ser o contrario de uma verdadeira vida espiritual. É certo que o

sufismo e o budismo “chan” (e “zen”) se manifestam por um controlo muito forte do

mestre sobre o discípulo. Mas é difícil, pelo menos no Ocidente, evitar a derrapagem de

uma via de “vigilância rigorosa e consciente sobre o ego” para um mero esquema de

controlo mental, mesmo que os psiquiatras norte-americanos coloquem em dúvida a

realidade desta “lavagem ao cérebro”, ou no mínimo, do “controlo mental” – ver o

capítulo sobre este tema no Oxford Handbook of New Religious Movements. É sabido

que muitos grupos “anti-seitas” - a este propósito, vale a pela recordar, com Massimo

Introvigne (La Magie à nos portes), a tipologia dos grupos “anti-cultistas” e dos

“contra-cultistas” – utilizam indevidamente e a seu bel-prazer esta acusação de

“controlo mental” para justificarem os seus ataques às “seitas” e aos “cultos” religiosos

e os colocarem em tribunal, mas que existe algum tipo de estratégia de controlo em

alguns NMR, isso parece ser indiscutível. Defender os NMR de acusações injustas deste

e doutro tipo, parece ser um acto de justiça e uma obrigação social por parte dos

especialistas universitários dos NMR que têm também a obrigação política de defender

a liberdade religiosa, mesmo quando são apelidados “amigos das seitas” por aqueles que

73
querem cercear a liberdade religiosa apenas por interesse em conservar a sua posição no

mercado do religioso”– veja-se a reacção exemplar da reacção contra a Lei da

Assembleia Nacional francesa, no livro de Introvigne e Melton, Pour en finir avec les

sectes.

Mas, se por um lado os cientistas sociais têm de denunciar os ataques contra as

“seitas” e “cultos” que aproveitam argumentos científicos insustentáveis, também, por

outro lado eles não podem silenciar os aspectos problemáticos que, na maior parte dos

casos, não são violentos, mas que apresentam algum tipo de risco para a saúde mental

dos aderentes a esses grupos e ameaças à sua liberdade e à dos seus familiares. O caso

da Filiação é paradigmático desta situação. Recordo, entre outros, o caso mais flagrante,

da crise psicológica, familiar e social do casal JS e C da “etnia portuguesa”, sintomático

da violência psicológica e do controlo sobre as vidas dos membros exercido pelos

responsáveis pela hierarquia do grupo.

É importante referir neste contexto a utilização de uma linguagem própria do

grupo, no caso da Filiação termos – para além deste próprio termo que pode indicar o

conjunto de filiados, mas também que eles são filhos espirituais ou iniciáticos do Mestre

- como a “obediência conventual”, a “assembleia dos filósofos”, a “verdade interdita”,

etc., denunciando uma ideia, ao mesmo tempo simbólica e real, de fechamento, de

clausura, de separação (dos puros dos impuros, do sagrado e do profano, etc.), de

perseguição por parte do mundo exterior, ideia que existe de algum modo em muitos

grupos religiosos e mágico-religiosos, mas que adquire uma maior densidade e

consequências nestes grupos onde o controle é maior sobre os membros. Também

expressões como a “tempestade química”, indicam que a via escolhida na Filiação não

74
pretende ser tranquila, mas sim “tempestuosa”, que o corte com os outros, com o Outro,

é radical e intenso e onde o interesse do grupo e do “mestre” se sobrepõe a tudo o resto,

“obediencialmente”. No entanto, de entre os grupos estudados, a Filiação foi o que

apresentou estas características “sectárias”, com maior intensidade. Só encontrei este

exemplo de violência simbólica no caso concreto deste grupo esotérrico-alquímico, já

que os outros grupos estudados – e sobretudo o outro grupo onde fiz “trabalho de

campo”, não são tão estritos, quer do ponto de vista da teoria, quer da prática, quer

também da estrutura do grupo.

Recordo agora aquilo que mais me impressionou positivamente em todos estes

grupos. Em primeiro lugar o espírito da experimentação e do trabalho manual,

conjugado com o estudo intenso. Isto, quer em laboratório, quer na natureza. Ora, lege,

lege, relege, labora et invenies – ora, lê, lê e relê, trabalha e encontrarás. Há uma

atitude de respeito e reverência pela natureza conjugada com uma vontade da sua

transformação através de um trabalho laborioso, árduo, paciente, com o objectivo de

“ajudar” a “evolução dessa mesma natureza. Escreve a Atalanta fugiens, de Michael

Maier: ajuda-me que eu te ajudarei, diz a Natureza para o alquimista, advertindo-o que

talvez o maior segredo da alquimia seja essa íntima comunhão entre ambos que

permitirá, segundo eles, uma evolução conjunta.

Daquilo que observei junto dos membros destes grupos e que observei em mim

próprio durante esse trabalho de campo, a determinada altura quando começa o trabalho

de laboratório, mais importante do que a Pedra Filosofal – objectivo que se admite mas

como uma hipótese longínqua e quase inacessível, um “dom de Deus”, um donun dei

(título de um tratado de alquimia) – é esse longo caminho que põe à prova o alquimista,

75
que o desafia e que constitui uma verdadeira meditação onde ele concentra as sus

energias espirituais, anímicas e físicas. Essa meditação exerce-se, contrariamente as vias

místicas e mágicas, num suporte material, ou melhor, através dele. Na alquimia

operativo-laboratorial é celebrada uma espiritualidade do artesão, independente das

outras características marcantes que os grupos possam ter, por exemplo e como casos

extremos, a do sacerdote da natureza nos FARC, privilegiando o primado da oração

propiciadora da intervenção divina na alquimia, ou a do guerreiro da natureza na F.

Solazaref, celebrando o primado do carácter heróico, guerreiro e quase demiúrgico, nas

operações alquímicas e secundarizando a acção divina.

Esse aspecto também marca uma diferença com as vias místicas onde se concebe

a matéria, à semelhança do gnosticismo radical, como um mundo que nos perde. Na

alquimia, é a matéria em transformação, por acção do próprio alquimista – perspectiva

mais hermética do que gnóstica, logo, mais optimista do que pessimista -, que permite a

sua “salvação”, mesmo que ele não encontre a Pedra Filosofal.

E voltamos à questão básica, do ponto de vista antropológico. O que leva

homens e mulheres modernos e com alguma preparação científica a acreditarem na

Pedra Filosofal? De facto, cheguei à conclusão, através do meu convívio com eles e da

minha introspecção, que nem todos os membros acreditam nela ou, na melhor das

hipóteses, acreditam numa possibilidade muito remota da sua realização. Direi mesmo

que muitos autoconvencem-se – “autopersuadem-se”, como diria Tania Luhrmann - da

sua realidade, mesmo que remota, pois é esse “objecto total”, mítico, que é essencial

para mobilizar todo o seu projecto espiritual e a sua afirmação identitária nesse universo

esotérico-alquímico que lhes dá poder e prestígio simbólicos. Trata-se de purported

76
objectives (Olaf Hammer, in Claiming Knowledge), afirmações que, mais do que se

constituirem em objectos de um verdadeiro convencimento ou crença, se proclamam

porque nas quais nos convem acreditar, para sermos “persuadidos” por elas, através de

“estratégias retóricas”, “práticas discursivas” - que geram “mecanismos sócio-

psicológicos”, identitários, por exemplo, mais do são gerados por eles. E, está claro,

essas afirmações também convém que os outros as escutem, sobretudo em determinados

meios, o que aumentará o nosso prestígio simbólico junto deles.

Em suma, o mais importante é, pois, a função dessa crença - essa(s) crença(s)

permitem também servir de “compensadores”, como já se viu - e não a crença em si, já

que ela permite uma “celebração do eu” (cf. Paul Heelas, The New Age Movement –

The Celebration of the Self and the Sacralization of Modernity), mais do que isso,

uma “sacralização do eu”, utilizando o mito alquímico por excelência que é a

elaboração da Pedra Filosofal, esse “objecto total”, através do rito sacrificial que

constitui o trabalho de laboratório, utilizando os “objectos religiosos” alquímicos que

são os materiais – as “matérias primeiras” (minerais, metais, sais, etc.) e as “matérias

primas” (o “húmido radical”, a “raíz dos metais”, o “fogo secreto”, o “espírito

universal”, etc.) e os instrumentos (fornos/atanores, retortas, balões, etc.) – os quais são

uma espécie de totems dos grupos e das correntes alquímicas: a via do antimónio, a via

do mercúrio, a via do vitríolo ou a via seca (em cadinhos e em fornos) e a via húmida

(em balões e retortas).

77
III – A ALQUIMIA NO CONTEXTO DAS CORRENTES ESOTÉRICAS

OCIDENTAIS: HISTÓRIA E FILOSOFIA, IMAGINÁRIO, SÍMBOLO, MITO E

RITO.

Após o levantamento de questões metodológicas na Introdução e a minha

aproximação antropológica reflexiva e autobiográfica à Alquimia de hoje e aos seus

praticantes, abordo agora neste Capítulo a sua História e a Filosofia e ainda o seu

Imaginário, a sua Simbólica, a sua Mitologia e o seu Rito.

História da Alquimia Ocidental até meados do século XX

A Alquimia é uma das disciplinas do Esoterismo, universo multifacetado que

inclui, entre outras a Gnose (e os diversos Gnosticismos), a Magia, a Astrologia, a

Cabala hebraica e renascentista (cristã e judaico-cristã), o Sufismo islâmico e, mais

tarde a Teosofia cristã, o Rosicrucismo, etc. Podemos considerar a Alquimia como

próxima da Magia, uma “Magia natural”, pois ela faz apelo a operações que implicam a

acção do Espírito Universal – que “o vento traz no seu ventre”, diz a “Tábua de

Esmeralda” – embora, contrariamente à magia, ela se exerça sobre um suporte material,

em que a matéria é sujeita a um processo sacrificial, ao mesmo tempo simbólico e

operativo, que a faz espiritualizar-se e “evoluir”, processo de algum modo homólogo do

arcaico processo xamânico em que, após a fase preparatória, se dá a morte e

desmembramento – com a separação dos “princípios alquímicos” – seguida de uma fase

de purificação e regeneração que conduz à “ressurreição” de uma nova matéria – a

Pedra dos Filósofos e depois a Pedra Filosofal.

78
Conforme sustenta Olav Hammer, no seu artigo “Esotericism in New Religioyus

Movements98, há duas concepções de Esoterismo:

- o conceito “histórico” e doutrinal de Antoine Faivre, que delimitou a noção de

“Esoterismo Ocidental (Moderno)” como “modo de pensamento” (Hammer);

- o conceito “tipológico” de “esoterismo”, proposto pelo próprio Hammer e que se

centra na observação de “propriedades estruturais” de uma “classe de movimentos

religiosos”, e na sua “correlação” com cinco características:

- social formations;

- rituals;

- purported objectives;

- cognitive style, and;

- relations to mainstream society99;

Este conceito será muito útil para estudarmos os grupos que praticam a alquimia

hoje, já que dá atenção, para além das “formações sociais”, a questões muito

importantes tais como, “práticas discursivas”, “objectos religiosos”, “mecanismos

socio-psicológicos”. É o que faremos no capítulo final que abordará a dimensão socio-

antropológica dos mesmos.

Deixemos por agora o conceito de Hammer – que utilizaremos, por ter uma

dimensão mais social, quando depois de descrevermos os grupos alquímicos,

procedermos ao seu estudo socio-antropológico - e centremo-nos no que Faivre propôs

em 1992 e para o qual o Esoterismo Ocidental tem as seguintes quatro características

específicas:

98 In Oxford Handbook of New Religious Movements, Capítulo 19, op. cit., p. 445.
99 Op. Cit., p. 449.

79
- ideia das correspondências entre as diversas partes da Natureza e entre esta, o

Homem e o Cosmos;

- a natureza viva: a matéria não é inerte, ela tem alma e espírito;

- imaginações e mediações, essenciais para que as operações da alquimia física,

laboratorial, não sejam apenas materiais e para que tenha sustentação a alquimia

“espiritual”;

- a experiência da transmutação, uma experiência interior (e ao mesmo tempo

exterior, no caso da alquimia física).

É importante referir o que Faivre sustenta e que diz respeito à progressiva

constituição do Esoterismo no Ocidente, como um corpo autonomizado e

sucessivamente expulso da Teologia, da Filosofia e da Ciência, contrariamente ao

Oriente, onde ele se mantém ainda, em grande parte, nesses domínios. Baseado nos

textos atribuídos a Hermes Trismegisto o Corpus Hermeticum, o Hermetismo - e

também a Alquimia que dele decorre - é, face à sua próxima e quase contemporânea

Gnose, uma filosofia optimista face à Natureza e ao Homem. A Gnose - e os seus

Gnosticismos - considera que o Homem é um ser espiritual in principio e que “caiu” na

matéria, onde está agrilhoado e da qual ele tem de se libertar para “retornar à Casa do

Pai”, à morada celestial, de onde o Homem foi exilado. A Matéria, e o Corpo, é pois,

segundo a Gnose, uma prisão, um entrave à “reintegração” espiritual do Homem. Logo,

só há salvação fora da matéria. Para o Hermetismo, de raíz neo-platónica como a Gnose,

a Matéria é, no entanto, susceptível de ser salva, espiritualizada, de ser reintegrada, por

acção do Espírito. As partículas de Luz espalhadas na Matéria, com a Queda – que a

Gnose também refere -, o logos spermaticus, podem salvar uma parte ou mesmo a sua

totalidade. Para a Gnose essas partículas de Luz têm de ser retiradas e afastadas da

80
Matéria, a qual fica irremediavelmente perdida, sem salvação. Este conceito da Luz no

seio da matéria é muito importante em alquimia operativa - onde por vezes é

denominado de “fogo secreto” -, bastando recordar o título de um tratado de Alquimia

do século XVII, atribuído a Marc-Antoine Crasselame, A Luz saindo por si própria das

trevas.100 E mesmo quando mais tarde se explicita, em Alquimia, a noção de Espírito

Universal que é preciso captar para animar a matéria, nunca é posta de parte a ideia de

que ele tem de se unir, por atracção, ao “espírito” que existe na matéria, tendo o

alquimista um papel determinante nesse processo, interactuando activamente nele.

Todas estas ideias – as quais têm alguma semelhença com a noção de mana -

apresentam uma clara dimensão mágica, no contexto da ciência, mas de uma magia

“natural”, como dissemos.

Redescobertos no Renascimento, cerca de 1450, por acção de Cosme de Medicis

e traduzidos a seu pedido por Marcillo Ficcino (1433-1499), estes textos herméticos

tiveram grande influência na Europa culta renascentista e contribuíram para o tema – a

que o Iluminismo dará sequência mais tarde -, de um grande conhecimento espiritual,

uma “filosofia perene”, que se perdeu e que era imperioso recuperar, quer dentro do

Cristianismo, quer fora dele. Embora o Hermetismo alexandrino – quer na sua dimensão

“culta”, filosófica, savante, como denominava o Rev. Padre Festugière, quer na sua

dimensão popular, mágico-religiosa - não refira explicitamente a Alquimia, ela

estabelece no entanto um quadro teórico que a torna possível.

Babilónica na sua origem, como propõe Mircea Eliade – sem esquecer as

alquimias chinesa e indiana -, a Alquimia desenvolveu-se no Egipto como um

100 Paris, Retz/Bibliotheca Hermetica, 1971

81
“prolongamento”, segundo Antoine Faivre, de l’astrologie hermétiste à partir de la

notion de sympathie liant chaque planète à chaque métal – de enorme importância

para a alquimia, como veremos - e terá sido até ao século II A.C., une technique

associée à la pratique des arts d’orfèvrerie – o que a situa, desde o princípio, na sua

dimensão operativa, laboratorial, sem esquecer a sua paralela dimensão espiritual, pois

como escreve A. Faivre, Avec Bolos de Mendès, au IIe siècle de notre ère, elle prend un

tour philosophique et se présente de plus en plus comme une science révélée. No

entanto, surge nesta altura, como uma corrente paralela, em Zózimo, em Sinésio e em

Olimpiodoro, os mais conhecidos, a alquimia “espiritual”, ou “visionária”: Zozime de

Panapolis (IIIe ou début du IVe siècle), dont vingt-huit livres ont été conservés,

développe une alchimie visionnaire, suivi en cela par Synesius (IVe siècle),

Olympiodore (Vie siècle) et Stephanos d’Alexandrie (VIIe siècle), chez lesquels

l’alchimie est considérée comme un exercice spirituel.101

Introduzida na Europa, através de Espanha, em finais do século XIII, por meio

dos célebres Tratados árabes traduzidos em latim, Turba Philosophorum, Summa

(atribuída ao árabe Geber, ou Al-Jabir), Aurora Consurgens (atribuída a S. Tomás de

Aquino) e ainda pela obra Rosarium Philosophorum (atribuída ao catalão Arnau de

Villanova), a Alquimia ocupa um lugar importante no imaginário medieval, alimentado

(do século XIV ao XV) por obras de nomes tão importantes como Nicolas Flamel,

Georges Ripley e Bernardo o Trevisano. Como sustenta Faivre, Comme à l’époque

héllénistique tardive, l’alchimie du Moyen Age tend à se déployer sur deux plans,

opératoire et spirituel.102

101 Antoine Faivre, L’Ésotérisme, Paris, P.U.F., 1992, p. 34.


102 Op. Cit., p. 39.

82
Esta tendência continuará com nomes com um Teofrasto Bombasto von

Honhenheim, chamado Paracelso (1493-1541) que, Professor na Academia de Medicina

de Basileia, lança as bases da medicina experimental e, ao mesmo tempo, desenvolve a

alquimia numa dimensão “totalizante”: instrument de connaissance du monde, de

l’homme, du créateur même, elle devient vraiment vision totalisante; tout, y compris les

astres, a été créé «chimiquement» et continue d’évoluer de façon «chimique». Para

Paracelso, a Alquimia está intimamente ligada à Astrologia, ambas elos das

“interdependências universais”, como escreve Faivre, expressas pelas: corrélations

entre l’homme, la Terre et les astres d’une part, les astres et les métaux ou les éléments

chimiques d’autre part.103

Paracelso foi o fundador da Espagíria, do grego spao (separar) e ageiro (reunir),

técnica de preparação das tinturas e elixires, decorrente da teoria da alquimia - que a

seguir trataremos. Desde já se dirá que a Espagíria separa os “princípios” alquímicos

para a seguir os reunir, fazendo-o reiteradamente, o que para a Química não fará muito

sentido, mas faz sentido para a Alquimia pois assim, diz ela, “abrem-se” os materiais ao

espírito e eles purificam-se.

Outros nomes importante se seguiram a Paracelso, como o de John Dee (1527-

1608) – autor de Monas hieroglyohica (1564) –, como o de um Médico e químico, João

Baptista Van Helmont (1577-1644), como o de um sapateiro e místico, Jacob Boheme

(1575-1624) – autor de De Signatura Rerum (1621) e de Mysterium Magnum (1623) – e

de Rosa-Cruzes eminentes, na senda do seu criador João Valentim Andrea (1586-1654),

a saber, Robert Fludd, Michael Maier – autor de Atalanta fugiens (1618) e médico de

Rudolfo II de Praga, protector de alquimistas e astrólogos -, Elias Ashmole (1617-1692)

103 Op. Cit., p. 49.


83
– um dos fundadores da Royal Society, a primeira Academia das Ciências do mundo,

continuadora do Invisible College do grande químico Robert Boyle, da qual foi grande

animador Samuel Hartlib – e Sir Isaac Newton (1642-1727), um dos mais ilustres

fundadores da ciência moderna, que praticou em segredo a Alqiuimia durante toda a

sua vida (pois, para além de não querer arriscar o seu prestígio académico e científico,

ele foi mais tarde Presidente da Royal Society, durante cerca de quarenta anos, e

Director da Royal Mint (a Casa da Moeda inglesa), e que tinha, na sua casa de

Cambridge, onde foi Professor, um laboratório alquímico no qual ocorreu uma vez uma

grave explosão que afectou a sua saúde. Newton tinha uma grande biblioteca alquímica

com os tratados cuidadosamente anotados com observações da sua própria experiência

laboratorial e com manuscritos alquímicos da sua própria mão (metade dos quais datam

de sete ou oito anos após a publicação, em 1686, dos seus Principia)104.

Newton é um exemplo típico do Iluminismo inglês de finais do século XVII,

com a sua construção da ciência moderna e a demanda simultânea do enorme

conhecimento dos antigos, da Prisca Sapientia, da Philosophia perennis, que se perdeu,

mas que a humanidade tinha de reencontrar. Daí esta contradição aparente que

influenciou, entre outros o jovem Goethe – ver a dimensão alquímica do conto da

Serpente verde105. É de salientar ainda, nos séculos XVII e XVIII, a edição de grande

enciclopédias alquímicas, como o Theatrum Chemicum (1652), de Elias Ashmole, o

Museum hermeticum (1678) e a Bibliotheca chemica curiosa (1702), de Manget (em

dois volumes) e a publicação dos seguintes livros que tiveram grande influência sobre a

Alquimia dos séculos posteriores: Aura catena Homeri (1723), de A. J. Kircheweger,

104104 Ver a Tese de Doutoramento de Betty Dobbs, publicada sob a forma de livro (em tradução fran
cesa), com o título Les Fondements de l’Alchimie de Newton, ou “La chasse au lion vert”, Paris, Ed. de
la Maisnie, 1981,

84
Ennoea, ou aplicação do entendimento da Pedra Filosofal (1733), do médico português

Anselmo Caetano Castelo Branco – um importantíssimo tratado publicado com as

licenças do Santo Oficio, que só terá tido eco, no entanto, na Península Ibérica -,

Histoire de la philosophie hermétique (1742), de N. Lenglet-Dufresnoy e o Dictionnaire

mytho-hernétique (1758) do Abade Dom Pernéty. Este último, será – já que a Rosa-cruz

do século XVII, embora com um texto fundador, As Bosas Químicas de Christian

Rosencreutz, de claro simbolismo alquímico, nunca foram uma sociedade iniciática

organizada, apenas o foram já em finais do século XVIII, com a “Rosa-Cruz de Ouro”

alemã, de 1777 - um dos primeiros organizadores e dinamizadores de um grupo

alquímico, embora com características maçónicas – saliente-se que no século XVIII, os

rituais maçónicos, particularmente dos “altos graus”, continham claras referências à

Alquimia -, os Iluminados de Avinhão106, cujo “rito hermético” é profundamente

impregnado de Alquimia107. Não é este o único exemplo de grupos alquímicos desta

época iluminista, já que há também a registar em Inglaterra, em finais do século XVIII e

em princípios do século XIX, a “sociedade rosicriacuana”, ou alquímico-rosacruciana,

do Dr. Segismundio Bacstrom108.

No começo do século XIX a Naturphilosophie alemã de, por exemplo, um

Novalis ou um Schelling (1775-1854) - segundo o qual ela é une tentation d’amenner

au jour ce qui a été le perpetuel refoulé du christiannisme, c’est-à-dire la Nature109 -,

retoma, “romanticamente” (já que integra de algum modo no Romantismo alemão),

105 Cf. Tese de Doutoramento de vette Centeno, na UNL


106 Ver Johanny Bricaud, Les Illuminés d’Avignon – étude sur Dom Pernéty et son groupe. Paris, SEPP,
1995 (réd. Da ed. de 1927),
107 Dom Pernety, Rituel Alchimique Secret du Grade de Vrai Maçon Académicien, composé en 1770,
Eidizione Rebis, Viareggio, 1981.
108 Adam McLean, “Bacstrom’s rosicrucian society”, in Hermetic Journal, n.6, pp. 25-29.
109 A. Faivre, op. Cit., p. 78.

85
alguns dos temas do Hermetismo e da Alquimia, pois surge com as seguintes

características essenciais:

1 - Une conception de la Nature comme texte à déchiffrer à l’aide des

correspondances;

2 - Le goût du concret vivant et de l’univers pluriel;

3 – L’identité de l’Esprit et de la Nature, considérés comme les deux germes

d’une racine commune (matière et Nature reposent sur un principe spirituel, un Esprit

les habite). Du même coup, connaissance de la Nature et connaissance de soi von de

pair.110

Saliente-se estes aspectos muito importantes na “filosofia da natureza” alemã e

que convergem com as ideias que presidem à alquimia operativo-laboratorial: as

“correspondências”, o “gosto do concreto”, o “universo plural”, a “identidade do

espírito e da natureza e a sintonia e sincronicidade entre “o conhecimento da natureza”

e o “conhecimento de si próprio”. A. Faivre refere, também, a “contribuição maior” da

Naturphilosophie alemã à ciência do século XIX que, segundo ele, é a “descoberta do

inconsciente”, (surtout avec Schubert et Carus): c’est dans le romantisme que la

psychanalyse plonge ses racines111 e menciona também que “é sob o seu clima” que

nasceu a Homeopatia moderna, de Samuel Hahnemann (1775-1843), a qual decorre dos

conceitos da espagíria paracelsiana: “ o semelhante cura o semelhante”.

Como se vê, depois de uma Idade Média onde os alquimistas são em grande

parte gente do povo – exceptuando o caso de um Roger Bacon, mas saliente-se que os

tratados atribuídos a grandes personalidades, como Bacon e S. Tomás de Aquino, são-

no por uma questão de prestígio e não porque eles tenham sido os seus verdadeiros

110 A. Faivre, op. Cit., p. 79.

86
autores –, e em que a tradição é comunicada sobretudo oralmente, verifica-se que a

partir do Renascimento ela passa a ser praticada por gente mais culta e por grandes

nomes da época, sendo veiculada por tratados de grande interesse literário, simbólico e

por vezes iconográfico112. Após os Iluminismos, e com o triunfo pleno da Ciência

moderna, ela passa outra vez por um período de uma certa obscuridade. No entanto,

verifica-se em meados do século XIX o surgimento de livros como A Suggestive

Enquiry into the Hermetic Mystery (1850), de Mary Ann Atwood, L’Alchimie et les

alchimistes (1856), de Louis Figuier, Alchemist and the Alchemists (1857) de Ethan A.

Hitchook e, no final do século, de Théories et symboles des alchimistes (1891), de

André Savoret e, muito importante para o nosso estudo de grupos alquímicos, o livro

Comment on devient alchimiste – Traité d’Hermétisme et d’Art Spagyrique (1897), com

prefácio do célebre ocultista Papus, da autoria do “comunista espiritualista”113 F.

Jollivet Castelot (1874-1939), Director das (revista) L’Hyperchimie e Rose-Croix e

Secretário-Geral da Association Alchimique de France”, associação também

denominada Societé Alchimique de France que dispensava um curso de alquimia aos

seus membros e que reunia nomes como o já mencionado Papus (da Ordem Martinista),

Dr. Marc Haven, Sédir, Stanislas De Guaita, Barlet, Augusto Strindberg e ainda Camille

Flammarion (membro honorário)114.

Uma das razões que poderão presidir a este renascimento da antiga Ciência ou

Arte de Hermes, em plena época cientista, será a necessidade, sentida por muitos –

possuidores de um espírito “dionisíaco”, face ao clima “apolíneo” da ciência

111 A. Faivre, op. Cit., p. 81.


112 Veja-se os muitos exemplos incluídos no estudo de Van Lennep, J., Arte y Alquimia, estudio de la
iconografía hermética y de sus influencias (1966), Madrid, Ed. Nacional, 1978
113 Gérard Galtier, Maçonnerie Égyptienne, Rose-Croix et Néo-Chevalerie, Paris, Rocher, 1989, pp.316-
318.

87
nascente115 -, de um imaginário mais rico que o da ciência triunfante, imaginário quer

vai povoar também os universos da literatura e da arte (simbolismo, surrealismo, etc.).

Como escreve Serge Hutin em Histoire de l’Alchimie, sobre a época da belle epoque,

em França e particularmente em Paris, La fin du XIXe siècle et le début du Xxe verront,

dans la réssurrection générale des sciences occultes, dans leur remise au goût du

public, un regain des recherches alchimiques116, de que a “Sociedade Alquímica de

França”, atrás mencionada é um exemplo marcante. Continua Hutin, Ce serait une

totale erreur de croire que la période si troublée qu’a connue le monde aprés 1914 ait

entrainé la disparition progresive de l’alchimie (...)117.

Esta “ressurreição geral das ciências ocultas” e da alquimia em particular é

também explicada por Mircea Eliade por uma continuidade entre o sonho dos

alquimistas e a ciência e a técnica: En se plaçant sur le plan de l’histoire culturelle, on

peut donc dire que les alchimistes, dans leur désir de se substituer au Temps, ont

anticipé l’essenciel de l’idéologie du monde moderne (...) c’est dans sa foi dans la

science expérimentale (...) qu’il convient de chercher les rêves des alchimistes.118. Para

Eliade, a Alquimia deixou muito mais ao mundo moderno do que uma mera química

rudimentar, ela deixou-lhe como legado sa foi dans la transmutation de la Nature et son

ambition de maîtriser le Temps.119 Esta continuidade entro sonho (utópico) dos

alquimistas e as realidades da ciência, convive em alguns espíritos de formação

114 F. Jollivet- Castellot, Comment on devient alchimiste, réed. Paris, Éd. D’Aujourd’hui, 1985, pp. 408-
412.
115 Recordemos aqui a divisão de Nietsche, retomada pela epistemologia – ver o livro de Gérard Holton,
L’imagination scientifique, Paris, Gallimard, 1981, particularmente o Capítulo “L’imagination
scientifique: dyonisiens et appoliniens”, pp. 375 - 415.
116 Serge Hutin, Histoire de l’Alchimie, Paris, Marabout Université, 1971, p 234.
117 Op. Cit., p. 235.
118 Mircea Eliade, Forgerons et Alchimistes, Paris, Flammarion, 1997, nouvelle édition corrigée et
augmentée, p. 154.

88
científica do fim de século XIX e do virar do século XX, como Marcellin Berthelot,

Pierre Curie, etc.120

A ressurreição da Alquimia no século XX dá-se verdadeiramente com duas

obras datadas de 1925 e 1930, respectivamente, Le mystère des cathédrales121 e Les

demeures philosophales122, assinadas por um certo Fulcanelli – para o qual já foram

avançadas várias hipóteses de identificação123, desde o livreiro e escritor esoterista

Pierre Dujols, o escritor e astrónomo Camille Flammarion124, o escritor de ficção

científica Rosny «ainé», o esoterista e egiptologista René Schwaller de Lubicz 125, o

pintor e ilustrador das obras de Fulcanelli, Jean-Julien Champagne, até ao próprio

prefaciador Eugène Canseliet, discípulo de Fulcanelli. O impacto destas obras é

considerável na altura da sua edição, mas será muito mais importante anos mais tarde,

na segunda metade do século XX (como veremos no capítulo seguinte) aquando das

sucessivas reedições nos anos 60, 70 e 80, altura em que começam a surgir as obras de

Eugène Canseliet (1899-1982), todas publicadas por Jean-Jacques Pauvert: Alchimie

(1964), L’Alchimie et son livre muet, Mutus Liber (1967), L’Alchinmie expliquée sur ses

textes classiques (1972), Trois anciens traités d’Alchimie (1975), Deux logis alchimistes

(1945, reed. 1979). Na senda de Fulcanelli e de Canseliet – particularmente do seu livro

119 Ibidem.
120 Patrick Rivière dá conta no seu livro Fulcanelli, Paris, Éd. De Vecchi, 2000, das relações deste
universo científico com a alquimia, e talvez o próprio Fulcanelli, de que falaremos a seguir.
121 Fulcanelli, Le mystère des cathédrales, Paris, Jean-Jacques Pauvert, 1964 (réed. 3e éd. Augmentée,
Paris, Jean Schemit, 1925). 1ª. Ed. Portuguesa, Lisboa, Edições 70, 1973.
122 Fulcanelli, Les demeures philosophales, 2 tomes, Paris, Jean-Jacques Pauvert, 1964 (reed. 3e. éd.
Augmentée, Paris, Jean Schemit, 1930). 1ª. Ed. Portuguesa, Lisboa, Edições 70, 1977.
123 Ver, por exemplo, o balanço de Geneviève Dubois, Fulcanelli dévoilé, Paris, Dervy, 1992.
124 Ver Frédéric Courjeaud, Fulcanelli, une identité révélée, Paris, Claire Vigne, 1996.
125 André VanderBroek, Al-Kemi, a Memoir – Hermetic, Occult, Political, and Private Aspects of R.A.
Schwaller de Lubicz, N.Y., USA, Lindisfarne Press, 1987.

89
L’Alchimie expliquée... -, destaque-se o grande impacto sobre os alquimistas operativos

contemporâneos de Atorène, Le laboratoire alchimique (1980)126

No domínio da Espagíria, é de salientar, fora de França, na primeira metade do

século XX, o alemão Alexandre von Bernus (1880-1965), influenciado pela alquimia e

sobretudo pela espagíria de Paracelso, que fundou em 1921 os laboratórios SOLUNA e

cujos produtos (tinturas, elixires, etc.) se vendem ainda hoje, particularmente na

Alemanha, Áustria e Suíça. Uma organização alquímico-espagírica de influência

paracelsiana, fundada (fora da Alemanha) por um alemão, Albert Riedel - cujo

pseudónimo foi Frater Albertus (+ 1984), o “alquimista das Montanhas Rochosas” - será

a Paracelsus Research Society, com sede em Salt Lake City, EUA. Também, mas já nos

anos 70, o espagirista Armand Barbault terá muita influência com o seu livro L’or du

millième matin (1969)127.

Para se ter uma ideia do impacto e da aceitação dos livros de alquimia em França

na segunda metade do século XX, veja-se a respectiva Cronologia que aqui

apresentamos, onde é evidente um aumento progressivo, mesmo exponencial, destas

edições, sobretudo nos anos 70 e 80.

No começo dos anos 80 começam, ainda, a surgir os grupos alquímicos

organizados, o primeiro dos quais – a seguir ao FARC, acima mencionado -, em 1979,

se denomina Les Philosophes de la Nature, com sede em Malesherbes, França e dirigido

por Jean Dubuis. Depois virão a Filiation Solazaref (1982/3) e Spagy-

126 Editado por Guy Trédaniel/Éditions de la maisnie, Paris, que editou nos anos 70, obras dos discípulos
de Canseliet, Guy Béatrice e Sévérin Batfroi.
127 Réed., Paris, J’ai Lu, 1970.

90
Nature/CHRCHM, de Patrick Rivière (final dos anos 80). Destes grupos falaremos

adiante no Capítulo IV, já que se trata do tema principal desta Tese e do seu objecto de

estudo.

Teoria e Filosofia alquímicas; imaginário, símbolo, mito e rito

Como dissemos, a Alquimia é, em grande parte, uma aplicação do Hermetismo

alexandrino, exemplarmente simbolizado pela Tábua de Esmeralda, atribuída a Hermes

Trismegisto - que é um modelo de muita literatura alquímica posterior e da prática

alquímica até aos nossos dias -, a qual passamos a transcrever:

É verdade, certo e sem nenhuma dúvida. Tudo o que está em baixo é como o

que está em cima e o que está em cima é como o que está em baixo, para realizar os

milagres de uma só coisa. Da mesma maneira que todas as coisas procedem dum

Único, do mesmo modo, por adaptação, elas nasceram dessa coisa única. O seu pai é

o Sol e a sua mãe a Lua. O vento trouxe-o no seu ventre e a Terra é a sua ama. (o

Único) É o pai de todos os milagres do mundo. O seu poder é perfeito, se ela (essa

coisa única) é convertida em terra. Separa a terra do fogo e o subtil do grosseiro,

suavemente e com grande prudência. Ele eleva-se da terra ao céu e torna a descer

sobre a terra, recebendo assim a potência das realidades superiores e inferiores Deste

modo, tu ganharás a glória do mundo inteiro e toda a obscuridade se afastará de ti. É

a potência das potências, que estende a sua vitória sobre todas as coisas subtis e

penetra todas as coisas sólidas. Assim foi criado o microcosmo, segundo o modelo do

macrocosmo. Assim e deste modo se fazem as aplicações maravilhosas. Eis porque eu

91
sou chamado de Hermes Trismegisto, pois eu possuo as três partes da sabedoria do

mundo inteiro. Perfeito é o que eu disse da obra solar128.

Como se vê o projecto do alquimista é prometeico, convidando-o a realizar no

seu laboratório - no microcosmo -, a utopia alquímica, num papel demiúrgico de re-

criação. Este mito alquímico fundador – que lembra outros mitos familiares à

Antropologia, como o dos Dogon estudado por Griaule 129- vai repercutir-se ao longo da

história da Alquimia, com algumas pequenas variações.

Baseada num claro “dualismo sexual”, como refere Serge Hutin130 - ver

também e sobretudo os capítulos “Le monder sexualisé” e “Terra mater. Petra genitrix”,

da clássica obra de Mircea Eliade, Forgerons et alchimistes, onde ele refere a

“embriologia mineral” dos alquimistas -, o simbolismo da Alquimia parte das oposições

binárias: Sol/Lua, Pai/Mãe, Enxofre/Mercúrio, Ouro/Prata, Fogo/Água,

masculino/feminino, esperma/menstruo, activo/passivo, etc. Para Serge Hutin, le

Grand Oeuvre, c’est l’union de l’élément mâle, le Soufre, et de l’élément femelle, le

Mercure. Et touts les auteurs multiplient les comparaisons empruntées au langage de

l’union et de la génération131. Esta dimensão sexual da Alquimia foi explorada por

Jung na sua célebre obra Psicologia e Alquimia132, tendo Bachelard feito algo

semelhante em A Psicanálise do fogo133.

128 Traduzido do latim por Titus Buerckhardt nasua obra Alchimie, Olten, Walter Verlag, 1960, pp. 198-
199, citado por Françoise Bonardel, L’Hermétisme, Paris, P.U.F., 1985, p. 13. A tradução é nossa.
129 Griaule, Marcel, Dieu d’eau, Paris, Fayard, 1966
130 Serge Hutin, L’Alchimie, Paris, P.U.F., 1995, pp. 31-32.
131 Op. Cit., p. 32.
132 Carl Gustav Jung, Psychologie et alchimie, Paris, Buchet-Chastel & Correa, 1970.
133 Gaston Bachelard, Psychanalyse du feu, Paris, Gallimard, reed., 1962.

92
Sistematizemos, então os conceitos - que não designam corpos (elementos ou

substâncias) químicos, entenda-se, mas que designam qualidades - nos quais assenta a

teoria alquímica:

- Dimensão estática:

- duas “naturezas”: pai/mãe, masculino/feminino, fixo/volátil, activo/passivo,

quente/frio, Sol/Lua, Enxofre/Mercúrio;

- três “princípios”: Enxofre, Mercúrio e Sal; este terceiro princípio, mediador entre os

dois primeiros – e por vezes simbolizado pelo Bispo que casa o Rei e a Raínha -,

embora implícito desde cedo, foi explicitado por Roger Bacon, Basílio Valentim e

Paracelso134.

- quatro “elementos”: Terra, Água, Ar e Fogo, da velha teoria grega associada a

Anaximandro, Aristóteles, entre outros;

- “quinta essência”, para fazer correspondência com o Sal, por vezes denomina-se um

quinto elemento, o Éter, ou a Quinta Essência.

Saliente-se a importância estrutural da binaridade e da ternaridade no simbolismo

alquímico.

- Dimensão dinâmica:

- em dois momentos: Solve/ Coagula, Separar/Reunir, Morte/Ressurreição; há uma clara

raíz xamânica neste “desmembramento”, nesta “morte”, à qual se segue uma

“ressurreição num novo corpo;

134 Ver S. Hutin, op. cit., p. 70.

93
- em três momentos: Obra ao Negro (Nigredo) – a morte sacrificial da matéria - » Obra

ao Branco (Albedo) – a purificação da matéria - » Obra ao Rubro (Rubedo) – a exaltação

da nova matéria, ressurgida, renascida -, isto é, as três cores da Grande Obra alquímica.

Uma vez mais a binaridade e a ternaridade, desta vez não na dimensão estática,

mas na dimensão dinâmica do processo alquímico

Esta característica sexual de base do simbolismo alquímico, assente naquilo que

um Lévi-Strauss denominaria de “invariantes universais”, confere-lhe uma dimensão

quase arquetípica. Como diz Lucien Scubla, em Lire Lévi-Strauss, “é forçoso

reconhecer que certas oposições cardinais constituem invariantes antropológicos com

valores bem fixos – a da vida e da morte, por exemplo – mesmo se os símbolos que os

representam são eles próprios polivalentes e permutáveis”.135 Ao mesmo tempo, sendo

o mito – como o afirma Lévi-Strauss em Anthropologie structurale136 – “um

operador lógico para resolver uma contradição” - resolução parcial ou imaginária -,

e tendo ele por “função tratar e resolver algumas grandes contradições com as

quais se defronta permanentemente o pensamento humano” 137, o simbolismo

alquímico está em condições, pela sua dualidade fundamental, arquetípica, de fornecer

um mito para resolver as contradições básicas da humanidade: vida/morte,

saúde/doença, abundância/privação, conhecimento/ignorância, etc. Como é que é

tentada essa superação da contradição? Através da introdução progressiva de

mediadores que, no caso da alquimia são os conceitos alquímicos de Enxofre e

Mercúrio, de fixo e volátil, etc.

135 Lucien Scubla, Lire Lévi-Strauss, Paris, Éditions Odile Jacob, 1998, p. 69.
136 Claude Lévi-Strauss, Anthropologie structurale, Paris, Plon, 1958, p. 254.
137 Lucien Scubla, op. cit., pp. 30, 32-34 e 38.

94
Continuemos à abordagem estrutural do simbólico em alquimia, a qual é muito

importante para entender melhor como é feita, no seu seio, a articulação entre o “dois” e

o “três”, base do simbolismo alquímico. A teoria do simbólico, em Antropologia, foi

desenvolvida de um modo muito importante por Lévi-Strauss (e isto, sem excluir as

contribuições importantes de um Durkheim, de um Mauss, ou de nomes como E. Leach,

Mary Douglas e Vitor Turner). Lucien Scubla – num importante livro onde deu conta,

recentemente (2), da história e da reflexão em torno da levi-strussiana “fórmula

canónica do mito” -, constatou que, como dissemos, para o autor de La Pensée Sauvage,

un mythe est un opérateur logique pour résoudre une contradiction, resolução que é

feita através de mediações (simbólicas) sucessivas, do par contraditório inicial (ex. a

vida e a morte, a natureza e a cultura, o masculino e o feminino, etc., etc.). Logo,

verificam-se introduções de um ou mais, mediadores simbólicos, A’, A’’, B’, B’’, etc.,

no seio dessa contradição de partida, entre A e B:

A » A’ » A’’ » …….. « B’’ « B’ « B

É claro que o ternarismo de Lévi-Strauss não se revela apenas na sua célebre

“fórmula canónica do mito” (cujo estudo não tem aqui lugar) - quaternária na sua

essência mas com uma assimetria que conduz ao ternário -, mas antes tem, desde logo,

uma expressão assumida no seu “triângulo culinário”, obtido a partir de uma dupla

binaridade. O antropólogo inglês Edmund Leach, no seu livro sobre Lévi-Strauss, expõe

claramente em evidência esta estrutura. (com origem na Linguística de Jakobson), que o

antropólogo francês desenvolve nos volumes de Mythologiques, em particular no Le

Crut et le Cuit:

95
Cultura «-------------------» Natureza

Normal Cru

Cozido Podre

Transformado

Vemos assim, como no quadro de uma dupla oposição - cultura-natureza e

normal-transformado -, se organiza uma estrutura ternária. É o que acontece em

Alquimia. Como afirma Leach, «a tese estruturalista é que triângulos deste género,

subentendo transformações comparáveis de modelos da Natureza, tal como são

apreendidos pelos cérebros humanos, têm uma aplicação muito geral…» (op. cit. p. 26),

«(existindo) princípios universais subjacentes à estrutura do triângulo culinário» (ibid.,

p. 36).

Naturalmente que isto tem uma enorme importância no quadro de uma

Antropologia fundamental ou teórica, tão desejada (talvez utopicamente) nos anos 60 e

70 - e anunciada, na sua vertente formalista138, por livros como Anthropologie

Structurale (Lévi-Strauss, 1958), La Pensée sauvage (Lévi-Strauss, 1962),

Mythologiques (Lévi-Strauss, 1964, 1966, 1968 e 1971), Lévi-Stauss (E. Leach, 1970),

Anthropologie et calcul (P. Maranda e outros, 1971), Structural models in folklore (P. e

E. Maranda, 1971), Structuralisme en Anthropologie (Dan Sperber, 1973), Pour une

Anthropologie fondamentale (E. Morin, H. Atlan, J.-P. Changeux, L. de Heusch, A.

138 E também, noutro registo, pelo autor de Steps to an accology of mind, Gregory Bateson

96
Moles, etc., 1974), entre outros -, e que retomou novo alento a partir dos anos 80, com

os trabalhos de Hage e Harary (Structural models in Anthropology, 1983) e com os do

matemático Jean Petitot (e discípulo do criador da teoria das catástrofes, René Thom),

dos quais sobressai o importantíssimo artigo “Approche morphodynamique de la

formule canonique du mythe” (in L’Homme, 106-107, 1988), e a consequente “Note

complémentaire sur l’approche morphodynamique de la formule canonique du mythe”

(in L’Homme, 135, 1995). Recentemente surgiram dois importantes livros sobre este

tema: em 1994, Anthropologie du mythe de Richard Pottier, mais centrado numa

perspectiva semio-linguista, e em 1998, o precioso Lire Lévi-Strauss de Lucien Scuba,

que faz o balanço e a evolução histórica da modelização da imaginação mítica, pondo

um assento tónico na vertente matemática (acessível a todos, diga-se), sem esquecer a

semio-linguística.

Gilbert Durand, apesar da sua posição crítica face ao estruturalismo lévi-

straussiano, em particular face ao seu ”agnosticismo” mas também e sobretudo face às

hermeneuticas que ele classifica de “redutoras” e que resultam duma perspectiva assente

na sua lógica binária (a qual é, apesar de tudo, uma parte apenas, ou mesmo o ponto de

partida, da sua teoria), não deixa de pôr em evidência o aspecto extremamente positivo

da posição intelectual de Lévi-Strauss, de recuperação da dignidade de um pensamento

que alguns (Lévy-Bruhl, p.e.) denominavam de “pré-lógico”, “primitivo”: “(…) o

famoso livro de Claude Lévi-Strauss em 1962, La Pensée Sauvage, significa, ao

contrário de todo o eurocentrismo, que os homens sempre Pensaram assim tão bem e

que em todo o homem subsiste um património selvagem infinitamente respeitável e

precioso” (5).

97
Discipulo de Gaston Bachelard – o qual nos seus estudos sobre o imaginário

adopta jà o binarismo dos dois regimes, nocturno e diurno – e influenciado pelas ideias

metafísicas de Jung sobre os arquétipos do ”inconsciente colectivo” (mas não seguindo

o seu quaternarismo, que no fundo não passa de um duplo binarismo) –, Gilbert Durand

procede como o seu Mestre a uma recuperação corajosa de certas correntes esotéricas

(p.e., a Gnose, o Hermetismo e a Alquimia). O autor da L’Imagination symbolique

(1964) e das Structures Anthropologiques de l’Imaginaire (1969), e promotor do Novo

Espírito Antropológico – que não tem a ver com a Antropologia etnológica, entenda-se,

já que situa no domínio de um idealismo filosófico – “inscreve-se”, como nos diz

Patrick Géay (6), « numa óptica pós-racionalista e neo-espiritualista largamente

inspirada pela psicanálise jungiana» que o conduz a admitir, como o psicólogo de

Zurich, que o imaginário humano é uma produção humana e não uma teofania – como

defende Mircea Eliade. Com efeito, como escreve P. Géay, se para Durand – na linha de

G. Bachelard – “o símbolo nunca é um signo arbitrariamente escolhido, mas é sempre

intrinsecamente motivado», (ele) vê contudo neste, na senda de Jung, um esquema

organizador e funcional que « modela inconscientemente o pensamento». Esta

aproximação, semelhante à de Bachelard, coloca pois «a imaginação humana como

sede central dos arquétipos fundamentais que dinamizam a consciência”, representando

o arquétipo para ele “a verdadeira matriz das ideias, enquanto que ligação entre o

imaginário e a razão” (7).

Como escreve Antoine Faivre, Durand “vai mais longe” que Jung e Bachelard,

“ao colocar o Imaginário – e o Mítico – como elemento primeiro, irredutível,

susceptível de dar conta das diversas formas de actividade do nosso espírito, sendo a

racional apenas uma dentre outras”(8). Como nos diz G. Durand, « é o imaginário que é

98
o primeiro, e a racionalidade é apenas uma sua modalidade» (9). Com efeito, como

Françoise Bonardel afirma, para o creador da Antropologia do Imaginário – “a ciência

da compreensão dinâmica das estruturas explicativas” (10) -, a racionalidade é apenas

“a modalidade diurna (…), que governa o regime da antítese e do terceiro excluído”, os

regimes nocturno sintético e nocturno místico “respondendo, por oposição e

integração ao racionalismo diurno, dominando a cultura ocidental dos últimos séculos”,

mas sendo o regime nocturno sintético, “o mais hermetista, pois encontramo-lo em

funcionamento em todas as formas de coïncidentia oppositorum: símbolos, mitos,

obras de arte …”(11) e naturalmente, no Hermetismo e no hermesismo,

respectivamente, formas da Tradição esotérica e da sua recriação no mundo actual.

Nós voltaremos a este mediador “regime nocturno sintético”, mas por agora é o

Momento de nos perguntarmos se a diferença de fundo entre o estruturalismo de Lévi-

Strauss e o de Gilbert Durand – figuratif, segundo a denominação do seu discípulo o

sociólogo Patrick Tacussel – não residirá no facto de, para o autor da Imagination

symbolique, “a lógica do pensamento mítico é uma lógica do terceiro incluído, uma

lógica ternária, uma lógica mediadora que liga a luz e a sombra, a racionalidade e

irracionalidade, o consciente e o inconsciente, ao contrário da racionalidade separativa e

exclusiva dominante no estruturalismo de Lévi-Strauss” (que, apesar disto, procedeu à

recuperação do pensamento selvagem) . Para esta doutrina, o pensamento mítico tem

uma lógica “racional” interna – embora, face à ciência e ao senso comum moderno, ela

não tenha um fundamento empírico (12).

Este Novo Espírito Antropológico – que não é “etnológico”, mas sim “literário”

e “psicológico” -, esta hermenêutica instaurativa de Gilbert Durand, tem uma tipologia

baseada na classificação isotópica das imagens : três estruturas, uma heroica, ou

99
diairrética, associada ao regime diurno, e as outras duas associadas ao regime

nocturno: a estrutura sintética, intermediária, mediadora, fazendo a ponte entre a

primeira (heróica) e a seguinte, a estrutura mística que se pode resumir no seguinte

quadro:

Quadro dos regimes e das estruturas do imaginário

Regimes Diurno Nocturno


Estruturas Heróica Sintética | Mística

Vemos que esta classificação das estruturas do imaginário – ternária, embora

partindo da binaridade de regimes - é claramente assimétrica pois duas delas incluem-se

no regime nocturno, cabendo a outra no regime diurno. Além disso, ela põe em

evidência que o pensamento racional, cartesiano e aristotélico é apenas uma parte do

pensamento humano, a sua parte diurna, mas que existem outras formas de

“pensamento”, as nocturnas, quer sintéticas, quer místicas. Dentre estas, o «regime

nocturno sintético» é o mais “hermetista” ou melhor “hermesiano”, pois “ele encontra-

se em operação em todas as formas da coincidentia oppositorum: símbolos, mitos, obras

de arte” (F. Bonardel, op. cit.,p. 119) , constituindo não uma actividade irracional mas

uma hermetica ratio, uma racionalidade das mediações.

Como vimos, Claude Lévi-Strauss utilizou um artifício nas suas fórmulas –

quaternárias - para assegurar a mediação: na clássica, a mediação é assegurada pelo

termo b, enquanto que na “transformada” a função y é que assegura a mediação. No seu

100
quadro – na sua “figuração” esquemática - da “classificação isotópica”, Gilbert Durand

opta por uma distribuição assimétrica de três estruturas por dois regimes.

Um seguidor de Gilbert Durand, Joel Thomas, propôs recentemente um esquema

sistémico da “estrutura do imaginário humano”. Trata-se, como escreve o seu autor, de

um sistema em que “cada instância é duplamente polarizada «positivamente» e

«negativamente», numa ambivalência que a faz tender para a sua regeneração ou para a

sua morte; como as duas instâncias são elas próprias colocadas em «tensão»

organizadora através de um nexo relacional (a terceira instância)”, chegando a “uma

estrutura dinâmica com cinco termos, composta por quatro polos (a estrutura

quadripolar cara a Jung) e por um nexo relacional servindo de interface” (in

Introduction aux Méthodologies de l’Imaginaire, 1998, p. 161):

A+ (vida) B+ (vida)

A «------- Tensão ------» B

A- (morte) B- (morte)

Poderemos pôr em correspondência esta estrutura de J. Thomas com o quadro

classificativo de G. Durand, substituindo A e B, respectivamente pelos regimes diurno

e nocturno, respectivamente, e considerando que a “vida” e a “morte”, são homólogos

de claridade e escuridão, de luz e trevas, etc. Nestes termos, teremos D+ = estrutura

heróica, N+ = estrutura sintética e N- = estrutura mística.

Como se vê, não encontramos no quadro classificativo de Durand o polo D- (que

equivaleria ao “dia escuro”), o que vem confirmar o carácter assumidamente assimétrico

101
da teoria de Durand das estruturas antropológicas do imaginário. Considerando mais

atentamente o esquema de Thomas, podemos ver que a “tensão” entre as duas instâncias

A e B pode assumir dois aspectos: o da oposição contraditória (“estéril”), quando os

pares diagonais são exclusivos, “puros” – e que contempla uma lógica diurna da não

contradição – e o da mediação (“criativa”), quando os pares diagonais são inclusivos,

“impuros” – e que contempla a lógica nocturna (mística) da contradição.

Tentando agora aplicar o “triângulo culinário” de Lévi-Strauss à classificação

isotópica das imagens de Durand, podemos obter as três estruturas (em triângulo)

através da dupla polarização diurno – nocturno:

Diurno « Regimes » Nocturno

Diurno Heróica

Regime

Nocturno Sintética Mística

Estruturas

Para se perceber melhor este problema apliquemos o mesmo triângulo à dupla

polarização – homóloga desta - claro-escuro e dia-noite (vide Quadro). Vê-se assim que

o quadro de Gilbert Durand assenta numa polarização exclusiva da noite – do regime

nocturno – na claridade e na escuridão. Não existe, nesta classificação, o crepúsculo –

só possível através da polarização do dia. Em termos dinâmicos teremos, em Gilbert

Durand, a sequência: noite (estrutura mística) – aurora (estrutura sintética) – dia

(estrutura heróica). E, neste sentido, esta classificação durandiana é claramente

102
influenciada pelo desenvolvimento clássico das três fases da Obra Alquímica ocidental

que tanto interessaram o seu mestre Jung: a Obra ao negro (nigredo), a Obra ao branco

(albedo), a Obra ao rubro (rubedo).

Paralelamente, se pusermos em correspondência o esquema de J. Thomas com o

Quaternário taoista, constituído pelos diagramas chineses(18) “yin – yin” (velho yin,

Inverno), “yin – yang” (jóvem yin, Outono), “yang – yin” (jóvem yang, Primavera),

“yang-yang” (velho yang, Verão), podemos ver (tableau C) – que a “tensão” entre as

duas instâncias A e B pode assumir dois aspectos:

- o da oposição contraditória (“estéril”), quando os pares horizontais são

exclusivos, “puros” – o que tem a ver com uma lógica “diurna” da não-

contradição;

- o da mediação - “criativa”, quando os pares diagonais são inclusivos,

“impuros” – o que terá a ver com uma lógica “nocturna”, “sintética”, da

contradição.

As denominações “estéril” e “criativa” foram tiradas do livro de Isabelle Robinet

sobre o taoismo alquímico: “…este Dois não pode subsistir, pois nem o Yin nem o Yang

podem permanecer isolados e puros, repetem sem descanso os alquimistas, sob pena de

tornarem-se estéreis. Eles cruzam-se pois, e unem-se para dar origem (nascimento) a

dois compostos (…) cada um contendo (…) a marca significativa do outro” (19).

De estes dois quadros – B e C – podemos retirar conclusões importantes para o

nosso propósito, a saber que:

1 – os pares “impuros” são os que permitem a mediação;

103
2 - a mediação é fonte de criatividade, pois, ao contrário, os pares “puros” são

“estéreis”.

Como podemos ver muito claramente, não encontramos no quadro classificativo

de Durand, o polo D – (o “dia escuro”), o que confirma o carácter nitidamente

assimétrico da sua teoria, para quem a única polarização admissível é a da noite (a

“noite clara” e a “noite escura”), sendo o dia incapaz desta plasticidade: não existe

« crepúsculo » nesta concepção do imaginário. Em termos dinâmicos ter-se-á, em

Gilbert Durand esta sequência:

Noite (estr. mística) - - » Aurora (estr. sintética) - - » Dia (estr. heroïca)

Ora, cesta progressão aparece-nos em correspondência com o desenvolvimento

da Grande Obra alquímica, em três fases:

Obra ao Negro(nigredo) --» Obra ao Branco (albedo) --» Obra ao Rubro

(rubedo)

Se pudermos admitir um arquétipo para a alquimia, ele será sem dúvida o da

criação, da geração e do (re)nascimento da vida (após a « morte »); um dos mais

importantes tratados da alquimia ocidental tem por título significativo La lumière

sortant par soi-même des ténèbres (A luz saindo por si própria das trevas). Então não

há lugar, na teoria optimista de Durand, para a morte, para o “crepúsculo” – ele que,

como resistente, lutou contra o crepúsculo nazi da humanidade… e, como cientista,

contra o « crepúsculo (materialista) dos deuses ». No fundo, embora dando lugar à

104
dimensão nocturna do espírito humano e ao seu carácter contraditório (tão presente no

hermetismo e na alquimia que tanto o interessam), Durand afirma o triunfo da Luz sobre

as trevas, da razão sobre a irracionalidade. Mas isto numa perspectiva contrária a um

certo maniqueismo, num universo onde o racismo cultural está ausente e onde a luz

convive com as trevas, a lógica binária com outras lógicas (a ternária, em particular) e a

razão com esta antiga « louca da casa », o imaginário.

O processo alquímico é pois um processo simbólico sacrificial, expresso e

praticado no laboratório – e no imaginário do alquimista – por um rito sacrificial

de raíz xamânica.

Esse rito sacrificial é efectuado no forno alquímico, ou Atanor, ou no matraz em

vidro, que têm ambos, saliente-se, uma forma análoga (embora mais o segundo do que o

primeiro) ao útero. Uma vez mais a analogia com a sexualidade e a fecundação dela

decorrente, já que a Obra alquímica é por vezes descrita em termos de Casamento das

duas naturezas, das suas Bodas – As Bodas Químicas (ou alquímicas) de Christian

Rosencreutz (Cristão Rosa Cruz), é o título de um dos Manifestos da Rosa-Cruz do

começo do século XVII, atribuído a João Valentim Andrea. Quer no forno, quer no

matraz (ou balão) – consoante se siga a “via seca”, onde os metais e minerais, são

fundidos no formo, ou a “via húmida”, com minerais, metais ou plantas, nos balões ou

matrazes – as matérias são previamente trituradas, misturadas e, depois, são fundidas no

forno ou dissolvidas no matraz.

A “matéria primeira”, escolhida pelo alquimista no que já constitui uma

demanda, mixto de técnica, de arte e de inspiração, pode ser mineral, metálica ou,

menos frequentemente, vegetal - já que o trabalho vegetal se situa mais no campo da


105
Espagíria. Assim, consoante os grupos temos, ao longo dos tempos (e até hoje) os que

trabalham com a estibina (sulfureto de antimónio), ou com o cinábrio (sulfureto de

mercúrio), ou com os sulfatos de ferro, ou com o ouro e a prata (partem do ouro para

atingir o “Ouro dos filósofos”...). A estas matérias juntam-se sais que, entre outras

coisas, ajudam a fusão.

Da “matéria primeira” escolhida pelo alquimista, extrai-se – através de um

conjunto laborioso de operações que os alquimistas mantêm secretas e que denominam

de “reincrudação” - a “matéria prima”, também denominada a “raíz dos metais”, o

“húmido radical”, o “mercúrio” (que nada tem a ver com o Mercúrio princípio, nem

com o mercúrio comum, metálico), que está presente em todos os metais (em uns, mais

do que noutros) e que é preciso “cozer”, “assar”, fermentar”, através de não menos

laboriosas operações que os alquimistas mantêm ainda mais secretas. Para os

alquimistas de sempre, os metais são a essência dos minerais e contêm a “chispa

divina”, a semente do espírito”, que tem uma clara origem gnóstico-hermética, como

vimos anteriormente.

Esta teoria e estes conceitos, que figuram nos antigos o modernos tratados, são

os mesmos que os alquimistas dos grupos contemporâneos utilizam e com os quais

descrevem as sua operações – conforme pude comprovar neste estudo. Por exemplo, o

alquimista contemporâneo Rubellus Petrinus – que acompanhei durante algum tempo

no quadro da Filiação Solazaref e de outras incursões a outros grupos alquímicos que

adiante referirei -, cita o clássico Filaleto, numa passagem, mixto de técnica alquímica e

de simbolismo e poesia, do seu tratado A Entrada Aberta ao Palácio Fechado do Rei:

106
A substância que tomamos primeiro é um mineral familiar ao mercúrio que coze

na terra um um enxofre cru; vil à vista mas glorioso internamente, o filho de Saturno,

que mais necessitas? Concebe-o correctamente pois é a nossa primeira porta.139

A dimensão simbólica e poética dos textos alquímicos, faz com que ela se

coloque definitivamente longe do universo da química – quer conceptualmente, quer

operacionalmente -, embora lide com os corpos químicos. Pode o alquimista estar a

lidar com materiais comuns, a estibina, o cinábrio, etc., mas ele não os descreve e sente

como tais, pois eles são em algum momento da Obra, o “dragão venenoso”, a serpente”,

o “lobo”, o “leão”, a “águia”, as “pombas (de Diana)”. Mais alguns exemplos – agora

tirados de um Tratado português do começo do século XVIII, um dos mais importantes

tratados da alquimia europeia e revelando um conhecimento profundo e actualizado do

seu corpus, tratado da autoria de Anselmo Caetano de Abreu Gusmão e Castelo Branco,

médico formado em Coimbra e natural de Soure140 –, exemplos desse riquíssimo

imaginário simbólico da Alquimia, ao mesmo tempo escondendo os segredos da Arte e

gerador de experiências interiores:

Do casamento hermético do Leão e da Águia. (...). Toma a Virgem com asas,

lavada, limpa e prenhada, da Seminal e espiritual matéria do primeiro contacto

masculino, ficando ilesa a glória da sua virgindade, com as faces tintas de roxo;

ajuntai-a com o segundo sujeito masculino, sem suspeita, nem perigo de adultério; e

por fim parirá um venerável fruto de ambos os sexos, do qual sairá uma imortal

prosápia de poderosíssimos Reis. (...) Ajuntai pois a Águia com o Leão, e escondei-os

139Citado por Rubellus Petriunus, in A Grande Obra Alquímica de Ireneu Filaleto, Nicolau Flamel e
Basílio Valentm, Lisboa, Hugin, 1997, p. 26.

107
no seu cláustro diáfano, com a porta bem tapada, para que não saia por ela a sua

respiração, ou lhe entre o ar estranho. A Águia acometendo o Leão, o despedaçará de

comerá. E logo adormecerá com um profundo e dilatado sono, inchando-lhe tanto o

estômago que feita hidrópica, se converterá com admirável metamorfose em um Corvo

muito negro, este perdendo paulatinamente as penas, principiará a voar e com o seu

voo remontará tanto que sacudirá sobre si mesmo água das nuvens, até que, ficando

molhada, dispa de boa vontade as asas e descendo por falta delas, se convertam num

branquíssimo cisne 141.

Como se depreende deste texto alquímico português - exemplar pelo

conhecimento que revela da tratadística alquímica europeia e por se situar em pleno na

sua tradição, fazendo a síntese do grande corpus alquímico até aos começos do século

XVIII, razão pela qual o escolhemos -, a Alquimia é indispensável da sua dimensão

simbólica, mesmo que esta veicule uma técnica. Para alguns alquimistas esta dimensão

do imaginário simbólico é, também e sobretudo, ela própria transformadora,

transmutadora da psique e do espírito do alquimista. Para outros, essa linguagem

simbólica é sobretudo um meio de esconder os segredos da Arte. Disto trataremos

quando referirmos os grupos estudados.

Umberto Eco, na sua obra Os Limites da interpretação142 refere a ambiguidade

constitutiva da Alquimia, centrada em dois polos, a alquimia prático-operativa e a

alquimia simbólica, assentando a primeira na busca da transmutação metálica –

140 ENNOEA, ou Aplicação do Entendimento da Pedra Filosofal, Lisboa Ocidental, 1733, reeditado em
1987, pela Fundação Gulbenkian com introdução de IvetteK. Centeno e também numa edição de MM,
Mafra, com prefácio de Manuel J, Gandra.
141 Op. cit., pp. 39 e 40 da Parte Segunda da edição original.
142 Unberto Eco, Os limites da interpretação, Lisboa, Difel, 1992 (trad. do original I limiti
dell’interpretacioni, 1990), p. 79 e seguintes – O Discurso alquímico e o segredo diferido.

108
procura realmente produzir ouro, e representou um modo, embora ingénuo e pré-

científico, de interrogar a natureza, de vê-la como coisa viva e lugar de possíveis

transformações, escreve Eco143 - enquanto que a segunda, segundo ele, se move a nível

puramente metafórico, representando uma das manifestações da gnose hermética144.

Este filão simbólico seria místico, esotérico e hermético e não teria nenhum valor

científico145 e encerraria apenas fantasias de regeneração e transformação

espiritual146.

Embora Eco produza, neste trabalho algumas considerações judiciosas sobre a

alquimia (ele que domina criticamente e amplamente o universo do esoterismo), não o

poderemos seguir no que diz respeito à distinção radical entre as duas alquimias, pois a

sua nomenclatura leva a pensar que a alquimia operativa está isenta de símbolos e a

simbólica isenta de operatividade – o que desmentido por muito tratados alquímicos,

como o exemplar ENNOEA. Também não poderemos acompanhar Eco no que concerne

à simbólica alquímica, a qual, como veremos, não é totalmente polissémica, nem

completamente aleatória como Eco parece sugerir.

Apesar de este autor salientar – muito acertadamente, ele que, no entanto, não é

um especialista da Alquimia, embora profundo conhecedor do espoterismo ocidental –

que o momento operativo e o momento simbólico andaram sempre a par e passo, ele

quer, no entanto, dizer apenas com isso que eles coexistiram historicamente, não

admitindo Eco que esses dois “momentos” estivessem presentes, ao longo da história da

143 Op. cit., p. 80.


144 Ibidem
145 Ibidem
146 Ibidem. No entanto, é por este discurso alquímico – discurso elaborado pelos cultores da alquimia
simbólica, um discurso ao quadrado, pois é um discurso da alquimia sobre os discursos dos alquimistas

109
Arte de Hermes, num mesmo alquimista, a não ser, como ele refere, excepcionalmente,

no caso de muitos alquimistas simbólicos contemporâneos, como o misterioso e

celebrado Fulcanelli, os quais prosseguiram práticas operativas147. De facto –

contrariamente ao que muitos alquimistas contemporâneos afirmam, tentando extrapolar

rectroactivamente a sua visão iniciática da alquimia -, concedemos que é difícil

sustentar que todos os autores alquímicos de antanho tenham visado uma prática

mística, esotérica, gnóstico-hermética, de transformação espiritual. Isso é sobretudo

claro numa certa alquimia do século XVII e XVIII, que, segundo Betty Dobbs, estava

até aí assente em especulações místicas (…) muito fortemente orientadas para a

especulação interior, e que passa a receber uma influência calmante do racionalismo e

da nova filosofia mecanista148. No entanto, estes dois momentos propostos por B.

Dobbs, não são mutuamente exclusivos: a alquimia racionalizada dos séculos XVII e

XVIII apresenta ainda algumas características místicas, como é o caso de muitos

tratados alquímicos - como é o caso do ENNOEA do nosso Castelo Branco -, onde

estão presentes, como veremos, quer um discurso racional quer um simbolismo onírico.

É por vezes referida, como uma indicação do carácter iniciático – de

transformação pessoal - de um determinado livro alquímico, a advertência que é feita

pelo adepto relativa às condições espirituais prévias à Obra. O que acontece é que essas

indicações podem constituir , por parte do alquimista, apenas sinais de temência a Deus,

do qual depende o êxito da Obra e, por outro lado, conselhos de preserverança e de

paciência, essenciais a um trabalho tão longo, não constituindo por si sós, provas do

carácter vincadamente místico da obra – o que não quer dizer que esse carácter esteja

- que Umberto Eco se interessa, para dissertar sobre a semiose hermética desse discurso polissémico de
sinonimia total, do remoinho metalinguistico sobre o qual assenta o discurso alquímico.
147 op. cit., p. 81
148 Betty Dobbs, Les Fondements de l’alchimie de Newton, Paris, Trédaniel, 1981, p. 87

110
necessariamente ausente. O caso do ENNOEA parece não constituir excepção, mesmo

quando o autor refere a necessidade da solidão – que também é escola, pois os

divertimentos solitários são estudos - eventualmente encontrada nos bosques (próximos

da sua Soure natal), onde se acha Deus149 .

De facto, na Parte Segunda desta exemplar obra, diz o autor que só aos Adeptos,

que são, e forem, perfeitos, e justos concederá Deus esta grande ciência; porque a

sabedoria não entra no entendimento dos homens maus, nem preservera no corpo dos

pecadores150. Por isso mesmo, Deus remunera esses homens – sejam eles cristãos, ou

não, como o gentio Hermes, o mouro Geber e o hereje Paracelso151 - com as

utilidades da Crisopeia, e outros bens temporais, para satisfazer os seus merecimentos,

pois se eles não tiveram estas virtudes, não os remuneraria Deus com estes prémios152.

Anselmo Caetano continua a enumerar, pela voz de Enodato – que dialoga

“hermeticamente” com Enódio – as outras qualidades do Filósofo Hermético, o qual,

segundo ele, Há-de ser homem de claro entendimento, profundo juízo, subtil discurso,

grande compreensão, e bom engenho; e porque isto só não basta, deve ser também

perito na língua latina, consumado na Filosofia, inteligente na Matemática, e versado

na lição dos livros Químicos, para que o estudo aperfeiçoe o entendimento, e o

entendimento ilustrado alcance grandes segredos com a subtileza do juízo, e os reduza

à prática com o bom engenho. Além de todas estas qualidades há de ter indústria,

constância riqueza, prudência, sossego, paciência e segredo porque (…) em nenhuma

149 Anselmo Caetano Munhoz de Abreu Gusmão e Castelo Branco, ENNOEA ou Aplicação do
Entendimento sobre a Pedra Filosofal,seguida de outras obras, Nota preambular de Manuel J. Gandra,
Mafra, 1987, Segunda parte, Diálogo segundo, cap. Únic. # 2, p. 29
150 opp. Cit., p. 9
151 ibid.; a actualização da ortografia é nossa (mantivemos a pontuação).
152 ibid. (idem)

111
coisa devem os Adeptos ser mais acautelados, do que em ocultarem os segredos com

que obram153.

E mesmo na justificação do segredo alquímico, nunca Anselmo Caetano evoca

razões iniciáticas ou místicas – tais como as que são explicitadas hoje pelos cultores da

moderna alquimia operativa, mesmo que operativamente tradicional – antes enumera

razões que têm a ver com a dificuldade das operações - a razão deste misterioso

segredo é, porque as operações da Arte Magna são muito dificultosas, e não podem os

homens explicar-se com palavras, quando as coisas são muito difíceis154 - e outras que

têm a ver com questões de preservação do segredo por motivo de segurança de todos –

para que ficando estas operações duvidosas, não sejam inquiridas, nem averiguadas

por homens ignorantes, e malignos, que executem com elas grandes maldades (…) para

que os Herméticos inventores, e descobridores deste segredo não ficassem obrigados a

satisfazer os danos, que causariam ao Mundo todos aqueles Tiranos, e Poderosos, que

abusassem de tão ambiciosa potência, e tirania155. Daí, ainda, a necessidade (devido à

natureza dificultosa do assunto e devido à conveniência de protecção da Obra) de uma

linguagem críptica, de natureza simbólica: se os Adeptos não a descrevessem com

enigmas, e metáforas, e sonhos, e fábulas, poderia ser conhecida a matéria da

Crisopeia, e preparada a Pedra Filosofal pelos rústicos, e ignorantes156. Note-se que

aqui, Anselmo Caetano invoca uma razão utilitária (e não iniciática) para a utilização do

simbolismo: o afastamento dos (perigosos) ignorantes. No entanto, ele refere ainda uma

razão última para a manutenção do segredo – mesmo para os que têm condições para

encetar a Obra – e que consiste na exigência do esforço individual nesta via operativa.

153 op. cit., p. 10


154 Anselmo Caetano…, op. cit., p. 12
155 op. cit., p. 13

112
Mas para aqueles que, hoje, verão facilmente aqui uma indicação de tipo iniciático, o

autor de ENNOEA menciona com singeleza a necessidade de que o Adepto tenha em

grande apreço a sua Obra: Bem sabeis, que vos não posso revelar a matéria da Pedra

Filosofal, senão em segredo; e para o segurar mais, quero que vos custe algum

trabalho, porque os homens não estimam senão aquilo, que pelo seu trabalho

adquiram157.

Interessante é, sem dúvida, a referência ao tradicional preceito de Imitação da

Natureza. Diz Anselmo Caetano: (…) a Arte Magna para fazer a Crisopeia deve imitar

nas suas operações a Natureza158. Uns verão, nesta asserção uma indicação de cariz

iniciático, uma via de comunhão com a Natureza, certamente inscrita na tradição

alquímica, que tem um forte registo de transformação dessa mesma Natureza – longe

portanto de uma atitude passiva e submissa. Mas não será legítimo ver nela apenas uma

estratégia operativa eficaz para levar a bom terno a Obra Grande? Cremos que sim.

Para terminar esta breve introdução ao carácter iniciático (ou ao carácter não

iniciático) da Alquimia – via o ENNOEA -, referiremos uma passagem que, para um

psicanalista como Bachelard terá uma conotação evidentemente sexual, mas que para

alguns jungianos constituirá prova bastante da individuação alquímica, em busca do

andrógino filosofal, assim como, para um cultor da chamada alquimia interna, será uma

clara revelação do “arcano das substâncias” (isto é, as matérias segregadas pelo

organismo humano, as quais são utilizadas nesse tipo de alquimia): na geração dos

Metais, o Enxofre é como a matéria seminal paterna, e o Mercúrio é como a matéria

156 op. cit., p. 16


157 op. cit., p. 17
158 op. cit., p. 15

113
com que concorre o sexo feminino para a geração do feto, as quais ambas juntas

formam no útero um só, e perfeito corpo. E daqui se segue que esta matéria é uma só

coisa159. Mas não constituirá apenas esta descrição uma alegoria biológica da união

alquímica dos dois princípios, enxofre e mercúrio?

Interessa agora ver que tipo de discurso realiza Anselmo Caetano, ao tratar Da

matéria com que os Herméticos fazem a Pedra Filosofal (ou a matéria com que os

Herméticos formam o Lapis, para … fazer a Crisopeia). Será (na hipótese

simplicissima160 de H. Eco) um discurso do tipo operativo, ou será um discurso do tipo

simbólico – por enigmas, e metáforas, sonhos, e fábulas, como diz Enodato,

questionado por Enódio? No que diz respeito à discussão da verdadeira matéria de que

o Lapis se forma – a primeira coisa que deveis conhecer, e averiguar, diz Enodato -, o

autor de ENNOEA utiliza uma argumentação de uma racionalidade transparente,

naturalmente no quadro das concepções alquímicas da época.

Na discusão da matéria com que os Herméticos fazem a Pedra Filosofal,

Anselmo Caetano – revelando um notável conhecimento das vias e dos materiais

alquímicos, citando autores como Geber/Al-Djabir, Filaleto, Raimundo Lúlio, Alberto

Magno, Bernardo o Trevisano, Basílio Valentim e Becher - começa por rejeitar os

vegetais – como o spiritus vinii lulliani, o vinho vermelho, ou branco de (pseudo)

Raimundo Lúlio - e os animais – como o espírito de urina -, pois como diz Enodato,

ainda que estes menstruos têm o seu uso na Química, na Alquimia eles não têm nenhum

préstimo, pois são incapazes de dissolver radicalmente o Ouro, isto é, de reduzi-lo à

primeira matéria de que foi formado, separando os princípios do metal mais fixo e mais

159 op. cit-, p. 22

114
perfeito161. Refira-se que esta distinção entre Química e Alquimia, apenas subalterniza

a primeira face à segunda, mas não exclui o trabalho químico da Obra alquímica, já que

Anselmo Caetano aconselha mesmo, ao alquimista, o estudo prévio dos livros de

Química162, embora afirme que mais se aprendia nos bosques do que nos livros,

sobretudo naqueles livros onde se acha muita ignorância do homem163 - uma vez que

será preciso estudo, experiência e paciência(…) para ler tantos autores, a fim de

conseguir realizar com êxito esta Filosofia (…) sumamente dificultosa164.

Do mesmo modo e pelas mesmas razões, são rejeitados o Salitre e o Vitríolo,

ambos, segundo ele, totalmente imprórios e inúteis. Postos de lado os minerais, falta

considerar os metais. Primeiramente, são discutidos o Arsénico – no sentido literal, que

é rejeitado, já que no sentido enigmático, os Adeptos chamam Arsénico Filosófico à

Matéria da sua Pedra Filosofal165 - , o Antimónio – embora as Crisopeias de alguns

Herméticos são fabricadas com o Antimónio, ou Stibio166, Enodato afirma que de

nenhum modo podereis tirar dele a matéria da nossa Obra167 - os quais são também

rejeitados, pois Todas essas matérias, ou Minerais, são impróprios por serem sujeitos à

corrupção, introduzida nelas pela actividade do fogo168. Mas, por outro lado, também o

Ouro, e a Prata, que no seu centro é Ouro169, não são próprios para a Obra, pois o

160 H. Eco, op. cit., p. 80


161 op. cit., p. 18 e 19; Castelo Branco/Enodato rejaita assim a via de Weindelfeld, do spiritus vinii
lulliani, expressa em De Secreti Adeptorum (1685), que Enódio refere nos seguintes termos: Conforme o
que ensina Raimundo Lúlio em vários lugares das suas doutíssimas obras, escolheria o Vinho vermelho,
ou branco, para separar dele o espírito, que é uma quintaeesência, a qual animada com o Sal volátil de
tártaro, é um menstruo radicalmente dissolvente do Ouro (ibid.).
162 vide supra
163 op. cit., p. 29
164 op. ,cit., p. 32
165 op. cit., p. 21
166 op. cit., p. 7
167 op. cit., p. 21
168 ibid.
169 op. cit., p. 23

115
Ouro tem uma natural e fortíssima composição, e não sofre nenhuma calcinação, por

não ter Enxofre combustível, como têm os outros metais170. Ou seja, enquanto que uns

são rejeitados por serem demasiado vulneráveis ao fogo, o Ouro é rejeitado, pelo

contrário, pela sua invulnerabilidade ao fogo. A racionalidade, no quadro da Alquimia, é

perfeita.

Então, Anselmo Caetano continua uma discussão racional tendente a

demonstrar não só o que afirmou anteriormente, mas também para justificar outras

posteriroes escolhas para a matéria do Lapis. Diz ele pela boca de Enódio – que

primeiro tinha perguntado se esta matéria se tira de um só, ou de todos os metais171 -:

a matéria, que buscamos, é o cálido inato, e o húmido radical dos Metai s172, ou pela

boca de Enodato: a matéria do Lapis não se tira de toda a substância metálica, senão

da primeira matéria radical, que em todos os metais é igualmente a mesma173. Porquê?

Porque, quer o cálido inato, quer o húmido radical dos metais, são incorruptíveis e

resistem à maior actividade do fogo174. Trata-se de procurar obter a matéria radical

dos metais - tema central na teoria da Alquimia -, de os reduzir à sua primeira

matéria175 - núcleo imponderável aos olhos da moderna físico-química – para

conseguir que todos os metais imperfeitos se possam converter em outros176.

Conseguir-se-à isto, a partir de qualquer metal?

Enódio refere que Todos os Adeptos confessam que esta matéria se acha, ou se

tira de coisas vis, ou de pouca estimação, e Enodato confirma que temos muitos

170 op. cit., p. 23


171 op. cit., p. 22
172 op. cit., p. 22
173 op. cit., p. 23
174 op. cit., p.21
175 op. cit., p. 23
176 op. cit., p. 24

116
sujeitos de que tirar a Pedra Filosofal177. Então, para além dos já rejeitados, a matéria

vil – comparando-a com o valor, que depois adquire por benefício da Arte Magna178 -

também não se pode tirar do Chumbo e do Estanho , por serem Metais impurissimos, e

imundos na sua raiz, ou no princípio da sua criação; porque é tão impura a sua

essencial substância, sendo ambos destituídos de substância fixa, que permaneça

constantemente no fogo, sendo apenas dotados de substância volátil179. Ora, é esta

substânia fixa, a verdadeira Matéria da Obra.

Apesar de conterem imundices, Enodato/Castelo Branco aceita o Cobre, o Ferro

e o Mercúrio, pois deles se pode tirar mais facilmente a Matéria da Pedra Filosofal,

sobretudo no Mercúrio – como diz Geber sobre este assunto, o autor que Anselmo

Caetano mais cita, aqui e em outras partes do ENNOEA. A razão reside no facto de,

embora diversos na sua forma acidental, ou aparente, eles serem, na substância radical

(…) essencialmente o mesmo sujeito metálico180. Por esse motivo, aconselhado por

Enodato, Enódio afirma estar resolvido a trabalhar no Azougue, pedindo-lhe, agora, que

ele lhe ensine a preparar a Crisopeia181.

Enodato avisa logo que Nenhum Filósofo explica claramente ess preparação,

porque não é lícito falar nesta matéria com muita clareza182. Contudo ele menciona,

logo no começo da sua discussão, que é necessário efectuar sobre o Mercúrio, uma

separação no corpo do Mercúrio para dele tirar a matéria da Pedra Filosofal, uma vez

177 ibid.; o que dá aso a Anselmo Caetano, pela boca de Enodato, a fazer uma bem humorada dissertação
sobre as (más) qualidades dos Esvrivães, dos Requerentes, das Sogras, dos lisonjeiros,dos Fidalgos e de
outros muitos…
178 op. cit., p. 25
179 ibid.
180 op. cit., p. 26
181 op. cit., p. 27
182 ibid.

117
que o Azougue, ficou tão infeccionado pelo pecado original mineral, que se ocultam

nele duas imundices, uma de natureza terrestre e outra de natureza líquida. No entanto,

como essa lepra,que mancha o corpo do Mercúrio, não procede da sua raíz, nem se

identifica com a sua substância, (…) sñ acidentalmente se une com ele, e facilmente se

pode separar pela Arte183. Assim, separa-se a terra, por banho húmido, e pela

ensaboadura da Natureza, enquanto que a água se separa por meio de um banho seco e

calor benigno, de tal modo que, com três lavações e purgas se renova o Dragão,

despindo as escamas, e antigas conchas184. Parece estar aqui uma referência às

laveures de Nicolas Flamel185 , o que, eventualmente, apontaria para uma via com

Mercúrio e Antimónio186 (que seria animado pelo Mercúrio, através das Pombas de

Diana, ou Águias de Filaleto), “via de amálgamas” que é mencionada por Betty

Dobbs187, a propósito dos trabalhos alquímicos de Newton, e que um praticante

português revelou “caritativamente”188. Outra hipótese seria a Obra do Mercúrio e do

Sol, em que se utiliza Mercúrio e Ouro (ou Prata); há quem refira, também, uma “obra

só com Mercúrio”189.

No Diálogo Terceiro da Parte Segunda do ENNOEA, são referidos, ainda mais

enigmativamente, os arcanos relativos ao Mercúrio Filosófico e à sua preparação. Aqui

o “discurso” é, progressivamente, mais enigmático, mais hermético, e o emprego das

alegorias e dos símbolos passa a ser dominante, se não mesmo exclusivo. Estamos, pois,

183 ibid.
184 op. cit., p. 28
185 cf. Le Livre des Laveures, in Les Oeuvres de Nicolas Flamel, Paris, Pierre Belfond, 1973
186 Note-se que os antigos denominavam o nosso Antimónio metálico, de Régulo de Antimónio, sendo a
nossa Estibina (Sulfureto de Antimónio) denominada de Antimónio, ou Estíbio – que não era útil para a
Obra Grande (como afirma Anselmo Caetano), mas sim o Régulo….
187 Op. cit., Cap. V
188 Rubellus Petrinus, A Grande Obra Alquímica, Lisboa, Hugin, 1997, em particular a primeira parte.
189 Manuel Algora Corbi, La Tabla Redonda de los Alquimistas, Luís Caárcamo, Madrid, 1980, pp. 183-
195

118
aqui na senda do discurso simbólico de que nos fala H. Eco, mas que aqui coexiste, num

mesmo autor e numa mesma obra, contrariamente ao que ele afirma, aceitando apenas

excepções em alquimistas do século XX (quer aliás são objecto deste estudo).

Começemos pelos seguintes três enigmas alquímicos:

- … a matéria da nossa é o ninho onde nasce, e se cria a nossa Águia … é a

chave mestra, que abre as portas do Palácio encentado da Natureza190;

- Ainda que esta matéria não entra na Obra, serve de meio para alcançar, e

conhecer a matéria que nela entra. Esta é composta dos quatro

elementos191;

- Esta matéria tem corpo, alma, e espírito, porque é filha do espírito

universal192.

Não é agora, a ocasião de proceder a uma análise exaustiva da via operativa do

ENNOEA, pelo que apenas veremos, por alto, a estrutura da sua Obra Grande. Mas é

importante referir, antes disso a sua concepção de Espírito Universal - em consonância

total com a tradição alquímica -, o qual será uma substância puríssima, penetrantíssima,

(…) impalpável, invisível e imperceptível (…) que desce do Céu empíreo para os

mixtos,e que sobe do centro de terra, comunicando-lhe as suas virtudes, e embebendo-

os, se faz corporal, constituindo assim o Sal, que é a primeira matéria de todo o

composto. Na verdade, esse Espírito Universal - na verdade o Pai da Pedra Filosofal -

é idêntico (mas multiforme) em todos os mixtos, sendo a quinta essência da Natureza,

contendo os três princípios, que são a mesma substância radical: o enxofre, ou fogo

190 op. cit., p. 33; registe-se o que nos parece uma evidente alusão ao tratado de Filaleto, A Entrada
Aberta no Palácio Fechado do Rei – cf. L’Entrée Ouverte au Palais du Roi, Paris, Retz, 1976.
191 ibid.

119
natural, o mercúrio, ou húmido natural e o sal, ou seco radical , que liga os outros

dois. 193

Voltando ao Mercúrio Filosófico, Anselmo Caetano diz-nos que ele é a Matéria

do Lapis, depois do seu nascimento (isto é, quando o cálido e o húmido, estão unidos

perlo seco). Os sucessivos nomes que (ela, matéria, ou ele, mercúrio) vai tomar – o

Mercúrio, o Enxofre, etc. – são estados da matéria, que resultam dos graus de calor

que o Mercúrio teve na digestão – os quais serão “explicados” no parágrafo IV deste

Diálogo Terceiro do ENNOEA. Assim sendo, o Mercúrio e o Enxofre serão

qualidades diferentes, resultantes de diversos graus digestão de uma só matéria194.

Então, Quando pela força do fogo se destila a humidade radical, juntamente com ela se

destila o seu natural calor que tem cor de Ouro (…) o Ouro Filosófico – denominado

Enxofre, Alma, ou Ouro, porque a sua cor parece Ouro.

É agora a altura de mencionarmos um relato sumanente simbólico que, longe de

se referir apenas a experiências místico-esotéricas, parece referir-se também a

experiências bem tangíveis de natureza operativo-laboratorial. Trata-se do Casamento

hermético do Leão com a Águia, o qual introduz aquilo que vai ser discutido no

parágrafo seguinte. Vejamos as suas partes mais importantes (que satisfarão,

eventualmente, a imaginação de algum psicanalista, ou jungiano):

192 ibid.; Manuel Algora Corbi (op. cit.), refere as Vias do Espírito Universal, assentes (quase) apenas no
Antimónio, o que parece não ser o caso da via de Anselmo Caetano, centrada no Mercúrio, ou Azougue.
193 Op. cit., pp.34-36
194 op. cit., pp. 37-38

120
Tomai a Virgem com asas, lavada, limpa, e prenha da Seminal, e espiritual

matéria do primeiro contacto masculino, ficando ilesa a glória da sua

virgindade, com as faces tintas de roxo; ajuntai-a com o segundo sujeito

masculino sem suspeita, nem perigo de adultério; e por fim parirá um

venerável fruto de ambos os sexos, do qual sairá uma imortal prosápia de

poderosíssimos Reis (…) Nestes ajuntamentos de que faço menção, tudo é

puro, sem mancha de vício: não se perde a virgindade, nem se comete

adultério. Juntai pois a Águia com o Leão, e escondei-os no seu claustro

diáfano, com a porta muito bem tapada, para que não saia por ela a sua

respiração, ou lhe entre o ar estranho. A Águia acometendo o Leão, o

despedeçará e o comerá. E logo adormecerá com um profundo, e dilatado

sono, inchando-lhe tanto o estômago, que feita hidrópica, se converterá com

admirável metamorfose num Corvo muito negro; este perdendo

paulatinamente as penas, principiará a voar, e com o seu vôo se remontará

tanto, que sacudirá sobre si mesmo água das núvens, até que ficando molhado

dispa de boa vontade as asas, e descendo por falta delas, se converta em um

branquíssimo Cisne 195.

Sem pretender fazer a exegese completa deste texto exemplar – parecido, aliás, a

outros textos de autores clássicos que referem as bodas alquímicas do enxofre e do

mercúrio –, a qual necessitaria de ser vista também à luz daquilo que Anselmo

Caetano escreve adiante, quando refere os graus de digestão, parece-nos não ser de

excluir a hipótese de que a Virgem com asas, seja o Mercúrio, ou Azougue o qual ao

sublimar-se, voa – o que segundo Filaleto é uma Águia -, podendo transportar com

195 op. cit., pp. 39-40

121
ele um Ouro, intrínseco (a sua semente radical) ou extrínseco (o Ouro “vulgar”).

Este é o fundamento da “via das amálgamas”

Através da discussão dos meios e extremos da Crisopeia e das quatro digestões

Herméticas, expõe Anselmo Caetano a Obra alquímica que propõe e segue. Desde

logo, os meios operativos, ou Chaves da Obra Grande, - que vai do Mercúrio

Filosófico e dos Metais Perfeitos até ao Elixir Perfeito – os quais poremos em

correspondência com os meios materiais ou diversos graus, e com os meios(ou

sinais demonstrativos, na realidade as cores sucessivas da Obra):

1º) - Dissolução ou Liquefacção: a) redução dos corpos à sua primeira e antiga

matéria, na verdade uma “reincrudação” dos corpos cozidos; b) congresso do

macho e da fêmea, que conduz ao corvo negro; c) separação dos quatro elementos

contidos na Pedra (quando retrocedem as luminárias).

Corresponde também ao 2º. meio material (depois do Mercúrio Filosófico e dos

Metais Perfeitos): os quatro elementos que circulam até se fixarem.

O Nigredo - a confusão dos elementos que surge no fim da liquefacção - é também

o 1º meio demonstrativo, a Cabeça de Corvo, que marca o princípio da primeira

negridão, a corrupção ou putrefacção (que dispõe para a geração).

Corresponde, ainda à primeira digestão (que é feita com CALOR BRANDO) – o

congresso do macho e da fêmea, a mistura das matérias seminais, a dissolução do

corpo e a resolução dos elementos em Água homogénea (o Caos tenebroso, o

Tenebroso abismo).

2º.) – Lavação: faz do Corvo Negro, um Cisne Branco, de Saturno, faz nascer

Júpiter, o rei dos Deuses (símbolo da conversão do corpo em espírito).

122
2º. Meio ou sinal demonstrativo - cor Branca (o Cisne): - onde se dá a perfeição do

primeiro grau e do Enxofre branco, também denominado Terra bendita, Terra

foliata, onde os filósofos semeiam o seu Ouro.

Corresponde ainda à 2ª. Digestão, onde o Espírito do Senhor anda sobre as águas

(começa a fazer-se luz, separando as águas das águas); renova-se o Sol e a Lua,

faz-se uma Nova Terra e um Novo Céu. Dá-se a espiritualização de todos os

corpos, os Corvos negros dão origem às Pombas brancas. O espírito ígneo que desce

em forma de água, procede a regeneração do mundo. A Águia e o Leão abraçam-

se num eterno e íntimo abraço.

Notas : - Segundo escreve o autor de ENNOEA, nas duas últimas obras

anteriores: o Dragão exercita a sua grande crueldade consigo mesmo, pois

tragando a sua cauda, todo se engole e se converte em Pedra

- diz ele, também, que é necessário obrar com grande advertência, para que se

faça a separação das águas com o peso, e medida, de sorte que as águas que

ficam debaixo do Céu, não afoguem a terra, e as que sobem ao Firmamento, a

não desamparem de modo, que fique seca.

3º.) – Redução: restitui a alma à Pedra desanimada, sustentando-a com leite

orvalhado e espiritual, até que tenha perfeito vigor

Corresponde, também, à 3ª. Digestão, a qual dá de beber à terra, que acaba de

nascer, leite orvalhado, e todas as virtudes espirituais da quintaessência (…).Então

esconde a terra em si um grande tesouro, primeiramente semelhante à luz

resplandescente – a Terra da Lua - e depois, ao Sol rubicundo – a Terra do Sol. .

Corresponde aos 3º e 4º. meios demonstrativos que são, respectivamente: a cor

Amarela (a Aurora) – marca a transição entre o Branco e o Vermelho e anuncia os

123
cabelos dourados do Sol - e a cor Vermelha escura (o Enxofre so Sol, Esperma

masculino, Fogo da Pedra, Coroa Régia, Filho do Sol) – que se tira da Branca, pelo

fogo.

4º.) – Fixação: fixa um e outro enxofre – 3º) meio material, que marca o fim

da primeira Obra -, sobre o seu corpo fixo, mediante o espírito; isto é feito, cozendo

os fermentos por seus graus (amadurecendo as coisas crtuas e dulcificando as

amargas)

Corresponde, também, ao 4º.) meio material: fermentos produzidos

sucessivamente pela ponderada mistura das sobreditas coisas, e, também, à 4º.

Digestão – que aperfeiçoa todos os Mistérios do Mundo, e converte a terra em

excelentíssimo fermento que fermenta todos os corpos imperfeitos.

Este último meio operativo – que marca o fim da primeiro trabalho da Obra

Hermética -, continua a cozer os fermentos por seus diversos graus, derretendo,

penetrando e tingindo, de tal modo que gera o Elixir, e depois exalta-o 196. Na

verdade, a Pedra exalta-se por graus – até chegar à sua última perfeição -, com

sucessivas digestões (quatro) que, na realidade, são os “regimes de fogo” de Filaleto.

O autor de ENNOEA, comenta a Obra que acaba de expôr, em linhas gerais, com as

seguintes afirmações, que constituem os segredos operativos (debaixo da pedra):

- toda a fabrica da Obra Filosófica não é outra coisa mais que dissolver e

coagular: dissolver o corpo e coagular o espírito (…) Pela redução se fixa

o corpo volátil em permanente corpo, e a Natureza volátil ultimamente

passa a ser fixa, do mesmo modo que a fixa tinha passado a ser volátil.197

196 op. cit., pp. 42-47


197 op. cit., p. 48

124
- A produção da Pedra dos Filósofos é como a criação do mundo, porque é

necessário que tenha o seu caos, e a sua matéria prima, em que nadem

confusos os elementos, até que separados pelo espírito ígneo, e que seja

elevada a parte leve desta separação para cima, e a grave seja precipitada

para baixo. Nascendo a luz, desaparecem as trevas: ajuntando-se as águas

em um lugar, aparece a terra seca ou árida. Finalmente saem

sucessivamente os dois Luminares grandes, e produzem as virtudes

Minerais, Vegetais, e Animais na Terra Filosófica198

- A criação da Pedra Filosofal é por todas as cirscunstâncias semelhante à

de Adão, porque do corpo terrestre e grave dissoluto pela água se faz o

limo, que mereceu chamar-se Terra Adâmica, na qual residem as

qualidades e virtudes de todos os elementos. Também se lhe infunde a alma

celeste pelo espírito da quinta essência, e o influxo solar, e pela benção, e

orvalho do Céu se lhe dá a virtude infinitamente multiplicativa, mediante a

cópula de ambos os sexos199

- - esta obra só se pode fazer havendo um radical disolvente do Ouro, e da

sua mesma natureza (…), que é o Mercúrio Filosófico; porém quem não o

tiver, não poderá colher o fruto desta Árvore da vida, ainda que saiba

conhecê-la200.

- O maior segredo desta obra consiste no modo de obrar, o qual todo

depende da circulação dos elementos, porque a matéria do Lapis vai

passando de uma para outra Natureza201.

198 op. cit., pp. 48-49


199 op. cit., p. 50
200 Op. cit., p. 48
201 op. cit., p. 50

125
- Quase que não há maior segredo em toda a praxe da obra, que o certo e

ajustado movimento deste círculo – o segundo círculo, da restauração, o

que pesa a água, e que examina as medidas – porque dá forma ao Infante

Filosófico.202

Depois de uma discussão de temas como A Circulação da água (onde se inclui

esse arcano do círculo, acima citado), o Fogo da Natureza e a Circulação dos

Eelementos, o Fogo Filosófico, Enódio pede a Enodato que lhe faça uma breve

relação da aplicação destas coisas, ao que ele anui, noutra descrição – uma

verdadeira súmula da Obra Grande - cheia de simbolismo operativo:

Tomai o Dragão Ruivo, animoso e belicoso, em cujo nascimento não faltou

nenhuma força. Depois escolhei sete ou nove Águias generosas, cuja vista se não

ofenda com os raios do sol. Lançai as Aves com a Fera em um cárcere claro, e

fortemente fechado, debaixo do qual poreis um vapor tépido, para que se acenda a

peleja. Em breve tempo se cometerão com dilatada e obstinada batalha, etá que

finalmente, depois de quarente e cinco ou cinquente dias, principiarão as Águias a

picar e a despedaçar a Fera. Morrendo esta, infectará todo o cárcere de

podridão…… (ver texto a pp. 65-67).

Uma síntese que, poderemos dizer, equivalente a esta, acha-se no Testamento

hermético (em castelhano), ao mesmo tempo simbólico e operativo:

Si en Mercúrio no alterado,/ Dissuelves Oro nativo,

202 op. cit., p. 55


126
El Rebis has conseguido,/ Y el fermento deseado:

Ponle en vaso sigilado,/En fogo lento a coser,

Advertiendo, que ha de ser/ Tan suave el movimiento,

Que solo elentendimiento,/Pueda llegarlo a entender.

(…)

En dos alas solamente,/ Consiste toda la Obra,

Y lo de más todo sobra,/ Porque és engaño patente:

Toma un cuerpo permanente,/ Y aun te custe disuelo,

Abate el Águia al suelo,/ Y no la dexes bolar;

Porque el intento es hallar,/ Modo de unir Tierra y Cielo.

(…) texto completo nas pp. 81-83

Existem algumas passagens de tratados clássicos de Alquimia que referem, o

papel central que a imaginação criadora teria nesse processo místico de transformação

espiritual que muitos reclamam – vide o caso de M. Eliade . Um exemplo interessante é

o do Rosário dos Filósofos (obra de alquimia operativa que surgiu na Idade Média e no

Renascimento, como sendo atribuida ao alquimista catalão do século XIII, Arnaldo do

Vilanova), podemos ler: A Natureza efectua a sua operação pouco a pouco. E quero

que tu actues assim, e sobretudo que a tua imaginação se conduza segundo a

natureza. E deves ver segundo a natureza, graças à qual os corpos são regenerados

nas entranhas da terra. Imagina-o por meio da imaginação verdadeira e não

fantástica203. Paracelso distingue a fantasia da imaginação - a fantasia não é

imaginação mas um jogo do pensamento204 - não tendo a primeira, como refere

203 El Rosario de los Filósofos, Barcelona, Munoz, Moya e Montraveta eds., 1986, p. 31 (a tradução é
nossa).
204 citado por Alexandre Koyré, in Mystiques, Spirituels, Alchimistes du XVIe. Siècle allemand, Paris,
Gallimard, 1971, p. 97 (a tradução é nossa).

127
Alexandre Koyré, fundamento na natureza e sendo apenas puramente intelectual, onde

as imagens flutuam no nosso espírito sem ligação profunda entre elas e entre elas e nós

próprios205. Pelo contrário, a imaginação é criadora, no sentido em que ela é a

produção mágica de uma imagem206.Ora esta actividade imaginativa é muitas vezes –

como refere Yvette Centeno no seu prefácio ao ENNOEA 207 -expressa sob a forma

relatos de sonhos, de visões, pelos próprios autores alquímicos. É o caso de Anselmo

Caetano de Castelo Branco, com o seu Sonho Enigmático, descrição simbólica, onírica,

visionária e altamente imaginativa que vem, no fim de ENNOEA – portanto numa

mesma obra de um mesmo autor-, suceder a discursivas e racionais aplicações do

entendimento, embora de uma racionalidade simbólica, sobre a teoria e a prática da

alquimia operativa. Vejamos o seu texto:

Tendo examinado todas as opiniões dos Filósofos Herméticos, e ponderado

todos os enigmas com que os Adeptos explicaram a maior obra, que a Natureza produz

com os instrumentos da Arte, cançado já de tão grande trabalho, adormeci e comecei a

sonhar, que estava embarcado, e dava logo à vela, navegando com bonança, pelas

inquietas ondas do Oceano. Como não descobria mais que Mar, e Céu, desejava

avistar, ou descobrir terra….

Tendo chegado à Cidade Morgana, ele vislumbra depois um vale, que ficava

entre dois montes muito altos e um admirável e delicioso bosque, onde as cores dos

frutos são as cores da Obra. Encontra aí uma Poderosísima Imperatriz, e um Filósofo,

cuja ocupação era ensinar ignorantes Peregrinos (como ele) e, que de um modo

205 op. cit., p. 96 (idem)


206 op. cit., p. 97

128
enigmático e alegórico lhe ensina os Mistérios da Arte que conduzem ao talo precioso –

ver texto completo a pp. 67-70.

O ENNOEA, como outros tratados alquímicos relevantes que poderíamos

igualmente escolher (como os tratados de Filaleto, Cosmopolita, etc.), constitui a

demonstração clara do erro da hipótese de Eco, pois estamos em presença de um

discurso simbólico que não se refere a experiências místico-esotéricas, mas sim a

experiências operativo-laboratoriais. Se alguma eficácia mística e espiritual existe na

alquimia operativa, ele deverá residir basicamente:

- na ìntima união do operador com a matéria (ver p.e., Canseliet)

- na utilização da simbolização das operações materiais

Portanto, embora os materiais, descritos mais ou menos simbólicamente, não

sejam estados de alma (como quer Jung), eles podem conduzir a uma transformação

psico-espiritual, resultado de:

a) um estado de espírito sagrado ou religioso;

b) um longo e paciente percurso de comunhão com a Natureza e com as

Operações da Arte;

c) uma capacidade poética de simbolizar os materiais e as operações e de

manter a vivência permenente dessas simbolizações.

Num contexto antropológico, esta “íntima união do operador com a matéria”,

transfere muitas vezes para o operador, particularmente no discurso dos alquimistas

contemporâneos – de que daremos conta no Capítulo sobre os Grupos alquímicos do

último quartel do século XX – uma capacidade de interferir com uma qualidade da

207Anselmo Caetano Munhoz de Abreu Gusmão e Castelo Branco, ENNOEA ou Aplicação do


Entendimento sobre a Pedra Filosofal, Nota de Apresentação de Y.C. Centeno, Lisboa, Fundação

129
matéria, próxima do conceito totémico de mana o qual, segundo Durkheim é “uma

espécie” de force anonyme et impersonnelle qui se trouve dans chacun de ces êtres

(animaux, hommes, images), sans pourtant se confondre avec aucun d’eux. Nul ne la

possède tout entière et tous y participent...208. De facto, o operador ao interagir com a

material em evolução adquire, segundo o discurso dos alquimistas, uma capacidade de

influir sobre essa evolução, dando-se, assim, uma convergência entre as forças

“impessoais e sobrenaturais”, quer do alquimista quer da matéria. Claude Rivière,

sintetiza o conceito de mana: puissance impersonnelle et surnaturelle, constatée de

manière tout empirique dans une action efficace...209. Essa acção eficaz da “força” que

o alquimista vai adquirir ao longo do seu caminho iniciático, fruto do seu “contacto

íntimo com a matéria”, é decisiva para a operação alquímica, já que é afirmado que ele

não tiver essa “força”, tal como a matéria (“fogo secreto”, etc,.), não haverá

transmutação.

Em suma, poderemos afirmar que as operações descritas pelos alquimistas têm

uma realidade física, para além da simbólica. De facto, algo se passa no laboratório do

alquimista que se pode interpretar – particularmente na “1ª. Obra” e em parte da “2ª.

Obra “ - em termos de Química e de Metalurgia. Mas muito mais se passa, como vimos,

no imaginário do alquimista e isto, desde a “1ª. Obra”. Esse imaginário simbólico

presente no rito alquímico – e assente no mito alquímico – transborda nas fases mais

adiantadas da Obra para a dimensão física, toldando-a com o sonho (utópico) da

realização da Pedra Filosofal, a qual proporcionaria os desejados “elixir da longa vida”

e “pó de projecção”, necessário à transmutação metálica.

Calouste Gulbenkian, 1987.

130
IV - O RENASCER DA FÉNIX: O RESSURGIMENTO DA ALQUIMIA EM

FRANÇA NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX.

É agora a altura de fazermos uma aproximação ao período de tempo e ao

universo cultural que é o objecto deste Trabalho. O ressurgimento da Alquimia

operativo-laboratorial vai estar, neste final de século XX, particularmente em França,

intimamente associado à publicação de livros e revistas de venda ao público, num

âmbito comercial – isto, independentemente de outras publicações de âmbito mais

restrito que estudaremos no Capítulo seguinte, já que sâo próprias dos diversos grupos

alquímicos estudados -, quer seja a reedição de tratados clássicos quer seja a edição de

livros e artigos de autores contemporâneos. E como é evidente, se se editam muitos

livros de uma determinada área é porque há quem os compre. Aliás, era frequente de

1975 a 2000, encontrarmos estes livros à venda não apenas em livrarias esotéricas, mas

também noutras generalistas e de grande consumo, como a FNAC. Saber se esses livros

– de difícil leitura, diga-se – são para serem lidos, ou para serem exibidos numa estante

da sala de visitas lá de casa, isso é uma questão importante de que falaremos adiante e

que tem a ver com o simbólico. Possuir esses livros é dominar aparentemente um

assunto “retro” e “outro”, que escapa ao entendimento dos outros, é colocar-se fora do

conhecimento comum da ciência e da técnica, talvez mesmo acima dele, é isso que se

pretende sugerir. No entanto, para além disso, existe um fenómeno social interessante –

já tratado no Capítulo que refere os NMR e as EA - e que consiste no fascínio sincero

que sabedorias antigas, espiritualidades e conhecimentos alternativos, exercem sobre

homens e mulheres dos nossos dias, com habilitações literárias por vezes superiores e

por vezes, com alguma preparação técnico-científica.

208 Émile Durkheim, Les Formes élémentaires de la vie religieuse (1912), Paris, PUF, 1968, pp. 268-270.

131
Como referiu a antropóloga T.M. Luhrmann no seu já citado Persuasions of the

Witch Craft: Ritual Magic in Contemporary England, estas novas espiritualidades

mágico-religiosas têm uma dimensão literária grande, veiculada através de livros

(tratados, manuais, etc) e revistas, substituindo a oralidade do mágico-religioso de

outrora e do mundo primitivo. Muitos (a maior parte) dos leitores destas publicações

não se dedicaram, no entanto, à prática alquímica laboratorial, mas ficaram fascinados

por um universo literário reencantado, de grande simbolismo, aderirindo a essa corrente

denominada, por Canseliet, seus companheiros e discípulos, de “Alquimia Tradicional”,

por oposição à leitura exclusivamente psicológica da denominada ”alquimia espiritual”.

O que é que retiraram esses leitores de textos que se referem a uma prárica laboratorial,

mas que, de facto, não se esgotam nela? Creio que foi uma filosofia da Natureza,

veiculada por um simbolismo exuberante, e ao mesmo tempo uma atitude de recuo

perante a modernidade técnico-científica, um retorno à natureza e um retorno a

universos de espiritualidades antigas comum na contra-cultura dos anos 60 e que

tiveram expressão espiritual a partir dos anos 70, como referiremos no Capítulo VI,

dedicado aos NMR e às EA. Tratou-se também, dentro desse retorno, de uma moda, de

uma atitude chic, que marcava a diferença, de entre as novas religiosidades e

espiritualidades, face a publicações populares destinadas a um público mais alargado e

que tinham a ver com um tema relacionado com o uniderso da Alquimia: uma demanda

de antigas civilizações com antigos saberes.

Para os alquimistas operativos tratava-se de decifrar, a través da leitura reiterada

e persistente, a linguagem secreta e misteriosa contida nesses tratados e livros, quer

209 Claude Rivière, Socio-anthriopologie des religions, Paris, Armand Colin, 1997, p. 31.

132
antigos quer modernos, verdadeiro desafio de hermenêutica assente numa dimensão ao

mesmo tempo racional – no quadro da racionalidade interna alquímica210 – e intuitivo.

Essa linguagem dar-lhes-ia acesso aos arcanos da operatividade alquímica: materiais,

operações, vasos, temperaturas, condições exteriores, etc. Os livros continham a

linguagem simbólica que iria moldar o discurso dos praticantes, os quais pouco

inovavam em relação àquilo que os grandes mestres da Alquimia tinham escrito. Esse

discurso é determinante pois ele coloca a teoria e a prática da Alquimia num universo

diferente da técnica e da ciência actuais, situando-o muito mais no domínio da poesia e

do misterioso, aumentando assim o fascínio dos leitores e dos praticantes. Trata-se de

um curioso fenómeno de auto-alimentação e de sinergias que se vai desenrolando à

medida que o leitor passa do exterior do universo alquímico para o seu interior, mesmo

que apenas a nível da leitura. E aqui o simbolismlo alquímico e a sua dimensão

“arquetípica”, porque assente numa raíz sexual e estruturado sobretudo em binaridades e

ternaridades, como vimos no capítulo anterior, pode acentuar esse fascínio, devido à sua

universalidade, mas também à exuberância simbólica dos seus textos, verdadeiros

contos de fadas, na realidade, mitos, como vimos.

Edições comerciais de livros

Pouco tempo antes de começar o período que nos interessa neste capítulo (1950

– 2000), é de referir que, em 1945, é publicada a primeira edição de Deux Logis

alchimiques, de Eugène Canseliet, a qual inclui – na linha de Fulcanelli - o estudo

simbólico de monumentos antigos, como pretexto para uma dissertação hermética e

alquímica. Nesse mesmo ano, como refere Atorène211, havia ainda por vender alguns

210 Ver o livro de Bernard Joly, La Rationalité de l’Allchimie au XVIIe. Siècle, Paris, Vrin, 1992
211 Atorène, Le laboratoire alchimque, Guy Trédaniel, 1982

133
exemplares das duas obras de Fulcanelli, mas em 1955, a sua reedição esgotou antes de

sair quando se propôs uma subscrição de 1.000 exemplares, o que revela o interesse

cescente pela alquimia a partir de 1950 – e Canseliet teve um papel importante nesse

fenómeno, com os seus numerosos textos e diversas entrevistas.

Sem pretender ser exaustivo, uma vez que em Anexo indicaremos praticamente

toda a actividade editorial, continuaremos com uma revista dos principais títulos. Em

1947 dá-se a publicação de Qu’est-ce que l’Alchimie, de André Savoret, nas ed. de

Psyché – um pequeno mas interessante ensaio em que a Alquimia é definida não como

sendo uma mística, nem uma química, nem muito menos um yoga ocidental. Em 1948

sai a Anthologie de la poésie hermétique de Claude d’Ygé, nas ed. Montbrun, Paris,

com prefácio de Eugène Canseliet. 2ª. Ed. na Dervy Livres, em 1976). Em 1951 é

publicado L’Alchimie, de Serge Hutin, na col. “Que-sais-je?” das Presses Universitaires

de France (P.U.F.), Paris (a 9ª. ed. será publicada em 1995), revelando por um lado o

interesse do grande público cultivado pelo tema, e por outro o interesse de uma editora

universitária por um tema “maldito”.

Mas a história da Alquimia não se faz apenas com as edições de livros, mas

também com acontecimentos, lendas e mitos. Por exemplo, em 1952, E. Canseliet,

instalado em Savignies (desde 1946) começa, segundo Atorène212, uma nova cocção –

operação alquímica de “cozedura” - de que dará testemunho no seu livro L’Alchimie

expliquée..; ele terá revisto nesse ano, em Espanha, o misterioso Fulcanelli – vide a

problemática afirmação que ele faz na entrevista que dá a R. Amadou, em Feu du Soleil.

Todos os anos, até 1956, será publicado um livro sobre alquimia. Em 1953 surge

212 Op. cit.

134
Aspects de l’Alchimie traditionelle, de René Alleau (nas èditions de Minuit, Paris), com

prefácio de E. Canseliet; trata-se de uma obra teórica profunda realizada por um

especialista de simbólica (autor do conhecido La science des symboles). No ano

seguinte, é publicada uma selecção de textos alquímicos – organizada por temas (o

Enxofre, o Mercúrio, a Matéria Prima, etc.) - intitulada Nouvelle Assemblée des

Philosophes Chymiques, de Claude d’Ygé (nas edições Dervy, Paris), com prefácio de

Eugéne Canseliet; uma reimpressão será publicada em 1972. Em 1955, sairá Mystiques,

sprituels et alchimistes du XVIe. Siècle allemand, de Alexandre Koyré, na Armand

Colin (reimpressão em 1971, na Gallimard). A partir de 1956, o número de publicações

anuais sobre este tema aumentará consideravelmente; nesse ano sairá Les Douze Clefs

de la Philosophie (publicado em 1602, com edição francesa de 1627), de Basile

Valentin, com tradução e comentários de Eugène Canseliet (Éditions de Minuit, Paris) ;

esta obra terá reimpressões em 1972 e 1977. Sairá ainda, em 1956, a importante obra de

Mircea Eliade, Forgerons et Alchimistes, na Flammarion (a reedição corrigida e

aumentada sairá em 1977).

Em 1957 é publicado um artigo de E. Canseliet em Art Magique de André

Breton (ed. Formes et Reflets, Paris) e sai também o segundo prefácio de E. Canseliet,

para a 2ª. edição da célebre obra de Fulcanelli Le Mystère des Cathédrales (publicado

em 1926, no Jean Schemit ed.), na edições Omnium Littéraire, Paris. Para além do livro

Dante alchimiste de Jacques Breyer, nas edições La Colombe, Paris, sairá nesse mesmo

ano a reedição de Les Clefs de la Philosophie Spagyrique (1722), de Le Breton, com

introdução de René Alleau, nas ed. Caractères, Paris; outra edição sairá mais tarde, em

1985, nas ed. Bailly, com apresentação de Sylvain Matyon. 1958 é um ano singular:

nenhuma obra de alquimia foi publicada, mas, no entanto, sai um dos livros que mais

135
contribuirá para a divulgação do mito alquímico, junto do grande público. Trata-se de

Le Matin des magiciens, de Louis Pawels e Jacques Bergier, na ed. Gallimard

(traduzido em português e publicado pela Bertrand com o título O Despertar dos

Mágicos), que terá numerosíssimas reimpressões e traduções em diversas línguas. Nele

e refere a personagem misteriosa de Fulcanelli, o alquimista françês que é apresentado

como tendo tido acesso ao segredo das transmutações nucleares, num quadro diferente

do da ciência actual - tema que fascinava sobremaneira um dos autores, Jacques

Bergier, possuidor de formação técnica e científica superior e portanto interessado por

esta vertente da Alquimia que, como vimos, é apenas uma parte (discutível) do seu

universo.

Em 1959, é publicado, nas ed. Fayard, Paris, o clássico estudo histórico de John

Read sobre Alquimia, De l’Alchimie à la chimie (tradução de Prelude to Chemistry,

publicado em 1957, em Inglaterra). Nesse ano sai também o livro de divulgação

histórica Les alchimistes de Michel Caron e Serge Hutin, nas Éditions du Seuil, Paris. A

partir de 1960, o número das edições sobre alquimia sobre em flecha (eventual

consequência do livro de Pawels e Bergier). Nesse ano sai a segunda edição de Les

Demeures Philosophales (1ª. Ed. 1930. Jean Schemit ed.), de Fulcanelli, nas edições

Omnium Littéraire, Paris, com um segundo prefácio, da autoria de E. Canseliet. Saem

ainda Alchimie et Médicine de Alexander von Bernus (trad. da edição alemã de 1948,

por Henri Hunwald), nas Edições Dangles, Paris – de grande interesse prático no

domínio da Espagíria - , Le Grand Oeuvre (1907, Chacornac, Paris) de Grillot de Givry,

nas edições Chacornac (com reimpressões nas Éditions Traditionelles, em 1971 e 1981)

e Les Sept livres de l’archidoxe magique de Paracelso, Ed. Nicolas Bussière, Paris,

reimp. 1983. Em 1960 dá-se ainda a publicação dos tomos I e II do Corpus Herméticum

136
de Hermes Trismegisto, fix., trad. de A. D. Nock e A.-J. Festugière (1ª. Ed. em 1946,

com reimpressões de 1972 a 1992), nas edições Belles Lettres, Paris; os tomos III e IV

(cujas primeiras edições francesas são de 1954), serão reeditados em 1972 (com

reimpressões até 1973). Em 1961 é publicado L’alchimie spirituelle, de Robert

Ambelain, em La Diffusion Scientifique (reimpressões em 1974 e 1985), uma

interpretação muito particular (e discitível) da Alquimia, e nesse mesmo ano, surge

ainda a reimpressão de Hermés dévoilé (1832) de Cyliani, nas edições Chacornac

(outras reimpressões em 1975 e 1982).

Após dois anos “fracos” – 1962 em que apenas sai a tradução francesa de La

tradition hermétique de Julius Evola, nas Éditions Traditionelles (com reimpressões em


1968 e 1988), e 1963, em que não se regista nenhuma publicação alquímica em França -

em 1964 é publicado o livro Alchimie de E. Canseliet – conjunto de artigos publicados

em diversas revistas – nas edições Jean-Jacques Pauvert, Paris; reimpressão aumentada

em 1978. Ainda em 1964 sai o terceiro prefácio, de E. Canseliet, para a 3ª. edição de Le

Mystère des Cathédrales, de Fulcanelli (Jean-Jacques Pauvert, Paris) e é publicado, por

Bernard Husson (no Omnium Littéraire), o livro Deux traités alchimiques du XIXe.

Siècle.

Em 1965 sai o terceiro prefácio de E. Canseliet, para a 3ª edição de Les

Demeures Philosophales, no editor Jean-Jacques Pauvert, Paris e em 1966, dá-se a

publicação da reedição de Théories et symboles des alchimistes (1893), de Albert

Poisson, nas Éditions Traditionelles. Nesse ano é publicado ainda os Commentaires sur
le Mutus Liber, de Serge Hutin, nas ed. Le Lien, Mazières les Metz, s.d. e também o

importante livro Art et Alchimie de Jacques Van Lennep, nas ed. Meddens,

Paris/Bruxelas (reimpressão em 1971). Em 1967, verifica-se a publicação de Alchimie et

son livre muet - Mutus Liber (1677), com comentários de E. Canseliet, nas edições J.-J.

137
Pauvert, de Paris (reimpressões em 1974 e em 1986). Em 1975 será publicado Trois
anciens Traités d’Alchimie, com caligrafia de E. Canseliet, por esta mesma editora.

Roger Caro (1911-1992) – que fundará em 1971 uma associação alquímica, Les

Frères Aînés de la Rose-Croix (FARC), reclamando-se de uma grande (e discutível)

antiguidade – publicara, entretanto, em 1961 a sua primeira obra, o Dictionnaire de

philosophie alchimique, de Kamala-Jnana (pseudónimo do autor), nas Éditions Charlet,

Argentières. Deve salientar-se a posição singular de Roger Caro que, sob o pseudónimo

de Kamala Jnana, tudo indica, publica em 1961, Dictionnaire de philosophie

alchimique, em 1968, Concordances alchimiqiues e em 1969, o sensacional Tout le

Grand Oeuvre photographié, com fotos a cores das diversas fases da Obra

alquímica.213 Segunda obra de Roger Caro, Pleiade alchimique, editada pelo autor, em

Saint-Cyr-sur-Mer Roger Caro terá o seu grupo alquímico-rosacruciano, os FARC

associado a uma Igreja gnóstica L´’Eglise de la Nouvelle Alliance, publicando em 1972

o Rituel FARC avec deux textes alchimiques inédits, ed. aut., como habitualmente em

Saint-Cyr-sur-Mer.

Em 1969, surge um livro de Espagíria, propondo uma abordagem operativa

diferente da habitual, L’or du millième matin de Armand Barbault, nas Publications

premières/Denoel (reed. “J’ai lu”, 1970). Nesse mesmo ano sai a reedição de Théories et

symboles des alchimistes (1891), de Albert Poisson, nas Éditions Traditionelles; e cujas

reimpressões em 1975, 1978, 1991 revelam bem o interesse crescente de um público

cada vez maior, interessado pelo esoterismo, e pela Alquimia. A publicação, nesse ano

(e com reimpressões em 1975, 1981, 1993), da 3ª. Ed. de Le symbolisme hermétique

dans ses rapports avec l’alchimie et la franc-maçonnerie, de Oswald Wirth, nas Ed.
Dervy-Livres (a 1ª. Ed. tinha sido publicada em 1910, a 2ª. em 1931) revela desta vez

um interesse particular dos maçons em entenderem as referências alquímicas que

213 Todos em edição do autor, Roger Caro, Saint-Cyr-sur-Mer, França.

138
aparecem nos rituais da Maçonaria, sejam eles dos primeiros graus (Aprendiz,

Companheirpo e Mestre), ou dos Altos Graus.

Em 1968 tinha sido publicado o célebre livro de Margerite Yourcenar L’Oeuvre

au Noir214 que relata o anseio pela descoberta da verdade, o tormento face à Inquisição e

a consequente prisão e morte do médico e alquimista renascentista Zenão – este livro

será adaptado ao cinema 20 anos mais tarde e ambos, livro e filme terão um grande eco

público junrto de gente cultivada. 1970 é o ano que vê a publicação de L’Érotique de

l’Alchimie, de Elie-Charles Flamand, com prefácio de E. Canseliet, na Belfond (2ª. Ed.


no Courrier du Livre, em 1989), livro que vai levar a Alquimia a um público mais vasto

que o do universo dos leitores intressados no Esoterismo, o que já tinha acontecido em

1966 com o livro de van Lennep, Art et Alchimie. A publicação em 1976, de Anthologie

de la poésie hermétique (1948, Montbrun, Paris), de Claude d’Ygé, com prefácio de E.

Canseliet, nas edições Dervy irá no mesmo sentido. Ainda em 1970 dá-se a reedição de
L’Alchimie et les Alchimistes (1854) de Louis Figuier, na “Bibliotheca Hermetica”,

dirigida por René Alleau desde 1969, na editora Denoel, Paris. Esta importantíssima

colecção reeditou, durante os anos 70, uma profusão de textos clássicos de Alquimia,

como por exemplo, também em 1970, Le livre des figures hiéroglyphiques de Nicolas

Flamel (reeditado em 1978) e L’Entrée ouverte au palais fermé du roi (1667), de

Filaleto, em 1971, La Lumière sortant par soi- même des ténèbres (1666) de Marc-

Antonio Crassellame e Le Triomphe Hermétique (1699), de Limojon Saint-Didier (com

introdução de E. Canseliet), em 1972, Le Livre des Figures Hiéroplyphiques, de Nicolas

Flamel (com introdução de E. Canseliet), e mais tarde, em 1975, Les 5 livres ou la clef

du secret des secrets de Nicolas Valois e Nicolas Grosparmy, em 1976, Nouvelle

Lumière Chymique (1691) do Cosmopolita, em 1976, Terre du Dauphin et Grande

Oeuvre Solaire, de Guy Béatrice e Sévérin Batfroi (com prefácio de E. Canseliet) e em

1977, Le Char Triomplhal de L’Antimoine, de Basílio Valentin e em 1978, Le dernier

testament, também de Basile Valentin, já sob a chancela de Retz, Paris. Nesse mesmo

214 Paris, Folio.

139
1970 dá-se a publicação de La Legenda des F.A.R.C. do atrás citado Roger Caro (ed.

aut., St.-Cyr-sur Mer), que encerra a lenda da fundação da Ordem dos FARC,

atribuindo, por uma questão de prestígio, uma grande antiguidade à mesma e associando

a ela, como seus “grão-mestres”, diversos nomes ilustres; esta estratégia é comum em

várias Ordens iniciáticas (veja-se o caso da AMORC, com a sua ascendência “egípcia”,

veja-se o caso de diversas Ordens e Ritos maçónicos).

Em 1970 é editado um livro que priveligia a vertente psicológica da Alquimia,

La voie de la transformation d’aprés C.-G. Jung et l’alchimie, de Étienne Perrot (na

Librairie de Médicis), livro que vai influenciar muitos investigadores que já seguiam as

obras de Jung. Recorde-se que a Tese de Doutoramento de Yvette K. Centeno na

FCSH/UNL versou uma aproximação do Conto da Serpente Verde de Goethe, nesta

perspectiva e registe-se a importante publicação, em 1971, da tradução francesa de

Psychologie et Alchimie (1944 e 1950), de Carl-Gustav Jung, nas edições Buchet-

Chastel et Correa (reed. em 1975 e 1991).

Nesse mesmo ano é publicado um livro que terá grande eco junto de um público

maior, mais popular, Le trésor des alchimistes, de Jacques Sadoul (reed. em 1971, 1972,

1976, 1990), na col. “J’ai lu”, já que divulga os “segredos” dos alquimistas e das suas
“transmutações”. Nessa mesma direcção divulgação, mas de um modo mais rigoroso e

históricvo, verifica-se em 1971 a publicação de Histoire de l’alchimie, de la science

archaique à la philosophie occulte, de Serge Hutin, na Marabout Université, Verviers

(Bélgica). A publicação em 1972 de La Pierre Philosophale, de Goerges Ranque, nas

ed. Robert Laffont, Paris, de Alchimie, de Lucien Gérardin, nas ed. Culture, Art,
Loisirs, Paris e de Lumières de l’Alchimie, de Arnold Walstein, nas ed. Mame, Tours

continua essa onda ediiorial de livros de divulgação da Alquimia junto de um público

mis largo, continuada em 1973 com a publicação de Le Grand Art des alchimistes, de

Jacques Sadoul, na Albin Michel (reimp. “J’ai lu”, 1975) e de Transmutations


alchimiques de Bernard Husson, nas ed. “J’ai lu” (reed. aumentada, com um prefácio de

140
François Trojani, nas edições La Table d’Émeraude, Paris). Ainda no que diz respeito à

divulgação da Alquimia, tremos em 1978 La Tradition alchimique, de Serge Hutin, nas

ed. Dangles e ainda a publicação de L’Alchimie (1957, Penguin) de E. J. Holmyard, com

textos de René Alleau, Eugène Canseliet, Claude d’Ygé, etc., editada na Arthaud. No

que diz respeito à grande divulgação (nem sempre rigorosa) da Alquimia junto de um

público mais alargado deve salientar-se também a publicação em 1991 de L’Immortalité

alchimique, de Serge Hutin, nas éd. Montorgueil, Paris. Em 1994 sai o “best-seller”

L’Alchimiste do brasileiro Paulo Coelho, nas ed. Anne Carrière e em 1996, de Alchimie,

le grand secret ( trad. franc. da ed. italiana), de Andrea Aromatico, na Gallimard e de

(num nível científico), Qu’est-ce que l’alchimie? do químico Pierre Lazlo, nas éd.

Hachette. Refira-se que, no domínio da grande divulgação da Alquimia, há dois temas

fortes que fascinam o público: a imortalidade alquímica e as transmutações.

Num domínio mais erudito temos de registar a publicação em 1971 de

L’Anthologie de l’Alchimie, de Bernard Husson (Belfond, Paris) e duas importantes

obras do Abade Dom A. J. Pernéty, o Dictionnaire Mytho-hermétique (1787), nas ed.


Arché, Milão (reimpressão em 1980) o qual será editado também, em 1972, pela ed.

Denoel, na col. “Bibliotheca Hermetica, e as Fables Égyptiennes et Grecques (1758), de

Dom Pernety, nas ed. Arché, Milão, livro que será editado, também, em 1981, pelas ed.

La Table d’Èmeraude, Paris (reimp. 1991). Em 1972 serão também editados Les

Oeuvres de Nicolas Flamel, na editora Pierre Belfond, Paris, e Le Rosaire des

Philosophes, com trad. e notas de Étienne Perrot, na Librairie de Médicis. No domínio

da dimensão literária da Alquimia assinale-se a publicação nesse ano de L’Alchimie du

verbe de Rimbaud, de Jean Richer (reeditada em 1991, nas ed. Trédaniel) e no domínio
da sua dimensão artística e iconográfica saliente-se a publicação, em 1973, de Alchimie.

Florilège de l’art secret, de Stanislas Klossowski de Rola (trad. ed. inglesa, de 1973),

nas edições Seuil Em 1978 será publicado o livro La pensée alchimique et le conte du

Graal de Paulette Duval, no Ed. Honoré Champion, em 1980, Rimbaud, la clef


alchimique, de David Guerdon, nas edições Robert Laffont e em 1982 Graal et

141
Alchimie, de Paul Georges Sansonetti, nas ed. Berg International, Paris (reimpressão em

1993) e Alchimie, contes et légendes, de J. Rebotier e J.-M- Agasse, ed. L’Originel,

Paris. De assinalar também em 1990 Toison d’or et alchimie de Antoine Faivre, nas

edições Arché, Milão, em 1991, Alchimie et imagination active de Marie-Luoize von

Franz, no ed. Jacqueline Renard, em 1993 Philosophie de l’alchimie: Grand Oeuvre et

modernité de Françoise Bonardel, nas Presses Universitaires de France, Paris e Milosz:

l’étoile au front de Alexandra Charbonnier, nas ed. Dervy. Saliência ainda para

Publicação de Philosopher par le feu. Anthologie de textes alchimiques occidentaux de

Françoise Bonardel, em 1994, nas ed. Seuil, Paris e L’Hermétisme alchimique chez

André Breton, de Richard Danier (com prefácio de Patrick Rivière), nas edições

Ramuel. Deve destacar-se neste domínio erudito a colecção “Cahiers de l’Hermétisme”,


da Albin Michel, dirigida por A. Faivre e F. Tristan, que já tinha publicado, entre outros

livros monográficos, de diversos autorees, Alchimie em 1978 e publicará em 1988,

Présence d’Hermés Trismégiste, e também Paracelse.

Em 1976 é publicada uma obra citada por Fulcanelli e que diz respeito à

“Cabala Fonética”, ou “linguagem diplomática (ou “verde”), indispensável para se

enderem os livros de alquimia, os quais estão escritos em lingaugem cifrada:

Mathériaux cryptographiques, de Grasset d’Orcet, tomo I, por Bernard Allieu e Alain

Barthelemy, s.l, s.d., nem menção do editor (reimpressão em 1983, ano em que será

editado o tomo II da mesmta obra). Vários livros sobre a identidade enigmática de

Fulcanelli serão publicados nos anos 80 e 90, como por exemplo, Fulcanelli, une

biographie impossible (1986, ed. Obelisco, Barcelona), de L.M. Martinez Otero, nas éd.

Arista, Plazac e em 1996 Fulcanelli, une identité révélée, de Frédéric Courjeaud, nas

edições Claire Vigne, Paris, e em 1997 e Fulcanelli dévoilé de Geneviève Dubois, nas

ed. Dervy, Paris. Nesta senda serão publicados já em 1997, Fulcanelli et le Cabaret du

Chat Noir, de Richard Khaitzine. Outro tema relacionado com os livros de Fulcanelli e

de Canseliet é o estudo alquímico dos monumentos e dos lugares. Em 1980 são


publicados La France des lieux et des demeures alchimiques de Josane Charpentier

142
(com prefácio de E. Canseliet), por Retz e Paris et l’alchimie, de Bernard Roger, (éd.

Alta, Paris).

As editoras que mais privilegiaram a edição de tratados de Alquimia e outros

livros sobre ela, foram, para além das já citadas anteriormente, Jean-Jacques Pauvert
que reeditou os livros de Fulcanelli e de Canseliet - publicação em 1978 da segunda

edição revista e aumentada do livro de E. Canseliet, Alchimie (saído em 1964) e em

1979 publicação da segunda edição, “considerávelmente aumentada” (a primeira foi

editada, em 1945, por J. Schemit), de Deux Logis Alchimiques, de E. Canseliet, por J.-J.

Pauvert, Paris, onde ele rectifica algumas passagens da entrevista que R. Amadou

publicou -. a já citada Denoel, com a sua “Bibliotecha Hermetica”, a Belfond, a Jobert -


que, em 1975, publica Rares Expériences sur l’Esprit minéral (1668), de P. Moras de

Respour, com reimp. em 1977, no mesmo ano, La Tourbe des Philosophes e em 1977, o

Traité de Chimie Philosophique et Hermétique e em 1976, Traité du feu et du sel

(1618), de Blaise de Vigenère - .a Librairie de Médicis - por exemplo, editando em

1975, Viridarium Chymicum, ou le jardin chimique (1624), de Daniel Stolcius, com

introdução e comentários de Bernard Husson, ou em 1980 Trois textes alchimiques

inédits du XVIIe. Siècle, com introdução de Bernard Husson. São ainda de assinalar,

entre outras, as Éditions Traditionelles, a Table d’Émeraude, ambas de Paris e a Arché

de Milão, mas editando em francês, devido ao grande interesse revelado em França –

país do racionalismo! - pela Alquimia. Nesta última editora, registemos a publicação de

Le Chemin du chemin atribuído a Arnau de Villanova, de La Clavicule, de Raymond

Lulle e de Miroir d’alchimie, atribuído a Roger Bacon e de Le composé des composés,

atribuído a Alberto Magno, tudo nas edições Arché, de Milão, que editarão ainda vários

textos antigos de alquimia, como por exemplo, em 1975, o Amphithéatre de l’Éternelle

sapience (1609) de Heinrich Khunrath, Lettre Philosophique (1671), de Michel

Sendivogius (o Cosmopolita), Les trois livres de l’art du potier (1861) de Cyprian

Piccolpassi, Splendor Solis (1598), de Salomon Trismosin, e La Vertu et Propriété de la


Quintessence de toutes choses, de Johannes de Rupescissa, ainda nas Edições Arché, de

143
Milão. O Liber Paraminum de Paracelso, será reeditado em 1984 nas Ed. Traditionelles
com introdução de Antoine Faivre e prólogo de Bernard Gorceix, dois universitários.

Em 1976, será editado, por esta mesma editora, Du Vitriol philosophique et de sa

préparation (1896) de Tripied e em 1977, Processus Chimique sous forme de messe (s.

XVI), de N. Melchior de Szeben, também nas edições Arché, Milão; no mesmo ano,

estas edições publicam também o Commentaire sur la Médicine Universelle (1665), de

Johannes de Monte-Snyders e em 1979 o Traité de la Pierre philosophale, seguido do

Traité de l’art de l’alchimie, atribuido a S. Tomás de Aquino, na colecção Sebastiani.

A partir de 1976, outra editora passa a ocupar um lugar importante na edição de

livros de Alquima, as Éditions de la Maisnie/Guy Trédaniel, de Paris que publicou nesse


ano, Alchimie et Révélation Chrétienne, de Sévérin Batfroi (com prefácio de E.

Canseliet), Sainte-Anne d’Alchimie de Guy Béatrice e inauguraram a Colecção

“Oeuvres Chymiques” dedicada a autores clássicos da Alquimia, como por exemplo

Oeuvre Chymique de Geber (em dois vols.) e, no memo ano, Oeuvre Chymique de

Bernard Le Trévisan (reimpressa em 1991). Em 1977 essa mesma editora publicará

Alchimiques métamorphoses du Mercure universel de Sévérin Batfroi, e em 1978, Les

Douze Portes d’Alchimie de George Ripley, em 1981, Épitre du feu philosophique, de

Jean Pontanus e ainda em 1982 Les Innonbrables pouvoirs de l’océan de Mercure de

Petri Murien, nas ed. Guy Tréadniel;. o mesmo autor publicará, no mesmo editor, em

1989, Cinnabaris ou le Mercure alchimique.

Em 1977 a colecção “Bibliotheca Esoterica” das Edições Arma Artis

(Neuilly/Seine) começará a publicação de obras aclássicas de Alquimia, começando

com Oeuvre Minérale de Johann Rudolf Glauber;, na “Biblioteca Alchemica” da

mesma editora, serão publicados em 1979, Révélation de la parole cachée par la

sagesse des Anciens (sec. XVII), de autor anónimo, com comentários e gravuras de

Bernard Biebel, e La Verité sortant du Puits hermétique (1753), de Philovite


Cosmocole. Em 1980 outra editora, as edições Gutemberg Reprints, entra neste domínio

144
dos tratados de Alquimia e de Química antiga, com a publicação de Traité de la chimie

(1668) de Christophe Glaser e de Histoire de la chimie (166-69), de Ferdinand Hoefer,

(a partir da segunda edição de 1668, Jean d’Houry, Paris), Le tombeau de la Pauvreté

(1691), atribuido a Atremont, Ouverture de l’Escholle de la Philosophie transmutatoire

(1633), de David de Planys-Campy, Dictionna, ire Hermétique (1695), de Guillaume

Salmon, em 1981, La Lumière tirée du chaos de Louis Grassot, em 1982, Discours

philosophique ou la clef du sanctuaire philosophique (1781), de Sabine Stuart de

Chevalier, e em 1984, IX Livre de distallion, de Jean-Baptiste Porta.

Em 1989 a livraria “La Table d’Émeraude”, de Paris, que editará a célebre

revista “La Tourbe des Philosophes”, publica La Pierre aqueuse de sagesse ou

Aquarium des sages (1619), de J.A. Siebmaacher, com a chancela de Éditions La Table
d’Émeraude” que já tinha reeditado em 1984, Voyages en kaléidoscope (1919, Paris) de

Irène Hillel-Herlanger - editada em 1977, nas Éditions de la Tourbe, Grenoble - a qual

já editara também Hermétiques ballades, de Jean Laplace, com prefácio de Sévérin

Batfroi e “considerações liminares” de E. Canseliet e ainda Considérations alchimiques

sur la fin du monde de Jean Laplace, o proprietário da editora. A Ed. La Table

d’Émeraude publicará em 1991 La chevalerie amoureuse, troubadours, félibres et rose-

croix (un manuscrit inédit de Pierre Dujols), com apresentação e comentários de J.-F.

Gibert e em 1992 La Chevalerie errante de André Coia-Gatie, livros que retomam a

“linguagem dos pássaros”, alquímica, tão cara a Fulcanelli, Canseliet e seus discípulos

agrupados na revista “La Tourbe des Philosophes”.

A actividade editorial de livros de Alquimia, grande parte dos quais são tratados

clássicos dos séculos XV a XVII, continua em bom ritmo até ao fim do século. Em

1994 é publicada uma obra com uma interpretação tecnico-científica da Alquimia La

Pierre philosophale. Étude rationelle de l’alchimie, de Albert Cau, nas ed. Col du Feu,

Paris.

145
Em 1997 é publicado La Pratique du Grand Oeuvre des philosophes por

Rouillac Piémontais, na colecção “Classiques de l’Alchimie”, dirigida por Geneviève

Dubois, nas Éditions Dervy, Paris. Nesta editora – que publicara em 1994 Propos sur la
Chrysopée, suivi du manuscrit de Pierre Dujols-Fulcanelli traitant de la pratique de

l’alchimie, de Jean-François Gibert – foi também publicado em 1997 a obra, Le

Psautier d’Hermophile seguido do Dictionnaire élémentaire à l’usage des jeunes

disciples d’Hermés. Em 1998 são publicados Le Livre d’Or de l’Alchimie de Jean-

Pascal Percherron e Le Livre d’Or de l’Alchimie de Jean-Pascal Percherron, ambos nas

Éditions Ramuel – que já publicara em 1994 L’Aura bleu du du Mercure alchimique de


Petri Murien (que já publicara, algo de semelhante, em 1986 e 1989), e Eric Saint-Clair

- e em 1999 serão publicados Traduction alchimique du “Siphra di tzeniutha” de

Moise, de Roger Caro, nas Éditions du Sphinx, L’Alchimie, antique science de demain,

de Loic Tréhédel, nas Éditions du Rocher, com prefácio de Rémi Chauvin, Alchimie

Kabbalistique, Spagyrie Végétale & Radiesthésie Vibratoire, de Jean-Luc Roime, nas

Éditions Col du Feu, Orcier e Ces Hommes qui ont fait l’alchimie au Xxe. Siècle, de

Geneviève Dubois, por Geneviève Dubois éditions, Grenoble. Ainda em 1999 terá lugar

um acontecimento editorial que causou grande polémica: a publicação de Finis Gloriae

Mundi, “atribuido” a Fulcanelli (o que levantará acesa polémica), com prefácio de

Jacques d’Arés, e editado em Londres, por Liber Mirabilis. Em 2000 será a vez de La

Génération & opération du grand oeuvre pour faire de l’or (sec. XVII), na mesma ed.

de Grenoble, Alchimie. La voie des amalgames ou voie de synthèse, de Jean-Pascal

Percheron, nas ed. L’Ignitiation, Morée e de Alchimie Science divine- L’Alchimie

révélée par l’image. L’Alchimie enfin réhabilitée, de Jean Deleuvre, nas Éditions

Ramuel, Villeselve e Le Grand Oeuvre alchimique de Eyrenée Filalète et Basile

Valentin, do português Rubellus Petrinus, nas Arcadis éd. , Amiens (trad. fr. da ed.

portuguesa de 1997, Hugin ed.).

No entanto, de todos os livros publicados, os que mais influência directa tiveram


sobre os alquimistas operativos franceses, foram, em 1972, L’Alchimie expliquée sur ses

146
textes classiques, de E. Canseliet, no editor Jean-Jacques Pauvert, Paris (reedição

aumentada em 1980), em 1975, Les clefs secrètes de l’alchimie des anciens de Fabrice

Bardeau, na editora Robert Laffont, Paris, e em 1978 a publicação de Le Feu du Soleil,

de Robert Amadou, por J.-J. Pauvert, contendo uma entrevista de três horas a E.

Canseliet - onde este alquimista declara ter reencontrado (pela última vez) Fulcanelli,

em 1952, em Espanha. Muito importante, pelas indicações operativas que dá, foi a

publicação do livro de Atorène Le laboratoire alchimique editado em 1982 nas edições

Guy Trédaniel/La Maisnie, Paris. A publicação de Les fondements de l’alchimie de

Newton da Profª. Betty Dobbs (que decorre da sua Tese de Doutoramento), com

prefácio de Sévérin Batfroi, nas edições de La Maisnie, em 1980, também ajudou muito

oa alquimistas operativos – mesmo os que desprezavam os intelectuais e os

“especulativos” – a elucidar alguns pontos enigmáticos da Obra, que Newton esclarecia

com as suas notas manuscritas, estudadas e publicadas pela universitária americana. No

final do século são publicados tratados alquímicos clássicos de grande interesse para a

prática operativa, como, em 1989, L’Alchimie de Flamel (1772-3), do Cavaleiro Denis

de Molinier, com prefácio de Fabrice Bardeau, nas èditions d’Art Savary e em 1992, Le

procédé de Monsieur d’Anvers (1722), por Fabrice Bardeau, nas edições J.M. Savary,

Carcassone, L’entrée du labirynthe de Gilles Pasquier, Introduction à l’Alchimie, suivie

des Récréations hermétiques et des Scholies, deux manuscrits d’alchimie du XIXe

siècle, editado nas edições Dervy e Poelle Alchimique de Winthertur et le feu des sages.

Étude analogique du symbolisme hermétique par la pratique philosophique selon

l’enseignement de Fulcanelli et d’Eugène Canseliet, de Jean Laplace, Ed. J. M. Savary,

Carcassonne. Muito importante também no domínio da alquimia operativo-laboratorial

foi a fundação, em Grenoble, por Jean Laplace, da revista trimestral “de estudos

alquímicos”, La Tourbe des Philosophes, na qual E. Canseliet colaborará assiduamente,

até à sua morte em 1982, com uma rubrica intitulada “Alchimiques mémoires”. Dessa

revista falaremos a seguir.

147
As revistas periódicas de Alquimia (extra-grupos estudados)

- Revista “La tourbe des Philosophes”

Reunindo Canseliet e os seus discípulos Laplace, de la Faverie, Béatrice, Batfroi

e um grupo que mais tarde se intitulará “Les Compagnons du Feu” (animado por

Laplace e La Faverie), embora não sendo uma “escola” alquímica, a “Tourbe des

Philosophes” veícula uma filosofia alquímica geral com um nível cultural bastante

apreciável e reúne alquimistas e simpatizantes da Arte de Hermes, na sua maior parte

discípulos da corrente “Fulcanelli e Canseliet”. Fundada em 1977 em Grenoble, por

Jean Laplace, a revista trimestral “de estudos alquímicos”, “La Tourbe des Philosophes”

terá como principal colaborador E. Canseliet que colaborará assiduamente com uma

rubrica intitulada “Alchimiques mémoires” que abria a revista, logo a seguir ao

editorial. Em 1979 a revista pasa a ser publicada pelo editor parisiense Bernard Renaud

de la Faverie, também proprietário da livraria La Table d’Émeraude (25, rue de la

Huchette, junto ao Quai Saint Michel, onde havia também, a livraria Éditions

Traditionelles). Ambas – La Tourbe e La Table – tiveram um importante papel no

desenvolvimento e divulgação da Alquimia em França (e não só), no último quarto do

séc. XX. A “Tourbe” incluirá ao longo dos seus 39 números – nº. 38-39 do 2º. Trimestre

de 1995, aguardando-se o nº. 40 desde essa data -, muitos artigos de alquimia operativa,

juntamente com outros, também sobre Alquimia, numa perspectiva cultural, filosófica e
espiritual bastante interessante e alargada. Dois anos antes da sua morte, em Savignies,

em Abril de 1982, a “Tourbe” publicará no seu nº. 10, um número especial de

homenagem aos 80 anos de Eugène Canseliet.

Ao estudarmos a “Tourbe des Philosophes”, para nos aproximarmos das suas

características mais notáveis, vamos centrarmo-nos nos seus editoriais - sobretudo, a


partir do nº. 6, os de Bernard Renaud de la Faverie, novo editor e director da revista,

148
após a saída de Laplace, em 1979 - e nos artigos dos seus mais influentes

colaboradores, como, por exemplo, Guy Béatrice e Sévérin Batfroi. Mas também

indicaremos outros artigos de outros autores para ilustrar a natureza plural da revista e a

diversidade de temas que - no quadro da “Alquimia Tradicional” - são aí tratados.

Num dos primeiros números desta revista fundada por Jean Laplace - cujo

primeiro número data do 4º. trimestre de 1977215- num texto assinado por Guy Béatrice,

podia ler-se aquilo que era um verdadeiro manifesto da Alquimia Operativa: “Il

faudrait que l’on cessât enfin, définitivement, de présenter au public, voire aux

spécialistes, l’Alchimie comme étant «une sorte d’approche figurative des réalités
archetypiques de l’homme et de sa pensée». Cette vision de l’Alchimie est un total

contresens et ne correspond à aucune réalité historique. (...) Ce que les universitaires et

tous les partisans d’une Alchimie «spiritualiste» n’ont pas encore compris, semble-t-il,

et ce malgré les travaux importants de Fulcanelli, d’Eugène Canseliet, de Claude

d’Ygé et de René Alleau, c’est que l’Alchimie n’est en rien une théosophie, mais bien

une métaphisique expérimentale, une «philosophie» naturelle manipulatoire


pratiquée en laboratoire sur la matière, au sein même de la nature”216. No entanto,

segundo a “Tourbe” - ou melhor segundo os autores da revista, já que embora haja uma

certa convergência de pontos de vista, essa convergência não é uniformidade, nem

muito menos unicidade, pelo menos quanto às linguagens - a Alquimia não é apenas

uma “manipulatória” material, embora ela se exerça sobre os materiais. De facto, outro

discípulo de Canseliet, Sévérin Batfroi, num artigo intitulado “Le disciple d’Hermés et

ses vertus”, escrevia: “Les Artistes ont lourdement insisté sur le fait que la seule

connaissance du «modus-operandi» - laquelle disent-ils, tiendrait en une vingtaine de

lignes - n’est point l’essentiel de la quête alchimique. Fulcanelli lui-même signale cela

dans les «Demeures Philosophales», lorsqu’il affirme: «Si l’Alchimie se bornait à

215”La Tourbe des Philosophes - revue d’études alchimiques”, Directeur et Redacteur en chef: Jean
Laplace, Éditions de la Tourbe, 9, Place Championnet, Grenoble
216Guy Béatrice, “Les Livres et les revues”, recensão crítica do livro “Raymond Lulle” de Jean-Claude
Frère, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 2, 1er. trimestre de 1978, p. 63

149
l’acquisition d’une technique spéciale, de quelque artifice de laboratoire, elle se

réduirait à fort peu de chose et n’excéderait pas la valeur d’une simple formule»217.

Logo, uma rejeição da única dimensão técnica da Alquimia. Mas o que é que
diferencia a Alquimia da mera Química? Desde logo, como já vimos anteriormente, a

atitude espiritual do operador que deve estar en sintonia com o verdadeiro objectivo da

Obra: “Oui, le Philosophe Hermétique véritable se propose un but extrêmement élevé

selon que le résume parfaitement Joannès de Monte-Snyders dans sa «Commentatio de

pharmaco catholico» (...): «Omniscient et Omnipotent, Dieu est l’Alpha et l’Oméga, LE

PRINCIPE ET LA FIN DESIRÉE, LE BUT DE NOTRE INTENTION, celui qui, par les

rayons de sa lumière divine, doit nous conduire et diriger vers le but: heureux, en verité

ceux qui comprennent cette lumière avec la pénétrante diligence de leur intelligence, et

qui en sont illuminés et puis écartés des erreurs”(...)218.

O alquimista, nesta perspectiva (que não é a única), tem de ser um crente em

Deus – quer ele seja deísta ou teísta -, crença que iluminará a sua relação com a matéria

transformada pela Obra. Como refere Sévérin Batfroi: “Alexandre Sethon énumère les

vertus philosophiques avec beaucoup de précision, en sorte que nous lui laissons

maintenant la parole: «Les scructateurs de la Nature doivent être tels qu’est la Nature

même: c’est-à-dire vrais, simples, patients, constants, etc., mais, ce qui est le principal
point, pieux, craignant Dieu et ne nuisant aucunement à leur prochain»(op. cit.,

p.45)”219. Outra característica que diferenciará a Alquimia da Química é a utilização

de processos idóneos a tornar os materiais “filosóficos”, isto é, alquímicos. E disso

tratará a “Tourbe des Philosophes”, com a linguagem simbólica tradicional da

Alquimia, num estilo que está na senda de Fulcanelli e de Canseliet.

217Sévérin Batfroi, “Le Disciple d’Hermés et ses vertus”, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 4 (3e. trim
1978), p. 16-17
218ibid., p. 17
219Sévérin Batfroi, citando “La nouvelle Lumière Chymique”, no artigo “Le Disciple d’Hermés et ses
vertus - 2e. partie”, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 5 (4e. trimestre de 1978), p. 17

150
A partir do nº.6, a revista tem novo director - Faverie - e editor - o próprio,

proprietário da livraria esotérica de Paris, “La Table d’Émeraude”, frequentada por

alquimistas (entre os quais, Canseliet) a qual desempenhará um papel importante, entre

outros, no ressurgimento e divulgação da Alquimia Tradicional na segunda metade

deste século. No nº.8 da “Tourbe”, surge, em editorial, um texto do seu director, “une

mise au point qui était grandement nécessaire et qui donne l’orientation définitive de la

revue”. Assim, sem negar o papel da operatividade laboratorial na Alquimia

Tradicional,“clássica”, Bernard Renaud de la Faverie insiste, na senda do célebre artigo

do Professor Antoine Faivre, da Sorbonne - já citado anteriormente, neste trabalho - no

carácter “universal” da Alquimia e do processo alquímico:”Ce n’est pas en vain que les

alchimistes se nomment philosophes. L’Alchimie est une philosophie, une vision du

monde, une voie illuminative qui depuis de la Table d’Émeraude d’Hermés Trismegiste

est à la recherche d’une loi universelle et d’une conception toute particulière des

rapports entre Dieu, l’homme et l’univers. C’est donc avec raison qu’on puisse

rechercher la loi alchimique et les structures de la démarche alchimique dans bien de


domaines que dans la seule pratique alchimique”.220 No entanto, escreve

Faverie,“plus on découvre de nouveaux domaines qui confirment la véritable alchimie,

plus il devient urgent de préciser sa démarche et sa particularité. Trop de choses ont

été appelés alchimie depuis la fin du XIXe. sciècle. La encore la recherche d’Antoine

Faivre peut être trécieuse. L’Alchimie contient un certain nombre de démarches

précises. Que se soit la corporisation de l’esprit, et la transmutation dans le règne

minéral, la régénération ou la rédemption dans l’homme, le perfectionnement dans la

nature, il s’agit toujours d’une seule et même chose”221.

Esta definição de uma Alquimia “generalizada”, “filosófica”, assenta no texto de

Faivre - de que voltamos a citar a sua parte essencial, por ter sido apropriada pela

“Tourbe”: (a Alquimia é) “une Weltanschauung à la fois cosmogonique, cosmologique

220Bernard Renaud de la Faverie, “Éditorial”, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 8 (3e. trim. 1979), p. 4
221ibid., p. 5

151
et eschatologique. Mas ela assenta também em algumas correntes herméticas e na

tradição de uma certa teosofia alquímica do século XVIII, incarnada por Jacob Boheme,

o qual escreveu em «Signatura Rerum» (Cap. VII, 78) - e Faverie cita-o - a seguinte

frase: “Il n’y a pas de différence entre la naissance éternelle, la réintégration et la

découverte de la Pierre Philosophale” 222.

Convém, no entanto, apesar desta reclamada “generalidade” e “generalização”

da Alquimia, delimitar fronteiras: “il est clair que la définition philosophique de

l’Alchimie ne convient nullement à une spéculation de métaphysique pure qui consiste

en séparation seule, à la psychanalyse, qui se cantonne, dans le mélange et la

confusion, à un naturisme moral ou écologique du retour à la nature ou à sa réduction

à un symbolisme abstrait, car le côté opératoire est ici essentiel”223. Esta perspectiva

da Alquimia, tinha raízes remotas nas interpretações simbólicas de “mansões filosofais”

feitas por Fulcanelli e por Canseliet, nas suas especulações sobre o “fim dos tempos”,

mas encontrava, sobretudo, antepassados próximos nos livros de Guy Béatrice e de

Sévérin Batfroi, publicados entre 1976 e 1979, “Terre du Dauphin et Grand Oeuvre

Solaire” (1976), assinado por ambos, “Sainte Anne d’Alchimie” (1978), “Le vaisseau

du salut et l’or des alchimistes” (1978) de Guy Béatrice e “Alchimie et Révélation

Rhrétienne” (1976), “Alchimiques métamorphoses du Mercure Universel” (1977) e “Du

Chaos à la Lumière” (1978) de Sévérin Batfroi. Estes livros foram muito importantes

por terem tornado pública esta perspectiva “generalizada” da Alquimia. Seria contra

esta perspectiva que, mais tarde, Solazaref vai levantar a voz da “Tempestade” centrada

numa Alquimia exclusivamente laboratorial? Cremos que sim. Seja como for, a

“Tourbe” continuou a publicar artigos com indicações mais ou menos explícitas sobre a

Alquimia laboratorial, a maior parte das vezes veladas pelo mais tradicional simbolismo

alquímico num contexto de grande erudição.

222ibidem
223ibidem

152
De qualquer modo, como conciliar o artigo de Béatrice, sobre a operatividade da

Alquimia - que recusava a “alquimia espiritual” dos universitários e dos espiritualistas -

com este editorial de Faverie em que uma perspectiva “generalizada” da Alquimia passa

a incluir também a teosofia224? No número seguinte da “Tourbe”, o nº. 9 (do 4º.

trimestre de 1979, mas publicado em 1980), o editor escreve para quem tivesse ficado

com dúvidas: “L’Alchimie opérative, classique, traditionelle est pour nous la base

incontestable de tout notre effort. Sans elle, la réflexion dite alchimique n’aurait plus
de sens. Son Maître incontesté au XXe. sciècle, sucesseur de Cyliani et Fulcanelli, est
Eugène Canseliet”. E, como para justificar o estilo dos artigos da revista - e o estilo dos

livros dos seus colaboradores - Faverie escreve: “Les alchimistes de tout temps ont eu

un langage spécifique d’une poésie incomparable. S’ils l’ont toujours utilisé, c’est

qu’ils le cryaient apte et indispensable pour communiquer leur Art. C’est donc

l’alchimie opérative, son simbolisme, son langage, sa pure tradition, celle qui a été

honorée par les générations des Artistes, qui est et sera pour la Tour des Philosophes

son fondement. C’est elle qui a assuré la continuité de leur Art. La philosophie y

rejoint la beauté. «Les Mystères des Cathédrales» est non seulement un exceptionel

traité d’alchimie, mais aussi un des plus grands livres de la littérature française de ce

sciècle. La France a eu la chance d’avoir aujourd’hui encore de nombreux tâcherons


de l’alchimie opérative, dont M. Canseliet est le symbole et le maître”225. E, após

comparar esta situação privilegiada com a reflexão filosófica que predomina nos livros

que são publicados, sobre o mesmo tema, nos países anglo-saxões, aos quais “manquant

d’épine dorsale, celle-ci se dilue souvent dans une psychologie ou un symbolisme

flous”, Faverie afirma, voltando à sua - e de Béatrice, e de Batfroi - Alquimia

“Universal”: “Mais non moins précieuse pour nous est la pensée alchimique et sa

vision du monde”. Por isso, ele diz: “Aussi nous saluons l’effort de tous ceux qui -

comme nos amis et collaborateurs Sévérin Batfroi et Guy Béatrice - oeuvrent pour

224 Não se trata, claramente, do teosofismo orientalisante de Blavatsky, denominado vulgarmente de


“teosofia”, mas da teosofia ocidental
225Bernard Renaud de la Faverie, “Éditorial”, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 9 (4e. trimestre 1979),
p. 4

153
témoigner la présence de la pensée alchimique”.226 Mas vejamos melhor em que

consistia a contribuição de Batfroi e de Béatrice para essa alquimia “universal”; para

isso, registemos o que escreveu, sintéticamente, o primeiro destes autores no nº.9 da

“Tourbe”: “Nous venions tout bonnement de confirmer que l’Alchimie, dans son

universalité, s’exerce unanimement dans tous les domaines de l’activité vitale.

Autrement dit, le «modus operandi» de l’oeuvre minéral peut rigoureusement


s’appliquer à l’histoire, aux mythologies, aux réligions, à la création artistique, etc.

(...)

E para que não se confunda esta posição com a teoria de Jung sobre a Alquimia,

Batfroi esclarece: “Par conséquent, ce que nous répétons ici, c’est que du macrocosme

au microcosme, de l’Univers à l’homme, tout suit une progression qualitativement

identique et dont le Grand Oeuvre d’Alchimie nous permet de prévoir le déroulement.

Ansi, donc, l’Ouvrage Minéral témoigne à la perfection du Grand Oeuvre divin qu’est

Création, et ceci pour chacune de ses phases. Toutes choses qui dépassent la

conception de Jung qui voulut que l’Alchimie s’exerçât également dans l’inconscient

collectif humain. Nous entendons donc démontrer qu’elle est surtout l’Archétype des

archétypes, c’est-à-dire, le reflet de la Divine Activité dans l’Espace et le Temps...” 227


ou, como escreveu Guy Béatrice, noutro artigo do mesmo nº. da “Tourbe”: “l’archetype

universel de création”228

Esta filosofia, sustenta Faverie, está presente hoje na Universidade, “elle pénètre

même à l’Université. Grâce à des travaux de Eliade, Corbin, Gilbert Durand, Antoine

Faivre, Frédéric Tristan - tant d’autres. La pensée et la logique des alchimistes (...).

Tout cela, ainsi que l’hermétisme, la Kabbale chrétienne (...), le symbolisme, la

pensée des grands théosophes, entre dans nos préoccupations. Telles sont nos options

226ibid., p. 5
227ibidem
228Guy Béatrice, “Graal et Alchimie”, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 9, p. 23

154
fondamentales et nous invitons tous les collaborateurs de bonne volonté de s’unir à
notre effort”229.

A “Tourbe” segundo afirma Bernard Renaud de la Faverie, não é uma “capela”


pois está aberta a opiniões “contraditórias”, salvaguardando “notre position sur la

fraternité et la complémentarité du Christianisme et de l’Art”, mas, mesmo aí “les

interprétations diverses sont possibles”. No entanto, a revista não dará guarida a

posições anti-religiosas: “toute inutile attaque des valeurs fondamentales de la religion

ne trouvera pas de place ici”.

Embora na “Tourbe” tenham aparecido vários artigos sobre alquimia operativa,

tratando de várias vias (via húmida, via seca, etc), é evidente de que a via que é a mais

característica desta revista é a “via seca de Fulcanelli”, seguida por Canseliet embora,

tanto o Mestre como o discípulo tenham tratado, também, de outras vias (a das

amálgamas, por exemplo). Uma questão importante que irá marcar a diferença entre a

“Tourbe” e a Filiação Solazaref é a da Espagíria que, segundo o “proto”-Solazaref,

Pierre d’Houches e, mais tarde, segundo o próprio Solazaref, é uma via com a dignidade

de qualquer outra mas que, segundo esta revista, não é uma via alquímica.

A “Tourbe” proclama-se, entretanto, contra os “falsos alquimistas”: “nous

savons que des faux alchimistes existen et ont toujours existé. Nous croyons que ceux

que les Anciens traitaient de faux philosophe étaient des gens qui trompaient le monde

en indiquant dans l’alchimie de fausses matières premières, en conseillant l’usage du

mercure vif, donnant des recettes frauduleuses pour le travail. Nous en voyons encore

aujourd’hui qui nous promettent d’expliquer en un seul volume le Grand Oeuvre, dansd

un langage de livres de cuisine et sans rien en cacher ou d’accomplir devant vous en

deux heures. Nous éviterons soigneusement tout contact avec eux.”230

229ibid., p.5
230ibid.

155
Revista “L’Alchimie”

Publicação, em 1999, do 1º. Número (Outubro) da revista trimestral,

L’Alchimie, nas Arcadis Éditions, Amiens, dirigida por Pierre-Alexandre Nicolas e

Karine Nicolas-Alcalay, fundamentalmente dedicada à alquimia operativo-laboratorial.

Os números 2 (Janeiro a Março) e 3 (Abril a Junho), sairam, com pontualidade, no ano

2000. De destacar, nestes números, dossiers sobre alquimistas praticantes como Jean

d’Ambre, J.-P. Percheron e o português Rubellus Petrinus. De notar ainda a colaboração

de Patrick Rivière, Fabrice Bardeau e, também de Jean Deleuvre

Números especiais de revistas não alquímicas

Esotéricas
- 1987: Publicação do nº. 114 (4e. trim 1987) da revista “L’Autre Monde” - Nº.

Spécial “Alchimie”, com artigos de Patrick Rivière (“Alchimie opérative, alchimie

spirituelle”), Robert Amadou, Pierre Carnac, etc.

- 1994: - Publicação do nº. 138 (Julho 1994) da revista “L’Autre Monde”, do

dossier “Les Transmutations ou comment changer la nature des choses”, com artigos de

diversos autores, entre os quais Pierre Carnac, Robert Amadou e Richard Khaitzine.

- 1997: - Publicação de La Sainte Science – L’oeuvre alchimique par la voie de

la sagesse, no nº. 385 (Primavera de 1996), da revista “Atlantis”, Vincennes, com

artigos de Fabrice Bardeau, Richard Khaitzine, etc.. O nº. 391 da mesma revista –

intitulado Le vin – banale et noble abstraction, também apresenta em “exclusivo” o

artigo Newton – un manuscrit alchimique retrouvé à New York, de Vlaicu Ionescu e

Fabrice Bardeau.

- 1998: Publicação de Alchimie – cantenaire de la naissance d’Eugène

Canseliet, no nº. 398 (3º. Trimestre de 1999) da revista “Atlantis”, con sede em
Vincennes.

156
Revistas académicas sobre esoterismo e alquimia

- 1982: Publicação do nº. 322 (Septembre-Octobre 1982), da revista “Atlantis”,

intitulado Hommage au Maître Alchimiste Eugène Canseliet, F.C.H. (1899-1982).

- 1983: Publicação na revista Le Fil d’Ariane (Waulhain-St.-Paul, Bélgica),

nº.19, de Explication de la teinture.. (1781), de Alexandre von Suchten

- 1985: Primeiro número da revista A.R.I.E.S. da Association pour la

Recherche de l’Information sur l’Ésotérisme (Meudon), dirigida por Antoine Faivre,

a qual publicou, entre outros artigos com estudos de alquimia, um número monográfico

intitulado “Paracelse et les siens”: nº. 19 da revista A.R.I.E.S., dirigida por Antoine

Faivre, contendo as actas do colóquio realizado em Dezembro de 1994, na Sorbonne

- Publicação de De la Pierre Philosophale de Jean Vauquelin des

Yveteaux, de De l’arbre de vie ou de l’arbre solaire, com comentários de Sylvain

Maton, no Tomo I da revista de História da Alquimia, Chrysopoiea, dirigida por

Sylvain Matton e publicada pela “Société d’Études pour l’Histoire de l’Alchimie”,

com o apoio do “Centre National des Lettres” . Comentários de Sylvain Matton. O tomo

II desta revista, publicado em 1988, inclui Commentaires sur l’épitaphe et les plaques

de Nicolas Flamel, também com apresentação de Sylvain Matton. A revista publicou

ainda mais dois Tomos, o III (1989) e o IV (1990-1991).

Revistas não esotéricas

- 1996: - Publicação do nº. especial (598, de Dezembro de 1996) da revista “Sciences et


Avenir”, intitulado De l’Alchimie à la Chimie.

157
Congressos, exposições e conferências públicas

- Publicação de Alchimie. Contribution à l’histoire de l’Art Alchimique, de

Jacques Van Lennep, Crédit Communal de Belgique, Bruxelas; reed. em 1985, na

Dervy Livres. Este é o catálogo da grande Exposição realizada em Bruxelas, de

Dezembro de 1984 a Março de 1985, sobre “A Alquimia, a sua Arte e a sua

prática”.

- Em 1989- Publicação de Symboles Spirituels de l’Alchimie - catálogo da

Exposição do Festival Internacional de Esoterismo -, realizado em Carcassonne em

Novembro de 1988 na Bibliotheca Philosophica Hermetica, Amsterdam.


- Publicação de Alchimie et Philosophie, actas do Colóquio internacional de
Tours, 4-6 de Dezembro de 1991, por J.-C. Margolin e S. Matton, nas ed. Vrin.

- Realização, em Fevereiro de 1992, de um Colóquio sobre Alquimia

denominado 2.e Forum de la Tradition Occidentale - Alchimie, organizado por

Jacques d’Arés e pela revista Atlantis, no edifício da Mairie de Vincennes, em

Fevereiro de 1992. Decorreu ao mesmo tempo, uma exposição de Alquimia operativa,

organizada pelos “Compagnons du Feu” (Jean Laplace, Bernard Renaud de la

Faverie, etc.), onde se podia ver diverso material de alquímico, entre o qual um

Athanor.
- Colóquio intitulado “Paracelse et les siens”, realizado em Dezembro de 1994

na Sorbonne, organizado pela revista A.R.I.E.S., dirigida pelo Prof. Antoine Faivre,

cujas actas serão publicadas no nº. 19 desta revista

- Realização do Coloquio sobre Eugène Canseliet, a 4 e 5 de Dezembro de

1999, na sala da antiga Sociedade de Geografia (criada por Ferdinand de Lesseps) e no


anfiteatro Louis Liard, na Sorbonne, respectivamente. Foram oradores, entre outros, a

158
filha de E. Canseliet, Béatrix, Henri Bodard, Bernard Renaud de la Faverie, Stanislas

Klossowski de Rola, François Trojani, Patrick Rivière, Fabrice Bardeau, Paolo Lucarelli

e Richard Khaitzine. Ausência da “Filiação Solazaref” e dos “Filósofos da Natureza” –

que a seguir estudaremos – ambas assoladas por problemas internos e cisões.

DIFUSÃO POR NOVAS TECNOLOGIAS

É uma característica dos NMR e EA, a utilização das novas tecnologias –

cassettes, CD-ROM, Internet, etc. - para difundir as antigas ou novas sabedorias.

Cassettes

1985- Publicação, em cassette, de uma conferência de Alain Serrière, Alchimie

Opérative et Alchimie Spirituelle, editada pela Associação Atlantis, Vincennes. A via

operativa indicada pelo autor é a “via do cinábrio” de Roger Caro.

CDs editados

Em 2000 foram editados dois CD-ROM:

- Publicação do CD-ROM, Boréal- Points Zero, ou les alchimistes de la

République, de Richard Khaitzine e Patrick Rivière, com a colaboração de Johan Dreue,

na Archimed Diffusion, Parmain.

– Edição do CD-ROM, Fulcanelli – La Chronique d’un mystère annoncé, de Richard

Khaitzine, com a colacoração de Johan Dreue, na Archimed Diffusion, Parmain.

159
Sítios na Internet

O primeiro site na nternet comçou nos anos 90, por iniciativa do escocês Adam

McLean – editor de “The Hermetic Journal” – e tem o título de Alchemy. É o maior sitio
da Internet dedicado à Alquimia.

Em 1999 começou o sítio francês Contrepoints, com interessantes elementos

sobre Alquimia (livros, revistas, artigos, cursos, etc.). A iniciativa é de Archimed

Diffusion e Johan Dreue.

160
V - A ALQUIMIA OPERATIVO-LABORATORIAL DO ÚLTIMO QUARTEL

DO SÉCULO XX: GRUPOS FRANCESES

O estudo que realizei para este Trabalho de Tese, junto dos grupos alquímicos

franceses do último quartel do século XX, decorreu nas seguintes frentes: a) estudo de

livros, revistas, etc., publicados pelos grupos; b) conversas com diversos alquimistas,

pessoal ou epistolarmente; c) trabalho de campo junto dos grupos alquímicos

Relativamente ao material utilizado para este trabalho, ele foi constituído pelos

ensinamentos (escritos ou orais) que os próprios grupos ou os seus membros tomaram a

iniciativa de divulgar de uma maneira ou de outra: livros, boletins, reuniões, seminários,

“cassettes”, etc. e por fotografias tiradas nas reuniões. Tivemos autorização expressa de

Jean Dubuis dos “Philosophes de la Nature” e de Patrick Rivière de “Spagy-Nature”

para a publicação desse material. Mesmo nos grupos em que não pedi autorização para

publicação do material recolhido, como no caso da “Filiação Solazaref”, a verdade é

que todas as publicações foram vendidas a quem as encomendava directamente (com

excepção das reservadas, a que aliás não tive acesso), encontrando-se até algumas à

venda em livrarias de esoterismo – vide Bibliografia e Anexos. Sempre apareci junto

dos alquimistas e grupos alquímicos como um interessado na Alquimia, mas também

como alguém que a queria estudar em todas as suas dimensões, mesmo numa

perspectiva universitária. Esta minha negociação e afirmação da identidade como

estudioso da história, da filosofia, do simbolismo e da prática do fenómeno –

observando-o “de fora”- e, ao mesmo tempo, fascinado pelo mesmo – participando “por

dentro” - foi aceite sem problemas pelos grupos, excepto junto da Filiação Solazaref,

com alguma desconfiança relativamente aos “intelectuais” e aos “especulativos” (apesar

de eu trabalhar, em determinada altura, também com o grupo). Na verdade tive esta

perspectiva de “observador participante” desde o início dos meus estudos, mas ela só

161
adquiriu (assim o espero) a teoria e a metodologia necessárias para um estudo

antropológico, após o termo das minha observações participantes.

Realizei “trabalho de terreno”, participando em trabalhos de alquimia operativo-

laboratorial junto dos seguintes grupos:

- “Les Philosophes de la Nature”, recebendo os seus ensinamentos sob a forma

de monografias, durante cerca de 10 anos (a partir de 1983), e frequentando três dos

seus “estágios” práticos, um em França (em 90) e dois em Portugal (93 e 94) – ver

Anexos;

- “Filiation Solazaref”, lendo as suas publicações e realizando trabalho de

alquimia operativo-laboratorial junto da “etnia portuguesa”, durante a segunda metade

dos anos 80 (em especial, nos anos de 86 a 89).

Segui um ensino por correspondência e mantive contacto com alguns dos seus

membros, com outros dois grupos:

- a associação “Spagy-Nature”, dirigida por de Patrick Rivière, seguindo as suas

monografias, entre 1986 e 1990, tendo privado com o seu lider várias vezes em França

e trocado correspondência com ele (ver Anexos);

- e comecei, a partir de 1996, o programa de estudos (prévio à prática) dos

“Frères Aînés de la Rose-Croix” (F.A.R.C.), sob a orientação de Elisabeth Demange e,

depois, de François Devaux (a partir de 1998); anteriormente jás tinha estabelecido

contactos epistolares com o seu fundador, Roger Caro (ver Anexos).

Noutro plano, frequentei a livraria parisience “La Table d’Émeraude”

especializada em obras sobre o Esoterismo em geral e a Alquimia em particular. Esta

livraria era muito frequentada por esoteristas e alquimistas de várias escolas maa

sobretudo pela linhagem alquímica de Fulcanelli e de Canseliet - o qual, no lançamento

da nova edição do seu livro Deux Logis Alchimiques me dedicou pessoalmente um


exemplar - e acompanhei, desde o seu início, a já mencionada “revista de estudos

162
alquimicos”, La Tourbe des Philosophes, editada pela livraria e que agrupava, até ao

seu termo, sobretudo os discípulos de Eugène Canseliet. Tive ainda contacto estreito

(para além do epistolar) com diversos alquimistas, franceses (p.e., Fabrice Bardeau),

espanhóis (p.e. Simon H.), norte-americanos (por exemplo, Hanz Nintzel) e portugueses

(Rubellus Petrinus), tendo em alguns casos participado nos seus trabalhos e, noutros

casos falado ou trocado correspondência com eles.

Começarei por referir os grupos que têm a ver com a linhagem alquímica

Fulcanelli-Canseliet – “Spagy-Nature e “Filiation Solazaref”-, para dar seguimento ao

que dissemos no capítulo anterior sobre a revista “La Table d’Émeraude” que agrupa

sobretudo os alquimistas desta corrente

“Spagy-Nature” e Patrick Rivière

Patrick Rivière é autor de vários livros sobre Esoterismo, entre os quais Sur les

sentiers du Graal231, e em particular de vários livros sobre Alquimia: Alchimie et

Spagyrie232, La Médicine Spagyrique233, La Médicine de Paracelse234 e L’Alchimie,

Science et Mystique235. Na sua primeira obra sobre alquimia, o autor coloca em fac

simile, uma carta de Eugène Canseliet, datada de 1973, que atesta uma relação

alquímica (pelo menos epistolar) desde essa data, entre o “Mestre de Savignies” e o

autor do livro, podendo sugerir inclusivamente uma relação Mestre-discípulo.

O que caracteriza os livros deste autor e alquimista é a sua assunção de uma

dupla tradição:

231 Patrck Rivière, Sur les sentiers du Graal, Paris, Robert Laffont, 1984; existe uma tradução para
português, editada no Brasil: Os caminhos do Graal, São Paulo, Ibrasa, 1988.
232 Patrick Rivière, Alchimie et Spagyrie, du Grand-Oeuvre à la Médicine de Paracelse, Caen, Éditions
de Neustrie, 1986.
233 Patrick Rivière, La Médicine Spagyrique, s.l., Éditions Capricorne, 1988.
234 Patrick Rivière, La Médicine de Paracelse, Paris, Éditions Traditionelles, 1988.
235 Patrick Rivière, L’Alchimie Science et Mystique, Paris, Éditions de Vecchi, 1990.

163
- a espagírica de Paracelso, continuada neste século por nomes como Armand

Barbault, Alexandre von Bernus e Albert Reidel (“Frater Albertus”) – nomes que

Patrick Rivière cita elogiosamente;

- a alquímica, de Fulcanelli e de Canseliet, não só no aspecto prático,

laboratorial – “via seca” – como no iniciático que o enquadra, particularmente com as

alusões à “Linguagem dos Adeptos”236, na verdade a “Cabala Fonética” que Fulcanelli

expõe e pratica nos seus livros.

Na contracapa do livro La Mécine Spagyrique, datado de 1988, pode ler-se que

Patrick Rivière - “N S H”237 - trabalha em Alquimia “há mais de quinze anos” tendo

criado “um pequeno laboratório de investigação” no domínio da espagíria – onde ele

“experimentou numerosos elixires e tinturas com vocação terapêutica” -, em Quercy, o

qual deu origem ao “Instituto de estudos espagíricos, SPAGY-NATURE”, sediado

em Molières (B.P. 4 – 82220 Molières)238: Chercheur indépendant depuis plus de

quinze ans, bien qu’entouré par de nombreux médecins, et oeuvrant activement dans ce

domaine particulier de la «Médicine Spagyrique», basée sur la Cosmo-Biologie, la

Psycho-Physiologie, la Minéralogie et la Phytothérapie, Patrick Rivière (N S H) a créé

un petit laboratoire de recherches dans le Quercy pour y expérimenter de nombreux

«élixirs et teintures” à vocation theurapeutique. Ces activités déboucheront finalement

sur la mise en place en 1983, de l’«Institut d’études spagyriques: «SPAGY-NATURE»

B.P. 4 – 82220 Molières» don’t il assume la direction et qui dispense l’enseignement de

la «Médicine Spagyrique» en France et à l’étranger.

Após ter colhido, no seu livro Alchimie et Spagyrie, a informação respectiva às

actividades alquímicas da escola de Patrick Rivière – fundada em 1983, apesar de ele se

dedicar à Alquimia desde os anos 70 -, estabeleci contacto epistolar com este alquimista

e escritor esotérico, em 1986, com o objectivo de aderir à Associação “Spagy-Nature”,

236 Ver capítulo 3 de Alchimie et Spagyrie, op. cit., pp. 54-69.


237 Desconhecemos o significado desta sigla, embora o “H” possa significar “hermético”.
238 Op. cit., contracapa.

164
com sede em Molières (França). Esta Associação dedica-se basicamente à Espagíria de

Paracelso, enriquecida com as já citadas contribuições mais recentes de Albert Riedel

(“Frater Albertus”), Alexandre von Bernius, Armand Barbault, etc.. A elaboração de

prepações espagíricas destina-se – como é anunciado por P. Rivière – à sua utilização

em “Medicina Hermética”. Esta utilização é acompanhada por terapeutas e médicos. A

Spagy-Nature é fundamentalmente um círculo exterior dedicado à Espagíria, no interior

do qual existe um círculo interior dedicado à Alquimia metálica, o “CHRC-HM”.

Uma vez admitido, passei a receber – mediante uma quantia que orçava os 100

FF mensais – 42 “monografias”239 mensais – sobre Espagíria e sobre Alquimia -

denominadas Solve et Coagula, assim como me foi facultado (na minha qualidade de

associado) material diverso sob a forma de fotocópias de artigos teóricos e práticos

respeitantes à Alquimia. Adquiri, ainda, dois livros editados por Spagy-Nature para os

seus sócios e ambos com introduções de Patrick Rivière:

- L’Alchimie et son Livre Muet – Mutus Liber d’Altus – fac-similé de l’édition de

La Rochelle, Molíères, Spagy-Nature, s.d., numa tiragem de 50 exemplares (da qual

possuo o nº. 22) – esta edição do Mutus Liber apresenta a particularidade de ter as

gravuras (Planches) pela ordem que P. Rivière considera a correcta;

- Le Triomphe Hermétique ou La Pierre Philosophale Victorieuse , de Limojon

de Saint-Didier, Spagy-Nature, Molières, s.d., numa tiragem, igualmente de 50

exemplares (da qual possuo o nº. 12).

Antes de conhecer pessoalmente este alquimista, mantive alguma

correspondência trocada com ele – de 1986 a 1992 -, a qual me permitiu obter algumas

referências suplementares respeitantes ao presidente desta associação e, também, à

própria Associação. Assim, poderei afirmar que Patrick Rivière é de fácil acesso, e de

trato cordato, mesmo simpático, não guardando grandes distâncias a quem o aborda

239 esta é o nome – utilizado na Ordem Rosa-Cruz AMORC- que se tornou habitual, para designar dos
fascículos enviados pelas designações esotéricas.

165
quer epistolar, quer pessoalmente. No entanto, a sua caligrafia – presente também nas

introduções às edições dos dois livros acima citados - é do tipo clássico, mesmo

artístico, na linha da de Eugène Canseliet (que transcreveu com o seu próprio punho e

editou “três antigos tratados de Alquimia”240), que não só é mais um elemento

identificador da sua intencional filiação na tradição alquímica do “Mestre de Savignies”,

como revela uma distância em relação à escrita corrente, moderna. A sua caligrafia tem,

pois, também uma função de separação e sugere de algum modo um mundo diferente,

separado, sagrado.

Patrick Rivière parece ter recebido outras transmissões além da alquímica, pois

numa sua carta datada de 20/11/90 (a mim dirigida) – ver Anexos - figuram, na

assinatura, para além do lema In Herma Trimegisto – que o coloca uma vez mais na

descendência iniciática de Canseliet (que assinava desta maneira241) - os símbolos

seguintes:

- S. I. , isto é “Supérieur Inconnu” – Superior Incógnito242 – o último e terceiro

grau iniciático do Martinismo – corrente que se pretende continuadora das doutrinas

oitocentistas de Martinez de Pasqually (teurgia) e, sobretudo do seu discípulo Louis-

Claude de Saint-Martin (a via cardíaca), quer nas suas vertentes, a “ocultista”, de

Papus, ou a russa, de Novikov. Desconhecemos qual é a linha iniciática que Patrick

Rivière seguiu. Note-se que o Martinismo é uma corrente que radica num tipo de

cristianismo esotérico – tendo a versão papusiana uma perpectiva mais sincrética e

“ocultista” do que a versão russa;

- C.B.C.S., isto é, Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa, último grau da Ordem

interna, cavaleiresca – de inspiração templária – do Regime ou Rito Escocês

Rectificado, maçonaria cristã, originária do século XVIII, criada por outro discípulo de

Martinez de Pasqually, Jean-Baptiste Willermoz, à qual, aliás, pertenceu o próprio

240 Eugène Canseliet ed., Trois Anciens Traités d’Alchimie – caligraphie et prolégomènes d’Eugène
Canseliet, F.C.H., Paris, Jean-Jacques Pauvert, 1975.
241 Vide reprodução fac-simile de uma carta de Canseliet a Rivière no livro deste último Alchimie et
Spagyrie¸ op. cit., p. 5.
242 Como escreveu Fernando Pessoa…..

166
Saint-Martin – pelo que se pode afirmar que se trata de um “martinismo maçónico e

cavaleiresco”. O Priorado que terá transmitido a P. Rivière este armamento terá sido o

“Prieuré Arcana” que ele refere noutra carta de 1992 (vide Anexos);

- “Chevalier de Notre Dame du Saint Graal”, outra transmissão cavaleiresca,

eventualmente – como os SI e os CBCS, com uma componente simbólica sacerdotal;

- R+C Aurea, o que parece ter a ver com a tradição da Rosa-Cruz de Ouro alemã

do século XVIII – movimento para-maçónico rosacruciano;

- um sêlo episcopal que revela a qualidade de Bispo de uma corrente cristã

joanina. Existiu uma Igreja joanina, ou joanita, “dos cristãos primitivos” ligada, no

começo do século XIX à Ordem do Templo de Fabré-Palaprat mas, já na segunda

metade do século XX existiu também uma Ordem neo-templária contemporânea, a

Fraternidade Joânica dos Cavaleiros Templários, depois denominada “Ordre des

Chavaliers du Temple, du Christ et de Notre-Dame”, com sede em Lille, que possuiu

(ou possui ainda) um Instituto (teológico) de S. João, sendo muito provavelmente, esta

corrente a que P. Rivière está ligado;

Portanto, estas cartas revelam a assunção, por parte de Patrick Rivière, da

recepção de iniciações de três tipos: artesanal – como o é a alquímica e como o é,

simbolicamente, a maçónica -, cavaleiresca – por exemplo a neo-templária maçónica

(como o martinismo rectificado dos CBCS) ou não maçónica (“cavaleiro do Santo

Graal”) - e, ainda, a sacerdotal - como a martinista e a rosacruciana, mas sobretudo

como a dessa Igreja joânica. Temos então um conjunto de transmissões iniciáticas que

cobrem todo o espectro do esquema tri-funcional de Dumézil : artesanal, cavaleiresca e

sacerdotal - e que, a haver uma preponderância de alguma delas, residirá na vertente

sacerdotal que irá banhar todas as outras. Implicará isto uma perspectiva “sacerdotal” da

Alquimia? Pensamos que sim. No entanto, esta vertente “sacerdotal”, está assente, não

numa perspectiva psico-espiritual, mas numa vivência “artesanal” da Alquimia, isto é,

numa perspectiva operativo-laboratorial. Resulta daqui que as operações de laboratório


se completam – na linha do que Canseliet defendia - por uma vivência iniciática da

167
Alquimia, isto é, no oratório. Nesta vivência poderemos incluir uma peregrinação a

Santiago de Compostela, organizada pela Associação “Spagy-Nature”

A qualidade de associado de Spagy-Nature, permitia facilidades na aquisição de

materiais e instrumentos alquímicos, tais como, por exemplo, estibina (sulfureto de

antimónio) e um forno – concebido pela própria associação, talvez mesmo pelo próprio

P. Rivière. Para dar formação prática – e alguma transmissão oral de segredos

alquímicos – organizaram-se estágios em França (nos quais não pude estar presente por

dificuldades diversas), quer na via alquímica dominante neste grupo – a “via seca” de

Fulcanelli-Canseliet – quer em espagíria vegetal ou mineral .

A parte estritamente alquímica das actidades deste grupo estava incluída num

círculo interior, denominado C.H.R.C.H.M. ou CHR+CHM – o que parece denotar

uma filiação rosacruciana operativa (“R+C”), designando o “H”, muito provavelmente

“hermético”. Fui admitido nesse círculo interno, através de um exame escrito que me foi

enviado pelo correio, mas não não recebi a iniciação presencial – oral – pelas

dificuldades atrás referidas; no entanto, tive informações da parte de Patrick Rivière do

que foi discutido e feito nessas reuniões. As questões escritas do exame de admissão no

CHR+CHM, incluiam temas como a natureza e idenficação da “Matéria Prima”, do

“Fogo Secreto”, como captar o “Spiritus Mundi”, quais as fases da Obra Alquímica, etc.

É de notar uma característica muito comum em grupos esotéricos em geral e

alquímicos em particular que é a dispensação do ensino por etapas e por níveis –

multilayered, como diz o já citado Olaf Hammer – em maior (caso de Solazaref) ou

menor (caso de Les Philosophes de la Nature) grau. Nesta escala, Spagy-Nature ocupa

uma posição intermédia . Por isso podemos afirmar a dupla natureza "esotérica” destes

grupos, pois são-no no sentido de Hammer, devido à sua estrutura social, características

de segredo e de hierarquia e são-no ainda no sentido de Faivre, devido ao carácter


esotérico da sua doutrina.

168
Refira-se que, quer nos seus livros para o grande público, quer nas instruções

reservadas de Spagy-Nature, existe um grande respeito pela linguagem tradicional dos

“Adeptos” – tal como o fazia Canseliet – criando assim uma atmosfera “tradicional” –

“separada” e “sagrada” - de ensino e de trabalho.A sua caligrafia, que já referimos,

ajuda à criação deste clima e desta sua afirmação identitária. Patrick Rivière revela –

para além de uma familiaridade com os textos clássicos da Alquimia - um grande

conhecimento da “Linguagem dos Adeptos” e, naturalmente da “Cabala Fonética” e do

simbolismo alquímico.

Em 1986 realizaram-se dois estágios teórico-práticos de Espagíria e de

Alquimia, em Molières, sede da Associação Spagy-Nature, dirigida por Patrick Rivière.

Esta Associação continua, desde essa data até aos nossos dias, com o mesmo tipo de

estágios (com níveis diversos de desenvolvimento). Em 1988 foi publicado Alchimie et

Spagyrie, du grand Oeuvre à la Médicine de Paracelse, de Patrick Rivière, nas Ed. de

Neustrie, Caen, e, também, do mesmo autor, na Editions. Traditionelles, La Médicine de

Paracelse. Em 1990 dá-se a publicação de Alchimie, Science et Mystique, ainda de

Patrick Rivière, com prefácio de Serge Hutin, nas Ed. de Vecchi, Paris (reimpressão em

1992).

Patrick Rivière não inovou em relação a Fulcanelli e a Canseliet, demonstrando

uma fidelidade em relação aos ensinamento desses mestres. Tendo nascido, ao que me

pareceu, pelos anos 50, ele terá conhecido ainda Eugêne Canseliet (falecido em 1982).

Não nos detemos na descrição da sua prática e da sua filosofia alquímicas pois tudo o

que já dissemos acerca dos seus mestres no Capítulo sobre a História da Alquimia e

também no que antecedeu este, quando falei da revista “La Tourbe des Philosophes” de

quem ele é um “filho” espiritual e operativo.

169
É importante afirmar que o lider deste grupo, embora afirmando (como um

alquimista o fará) a possibilidade da relização da Pedra Filosofal, coloca-a no entanto

como uma meta distante e difícil de atingir. Fulcanelli terá conseguido esse objectivo,

mas Canseliet não o conseguiu. Patrick Rivière nunca afirmou que estava em vias de o

conseguir.

ROGER CARO E OS F.A.R.C.

O nosso contacto com esta escola alquímica consistiu em permutas epistolares

com o seu Imperator, Roger Caro - apresentamos, em Anexo, a última carta que dele

recebemos, pouco tempo antes da sua morte - na aquisição de alguns dos seus livros

(que não se obtinham no circuito comercial, mas que ele vendia directamente) e na

obtenção de fotocópias de outros.

Mais recentemente, tivemos a oportunidade de contactar alguns membros do

FARC em França, nomeadamente Bernard Fréon, Elisabete Demange e, mais

recentemente, François Delvaux.

- História, doutrina iniciática e linhagem:

O grupo denominado “Ordre des Frères Aînés de la Rose-Croix – F.A.R.C.” -

segundo a sua “Legenda”, que é, na realidade, uma “lenda de fundação” da Ordem,

terá sido instituído em 1317, tendo-se perpetuado esta confraria, segundo os FARC, até

aos nossos dias através de uma ilustre sucesão: les FARC ne remontent pas au Temple

de Salomon, ni a Toutmés III, mais leur présence est virtuellement démontré avec ces

115 parchemins munis de leur scel d’origine s’étalant de 1317 à nos jours. La

continuité est parfaite243.

243Roger Caro, “Legenda des F.A.R.C.”, St. Cyr-sur-mer, 1970, citado por Jean-Pierre Giudicielli de
Cressac-Bachelerie, “Pour la Rose Rouge et la Croix d’Or”, Paris, 1988, ps. 95-96; mais ainda do que as
outras obras de Caro/Kamala-Jnana (que consultámos), a “Legenda” é extremamente difícil de encontrar.

170
A origem da Ordem tem, segundo a “legenda”, a ver com a extinção da Ordem

do Templo - o que faz lembrar a “lenda escocesa” da Maçonaria (presente, por exemplo

no Rito Escocês Rectificado), visto que aqui, também, são os templários fugidos de

França, em 1314, à perseguição movida pelo Rei, que se refugiam nas Ilhas Britânicas,

tendo ido para a ilha de Mull e colocando-se ao serviço do rei escocês Robert Bruce. O

Barão Guy de Montanor teria iniciado na Alquimia Gaston de la Pierre Phoebus e

ambos reunem, em 1316, vinte e cinco companheiros com o objectivo de voltar para

França, a fim de cumprir uma missão excepcional. Morto Pierre Phoebus (numa

emboscada) o sucessor de Guy de Montanor, Jacques de Via, sobrinho do Papa João

XXII (que intercedeu para a sua nomeação) foi envenenado em 6 de Maio de 1317,

data na qual a “Igreja Templária” tomou o nome de “Frères Aînés de la Rose-Croix”.

Sucedeu-lhe Guidon de Montanor que transferiu a sede de Avignon - onde residia o

Papa - para a Comendadoria Templária de Montfort-sur-Argens (26 de Julho de 1333).

Na lista dos Imperators dos FARC publicada na “Legenda” encontram-se alguns

Cavaleiros de Rodes e ainda Nicolas Flamel, como “sénéchal” (sob o anagrama de

l’Aisne de Flame) do 12º. Imperator Ludovic des Pins, entre 1418 e 1427, o adjunto do

Imperator Bergues, Sixte de Levalois Carlos, seria Carlos VI de Valois, sendo o 33º.

Imperator, Robert Fludd, com o nome de Robertus de Fluctibus.

O alquimista Roger Caro, 57º. sucessor de Jacques de Via, e Patriarca da “Église

de la Nouvelle Alliance - ENA” - que, como os “FARC”, tinha até à recente morte de

Car, a sua sede em Saint-Cyr-sur-Mer (Les Angelots, Chemin de la Madrague) - mostra

na “Legenda des FARC”, que existem profundos laços entre estas duas organizações e a

Maçonaria. A ENA tem a sua sucessão apostólica na Igreja Católica Romana - e na

Igreja Arménia Uniata e aceita as decisões conciliares até 1054, data da separação das

Igrejas do Oriente e do Ocidente244. Para cimentar esta ligação entre a Igreja Católica e

244cf.Jean-Pierre Bayard, “Le Guide des Sociétés Secrètes”, Paris, 1989, ps. 42 e 91; aqui, o Autor entra
em crontradição com o que escreve no seu livro anterior “La symbolique de la Rose-Croix”, onde afirme
que “Pierre Phoebus, 58e. Imperator, nommé en 1969, n’a pas dévoilé son identité”. Será Pierre Pheobus,
Roger Caro? Haverá um engano apenas entre 57º. e 58º.?

171
a Alquimia, os FARC publicaram um manuscrito apócrifo, um “pergaminho alquímico

de S.S. João XXII, Papa alquimista em Avignon (1316-1334), cujos desenhos

manuscritos resumem toda a Grande Obra”245. Esta “Igreja da Nova Aliança”,

inseparável dos FARC, é “missionária, ecuménica e gnóstica” e “o reflexo exacto da

primitiva Igreja Templária criada em 1317 pelos “Irmãos Primogénitos da Rosa-Cruz”,

ligando-se, “pela sua sucessão apostólica ao Patriarcado do ramo gnóstico da Igreja

Sírio-Jacobita de Antioquia cujo representante actual foi ordenado pelo Patriarca Pierre

Phoebus (Roger Caro)”. Ela contém “no seu seio” os FARC que perpetuam “un ensino

alquímico cujo simbolismo Universal se encontra desde os mistérios cristãos até à

iniciação maçónica”246.

Quanto à filiação profunda desse “ensino”, um livro de um adepto desta escola -

que se esconde sob o pseudónimo de Jean de la Clairefontaine - revela-nos que ele

provem dos “mestres ismaelitas”: “(l’article 10 de la) Règle de l’Ordre des Frères

Aînés de la Rose-Croix fait et rédigé sur l’ordre de Notre Saint Père Jehan XXII, pape,

l’an 1317 et la veille du jour du baptême de notre glorieux Seinheur Jesus-Christ, au

couvent des frères Pontifes de Pont-Saint-Esprit par notre vénéré rector et approuvé

par Jacques de Via Imperator et par Della Revere, Sénéchal, qui ont mis leur scel: En

souvenir des maîtres ismaeliens qui nous enseignèrent leur science, nous

perpétuerons l’alchimie non pour obtenir des trésors aurifères, mais parce qu’elle

démontre une seule vérité et permet d’obtenir la véritable quintéssence de la vie”247.

A propósito de influências árabes sobre a Ordem dos FARC (para além das

ismaelitas citadas na passagem anterior), Jean-Pierre Giudicielli - que parece possuir,

245manuscrito da “da colecção do Templo dos Irmãos Primogénitos da Rosa-Cruz”, in Jean de


Clairefontaine, op. cit., p.378; a tradução é nossa
246folheto de apresentação, reproduzido no livro de Solazaref, “Les Bûchers du XXe. sciècle”, Teilhède,
1988, p. 41. É de notar que num outro folheto, que possuímos, esta Igreja é denominada de “Eglise
Universelle de la Nouvelle Alliance - EUNA” e reclamando-se de uma sucessão apostólica “Velha
Católica Romana de Utrecht”, além da Católica Romana: “Informations sur l’Église Universelle de la
Nouvelle Alliance”, par S.B. R. Caro, Bandol, 1983; a tradução é nossa
247Jean de Clairefontaine, “Apocalipse: Révélation Alchimique”, Paris (?), 1985, p. 370

172
entre outras, esta filiação alquímica - conta-nos que há que ter em conta também a

Escola de Bagdad, a Casa da Sabedoria, e a universidade cairota de Al-Axhar:

L’histoire de l’Ordre part du contact entre quelques rares templiers (et non les

templiers plus guerriers que quêteurs de sciences hermétiques) et des adeptes liés

particulièrement à l’École de Bagdad «Beit el Hikmat» créée par le Khalife Al Mamoun

en 830. Les chrétiens l’appelèrent Maison de la Sagesse. Il ne faut pas négliger non

plus le rôle de la mosquée d’El-Azhar, lieu de rencontre important de l’époque, où un

maître de l’université cachait aussi parfois un hermétiste248.

Por seu turno, Jean-Pierre Bayard249, transcreve um trecho da “Legenda” (p. 27)

que refere esta tradição e os contactos havidos, no campo da alquimia, entre os

Templários e árabes: De trés nombreux auteurs ont exposé (et nous le verrons en détail

plus loin) comment les Templiers sous Hassan et Saladin, ont étudié toute sortes de

Philosophies dans cette fameuse Maison de la Sapience où ils avaient accés.

Naturelement, on s’en doute, ces Chevaliers du Christ ne fréquentaient pas tous cette

Maison de la Science. Plus soldats qu’intelectuels, leur nombre était trés restreint.

Parmis ceux-lá, qualques Sénéchaux et chapelains, rarement les Grands Maîtres.Plus

tard, lorsque la «science» orientale leur fut fermée, les Templiers instruits en Art

d’Alchimie perpétuèrent cet enseignement en distinguant d’abord, en instruisant

ensuite, ceux de elurs pairs les plus aptes à leur succéder. C’est ainsi, par cette filière

fraternelle, que Guidon de Montanor, puis Gaston de Pierre Phoebus, se trouvèrent

détenteurs du secret hermétique et pûrent plus tard instruire à leur tour leurs

compagnons en Fraternité.

Jean-Pierre Giudicielli dá-nos algumas precisões suplementares sobre a história

da Ordem (baseado na “Legenda”) indo desde o seu começo até aos tempos mais

recentes e que têm a ver com a afirmação – que pretende dar prestígio à Ordem, mas

248Jean-Pierre Giudicelli Cressac-Bachelerie, “Pour la Rose Rouge et la Croix d’Or”, Paris, 1988, p. 96
249 Op. Cit.

173
que não pode ser provada, nem parece ser verosímil - de que nomes ilustres, no contexto

do esoterismo e da literatura, como Bulwer Lytton (o autor dos “Últimos dias de

Pompeia” e do romance esotérico “Zanoni”), Wynn Wescott (chefe da rosacruciana

SRIA e fundador da “Golden Dawn”) e o escritor ocultista Eliphas Levi (“ A Chave dos

Grandes Mistérios”, História da Magia”, “Dogma e Ritual da Alta Magia”), foram seus

“Imperators”: Selon l’histoire de l’ordre, en France, prévenus à temps par le chapelain

du manoir de la Buzardière, prés du Mans, sept templiers, Gaston de la Pierre

Phoebus, Guidon de Montanor, Gentilis de Foligno, Henri de Montfort, Louis de

Grimoard, Pierre Yorick de Rivault et César Minvielle, se replièrent en toute hâte vers

Dinard, puis vers Saint-Malo où ils affrétèrent de nuit une barque de pêcheurs qui les

déposa sur le sol d’Angleterre. La commanderie de Londres les reçu et les hébergea.

Afin d’éviter les persécutions du roi Édouard, quelques chevaliers adeptes s’enfuirent à

l’île de Mull, ils retournèrent plus tard en France, où ils donnèrent un nom à l’ordre le

2 décembre 1316: «Les Frères Aînés de la Rose-Croix». Nous n’allons suivre l’ordre

aux cours des sciècles, mais il nous semble important de signaler quelques noms des

derniers Imperator, le 51e. était Lord Bulwer Lytton, lié étroitement à divers cercles

trés fermés, l’abbé Louis Constant (Eliphas Levi) lui succéda, suivi par William Wynn

Westcott (membre de la SRIA). Passant ainsi entre les mains des frères dépositaires des

filiations diverses, l’ordre va par la suite retourner à son pays d’origine: la France, où

il manifestera sa présence sous l’impoulsion de Pierre Phoebus, faisant publier de

nombreux livres hors commerce. Relativamente a esta fase mais recente dos FARC,

Jean-Pierre Bayard, completa a lista de Bachelerie: Bulwer Lyton é o 51º. Imperator

(1849-1865), o abade Constant (Eliphas Lévi) é o 52º. (1865-1874), seguidamente vem

William Wynn Westcot (1874-1892) - “qui appartenait aussi à la S.R.I.A.”250- e Steiner

(1898-1900).

Giudicelli a firma que “os FAR+C, estanto limitados a 33 membros, só podem

cooptar alguns poucos adeptos, mas que existe uma outra Ordem mais interna– o

250Jean-Pierre Bayard, “La symbolique de la Rose-Croix”, Paris, 1875, p.226

174
mesmo arquétipo “esotérico” (no conceito de Hammer) – que não pude eu próprio

provar a sua existência, a qual possuirá, segundo ele, as chaves da “alquimia interna”, a

“via do corpo de imortalidade”: L’extrême prudence de l’Imperator a permis que

quelques frères seulement accèdent à la connaissance opérative, mais il se refuse à

rentrer dans la notion de mythes, de rêves si chers à l’humain plus avide de sensations

et d’évasion que de réalités. L’ordre ne propose pas de reformer le monde, il est

dépositaire d’une Tradition. Il existe un autre Ordre des FAR+C réservé à 12

membres et qui concerne une autre opérativité alchimique interne mais, malgré son

ancienneté, nous pensons que les deux ordres n’en constituaient qu’un seul à un

moment de l’histoire, ou qu’ils étaient imbrinqués l’un dans l’autre de toute manière.

Cet ordre interne pratique la voie du corps d’immortalité par la Esta Ordem “interna”

– que seguirá a “via do cinábrio”, a “via da imortalidade” chinesa - denominar-se-á,

segundo este mesmo Jean-Pierre Giudicelli, “la Collégiale Al Kimia, animée par un

groupe d’adeptes issus de l’enseignement des Frères Aînés de la Rose + Croix, ordre

(...) qui est dépositaire sur la voie du cinabre (il s’agit bien entendu du Wouei Tan). E,

mais adiante, diz: “(...) les FAR+C (elle est la seule organisation) à témoigner d’une

vieille pratique: la voie du cinabre. Il s’agit là d’un Wouei Tan (voie du cinabre

extérieur), encore que nous ayons la preuve que certains Imperators connaissaient bien

l’aspect interne, c’est le cas par exemple de Lord Bulwer Lytton - qui fut le 51e.

Imperator de FAR+C (1849-1865)...”251.

- Via alquímica característica

A via dos FARC - que, segundo J.-P. Bayard ne se font pas connaître du grand

public et restent profondément discrets sur leurs activité”252- é, segundo nos parece, a

via húmida, utilizando, como matéria prima o cinábrio (conforme é sugerido nos

textos de Caro e de Kamala-Jnana e confirmado por Cressac-Bachelerie e Trieli).

251ibidem, p. 64
252ibidem, p. 225

175
Para uma descrição o mais detalhada possível dos princípios, do processo e da

sua simbolização, vamos socorrer-nos, do texto de Jacques Trieli253 e do registo de

uma conferência realizada por um seguidor desta confraria, Alain Serrière254; este

relato poderá ser complementado pelo exame das fofografias a cores de “toda a Grande

Obra fotografada” - de aprentamos cópia, em Anexo - e que constam da obra homónima

de Roger Caro255.

Poderíamos utilizar os livros de texto256 publicados por Roger Caro, mas

embora sejam eles os elementos de instrução para os Neófitos da Ordem, uma instrução

guiada, é certo, eles não são tão explícitos como o artigo de Trieli e, sobretudo, como a

conferência de Serrière, testemunho de enorme interesse para o nosso trabalho, quer a

nível de descrição operativa, quer de simbolização, quer ainda da doutrina dos FARC.

Um outro livro de um discípulo de Caro - Apocalypse: révélations alchimiques de Jean

de Clairefontaine, nas ed. Axis, 1985 - poderia também ter sido utilizado mas não é tão

intressante para o nosso propósito como aqueles dois trabalhos que aqui utilizaremos de

seguida.

- Conferência de Alain Serrière

A conferência de Serrière não questiona a qualidade transmutatória da via, mas

valoriza os seus aspectos iniciáticos do processo FARC, que apresenta em detalhe,

apresentando um maior interesse do ponto de vista da simbolização ao contrário do que

o texto de Trieli que é mais pobre neste aspecto, uma vez que apresenta, uma síntese do

processo laboratorial (bastante útil, para os operativos, aliás como a conferência de

253Jaques Trieli, “La Voie du Cinabre: un grand particulier ou voie de la Pierre Philosophale?”, in
“Troisième Millénaire”, nº. 35, 1995.
254Alain Serrière, ”Alchimie Opérative et Alchimie Spirituelle”, cassette editada pela Associação
“Atlantis”, Vincennes, 1985; a transcrição, a tradução e os sublinhados são nossos.
255Roger Caro, “Tout le Grand Oeuvre Photographié”, Saint-Cyr-sur-Mer, 1968
256Roger Caro, “Pleiade alchimique”, Saint-Cyr-sur-Mer, 1967; “Concordances alchimiques”, S.-C.-sur-
Mer, 1968; “Rituel FARC et deux textes alchimiques inédits”, S.-C.-sur-Mer, 1972

176
Serrière). Dessa conferência, transcrevemos as suas diversas passagens (em tradução

nossa) por ordem quase cronológica da sua apresentação:

a) Princípios:

- “A Alquimia, ao contrário das outras vias iniciáticas, como a Kabala, o

Sufismo, etc, inclui manipulações materiais e físicas” (...) “A Alquimia á a única via

iniciática que permite controlar num plano físico material, o progresso do operador

e o seu estado de espírito”.

- “O laboratório é Laborare e Orare, (pelo que) sem oração não se chega a parte

alguma”.

- “A Alquimia Operativa não consiste apenas em aplicar receitas; por melhor

operativo que seja, se ele não se transformar a ele próprio, nos seus diversos planos,

ele não chegará a nenhum resultado, do ponto de vista alquímico (poderá chegar a

um resultado químico ou arquímico)”.

- “Não é pràticamente possível praticar uma Alquimia Espiritual se não se

praticar uma Alquimia Operativa; é muito difícil (...) O que se passa no Athanor do

laboratório é o que se passa no corpo, na alma e no espírito do alquimista”.

Eis aqui um tema central que os alquimistas proclamam: não se transmuta a

matéria se o alquimista não se transmutar a si próprio, mas os dois processos são

síncronos, laboração e oração vão de par.

b) Prática

- “Todo o trabalho do alquimista vai consistir em escolher uma Matéria


Prima (um mineral, uma “pedra”), que contem um Sal, um Enxofre e um Mercúrio, e

em purificá-los, em libertá-los da ganga da terra (“terrestreité”), que é equivalente ao

pecado (não no sentido moral, mas espiritual), até ao momento em que estando

perfeitamente purificados e conjuntos, esta Pedra se torna transmutatória, do mesmo


modo que o Homem perfeito se torna miraculoso”

177
- “Como é que reconhecemos que se trata de Alquimia? Em Alquimia, há cinco

espécies de Fogo, mas nunca se utiliza o fogo vulgar, a não ser para as primeiras

operações (para fabricar o Sal) e para as últimas (para transmutar). Em Alquimia, não

se junta, à Pedra, nada que lhe seja estranho (o homem não se purifica tomando

comprimidos, o homem para se aproximar do Criador, para se purificar, apenas “junta”

a oração, é preciso saber orar - orar, é juntar o Espírito divino ao homem);

análogamente, é preciso juntar à Pedra-Matéria Prima, o equivalente do Espírito

Santo, o Sal - que é preciso fabricar na primeira fase da operação alquímica, a pré-

preparação, os “hors-d’oeuvres”, a preparação do Sal. O Sal é um produto que possui

uma grande força - “ros”, de rosa, de rocio, do orvalho que impregna os cristais

higroscópicos de sal, quando expostos á humidade ambiente, de noite (a colheita do

orvalho, em alturas propícias, é apenas para a Espagíria)- força essa que é ao mesmo

tempo espiritual e material. O Sal fabrica-se pondo em contacto dois corpos muito
simples e deitando água a ferver em cima (com um filtro); dá-se uma reacção violenta e

caem gotas que atravessam tudo e, depois, se cristalizam. A única possibilidade de

conter o Sal é contê-lo nele próprio - coagulá-lo - ou pô-lo numa forma líquida (mas não

se aguenta muito num frasco Pyrex)”.

- “Agora começa verdadeiramente a Grande Obra. Reduz-se a Matéria Prima

em pó (caos primordial) do mesmo modo que o homem que quer avançar no caminho

iniciático deve mortificar-se! a ascese é fundamental! - VITRIOLUM, cuja letras são

as iniciais da seguinte frase traduzida do latim: “visita o interior da terra, rectificando

encontrarás a Pera oculta, verdadeira Medicina”. Entra em ti próprio! Rectifica-te! É

preciso que o homem velho morra para que o novo renasça. É preciso, pois, morrer para

a vida terrestre, para renascer para a vida espiritual - as operações alquímicas dão um

verdadeiro significado à mortificação (que não é uma autodestruição mas sim um


renascimento - S. Francisco de Assis exagerou na mortificação ao ponto de desprezar o

seu corpo, até que um Anjo o avisou). A Pedra também terá de morrer como Pedra e

vai ser triturada no almofariz de modo a ficar reduzida em pó impalpável. Vai

dar-se em seguida a separação dos elementos: Sal (o “corpo”), Enxofre (a “alma”),

178
Mercúrio (o “espírito”) e a ganga terrestre (“terrestreités”). Na Alquimia

Operativa coloca-se em conjunto o Reino vegetal (Sal), com o Reino mineral (a


Pedra) e com o Reino animal (as mãos do operador). Como o Sal representa (é)

uma grande força divina (os alquimistas são os “Frères de la Rosée Cuite” - os

“Irmãos do Orvalho Cozido”), ao ser deitado sobre a Matéria Prima em pó, ele vai

desencadear uma reação violenta e provocar a sublimação (não se deve encher o balão

com mais de 25% do seu volume pois ele pode rebentar e o Sal a ferver é muito

perigoso). Mas se a Pedra tem um Sal intrínseco, porque é que ele não provoca a

sublimação e é preciso adicionar um Sal exterior? É como no homem que é constituído

por um corpo que ocupa todo o espaço físico, a alma que ocupa muito menos espaço e o

espírito que é apenas uma chama divina; o Espírito (Sal) existe muito pouco, quer no

homem, quer nos minerais, logo é preciso acrescentar Espírito Santo ao homem e à
Pedra, isto, é coloca-se uma quantidade de Sal na retorta (onde está a Matéria Prima
em pó) nas “proporções da Natureza”(não se conhecem, só pertencem a Deus)”.

- “As mãos (do operador) são indispensáveis (...) para - à semelhança de

Cristo que transformou água em vinho nas Bodas de Canã - desencadear a sublimação

(excitação mútua dos corpos) que vai dar origem à passagem do Sal e, depois, do

Mercúrio que se condensam, por essa ordem, num balão, após refrigeração (nesse balão

o Sal e o Mercúrio separar-se-ão, depois, devido ás suas densidades diferentes). No

fundo da Athanor- retorta- fica, após a sublimação, o Enxofre e a ganga terrestre.

Após esta primeira fase o muda de forma: de retorta, passa a balão (matraz). Sobre o

Enxofre, deita-se - reamalgama-se - primeiro o Mercúrio e depois sela-se

cuidadosamente (o selo de Hermes) com tecido e cera e depois tudo se sublima como

anteriormente, mas agora, uma parte de enxofre vai sublimar-se também, ficando no

fundo do balão dois terços de Enxofre com a ganga. As mãos do operador continuam

a actuar, e agora dá-se uma sublimação geral que vai até ao topo do balão”.

Resumamos até aqui estas proposições de Serrière:

179
- o “fogo do espírito” existe na matéria mas também deve ser captado pelo

orvalho e comunicado ao sal;

- a mortificação sacrificial da matéria e a sua redução ao “caos primordial”;

- a indispensabilidade da utilização das mãos do operador.

Continuando, Serrière refere a dimensão sexual da simbólica alquímica (já

estudada por nós em Capítulo anterior) conduzindo ao “andrógino primordial”,

relatando depois a evolução cromática da matéria alquímica – aa “cabeça do corvo”, à

“lua” ou “virgem”, passando por diversas cores intermédias, a “cauda pavonis”:

- “O Mercúrio e o Enxofre (ligados pelo Sal) têm uma enorme afinidade um

pelo outro (fêmea e macho, raính, a e rei, etc.) - tal como o Pai e o Filho estão ligados

pelo Espírito Santo - fazendo o par perfeito, o andrógino primordial ! A Santa

Trindade é una e trina: uma Pedra e três Princípios. Os vapores produzem-se em

turbilhão e à medida que a reacção vai diminuindo de intensidade ( e em calor) formam-

se bolhas de Mercúrio (que parecem de champanhe) as quais vão começar a rodar e,

pouco a pouco, a descer e que se carregam de matéria ao atravesar os vapores

sulfurosos, tornando-se mais pesados e caindo como chuva sobre o “compost” a ferver

que está em baixo e desaparecem dentro dele e a reacção depois pára. As granulações

estão ocultas no “compost” e estão aparentemente perdidas, apenas aparentemente, pois

se o homem não fosse pecador, não poderia continuar na matéria, do mesmo modo se

não houvesse um “compost” para proteger e envolver as granulações nascentes - o

“menino-Rei” - não haveria Alquimia possível, pois elas desapareceriam


rápidamente. Logo, não devemos lamentar os nossos pecados nem ter vergonha da

nossa condição de pecadores, pois se, de facto, é devido ao pecado que não somos

deuses, também é graças ao pecado (à “terrestreité”) que nos podemos elevar até

Deus”.
- “Então abre-se o balão e junta-se o Sal; a intervalos regulares (“meses

filosóficos”) vai-se acrescentar uma certa quantidade de Sal de modo a que ele circule

no interior do Athanor para banhar o seu interior e aquecer tudo outra vez; assim, a
pouco e pouco, vai passar a castanho e depois a negro (“corvo”) - se se puser Sal a

180
mais ficamos com uma cor laranja (e tem de se deitar tudo fora). É preciso continuar
progressivamente, regularmente e moderadamente (naturalmente). Do seio do negro vai

nascer o “óleo de Saturno” muito belo e irisado (com todas as cores do arco-iris -

“cauda pavonis”), ele é a quintaessência que vai flutuar à superfície do “compost” e

depois sobe pelo balão, até que, graças a uma técnica particular, o alquimista vai

“cortar a cabeça ao corvo”: recolhe a quintaessência e põe-na de lado, de modo que o

“compost” possa respirar. Esta quintaessência já tem propriedades notáveis, quase de

uma Medicina Universal (cf. Cyliani e Fulcanelli): uma gota dela, apenas, tomada em

cada equinócio, num caldo ou num copo de leite, é o suficiente para se purificar por seis

meses; hoje o mundo já é diferente, pelo que a purificação não deverá durar tanto,
devido à spoluições físicas e psíquicas. No entanto, e mesmo assim, a quintaessência

purifica (embora cheire mal, devido ao Enxofre); se tomada à noite, ao acordar estamos

banhados em sujidade devido à transpiração (os “humores” dos antigos), então toma-se

um duche e lava-se a roupa”.

- “Agora vai-se trabalhar com o balão aberto e aí a matéria líquida vai apodrecer

- Putrefacção - e torna-se verde (Fulcanelli e Canseliet têm razão). Junta-se o Sal - que

atrás foi utilizado para a cocção - desta vez, para para lavar a matéria (as “leveures” de

Flamel - lavagens ígneas), isto é, para a desembaraçar das impurezas. Então o sal - que

é branco porque contém um corpo branco - vai branquear a matéria - Albedo. A Pedra

fabrica a sua própria casca - ovo alquímico - e assim desembaraça-se do “compost”. O

alquimista pode pôr o ovo na sua mão - a mão do alquimista torna-se uma vez mais o

Athanor. Esta fase de brancura, esta “lua”, esta “virgem imaculada”, marca o fim da

fase alquímica do Solve, dissolução, pelo que temos as seguintes fases alquímicas:

0 - 1ª. pré-preparação do Sal

1-2ª. preparação: separação dos três corpos (“separatio”)- 2 “meses filosóficos”

2- 3ª. dissolução (Solve): reamalgamação dos 3 corpos no interior do ovo alquímico

(“conjunctio”) - 8 “meses filosóficos”


a seguir vamos ter:

181
3 - 4ª. coagulação (Coagula) -16“meses filosóficos”

4 - 5ª. multiplicação - 2 “meses filosóficos”

- “Agora muda-se a alimentação da “criança real” (ou Infante); não se

acrescenta, no entanto, nada que lhe seja estranho - tal como não se acrescenta nada ao

homem para o fazer avançar na sua via espiritual - mas dando-lhe a quintaessência

também chamada Mercúrio “Tingente” (quando a Pedra estava na fase de “cauda

pavonis”, desenvolveu um óleo vermelho na superfície e amarelo, como a tintura de

Iodo - o que é práticamente a cor da quintaessência, embora esta seja um pouco mais

viva) o qual vai fazer passar a Pedra, progressivamente do branco ao amarelo e depois

ao rubro. Ao deitar a quintaessência sobre a Pedra branca, aparece a cor amarela,

depois o amarelo alaranjado, depois, ainda, o laranja (importante!), o qual escurece

depois e a Pedra torna-se vermelha. Esta Pedra tem todas as características da Pedra
Filosofal, só que não tem poder transmutatório (é um “falso profeta”, não tem poder por

ela própria), pois não foi ainda multiplicada”.

- Quando se atingir o vermelho decorreram exactamente 16 “meses filosóficos”.

Agora as coisas vão decorrer muito depressa, pois no total, a Grande Obra demora 28

“meses filosóficos”, logo o conjunto da multiplicação demora 2 “meses filosóficos”.

Para tal é preciso que o alquimista triture a Pedra que ele fabricou, que a coloque, deste

modo, numa retorta e que coloque aí também, um pouco de Sal que terá que lhe ter

sobrado. Este Sal vai provocar a mesma sublimação que que se realizou na fase de

preparação. Põe-se, então, um pouco de Mercúrio e de Sal num balão bem fechado, e

agora já quase não há “compost” (há pouco estava liquefeito). Dá-se pois a sublimação,

formando-se “granulações” que caem sobre o “compost” e agora tudo vai muito

depressa: o Sal vai Pedra provocar uma enorme quantidade de quintaessência, que se

recolhe, lava-se de novo a (que embranquece muito depressa) a qual está dentro de uma

casca que já é muito mais sólida que na fase anterior, leva-se ao rubro e agora já tem

algum poder transmutatório, ela é práticamente pura. Mas o alquimista vai operar

182
uma 2ª. multiplicação: repete tudo outra vez e mesmo mais do que uma vez, também o

poder transmutatório aumenta com a purificação”.

- “No entanto, é preciso que o “Irmão burro” não seja morto pelo “Irmão

Francisco”, isto é, a evolução espiritual do alquimista não o deve fazer deixar a Terra.
Ora chega-se, a partir da 3ª. multiplicação, a um grau de pureza tal que nada já pode

conter a Pedra Filosofal, ela retorna aos elementos constitutivos do Universo (ela passa

através de tudo, “evapora-se”) ela retorna ao seu Criador, pela via mais directa e mais

curta. Mas, mesmo a este nível, a Pedra Filosofal é ainda um “objecto/sujeito” material,

ela é ainda matéria - e essa é a grande diferença entre a Pedra Filosofal e o Cristo (a

Pedra Filosofal pode ser assimilada ao Alquimista, mas não ao Cristo), pois o Cristo

morreu também e recebeu o Espírito Santo na tumba e ressuscitou ao 3ª. dia,

encontrando Madalena no Jardim e esta toma-o por jardineiro (e ela conhecia-o bem, se

ela disse isso é porque ele mudou) e ele disse-lhe: “Não me toques!”, pois ele já não

pertencia a este mundo (ele passaria através dela?). Jesus incarnado era Deus e Homem.

Em Jesus ressuscitado, a parte divina prevalece sobre a parte humana, e é por isso que

ele diz para Maria Madalena não lhe tocar. Assim, o alquimista não deve levar a

purificação da Pedra Filosofal até a um limite extremo, pois correria o risco de não lhe

poder tocar”.

- “A obtenção da Pedra Filosofal não é o fim, é o começo. Desde logo, por que

o alquimista já se transformou considerávelmente, mas também porque, obtida a


Pedra Filosofal, ele já pode transmutar os metais vis em ouro; para isso ele envolve

o grão da Pedra Filosofal em cera e lança-o sobre o metal em fusão (por exemplo

chumbo, cuidado com o mercúrio pois os vapores são perigosos), num cadinho

refractário e o grão chega para transmutar toda a massa de metal em ouro”.

- “Para além das vias húmida e seca (o Sal utiliza-se líquido na via hímida e

cristalino na via seca - nesta, cuidado com as explosões, pois não só as reacções são

mais intensas, mas ainda existe o risco de queimar o “compost”) há a via sacerdotal.

Nseta via, mistura-se tudo num balão: há separação, reamalgamação, enquanto o


alquimista reza a Deus e os Anjos fazem o trabalho: duas sublimações; ele apenas

183
tem de “cortar a cabeça do corvo” e o trabalho faz-se em menos de um dia, mas isto é só
para pessoas missionadas”

- “O alquimista não utiliza o ouro para ele próprio, mas sim para curar, o fim da

Alquimia é curar! (por exemplo, pode-se colocar o ouro puríssimo, laminado, sob a

forma de folha que se enrola e se põe num frasco com água da chuva e daí resulta um

elixir; o elixir pode ser lunar - com a Pedra branca - ou solar - com a Pedra rubra)”

- “Para que haja Alquimia é preciso que se verifiquem três condições: 1) que

existam os três corpos/princípios: Mercúrio, Enxofre e Sal; 2) que a Pedra seja

purificada sem nunca lhe juntar nada que lhe seja estranho; 3) que não seja utilisado o

fogo vulgar”.

- “Para além das pessoas que praticam a Alquimia, mesmo nas outras que têm
um bom conhecimento teórico, há já um começo de transmutação. A Alquimia

desenvolve os dons latentes no homem (cura, vidência, etc.) a um ponto extraordinário

que não é possível descrever - este é o verdadeiro segredo dos alquimistas! De onde

vem este conhecimento? Dos Rosa-Cruzes, pois o fim da Rosa-Cruz é o de transmitir o

conhecimento e a iniciação alquímicos, embora de um modo velado - simbolismo

alquímico. A técnica aqui descrita não é a única, esta é a dos F.A.R.C.”

Observações a estas últimas declarações de Serrière nesta conferência:

- a afirmação da possibilidade de transmutação da matéria (Pedra Filosofal) e do

alquimista (“poderes latentes do homem”, vidência e cura, objectivo final da Alquimia);

- a analogia entre o processo alquímico e os dogmas do cristianismo;

- a possibilidade de uma “alquimia sacerdotal”, onde intervêm os “anjos”;

- Artigo de Jacques Trieli

184
Do artigo de Trieli, cujo título é “La voie de cinabre, grand Particulier ou voie de

la Pierre Philosophale”257, começaremos logo por registar a sua opinião sobre aquilo

que poderia pôr em risco a dignidade alquímica da via dos FARC qaue, segundo ele

conduz à Pedra Filosofal, “embora ele só tenha conhecido uma pessoa que a tenha

conseguido e que foi Kamala Jnana/Roger Caro”: “Dire que la voie du Cinabre est un

grand Particulier ne veut pas dire qu’elle ne conduit pas à la Pierre transmutatoire,

mais peu nombreux sont ceux qui on réussi la Pierre Philosophale dans cette voie.

Personnellement, je ne connais qu’une personne, portant le non d’initié de Kamala

Jnana, qui ait réussi une poudre de projection à partir de la voie du Cinabre. Pour les

autres, bien nombreux, qui ont essayé cette voie, les plus heureux n’ont réussi qu’une

coloration de l’argent en Or sans lui donner le poids (la densité), ou d’autres ont

obtenu de minusculles parcelles de métal jaune résistantes au tests chimiques, mais en

quantité insuffisante pour permettre des tests physiques”258. Mais à feente, será

discutida esta questão.

Mas o artigo de Trieli é, também, uma boa síntese muito interessante para os

“laborantes”, – embora de descriçao enigmática - do processo operativo dos FARC que,

como todos, atravessa o Solve sacrificial e atinge, após a morte, o Coagula ou

“renascimento” da matéria, seguindo assim o arquétipo alquímico da “morte e

renascimento”:

“Processus de la voie du Cinabre

Ce processus est tiré du dictionnaire alchimique de Kamala Jnana259

Il comporte six phases opératives:

- 1º La prépéparation ;

257 Alchimie: Grandir en l’Être; la Pierre philosophale; La transmutation en l’Homme; l’art


maieutique de Jésus et de Paul , nº. 35 da revista 3e. Millénaire, Paris, 1995, dedicado à Alquimia:. Para
além de um artigo de Albert Cau sobre a Pedra Filosofal e a energia atómica (bem característico deste
autor), e de um interessantíssimo artigo de François Trojani, L’Alchimie une relecture du Monde,
saliência para um artigo de Jacques Trieli, “La voie du cinabre: un grand Particulier ou Voie de la Pierre
Philosophale?”, com preciosas indicações sobre as vias da alquimia operativo-laboratorial.
258Jacques Trieli, op. cit., p. 33
259Kamala Jnana, “Dictionnaire alchimique”, Saint-Cyr-sur-Mer, ed. autor,

185
- 2º La préparation : durée, 2 mois philosophiques;
- 3º La phase Solve : durée, 8 mois philosophiques;

- 4º La phase coagula : durée, 16 mois philosophiques;

- 5º La phase multiplication : durée, 2 mois philosophiques;

- 6º La phase projection.

1º. La Prépréparation:
Elle concerne la fabrication du sel. Ce sont les travaux d’Hercule, et ceux qui

ont eu le courage de chercher le vieux chêne creux de Nicolas Flamel savent ce que

veulent dire ces travaux d’Hercule. La durée de ces travaux constituant «le hors
d’oeuvre» nést pas déterminée par l’Art, elle ne dépend que des conditions de travail de

l’opérateur. Il est dit aussi que l’on peut faire préparer ce sel par ceux qui ont une

bonne expérience de la chimie, mais dans ce cas, il faut l’abreuver de Spiritus Mundi
afin de le rendre canonique.

2º La Préparation
Première phase du Grand Oeuvre, en considérant qu’on a sous la main tout ce

qui est nécéssaire pour l’entreprendre. Elle consiste à broyer des blocs de materia

prima dans un mortier et à mettre cette matière pilée avec de l’eau philosophale dans

l’athanor, en appliquant le cinquième feu. Sous la violence de cette chaleur, les trois

corps se séparent en deux groupes; le corps sulfureux reste dans l’Athanor et le corps

salin et mercuriel (volatils) sont recueillis aprés refroidissement dans un réceptacle

communiquant avec l’athanor par une longue galerie.

3º Solve:
Deuxième phase du Grand Oeuvre; elle se trouve entre la Préparation et

Coagula. Elle comprend deux stades:


- La Putréfaction (Photo 1)

- La Végétation

C’est dans cette phase qu’apparaissent les granulations ressemblent à des oeufs

de grennouilles (photo 2), le corbeau et le sang du dragon (photo 3), la couronne d’or,

186
l’herbe sans racine, etc. Elle a une durée de huit mois philosophiques. Solve et régit par

Saturne et Jupiter.

4º Coagula
Troisième phase du Magistère. Elle vient directement aprés Solve, et contient

trois degrés de feu durant lesquels apparaissent les couleurs: Blanche (photo nº 4:

oeufs de poissons), orangée, et rouge (photo nº. 5). Sa durée est de seize mois
philosophiques. C’est à la fin de ce stade qu’apparait la première pierre au rouge (le

faux prophète, photo nº 5). Pour que cette Pierre ait quelques vertus notables, il lui faut

passer par la quatrième phase de l’oeuvre, qui est la multiplication.

5º Multiplication
Dernière phase du Magistère. Elle consiste à épurer d’avantage la Matière en

considérant la «Granulation» fin Coagula exactement comme s’il s’agissait de la

minière primitive. A noter que plus on réitère le nombre de Multiplications, plus on

augmente la force de la poudre de projection. à noter également que le temps de

fabrication se trouve de plus en plus réduit.

6º Projection
Opération qui consiste à jeter de la poudre lunaire ou solaire (enrobée de cire

d’abeilles) dans du plomb ou du mercure en fusion.”260.

Após esta exposição, J. Trieli passa à discussão antes iniciada e que diz respeito

às capacidades de “projecção” desta via, pois, pelos vistos, nem todos os que nela se

lançaram “não foram coroados de sucesso”: “Bien que le processus indiqué par Kamala

Jnana soit rélativement clair, il faut reconnaître que les résultats de la majorité des

chercheurs en la Sainte Science, n’on pas toujours été couronnés de succés.”

Interrogando-se sobre quais serão as causas desse insucesso, Trieli - além daquilo que já

referimos antes, i.e., a existência de “numerosos parâmetros” e o “conhecimento

insuficiente dos Princípios alquímicos” - aponta como uma delas, a “qualidade das

matièrias postas em jogo”: “On peut donc s’interroger sur les raisons qui ont conduit la

260Jacques Trieli, op. cit., ps. 33-34

187
plupart de ces aspirants à échouer. Elles reposent notamment sur la qualité des

matières mises en oeuvre.”

Citando o texto de Basilio Valentino: “Sache mon ami que toutes choses

impures ou souillés ne conviennent pas à notre oeuvre”, pelo que “toutes

marchandises à vendre, tirées des mines, valent chacune leur prix, mais lorsqu’elles

sont falsifiées, elles deviennent impropres. Elles sont, en effet, altérées sous un faux
éclat, et ne sont plus comme auparavant, convenables au même ouvrage”. Mas a

escolha das matérias nas minas e no seio da natureza, pode não ser suficiente, pelo que

elas deverão ser trabalhadas “canónicamente”, pela Arte, isto é, segundo Trieli: “en

leur donnant cette semence qui leur donnera le pouvoir de réaliser les véritables
«Noces Chimiques», et non une parodie basée sur une simple réaction chimique.” Em

que é que consistirá esa “semente” mineral? A resposta, segfundo Trielli, parece estar

nos “isótopos”, razão pela qual, é feita uma incursão na Química Nuclear (citando um

trabalho do físico Albert Cau, sobre a Alquimia, que referiremos adiante): “Ces

matières doivent être vivantes, c’est-à-dire, pour prendre l’exemple du Cinabre Hg S, il

faut que le mercure possède toute sa famille isotopique (tableau nº 1). Un Cinabre

reconstitué avec des matières achetées chez un fournusseur de produits chimiques est

certainement pur, mais alchimiquement c’est un corps mort, non animé. Prenons,

parfeemple le cas du mercure. Il est constitué de la famille isotopique suivante (tableau

nº 1):

29,80% de Hg 202; 13,22% de Hg 201; 23,13& de Hg 200;

16, 84% de Hg 199; 10,02% de Hg 198; 0, 146% de Hg 196.

Il est bien évident que si vous voulez réaliser une transmutation avec mercure

natif, vous aurez beaucoup plus de chances de réaliser une transmutation partielle

grâce aux isotopes prés de l’or 197/79. Les énergies mises en jeu ne sont pas de même

grandeur suivant l’isotope.”261

261ibid., ps. 34-35

188
Deve dizer-se, em boa verdade, que estas “revelações” não estão na linha

habitual dos textos e das intervenções públicas dos FARC. De facto, esta linguagem

talvez demasiadamente técnico-científica - na senda de um Georges Ranque, por vezes

de um Solazaref e de um Albert Cau - raramente surge à luz do dia, pela boca de Caro e

dos seus seguidores. Jacques Trieli cita Cau para justificar esta posição: “Pour Albert

Cau, physicien courageux, l’Alchimie doit être repensée avec le langage des

scientifiques de notre temps. Il met l’accent sur les caractéristiques de la physique

quantique que la Pierre Philosophale devrait avoir pour réaliser une transmutation

métalllique, tout en prenent appui sur l’expérience des anciens Adeptes.”262. De

qualquer modo, Trieli, no seu texto, retoma ao aspecto iniciático da Alquimia e,

específicamente, da via dos FARC, dando um exmplo significativo, quanto ao “poder

do mediador”, em que Roger Caro e um seu discípulo, realizam as mesmas operações,

com as mesmas matérias e ao mesmo tempo e no mesmo lugar, mas apenas Caro

consegue ter êxito - o que lhe confere uma natural superioridade espiritual e iniciática,

face ao discípulo: “L’Alchimie étant un système intératif, implique la nécessaire

qualité harmoniaque et le pouvoir médiateur de l’opérateur. Prenons par exemple un

témoignage vécu: «Mon ami Maurice Auberger (major de l’École Centrale) avait été
invité à débuter la phase Solve chez son ami Roger Caro, acompagné de son épouse et

disciple Madeleine. Ils choisirent chacun une même part des trois matières

philosophales (soufre, mercure et sel), et les ayant cohobées, ils firent agir le feu

energétique,... seul Roger Caro réussit cette phase en produisant des granules et les

couleurs correspondant à ce régime de feu». Pourtant, chacune des trois personnes

avait utilisé les même matières, un même ballon et le même sel dans un même lieu, et

tous avaient manipulé en même temps”.263

Este testemunho anónimo (ou será do próprio Trieli?), confirma o adágio dos

Adeptos: “Não transmutarás senão estiveres transmutado”. Como escreve Trieli: “la

262ibid., p. 35
263ibidem

189
Pierre Philosophale ne sert qu’à transmuter les autres, que ce soient des métaux ou des

êtres humains, «vu que l’Adepte doit déjà s’être transmuté lui-même pour réussir sa
Pierre Philosophale». De facto, continua ele,“l’homme lui-même est impliqué dans la

transmutation de la matière. C’est lui, en définitive, qui doit être transmuté. Le Grand
Oeuvre, c’est aussi les véritables Noces Alchimiques de l’Esprit et de l’Âme” 264. Aqui

encontramos uma “justificação” para os falhanços sistemáticos em alquimia, os quais

residirão na falta de qualidade da matéria, na falta de qualidade espiritual e operativa do

alquimista. O observador exterior ao mundo da Alquimia, verá nisto apenas uma

retórica justificativa do insucesso da “Arte ou Ciência de Hermes”

Embora Jacques Trieli se exprima de um modo bastante particular,

relativamente a Caro e aos FARC - de que ele parece ter sido ou ser um membro,

embora tudo indica que ele tenha recebido outras filiações, pelo que a globalidade do

seu texto, não é paradigmática dos FARC - não queremos deixar de citar uma frase sua

em que ele afirma, seguindo a tradição, o “carácter universal da alquimia” e o carácter

específicamente alquímico da “interactividade” operador-matéria (“o homem e a

matéria evoluem em conjunto”) que é reclamado por todos os alquimistas: “L’Alchimie

affirme son caractère universel car son processus s’applique à tous les ordres de la

nature. Elle ne peut être uniquement une voie spirituelle ni une voie appliquée

seulement à la transmutation de la matière. Ce qui fait sa grandeur et sa spéficité,


c’est ce système interactif où l’homme et la matière évoluent ensemble. C’est ce

qu’Eyrénée Philalèthe veut nous faire entendre lorsque, dans son «Entrée ouverte au

Palais fermé du Roi», il fait parler la Pierre et l’Alchimiste: «... aide-moi et moi je

t’aiderai, délivre-moi et moi, je te délivrerai.»265. Diz a Pedra para o alquimista:

“Ajuda-me que eu te ajudarei, liberta-me que eu te libertarei”, frase que não poderia ser

mais lapidar do discurso fundamental dos alquimistas.

264ibidem
265ibidem

190
- Outras características históricas e estruturais do grupo

Segundo Jean-Pierre Bayard266, os FARC têm, ainda as seguintes

características:

- A partir de 1708, os FARC passam a receber mulheres, no seu seio;

- O Conselho Supremo dos FARC é constituído (como já havia sugerido o texto

de Giudicelli, acima referido), por 33 membros que nomeiam, em Conclave, o

Imperator;

- O Imperator é assistido por um “Sénéchal”, um Grande Comendador, um

Hierofante maior, e cinco Grão-Mestres (um para cada parte do mundo). Sob a

jurisdição directa dos Grão-Mestres, os “Mestres-Guias” parcourent inlassablement

villes et villages à la recherche de sujets susceptibles de perpetuer la Philosophie

alchimique267. Actualmente, a Europa contará com 5 “Mestres-Guias” que fazem um

relatório mensa das suas actividadesl ao seu superior.

- Actualmente, o ensino FARC é realizado (individualmente, como sempre) por

cooptação, através de uma série de perguntas a que o aluno tem de responder - após

estudo dos livros de Caro - e enviar ao instrutor, o qual, por sua vez, corrige as

respostas. Estes livros, fundamentalmente, “Concordances alchimiques”, “Pléiade

alchimique” e o “Dictionnaire alchimique” (de Kamala-Jnana, nome iniciático de

Caro) contêm passagens de trechos dos Tratados clássicos de Alquimia

- O membros reconhecem-se, entre si, por meio de sinais e códigos, que,

segundo a “Legenda” (p.22) têm pontos comuns com aquelees que figuram no “Tuilleur

des Maçons Écossais” de 1812.

- Cada Imperator deve compor o seu brasão, mas entre os diversos emblemas

devem figurar obrigatòriamente, o pelicano, o leão e o Agnus Dei. As armas cotêm, lém

266Jean-Pierre Bayard, “La Symbolique des Rose-Croix”, op. cit., p.226


267op. cit., p.226 ; não é referida a origem desta frase (será da “Legenda”?)

191
disso, o brasão da Ordem (a cruz e a rosa) e o da Igreja Templária (o pelicano e os três

filhos, debaixo um chapeu de cardeal268;

- Apesar de terem publicado várias obras (em circuito comercial) os FARC

continuam bastante discretos, como organização. Roger Caro, em Pleiade Alchimique”,

fala-nos de um misterioso centro de Ajunta onde os membros são instruidos na Arte

alquímica.
- A última edição de uma obra de Roger Caro de que temos conhecimento foi a

realizada já depois da sua morte, por iniciativa do seu filho: Bible, Science et Alchimie,

de Roger Caro, com prefácio do seu filho Daniel Caro, nas Éditions du Sphinx, Ganges,

1994.

- Por último, devemos indicar que, para além da ligação entre os FARC e a

ENA, existe uma outra ligação com a organização “Templiers de Chypre”, também

dirigida por Roger Caro e com o mesmo local por sede269.

Em suma: os FARC são uma Ordem alquímica que se reclama, também, da

tradição templária e rosacruciana (com referências maçónicas) e que está associada a

uma Igreja cristã. A filiação alquímica reclamada é “ismaelita”, embora a via húmida do
cinábrio, por eles seguida, se encontre em outras fontes. A sua discreção está de acordo

com o tipo de recrutamento utilisado, com o seu processo de ensino e com os seus

textos onde se verifica uma integração entre a teoria alquímica, a doutrina cristã

esotérica e a parte prática específica - boa integração do “ora” e do “labora”.

268Em J.-P. Giudicelli, op. cit. figuram, a página 97, “les symboles des FAR+C”, que, embora
semelhantes, não correspondem exactamente a esta descrição - apresentaremos, este desenho, em Anexo
269Jean-Pierre Bayard, “Le Guide des Societés Secrètes”, op. cit., p. 42

192
GRUPOS ESTUDADOS NO TERRENO

SOLAZAREF E A SUA “FILIATION”

História, doutrina e linhagem

- O Período da “Tourbe”

No nº. 17 da Revista “La Tourbe des Philosophes”, com a indicação de 4º.

semestre de 1981 (mas publicado em finais de 1982), surgiu um artigo /anúncio

intitulado “Du matériel céramique pour la voie sèche et la voie humide” que marcou a

“pré-história” de Solazaref e da sua “Filiação”. Nesse artigo, informava-se que “Pierre

d’Houches” - que pouco tempo depois adoptará o nome de Solazaref - ceramista em

Auvergne desde 1973, trabalhador manual e saber-se-á depois, possuidor de boa

formação científica superior, no domínio da Física dos plasmas: travaille le grés et la

porcelaine au tour et selon les pocédés tout aussi spéciaux que traditionels. C’est - et lá

est le but essenciel de son travail de potier - un pratiquant assidu de l’art d’Hermés.

(...)Le matériel qu’il fabrique est spécialement conçu pour le travail des matières

philosophiques. Aprés ces annés de mise au point et avec l’aide de ses amis chymistes,

il a pu élaborer des terres spéciales, des procédés de façonnage tout aussi particuliers,

en vue de confectionner un matériel propre à l’Art (...) par exemple, ses creusets des

purification mercurielle (...) ses creusets de séparation, ou simplement de régule (...).

Pour des raisons que vous savez tous, Pierre d’Houches (lá est son nom de chymiste)

tient à garder un certain anonymat, sauf pour ceux qui le contacteraient. Cela
n’empêche pas, évidemment d’exercer son métier de potier tout á fait oficiellement dans

193
le monde. Voici où vous pouvez le joindre: Pierre d’Houches, aux bons soins d’Anne
Thu Thuy, Vidal /Grand Rue/ Marsat/63200 RIOM. Anne Thu Thuy, elle, est réligieuse

et se veut l’être au sens traditionel du terme. Ainsi, elle peut, avec grand sapience, re-

lier en un seul volume plusieurs écrits ou parer d’un habit noble et solide les ouvrages

qui vous tiennent à coeur”270.

Como se vê estamos perante duas pessoas (um par, no sentido alquímico

tradicional) que vivem fora dos grandes centros - por opção, já que “Pierre d’Houches”

é um pseudónimo de alguém com uma sólida formação cientíica - que adoptam um

“métier” tradicional e que vivem dele, o que aliás está em sintonia com as “novas

espiritulidades” assentes numa contra-cultura de corte com o establishment, mesmo que

este par venha a rejeitar, numa atitude tradicionalista e anti-moderna, essas “novas

espiritualidades”. De certa maneira, isso já representaria, eventualmente, um corte com

a maioria dos leitores da “Tourbe” - pessoas das cidades, com outros empregos, que se

interessavam pela Alquimia ou no seu aspecto intectual, ou então pela Alquimia

operativa (laboratorial), mas sem abandonar os seus empregos, dedicando-lhe os tempos

livres possíveis, esperando, eventualmente, que mais tarde a reforma os pudesse libertar,

finalmente, para o seu grande interesse. “Pierre d’Houches” é um nome que na “cabala

fonética” poderá significar “Pierre de touche”, a Pedra de toque - talvez indicando que a

concepção alquímica e o estilo de vida dela decorrente, fossem o “toque” de um

verdadeiro alquimista.

A esta artigo seguiram-se outros cinco, na mesma revista, um denominado

“Litterae Custodium”271, e quatro intitulados“De Operandi Modo: Igne Aquaque”272,

no primeiro dos quais se anunciava que: “un certain nombre d’articles paraîtront sur la
pratique même, entrant dans les moindres détails des nécessités de démarrage, tant en

270in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 17 , 4e. trimestre de 1981, ps. 47-48. Esta revista é editada em
Paris 5e., pela livraria “La Table d’Émeraude”, 21, rue de la Huchette.
271”La Tourbe des Philosophes”, nº.19, 2e. trimestre de 1982
272”La Tourbe des Philosophes”, nº. 20, 3e. trimestre de 1982, nº. 21, 4e. trimestre de 1982, nº. 22, 4e.
trimestre de 1983

194
voie sèche qu’en voie humide, relatant plus le matériel , les manipulations, que la
doctrine”273. Nesses artigos operativos, assinados os três primeiros por Pierre

d’Houches et Roger Beaulieu e os dois últimos apenas por Pierre d’Houches,

proclamando-se o(s) autor(es), discípulos de Canseliet e de Fulcanelli,. Assim, pode ler-

se: “Nous ne clôturerons pas cet épître liminaire sans rendre hommage, d’une manière

bien faible en regard de l’évènement, à Monsieur Eugène Canseliet, décédé le 17 avril

1982 à 8 heures au soleil”. Por outro lado, e relativamente a Fulcanelli escrevia-se o

seguinte: “Que personne ne s’identifie à ce qui a pu se dérouler entre Monsieur

Canseliet et Fulcanelli, car la situation était toute différente: rapellons que Fulnanelli,
patenté par son haut niveau d’Adepte, a lui-même confié une mission au Maître de

Savignies”. É verdade que, logo a seguir, lê-se que: “Cette mission, nous savons que les

fils de l’Art saurons la retrouver selon la réelle filiation, dans laquelle toutes les

précautions sont prises pour écerter les vautours”274, o que poderia fazer vaticinar uma

corrida para a sucessão de Canseliet. Nesse tempo, a viuva e a filha de Canseliet,

sobretudo esta eram tratadas com a deferência própria de um candidato a herdeiro

espiritual: “C’est avec la trés amicale autorisation d’Isabelle Canseliet qui, comme

Madame Canseliet, l’épouse, et en ces heures particulièrement douloureuses, du plus

profond sépulcral, ont su se montrer vraiment trés dignes de l’extraordinaire labeur de

l’Homme avec lequel elles ont toujours vécu” E, na realidade, Pierre d’Houches afirma

que, a propósito de uma questão que ocorrerá ao espírito dos “invejosos” - “la question

de la descendance initiatique ou, si l’on préfère, celle du dauphin” - é seu entender,

“qu’il appartient à la famille elle-même, notamment à Isabelle Canseliet, fidèle

compagnon de laboratoire, de révéler en la matière des choses telles quelles sont, si le

moment vient et - in occulto - selon les dernières volontés du maître275”. Nessa altura,

contráriamente ao que alguns diziam, lamentando que o Mestre de Savignies não tivesse

conseguido realizar a Obra, Pierre d’Houches afirma, pelo contrário, que ele foi coroado

de sucesso: “Canseliet a réussi!(...) l’au-delá de cette réussite, dont nous affirmons qu’il

273”La Tourbe des Philosophes”, mº. 19, p.22


274”Tourbe”,nº. 19, ps. 18 e 19
275ibidem

195
existe et dont nous apporterons la preuve en temps voulu, reste pour toujours sous le

sceau du secret filial et, répétons-le, non-nominatif. Cher Maître!276”

Mas estas referências a Fulcanelli - por exemplo, “La route fut longue qui, de
Fulcanelli, nous fit découvrir ce monde étrange et merveilleux de l’absolu, vers lequel

tout humain devrait se tourner”277- e a Canseliet - “c’est Monsieur Canseliet qu’il vous

faut suivre comme précieux guide” (...)“Cher ami Eugène Canseliet” 278- iriam, em

breve ser rectificadas, no caso do primeiro por uma negação - violentísima - da sua

condição de Adepto e, no caso do segundo, por algumas reservas e alusões à sua

“ingenuidade”. Provavelmente devido a, como diria René Girard279, “rivalidades

miméticas” assentes em “desejos miméticos”, centradas na sucessão do Mestre na qual

estavam interessados vários outros alquimistas, ente os quais Jean Laplace, primeiro

director da revista “La Tourbe des Philosophes”. As referências a Canseliet - “Par

son immense travail au laboratoire (...) l’étudiant attiré par le labeur artisanal. Tu dois

au maître des centaines de nuits de fatigue, mais de plénitude280” - continham os dois

temas que irão acompanhar - aqui sim, fielmente - todo o percurso de Pierre

d’Houches/Solazaref: é preciso trabalhar no Forno, mais do que especular: “Notre

conseil personnel: travailler. Travailler dur au fourneau” e é preciso despertar:

“Éveille-toi, obéis à la première page du Mutus Liber. Ne dors plus à toi-même. Ne te

laisse plus endormir. Attention à tous les phénomènes de considération et

d’identification, sous quelque forme qu’ils se présentent”281. No entanto, se no

primeiro tema a convergência é total, já no segundo a interpretação do “despertar” e da

via a seguir para o conseguir vai levar o futuro Solazaref a a afastar-se do seu

catolicismo integrista de partida e a enveredar por um neo-paganismo com uma

tonalidade “céltica e centro-europeia”, ao mesmo tempo que seguia as “técnicas do

276ibidem
277ibidem, p.22-23
278ibidem
279 Cf. La violence etkle Sacré, op, cit.
280ibidem, p.23
281ibidem, p.22

196
despertar” de Gurdjef – sincretismo bastante típico das “novas espiritualidades” que

Solazaref rejeitará -, enquanto que Canseliet se manteve sempre na via do esoterismo

cristão de natureza alquímica.

Paralelamente a estes dois temas, figuravam já, nesses artigos, outras

características que iriam marcar a obra do futuro Solazaref, entre as quais, as indicações

explícitas de natureza técnica (cálculos, desenhos, tabelas, etc.) aptas para chocar um

intelectual “especulativo” e referências que tinham a ver com a técnica iniciática de

“despertar” (“éveil”). Assim, no primeiro caso, encontramos planos para a construção

de um forno com indicações relativas aos materiais refractários (cimentos e tijolos) e à

natureza termodinâmica do problema (calores específicos, massas, débitos horários,

etc). Quanto ao problema do “despertar”, Pierre d’Houches (futuro Solaref) aborda -o

com referências aos textos alquímicos tradicionais, mas também com alusões

denunciando os obstáculos ao “despertar” e que são: “considération”, “identification”,

etc. - que mais tarde explicitaria claramente – extraídas da técnica iniciática de

Gurdjeff, para o qual “o homem dorme, não está despertado”: “Tous (les Pères, Adeptes

de Science) nous disent que l’Homme dort”, “C’est de ce sommeil au monde dont ils

parlent, de notre propre adormissement à la Dame et à l’Esprit”, “Nous nous

permettons d’insister tout particulièrement sur la nécessité de l’eveil, et de conseiller

au laborieux débutant d’entreprendre, avec la plus grande assiduité, cette


métamorphose primordiale en lui-même, comme le demandent tous les Adeptes”. É

preciso, pois, despertar, através do trabalho incessante, para o “mundo verdadeiro”:

“(...) le conseil des Sages est de quitter ce monde-lá, pour rejoindre celui de l’Art”282.

O acento tónico posto em indicações “caridosas” (“charitables”) – isto é,

generosas, poerque diivulgam aspectos normalmente reservados ou secretos - relativas à

prática “no forno” indispensável ao “despertar”, poderia fazer prever uma inflexão

relativamente ao estilo da revista o que, em breve, iria resultar num conflito com os

282”La Tourbe des Philosophes”, nº. 20, 3e. trimestre 1982, p. 22-23

197
outros discípulos destes dois grandes nomes da alquimia deste século, não porque eles

não exercessem a prática da alquimia, mas porque o ataque intencionalmente

provocatório aos “livrescos” e aos “intelectuais” - os que previligiavam uma descrição

literária, simbólica, reservada, e erudita dos materiais e dos processos alquímicos -

indiciava já uma diferença de tom e de escola, como veremos. Aliás o espírito desses

artigos é claramente explicitado no primeiro deles:

“- une intime union se maintiendra entre les conseils de manipulation - le

monde extérieur de l’artiste - et les conditions de développement de sa vie intérieure,

union san laquelle le travail alchimique reste stérile, tombant soit dans l’excés de

l’intellectualisme ou dans celui de la matière.

- (...) ils s’adressent aux pratiquants, aux manipulateurs, et non pas à ceux qui

ne voient dans l’alchimie que sa forme livresque”283

Estreitamente relacionado com esta postura, está a veneração à Dama (“Dame

Nature”), a Virgem, que acompanhará Solazaref nos seus primeiros escritos - muitos

terminados pela frase, Par Marie Mère de la Philosophie – já que cristianismo

tradicionalista vai dar lugar, a seguir, a um paganismo celta: “Vierge! Contemplons-la,

car elle n’a jamais déçu les hommes ni Dieu. Elle est la seule qui ait été inviolablement

fidèle, et c’est pour cela qu’on dit qu’Elle est immaculé, même lorsqu’Elle est dans la

prison du soufre: vierge minérale... La Dame est si bienveillante! Elle invite tout

d’abord l’aspirant à la visiter. Tout au début, il faut rechercher minières, eaux, sels,...:

parmi les appelés à l’art, la présence de la Vierge est un privilège. «Tu est la Mère»”.

E, para o aspirante, este conselho de sempre invocar o amor de Maria: “Si tu est perdu

devant le four ou le mortier, regarde en toi-même où tu en es dans ton amour pour

Marie (...). Tous les artistes, di fait qu’ils entrent plus avant dans le mystère de la

Dame, lui appartiennent davantage, lui donnent alors encore plus d’amour et plus

d’honneur.”.

283”La Tourbe des Philosophes” nº. 19, ps. 22

198
É preciso estar em “harmonia” com a Dama Natura, venerando Maria, Nossa

Senhora: “vivre sous le manteau de Notre-Dame” - pois ela é iniciadora: “la Dame lui

enseigne qu’il se doit être plus préservérant, plus stable”. Além do mais, ela é

dispensadora de graças aos “laborantes”, já que dispõe de materiais que põe

generosamente à disposição do “laborante”, como o orvalho - a “água celeste” - que

deve ser colhido para as operações espagíricas: “L’artiste se retrouve tout naturellement

dans les champs où la rosée se dépose, aux petits matins printanniers des précieuses

périodes de lune montante, apprenant, seul, au contact de la majestueuse Dame,

l’alphabet des gestes de laboratoire”.284

E, a propósito das diferentes vias, diz ele que “a voz corrente” diz que existirão

entre elas “diferenças aparentes” que fazem com que se considere a via breve como “la

plus extraordinaire”, la via seca como “la plus contemporaine”, a via húmida como

“la plus difficile” e a espagíria como “parent pauvre, reléguée au rang d’un vague

bricolage hermétique” . Ora, segundo o nosso autor, isso constitui um erro pois a

Espagíria é tão digna como a Alquimia “Considerer la Spagyrie comme parent pauvre

de l’Alchimie est une grave erreur. Bien de prodiges peuvent être accomplis avec la

Spagyrie (...) En outre la Spagyrie, comme toute ses soeurs (voie séche, voie humide et

voie brève), possède emð elle toutes les conditions requises pour l’évolution intérieure,

dans ses modes opératoires”285 . Por tal facto ele procede a uma igualitarização das

quatro vias e a uma recuperação e dignificação da espagíria (e elogia, inclusivamente, o

“grande mestre” von Bernus, “talvez a melhor escola alemã de espagíria” 286), pois a via

espagírica está, cono às outras, “sob o manto de Nossa Senhora”: ”Tout ce qui meut

sous le manteau de Notre-Dame lui appartient. Dés lors, comment oser prétendre que

l’une de ses parties est plus noble qu’une autre ? La Vierge est immaculée: la spagyrie

est immaculée, la voie humide est immaculée, la voie sèche et immaculée, la voie brève

est immaculée. La finitude des quatre voies ne concerne pas les hommes dans son

284”La Tourbe des Philosophes”, nº. 21, ps. 21-24


285”La Tour des Philosophes”, nº. 23, p. 27
286 “quasiment la meilleure école allemande en spagyrie. Von Bernus est un grand maître””, ibidem, p.26

199
essence, et la pierre des philosophes n’est pas plus l’apanage d’une voie que d’une

autre”287. É claro que para além de um intenso cristianismo, há uma perspectiva

interessante de “retorno à Natureza”, muito caracterítica das novas espiritualidades.

Mas qual das vias seguir - “La spagyrie, la voie humide, la voie sèche ou l’art

bref, vers quelle destinée est appelé l’artiste?”. A resposta está na “linguagem dos

pássaros”, nessa linguagem, mais poética que racional, que privilegia a intuição e a

inspiração e que pode dar respostas ao alquimista:“C’est lui, aspirant, qui viendra te

guider pour choisir ta voie. Il est la forme manifestée de Marie, des saints anges et de

l’Esprit Universel. Il est la seule voie. Il est la porte ouverte au palais fermé du roi”. E,

a propósito, ele elogia (ainda) Fulcanelli e Canseliet “Comment ne pas rendre un

immense hommage à Fulcanelli et à son disciple, M. Canseliet, eux qui, par leur bonté,

ont révélé jusqu’au monde profane la seule clef permettant d’accéder réellement au

fourneau!”. Em suma, “é preciso ouvir o coração”“La voie ? Ami aspirant, écoute en

ton coeur, attends patiemment dans la prière et dans les signes. Le langage des oiseaux

révèle, l’appel du dedans à l’art est l’orientation”288. Não referiremos aqui a

dissertação sobre as vias e alguns temas operativos como o “vitríolo”, o “nitro”, a

“assadura” (“assation”) em via seca – de carácter mais técnico -, o que faremos adiante,

mas iremos deter-nos, brevemente e desdde já, sobre outras características que esses

artigos da “Tourbe” continham e que, mais tarde, iriam continuar em “Solazaref”.

Assim, a questão da “prática religiosa tradicional”, relativamente à qual, Pierre

d’Houches segue o laico, mas não areligioso Fulcanelli - a quem ele mais tarde acusará

de maçon – e o cristão católico Canseliet: (“a prática religiosa tradicional” é)“la Pierre

angulaire de l’Oeuvre (...) est également la pierre fondamentale de l’Église et de la

Vérité chrétiennes”289. Esse espírito religioso é referido, pelo futuro Solazaref, como

287”La Tourbe des Philosophes”, nº.22, ps. 9-10


288ibidem,p.11-12
289Fulcanelli, “Les Demeures Philosophales”, Paris, 1973, p. 350-351, citado no artigo “De Operandi
Mode: Igne Aquaque”, in “Tourbe des Philosophes”, nº. 23, p. 17

200
sendo essencial ao domínio do ego, etapa fundamen tal da via do “despertar”: “Ce qui

est nécessaire pour le travail est avant tout la pratique en notre temps d’un état

religieux, afin de renouer avec la Tradition en nous exorcisant du fabuleux pouvoir

hypnotique de l’ego. Une absence quasi totale de l’influence primaire de l’ego est

requise pour se mettre au travail (...). Notre sciècle exige un travail au préalable, qui

fait appel plus que jamais à l’observance strcte d’une discipline religieuse (...). La

pratique stricte d’une discipline religieuse n’est pas un vague étude symbolique de telle

ou telle religion(...) Elle est comme l’Alchimie: opérative et non pas livresque”290.

Por outro lado, a afirmação de que o objectivo da Alquimia deve ser a

elaboração das “medicinas” - “mécines du premier, second et troisième ordre, que

chaque chymiste se doit de pratiquer au laboratoire sans en ommettre aucune, avec tout

ce que cette pratique comporte comme éléments guidants et sûrs”291 - objectivo que

também é assumido pelos FARC, como vimos acima. E para justificar um

“enciclopedismo” ou versatilidade alquímicos, que alguns acharão excessivos, Pierre

d’Houches, sustenta: “C’est ainsi que les quatre voies dont nous parlons entrent

précisement dans le cadre des trois médicines. Cela veut dire qu’un alchimiste ne peut

pas ignorer une médicine plus qu’une autre, une voie plus qu’une autre. Un alchimiste

est, par conséquent, aussi bien spagyriste que pratiquant la voie sèche ou les autres. Un

alchmiste, tout comme ce qu’il vit, s’ouvre fatalement dans le sens positif de l´’evantail

de la connaissance que la Dame déploit, au lieu de se perdre dans ce qui devient alors

sectairement une vulgaire spécialité dans laquelle, necesse est, il ne peut aboutir”292.

Esta crítica da especialização alquímica, irá ter as suas consequências quer no “Introitus

ad Philosophorum”, quer na “Somme Hermétique”, onde as quatro vias terão papel de

relevo numa exposição quase enciclopédica - o que não admira pois o autor praticou-as

todas.

290”Tourbe des Philosophes”, nº. 23, ps. 21-22


291”La Tourbe des Philosophes”, nº. 22, p. 14
292ibid., p.15

201
Também aparece nos artigos da “Tourbe”, inevitávelmente e uma vez mais, a

grande questão da operatividade e da especulação: “il ne faut pas (...) laisser ceux qui

ne pratiquent pas parler de pratique”, pois, “ce attitudes de «parler sans faire les

choses à faire» engendrent ou sont issues de ce que nous reprochent à juste titre lçes

Jung et Bachelard (...). O que não retira o valor a certos trabalhos “intelectuais”:“Voilá

qui n’a rien à voir avec des études comparatives ou des analyses symboliques: il faut

des intellectuels, des analystes, seuls eux sont capables de réaliser ces travaux de

fourmi, de recherche livresque. Ils rassemblent, comparent, retirent de la poussière

certains écrits de valeur, voilá qui est trés utile”293.

Postas as coisas nestes termos, já estavam lançadas, como dissemos, as sementes

para um conflito entre os “operativos” e os “especulativos”. E embora Pierre d’Houches

agradeça ao edotor da revista: “Nous avons en cela l’aide trés chaleureuse de toute

équipe de la Table d’Émeraude: qu’elle soit remercié particulièrement, et de leur

témoigner en public notre confiance. Non pas que l’équipe fût une sorte de «complice» -

elle qui se caractérise justement par sa complète indépendance - mais tout simplement

parce qu’elle nous offrit cette liberté d’intention à l’égal d’autres qui avaient aussi trés

bien compris les nécessités de l’heure”. E prevendo que será necessária uma “limpeza”

das “cavalariças“ (termo que ele utilizará, neste contexto, num opúsculo posterior, Du

nettoyage des écuries d’Augias) da Alquimia “l’Alchimie opérative reprendra le droit

aprés le grand nettoyage prévu dans quelques années”, onde, com algum

maniqueismo “les justes retrouveront le saveur de vivre authentiquenment en Alchimie,

les méchants seront alors classés dans les poussièrreux dosiers de l’histoire, en

compagnie de leurs semblables”294, Pierre d’Houches anuncia o seu retiro do meio

“mundano”, o virar de costas ao mundo: “C’est à la suite d’une fraternelle réunion

entre postulants à l’Art, que nous nous retirons définitivement vers le laboratoire (...)

Tant que Dieu le voudra, nous serons, du fond de notre laboratoire, discrètement

293”La Tourbe des Philosophes”, nº. 23, ps. 30-31


294ibidem, p.16-17

202
présent en observant l’évolution de la question alchimique. Et, au besoin seulement,

nous interviendrons ponctuellement pour donner notre point de vue, mais seulement si

les circonstances l’éxigent”295. Este “retiro” e esta “exclusividade” laboratorial, iriam

ser anunciadas e impostas, também, aos discípulos, pelo “novo herdeiro”: “Pour

l’heure, tous au travail (...) En signe de pénitence, j’impose à ceux qui marchent sous la

bannière du nouvel héritier un silence absolu de deux années de laboratoire (...) Tous
au charbon”.296

Ora, se a intenção era de silêncio exterior, ela não foi respeitada, pois não só ele

foi autor de uma das mais prolíficas produções alquímicas de sempre, como as suas

intervenções nunca primaram pela “discreção”. Por outro lado, o último artigo desta

série de cinco publicados pela “Tourbe”, anunciava, também, o começo da ruptura com

a linhagem “Fulcanelli-Canseliet” que, segundo ele, tinha “posto o dedo na via seca”, a

qual não era a única adequada aos nossos dias e além disso, embora hoje se verificasse

um primado dessa via - “la voie sèche semble plus à aisée de nos jours que la voie

humide” - mais tarde, a via preferencial será a via breve: “En cette époque donc, la voie

sèche peut avoir une sorte de préférence, comme plus tard, lorsque le monde sera

encore plus pollué, la voie brève”297.

- A “Tempestade”: do “Introitus” à “Soma Hermética”

Numa brochura provávelmente publicada em 1983 - seguramente antes do

“Introitus” - intitulada “L’Obédience Conventuelle Alchimique à l’Aube du Xxe.

Sciècle”298, Solazaref proclama o seu “brasão” e a sua descendência iniciática que

decorria de Fulcanelli, Canseliet e do Adepto N.: “Le temps de l’imposture est mort.

Cela est notre blason.(...). Servir, c’est l’unique voie qui offre la magnificence à notre

295ibidem, ps.15 e 37
296Solazaref, “L’Obédience Conventuelle Alchimique à l’Aube du XXIe. Sciècle”, s.l., s.d., p. 4
297ibidem, p. 29
298Solazaref, “L’Obédience Conventuelle Alchimique à l’Aube du XXIe. Sciècle”, s. l., s. d., p.2

203
blason, celui de la fraternité. C’est l’heure de réunir autour du même feu, tout prés du

Graal, les fils de Science que Eugène Canseliet a formés au secret dans l’ombre de la
transmission de Fulcanelli et de mon maître N..., par lequel j’ai reçu la Pierre”. E, ao

mesmo tempo, vincava bem a sua linhagem alquímica e a legitimidade do seu “poder

temporal”, recebido da filha de Canseliet - “La loi nouvelle qui m’a été remise par

Isabelle Canseliet est celle des actes dans la bonne direction. Le laboratoire passe par
là et uniquement par là (...) J’en assure dorénavant la paternité ainsi que l’autorité

temporelle”. Em suma, Solazaref afirmava a sua filiação: “Les derniers écrits en date

d’un authentique Maître sont ceux de Monsieur Canseliet, précédé de Fulcanelli et,

pour l’Europe Centrale et l’Asie, de N..., dont je présenterai les manuscrits un jour.

Eux sont entièrement crédibles, justes, saints et trés vrais. Ils sont, avec leurs Pères, la

seule référence contemporaine indiscutable.”299. Como veremos, este projecto de

reunir todos os discípulos de Fulcanelli e de Canseliet, numa “Obediência conventual

alquímica”, fracassou - talvez por “culpa” do próprio Solazaref, que introduziu a

filiação do Adepto N..., com consequências drásticas no plano operativo e doutrinal.

Em 1988, no polémico livro “Les Bûchers du Xxe. Sciècle”, Solazaref indicava,

a propósito de “um vasto complot contra a Alquimia”, o nascimento histórico da sua

“Filiação”, nos seguintes termos:

“- Saint-joseph 1983: plusieurs personnes sont conviés à une réunion de

manière à éclaircir la situation du moment. Rien de sérieux n’a encore jamais été écrit

sur l’Ari bref. Laplace était venu, inquiet; il était là pour demander l’initiation à l’Art

bref.

- 1984: premières parutions publiques d’écrits de notre filiation en tirage limité.

- 1985: les sangsues s’étant procuré des copies de ces écrits, on se met à parler

d’Art Bref avec des moyens puissants.

- 1986: le milieu commence à nous accuser de plagiat...”300.

299ibid., p. 4
300Solazaref, “Les Bûchers du Xxe. Sciècle”, Teilhède, 1988, ps. 227-228

204
No Segundo Caderno da revista “Tempête Chymique, face à l’Athanor:

aujourd’hui”, da “Filiação Solazaref” - filiação que, na altura, era denominada, com

frequência, “Assemblée des Philosophes” - era explicitado, mais detalhadamente, o seu

nascimento:

“Le premier dimanche de l’Advent de 1983, jour de la résurgence effective, à

visage découvert, de l’Assemblée des Philosophes, notre guide de filiation brève,

Solazaref, avait prononcé ce mot régence, dont il nous fut difficile de saisir à la fois

l’ampleur et le sens précis. Cependant, de fait, nous avions été appelés: nous partions.

La Quête exige l’abandon à la Providence et la confiance en la lanterne de la Dame.

L’Assemblée des Philosophes devait exercer la Régence, comme nous l’avait annoncé

Solazaref, en sa clairvoyance. Pour prier, travailler au feu, servir.”301

Mas perguntava-se o autor deste artigo, companheiro e discípulo de Solazaref:

“Mais où était la légitimité, quelle était la Régence?”. A “regência” estaria na filha de

Canseliet? Não, no seu entender: “Présente, ô combien, Isabelle Canseliet se tient dans

l’ombre. Telle l’oiseau nocturne, atribut de la sagesse, elle écoute et observe.

L’obédience demande que chacun soit à sa juste place. Isabelle Canseliet a maintenu en

suspension le souffle de la Science”.

Então quem investiu Solazaref nessa “regência”? “C’est également à cette

hauteur que se situe l’intervention brève de Solazaref, avant qu’il ne soit appelé à cette

plus filiative charge, spécialement dans son ouvrage Introitus. Il est bienséant de croire

que ces coups de foudre représentent justement les deux Adeptes, N... et Fulcanelli, se
donnant la main dans l’éternité alors que, le calme revenu au bon niveau

philosophique, l’héritage reprend ses devoirs d’obédience. Tout cela était caché depuis

bien des annés et, si Solazaref n’a connu Eugène Canseliet que tardivement, c’est lui

301Jacques de Beaulieu et son épouse (sic), “Alchimia sola est”, in “La Tempête Chymique”, deuxième
cahier: Carême 1985, p. 16

205
qui prépara le corps du Maître avec Isabelle, et il était depuis douze ans disciple averti

de celui qui le nomme aujourd’hui”. E quanto a esse (então) misterioso Adepto N..., “il

suffira de révéler que l’Adepte qui enseigna la voie brève à Solazaref n’est évidemment

pas inconnu de Fulcanelli, puisqu’ils sont tout les deux couronées. Il serait cependant

vain de tenter le moindre rapprochement entre les deux Adeptes sur le plan de ce

monde, parce que d’une part ils ne sont pas de ce monde et, d’autre part, si quelque

chose pouvait les séparer, ce ne serait que quelques dizaines d’annés d’âge, du point de

vue du monde”302.

Como se vê, há uma preocupação da parte de Solazaref e de seus discípulos,

após o rompimento com a “Tourbe” de se referirem, ainda, à linhagem Fulcanelli-

Canseliet, invocando, ao mesmo tempo, uma explícita ou implícita autorização de

Isabelle Canseliet.

Em 1984, sai uma obra monumental, da autoria de Solazaref - o Introitus ad

Philosophorum Lapidem, numa cuidada e dispendiosa edição do Autor, numa tiragem

de 350 exemplares, dos quais 50 numerados – edição que iria causar um verdadeiro

choque no meio alquímico internacional pela erudição alquímica e científica e pela

doutrina do “despertar” - Gurdjeviana - nele contida. A provocação caiu como uma

bomba: desde fotos de Solazaref a fazer tiro ao alvo com uma “Smith & Wesson”, ou a

atirar ao arco, até ao regime alimentar aconselhável ao alquimista, mas sobretudo as

determinações acerca do trabalho sobre o “ego”, “tomando consciência da sua

nulidade”: “...Prendre conscience de la nulité de soi, plusieurs grand chocs sont

nécessaires...Le regard solaire, ouvett au monde, par lequel “je” est mort, voyant tout”,

lê-se, por exemplo, na legenda de uma das fotos incluídas no livro303.

302ibidem, p.16 e 17
303Solazaref, ”Introitus ad Philosophorum Lapidem”, Chez l’Auteur, imprimerie Dole à Moulins, 1984, p
71

206
A primeira parte, intitulada “Ce qui est/ Ce qui est possible”, começa por uma

página dirigida aos “Amis Philosophes”, em que se vê uma gravura de um homem de

cabelo comprido e barbas e com um hábito comprido, com cinto (o próprio Solazaref),

segurando na mão direita um pergaminho enrolado e, na esquerda, empunhando uma

espada que está colocada sobre o ombro direito de um homem ajoelhado e com as mão

postas em oração. Este armamento - é disso que se trata, um armamento de um

alquimista - desenrola-se sob um céu nublado do qual desce uma pomba do Espírito

Santo. Aqui está claramente enunciada a vocação dos elementos da Filiação Solazaref:

mais do que sacerdotes da Natureza - a vovação religiosa cristã é explícita: “Vous,

portulant à l’Art, commencez par vous mettre à genoux et par dire: AU NOM DU

PÈRE, DU FILS, ET DU SAINT-ESPRIT AMEN”304 - eles serão uns guerreiros da

Natureza e não seus sacerdotes. Esta via alquímico-cavaleiresca - com consequências

políticas inquietantes que referiremos - é referida mais adiante, no Tratado: Mais tout

comme dans la Chevalerie, qui n’a pas d’époque puisqu’elle est principalement

spirituelle dans son essence, l’Alchimie ne demande-t-elle pas également la fidélité

absolue à la parole donnée, l’unité de soi et l’engagement irréversible au service des

réalités supérieures?”305 . Mas para que serve este combate, hic et nunc ? Desde logo,

ele serve para vencer o ego, mas tambérm para vencer os “falsos”: “nous affirmons,

avec toute la puissance de notre expérience à l’Athanor, que toute personne n’exerçant

pas à la pince ou au ballon n’est pas autorisée par les Pères à transmettre quoi que ce
soit (...). Nous ne serons jamais assez combatifs contre ces faux, nous ne sévirons

jamais assez comme à l’image de la trés-sainte chevalerie; l’épée tintant le Graal

s’octroie le pouvoir de donner la mort”306. Esta atitude “cavaleiresca” fê-lo lançar um

apelo, no “Les Bûchers du Xxe siècle”, para resistêrncia armada contra a eminente

(segundo Solazaref) invasão da Europa Ocidental pelas tropas soviéticas e levou alguns

dos seus directos colaboradores, vestidos à motard e armados de correntes e matracas, a

atacar e a danificar um stand da revista “La Table d’Émeraude”, numa Feira de Livros

304ibid., p. 19
305ibid., p.37
306ibid., p.113

207
esotéricos – o que deu origem a um processo judicial contra a “Filiação”. Curiosa ideia

de cavalaria...

Este Tratado de Alquimia - a Alquimia, “Fille de Dieu, source pure de la

miséricorde de Marie notre trés-sainte Mère”307- é dedicado, entre outros (ao Pai,

“medalhado da Resistência”, à Mãe, “mãe de cinco filhos, fiel, amantíssima,

trabalhadora, esposa exemplar”, “aos artesãos que trabalham com as suas mãos”) aos

seus Mestres, “ceux qui furent mes maîtres, pour avoir su m’administrer de justes

corrections”, e onde está ausente significativamente, Solazaref e onde é privilegiado o

Adepto N. – que, segundo Solazaref, conseguiu que os efeitos de Chernobyl fossem

controlados...: N., Adepte, qui m’enseigna l’Art brevis, par lequel je suis arrivé, Le

Cosmopolite, Monsieur Eugène Canseliet, Père Paul, moine, Archimandrite Placide D.,

Kowaliski, fils de l’Arménien trés estimé, Tri Sang, moine instructeur bouddhiste au

Viet-Nam, assassiné par les Viet Minhs, d.C., indien d’Amérique Centrale, Père E. de

L., Abbé, Frère Marcel, ermite bénédictin.”308. Ele foi entregue “em mão” a “vingt-

deux personnes qui, par leurs actes, ont montré qu’elles étaient dignes de le recevoir,

de le conserver et de transmettre le moment voulu. Ces élèves ont parcourru, ensemble,

la longue route d’un pélérinage de plus de cent soixante dix kilomètres, à l’iisue

duquel le présent traité leur fut confié. En outre, l’initiation dont il est question plus bas

a été vécue par ces mêmes êtres au château de Plessis-Bourré, le Dimanche de

Pentecôte 1984, par l’artifice d’une opération d’Art Bref (...) Les futurs disciples

seront reçus par ces derniers. Ce n’est qu’à la suite d’épreuves qu’ils seront, à leur tour

et selon la Tradition, acceuillis au sein des Frères postulants de la Rosée Cuite”.309

A intenção do “Introitus” é clara: para além de ensinar a técnica, as técnicas

alquímicas, ele pretende “despertar os postulantes”, convvida-los a “não dormir”: “Fils

de Science, pardonnez-moi de vous réveiller, vous me l’avez demandé. Comment

307ibidem
308ibid., p.5
309ibid., p.9

208
voulez-vous sortir quiconque du sommeil sans le secouer un peu?”310. E, na realidade,

Solazaref cumpre a promessa, pois: “Atteindre l’Adeptat, c’est en premier lieu ne plus
dormir”311, “Il ne faut jamais oublier”, “Ceux qui luttent sont ceux qui se rappelent”.

Por isso, utilizando assuntos que alguns pensarão não ter “rapport direct avec

l’Alchimie”312 - como a psicologia, a fisiologia - o Autor compõe um dos mais

extraordinários livros de Alquimia que conhecemos (embora com consequências

políticas e sociais lamentáveis), não só pelos enormes conhecimentos alquímicos que

evidencia - frutos de uma experiência laboratorial inquestionável - mas também pela

doutrina iniciática gurdjeviana do “despertar”, da libertação do império do ego, que ele

enxerta na Alquimia. Pode questionar-se se é legítimo um Tratado de Alquimia, ir

recorrer a uma doutrina estranha a ela, as técnicas necessárias ao desenvolvimento

imterior. Mas então a Alquimia não é, por si só, um instrumento potente de

transmutação interior? A resposta de Solazaref é negativa, relativamente aos dias de

hoje pois segundo este Alquimista, “l’homme a cristallisé définitivement une nouvelle
dimension de lui-même dans cette relation négative avec l’univers: la personalité,

l’ego313”. É portanto necessário associar, em seu entender, à Alquimia, técnicas

poderosas de trabalho sobre o ego, que ajudem o homem a despertar para uma dimensão

a que ele tinha acesso outrora. Esta “bricolage” iniciática, característica das novas

religiosidades e espiritualidades, atinge uma “Filiação” que se pretende tradicional,

embora ela invoque plausíveis razões numa retórica convincente.

O “Introitus” é um Tratado da Alquimia - “destinado essencialmente ao ensino

dos discípulos de Solazaref”314 - com cerca de 400 páginas, em três partes, das quais a

segunda contem treze capítulos, tantos quantos os degraus da “Escada Santa” que é

necessário subir para realizar a Grande Obra. Desses capítulos, indicaremos os seus

títulos - que referem uma qualidade iniciática - acompanhados das respectivas


310ibid., p. 7
311ibid., p. 24
312ibid., p.25
313ibid., p. 43
314”ce livre est essenciellement destiné à l’enseignement des disciples de Solazaref”, op. cit., p.9

209
operações alquímicas laboratoriais - em itálico, tal como figura no livro, no caso dos

capítulos sétimo a décimo segundo, cujo texto está ausente (só existe a primeira página),

ou em letra normal (embora incluindo citações em itálico), por nossa iniciativa, para os

Capítulos que estão realmente presentes no Tratado. Esta associação entre as operações

de transformação interior e as operações laboratoriais – que é uma atitude comum na

Alquimia - está presente, desde o começo da “Filiação”: “Notre époque de révélations

galvaudées ne peut mener qu’au désespoir si le laboratoire intérieur n’a pas été visité

par les mêmes harmoniques. L’étalage de la dextérité opérative rencontre l’examen


attentif de l’intériorité”315 .Mas, se ela não está sempre articulada linearmente entre

umas e outras - existe uma subtil a-causalidade, na maior parte dos casos - não deixa de

ter interesse, para pôr em relevo a ligação entre o que se deve passar no interior e no

exterior do operador.

- Premier degré: “Le Renoncement” - No primeiro grau - degrau - da “Escada

Santa”, “la Renonce”, é dito que “seul le maintient de la lutte entre l’ego et l’être
pourra créer l’énergie suffisamment permanente pour vaincre vos fixités”316. Quanto

à parte operativa, vemos, nesse capítulo, uma página onde figura uma foto, com a

seguinte legenda:”voici, au sortir de l’oeuf brevis, saturne rendu philosophique, prêt à

recevoir le particulier de Vigenère”, e onde é referida uma transmutação, “issue d’un

particulier de Vigenère sur le Plomb, en or trés fin”. Isto, como prova operativa da

validade da filiação - a da capacidade que ela tem de realizar a trasmutação metálica,

neste caso, através de um “particular” do Autor do “Traité du Feu et du Sel” - pois, para

renunciar, é preciso ter confiança.

- Deuxième degré: “Le Détachement”- onde é referido onde e como instalar o

laboratório, seguindo as regras da geografia e da geometria sagradas (as ondas telúricas,

o número de ouro) que permitem a criação de um espaço sagrado “détaché” - e sancire é

delimitar, separar - do espaço profano: “Si la sublimation est le facteur puissance

mathématique, si la Remore est celui de la racine, la séparation sera bien évidemment

315Solazaref, “L’Obédience Conventuelle Alchimique à l’Aube du XXIe. Sciècle”, p. 3


316ibid., p. 110

210
la division, base arithmétique choisie pour le calcul de dimensions de l’enceinte

variable avec l’hauteur du charbon ou la grille du brûleur”.

- Troisième degré: “L’Éxil volontaire” que, segundo Solazaref, se distingue da

Renúncia e do Afastamento, pelo facto de ele ser “sans retour”, porque o Exílio
Voluntário implica uma “atitude tradicional”. Neste capítulo é mencionada a questão da

extracção du “Sujeito” das minas - “l’exil volontaire est l’étape philosophique qui

concerne l’extraction du Sujet de la mine”317, explica ele, ao mesmo tempo que se

desculpa por não nomear essa “matéria primeira”, “par simple respect pour la Dame”.

Também são dadas, explícitamente, indicações sobre a construção do Athanor, que

complementam as fornecidas nos artigos publicados sob o nome de Pierre d’Houches,

nos nºs. 19 e 20 da “Tourbe”

- Quatrième degré:“De la trés louable obéissance” - Este quarto grau - “celui

de l’ordre, de la mesure, de l’équilibre, du discernement mais aussi celui de la pauvreté

quantitative des fournitures, de l’abnégation des fioritures inutiles, de la sobrieté des

usages”318- diz respeito ao “material que envolve o Athanor”, assim como às

“condições exteriores” e nele são dadas indicações sobre as terras refractárias destinadas

ao fabrico dos vasos alquímicos, a lista do material necessário às quatro vias e as

indicações relativas ao “Sujeito”, à elaboração do Régulo e à separação seca; figuram,

ainda, um desenho de um molde para o régulo e a fotografia de um Athanor e “uma

descrição sumária para a elaboração de uma pequena retorta”;

- Cinquième degré:“La fervente pénitence” - são referidos os “trabalhos de

Hércules” e é descrita a elaboração do carvão de madeira para se “tentar a fusão de

marte” e são dados os planos para a construção do “forno de combustão”:”Puisque nous

sommes au degré cinquième qu’est la pénitence, c’est-à-dire la combustion des corps

engendrés par les mauvaises pratiques de l’ego, voici la description de la bonne

manière de préparer le charbon de bois, afin que vous puissiez, si le dessein de mes

ennemis se précipitait sur moi àvant l’heure, tenter la fusion du mars en votre

317ibid., p. 152
318ibid., p. 187

211
temps.”319. Este capítulo inclui, ainda, referências à Espagíria vegetal - obtenção dos

três Princípios e sua conjunção num “vaso de circulação” 320- e, também à elaboração

de um termopar para medir as temperaturas de 250º c a 1200º C;

- Sixième degré: “La mort” - Aqui referem-se alguns elementos sobre o

amonìaco, pois “bien peu d’Adeptes indiquèrent, dans leurs traités, lusage précis de

l’hammoniac”. De resto, esse “sal de harmonia”, ou harmoníaco”, aquando da

putrefacção dos corpos, “est l’agent transmisseur des qualités de l’astral - astris”.
Como escreve Solazaref, “este sexto grau, marca o fim do Introitus ad Philosophorum

Lapidem”, pois, “la séparation philosophique au sens complet du terme, le point, le

pont de jonction qui relie cette finitude avec les purifications mercurielles, s’effectue

par l’usage de ce fameux sel”, sal que, como o Autor indica, é “le seul être capable de

donner l’essor au soufre philosophique”321


- Septième degré:“De l’affliction qui produit la joie” (Degré vécue avec le

Maître, par nécessité traditionelle) - Comme le feu secret sépare et purifie, l’affliction,

par ses larmes pures, détruit toutes les impuretés visibles ou cachés. Au laboratoire:

les purifications mercurielles (rectification des sels adéquats)

- Huitième degré: “De l’absence de colère et de la douceur” (Tome II

d’Introitus ad Philosophorum Lapidem) - Au laboratoire: les purifications mercurielles:

- quelques tours de main au fourneau - la presévèrance (Voie sèche et voie humide)

- Neuvième degré: “Du Ressentiment” (degré vécu avec le Maître, par

nécessité traditionelle) - (...) Ne veuillez pas aux hommes, mais aux causes qui les ont

perdus - Au laboratoire: Les purifications mercurielles: les échecs

- Dixième degré: “De la Médisance” (idem), Nul homme sensé n’ignore que la

médisance est le produit de la haine et de la rancune (...) Au laboratoire: Les


purifications mercurielles: l’absence de la qualité vitriolique ou la canonicité première

319ibid., p. 240
320vide foto, op. cit. p. 253
321ibid., p.279

212
- Onzième degré: “Du bavardage et du Silence” (Tome II d’Introitus ad

Philosophorum Lapidem), (...) Au laboratoire: La préparation des aigles, les vaisseaux


(voie sèche et voie humide)

- Douzième degré: “Le mensonge” (idem) - Vous êtes tellement habitué à

mentir(...)Pour dire la vérité, il faut acquérir une énergie spéciale, dont le trait

caractéristique est l’absence de considération. Au laboratoire: Le bilan intérieur du

premier oeuvre

- Treizième degré: “De l’Acedie”(idem). Le bilan intérieur du premier oeuvre

est le seul qui vous autorise à traiter d’une manière irréversible toutes vos maladies de

l’âme. Accesion au second corps. Au laboratoire: Médicine du deuxième être


minérale, propice à l’acquisition des conditions psychiques et spirituelles nécessaires

au deuxi*ème oeuvre sec et bref

- Quatorzième degré: “Du ventre”. (...) vous ne savez plus que vous êtes

gourmands”322. Neste capítulo, são descritas as “zonas de fixação de energia vital”, no

homem anímico, no afectivo e no intelectual, com vista à obtenção do “equilíbrio das

três funções” e à obtenção da “harmonia” do “ser permanente” - e os diversos

“alimentos” (os alimentos, o ar e as “impressões”) e “digestões”, com os respectivos

“choques”. “Nous ne continuerons pas la description de l’enchaînement du processus

de digestion traditionnel, car il est secret, et il faut que vous le découvrez par vous-

même: cela fait partie de votre libération intégrale du péché originel.” É por isso que

“le maître veille ainsi sur vous jusque dans votre estomac: c’est comme cela qu’il vous

change, avec vous”.323 Daí a importância de estudar os regimes alimentares, quais as

preferências dos diversos tipos (anímico, emocional e intelectual) e qual a sua relação

com as fases da Obra alquímica324:

322ibid., p. 309
323ibid., p. 315
324ibid., p. 320

213
Tipos Preferências Fase da Obra

anímico Carnes, charcuterias, álcoois, excitantes, etc Reino da 1ª.Obra,

Trabalhos de

Hércules

emocional Sub-produtos animais, leites, leguminosas, cereais, Reino da 2ª. Obra,

bolos, etc estabilidade

emocional

intelectual Vegetais, águas minerais, chás, fruta, oleaginosas, Reino da 3ª. Obra

integração cósmica

Além disso, são fornecidos325 conselhos quanto aos cuidados gerais a ter com a

alimentação:

- beber água entre as refeições

- cuidar das “justas doses” do “conjunto prótidos-glúcidos-lípidos”

- realização de exercícios físicos, para eliminação conveniente

- ingestão de produtos sãos

Quanto ao jejum, “bien qu’elle fasse partie intégrante de ce degré, sera examiné

dans le Tome II d’Introitus”326. Seguem-se outras indicações sobre a respiração e a

música - o canto sagrado. Quanto à primeira, “Pour extraire le plus possible la filiale

nouriture de l’air - celle qui aidera à ce troisième choc -, il est nécessaire que votre

organisme dispose d’une quantité non négligeable de substances fines

correspondantes, dont l’élaboration s’est réalisée par votre propre ascèse. C’est alors

et seulement que les corps que vous aurez conçus en vous agiront comme des aimants
sur les substances sacrées contenues dans l’air”.327 Revela-se muito interessante esta

passagem, pois ela tem a ver com a chamada “alquimia interna” (que não tem nada a ver

com a alquimia psíquica ou mística) ou “via das substâncias”, embora nesta o objectivo

325ibid., p. 322
326ibid., p. 336
327ibid., p. 350

214
seja mais a constituição do “corpo de glória”, que sobrevivirá à morte, do que a simples

absorção do “prana” do ar - embora um não se possa dar sem o outro, provàvelmente.

A educação da “função emocional” e da sua “metabolização” - expressões que

sugerem os ensinamentos de Gurdjeff - são postas em evidência, no final do Capítulo.

Assim, a propósito da imperiosidade da “participação emocional do discípulo”: “Votre


participation émotionelle est impérative. Cela s’apprend par l’ascèse, cela ne

s’interprète ni se formule intellectuellement”. E Solazaref dá, como exemplo a ligação

entre Canseliet e Fulcanelli: “L’attente du Maître de Savignies ne concernait pas tant le

temps météorologique - bien qu’il soit primordial sur un autre plan -, que la

métabolisation de l’énergie émotionelle nécessaire, qu’il attendait par la venue de

Fulcanelli”328. Isto tem, além do mais, um grande interesse, pois volta a colocar o

problema da filiação, num contexto do “processo emocional”. Embora Fulcanelli no

Introitus, já se afirme discípulo do Mestre N..., ele não corta radicalmente, ainda, com

Fulcanelli, e muito menos com Canseliet - com este, nunca haverá um corte, mas uma

distanciação. Referindo-se a Canseliet, diz o Autor:“Tout était prêt, et l’immense savoir

dont il était dépositaire pouvait exorciser les caprices météorologiques. Notez comme

personne n’a souligné la profonde nostalgie des termes avec lequels il relattait

l’attente. Il amorçait ainsi intérieurement le processus émotionel qui émettait une

onde capable de correspondre avec Fulcanelli ou sa filiation. Il obtint sa réponse, son

ordre de mission, que je vous répète: allez, pélerins, vous recueillir sur sa tombe.”

Voltando à função emocional, ela tem, segundo Solazaref, uma importância

muito grande durante a 2ª. Obra: “Nous avions souligné l’importance d’éduquer la

fonction émotionelle comme étant celle qui est le centre de la vie intérieure du disciple

au second oeuvre. La coction, dont certaines tares s’maginent encore qu’il ne s’agit

que d’une manipulation subtile, requiert un type de choc spécial, qui concerne les élus.
(...) l’artiste méritant (...)maintenant, arrivé à ce stade de l’oeuvre, il atteint le seuil

328ibid., p. 344

215
d’oraison tel qu’il ne subsiste plus aucune distance entre la Dame et son porpre

accomplissement. (...) De cet accomplissement dépend directement la qualité de la


Pierre. C’est pourquoi et contrairement à certains bruits qui circulent dans les salons,

les souffleurs malins qui «arriveraient» par esprit déluré à une pseudo-coction

n’engendreraient rien d’autre qu’un petit particulier à l’or, sous forme saline, capable

de transmuter seulement une à dix fois son propre poids. La Pierre est bien autre chose.

Outre ses capacités transmutatoires grandement supérieures - jusqu’à cent mille -, elle

vit et n’a rien de commun avec un particulier”329. Interessante é notar que, em relação

ao “domínio do ego” dos “eleitos”, Solazaref escreve - numa alusão clara ao sufismo

islâmico: “la condition humaine d’élu préssupose la baraka, c’est-à-dire l’aide directe
de Dieu - le don des étoiles -, se traduisant par ce qu’on peut dénommer une «cause sur

le monde»”330. No entanto, a Alquimia desta filiação é assumidamente cristã: “En

Alchimie chrétienne, c’est au fur et à mesure de votre métamorphose que vous

consumez l’énergie négative des désirs, agents dynamiques de l’ego”. Cristã, mas com

referências orientais, como se vê, também, pela seguinte passagem: Les désirs invoulent

en rapport avec le feu secret que vous développez en vous, comme nous l’avions

précédemment indiqué. Votre lutte intérieure, donnant naissance au feu secret

croissant, dissout les désirs par crémation interne. C’est pourquoi cette pratique est de

règle en Orient, à l’ultime phase de la mort”331.

A propósito da “função emocional” e dos “choques”, o Autor faz-nos uma

síntese da relação entre os “alimentos” e as “causas”, nas suas três estados, ou níveis:

“vous aurez saisi aidément que la maîtrise de la première sorte de nourriture - las

aliments - autorise l’homme à être cause sur la matière environnante. Le socond

niveau d’accomplissement est celui qui le rend, en sus, cause sur lui-même. Mais ce

dernier état atteint encore un stade de transcendance tel que l’homme n’est plus seul: il
s’agit de la liaison même entre l’homme et Dieu qui se manifeste, et c’est la raison

329ibid., p. 347
330ibid., p. 348
331ibid., p. 352

216
pour laquelle le philosophe est alors cause sur le social (...)” 332. Esta última frase,

poderá fornecer o quadro justificativo da intervenção política de Solazaref que se vai

desenvolver ao longo dos anos e que atingirá o seu ponto mais forte com o livro “Les

Bûchers du Xxe. Sciècle”.

O “Introitus” termina com uma terceira parte intitulada “Le nouvel âge”,

referente à “Arte Breve” e que passaremos a mensionar adiante. Este Tratado termina

com um aviso: quem não tiver efectuado a “synchronisation précise entre tous les

éléments de ce traité”, não deve tomar conhecimento do Tomo II do “Introitus”, pois

isso será “inutile, voire dangereux”333.

A via alquímica característica

No nº. 22 da “Tourbe”, Pierre d’Houches (futuro Solazaref) escreve: Nous

assistons ainsi, pour l’alchimie, à l’élévation en échelle et dans la même direction, des

matières de départ, qui mènent à la toute matière première. Et si la spagyrie utilise les
vitriols métaliques, si la voie humide part des sulfures, si la voie sèche démarre des

métaux et de sulfures, si la voie brève s’enclenche sur métal à état de plasma, ces

voies apparemment distintes, sont TOUTES sous la vigilance de Notre-Dame, mais

seulement à différents niveaux de l’échelle de la réalité. Le spagyriste pourra, par

l’artifice, trouver la matière première tout comme l’artiste de voie sèche, et tous, d’être

unis dans ça grande famille des chymistes.”334 . E, para acentuar a igualdade

“filosófica” das quatro vias, o Autor escreve: “Le mercure philosophique, réelle matière

première de l’Oeuvre, s’extrait dans les quatres voies, avec plus ou moins de difficultés

selon son ordre d’appartenance dans les voies. Il est, dans la spagyrie et dans la voie

humide, tout aussi difficile de le rendre fixe qu’il est difficile de le faire poindre dans la

332ibid.,p. 348
333ibid.,p. 411
334Pierre d’Houches, “De operandi modo: igne aquaque”, in “La Tourbe des Philosophes”, nº. 22 (4e.
trim 1983), Paris, p. 13

217
voie sèche et dans la voie brève (dans cette dernière, il est complètement occulté par le

modus operandi335). Este “mercúrio filosófico” não deve ser confundido com o
“mercúrio dos filósofos”, que, segundo o Autor, está nele presente, duma maneira ígnea.

Na VIA SECA, a “estrela dos magos” - aquela que guia o alquimista - é a

“parte mercurial”, bastante discutida pelos diversos autores, os quais fazem, no entanto,

sobre o “enxofre”, uma grande discreção: “C’est ainsi qu’en voie sèche, les textes

s’attardent beaucoup sur le mercure - y compris ceux de Fulcanelli ET ceux du maître

de Savignies, savignies... - et sont trés discrets en ce qui concerne le soufre. Voilá

pourquoi bon nombre de pratiquants en voie sèche sont bloqués aux aigles: la

question du soufre est la plus grave. (...). Por iso, Pierre d’Houches, continua com

algumas divulgações relativas ao “enxofre”: “Apparemment, les maîtres s’étalent

largement sur le mercure ou la partie mercurielle, alors que le caput mortuum, d’où
l’on tire la terra adamique, est laissé pour aompte. C’est qu’il s’agit lá de l’entrée au

troisième oeuvre (...) terre noire et delaissée, de laquelle on tire la terre adamique, qui

donnera aux aigles la rémore, vrai soufre philosophique (...). Calciner vulgairement le

caput ne donne q’une terre rouille, de laquelle est sorti le soufre subtil. Il faut extraire

la terre adamique du caput mortuum, par l’artifice de la calcination, qui, à ce niveau

des préparatifs du deuxième ouvre, se doit être philosophique. Or, chacun sait qu’une

calcination philosophique est la séparation d’une conjonction sal-sulpur...”336. Mas,

não só o problema do “enxofre” é normalmente ocultado,ou menos referido, na via seca.

A questão da “assadura” - “filosófica” - da matéria, é também importante e pouco

referida: “Pour ce qui concerne le tout début de l’oeuvre sèche - l’extraction réguline

de notre minière - il ne faut pas oublier l’opération suivante, l’assation, qui précédrea,

aux judicieuses époques, les premières séparations. Mais outre l’assation, au feu doux

de la voie humide, la matière concassée et mêlée habilement aux petits galets de rivière,

le tout en gros ballon mis en quarentaine, comme dans la mine, il est impératif d’avoir

335ibid., p.15
336ibid., p.16-17

218
obtenu auparavant de trés excellents sels”337. Continuando com a sua divulgação

“caridosa”, Pierre d’Houches refere que, tendo já falado do “primeiro sal” “à propos du

langage des oiseaux” - onde ele refere uma pequena aldeia, Montsel, “mon sel”, com

muitos estábulos e currais, onde “un magnifique sel de pierre abondait sur tous les

murs!”338 - importa referir o “segundo sal”, no que ele aconselha a seguir a XIIª. chave

de Basile Valentin - “frère et maître” - lendo-a, “à la manière de celle du Mutus liber,


bien que cette clef soit apparemment sans rapport direct”, de que colherão indicações

“caridosas”, no tocante à “la manière de le bien préarer”. Quanto ao mais, para os sais,

“il suffit de transposer le langage de Lemery sur le plan philosophique”339.

Na VIA HÚMIDA - onde, “dés le départ que la porte se fait étroite” - é preciso

ter atenção “aux moments trés décisifs des dissolutions et des lavages propres aux

matières dissoutes, afin de préparer un trés excellent mariage et non pas un mariage

voué à l’échec, forcé par la hâte. Lá, ce sont les matières qui se marient, le philosophe

nétant qu’une sorte de serviteur... car elles s’attirent et passent d’un vase à l’autre,

toutes pures, pour s’unir en un troisième lieu, qui sera trés exactement l’union parfaite

des deux principes, en poids et en mesure: le philosophe n’aurait jamais pu être aussi

précis!. Les matières dissoutes, lavées, sont prêtes aux noces chymiques, dans un lieu

frais et à l’abri des regards, où la Dame décide du jour et de heure. Puis, lorsque Dieu

le veut - Dieu le feu, éveil du feu secret - les matières aimantées se jettent dans les bras

l’une de l’autre, comme des aimés qui s’étaient perduis et qui se retrouvent”.340

Relativamente à ESPAGÍRIA, esta via é “recuperada” em dignidade: “si nous

insisterons tout particulièrement sur la spagyrie - outre le fait qu’elle soit mal comprise

en France dans son histoire alors qu’à l’Est elle l’est... - c’est qu’elle permet, justement

par son aspect exotérique, de découvrir la porte d’entrée de la science” 341. A propósito
337ibid., p.17
338ibid., p. 12
339ibid., p. 17
340ibid., p. 17-18
341ibid., p.15

219
desta “porta de entrada” e dos princípios que devem guiar a sua prática, Pierre

d’Houches, escreve que “l’union intime du soufre, du mercure et du sel(...) se fera à

l’abri des regards de la lumière. Le temps requis pour cette opération dernière, menant

à la médicine du corps de base, est souvent trés long: plusieurs mois à des années,

mauis c’est le seul moyen de résoudre les trois principes, par leur propre essence et

sans l’aide d’aucune manipulation extérieure, sinon celle de leur nettre en présence,

afin qu’ils puissent se fixer en parfaite médicine.”342. Neste âmbito, ele chama a

atenção para duas importantes operações espagíricas: a destilação - “savoir distiller est

un véritable art, un grand art” - e a calcinação. Quanto à primeira, “On attachera

beaucoup de soin, en ce concerne le mercure primitif du corps, aux macérations et

distillations sucessives. (...) Distiller est, sinon l’opération la plus difficile, le moyen

propre à chaque médicine, à chaque végétal de base, qui nécessite un régime en

température et en temps tout aussi particulier. Le régime variant en général au cours de

la distillation en elle-même, on imagine le nombre de possibilités existantes,

l’expérience et l’intuition que demande cette «simple» opéartion, pourtant seule clef

d’une trés excellente obtention de la partie mercurielle”. Relativamente à calcinação,

Pierre d’Houches diz: “De même, la calcination et les laveures des cendres qui

déboucheront sur le sel végétable, se doivent d’être éxécutés avec autant de soin et

d’amour. Lá, les conditions extérieures sont d’égale importance que dans les autres

voies chymiques. Lune montante oblige, variation d’éclats de lumière et, au départ,

excellente broyage des cendres dans lesquelles la partie saline sera ainsi en union

intime avec la partie fixe, facilitant plus tard la fixation de la médicine elle-même, tout

en retardant sa «prise»”.343

Para a Espagíria dos METAIS, é necessário “un trés bon vitriol” - “le meilleur

possible, que l’on s’attachera à préparer soi-même, en évitant les produits du

commerce”- em que a sua preparação é a chave da sua qualidade: “Un soin tout

342ibid., p. 18
343ibid., p. 19

220
particulier se fera ici dans la dissolution du métal de base avec un esprit approprié, le

tout obtenu philosophiquement, même le métal!”. Quanto a esta operação, ela é um bom

motivo para a ilustração da “interpenetração” das vias alquímicas e da sua mútua

dignidade: “Lá encore, les voies ne peuvent que s’interférer, pour la plus grande gloire

de la Dame. Car ce métal, issu bien entendu à partir de sa minière et par voie sèche, au

creuset, donnera son régule que l’on fera ensuite fermenter, afin d’en faciliter

l’ouverture ultérieure avec l’esprit: une bonne fermentation éveille toujours le

soufre...”344. Mas a escolha do “espírito” - nome da química antiga para o ácido - é

também importante: “L’esprit requis, propre à chaque métal, est à voir selon le grade

de soufre: l’ouverture se fera d’autant mieux que les deux sont de même «niveau». Quoi

qu’il en soit, l’esprit doit également être préparé par l’artiste, qui sait, par l’expérience,

que le choix de sa terre, emprisonnant les résidus au fond de la curcubite du potier, est

tout à fait primordial. En effet, dépend d’elle la finesse des pointes obtenues et

enfermées dans l’esprit, agent principal d’ouverture”.345

Por último, “but not least”, a VIA BREVE, relativamente à qual, apesar de

lacónico, Pierre d’Houches revela importantes segredos, um relativo à matéria da via:

“La voie brève, elle, renferme une terrible clef dés le départ (...) tout simplement la

capacité de l’artiste à mettre le métal en état de plasma gazeux. Ce sera ce plasma qui,

au-dessous du métal en haute fusion et dans l’interface liquide-gaz, sera l’artifice

principal et à la fois l’agent de transmutation”.346 O outro, relativo ao vaso da Obra,

nesta via: “le vase est la nature elle-même, par le sceau d’Hermés”. Pierre d’Houches

termina estas curtas referências sobre a via breve, avisando: “Dieu est grand, ayant

placé dans cette clef d’ouverture de la voie brève le diable, au même instant, donnant à

l’opération le caractère d’un grand danger, pour soi et pour les siens, et aussi pour sa

344ibidem
345ibid., ps. 19-20
346ibid., p. 20

221
descendance. Seuls les élus, comme d’habitude pourrions-nous dire, peuvent toucher le

manteau de la Dame”347.

Desta resenha se pode constatar que Solazaref, enquanto Pierre d’Houches, já

tinha os conhecimentos necessários - e exibia-os exuberantemente - de modo a propor-

se com sucessor de Canseliet. O choque deve ter sido grande, com a recusa verificada-

por questões de doutrina, mais por questões de técnica - o que terá suscitado a violenta

reacção que a “Tempête” anunciou.

Outras características

O opúsculo “L’Obédience Conventuelle Alchimique, à l’aube du XXIe.

Sciècle”, saído pouco após a constituição da Filiação Solazaref (antes da publicação do

“Introitus”, talvez em 1983), já anunciava uma atitude marcial, sacerdotal-cavaleiresca,

anunciando tempos de combate. No entanto, nada fazia prever que ese combate se

estendesse ao campo político: “Vous ne serez pas seulement capables de bravoure et

d’éfficacité supérieures. Vous êtes la caste sacerdotale de l’épuration ésotérique de ce

temps. De l’alchimie, vous devez en sublimer les vertus, en célébrer les rites, en

assumer les risques”. Mas, o “inimigo” parecia ser apenas os adversários no plano da

alquimia e do esoterismo: “Nécoutez pas les mots de l’ennemi (...) les mauvais de ce

monde (...) ennemis, adversaires de l’Art (...) ils sont impies et ils le savent au fond
d’eux. La cause qui les meut n’est pas celle de l’Alchimie”348.

De qualquer modo, a atitude era de combate contra o “mundo” - “ce monde lá

est une calamité épouvantable, à laquelle il est séant de se soustraire


complètement”349 - e “os do mundo”, “os maus deste mundo”: “Vous constituez déjà

un corps (...). Votre seul drapeau est le manteau de la Dame (...) Vous deviendrez peu à

347ibid., p. 21
348Solazaref, “L’Obédience Conventuelle Alchimique à l’Aube du XXIe. Sciècle”, s.l, s.d., p.1
349ibid., p. 2

222
peu, si vous continuez, ce corps d’élite qui défendra la Science des mauvais de ce

monde. (...) Vous n’avez jamais à avoir honte de vos actes, pourvu qu’ils soient

sincères, car vous êtes initiés à un enseignement trés dur, le plus authentique (...) Vous

avez découvert le secret de l’ordre, de l’obéissance, du devoir, de la loyauté. (...) Vous

devez être supérieurs en tout car la cause que vous défendez est hors la loi commune.

(...) Souvenez-vous que vous êtes dressés dans l’ombre de purs tués pour la cause que

vous défendez: les Chevaliers nos Pères; ainsi vous préparez vos épousailles avec la

mort à vous-mêmes. La Saga de ce corps d’élite s’ouvre et se ferme sur des actes

héroiques. Le pire n’est pas encore venu. Pourtant, vous connaîtrez le pire, et il
faudra être prêts. (...) Vous, vous êtes les soldats de la Dame350”. Estas frases iriam,

por certo, moldar os espíritos dos discípulos e prepará-los para os mais duros

“combates”: “L’époque n’est plus à la tiédeur. La tiédeur abrite la lâcheté, c’est-à-dire

la trahison (...) Une seule référence: l’Art. Une seule attitude: son éthique, son glaive

de droiture, de promptitude et de service. (...) Nous sommes tous pleins d’ardeur.”351

Resenha histórica da “Filiação Sozazaref”

1984 - Publicação de L’Obédience conventuelle alchimique à l’aube du XXe.

Siècle, de Solaref, ed. aut.. - Provável começo (1983-4) da Filiation Solazaref

(segundo o próprio, em Les Bouchers – vide infra). - Publicação de Introitus ad

philosophorum lapidem de Solazaref, ed. aut., s.l.. Publicação do 1º. número (premier

cahier: octobre 1984), da revista “Tempête Chymique, face à l’Athanor, aujourd’hui:

une série limitée de cahiers d’alchimie – Une réponse traditionelle concrète aux

questions de ce temps”, da “Assemblée des Philosophes sous l’obédience de l’Art

Bref -Filiação Solazaref “, com Director de publicação, Dominique Vadot, Chefe

de Redacção, Jeanne Descarmes. Editor Aux Amoureux de Science, com direcção de

correio, Librairie “La Légende Dorée”, Riom.

350ibid., p.1

223
1985 - Publicação do nº. 2 (deuxième cahier: Carême 1985) de Tempête

Chymique, da “Assemblée des Philosophes”/ “Filiation Solazaref”, Riom. Publicação

de La Vérité Interdite, éléments d’initiation à la connaissance alchimique traditionelle¸

premier opuscule: Les Prolégomènes, de Solazaref, nas edições Aux Amoureux de

Science, Teilhède, Combronde. Publicação de L’Assation Philosophique en Voie sèche

de Solazaref, ed. “Aux Amoureux de science”, Theilède, Combronde.

1986 - Publicação do Deuxième opuscule: Alchimie, science et religion suivi de

conseils pour les navigants, de La vérité interdite, éléments d’initiation à la

connaissance alchimique traditionelle, de Solazaref, nas ed. “Aux Amoureux de

Science, Theilède, Combronde.

1987 - Publicação do Troisième cahier: Carême 1987¸de Tempête Chymique,

Face à l’Athanor aujourd´hui, da Assemblée des Philosophes sous l’obédience d’Art

Bref, dirigida por Dominique Vadot e Jeanne Descarmes e editada por Aux Amoureux

de Science, Theilède, Combronde. Direcção de correio: Livraria “La Légende Dorée”,

Riom. Este foi o último “caderno” desta revista.

1988 - Publicação de Les Bûchers du Xxe. Siècle, de Solazaref, nas ed. “Aux

Amoureux de Science”, Theilède. Publicação de Du nettoyage des Écuries d’Augias,

Tome II ou Le Combat des Adeptes, de Solazaref, nas “Éditions aux Amoureux de

Science”, Teilhède.

1990 - Começo da publicação de Somme Hermétique (1990-1991) de Solazaref,

nas ed. “Aux Amoureux de Science”: Tome III, De l’esprit universel Vol.I: Vitriolum,

Vol.II: Alkaest.

1991 - Publicação de Somme Hermétique Tome IV, De natura metallorum, Vol.

1: Petites opérations minérales et voies alchimiques (première partie), de Solazaref, nas

ed. “Aux Amoureux de Science”, Theilède. Publicação, ainda, do mesmo autor e da

351ibid., p. 2

224
mesma obra, do vol 1: Le feux du ciel de Somme Hermétique Tome VI: Ars brevis, na
mesma editora.

1992 - Publicação de Deuxième partie de Petites opérations minérales & Voies

alchimiques (Somme Hermétique Tome IV – De Natura Metallorum), de Solazaref.

Publicação ainda, de Somme Hermétique Tome V – De Natura Vegetalorum, Volume 1 –

Petites opérations végétales , première partie et deuxième partie, de Solazaref, na

mesma editora.

1993 - Publicação de Deuxième partie de Petites opérations minérales & Voies

alchimiques (Somme Hermétique Tome IV – De Natura Metallorum), de Solazaref.

Publicação ainda, de Somme Hermétique Tome V – De Natura Vegetalorum, Volume 1 –

Petites opérations végétales , première partie et deuxième partie, de Solazaref, na


mesma editora. Conferência de Solazaref, intitulada Sacred Metallurgy: Materials for

the Third Millenium, realizada no “Auditório Dag Hammarskjold, nas Nações Unidas,

Nova Iorque, em 13 de Maio de 1993. O título completo era (em françês): Metallurgie

sacrée: Apport de la vision Alchimique Centre-Européenne (Celte) en vue d’une

possible élaboration des matériaux du Troisième Millénaire. Esta conferência foi

publicada, em Junho do mesmo ano, nas Éditions Aux Amoureux de Science, Teilhède.

1994 - Publicação dos nº. 1 e nº. 2 (respectivamente, 1º. e 2º. Trimestres de

1994) de “Escapade Alchimique – bulletin de liaison de la Filiation Solazaref”.

Exposição de Alquimia, em Florença, organizada pela Filiation Solazaref. A Filiation

Solazaref, realizou uma exposição de material alquímico e uma conferência pelo próprio

Solazaref, ambas em Mafra, Portugal. Anúncio, no Equinócio de Outono de 1994, do

fim das actividades exteriores da “Filiation Solazaref” e do próprio Solazaref. Nesse

texto é feito um balanço das actividades: “publicação de uma parte da Somme

Hermétique”, “viagens, exposições em toda a Europa e principalmente em Paris,

Bruxelas, Ravena, Carcassonne, Mafra, Florença, Tomar,…, assim como em Praga e na

Transilvânia”, “restauração parcial do Castelo de Serviat, demeure des philosophes de

notre congrègation”, etc. .

225
1995 - Carta da ”Filiation Solazaref”, denunciando uma dissidência, no seu seio,

e retirando a confiança nas Éditions “Aux Amoureux de Science” e, também a umas

recém criadas Éditions Janvier. Na prática, a “Filiação” chegava ao fim, pelo menos

numa dimensão pública.

JEAN DUBUIS E “LES PHILOSOPHES DE LA NATURE”

A saida, em Dezembro de 1982, do nº.1 da revista “Le Petit Philosophe de la

Nature”, da Associação “Les Philosophes de la Nature” - LPN (Malesherbes e, depois,

La Garenne Colombes), fundada em 1979 e presidida por Jean Dubuis marca o apare

cimento público do grupo. Tratava-se de um boletim interno dos cerca de 1.000

membros da Associação, com muitos artigos sobre Espagíria e Alquimia, o qual atingiu

o nº. 127, em 1995 (vide infra).

O contacto estabelecido com esta Associação, levou-me a entrar para seu

membro em Fevereiro de 1983, o que me permitiu receber o seu boletim mensal - com

artigos sobre Espagíria e Alquimia, além de outros sobre temas diversos - receber as

“correspondências” mensais dos seus cursos de “Espagíria” e de “Alquimia”, em

fascículos e frequentar os seus “estágios” práticos nestas duas áreas.

História, Funcionamento e Linhagem

A Associação “Les Philosophes de la Nature” - presidida por Jean Dubuis - foi

criada em Malesherbes, no princípio dos anos 80, tendo o seu boletim “Le Petit

Philosophe de la Nature”, começado a circular o nº. 1, entre os seus membros, em

226
Dezembro de 1982352;o último número, o 127, saiu em Junho-Julho de 1995, altura em

que as actividades da Associação foram suspensas, como veremos a seguir. O boletim

atingiu a tiragem de 1.000 exemplares.

Os “Philosophes de la Nature” - associação subordinada à lei das associações

francesas de 1911 e cuja última sede era em La Garenne Colombes353 - puseram à

disposição dos seus membros, cursos teórico-práticos, em fascículos mensais, de

“Espagíria”, “Alquimia Mineral”, “Qabal”, “Esoterismo” e, também, de “Medicina

iniciática” (este a cargo de Patrick e Maela Paul). O número de fascículos -

denominados “correspondances” - do curso de “Espagíria” é de 48 ( 4 anos) e o da

“Alquimia Mineral” de 84 (7 anos), pelo que se alguém desejasse seguir o primeiro

destes cursos alquímicos - o de “Espagíria” - e depois o de “Alquimia Mineral”, levaria

mais de dez anos, se, por qualquer motivo não interrompesse a sua cotisação - que em

1994 era de 300 FF para residentes em França e nos territórios do Ultramar e de 350 FF

para residentes no estrangeiro, e que dava, em qualquer dos casos, direito a receber o

boletim e a inscrever-se nos cursos por correspondência. Quanto ao preço destes cursos,

ele era de 360 FF por ano, podendo ser pago trimestralmente 354. Os Filósofos da

Natureza realizaram até meados dos anos 90 vários estágios teórico-práticos em

diversas localidades de França e também nos EUA e em Portugal.

Relativamente ao número de membros e à sua distribuição por países -

divulgado pela própria associação (vide Anexo) que cultivou sempre uma imagem de

transparência nas suas actividades - ele era, em Setembro de 1990, de 948 membros, dos

quais 394 (42%) mulheres e 554 (58%) homens; quanto à distribuição profissional, para

além de artistas, gestores, administrativos, artesãos, comerciantes, agricultores, militares

e reformados, os valores mais significativos, nessa data, eram de 123 (13%) médicos e

profissões para-médicas, 91 (10%) professores, 60 (6%) engenheiros e 32 (3%)

352”Le Petit Philosophe de la Nature”, dirigido por Jean Dubuis, impresso (policopiado) por LPN, BP 18,
45330 Malesherbes
353LPN, 12 avenue Olivier, La Garenne Colombes
354cf. “Le Petit Philosophe”, nº. 121 de Dezembro de 1994, p.3

227
estudantes. Quanto á sua distribuição geográfica havia 78 (8%) membros estrangeiros

(Belgica, Países Baixos, Suiça, Itália, Portugal, Espanha, Tchecoslováquia, E.U.A.,

Canada, África Negra). Nos Departamentos do Ultramar havia 16 membros (1,7%) e em

França, as maiores concentrações davam-se nas áreas citadinas - naturalmente mais

povoadas, mas também mais interessadas - como as regiões de Paris: 382 membros

(40%), de Toulouse: 42 membros (4,4%), de Metz: 30 membros (3,2%), de Lyon: 28

membros (3%), de Bordéus: 23 membros (2,4%), de Marselha: 21 membros (2,2%),

etc.355

Em Outubro de 1994, de um total de 648 membros activos, 18 honorários, 2071

irradiados (certamente por falta de pagamento de cotisação). Dos 648 membros activos,

310 (quase 50%, um aumento de dez pontos percentuais em relação a 1990)

concentravam-se na região parisiense, 160 distribuiam-se com razoável uniformidade

pelos diversos departamentos franceses (com excepção para um pico de 28 membros na

Haute Garonne), 43 noutros países europeus (Bélgica, Alemanha, Suíça, Portugal,

Espanha, Itália, etc.), 10 nos Domínios do Ultramar (Guadalupe, Martinica e Guiana),

13 em África (Benim, Costa do Marfim, Gabão, Camarões), 11 na América do Norte (6

no Canadá e 5 nos E.U.A.) e 1 na Austrália. Em Setembro de 1994 recebiam os cursos:

de “Espagíria”, 68 membros (10,5%), de “Mineral”, 80 (12,3%), de “Qabal”, 182

(28%), de “Esoterismo”, 52 (8%) e de “Medicina”, 50 (8%)356. De salientar o elevado

número de portugueses (17) inscritos após a realização de estágios em Portugal

(anteriormente a estes, havia só 3 membros portugueses); fenómeno idêntico terá

acontecido, recentemente, nos Estados Unidos.

Quanto à linhagem alquímica, o seu fundador e Presidente, Jean Dubuis,

escrevia e dizia frequentemente que recebera os ensinamentos alquímicos e espagiricos

de alquimistas alemães: “À titre d’exemple nous allons décrire un des procédés utilisés

355cf. “Le Petit Philosophe”, nº. 82 de Janeiro de 1991, p.8


356cf. “Le Petit Philosophe”, nº. 121 de Dezembro de 1994, p.4

228
par les spagyristes de l’école allemande”357(...) “L’école allemande qui utilise ce

processus ne cherche pas par ce procédé, à rejoindre une voie alchimique; elle reste

dans le cadre de la guérison que les lois de ce pays lui autorisent”358. A forte vertente

cabalística - na linhagem de “Cabala Denudata” de Knorr von Rosenroth (1636-1689) -

da Associação e do enquadramento dos seus ensinamentos alquímicos (quer espagíricos

quer alquímicos), a sua insistência - pelo menos nos seus primeiros tempos - na “via dos

acetatos”, parecem confirmar uma filiação provávelmente alemã.

Via(s) alquímica(s) característica(s)

Os “Philosophes de la Nature”, sob a orientação de Jean Dubuis, desenvolveram

os seus ensinamentos espagírico-alquímicos em três vertentes:

- Espagíria (vegetal e mineral)

- Alquimia:

- via húmida dos acetatos

- via seca do antimónio

É de notar, nos últimos anos da Associação, o interesse pela via de Flamel -

talvez devido à perigosidade da “via dos acetatos” - tendo sidos publicados os textos

relacionados com essa via (vide infra).

Embora tivesse sido autorizado por Jean Dubuis para me referir aos

ensinamentos contidos nas “correspondências” dos “Philosophes de la Nature” (vide

carta anexa), considero também útil e importante referir-me aos ensinamentos teórico-

práticos ministrados nos estágios que frequentei, quer em França (1990) quer em

Portugal (1993 e 1994) e de que apresento, em Anexo, algumas fotografias,

devidamente legendadas.

357”Notice Postulant” nº. 24, p.2


358ibidem, p.3

229
- A CONCEPÇÃO GERAL “LPN” DA ALQUIMIA E DO ALQUIMISTA

Vamos utilizar os textos escritos para fundamentarmos estas concepções, não

porque os ensinamentos orais não sejam interessantes – por exemplo a frase “A

Alquimia é a transferência da energia psíquica na matéria”, foi por nós registada

num estágio de alquimia dos LPN359- mas porque eles constituem a base do discurso

dos adeptos dos LPN.

Para os “Philosophes de la Nature” (LPN), a Alquimia “nést pas ni la chimie ni

la hyperchimie, mais un processus biodynamique qui tient davantage des processus de

la fermentation ou de la putréfaction plutôt que des réactions chimiques classiques.


L’Alchimie conduit à la connaissance profonde des mécanismes fondamentaux de la

Nature, mais à la différence des sciences profanes qui n’envisagent que l’aspect

matériel de ces mécanismes, l’Alchimie tient également compte de l’aspect spirituel

généralement invisible à la perception sensorielle de l’opérateur. C’est par cet aspect

des études alchimiques que l’opérateur est conduit à un progrés spirituel, à une

élévation de son niveau de conscience. (...) l’avancement spirituel conduit à avoir “la

tête dans le ciel”, mais, pour mener son travail à bien, l’Alchimiste est obligé de garder

les pieds sur Terre; il prend conscience des réalités supérieures tout en gardant à

l’esprit les manifestations physiques et leur importance”360.

O segredo da alquimia laboratorial consistirá pois em chegar ao espiritual por

meio do material: “À travers les éléments physiques, l’Alchimiste ou l’artiste habile

peut et doit parvenir à manipuler les éléments divin, spirituel invisible qui sont les

véritables éléments de la vie dans les choses et dans les êtres”.361

359Estágio LPN, realizado em Montgiscard (Toulouse), em 8 de Setembro de 1990


360”Notice Postulant”, nº. 1, ps.3 e 4
361ibidem, p.6

230
Relativamente ao aspecto relativo à interacção operador-matéria, Jean Dubuis,

escreve: “En alchimie, même si les ingrédients adéquats son présents et si les

manipulations physiques sont bien faites le résultat ne sera pas nécessairement atteint

car la réusite dépandra de l’état personnel del’opérateur. En un sens trés restreint

l’Alchimie peut être considerée comme la parapsychologie de la chimie, la réusite de

l’opération dépendant des états intérieurs psyshiques et spirituels de l’opérateur. Ceci

est encore plus vrai lorsqu’on avance dans la hiérarchie des opérations et oeuvres

alchimiques.”362

Quanto ao requisitos a que deve obedecer o alquimista, Jean Dubuis diz que ele

“ne peut pas être athée: ce doit être un spiritualiste. (...) il importe qu’il puisse faire

commencer chaque période e travail (...) par une invocation et qu’il la termine par une

prière de remerciement à Dieu, au Cosmique, à l’Unité, au Grand Architecte, ou à la

conception Divine ou Spirituelle qu’il a choisi selon son coeur. Importa que o

alquimista tenha presente, escreve o Presidente dos LPN, que o seu objectivo deve ser

“uniquement (...) son progrés spirituel personel. Songer à de lointaines transmutations


métalliques en pensant uniquement aider les autres n’est ni une excuse ni une incitation

auprés de l’Infini. La faculté de transmutation est une récompense du progrés

spirituel personel; mais on n’a jamais aidé qui que ce soit dans ce monde avec de l’or

si l’Infini ne l’a pas permis. (...) C’est ce progrés spirituel personnel que l’on doit

d’abord rechercher: comment peut-on songer à aider les autres si on ne possède pas

soi-même un certain degré de maîtrise. Il existe un principe sacré d’égoisme qui veut

que l’on progresse d’abord soi-même avant de songer à faire avancer les autres.”363
- Quanto à teoria cabalística dos “Philosophes de la Nature”: “Il ne faut pas

oublier que nul n’est Alchimiste s’il ne connait la théorie de l’Alchimie, celle de la

magie naturelle, et quelques règles de l’astrologie sacrée”364.

362ibidem, p.5; os sublinhados são nossos


363ibidem, ps. 4 e 5; os sublinhados são nossos
364”Notice Postulant”, nº. 32, p.3; os sublinhados são nossos

231
“La Qabal vient de la tradition israelite. Elle explique la création de l’univers,

l’origine et le devenir de l’Homme, sa nature et le mode de travail du Créateur. La

Qabal opérative, pratique, conduit aussi à une certaine connaissance unitaire, à une

initiation intérieure et l’on peut penser que, dans les temps anciens, c’est-à-dire du

temps des véritables Adeptes, ceux-ci obtenaient une Connaissance unique qui était à la

fois la Qabal, l’Alchimie et l’Astrologie. Quand on approche de la Connaissance

unitaire, quelle que soit la voie par laquelle on est passé, on a la Connaissance dans les

autres disciplines”. Por outro lado, “L’Alchimie donne une connaissance de la Nature

qui concerne à la fois son aspect physique et metaphysique. Le véritable but de

l’Alchimie est de conduire à une initiation intérieure, c’est-à-dire à la liaison entre le

conscient et les différents niveaux subconscients. Cela apporte, progressivement (...)

une connaissance à peu prés unitaire qui enveloppe tous les aspects de l’Univers et de

l’Homme”365.

Mas esse conhecimento é um conhecimento operativo, pois embora “l’état de

Mage ou d’Alchimiste n’est que la conséquence du niveau de conscience atteint”, a

verdade é que, ao mesmo tempo, “pour nous, le pouvoir de transmutation doit être l’un

des premiers à se manifester”.

A ESPAGÍRIA DOS “PHILOSOPHES DE LA NATURE”

“La spagyrie s’occupe essentiellement de la guérison du corps et l’Alchimie de

la guérison de l’âme”.

A Espa.gíria é a “arte das separações” dos 3 princípios alquímicos e da sua

posterior reunião, com vista à elaboração das tinturas, dos elixires, etc. Eis o que nos

dizem os LPN, desenvolvendo mais este tema:

365Jean Dubuis, “Alchimie, Qabal et Astrologie” in “Le Petit Philosophe”, nº. 30 (novembre 1985), p.1

232
- Quanto aos princípios: “Étymologiquement, ce mot signifie, en grec, séparer et
réunir (...)si l’on peut considérer la spagirie comme une partie de l’alchimie, il y a

cependant entre elles une différence de but et aussi de méthode de travail. La spagirie

s’occupe essentiellement de la santé du corps mais elle n’est pas une recherche

initiatique, alors que l’alchimie est une médicine de l’âme et son véritable but est

initiatique. Les opérations spagiriques, notamment celles du règne végétal, ne

nécessitent pas un état particulier de l’opérateur. Le lien entre travail-matiére et

opérateur est faible.. Par contre, en alchimie, le lien matière-opérateur est trés fort, et

nul ne transmute quoi que ce soit s’il n’est pas transmuté lui-même. En alchimie, la

qualité psychique de l’opérateur est essentielle”. 366

- Quanto ao método: ”Toute chose créée, ou mixte, contient 3 principes qui

concentrent les énergies spirituelles: le soufre, le sel, le mercure. Le soufre est l’âme

incorruptible, le mercure est l’esprit qui lie et anime le soufre et le sel, le sel est le

corps. Il y a en plus des impuretés appelées fèces. La méthode consistera, à partir d’un

mixte, à séparer, purifier puis réunir les trois principes”367

A ALQUIMIA MINERAL DOS “PHILOSOPHES DE LA NATURE”

A Alquimia Mineral dos LPN estava centrada, na sua primeira fase, numa via

húmida, a “via dos acetatos”. Apenas na parte final do curso “Mineral” começaram a ser

feitas descrições da “via seca do Antimónio”, sobretudo da “1ª. Obra”, e nos últimos

anos, foram divulgados importantes documentos sobre a “via de Flamel”, ao mesmo

tempo que os estágios passaram a incluir - para além da espagíria - esta via alquímica.

Características desta escola

As “Notice Postulant” do curso de Espagíria têm as seguintes preocupações:

366Jean Dubuis, ”Spagirie”, in “Le Petit Philosophe”, nº. 24 (mars 1985), p.1; os sublinhados são nossos
367Jean Pajot, ”La Spagyrie”, in “Le Petit Philosophe”, nº. 92 (janvier 1992), p.1; idem

233
- Em cada uma são incluidos textos sobre Filosofia, Teoria e Prática alquímicas,

pois segundo afirma Jean Dubuis “cette division ternaire nous a été inspirée par Dom

Pernety qui déclare que trois choses sont néecessaires pour avoir quelques chances de

succés dans la Voie Alchimique: un bon jugement, une bonne théorie et une main

habile. Dans la partie “Philosophie alchimique”, nous espérons donner les

connaissances nécessaires à la formation de ce bon jugement, dont le résultat le plus

évident est une pensée libre; mais cela n’implique absolument pas le fait d’être libre

penseur. La partie “Théorie Alchimique”de nos cours vise deux buts principaux. Le

premier est de donner une connaissance théorique sans laquelle l’experimentation

alchimique n’est pas possible. En effet, il ne faut jamais tenter une expérience en ce

domaine sans en connaître l’objet, la procédure et le résultat à atteindre: en Alchimie


on n’expérimente ni au hasard ni par curiosité. L’autre but recherché est l’ouverture

des livres hermétiques: ils ne sont pas écrits pour des débutants ou des ignorants, mais

au fur et à mesure que l’on s’imprègne de la théorie alchimique, l’obscurité de leur

langage se transforme d’abord en transparence puis en lumière. Dans le chapitre

“Pratique Alchimique” nous décrirons en détail les manipulations nécessaires et les

précautions qui doivenmt les accompagner (pour) accéder “à la main habile” 368

É de referir os cuidados quanto à segurança que são incluidos nas

“correspondências” e nos artigos do boletim e, também, na contenção da utilização dos

elixires, os quais revelam, ainda, as concepções que os LPN têm quanto aos efeitos

curativos das suas preparações espagíricas e alquímicas: “Il ne faut pas utiliser les

elixirs alchimiques pour la guérison en général, car: 1) La loi interdit la prescription

de substances destinées à l’accomplissement d’un acte médical; 2) Les élixirs végétaux

ont un effet essentiellement spirituel et on ne doit pas toucher à cet aspet chez les

autres: un élixir pourrait évéiller un chakra chez une personne qui n’aurait pas la

compréhension adéquate pour suporter ce problème; 3) Les traitements les plus

efficaces sont les extractions métalliques, lesquelles ne sont pas incluses dans les

368”Notice Postulant”, nº. 1, p.1-3; os sublinhados são nossos

234
premières parties de ce cours”369. É de salientar que estas questões da segurança e da

aplicação dos elixires para efeitos médicos, estiveram presentes nos últimos documentos

do grupo, antes da sua suspensão - por divisões internas. Mas elas estiveram sempre

presentes, desde o início da actividade pública dos LPN, como o atesta a seguinte

passagem, relativa ao uso dos elixires, incuída na 1ª. “Notice Postulant” do curso de

“Espaíria” ou “Vegetal”: “Nous préférons également vous mettre en garde dés

maintenant sur le fait que la loi française interdit à toute personne étrangère au corps

médical de prescrire à une autre l’usage de tout produit dans un but de cure ou de soin.

Il ne faut dons pas songer aux élixirs pour la santé des aitre. Et pour nous éviter toute

tentationen ce domaine nous ne donnerons pas, au moins dans un premier temps, les

moyens de controler les élixirs alchimiques: leur fabrication est en elle-même un


élément de connaissance de la Nature et un moyen de dévelopement spirituel”370.

Por outro lado, os elementos teórico-práticos dos LPN - e essa é uma

característica importante do grupo - são-nos apresentados de uma maneira sintética:

“Vous serez peut-être étonnés de la brièveté de nos textes; mais nous suivons en cela la

Tradition Alchimique. L’adage dit:”lis et relis”. Il faut donc lire et relire les textes

avant de s’en imprégner, suivant par la l’exemple donné par certaines opérations

chimiques dont la répétition persévérente conduit à un résultat alchimique. Un autre


adage dit qu’il faut débarasser la matière de ses principes terrestres superflus; c’est

pourquoi nous éviterons le délayage littéraire”.371

ESTÁGIOS DOS LPN

ESPAGÍRIA

369”Notice Postulant”, nº. 24, ps. 2 e 3; os sublinhados são nossos


370”Notice Postulant”, nº. 1, p.4; idem
371”Notice Postulant”, nº. 1, p. 1-3; os sublinhados são nossos

235
Os Estágios de Espagíria que frequentámos, quer em França (arredores de

Toulouse) quer em Portugal (Várzea de Sintra) desenrolaram-se ao longo de um dos

dias do fim de semana em questão (um dia para a Espagíria e outro para a Alquimia,

embora nem sempre os “dias” fossem inteiros). Vamos transcrever, a seguir, as notas

que tirámos nesses estágios e que são consistentes umas com as outras (são

práticamente iguais, mesmo com instrutores diferentes):

- A primeira operação efectuada foi a destilação do vinho tinto - tinto, pois ele

contem “fogo solar”; foi utilizado o densímetro para determinação do grau alcooñlico

do destilado. A partir dos 90º é preciso juntar sais obtidos por lixiviação das cinzs das

vides (sais de Potássio, carbonato de Potássio) para “agarrar” o álcool. É de notar

que se aumentarmos as destilações elas podem captar as vibrações do operador e do

ambiente; se redestilarmos 6 ou 7 vezes até atingir um Mercúrio de 96º, ele já será

sensível ao corpo subtil do operador - importância do Oratório.


- Depois coloca-se a planta moída numa “encubadoura” (“couveuse”) em 1/3

do seu volume em alcoól a cerca de 38 ou 40º C. Outro procedimento é o de colocar a

planta moída num cartucho de “Soxhlet”, colocá-lo num refrigerante vertical sobre um

balão com álcool e proceder à extracção; neste caso o que é extraído é uma tintura -

mixtura de álcool (Mercúrio da planta) com óleo essencial (Enxofre da planta). O

álcool de vinho é o Mercúrio indeferenciado do reino vegetal, mas em contacto com o

Mercúrio da planta, aquele vai “determinar-se”, isto é vai entrar em ressonância com

a memária da planta.
- Outro procedimento ainda é o de fazer uma destilação a vapor de água (planta

com água no balão); neste caso, dá-se uma separação do óleo do álcool e no fundo do

balão fica a planta que deve ser calcinada - para dar cinzas que serão lixiviadas (por

meio de lavagens, filtrações e cristalizações), até que o sal fique bem branco e

cristalizado.

- Este sal é muito higroscópico, deliquescente, captando muito bem a humidade

do ar, o que é muito importante em Espagíria e em Alquimia - essa captação deve

fazer-se sobretudo à noite e, melhor ainda em determinadas épocas do ano, em que o

236
Espírito Universal é mais abundante. Quanto ao óleo essencial - o Enxofre - ele deve

ser purificado num balão com água e depois realiza-se novas destilações até que

desapareça uma coroa vermelha (impurezas) à sua superfície.

- O sistema de extracção com o Soxhlet dá tinturas boas para o corpo - por

exemplo, para o coração, toma-se 10 gotas de “garence” num copo de água, todos os
dias - e o sistema de extracção por vapor dá boas medicinas para a alma. Para a

planta seca utiliza-se o soxhlet, para a planta fresca utiliza-se a destilação a vapor.

- Para se tornar a tintura mais eficaz, devemos proceder à sua purificação,

utilizando-se o corpo - o sal - obtido como anteriormente. Coloca-se o sal em digestão -

circulação - com a tintura(a tintura sobre o sal), numa incubadora, a 38/40º durante

uma semana (a circulação é como um ciclo de reencarnações). Na digestão, dá-se uma

repetição de “subidas” e “descidas” da tintura no balão fechado - a repetição em


alquimia é o que faz evoluir a matéria - durante uma semana: vai passar por todos os

dias até chegar ao dia da planta. O sal que se pôs em contacto com a tintura recebe as

energias e também as impurezas desta. Decanta-se o sal e calcina-se pelo fogo, o que

vai eliminar as impurezas que se fixaram ao sal. Continua-se o ciclo: calcinação +

tintura até que a tintura fique completamente descolorida; nesta altura a tintura está

purificada. Na realidade dá-se a volatilização do sal na tintura: na reunião do sal com

o mercúrio e o enxofre da tintura, o sal vai volatilizar-se no álcool da tintura (pode

destilar-se a tintura e deixar cair o destilado sobre o sal). Obtem-se assim o elixir.

- O Elixir é mais volátil e a Pedra é mais fixa:

Enxofre
Fixo Volátil

Sal Mercúrio

« «« PEDRA ELIXIR » » »

237
- Para realizar a Pedra coloca-se o mercúrio sobre o sal + enxofre - 1º.) deita-

se o enxofre sobre o sal, i.e., satura-se o sal com o enxofre; 2º.) deita-se o mercúrio

sobre o sal saturado com o enxofre - tapa-se o recipiente o qual vai para a

incubadoura durante uma semana. Repete-se a operação várias vezes até que o sal fixe

o mercúrio, o qual permite que o enxofre se una a ele. A Pedra parece uma resina.

Para se atingir a Pedra ao Rubro, é preciso pô-la numa incubadora, durante 12 a 18

meses.

- “Espagíria sem material”: A fabricação do «Ens»: a partir de 1 kg de

carbonato de potássio comercial ou obtido a partir da calcinação das vides, expõe-se

ao ar, à noite, e recolhe-se o líquido de manhã - cuidado em não o expôr ao Sol.

Guarda-se esse carbonato de potássio liquefeito - a Água dos Anjos - e deita-se (em

volumes iguais) sobre a planta em pó num frasco (a planta é deitada no frasco com

uma peneira “canñnica”); deixa-se passar duas semanas, após o que se junta álcool

“seco”(sem água, ou quase sem água). Guarda-se o frasco durante um mês numa

estufa a 40º C e depois usa-se o extracto como habitualmente - é o “fogo” que extrai,

dá-se uma energetização. A “Água dfos Anjos”, uma vez que dissolve os sais, revivifica

os sais da planta, onde se dissolve o óleo da planta.

- A Pedra é mais eficaz iniciáticamante que o Elixir(a menos que ele provenha

da Pedra): a Pedra de “carvis” (alcaravia) permite contactos com a Séfira de Hod

(Mercúrio) e desenvolve poedres mágico-alquímicos (por exemplo a Verónica apenas

permite contacto com um centro sefirótico inferior àquele):

- O Elixir tem um efeito purificador a longo termo: toma-se todas as semanas e

após um ano, ou um ano e meio, e tem-se o contacto com o Centro Sefirótico

escolhido:
- Exemplos dos efeitos de algumas Pedras: a “Pedra de Hod” dá autoridade

sobre os elementos físicos da Natureza e permite sair do mundo da ilusão, uma

“Pedra de Tifereth” dará contacto com o Eu Interior, e uma “Pedra de Binah”

podendo dar contacto com a Eternidade, derá difìcilmente suportada pelo Homem.

238
- Em que momento se deve começar a extracção da planta? Ela deve ser feita

nos períodos mais favoráveis. Para iso dve ter-se em conta as atribuições planetárias

das plantas e as horas planetárias.

ALQUIMIA MINERAL/VIA DE FLAMEL

- Em primeiro lugar temos de proceder à separação da estibina (sulfureto de


antimónio) da sua ganga: coloca-se a estibina num pequeno forno eléctrico constituído

por um tubo de aço com um estreitamento em baixo, dentro de um cilindro com uma

resistência eléctrica em espiral. A 400ºC a estibina começa a estalar (devido à sua

ganga) e a 500º C deixa de estalar e começa a fundir a cerca de 550º C (até 800º C o

máximo). Ela passa então para baixo onde cai sobre um copo com água - a ganga fica

esponjosa e não cai - e as gotas de estibina vão depositar-se na água onde arrefecem.

Então temos o mineral de antimónio separado da sua ganga. Na 1ª. fusão fica já retido

algum enxofre na ganga.

- Agora vamos realizar uma outra operação química que vai retirar mais

enxofre ao antimínio: a redução da estibina em antimónio. Para isso junta-se à estibina

purificada, Ferro (em pregos), Salitre (Nitrato de Potássio) e Tártaro (Carbonato de

Potássio). O Enxofre vai fixar-se no Ferro, formando-se o sulfureto de ferro, enquanto

que o antimónio fica livre, sob a forma metálica - o Régulo de Antimónio. Para isso,

põe-se tudo num cadinho de grafite o qual se coloca no forno até atingir a temperatura

que dê uma cor vermelha alaranjada (cuidado: é preciso utilizar óculos, luvas de

amianto e pinças). Depois vaza-se para uma “lingotière” em aço, dando-se uma

separação do Antimónio (Régulo) das escórias; no caso das primeiras escórias, elas
contêm a semente do Ouro (não acontece o mesmo nas seguintes) pelo que as vamos

guardar. Então vamos fazer uma nova purificação: junta-se o Régulo, sob a forma

cñnica (“culot”), com o Ferro e o Salitre; repete-se a operação três vezes no total, até

que os pregos fiquem intactos, até que já não fiquem pregos nas escórias, o que quer

239
dizer que já não fixam mais enxofre. Obteve-se o Régulo marcial de Antimónio, muito

brilhante, está cheio de ferro - é a chave da Obra


- Amalgamação com Mercúrio e a Prata metálicos: junta-se uma parte de

Régulo com uma parte de Prata com um pouco de Salitre. Este conjunto - Régulo (de

Antomónio) marcial lunar - funde a 800º C e, reduzido a pó, num almofariz, vai

amalgamar-se com o Mercúrio metálico (tridistilado, do comércio); junta-se o Régulo

marcial lunar (100 g) com o Mercúrio (500 g), durante 4 a 5 horas, num moinho de

bolas metálicas (cuidado: não se deve fazer num almofariz, pois os vapores são

perigosos). Outra via, era a junção do Cobre, para obtenção do Régulo (de Antimónio)

marcial lunar venusiano.


Até aqui o trabalho é exclusivamente químico; podem encontrar-se referências

explícitas em Tratados de Química antiga como por exemplo em Lémery, Glaser, etc..

A partir daqui é que o trabalho começa a ser alquímico; de qualquer modo, os LPN

fornecem-nos, desde já e de uma maneira original, a razão “filosófica” da escolha dos

metais que entram nesse trabalho químico, preparatório do trabalho alquímico.

- A razão da escolha desta metais é baseada na Árvore da Vida Cabalística e

nas correspondências entre os Centros Sefiróticos e os Metais (vide supra). Na

Alquimia, o Homem deve fazer evoluir ou Iniciar a Natureza Caída (que fez a

involução). Ora como o Antimónio está em correspondência com a Séfira mais baixa,

Malkuth, devemos partir dele para o fazermos evoluir (subir a Árvore) - esta é a razão

porque foi escolhido por alquimistas como Flamel, Filaleto, Valentino, etc.. A razão

da mistura com os metais Ferro, Prata, Mercúrio, Cobre, etc. é que eles estão em

correspondência com os Centros Sefiróticos superiores - Yesod, Netzach, Hod,

Geburath, etc. o que vai fazer evoluir a Matéria Prima.

- Para a Animação do Mercúrio, é preciso proceder à deslilação da amálgama

(cuidado, não pode haver retorno de água - perigo de explosão). Em cada destilação do

Mercúrio animado - a “Águia” de Filaleto ou as “Pombas de Diana” de Flamel - a


energia alquímica do Antimónio transmite-se ao Mercúrio por intermédio da Prata (ela

240
é ao mesmo tempo mediadora e fornecedora da semente lunar). No fundo do balão

ficam as “Pombas mortas de Diana” - que não conseguiram voar, ou que começaram a

voar e cairam logo de seguida. A seguir ao voo de cada “Águia” e antes de se fazer

uma nova amálgama, o Mercúrio animado deve ser destilado uma vez; depois da

destilação, a prata é recuperada da “Pombas mortas”, para uma nova amálgama.

Os Estágios (de Agosto de 1993 e de Outubro de 1994, em Sintra) terminaram

com a realização laboratorial das “Águias”, tendo sido distribuido um folheto intitulado

“Préparation d’un Mercure Sophique et Ensemencement”, com muitos detalhes

técnicos, temperaturas, tempos, etc. que não vale a pena aqui indicar. Os aspectos

globais da técnica até ao começo da 2ª. Obra de Flamel, foram aqui referidos, com

indicações importantes relativas à simbolização característica dos LPN e ao seu quadro

teórico.

- É de referir que o estágio de Setembro de 1990, em Toulouse, não incluia a via

de Flamel, mas sim a elaboração do Régulo marcial de Antimónio (tal como foi acima

referida) para a via seca e, também, trabalho do “vinagre radical” para a via dos

acetatos. Quanto à Espagíria não havia diferenças.

Vejamos então o que foi feito, em Toulouse, relativamente ao “Vinagre

Radical”:

ALQUIMIA MINERAL/VIA DOS ACETATOS

Foi dado pouco tempo a esta via pois em 1990 já ela estava em declínio, dentro

dos LPN (devido à sua dificuldade e perigosidade). De qualquer modo, transcrevemos

as notas relativas ao que foi feito:

- Colocam-se vinagre dentro de uma garrafa de plástico, no frigorífico. Devido

à diferença entre os pontos de congelação, o vinagre separa-se da água nele contida.

Então destila-se esse vinagre e, depois, põe-çse esse vinagre sobre carbonato de cobre

241
o que vai dar acetato de cobre. Aquece-se a 200º C e separa-se o ácido acético (sem
água) do cobre. O Vinagre radical obtido dá para fazer o acetato de antimónio.

- A Via dos Acetatos é um enxerto da vida vegetal (dada pelo carbono) no

chumbo, enquanto na via do cinábrio ao dar-se enxofre ao mercúrio, revivifica-se o

mercúrio e obtem-se um bom cinábrio. Os princípios vitais estão no enxofre e nos

óleos. A vida metálica é o S, a vida metálica é o O....

Cronologia dos últimos anos dos LPN:

1993- Conferência de Jean Dubuis e estágio espagírico e alquímico, em Sintra

(Portugal), da Associação Les Philosophes de la Nature, em Agosto de 1993. Outro

estágio foi realizado, em Agosto de 1994, no mesmo lugar, pela mesma Associação.

1998- Suspensão das actividades da Associação Les Philosophes de la Nature,

devido a desinteligências entre os seus dirigentes (de um lado, Jean Dubuis, do outro

Marc-Gérald Cibard). Desde essa altura, a Associação tem um Administrador Judicial.

Caractéristicas (resumidas) dos LPN

Os “Philosophes de la Nature” são um grupo (ou associação) alquímico que tem

uma clara inspiração cabalística e uma forte componente espagírica e que nos últimos

anos passou de uma formação alquímica na “via dos acetatos” para uma formação na

“via de Flamel”. São abertos, ministram cursos por correspondência e realizam

“estágios” práticos de fins de semana. Têm um boletim onde são publicados (entre

outros) artigos sobre alquimia e espagíria. Quer os texto dos cursos, quer os artigos do

boletim, quer ainda os estágios, assentam numa linguagem onde a simbolização náo é

muito forte e, por isso, onde a integração entre doutrina, teoria e prática não é a mais

conseguida.

242
VI - NOVOS MOVIMENTOS RELIGIOSOS E ESPIRITUALIDADES

ALTERNATIVAS DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX E A SOCIO-

ANTROPOLOGIA DOS GRUPOS ESTUDADOS

Após o estudo diacrónico e sincrónico do universo simbólico e mítico da

Alquimia, do estudo do seu rito e da descrição dos alquimistas e grupos alquímicos

nestas mesmas dimensões, vejamos agora as suas dimensões sociais internas e externas.

Começaremos pela análise do surgimento destas “novas” religiosidades e

espiritualidades.

Do “desencantamento do mundo” ao seu reencantamento

Com o desenvolvimento da racionalização e da secularização na Europa e no

Ocidente em geral, sobretudo nos século XIX e primeira metade do século XX,

verificou-se, segundo a apreciação sociológica vigente até aos anos 70/80, aquilo a que

Max Weber chamou de “desencantamento do mundo”. As grandes instituições

religiosas entraram em crise face a uma sociedade laicizada e as religiões históricas

deixaram de fornecer, a muita gente, respostas racionais e emocionais sobre as grandes

questões do Homem. Deus e os deuses “abandonaram” progressivamente um mundo

“desencantado”, assente no progresso material e tecnológico, sendo ao mesmo tempo

escorraçados pelas ideologias positivistas e materialistas que consideravam que a

evolução do Homem e da Sociedade conduziria inelutavelmente a um mundo

desprovido das “superstições” religiosas e mágicas e em que a razão e a Ciência dessem

conta exclusivamente das interrogações do ser humano e lhe fornecessem respostas às

suas inquietações mais profundas. A Humanidade que já tinha atravessado,

243
sucessivamente, os estágios da Magia e da Religião, estava agora a entrar,

irreversivelmente, na Idade da Ciência – era este o diagnóstico optimista e diremos hoje,

um pouco ingénuo, que o positivismo “cientista” elaborou em finais do século XIX e

nos começos do século XX e que se arrastou até meados do século passado.

A doutrina da secularização mereceu, no entanto, uma reflexão posterior mais

detalhada, reflexão que a própria sociologia elaborou sobretudo a partir do começo dos

anos 90. De facto, paralelamente a uma evidente “decomposição” das religiões, fruto

da sua crise – somada a uma manifesta crise das ideologias profanas (as “grande

narrativas” políticas, nomeadamente) que também davam sentido e explicação do

mundo -, verificou-se progressivamente, uma “recomposição” do religioso, com a

formação de múltiplos “novos movimentos religiosos” (NMR’s) – denominação que as

ciências sociais e humanas preferem às de “seitas” e “cultos” – e também de uma ”nova

espiritualidade” exuberante, quer do ponto de vista das doutrinas religiosas e mágico-

religiosas, quer dos efectivos que são influenciados por essa “nebulosa místico-

esotérica” (designação da autoria de Françoise Champion).

Esse “retorno do religioso” - que não é necessariamente o “retorno de Deus”,

já que assume formas diversas de religiosidade e de espiritualidade, na maior parte dos

casos afastadas das grandes religiões - é, segundo François Laplantine, “um dos

fenómenos sociais mais significativos da modernidade dos anos 1970-1990”372 –

retorno que inlcui o fundamentalismo, o radicalismo e a violência, como algumas das

372 François Laplantine, “Présentation” de Le Défi Magique - Ésotérisme, Occultisme, Spiritisme, Volume
1, Textes réunis par Jean-Bapt6iste Martin et présentés par François Laplantine, Lyon, Presses
Universitaires de Lyon, 1994, p. 9. Este volume (e o 2º. ) inclui as actas de um colóquio realizado em
1992 e organizado pelo CREA – “Centre de Recherches et d’études anthropologiques” da Universidade
Lumière de Lyon e o CESNUR – “Centro Studi sulle Nuove Religioni” de Torino, dirigido por Massimo
Introvigne.

244
suas manifestações -, e manifesta-se através de “uma série de respostas (à crise desta

modernidade) diversificadas e contraditórias”. De facto, continua Laplantine, le

religieux, loin de disparaître en cette fin du Xxe. siècle, se recompose selon des formes

parfois assez déconcertantes pour les observateurs du social. Le mélange de cultures, le

déracinement urbain, le doute généralisé concernant les ceritudes de la tradition et les

promesses de la modernité, conduisem à une recomposition de ce qui, dans toute

société, donne significations et valeurs aux comportements, «relie» les hommes entre

eux: le religieux373.

A crise das grandes instituições religiosas não significou necessariamente –

contrariamente ao que algumas análises apressadas proclamavam – a crise da religião,

do religioso em geral, muito menos o seu fim. O que aconteceu foi que a religião tomou

novas e diversificadas formas para responder à crise de sentido que as pessoas

experimentavam e que as grandes religiões (e as “grandes narrativas” ideológicas e

politicas) já não lhes podiam resolver. Uma significativa parte das pessoas das

sociedades ocidentais ou ocidentalizadas, já não encontravam respostas satisfatórias (do

ponto de vista racional e emocional) às grandes questões do Homem que, quer a Ciência

(ou melhor, a tecno-ciência), quer as Religiões históricas assentes em grandes

instituições, muitas vezes distantes dos fiéis, já não lhes podiam oferecer, quer por

limitação doutrinal (dogmas, etc.), quer por limitação funcional (a vivência e a

organização do culto, etc.).

É indiscutível, no entanto, que houve uma “secularização” da sociedade

acompanhada de uma “privatização” do religioso em que a religião como instituição

373 Ibidem.

245
social foi, de algum modo, afastada do espaço público. O que acontece é que essa

secularização só atingiu esses instituiçoes religiosas e a sua posição na sociedade

ocidental, pelo que em vez de assistirmos a uma extinção do sagrado e do religioso, o

que se verificou (e verifica) foi (e é) “uma multiplicação de formas de expressão

religiosa (seitas e profetismos)”374. Como escreve Claude Rivière, referindo-se à obra de

David Martin375, la sécularisation n’est pas un processus unilinéaire et irréversible,

mais complexe et ambigu, qui n’exclu pas les individus charismatiques ni les

orientations symbolistes et ésotériques, chez les élites à la recherche du sacré376. São

estas “orientações simbolistas e esotéricas” que surgem em “elites (sociais) em busca

do sagrado”, que são o objecto deste nosso trabalho de Tese e de que já tratámos

anteriormente.

Essa recomposição do religioso – onde se verifica, segundo François

Laplantine, “grande parte do trabalho actual de busca de sentido e de reconquista

identitária” – vai desenvolver-se, segundo este autor, em “duas direcções totalmente

distintas”: a) Ignorant les frontières (religieuses, mais aussi extra-religieuses)

caractérístiques des sociétés «traditionnelles» ou «rationelles», les religons produisent,

par syncrétisme, de l’inédit et font réapparaître des formes de spiritualité que l’on

croyait abandonnées et surtout qui ne sont plus l’oeuvre des grandes institutions

ecclésiales. b) Se crispant sur leurs frontières, elles réagissent à la modernité, en

réactivant la tradition. Ce sont les intégrismes et les fondamentalismes, qui

connaissent un développement spétaculaire depuis une quinzaine d’années, tant dans le

judaisme que dans l’Islam, le catholicisme, le protestantisme. Dans le primier cas (la

recomposition à partir d’une option que nous appelerons «gnostique»), la

374 Ibid., p. 154 .


375 David Martin, A General Theory of Seculization, Oxford, Blackwell, 1978.

246
reconstituition des identités et la reconquête du sens s’effectuent plutôt aujourd’hui, par

ce que le groupe social capte par ses «antennes». Dans le second cas (la recomposition

du religieux à partir d’une option qui peut être qualifiée de «sectaire»), elles

s’effectuent davantage par ce que le groupe radicalise à partir de la mémoire collective

et de ses «racines», C’est doncs à une transformation impressionante du paysage

religieux, que nous sommes confrontées. La modernité réactive notamment des formes

«noires» de religions (..).Nous assistons aussi à de nouvelles formes de comportements

dont «Dieu» n’est que l’une des composantes.377

Essa recomposição do religioso resultou, pois, na criação de NMR’s, grande

parte dos quais são “seitas” na denominação de Weber-Troeltsh378, e também de uma

espiritualidade sincrética, compósita, obtida por “bricolage” individual, nesse enorme

“supermercado” do religioso e do mágico-religioso, constituido por antigas tradições

espirituais, religiosas e mágico-esotéricas, mas também por espiritualidades com novas

características que radicam na tecno-ciência, na psicologia, etc.

Toda esta situação do retorno do religioso e da sua recomposição – para alguns

surpreendente - levou (como dissemos) alguns dos que elaboraram há décadas a “teoria

da secularização”, a rever essa doutrina e mesmo a substituí-la por outras, a saber, a da

“des-secularização do mundo” e a, equivalente, do “reencantamento do mundo”.

Pelo interesse que isso constitui para este nosso trabalho, vamos determo-nos um pouco

mais neste tema de reflexão, a qual tem a ver com uma reflexão sobre o conceito de

religião – e que complementa os conceitos já referidos na Introdução e este trabalho.

376 Claude Rivière, Socio-anthropologie des réligions, Paris, Armand Colin/Masson, 1997, p. 150.
377 François Laplantine, Le Défi Magique, vol. I, op. cit., p. 9 e 10.
378 Essa tipologia – evolutiva - distingue as religiões das seitas e, entre as duas, abre um espaço para as
denominações (ver, p.e., J.P. Willaime, Sociologie des religions, Paris, P.U.F., pp.27 e )

247
Exemplo dessa atitude de mudança teórica é Peter Berger, teórico da

“secularização” e autor do importante livro do final dos anos 60, The Sacred Canopy:

Elements of a Sociological Theory of Religion379, que no virar do século, em Le

réenchant du monde380, tradução francesa de The Desecularization of the World –

Resurgent Religion and World Politics, constata e explica a “ressurgência actual do

religioso”, revendo a análise onde assentou a “secularização”, já que para ele e os que o

acompanham – neste livro, Jonathan Sacks, George Weigel, David Martin, Grace Davie,

etc, mas não apenas estes – “a modernidade não acarretou um declínio da religião”.

É habitual localizar a origem dos NMR nos anos 70, decorrente de vários

factores que a seguir analisaremos. Mas parece que eles têm (pelo menos os primeiros)

uma raíz na contra-cultura dos anos 60, com a sua contestação ao “sistema” e a busca de

novas formas de vivência social, espiritual e filosófica. É importante referir que em

meados dos anos 70 se deu também a eclosão do fenómeno dos “fundamentalismos”,

dessa “vingança de Deus” (cf. Gilles Kepel, op. cit. na Bibliografia), desse regresso de

um religioso “efervescente” e mesmo violento e de que foram cumes a xiita Revolução

Iraniana do ayatollah Kohmeini – que abriu caminho, posteriormente, ao radicalismo

“islamista” em geral, quer xiita, quer sobretudo sunita (Al-Qaida, etc.) - e, também

numa versão não violenta, mas mesmo assim efervescente, o integrismo de

Monseigneur Lefebvre, o fundamentalismo pentecostalista e neo-evangélico, o

“sionismo religioso”, o “fundamentalismo” hindu, etc., etc. Deve referir-se, no entanto,

que as manifestações da violência religiosa contemporânea, embora tendo a sua

379 Nova Iorque, Anchor Books/Random ouse, 1967.

248
manifestação mais intensa e espectacular no chamado islamismo “salafista” e

“jihadista”, não se limitam a este, podendo dizer-se que quase todas as “grandes

religiões” apresentam, nos nosso dias, um maior ou menor grau de violência381.

Já vimos brevemente as causas deste fenómeno religioso que radicam na

racionalização e na secularização verificadas na Europa e no Ocidente em geral,

(sobretudo nos século XIX e primeira metade do século XX), e que acarretaram aquilo a

que Max Weber chamou de “desencantamento do mundo” e que deu origem ao

diagonóstico sociológico da “secularização”. O que aconteceu, entrertanto, foi que a

doutrina da secularização de Peter Berger, proposta no seu já citado livro de 1967, The

Sacred Canopy: elements of a Sociological Theory of Religion, Anchor Books, N.Y.,

1990, assentou – para além da sua Teoria da Religião382 – no diagnóstico da crise

verificada nas grandes instituições religiosas, em que se constatava uma “privatização”

desse religioso que progressivamente abandonava a “praça pública”, mas em que se

tomava essa crise das instituições religiosas por uma crise do religioso no seu todo, crise

acompanhada do “pluralismo”383. Ora essa crise institucional foi acompanhada, como já

dissemos, do surgimento progressivo – a partir da evidente “decomposição” do religioso

– de novas formas obtidas a partir de uma “recomposição” do religioso, com a formação

de múltiplos “novos movimentos religiosos” (NMR’s) – denominação preferível à de

380 Peter Berger e outros, Le réenchant du monde, Paris, Bayard, 2001, trad. francesa de The
Desecularization of the World – Resurgent Religion and World Politics, Grand Rapids, Mi/EUA,
Eerdmans, 1999.
381 Ver um resumo disto num meu trabalho intitulado “A violência religiosa contemporânea” publicado
no anuário “Janus 2007” (Público/UAL). Para um tratamento mais detalhado e completo, ver as obras de
Mark Juergensmeyer e de Charles Selengut, citadas na bibliografia.
382 Teoria na qual a religião é um “nomos”, um mundo de ordem significaticva contra o caos, um “escudo
último contra o terror da anomia”, i.e., a ansiedade e a falta de normas, o qual “fornece a mais efectiva
legitimação da ordem social”, “cosmicizando-a e tornando-a sagrada-a” e, ao mesmo tempo, criando um a
alienação”, ao esquecer o homem que foi ele próprio que ”construiu socialmente” esse mundo cultural
que é a religião.
383 e do consequente “mercado” de “produtos religiosos” que traz a desobjectivação do “nomos” e põe
em cheque a sua veracidade, relativizando-a

249
“seitas” ou “cultos” – e de uma ”nova espiritualidade”, exuberante, quer do ponto de

vista das doutrinas religiosas e mágico-religiosas, quer dos efectivos influenciados por

essa “nebulosa místico-esotérica” (designação da autoria de Françoise Champion). Em

suma: o religioso não desapareceu, antes ressurgiu sob novas formas, uma das quais

estudámos neste trabalho.

Essa recomposição do religioso resultou, pois, na criação de NMR’s – grande

parte dos quais são “seitas” na denominação de Weber-Troeltsh384 – e também de uma

espiritualidade sincrética, compósita, obtida por “bricolage” individual, nesse enorme

“supermercado” do religioso e do mágico-religioso, constituido por antigas tradições

espirituais, religiosas e mágico-esotéricas, mas também por espiritualidades com novas

características que radicam na tecno-ciência, na psicologia, etc.

As pessoas das sociedades ocidentais ou ocidentalizadas, já não encontravam

respostas satisfatórias (do ponto de vista racional e emocional) às grandes questões do

Homem que, quer a Ciência (ou melhor, a tecno-ciência), quer as Religiões históricas

assentes em grandes instituições, muitas vezes distantes dos fiéis, já não lhes podiam

oferecer, quer por limitação doutrinal (dogmas, etc.), quer por limitação funcional (a

vivência e a organização do culto, etc.). Passou-se, pois, de uma posição periférica do

indivíduo nas grandes instituições religiosas, para uma posição central em que o

indivíduo “recompõe” (sincreticamente, por vezes) os elementos religiosos que agora se

situam, pluralisticamente, na sua periferia385 – o ser individualista moderno que escolhe

o seu caminho religioso com dimensões não-comunitárias a aberto a compromissos

384Essa tipologia – evolutiva - distingue as religiões das seitas e, entre as duas, abre um espaço para as
denominações (ver, p.e., J.P. Willaime, Sociologie des religions, Paris, P.U.F., pp.27 e )

250
plurais e não-exclusivos, substitui o ser tradicional que aceitava, muitas vezes

passivamente, a religião da sociedade onde nascia, a qual era comunitária e exigia

compromissos exclusivos.

Mas, como já refrimos, este processo não foi um processo geral e único, antes

coexistiu (e coexiste) com as antigas formas religiosas e suas instituições (que, embora

em crise, continuam a existir). Como escreve Claude Rivière, referindo-se à obra de

David Martin386, “a secularização não é um processo unilinear e irreversível, mas

complexo e ambíguo”387. E, nesse contexto, em vez de assistirmos a uma extinção do

sagrado na sua manifestação tradicional, o que se verifica é “uma multiplicação de

formas de expressão religiosa (seitas e profetismos)”388 que coexistem com as antigas

(ou renovadas) religiões – mesmo estando elas em crise .

Para o sociólogo Lorne L. Dawson (op. cit.), é fundamental, para compreender

os NMR “evitar as análises reducionistas” e ter em conta, para além dos problemas na

“infraestrutura”, os problemas na “superestrutura” (direi eu), isto é, as “necessidades

espirituais” da humanidade e a dimensão emocional do Homem. Com ele diz: “Os

NMR nascem de um desejo de satisfazer certas necessidades «espirituais» da

humanidade, as quais têm uma realidade e uma importância independentes das nossas

outras necessidades sociais e psicológicas” (op. cit., p. 12)

385 Ver o meu artigo e o esquema nele publicado, em Le sacré, comme centre organisateur, publicado no
livro dirigido por Basarab Nicolescu, Le sacré aujourd’hui, Ed. Rocher, Monaco, 2003, incluído, em
tradução para português, no meu livro Re-criações herméticas II, Hugin, Lisboa, 2004, pp.224-231.
386 David Martin, A General Theory of Seculization, Oxford, Blackwell, 1978.
387 Claude Rivière, Socio-anthropologie des réligions, Paris, Armand Colin/Masson, 1997, p. 150 (a
tradução é nossa).
388 Ibid., p. 154 (a tradução é nossa).

251
Será muito útil ver agora qual a Teoria da Religião que fundamenta estas

afirmações de Stark e Bainbridge e a sua correspondente Teoria da Secularização – que

fornece uma versão alternativa às que Peter Berger propôs. Partindo da convergência

com este importante investigador e pensador, na constatação do carácter “indiscutível

(de) que alguma espécie de secularização ocorreu no mundo moderno”, Stark e

Bainbridge elaboraram uma teoria que dá conta da (também indesmentível)

“persistência do religioso” no nosso mundo. Para eles, as “religiões são organizações

humanas primariamente comprometidas em fornecer «compensadores», - i.e.,

promessas de recompensa (vida depois da morte, etc.) noutro tempo e noutro lugar -,

compensadores gerais, baseados em concepções sobrenaturais”. Reconhecendo (tal

como Weber e Berger) que “os humanos precisam de viver num mundo com

significação” e que, “nem as maravilhas da ciência moderna, nem a abundância material

das sociedades industriais avançadas anulam esta necessidade” - nem a satisfazem, tal

como não satisfazem a “consequente busca de certezas sobrenaturais” -, estes autores

elaboram uma teoria da secularização que é entendida como a constatação do “colapso

periódico de organizações religiosas específicas e dominantes, em consequência de elas

se terem tornado mais mundanas, mais acomodadas aos aspectos não religiosos dos seus

contextos culturais”, pelo que, “ao contrário do que afirmam Berger e seguidores, (...) a

secularização não deve ser confundida com a perda da necessidade de compensadores

naturais, pelo contrário: é o falhanço em oferecer compensadores naturais

significantemente vividos e consistentes que explica o declínio das religiões

estabelecidas”. Em suma, como já vimos (mas nunca é demais repetir), a religião não

morreu, ela mudou (ou está a mudar).

Os Novos Movimentos religiosos (NMR) e as Espiritualidades Alternativas (EA)

252
Está na altura de enquadrar estes grupos, de precisar os conceitos e estabelecer

tipologias, baseando-nos naturalmente, nos especialistas que têm dedicado ao estudo

desta nova religio389. Novos Movimentos Religiosos (N.M.R.) é a denominação

adoptada pelas Ciências Sociais para o conjunto de manifestações actuais do fenómeno

religioso, as quais vulgarmente são denominadas como “seitas”, “cultos”, expressões

pejorativas, logo, não neutras. Utiliza-se também a denominação de Espiritualidades

Alternativas (E. A.) ou “emergentes”, para um conjunto de fenómenos do novo

religioso, com menor grau de organização e estrutura que os NMR e ainda com um

carácter mais filosófico e menos “religioso” que as religiões tradicionais. Estes NMR e

EA não são todos “novos” e nem todos são “movimentos” – ver Massimo Introvigne,

La Magie à nos portes, Fides, Paris, 1994 - ver ainda o prefácio de J. Gordon Melton a

Encyclopedia of New Religions, de Christopher Partridge: “a maior parte das novas

religiões apresentam as velhas religiões num novo contexto, a uma nova audiência.” (p.

10). Além disso, muitas das suas manifestações “desafiam as nossas próprias definições

de religião” (ibid., p. 11), pelo que seria mais natural colocá-las mais no campo das

“espiritualidades” do que no das “religiões” - as quais “estão dando o lugar” às

primeiras – ver o título da obra editada por Eileen Barker (uma das fundadoras do

estudo dos NMR) e Margit Warburg, New Religions and New Religiosity, Aarhus

University Press/Cambridge University Press, 1998 e, também, o subtítulo da recente

obra de Paul Heelas e Linda Woodhead, The Spiritual Revolution – why Religion is

given way to Spirituality, Blackwell, Oxford, 2005. E, convém dizer, muito do seu

religioso é, como em muitas manifestações religiosas (quer recentes, quer antigas), um

389 Nova Religio – The Journal of Alternative and Emergent Religions, é o título de uma recente revista
académica, dirigida por Catherine Wessinger e editada, em Nova Iorque, pela Seven Bridges Press, em
colaboração com a Universidade Loyola de Nova Orléans e a Universidade Stetson, dedicada, como o seu
subtítulo indica, ao estudo das religões alternativas e emergentes.

253
“mágico-religioso” – ver, a este propósito, o interessante e já citado livrinho de

Massimo Introvigne (Director do CESNUR – Centro de Estudos de Novas Religiões, de

Torino). Esclareça-se, por fim, nesta breve discussão da denominação NMR, que ela foi

claramente inspirada pela denominaçaõ homóloga japonesa – que distingue, aliás, as

“novas religiões”, das “novas novas religiões”, etc.

As “espiritualidades da vida” e a tipologia de Paul Heelas.

Comecemos pela mais recente tipologia, que não é evolutiva, mas que pretende

apresentar as diversas modalidades religiosas que coexistem, com mais ou menos

harmonia, com mais ou menos violência, nos nossos dias – tanto nos níveis global,

nacional, local, como pessoal - e que de alguma maneira integra (como veremos

adiante) as outras, mais consagradas. Paul Heelas, Professor do Departamento de

Estudos Religiosos na Universidade de Lancaster, propôs recentemente – com a sua

colega Linda Woodhead – no livro Religion in modern times390, a seguinte tipologia

(que segundo ele próprio deve muito a Robert Bellah):

- religions of difference;

- religions of humanity;

- spiritualities of life391.

baseada nos diferentes graus de relação entre o divino, o humano e a ordem natural,

Começando por um extremo do espectro, temos (em tradução nossa):

390 Paul Heelas, Linda Woodhead, Religion in modern times – an interpretative anthology, editado na
colecção Religion and Modernity , em Oxford, pela editora Blackwell, em 2000.
391 P. Heelas, L. Woodhead, op. cit., pp. 2 e3.

254
- As Religiões de diferença, que distinguem drásticamente entre o divino, por

um lado, e o humano e a a natureza, proclamando assim a transcendência do

divino salvador. Referem-se a uma revelação ocorrida no passado e a uma

tradição da qual decorre a autoridade, muitas vezes interpretada e representada

por uma hierarquia que exige obediência, renúncia e sacrifício. Exemplos: as

religiões “históricas” ou “grandes” religiões, tal como o Hinduismo, o Judaismo,

o Cristianismo (católico, ortodoxo, anglicano etc.), o Islamismo, etc., mas

também as “denominações”, por exemplo, as cristãs protestantes, a saber,

evangélicas, carismáticas, pentecostalistas, etc.

Passando ao polo oposto, temos as:

- Espiritualidades da vida, que adoptam uma perspectiva “holística”, vincando

a identidade fundamental entre o divino, o humano e o natural; ocupar-nos-emos

delas de seguida;

E, entre os dois, situam-se as:

- Religiões (liberais) de humanidade, que tentam manter um equilíbrio entre

estes três elementos, sem subordinar o humano, quer ao divino, quer ao natural.

São exemplos deste tipo, correntes liberais e modernas do cristianismo

(protestante, mas também católico, etc.), do hinduismo, etc.

Estes três tipos de religião dos nossos dias podem dar origem, segundo Paul

Heelas, a outras formas de religião, a novas variedades religiosas, de que ele cita duas:

255
experiential religions of difference e experiential religions of humanity, as quais aliás

não são de muita importância para o tema que estudámos: os grupos alquímicos da

segunda metade do século XX.

Importante, de facto para o presente estudo, são as espiritualidades da vida da

tipologia de Heelas, que passaremos a examinar com mais detalhe. Ao contrário das

“religiões de diferença”, em que o divino está acima do humano e do natural (o que

acontece ainda, embora em menor grau, com as “religiões liberais de humanidade”), as

“espiritualidades da vida” consideram que o divino existe já dentro da ordem das coisas

e que os seus ensinamentos e práticas assentam na espiritualidade intrínseca da pessoa

ou na espiritualidade integral da ordem natural, no seu todo392. Estas espiritualidades

proclamam a existência e a necessidade da experiência de um “Eu superior” ou “Eu

interior” que é preciso libertar, aqui e agora, do “eu inferior”. Para elas a vida perfeita

já está inerentemente presente; a única coisa que é preciso fazer é “trabalhar” com

rituais, meditações, “psicotecnologias”, etc. de modo a criar o contacto transformativo

que envolve a manifestação da própria divindade da vida. A experiência espiritual é

tudo o que importa finalmente393. Algumas destas espiritualidades também consideram

o mundo natural como sendo sede da imanência do divino. As “espiritualidades

interiores” põem, além disso, segundo Heelas, um ênfase no unitário, no mesmo, a

espiritualidade perene que reside no coração de todas as religiões e mesmo na ordem

natural como um todo394. Mas sobretudo, e paralelamente, para estas “espiritualidades”

a autoridade é considerada residir antes no interior, do que no exterior (…) (pelo que)

os que nelas estão envolvidos não confiam nos ditames da ttradição (sendo, por isso) as

espiritualidades da vida (…) formas destradicionalizadas de religiosidade. De tal modo

392 P. Heelas, L. Woodhead, op. cit., p. 110 (a tradução é nossa).


393 Ibid., p. 111 (a tradução é nossa).
394 Ibidem.

256
elas rejeitam a tradição, que podem ser consideradas genuinamente pós-

tradicionais395.

Para Paul Heelas, essas espiritualidades da vida - que apresentam uma

indesmentível tendência para o interno ou para o interior e que, além disso, defendem e

procedem a uma valorização da vida - apresentam alguns “termos análogos”, dos quais

destacamos os seguintes:

- “New Age” e Movimento “New Age”, termo de uso comum, sobretudo a

partir dos anos 60 o qual embora, segundo Paul Heelas, se sobrepõe àquilo

que nós chamamos de espiritualidades da vida, este autor não o utiliza

devido à sua tonalidade prejorativa, pois é um termo emocionalmente

carregado que tem a ver com o “consumismo”, o “vulgar” e a

“espiritualidade de Hollywood”396.

- “Paganismo/Neo-paganismo”, que valoriza as espiritualidades internas,

pre-modernas, associadas com antigas tradições, tais como a bruxaria (…)

célticas/drúidicas, xamânicas, ameríndias. Paul Heelas, considera que nestas

correntes, alguns dos seus membros – os pagãos – organizam-se em

comunidades muito mais diferenciadas do que aquelas que são típicas dos

que estão envolvidos nas espiritualidades da vida397.

- “Novos Movimentos Religiosos”(“NMR”), termo que se tornou popular no

discurso académico depois dos anos 60, é na opinião de Paul Heelas,

relativamente impreciso, pois pode conter todas as novas formas de religiões

«alternativas» no “Ocidente”. Devido à natureza autoritária dos NMR bem

organizados, há (relativamente) poucos NMR que ensinam a demanda

395 Ibidem.
396 Ibid., p. 112.
397 Ibidem.

257
interior e os que a seguem não se sentem por eles atraídos, antes privilegiam

a liberdade e as formas (relativamente) não- autoritárias de associação, de

reunião, etc.398

Neste domínio da organização das novas formas religiosas existe uma situação

muito comum, particularmente nas Espirityualidades Alternativas, que é caracterizada

pela frase da socióloga Grace Davies, “acreditar sem pertencer”, incluída no seu célebre

livro399: Believing without Belonging.

Esta tipologia de Paul Heelas , embora útil para distinguir as novas religiosidades

e espiritualidades das manifestações religiosas tradicionais, não dá conta todavia de toda

a diversidade que existe nas manifestações actuais do religioso, neste domínio – onde

coexistem, como já vimos, formas e conteúdos “antigos” e “novos” – pelo que será

necessário recorrer, de seguida, a outras tipologias mais finas, as quais poderão melhor

enquadrar os miovimentos que estudámos.

398 Ibid., p. 113.


399 Davies, Grace, Religion in Britain since 1945: Believing without Belonging, Oxford, Blackwell, 1994

258
Tipologias dos NMR

De todas as tipologias que pretendem fazer uma distinção mais fina no interior

dos NMR, i.e., entre as suas diversas manifestações, parece-nos que a apresentada na

obra Encyclopedia of New Religions, por Christopher Partridge, é a mais adequada à

descrição deste fenómeno complexo que são os NMR. Assim, nesta tipologia proposta,

teremos as seguintes divisões (seguida dos exemplos mais significativos):

- NMR com raízes no Cristianismo: Mormonismo, Testemunhas de Jeová, Ciência

Cristã, Pentecostalismo da Unicidade, Igreja Universal de Deus, Igreja da

Unificação/”Moonies” (Coreia do Sul), Rastafarianismo, Igrejas Africanas Independentes

(África sub-sariana), Kimbanguismo (Congo ex-Zaire), Igreja do Senhor/Aladura (Nigéria),

Igreja Celestial de Cristo/Aladura (Benin), Igreja Cristã de Sião (África do Sul), Templo do

Povo do Ver. Jim Jones (EUA/Guiana), Ramo dos Davidianos (waco, Texas), A

Família/Meninos de Deus, Espiritualidade da Criação de Matthew Fox, Igrejas Internacionais de

Cristo/ICOC, Fraternidade de Jesus/Exército de Jesus, etc.

- NMR com raízes no Judaísmo: Movimento Lubavitch, Cabalismo (The Kabbalah

Learning Center, de Rav Berg, etc.), Aleph/Aliança para a Renovação do Judaísmo, Judaísmo

Reconstrucionista, Judaísmo Humanístico, Gush Emunim, Meshihistim, etc.

- NMR com raízes no Islão: Ordem Sufi Turca/ Odem dos Derviches Halveti-

Jerrahi, Ordem Sufi dos Naqshbandis Haqqani, Fé Baha’i, Movimento Internacional Sufi, A

Nação do Islão (de Louis Farrakhan, EUA), Subud, etc.

259
- NMR com raízes no Zoroastrismo: Mazdeísmo reformado, Filosofia Parsi, etc.

- NMR com raízes nas Religiões Indianas: Missão Ramakrishna, Brahma

Kumaris, Movimento Meher Baba, Sociedade Satya Sai Baba, Ananda Marga, MT/Meditação

Transcendental (de Maharishi Mahesh Yogi), ISKCON/Movimento Hare Krishna, Yogas e

Tantrismos diversos, Movimento Osho (ex-Rajneesh), Fundação Krishnamurti, Elan Vital, do

Guru Maharaji, NKT/Tradição do Kadampa, Shambala International, etc.

- NMR com raízes no Extremo Oriente: Tenrikyo (Japão), Soka Gakkai (Japão),

Reiki (Japão), Aum Shinrikyo (Japão), Taoismo moderno (Mantak Chia, etc.), Kyodan/Perfeita

Liberdade (Japão), Cao Daí (Vietnam), Falun Gong (China), Tai Chi (China), Artes Marciais

diversas, Meditação budista Chan/Zen, Feng Shui (China), etc.

- NMR com raízes nas Tradições indígenas e Pagãs: Cultos “cargo” (Melanesia,

Polinesia), Druidismo/Celtismo, Santeria/Regla de Ocha (Cuba), Umbanda (Brasil), Candomblé

(Brasil), Vudu (Haiti), Brujeria (México), Palo Maiombe (México), Igreja dos Nativos

Americanos (EUA), Xamanismos diversos (Castaneda, Michael Harner, etc.), Wicca, Eco-

paganismo, Heathenismo e Tradição Norse/ Paganismo germânico e nórdico/Federação pagã,

etc.

- NMR com raízes no Esoterismo Ocidental (EO) e nas Tradições “New

Age”(NA):

a) EO: Teosofia cristã (Swedenborg, Jacob Boheme, etc.), Rosacricianismo (AMORC,

Rosicrucian Fellowship, Lectorium Rosacrucianum, etc.), Neo-templarismo (OSTS, OTS, ORT,

OCTCND, OVDT, OSMTJ, etc.), (Franco-) Maçonaria (Judaico-cristã, Cristã, “egípcia”, etc.,

de Ofício, de Altos graus, Regular, liberal, etc.), Teosofismo (Sociedade Teosófica de H.P.

260
Blavatksky, Antroposofia de Rudolf Steiner, Escola Arcana de Alice Bailey, etc.), outras

escolas: HOGD/Hermetic Order of the Golden Dawn, de W. Wynn Wescott, AA, de Aleister

Crowley, OTO/Ordo Templi Orientis, de Karl Kellner, Theodor Reuss e A Crowley, Grupos

Gurdjieff e Ouspensky, Igrejas Gnósticas, Satanismo (Igreja de Satã, de LaVey, Templo de Set,

de M. Aquino), Vampirismo (Templo do Vampiro), etc.

b) NA: Instituto Esalen (California), Fundação Findhorn (Escócia), Summit Lighthouse/Igreja

Universal e Triunfante, “O Curso de Milagres”, “A Profecia Celestina”400, etc.

- NMR com raízes em Culturas Ocidentais Modernas: Espiritualidade centrada

nas Celebridades (Elvis Presley, Princesa Diana, etc.), Psicologias transpessoais (Stanislav Grof,

Pierre Weil, etc.), URANTIA, Ufologia (Raelianos, Heaven’s Gate, etc.), Controle Mental de

Silva, Igreja de Cientologia/Dianética de Ron Hubbard, Espiritualidades Feministas,

Movimento do Potencial Humano (Abraham Maslow), NLP/Programação Neuro-linguística,

Doofs e Raves, etc.

Criticável, para alguns, nesta tipologia – a melhor, no entanto, que nos foi

proposta até agora – apenas as duas últimas divisões, já que pode parecer que seria

preferível afastar o “New Age” do Esoterismo Ocidental401 – embora o primeiro tenha

também, no segundo, raízes gnósticas e herméticas, mas, além delas, também outras,

por exemplo no Teosofismo de Blavatsky, que não é estritamente ocidental, antes é

sincrético e mesmo oriental – e integrar o “New Age” nos NMR com raízes nas

Culturas Modernas Ocidentais, pois de facto é essa a sua característica essencial. No

entanto como veremos neste trabalho de Tese, há grupos esotéricos que apresentam

características claramente “new age”, embora se queiram distanciar dele.

400 Ambos pertencentes à categoria de audience cults¸ proposta (tal como as outras categorias de client
cults e movement cults) por Rodney Stark e William S. Bainbridge, no seu livro The Future of Religion:
Secularization, Revival and Cult Formation, University of California Press, 1985

261
É importante lembrar o lugar que ocupa a alquimia operativo-laboratorial nestas

tipologias propostas – a de Partridge (“esoterismo ocidental e as tradições do «new

age»”) e as propostas por J. Gordon Melton (“sabedoria antida”) e David Barret

(“esotérica e neo-pagã”) -, sintetizando-as no seguinte quadro:

A Alquimia Laboratorial e o seu lugar nas várias tipologias de NMR/EA

- “Sabedoria antiga” (Gordon J. Melton, in “The Cult Experience”)

- “Esotérica and neo-pagã” (David Barret in “The New Believers”)

- “Esoterismo Ocidental e as Tradições do New Age” (Christopher


Partridge, in “Encyclopedia of New Religions”)

Essa espiritualidade da “Nova Era” (onde incluiremos também, o que não faz

Partridge, a escola Ramtha e o channeling), este “New Age”, não é nem um movimento

único, nem está assente apenas em raízes panteístas e gnósticas, foi estudado, sob

diferentes perspectivas, em três obras essenciais: duas de 1996, The New Age

Movement. Celebration of the Self and the Sacralization of Modernity, de Paul Heelas,

(Blackwell, Oxfrod) – para o qual este fenómeno de uma “nova religiosidade”, é “uma

religiosidade da modernidade tardia” ou mesmo de “uma religiosidade pós-moderna”

que recusa a orientação cristã tradicional em direcção à salvação e se preocupa mais

com a expansão e realização pessoais - e New Age Religion and Western Culture.

Esotericism in the Mirror of Secular Thought, de Wouter J, Hanegraaff (Brill, Leyde) –

que reduz o “New Age” ao “esoterismo ocidental” (o que é no mínimo discutível, já que

401 Muitas Ordens esotéricas ocidentais encaram o “New Age” com alguma superioridade espiritual e

262
uma parte significativa do esoterismo contemporâneo afasta-se dele e até o rejeita),

“esoterismo ocidental” que, encontrando a modernidade, se “seculariza” e tenta um

novo compromisso com a ciência moderna - e outra mais recente, Le New Age, des

origines à nos jours, de Massimo Introvigne (Dervy, Paris, 2005, tradução do livro

italiano New Age & Next Age, de 2000). Nesta última obra, o autor (Director do

CESNUR) propões que, depois do primeiro “New Age” de 1962 a 1992 – movimento

milenarista, em rede (network), que anunciava uma “idade de ouro” colectiva -, se

verifica a emergência de uma nova forma, o pós-“New Age”, ou o “Next Age” que,

desde há cerca de 10 anos, já não assenta na comunidade e nas redes de comunidades,

antes se acentua o carácter individual e individualista do fenómeno, de que resulta um

“arquipélago” de “ilhas” individuais.

Algumas características de certos NMR e seus aspectos problemáticos

Os NMR e as EA têm tido uma imagem problemática402 junto do público

devido a acontecimentos lamentáveis – familiares, financeiros, criminosos, etc. -

relatados pelos media, mas que em boa verdade atingem apenas uma pequena parte

deste fenómeno tão diverso. Acusações de sequestro de membros (em particular de

menores403), de tráficos diversos (de droga, de armas e de divisas) e posse de armas404,

de exploração económica405 e de “lavagem ao cérebro” dos seus membros, juntamente

com os acontecimentos de violência406 registados em alguns deles, são muitas vezes

mesmo aversão.
402 Ver, por exemplo, James R. Lewis e Jesper Aagaard Petersen, eds., Controversial New Religions,
Oxford, Oxford University Press, 2005.
403 Cite-se o caso célebre dos “Meninos de Deus”.
404 Cite-se os casos dos Davidianos em Waco/Texas e da Ordem do Templo Solar.
405 A Cientologia é alvo deste tipo de acusações em vários países.
406 Ver, por exemplo, J. Gordon Melton e David Bromley, eds., Cults, Religion and Violence, Cambridge,
Cambridge University Press, 2002.

263
evocadas pelas organizações “anti-seitas” (quer religiosas, quer laicas) como suficientes

para a proibição do fenómeno dos NMR no seu todo, o que a verificar-se traria como

consequência um grave atentado à liberdade religiosa. Na verdade, a violência e outras

manifestações verificam-se, minoritariamente, tanto em “seitas” como nas “grandes

religiões” e as outras acusações acima referidas são por vezes injustificadas (como é o

caso da maior parte das chamadas “lavagens ao cérebro”), ou têm raíz em conflitos

familiares. É claro que devido à natureza complexa do fenómeno dos NMR este é mais

difícil de monitorizar e de controlar, não sendo de excluir acontecimentos preocupantes

(como é o caso dos violentos). No entanto, o que é necessário fazer, desde já, é (em vez

da tentação proibicionista) proceder à observação e o estudo deste fenómeno407 feito por

especialistas num perspectiva interdisciplinar – para além da sociologia, da psicologia e

das ciências das religiões, a antropologia que embora tendo “chegado tarde” 408 ao

estudo do fenómeno, está em boa posição para dar um precioso contributo ao seu

estudo. No caso dos grupos alquímicos estudados só encontrei um exemplo de

violência, sobetudo simbólica e psicológica, mas com pelo menos um exemplo de

violência física.

É certo que muitas vezes o que os aderentes desses “novos movimentos

religiosos” e dessas “novas espiritualidades” procuram mais, é uma segurança

psicológica, emocional, física e material que os tranquilize face às múltiplas incertezas e

407 Veja-se, neste contexto das manifestações violentas, o trabalho de campo do sociólogo suiço Jean-
François Mayer, elaborado na fase “tranquila” da Ordem do Templo Solar. Infelizmente este estudioso
terminou o seu trabalho antes de se começarem a verificar sintomas inquietantes naquele grupo,
particularmente uma radicalização gnosticista do seu discurso consubstanciada numa desvalorização
progressiva do mundo – em resposta a um cerco legítimo das autoridades, por razões de tráficos diversos.
Depois dos diversos suicídios verificados (não só na Suiça, mas também em França e no Canadá), Mayer
foi contratado pela Polícia e pelas Informações helvéticas para expliucar o sucedido e para prevenir
recidivas.
408 O excelente trabalho (de 1989) da antropóloga T.M. Luhrman, Persuations of the Witch’s Craft –
Ritual Magic in Comtemporary England (Picador, London, 1994), teve infelizmente, até hoje, poucos

264
aos múltiplos desafios da vida. E se no caso das influências vagas e das adesões fluidas,

existe apenas um reconfortante apoio doutrinário, psíquico e espiritual, já no caso

extremo das comunidades sectárias – particularmente as que situam no que Françoise

Champion e Danielle Hervieu-Léger denominaram de “religiões da emoção”409 -

entrega do aderente é total ou quase total: beaucoup d’adhérents ont eu à supporear une

malaise psychique, une vie de doute ou d’errance avant d’entrer en communauté.

Cherchant la sécurité, ils trouvent dans les sectes résponse à leurs besoins, puisqu’on

leur assure gîet et couvert, soutient et protection tant physique que psychologique410.

Tal relação emocional põe por vezes os aderentes a esses grupos na sua dependência

psicológica, pelo menos, colocando a questão de “controlo mental” ou mesmo de

“lavagem ao cérebro”, temas que são frequentes nas acusações contra as “seitas”

Os grupos alquímicos estudados – onde surge, no dizer de Laplantine, uma

“forma de espiritualidade que se julgava abandonada”, praticada por “elites sociais

em busca do sagrado”, com “orientações simbolistas e esotéricas” - situam-se dentro

destes dois tipos de associação acima citados, sendo maioritária a adesão fluida a grupos

abertos – “movimentos para-religiosos sem carácter sectário”411 - e representando a

adesão do tipo comunitário sectário, rígido e com forte sistema de sanção, um caso

limite que só verificámos num dos grupos (“Filiação Solazaref”) e que, mesmo assim,

integrava sobretudo uma minoria dentro do próprio grupo (uma espécie de “círculo

interno”), embora com efeitos hierárquicos e miméticos que se transmitem ao resto do

grupo, como vimos. Em todos os grupos há sempre alguma espécie de “círculo interno”

continuadores à altura. Cite-se, como excepção notável, o trabalho de Susan Greenwood, Magic,
Witchcraft and the Otherworld – An Anthropology, Oxford, Berg, 2000.
409 Françoise Champion, Danielle Hervieu Léger, De l’émotion en religion. Renouveaux et traditions,

Paris, Le Centurion, 1990.


410 Claude Rivière, op. cit., p. 156.
411 Ibid., p. 157.

265
em torno do fundador e do lider mas a intensidade dessa estrutura e os seus reflexos em

todo o grupo dependem, como veremos, do carisma do chefe e da ideologia do grupo.

Veremos também adiante que alguns dos grupos alquímicos estudados se podem

integrar, total ou parcialmente, nessa “nebulosa místico-esotéria”, denominada de “New

Age” (“Nova Era”), cujos grupos, ou associações mais ou menos vagas, “não

apresentam ideologia unificada e estável, nem rito rigorosamente prescrito”. Eles

respondem antes, como diz C. Rivière, a expériences de recherche d’un mieux-être

intra-mondain, par l’accent mis sur le relationnel et la communication, onde são

atingidos a “libertação espiritual, o equilíbrio, o auto-domínio, a responsabilização”,

considerados como decorrentes dos effects thérapeutiques, de médicines alternatives

(homéopahtie, élixirs floraux, naturopathie), ou de techniques psychocorporelles de

développement du potentiel humain (yoga, méditation orientale revisitée, «channeling»:

version contemporaine du spiritisme) e que incluem ainda manières de communiquer

avec l’énergia cosmique et de retourner à l’être essentiel, en maîtrisant o seu ego…412.

É importante dizer, desde já, que a adesão ao universo da Alquimia e aos grupos

alquímicos, por parte de muitos, radica nessa esperança de cura e saúde psico-físicas

que eles têm a esperança de encontrar, quer seja através das essências, tinturas e elixires

– já nem falando da longínqua e mítica Pedra Filosofal da qual decorre o Elixir da

Longa Vida -, quer através do carisma e influência do “mestre” que se pensa estar

transmitida ao grupo, qual baraka (benção ou graça) dos mestres das tarikas sufis.

Trata-se, como sempre, no universo do religioso, de encontrar “compensadores”

412 Ibidem.

266
(Rodney e Stark, op. cit.) para diminuir a angústia e a incerteza e dar conforto e

esperança.

Depois de termos abordado em capítulos anteriores a dimensão histórica,

diacrónica da alquimia e a vivência dos membros dos seus grupos, seus discursos e suas

práticas, vamos agora estudar a sua dimensão sincrónica. O objectivo deste capítulo é

analisar as doutrinas dos grupos alquímicos estudados e estudar a sua correlação com a

sua estrutura social, hierarquia, atitude política e outros comportamentos face à

sociedade. Começemos pelas doutrinas e depois faremos o estudo da estrutura destes

grupos.

A - TIPOLOGIA DOS GRUPOS ALQUÍMICOS BASEADA NAS SUAS

DOUTRINAS

Estes grupos adoptam, como se viu, para além da Alquimia e da Espagíria,

algumas outras doctrinas esotéricas. Facilmente se vê que, contrariamente às

proclamações dos seus lideres, na maior parte dos casos não existe uma doutrina

alquímica “pura”, mas sim uma “bricolage” com várias contribuições. Apenas

observámos uma maior “pureza” no caso do Sagy-Nature de Patrick Rivière, que segue

Fulcanelli e seu discípulo Canseliet – este, no entanto, mais cristão que o seu mestre.

Mas mesmo nestes mestres da tradição alquímica europeia, renascida no século XX, há

algumas incursões noutros domínios, sendo interessante, no caso de Fulcanelli, salientar

o capítulo do Mistérios das Catedrais relativo à “Cruz cíclica de Hendaye” e que tem

claras ressonâncias escatológicas e apocalípticas.

267
Procuraremos fazer no quadro seguinte a síntese das diversas contribuições

doutrinais destes grupos estudados. Assim, para além da Alquimia e da Espagíria,

presentes em todos os grupos, temos a marcante presença da Cabala em “Les

Philosophes de la Nature”/LPN (Qabal como eles escrevem) que, para além de ser

objecto de um curso específico e autónomo – promovendo o estudo da Árvore da Vida

cabalística para fins de meditação, na senda do rosacrucianismo alemão (Rosa-Cruz de

Ouro alemã dos anos 70 do século XVIII) e inglês (Ordem Hermética da Aurora

Dourada, fundada em 1888) – também apresenta uma articulação com a Espagíria –

como se vê claramente no respectivo curso -, articulação essa baseada nos ensinamentos

do cabalista e alquimista alemão Knorr von Rosenroth e na doutrina das “assinaturas”

de Paracelso que estabelece as correspondências entre as partes e órgãos do corpo e suas

doenças, por um lado, e os planetas, os metais e as plantes, por outro, permitindo assim

que os elixires vegetais ou minerais preparados sejam utilizados para fins medicinais.

No outro grupo que estudámos em trabalho de campo, a Filiação Solazaref/FS,

constatámos nas suas publicações e no seu discurso público ou semi-público, uma clara

influência de Georges I. Gurdjef, traduzida em expressões como, por exemplo, a

“metabolização” da doutrina e do trabalho operativo que tem de passar para a fisiologia

e para as camadas subtis mais profundas do alquimista – uma vez mais uma

distanciação e mesmo um ataque aos “especulativos”, aos intelectuais e aos “alquimistas

de sofá” – e ainda a necessidddade da utilização de “choques” iniciáticos para despertar

os adeptos, como as longas caminhadas no campo, por vezes à noite (que Gurdjef

utilizava com o seu grupo do Instituto para o Desenvolvimento Harmonioso do

Homem), as invectivas, por vezes sob a forma de insultos, para “pôr o ego no seu lugar”

(recordo o episódio que me contaram e de que foi alvo o filho de EM, aquando da

268
deslocação de um grupo de portugueses à sede da FS em Marsat, Auvergne/Puy de

Dôme. É de referir ainda no que diz respeito à doutrina que a FS teve uma primeira fase

claramente cristã-católica fundamentalista, na linha de um Moseigneur Lefèvre, com

algumas referências célticas, mas esse tipo de cristianismo celta foi sendo

progressivamente substituído por um apelo constante à tradição pagã “centro-europeia”

Por seu turno, os Frères Aînées de la Rose-Croix/FARC, de Roger Caro, são

claramente rosacrucianos e têm associados uma Igreja cristã gnóstica – de que Roger

Caro era o Patriarca - que, apesar do seu esoterismo, procurou sempre o reconhecimento

de Roma. No que diz respeito ao grupo Spagy-Nature/SN, de Patrick Rivière, só

detectámos nele um cristianismo alquímico – o Graal como líquido alquimico - que lhe

vem de Canseliet e alguma referência de tipo neo-templário.

Assim, temos:

LPN FS SN FARC
Doutrinas
Espagíria + + + +
Alquimia + + + +
Cabala (Qabal) +
Cristianismo + (1ª. fase) + +
Neo-paganismo + (2ª. Fase)
Rosicrucianismo (+) +
Templarismo + +
Igreja Gnóstica +
Gurdjief +

Se nós utilizarmos a “tripartição trifuncional” de Georges Dumézil, - cf. Mythe

et Épopée, t. I, II, III (1968, 1971, 1973, 1986) Paris, Gallimard, 1995 -, podemos

estabelecer uma correlação entre estes grupos e os três níveis de iniciação simbólica

269
associados à “tripartição” de Dumézil. Pode observar-se, assim, que todos eles se

centram na prática artesanal da alquimia operativo-laboratorial, um deles, a Filiação

Solazaref, apresenta um imaginário cavaleiresco e heróico e uma outra é

particularmente sacerdotal, os Frères Aînées de la Rose-Croix, com a sua Igreja ENA –

Église de la Nouvelle Alliance. Os Philosophes de la Nature/LPN, com o seu trabalho

da Cabala associado ao da Espagíria alquímica, aproximam-se do universo sacerdotal, o

mesmo acontecendo, em menor grau, com o grupo Spagy-Nature/SN, apesar das

referências neo-templárias do seu lider que se enquadram, no entanto, na dimensão

sacerdotal do cristianismo alquímico de Canseliet que SN e Patrck Rivière seguem.

Temos pois, o seguinte quadro:

LPN FS SN FARC
Simbolismo
Artesanal + + + +
Cavaleiresco ++ +
Sacerdotal + + + ++

È importante notar a presença, nestes grupos, de outros sistemas esotéricos

juntamente com a Alquimia, e entender a razão desta coexistência, desta

complementaridade. A verdade é que, apesar de a Alquimia operativo-laboratorial ser

em si mesma uma espoiritualidade baseada numa dimensão artesanal, podendo bastar-se

a si própria, o que se passa é que estes grupos e os seus membros sentam a necessidade

de a complementar com dimensões sobretudo saderdotais, como se no fundo o homem

moderno desconfiasse da completude da via spiritual artisanal e tivesse de recorrer a

outras práticas (Qabala, Gurdjief, etc.) mais “espirituais”. Isto deve radicar na tradição

270
religiosa e míistica ocidental que desvaloriza o corpo e a matéria e para a qual só há

espiritualidade nos planos mais afastados do mundo material.

Finalmente, é útil para melhor sistematizar as posições destes grupos face aos

temas da espiritualidade moderna do tipo New Age – ver, p. e., Wouter H. Hanegraaff,

New Age Religion and Western Culture – Esotericism in the Mirror of Secular Thought.

Alguns dos grupos alquímicos que estudámos rejeitam firmemente o New Age e as

espiritualidades e religiosidades modernas. No entanto, em alguns deles podemos ver

alguma “contaminação” de temas dessas espiritualidades, sendo o caso mais exemplar o

do LPN.

LPN FS SN FARC
Afirmação da ciência + + +
“Nova Ciência” + +
Parapsicologia + +
Terapias Alternativas + + + +
alquímicas
Terapias Alternativas +
Electrónicas (*)

(*) de ondas cerebrais alfa

E, mesmo nos grupos abertamente anti-New Age e anti-NM FS, vemos que

alguns deles apresentam certas caracteristicas de “bricolage” spiritual que encontramos

em algumas correntes New Age:

LPN FS SN FARC
NMR + +
EA +
New Age +

271
Anti-New age +++ + ++

Então, em vez de rejeitarmos a classificação de Christipher Partridge em que ele

classifica a Alquimia como um tipo de NMR e EA, incluindo como subtipos quer o

Esoterismo Ocidental quer o New Age, nós devemos aceitá-la pois essa vertente “new

age” depende do grupo.

B – TIPOLOGIA DOS GRUPOS ALQUÍMICOS BASEADA NA SUA

ORGANIZAÇÃO, ESTRUTURA E OUTRAS CARACTERÍSTICAS

SOCIOLÓGICAS

No artigo intitulado “Esotericism in New Religious Movements” (Capítulo 19 do

The Oxford Hanbook of New Religious Movements, editado por James R. Lewis,

Oxford University Press, 2004, pp. 445-465), Olav Hammer discute as definições de

Esoterismo e divide-as em duas categorias principais:

- a concepção “histórica”, como a do Esoterismo Ocidental, de Antoine Faivre que

já descrevemos no Capitulo III;

- o conceito “tipológico” de Esoterismo, proposto por Hammer (que vale a pena

aqui recordar), como um acesso por etapas ao conhecimento (multitiered access to

knowledge), que corresponde a uma definição mais corrente de esoterismo - “o

conhecimento apenas para alguns e por fases” - e que está relacionado com a estrutura e

a função das “religiões esotéricas” e dos NMR, como explicita Hammer, nesse artigo:

myths, rituals, religious objects, social formations, discursive practices and

272
sociopsychological mechanisms. O mesmo autor afirma, nesse sentido, que é necessário

entrar em consideração com as seguintes cinco características e a sua correlação com o

“esoterismo tipológico” (Hammer, op. cit., p. 449):

- formação social (social formations);

- rituais (rituals);

- objectives declarados (purported objectives);

273
- estilo cognitivo (cognitive style);

- relações com a sociedade envolvente (relations with mainstream society).

Como afirma Olaf Hammer there are “Western Esoteric” currents that are not

esoteric in the typological sense of the world, e por outro lado, many of the esoteric

typological currents are not “Western esoteric” in Faivre’s sense. Exemplo disto será

Quanto à Alquimia, se nós considerarmos apenas a sua teoria e a sua prática, sera

muito útil, como vimos em capítulos anteriores, encara-la na perspectiva histórica,

diacrónica, de Antoine Faivre e do seu “esoterismo occidental” – que se situa no

contexto da história das correntes de pensamento e das ideis religiosas, particularmente

as esotéricas. No entanto, se quisermos estudar os grupos alquímicos inseridos numa

determinada sociedade e numa cultura específica e se quisermos estudar as formas que

eles assumem será necessário usar a aproximação “tipológica” e sincfrónica de Olav

Hammer que valoriza mais as dimensões antropológicas e sociológicas deste fenómeno

– facto importante para um estudo, como este, no âmbito da Antriopologia Social e

Cultural. Decorrente desta perspectiva de Hammer teremos de considerar, o que já

fizemos em Capítulo anterior e que discriminaremos a seguir:

- o mito alquímico que é a elaboração da Pedra Filosofal, esse “objecto total”;

- a alquimia laboratorial que é um rito;

- os “objectivos afirmados”, “práticas discursivas e mecanismos sócio-

psicológicos” e as correspondentes “persuasões” e “estratégias retóricas”;

- os “objectos religiosos” alquímicos são os materiais – as “matérias primeiras”

(minerais, metais, sais, etc.) e as “matérias primas” (o “húmido radical”, a “raíz

dos metais”, o “fogo secreto”, o “espírito universal”, etc.) e os instrumentos

274
(fornos/atanores, retortas, balões, etc.) – que são uma espécie de de totems dos

grupos e das correntes alquímicas.

Utilizei neste estudo ambas as abordagens, a primeira (histórica) que já tratámos

nos Capítulos II, III e IV e a segunda que nos guiou no que já focámos em capítulo

anterior – particularmente o que tratou os grupos alquímicos estudados – e no parágrafo

antecedente e nos guiará no que se segue e que ilustraremos sinteticamente por tabelas

A definição de Hammer de Esoterismo implica um conhecimento reservado, por

vezes secreto, cuja divulgação e acesso são administrados por especialistas do sagrado,

por virtuosi religiosos (cf. Max Weber), através de uma estrutura hierárquica que está

associada ao poder desses mesmos especialistas. Esta fronteira estabelecida pelo grupo

entre o conhecimento da sociedade exterior e o do grupo esotérico, conhecimento ele

próprio esotérico, estabelece assim uma partição entre dois mundos, o dos profanos

(“eles”) e o dos iniciados (“nós”) que detêm este conhecimento reservado e que está

limitado aos iniciados e que lhes dá “poder ideológico” e simbólico. Esta divisão entre o

grupo e a sociedade, é replicada dentro do próprio grupo pois, dentro dele existe

também uma partição entre os detentores dos diversos níveis de conhecimento e poder.

Tudo isto, o poder dentro do grupo e o poder face à sociedade exterior. Como escreve

Olaf Hammer, in this form, secret knowledge not only defines those who are privy to it,

the initiates who have access to the scarce resource. It also defines an out-group that

lacks the privileged insight, by drawing boundaries between them and the in-group. (…)

The degree to which one possesses the scarce resource will place any given individual

on a specific rank in the social hierarchy.(Olaf Hammer, “Esotericism in New

275
Religious Movements”, in The Oxford Hanbook of New Religious Movements, op. cit.,

p. 450).

Embora apresentando tensões (maiores ou menores) entre o grupo e a sociedade,

a “formação social” destes grupos imita, de algum modo, a estratificação da sociedade

envolvente. Como refere Hammer, The demarcation between in- and out-groups can

run along lines that resemble those of the surrounding society (ibidem), uma vez que

the hierarchy of a religious organization can mirror the inequalities of society at large

(op. cit., p 451).

A intensidade dessa fronteira, dessa partição entre o grupo e a sociedade, pode

ver-se no seguinte quadro comparatvo, utilizando a tipologia que tem a ver com a

attitude do grupo religioso face ao mundo, - world affirming, world accommodating e

world rennouncing - proposta por Roy Wallis no seeu livro Elementary Forms of New

Religious Life:

LPN FS SN FARC
Afirmação do mundo + (*)
Acomodação face ao mundo + + +
Renúncia do mundo ++

(*) Roger Caro, Patriarca da ENA, solicitou ao Vaticano o reconhecimento da Igreja Católica à

sua igreja, apesar desta ser esotérica, gnóstica e de ele estar à frente de um grupo alquímico

É importante relacionar esta atitude face ao mundo com a dimensão milenarista

e apocalítica referida no Parágrafo anterior:

276
LPN FS SN FARC
Milenarismo + +
Apocaliptismo ++

Dos dois quadros anteriores se pode ver que a Filiação Solazaref apresenta, ao

mesmo tempo, uma “renúncia ao mundo” e uma clara atitude apocalíptica.

Já que por vezes a violência está ligada a um imaginário milenarista e

apocalíptico, deve focar-se essa característica. Neste sentido, é importante detectar se

existem algumas manifestações de violência psicológica ou física nestes grupos, o que

resumiremos no seguinte quadro.

LPN FS SN FARC
Violência (pelo menos retórica) +
Não-violência + + +

Correlacionando este quadro com os dois anteriores, verifica-se que a Filiação

Solazaref, apocalíptica e renunciando ao mundo – talvez mesmo rejeitando o mundo em

certas ocasiões de conflito –, é a que manifesta também algumas manifestações de

violência (pelo menos simbólica, mas também real).

Importante também é a estrutura do grupo – a Filiação Solazaref é a única que

oferece uma vida em comunidade, pelo menos ao seu núcleo interno – e a hierarquia

interna, a qual esta naturalmente associda ao poder e ao carisma dos seus dirigentes:

277
LPN FS SN FARC
Hierárquico ++ + (*)
Não-hierárquico + + (**)

(*) os FARC possuem uma igreja, ENA, com hierarquia

(**) contem, no entanto um grupo interno, o CHRCHM

LPN FS SN FARC
Líderes carismáticos + +++ + ++

É fácil ver-se, então, que os líderes mais carismáticos (Solazaref sobretudo)

estão associados a uma estrutura hierárquica do grupo que dirigem.

Relacionado com a hierarquia e a estrutura do grupo está, também – e isso é

claro na definição de Hammer de esoterismo -, o modo de comunicação dos seus

ensinamentos teóricos e práticos, comunicação mais ou menos reservada, que se

sintetiza na seguinte tabela comparativa:

LPN FS SN FARC
Cursos por correspondência + + (+)

Nota: no caso dos FARC o ensinamento por correspondência é reservado, graduado e sujeito a

provas de exame (mesmo que epistolar)

É claro que uma vez que o conhecimento detido por esses grupos é reservado, tal

como a sua administração, existirá um “desejo mimético” (René Girard) no exterior do

grupo, face a esses conhecimentos, tal como no interior do mesmo existirão fenómenos

278
de “rivalidade mimética” (René Girard) despertados por esse acesso ao conhecimento

que é administrado faseadamente e parcelarmente pela hierarquia. Este fenómenmo por

vezes conduz a cisões nos grupos, com a formação de novas estruturas e hierarquias, no

interior desses novos grupos. Estes “desejos” e “rivalidades” “miméticas”, poderão

estar na origem de fenómenos de violência contra o grupo e dentro do grupo.

Resumindo podemos afirmar, com Olaf Hammer - numa importante passagem

do seu já citado trabalho -, que “existe uma circularidade característica entre as crenças,

as formações sociais e a praxis dos segmentos de mais alto grau de uma comunidade

religiosa esotérica (no sentido que ele, Hammer, propõe):

(...) a study of the social formations of esoteric religions can also highlight the

mechanisms by which the structure of such religious bodies is maintained over time.

There is a characteristic circularity between the beliefs, the social formations and the

praxis of higher-ranking segments of an esoteric religious community. A ritual of

initiation into restricted insight is only meaningful within a given religious world that

encompasses a complex dogmatism, a specialized ritual vocabulary, and so forth. The

mass of arcane details that constitutes the religious worldview can only be helpful if

there is a corps of individuals who are able to allocate intellectual and other resources.

This knowledge is used as a marker of status that sets the same corps of people off

against the lower-ranking members. And in order to protect their rank, the higher-

ranking members reproduce the initiatory ritualism. A major goal of the religious

activity of those of lower rank may be to gain access to the protected knowledge of the

higher echelons. In some movements, this upward mobility causes new tittles (and)

higher levels… (op. cit., p. 451)

279
VII – CONCLUSÃO

A Alquimia operativo-laboratorial é um processo simbólico de natureza

sacrificial que o alquimista transfere para o laboratório e que se exerce sobre matérias

por ele escolhidas. O mito alquímico tem, pois, a sua correspondência operativa num

rito sacrificial em que os materiais sofrem um processo de “morte” – trituração,

“desmembramento”, dissolução, cocção, fusão, etc. - e ressurreição num novo “corpo”,

a Pedra dos Filósofos e, no patamar superior da utopia (al)química, a Pedra Filosofal.

Este processo que a matéria sofre tem claras ressonâncias xamânicas, como se o

alquimista não quisesse sofrer esse proceso directamente em si mesmo, mas sim

indirectamente, utilizando a matéria como “relais”, como intermediária do processo. Os

alquimistas proclamam que eles sofrem o processo iniciático em simultâneo com as

transformações da matéria, na senda do que afirmaram os tratados clássicos que os

alquimistas modernos e contemporâneos repetem: Ajuda-te que eu te ajudarei, diz a

Natureza para o alquimista.

A prática alquímico-laboratorial é, assim, um rito sacrificial em que a vítima

sacrificial é a Matéria Primeira, escolhida pelos alquimistas na Natureza. Os próprios

alquimistas denominam a sua Arte de “drama mineral”, em que “a matéria que todos

rejeitam” é sacrificada, imolada no balão – em solução - ou no cadinho – em fusão -,

não sem antes ter sido sujeita a uma prévia trituração. A “morte” da matéria profana –

nigredo - é condição necessária para a sua “ressurreição” – albedo - como matéria

sagrada, a Matéria-prima. Esta será conduzida através de ritos sacrificiais

complementares até ao estado de rubedo, atingindo a sua “exaltação” máxima no estado

de Pedra Filosofal.

280
Os processos que se passam no laboratório do alquimista - processos químicos e

metalúrgicos facilmente identificados no começo das operações - são simbolizados

através da imaginação criadora dos adeptos. À medida que a Obra avança essa

imaginação simbólica sobrepõe-se à realidade material e projecta-se sobre ela, tomando

a dianteira. Assim, o discurso alquímico introduz e projecta, qualidades especiais e

sobrenaturais, quer na matéria, quer no operador, que nos fazem recordar o conceito de

mana. Embora em potência, num e noutro, essas “forças sobrenaturais” vão evoluindo

ao longo do processo alquímico, dando ao alquimista a sensação de “iluminação” e

características pouco comuns que fazem parte do imaginário alquímico referente ao

alquimista – saúde plena, eterna juventude, longa vida, imortalidade – e à matéria, a

qualidade espiritual próxima (na Pedra dos Filósofos) ou igual (Pedra Filosofal) à

perfeição, o que permitirá, via pó de projecção, a transmutação dos metais “vis” em

nobres, Ouro (Crisopeia) ou Prata (Argiropeia). Estes conceitos míticos (“fogo secreto”,

“espírito universal”, etc.) colocam a alquimia no campo da magia - embora isso seja

negado pelos seus praticantes -, de uma magia “natural”, é certo, e fornecem aos seus

adeptos os “compensadores” de que nos falam Starck e Bainbridge e de que o Homem

necessita.

A Alquimia operativo-laboratorial é um quase “mito universal” já que assenta na

suposta existência de uma Matéria-prima universal. Não tendo ela – face à ciência

actual – “significado empírico” (Richard Pottier), ou fundamento empírico, nem quanto

aos objectivos (a transmutação dos metais em ouro e a imortalidade física, ou pelo

menos o prolongamento significativo dessa vida física), nem quanto aos meios, ela

apresenta, entretanto, uma lógica interna. É, pois, de salientar que, mesmo num universo

em que o simbolismo é luxuriante e complexo, existe uma estrutura simbólica de base

281
de carácter binário e ternário, universal, porque baseada na biologia e na sexualidade - o

“pai”, a mãe”, o “casamento”, o “nascimento”, o(s) “filho(s)”, o “crescimento”, a

evolução, a morte, etc.. Face à “irracionalidade” científica da Alquimia existe no

entanto uma “racionalidade interna da alquimia”, pelo que o que Lévi-Strauss afirmou

em relação ao pensamento mítico - “o homem sempre pensou assim tão bem” – se

poderá aplicar à Alquimia.

Praticada, sobretudo individualmente, nos séculos passados, por alquimistas que

tinham discípulos e ajudantes, num processo de aprendizagem e formação

essencialmente oral, ela passa a veicular cada vez mais os seus ensinamentos através de

tratados (nomeadamente a partir da alta Idade Média). O aparecimento de grupos

alquímicos organizados só se verifica a partir dos séculos XVII e XVIII e, após uma

ocultação no século XIX, eles ressurgem em finais desse século e em princípios do

século XX e, de um modo mais visível, na segunda metade do século XX,

particularmente em França, no último quartel desse século – período e país que é

objecto deste estudo.

O ressurgimento da alquimia operativo-laboratorial no século da ciência e da

técnica pode parecer contraditório, mas ele inscreve-se num processo de

“reencantamento do mundo” que deu origem, a partir dos anos 60 do século XX, a um

movimento heteróclito de contra-culturas, de filosofias, de religiosidades e de

espiritualidades a que se associam os chamados Novos Movimentos Religiosos (NMR),

as Espiritualidades Alternativas (EA) e as da Nova Era, New Age (NA). A origem desse

processo de reeancantamento pode situar-se na crise espiritual, cultural e social e da

282
falta de respostas e de sentido – de “compensadores” - que as grandes instituições

religiosas (e também a tecno-ciência) ofereceram ao Homem.

Os NMR, as EA e o NA são, uma parte, modernos, outra parte, ressurgimentos

de religiões e espiritualidades antigas – correspondendo a um regresso a religiões e

espiritualidades pré-cristãs – e, outra parte, ainda, actualizações dessas tradições. Estas

novas religiosidades e espiritualidades contêm como um dos temas fortes esse regresso

do “muito antigo”, raíz do “muito actual”, demanda dos iluminismos, quer o inglês de

finais do século XVII, quer os franceses e norte-americanos (e também o alemão) de

finais do século XX, quer na filosofia, quer na religião, quer em alguns casos na ciência

– veja-se a demanda de Newton, muito próxima da da alquimia nos tempos modernos –,

regresso de um “ancestral” que é também deísmo universalista que pretende transcender

(mas não o negar, em muitos casos) o Cristianismo, por vezes numa perspectiva

gnóstica, pessoal, interior. Aliás, nestas modernas espiritualidades e religiosidades,

mesmo quando a forma é antiga, como no caso da Alquimia, o conteúdo, a substância é

moderna, já que é o indivíduo que está no centro desse universo espiritual e religioso,

escolhendo, decidindo e mesmo recompondo numa curiosa “bricolage” os elementos da

sua própria espiritualidade e religiosidade. Isso acontece também com os grupos

alquímicos contemporâneos, onde se verificam “apports” estranhos à pura tradição

alquímica, como a doutrina de Gurdjief na Filiação Sozaref, ou uma máquina de “ondas

alfa” nos Filósofos da Natureza – neste grupo, por outro lado, a utilização conjunta com

a Cabala e Astrologia insere-se numa tradição que vem de Paracelso e da Espagíria

alemã. O primado da experiência e da vivência pessoal são também características dos

NMR e EA, que estão presentes, de um modo muito claro, na alquimia operativo-

283
laboratorial, onde o alquimista, mesmo que em grupo, está no centro da experiência

física e espiritual, sendo, ao mesmo tempo, um sapiente e um demiurgo.

Uma das razões da permanência nos dias de hoje da Alquimia reside no facto de

alguns indivíduos, embora possuindo formação técnica e científica actual, quererem

passar da periferia de um universo de conhecimento e poder que não dominam

totalmente (isto ainda é mais verdadeiro para os que não possuem formação técnico-

científica actual), para o centro de um outro universo gnoseológico que a maioria não

domina e ao qual é difícil aceder. “Reclamar (um) conhecimento (diferente)” – claiming

knowledge (Olaf Hammer) – dá poder simbólico e prestígio.

Um outro tema da contemporaneidade espiritual e religiosa, para além do

regresso a um certo Paganismo, é o regresso à Natureza – por vezes numa dimensão

Panteista -, como se a sociedade moderna, a técnica e a ciência tivessem cortado a

ligação do Homem com o mundo natural e os seus ritmos, sentindo aquele a

necessidade de restabelecer essa ligação. A posição da Alquimia não é, no entanto,

passiva, face à Natureza, pois ela encara a contemplação da Natureza com o objectivo

de conhecer os segredos e mistérios das suas operações e da essência da vida, para

poder “imitá-la”. A Alquimia, tal como o Hermetismo, é optimista pois proclama a

possibilidade de “espiritualizar” a matéria, regenerando-a, melhorando-a e acelerando

os processos evolutivos da natureza.

Os grupos alquímicos estudados são duplamente esotéricos, desde logo, do

ponto de vista da doutrina, uma vez que se situam no domínio do Esoterismo Ocidental

(A. Faivre), mas também são esotéricos do ponto de vista da sua estrutura social (O.

284
Hammer). Há uma evidente correlação entre a hierarquia e a estrutura fechada do grupo,

por um lado, e o modo progressivo, faseado e hierarquizado, como os ensinamentos são

dispensados.

O fechamento do grupo conduz algumas vezes à rejeição do mundo, podendo

esta levar à violência. O tradicionalismo próprio de certo tipo de esoterismo conduz

normalmente a posições políticas e sociais conservadoras, mas só registámos um caso

de extremismo nos grupos estudados.

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- Amadou, Robert, Le Feu du Soleil – enttretiens sur l’alchimie avec Eugène Canseliet,

Paris, Pauvert, 1978

- Atorène, Le laboratoire alchimque, Guy Trédaniel, 1982.

- Barbault, Armand, L’or du millième magtin, Paris, J’ai Lu, 1969.

- Bardeau, Fabrice, Les clefs secrètes de la chimie des anciens, Paris, Laffont, 1975.

304
- Cau, Albert, La Pierre Philosophale - étude rationelle de l’alchimie, Orcier, Ed. Col

du Feu, 1995

- Chauvière, Bernard, Parcours alchimique à l’usage d’un opératif, Londres, Liber

Mirabilis, 2000.

- Clairefontaine, Jean de la, Apocalypse: révélation alchimique, s. L., Axis/Arditec,

1985.

- Deleuvre, Jean, Alchimie, science divine – l’alchimie révélée par l’image, l’alchimie

enfin réhabilitée,Villeselve, Ed. Ramuel, 2000.

- Eugène Canseliet, Deux Logis alchimiques, en marge de la Science et de l’Histoire

(1945), Paris, Jean-Jacques Pauvert, 2ª. Ed. aum., 1979.

- Alchimie – études diverses de Symbolisme hermétique et de la pratique

Philosophale (1964), Paris, Pauvert, 2ª. Ed. aum, 1978.

- L’Alchimie expliquée sur ses textes classiques classiques, Paris, Pauvert, 1972.

- Fulcanelli, Le Mystère des Cathédrales et l’interprétation ésotérique des symboles

hermétiques du Grand Oeuvre (1925), Paris, Jean-Jacques Pauvert, 3ª. Ed. rev. e aum.

(com 3 prefácios de E. Canseliet), 1964; tradução portuguesa de António Carlos

Carvalho, publicada, em Lisboa, em 1973, pelas Edições 70.

- Les Demeures philosophales et le symbolisme hermétique dans ses rapports

avec l’art sacré et l’ésotérisme du Grand Oeuvre (1929), Paris, Jean-Jacques Pauvert,

3a. Ed. aum. (com 3 prefácios de E. Canseliet), tomos I e II, 1964; tradução portuguesa

305
de António Last e António Lopes Ribeiro, publicada em Lisboa, em 1977, nas Edições

70.

- (atribuído a) Fulcanelli, Finis Gloriae Mundi, Londres, Liber Mirabilis, 1999.

- Gibert, Jean-François, Propos sur la Chrysopée, suivi du manuscrit de Pierre Dujols-

Fulcanelli, traitant de la pratique alchimique, Paris, Dervy, 1995.

- Jollivet-Castellot, F., Comment on devient alchimiste – Traité d’Hermétisme et d’Art

Spagyrique (1897), Paris, Éditions d’Aujourd’hui, 1985.

- Junius, Manfred, Practical Handbook of Plant Alchemy: How to Prepare Medicinal

Essences, Tinctures and Elixirs, Nova Iorque, Inner Traditions, 1985;

- Laplace, Jean, Index general des termes spéciaux, des expressions et des sentences

propres à l’Alchimie, se rencontrant dans l’oeuvre complète d’Eugène Canseliet, Paris,

Ed. Suger, 1986.

- Marié, Eric, Introduction à la Médicine Hermétique, à travers l’oeuvre de Paracelse,

Vitré, Ed. Paracelse, 1988

- Martinet, Lucien, Clefs secrètes des faiseurs d’or ou 100.000 ans d’or alchimique,

Villeselve, Ramuel, 1997.

- Murien, Petri, Les innonbrebles pouvoirs de l’océan de mercure, ou comment utiliser

le mercure pour la santé et la fortune, Paris, Guy Trédaniel, 1986.

306
- Pasquier, Gilles, L’Entrée du labyrinthe ou Introduction à l’Alchimie suivie des

«Récréations Hermétiques» et des «Scholies», deux manuscrits d’Alchimie du XIXe,

siècle, Paris, Dervy, 1992

- Percheron, Jean-Pascal, Alchimie – la voie des amalgams ou voie de synthèse, Morée,

L’Ignitiation, 2000.

- Petrinus, Rubellus, A Grande Obra alquímica de Ireneu Filaleto, Nicolau Flamel e

Basílio Valentim, Lisboa, Hugin, 1997

- Espagíria alquímica, Madrid, Ed. Mirach, 2001.

- Pyrazel, L’Ambroisie du Soleil, ou «La Pierre Héroique» - Ars Brevis Philosophici,

Villeselve, Ramuel, 2000.

- Rivière, Patrick,, La Médicine Spagyrique, Albi, Ed. Capricorne, 1988.

- Alchimie & Archimie: L’Art des «Particuliers», des teintures aurifiques ou

Manuel de procédés pratiques pour produire l?or et l’Argent «archimiques» suivant les

méthodes authentiques des anciens Philosophes, Lyon, Ed. du Cosmogone, 2002.

- Médicine spagyrique, Paris, Pardés, 2003.

- Roime, Jean-Luc, Alchimie Kabbalistique, Spagyrie Végétale & Radiesthésie

Vibratoire, Orcier, Ed. Col du Feu, 1998.

- Serrère, Alain, Alchimie Opérative et Alchimie Spirituelle, Vincennes, cassette editada

pela Associação “Atlantis”, 1985

307
- Simón H., La Puerta cerrada, diario de un alquimista, Barcelona, Esoteria, 1981,

- Las Palomaa de Diana y la Medicina Universal, Cuenca, Ed. Maika, 1985.

- El Libro de Ouro de la Alquimia, Sevilla, Munoz Moya y Montraveta, 1987.

- Alquimia, el enigma de los tiempos, Sevilla, Munoz Moya y Montraveta, 1988.

- Alquimia, los siete tiempos – acuarelas y textos, Sevilla, Munoz Moya y

Montraveta, 1988.

- Tréhédel, Loic, L’Alchimie, antique science de demain, Paris, Rocher, 1999.

- Von Bernus, Alexander, Alchimie et Médicine (1948), Paris, Éd. Dangles, 1960.

Publicações editadas pelos grupos estudados

FARC

- Roger Caro, Dictionnaire de Philosophie Alchimique par Kamala-Jnana,

Saint-Cyr-sur-mer, 1961.

- Pleiade alchimique – 7 documentrs inédits sur le Grand-Oeuvre par les

Maîtres d’Ajunta suivis de deux essais sur la Pierre Philosophale par Roger

Caro, ed. aut., Saint-Cyr-sur-mer, 1967.

- Concordances alchimiques – 5 textes hermétiques par Roger Caro

suivis de 7 documents inédits sur le Grand-Oeuvre par Kamala-Jnana et lesd

Maîtres d’Ajunta, ed. aut., Saint-Cyr-sur-mer, 1968.

308
- Tout le Grand Oeuvre photographié – clichés de Kamala-Jnana

(F.A.R.+ C. – Supérieur du Temple d’Ajunta) – commentaires de Roger Caro

(Grand Prix des F.A.R.+C.), ed. aut., Saint-Cyr-sur-mer, 1968.

- Légenda des Frères Ainés de la Rose Croix, ed. aut., Saint-Cyr-sur-

mer, 1970.

- Rituel F.A.R.+C. et deux textes alchimiques inédits... suivi de «Vérité

sur les descendants des anciens rois de Chypre», ed. aut., Saint-Cyr-sur-mer,

1972.

- Eglise de la Nouvelle Alliance – Cours de Théologie à l’usage des

Séminaristes, par Pierre Pheobus, Évêque, Patgriarche de l’ENA, ed. aut.,

Saint-Cyr-sur-mer, 1973.

- Informations sur l’Église Universelle de la Nouvelle Alliance - Bandol,

Ed. ARIS, 1983

- Bible, Science et Alchimie, (introd. de Daniel Caro), Laroque, Ed. du

Sphinx, 1996.

- Traduction alchimique du «Siphra di Tzeniutha» de Moise (introd. de :

Daniel Caro), Laroque, Ed. du Sphinx, 1999.

- Instruções reservadas dos FARC: “1ère. Leçon” etc,, “Fabrication de

la Potasse de Chaux, etc.

F. Solazaref

-Solazaref, L’Obédience conventuelle alchimique à l’aube du XXIe. Siècle, s.l.,

s.d.,

309
- Introitus ad Philosophorum Lapidem, chez l’auteur, 1984.

- “L’Assemblée des philosophes sous l’obédience de l’Art Bref”, revista

Tempête Chymique face à l’athanor, aujourd’hui: une série limitée de

cahiers d’alchimie, dirigida por Dominique Vadot, Éd. “Aux amoureux

de science”, Librairie “La Légende Dorée”, Riom:

- premier cahier: octobre 1984

- deuxième cahier: Carême 1985

- troisième cahier: Carême 1987.

- Pierre d’Houches, Matériel de Chymie à l’usage des plus nécessaires

préparations de la Philosophie – catalogue descriptif accompagné dee

photographies et de figures explicatives, ed. aut., Clermond-Ferrand,

1984.

- Les Ateliers Pierre d’Houches, ed. aut., Clermond-Ferrand, 1985.

- L’Assation Philosophique en voie sèche, Teilhède/Combronde, Éditions

Aux Amoureux de Science, 1985

- Notions sur l’Éveil à la Sexualité Traditionelle Occidentale – premier

fascicule: l’autre, Teilhède/Combronde, Éditions Aux Amoureux de

Science, 1985.

- La vérité interdite: éléments d’initiation à la connaissance alchimique

traditionelle:- premier oposcule – Les prolégiomènes¸ deuxième oposcule

– Alchimie, sciences et religion, suivi des conseils pour les navigants,

Teilhède/Combronde, Éditions “Aux amoureux de science”, 1985 e 1986,

respectivamente.

- L’Assation Philosophique en voie sèche, Teilhède/Combronde, Éditions

Aux Amoureux de Science, 1985

310
- Les Buchers du XXe. siècle – Teilhède/Combronde, Éditions Aux

Amoureux de Science, 1988.

- “Les Incorruptibles” (Filiation Solazaref), Du nettoyage des Écuries

d’Augias – tome II ou Le Combat des Adepteees, Teilhède/Combronde,

Éditions Aux Amoureux de Science, 1989

- SOMME HERMÉTIQUE:

- Tome III – De l’Esprit Universel – Volume 1:

V.I.T.R.I.O.L.U.M.; Volume 2: Alkaest, Teilhède, Ed. amoureux de

science, 1990 (ambos).

- Tome IV – De Natura Metallorum – Volume 1: Petites

opérations minérales & voies alchimiques (première partie); idem

(deuxième partie), Teilhède, Ed. amoureux de science, 1991 (ambos).

- Tome VI – Ars Brevis – Volume 1: Les Feux du Ciel, Teilhède,

Ed. amoureux de science, 1991.

- Tome V – De Natura Vegetalorum – Volume 1: Petites

opérations végétales (première partie); idem (deuxième partie), Teilhède,

Ed. amoureux de science, 1992 (ambos).

- Métallurgie Sacrée (quelques pasaages marquants)- Conférence

aux Nations Unies – 13 mai 1993, Teilhède, Éd. Aux Amoureux de

Science, 1993.

- Escapade Alchimique – Bulletin de liaison de la Filiation

Solazaref, nº.s 1 et 2, Teilhède, Aux Amoureux de Science, 1994.

311
LPN

- Jornal interno, Le Petit Philosophe de la Nature, Malesherbes, LPN, do nº. 1

(Dezembro de 1982) ao nº. 127 (Junho-Julho de 1995).

- Correspondances

- Notice postulant, nº. 1- 40

- Spagyrie, nº. 41 – 48

- Alchimie, nº. 1 - 39

– Minéral, nº. 40 - 84

- Catalogue (de material de laboratório), Malesherbes, LPN, Setembro de 1990

Spagy-Nature

(para além dos livros de Patrick Rivière publicados em edições comerciais)

- SOLVE ET COAGULA, nº.s 1 a 42, instruções mensais de alquimia e espagíria

enviadas aos membros de Spagy-Nature.

- Limojon de Saint-Didier, Le Triomphe Hermétique (1699), introd. Patrick

Rivière, Molières, s.d., (tiragem de 50 exemplares).

- Altus, L’Alchimie et son Livre Muet (Mutus Liber), fac-simile de l’Édition de La

Rochelle (1677), introd. Patrick Rivière, Molières, s.d., (tiragem de 50

exemplares).

312
ANEXOS

313
ANEXO A

CRONOLOGIA DA ALQUIMIA EM FRANÇA, NA SEGUNDA METADE DO

SÉCULO XX – PRINCIPAIS PUBLICAÇÕES E ACONTECIMENTOS413.

Nota: A bold figuram os acontecimentos mais importantes para as diversas escolas da alquimia

operativo-laboratorial; a sublinhado estão as edições mais importantes para a alquimia operativo-

laboratorial.

(1945 – Publicação da primeira edição de Deux Logis alchimiques, de Eugène

Canseliet.). Nesse mesmo ano, como refere Atorène, havia ainda por vender alguns

exemplares das duas obras de Fulcanelli, mas em 1955, a sua reedição esgotou antes

de sair, quando se propôs uma subscrição de 1.000 exemplares, o que revela o interesse

cescente pela alquimia a partir de 1950 – e Canseliet teve um papel importante nesse

fenómeno, com os seus numerosos textos.)

(1947 – Publicação de Qu’est-ce que l’Alchimie, de André Savoret, nas ed. de

Psyché.)

(1948 – Publicação de Anthologie de la poésie hermétique de Claude d’Ygé, nas

ed. Montbrun, Paris, com prefácio de Eugène Canseliet. 2ª. Ed. na Dervy Livres, em

1976)

1951

– Publicação de L’Alchimie, de Serge Hutin, na col. “Que-sais-je?” das Presses

Universitaires de France (P.U.F.), Paris; 9ª. Ed. em 1995.

413 Utilisámos, para tal várias fontes, entre as quais duas muito importantes: no que diz respeito a
Canseliet seguimos a cronologia apresentada por Atorène no seu livro Laroratoire alchimique, Paris, Guy
Trédaniel, 1981, pp.332 e seguintes. No que concerne à bibliografia, utilisámos o artigo de Jean-Jacques
Mathé, Bibliographie des ouvrages et travaux en langue française depuis 1945 concernant la philosophie
hermétique, incluído em Alchimie, Antoine Faivre, etc., Albin Michel, Paris, 1978, pp. 189-221,
completado, em 1996, na segunda edição da mesma obra, editada por Dervy, Paris.

314
1952
– E. Canseliet, instalado em Savignies (desde 1946) começa, segundo Atorène,

uma nova cocção de que dará testemunho no seu livro L’Alchimie expliquée..; ele

terá revisto nesse ano, em Espanha Fulcanelli… (vide entrevista a R. Amadou).

1953
– Publicação de Aspects de l’Alchimie traditionelle, de René Alleau (nas

èditions de Minuit, Paris), com prefácio de E. Canseliet.

1954
– Publicação de Nouvelle Assemblée des Philosophes Chymiques, de Claude

d’Ygé (nas edições Dervy, Paris), com prefácio de Eugéne Canseliet; reimpressão em
1972.

1955
– Publicação de Mystiques, sprituels et alchimistes du XVIe. Siècle allemand, de

Alexandre Koyré, na Armand Colin; reimpressão em 1971, na Gallimard.

1956
– Publicação de Les Douze Clefs de la Philosophie (1602, edição francesa de

1627), de Basile Valentin, com tradução e comentários de Eugène Canseliet (Éditions

de Minuit, Paris); reimpressões em 1972 e 1977.

- Publicação de Forgerons et Alchimistes de Mircea Eliade, na Flammarion;

reedição corrigida e aumentada em 1977.

1957
– Publicação de um artigo de E. Canseliet em Art Magique de André Breton (ed.

Formes et Reflets, Paris).

- Segundo prefácio de E. Canseliet, para a 2ª. edição de Le Mystère des


Cathédrales (1926, Jean Schemit ed.), de Fulcanelli, nas edições Omnium Littéraire,

Paris.

- Publicação de Dante alchimiste de Jacques Breyer, nas edições La Colombe,

Paris.

315
- Publicação de Les Clefs de la Philosophie Spagyrique (1722), de Le Breton,
com introdução de René Alleau, nas ed. Caractères, Paris; outra edição , em 1985, nas

ed. Bailly, com apresentação de Sylvain Matyon.

1958
– Publicação de Le Matin des magiciens, de Louis Pawels e Jacques Bergier, na

ed. Gallimard; numerosíssimas reimpressões e traduções em diverss línguas.

1959
– Publicação de De l’Alchimie à la chimie (trad. de Prelude to Chemistry,

1957), nas ed. Fayard, Paris.

- Publicação de Les alchimistes de Michel Caron e Serge Hutin, nas Éd. Du

Seuil, Paris.

1960
– Segundo prefácio, da autoria de E. Canseliet, para a 2ª. edição de Les
Demeures Philosophales (1ª. Ed. 1930. Jean Schemit ed.), de Fulcanelli, nas edições

Omnium Littéraire, Paris.

- Publicação de Alchimie et Médicine de Alexander von Bernus (trad. da edição

alemã de 1948, por Henri Hunwald), nas Edições Dangles, Paris.

- Publicação de Le Grand Oeuvre (1907, Chacornac, Paris) de Grillot de Givry,

nas edições Chacornac; reimpressões nas Éditions Traditionelles, em 1971 e 1981.

- Publicação dos tomos I e II do Corpus Herméticum de Hermes Trismegisto,

fix., trad. de A. D. Nock e A.-J. Festugière (1ª. Ed. em 1946, reimpressões de 1972 a

1992), nas edições Belles Lettres, Paris. Os tomos III e IV (cujas primeiras edições

francesas são de 1954, serão reeditadas em 1972, com reimpressões até 1973).

- Publicação de Les Sept livres de l’archidoxe magique de Paracelso, Ed.

Nicolas Bussière, Paris, reimp. 1983.

1961
– Publicação de Dictionnaire de philosophie alchimique, de Kamala-Jnana

(Roger Caro), éd. Charlet, Argentières.

316
- Publicação de L’alchimie spirituelle, de Robert Ambelain, em La Diffusion

Scientifique; reimpressões em 1974 e 1985.

- Reimpressão de Hermés dévoilé (1832) de Cyliani, nas edições Chacornac;


reimpressões em 1975 e 1982

1962
– Publicação da tradução francesa de La tradition hermétique de Julius Evola,

nas Éditions Traditionelles; reimpressões em 1968 e 1988.

1963

1964
- Publicação de Alchimie de E. Canseliet – conjunto de artigos publicados em
diversas revistas – nas edições Jean-Jacques Pauvert, Paris; reimpressão aumentada

em 1978.

- Terceiro prefácio, de E. Canseliet, para a 3ª. edição de Le Mystère des

Cathédrales, de Fulcanelli (Jean-Jacques Pauvert, Paris).

- Publicação, por Bernard Husson (no Omnium Littéraire) de Deux traités

alchimiques du XIXe. Siècle.

1965
– Terceiro prefácio de E. Canseliet, para a 3ª edição de Les Demeures

Philosophales, no editor Jean-Jacques Pauvert, Paris.

1966
1966 – Publicação da reedição de Théories et symboles des alchimistes (1893),

de Albert Poisson, nas Éditions Traditionelles.

- Publicação de Commentaires sur le Mutus Liber, de Serge Hutin, nas ed. Le

Lien, Mazières les Metz, s.d.

- Publicação de Art et Alchimie de Jacques Van Lennep, nas ed. Meddens,

Paris/Bruxelas; reimpressão em 1971.

1967

317
– Publicação de Alchimie et son livre muet - Mutus Liber (1677), com
comentários de E. Canseliet, nas edições J.-J. Pauvert, Paris; reimpressões em 1974 e

em 1986.

- Publicação de Pleiade alchimique de Roger Caro, ed. aut., Saint-Cyr-sur-Mer.

- Publicação de Alchimie, Science et Sagesse de Titus Burckhardt, nas ed.

Planète.

- Publicação de La Vertu et Propriété de la Quintessence de toutes choses, de

Johannes de Rupescissa, nas ed. Arché, Milão, que editará vários textos clássicos de

alquimia (vide infra).

1968
– Publicação de Concordances alchimiques de Roger Caro, S.-C.-sur Mer.

– Publicação de Tout le Grand Oeuvre photographié de Roger Caro, ed. de


autor, Saint-Cyr-sur-Mer.

- Publicação de L’or du millième matin de Armand Barbault, nas Publications

premières/Denoel (reed. “J’ai lu”, 1970).

- Publicação de Oeuvre médicales de Paracelso, nas P.U.F.

1969
– Publicação de Atalante Fugitive (1618), de Michel Maier (trad.de Etienne

Perrot), nas Librairie de Medicis.

- Publicação de Théories et symboles des alchimistes (1891), de Albert Poisson,

nas Éditions Traditionelles; reimpressões em 1975, 1978, 1991.

- Publicação da 3ª. Ed. de Le symbolisme hermétique dans ses rapports avec

l’alchimie et la franc-maçonnerie, de Oswald Wirth, nas ed. Dervy-Livres (a 1ª. Ed. foi

publicada em 1910, a 2ª. Em 1931); reimpressões em 1975, 1981, 1993.

1970
– Publicação de L’Érotique de l’Alchimie, de Elie-Charles Flamand, com

prefácio de E. Canseliet, na Belfond; 2ª. Ed. no Courrier du Livre, em 1989.

- Reedição de L’Alchimie et les Alchimistes (1854) de Louis Figuier, na

Bibliotheca Hermetica, dirigida por René Alleau desde 1969, na editora Denoel,

318
Paris. Esta importantíssima colecção reeditou, durante os anos 70, vários textos

clássicos de Alquimia, como por exemplo, também em 1970, Le livre des figures
hiéroglyphiques de Nicolas Flamel (reeditado em 1978) e L’Entrée ouverte au palais

fermé du roi (1667), de Filaleto, em 1971, La Lumière sortant par soi- même des

ténèbres (1666) de Marc-Antonio Crassellame e Le Triomphe Hermétique (1699), de

Limojon Saint-Didier (com introdução de E. Canseliet), em 1972, Le Livre des Figures

Hiéroplyphiques ( ), de Nicolas Flamel (com introdução de E. Canseliet), e mais

tarde, em 1975, Les 5 livres ou la clef du secret des secrets de Nicolas Valois e Nicolas

Grosparmy, em 1976, Nouvelle Lumière Chymique (1691) do Cosmopolita, em 1977, Le

Char Triomplhal de L’Antimoine ( ), de Basílio Valentin e em 1978, Le dernier


testament ( ), também de Basile Valentin, já sob a chancela de Retz, Paris.

- Publicação de La Legenda des F.A.R.C. de Roger Caro, ed. aut. St.-

Cyr-sur Mer.

- Publicação de La voie de la transformation d’aprés C.-G. Jung et l’alchimie,

de Étienne Perrot (na Librairie de Médicis).

- Publicação de Le trésor des alchimistes, de Jacques Sadoul (reed. em 1971,

1972, 1976, 1990), na col. “J’ai lu”.

1971
– Criação dos Frères Aînés de la Rose-Croix – F.A.R.C., por Roger Caro

(1911-1992), en Saint-Cyr-sur-Mer.
- Publicação de L’Anthologie de l’Alchimie, de Bernard Husson (Belfond,

Paris).

- Publicação da tradução francesa de Psychologie et Alchimie (1944 e ver. em

1950), de Carl-Gustav Jung, nas edições Buchet-Chastel et Correa; reed. em 1975 e

1991.

- Publicação de Histoire de l’alchimie, de la science archaique à la philosophie

occulte, de Serge Hutin, na Marabout Université, Verviers (Bélgica).

319
- Publicação de Dictionnaire Mytho-hermétique (1787), de Dom A. J. Pernety,

nas ed. Arché, Milão; reimpressão em 1980. Este diccionário será editado também, em

1972, pela ed. Denoel, na col. “Bibliotheca Hermetica (vide infra).

- Publicação de Fables Égyptiennes et Grecques (1758), de Dom Pernety, nas

ed. Arché, Milão. Este livro será editado, também, em 1981, pelas ed. La Table

d’Èmeraude, Paris (reimp. 1991).

1972
– Publicação de L’Alchimie expliquée sur ses textes classiques, de E. Canseliet

(Jean-Jacques Pauvert, Paris); reedição aumentada em 1980.


- Publicação de Rituel FARC avec deux textes alchimiques inédits de Roger
Caro, ed. aut., S-C s. M.

- Publicação de La Pierre Philosophale, de Goerges Ranque, nas ed. Robert

Laffont, Paris.

- Publicação de L’Alchimie du verbe de Rimbaud, de Jean Richer, reeditada (2ª.

Ed. “completada”, em 1991, nas ed. Trédaniel).

- Publicação de Alchimie, de Lucien Gérardin, nas ed. Culture, Art, Loisirs,

Paris.

1973
– Publicação de Les Oeuvres de Nicolas Flamel, na editora Pierre Belfond,

Paris.

- Publicação de Le Rosaire des Philosophes, com trad. e notas de Étienne

Perrot, na Librairie de Médicis.

- Publicação de Le Grand Art des alchimistes, de Jacques Sadoul, na Albin

Michel; reimp. “J’ai lu”, 1975.

- Publicação de Lumières de l’Alchimie, de Arnold Walstein, nas ed. Mame,

Tours.

1973

320
- Reedição de L’Alchimie au Moyen Age (1938, Paderborn), de Wilhelm

Ganzenmuller, na Marabout, Verviers (1ª. Ed. fr. Aubier-Montaigne, s.d.).

- Publicação de Transmutations alchimiques de Bernard Husson, nas ed. “J’ai


lu”; reed. Aumentada, com um prefácio de François Trojani, nas edições La Table

d’Émeraude, Paris..

- Publicação de Alchimie. Florilège de l’art secret, de Stanislas Klossowski de

Rola (trad. ed. inglesa, de 1973), nas edições Seuil.

- Publicação de Pratique Opérative de l’ancienne Franc-maçonnerie turque. La

clef de la compréhension de l’alchimie.., de Rudolph von Sebottendorf, na Éd. Du

Beaucens, Bélgica.

- Publicação de Le Chemin du chemin de Arnau de Villanova, de La Clavicule,


de Raymond Lulle e de Miroir d’alchimie, de Roger Bacon e de Le composé des

composés, de Albert Le Grand, nas edições Arché, de Milão, que editarão vários textos

antigos de alquimia, como por exemplo, em 1975, o Amphithéatre de l’Éternelle

sapience (1609) de Heinrich Khunrath, Lettre Philosophique (1671), de Michel

Sendivogius (Le Cosmopolite) e Les trois livres de l’art du potier(1861) de Cyprian

Piccolpassi, Splendor Solis (1598), de Salomon Trismosin, e o Liber Paraminum de

Paracelso (reed. em 1984 nas Ed. Traditionelles com “avant-propos de Antoine Faivre

e prólogo de Bernard Gorceix. Em 1976, será editado, por esta editora, Du Vitriol

philosophique et de sa préparation (1896) de Tripied.

1975
– Publicação de Trois anciens Traités d’Alchimie, com caligrafia de E.

Canseliet, por J.-J. Pauvert, Paris.

- Publicação na Librairie de Médicis, de Viridarium Chymicum, ou le jardin


chimique (1624), de Daniel Stolcius, com introdução e comentários de Bernard Husson.

- Publicação de Les clefs secrètes de l’alchimie des anciens de Fabrice

Bardeau, em Robert Laffont, Paris.


- Publicação de Histoire de la Philosophie hermétique (1742), DE Lenglet-
Dufresnoy, nas ed. Georg Olms, Hildesheim.

321
- Publicação de Rares Expériences sur l’Esprit minéral (1668), de P. Moras de
Respour, nas ed. Jobert; reimp. 1977. Publicação de La Tourbe des Philosophes e do

Traité de Chimie Philosophique et Hermétique, na mesma editora (reimpressão em

1977). Em 1976, será publicado, também nas ed. Jobert, Traité du feu et du sel (1618),

de Blaise de Vigenère.

1976
– Publicação de Alchimie et Révélation Chrétienne, de Sévérin Batfroi (com

prefácio de E. Canseliet), por Guy Trédaniel, Paris. Estas Éditions de la Maisnie/Guy

Trédaniel, começam neste ano a edição – na sua Collection Oeuvres Chymiques - de


várias obras clássicas de alquimia, como por exemplo Oeuvre Chymique de Geber (em
dois vols.) e, no memo ano, a Oeuvre Chymique, de Bernard Le Trévisan (reimpressa

em 1991); em 1978, editarão Les Douze Portes d’Alchimie de George Ripley e em

1981, Épitre du feu philosophique, de Jean Pontanus.

- Publicação de Anthologie de la poésie hermétique (1948, Montbrun, Paris) de

Claude d’Ygé, com prefácio de E. Canseliet, nas edições Dervy.

- Publicação de Terre du Dauphin et Grande Oeuvre Solaire, de Guy Béatrice e

Sévérin Batfroi (com prefácio de E. Canseliet), por Dervy, Paris.

- Publicação de Mathériaux cryptographiques, de Grasset d’Orcet, tomo I,

por Bernard Allieu e Alain Barthelemy, s.l, s.d., nem menção do editor; reimpressão em

1983, ano em que será editado o tomo II da mesma obra.

- Publicação de Sensorium Dei dans l’hermétisme et dans la science, de J.

Zafiropulo e C. Monod, nas ed. Belles Lettres, Paris.

1977
– Fundação, em Grenoble, por Jean Laplace, da revista trimestral “de estudos

alquímicos”, La Tourbe des Philosophes. E. Canseliet colaborará assiduamente com

uma rubrica intitulada “Alchimiques mémoires”.

- Publicação de Voyages en kaléidoscope (1919, Paris) de Irène Hillel-

Herlanger, nas Éditions de la Tourbe, Grenoble; reedição em 1984, nas edições La


Table d’Émeraude.

322
- Publicação de Alchimiques métamorphoses du Mercure universel de Sévérin

Batfroi, no ed. Guy Trédaniel, Paris.

- Publicação de Oeuvre Minérale de Johann Rudolf Glauber, na colecção

Bibliotheca Esoterica das Edições Arma Artis (Neuilly/Seine); na Biblioteca


Alchemica da mesma editora, serão publicados em 1979, Révélation de la parole

cachée par la sagesse des Anciens (sec. XVII), de autor anónimo, com comentários e

gravuras de Bernard Biebel, e La Verité sortant du Puits hermétique (1753), de

Philovite Cosmocole.

- Publicação de Processus Chimique sous forme de messe (s. XVI), de N.


Melchior de Szeben, nas edições Arché, Milão; no mesmo ano, estas edições publicam
também o Commentaire sur la Médicine Universelle (1665), de Johannes de Monte-

Snyders.

- Publicação de Hermés Trismégiste (1866), de Louis Ménard, nas ed.

Trédaniel/La Maisnie.

- Publicação de Le Monde Magique des Héros (1605) de Cesare della Riviera,

nas edições Arche, Milão.

- Publicação de Opuscule trés excellent (1567), de Denis Zachaire, nas éd. De

la Violette, Paris. Introdução de Bernard Biebel.

1978
– Publicação de Sainte-Anne d’Alchimie de Guy Béatrice, Hermétiques Ballades

de Jean Laplace e de Héraldique Alchimique nouvelle de J. Camacho e A. Gruger,

todos com prefácio de E. Canseliet.

- Publicação da segunda edição revista e aumentada do livro de E. Canseliet,

Alchimie (saído em 1964).

- Publicação de Le Feu du Soleil, de Robert Amadou, por J.-J. Pauvert,

contendo

uma entrevista de três horas a E. Canseliet, onde este alquimista declara ter

reencontrado (pela última vez) Fulcanelli, em 1952, em Espanha.

323
- Publicação de Hermétiques ballades, de Jean Laplace, com prefácio de

Sévérin Batfroi e “considerações liminares” de E. Canseliet, nas Éd. De la Tourbe,

Grenoble; no mesmo ano e na mesma editor, Jean Laplace edita também

Considérations alchimiques sur la fin du monde.

- Publicação de Alchimie Asiatique, seguida de Le Mythe de l’Alchimie, de

Mircea Eliade, nas Éditions de l’Herne, Paris; 2ª. Ed. 1990.

1979
- Publicação da segunda edição, “considerávelmente aumentada” (a primeira

foi editada, em 1945, por J. Schemit), de Deux Logis Alchimiques, de E. Canseliet, por

J.-J. Pauvert, Paris; aí ele rectifica algumas passagens da entrevista que R. Amadou
publicou.

- A revista La Tourbe des Philosophes passa a ser publicada pelo editor

parisiense Bernard Renaud de la Faverie, também proprietário da livraria La Table

d’Émeraude (25, rue de la Huchette, junto ao Quai Sint Michel, onde havia também,

a livraria Éditions Traditionelles). Ambas – La Tourbe e La Table – tiveram um

importante papel no desenvolvimento e divulgação da Alquimia em França (e não


só), no último quarto do séc. XX.

A Tourbe – que publicará vários artigos de E. Canseliet, intitulados


“Alchimiques ménoires” -, incluirá ao longo dos seus 39 números – nº. 38-39 do 2º.

Trimestre de 1995, aguardando-se o nº. 40 desde essa data -, muitos artigos de

alquimia operativa, juntamente com outros, também sobre Alquimia, numa

perspectiva cultural e espiritual bastante interessante e alargada.


- Publicação de La pensée alchimique et le conte du Graal de Paulette Duval,

no ed. Honoré Champion.

- Publicação de L’Alchimie (1957, Penguin) de E. J. Holmyard, com textos de

René Alleau, Eugène Canseliet, Claude d’Ygé, etc., editada na Arthaud.

- Publicação, por Bernard Husson (autor da introdução), de Trois textes

alchimiques inédits du XVIIe. Siècle, Librairie de Médicis.


- Publicação de La Tradition alchimique, de Serge Hutin, nas ed. Dangles.

324
- Publicação de Traité de la Pierre philosophale, seguido do Traité de l’art de
l’alchimie, atribuido a S. Tomás de Aquino, nas ed. Arché, Milão (col Sebastiani).

- Publicação de L’Étoile Flamboyante (1766), do Barão de Tschoudy, nas ed.

Gutemberg Reprints, Paris.


- Publicação de Traité dAlchimie et de Physiologie taoiste, de Zao Bichen, nas

Éd. Les Deux Océans, Paris, com trad. introdução e notas de Catherine Despeux.

- Fundação da Associação Les Philosophes de la Nature, em Malesherbes,

dirigida por Jean Dubuis. A Associação LPN (assim também designada), punha à

disposição dos seus membros, cursos por correspondência teórico-práticos, em

fascículos mensais, de “Espagíria” (48 fasc./4 anos) e de “Alquimia Mineral” (84

fasc./ 8 anos), entre outros. A Associação LPN também realizou, até meados dos anos

90, estágios teórico-práticos de Espagíria e de Alquimia, em diversos pontos de

França e no estrangeiro (Portugal, E.U.A, etc.).

1980
– Publicação de La France des lieux et des demeures alchimiques de Josane

Charpentier (com prefácio de E. Canseliet), por Retz.

- Publicação de Manuel de l’alchimiste de Frater Albertus (Albert Riedel), nos

Ateliers du Maat, Montréal.

- Publicação de Les fondements de l’alchimie de Newton de Betty Dobbs, com


prefácio de Sévérin Batfroi, nas edições de La Maisnie.
- Publicação de Traité de la chimie (1668) de Christophe Glaser e de Histoire

de la chimie (166-69), de Ferdinand Hoefer, nas edições Gutemberg Reprints (a partir

da segunda edição de 1668, Jean d’Houry, Paris); estas edições editarão outras obras

clássicas de química antiga e alquimia, como por exemplo, no ano anterior, Le

tombeau de la Pauvreté (1691), atribuido a Atremont, e no mesmo ano, Ouverture de

l’Escholle de la Philosophie transmutatoire (1633), de David de Planys-Campy,

Dictionnaire Hermétique (1695), de Guillaume Salmon, em 1981, La Lumière tirée du

chaos de Louis Grassot, em 1982, Discours philosophique (…) ou la clef du sanctuaire

325
philosophique (1781), de Sabine Stuart de Chevalier, e em 1984, IX Livre de distallion,
de Jean-Baptiste Porta.

- Publicação de Alchimie, textes alchimiques allemands traduits et présentés par

Bernard Gorceix, nas edições Fayard.

- Publicação de La Médicine hermétique des plantes (1912), de Jean Mavéric,

nas edições Belisane, Nice.

- Publicação de Paracelse , de div. aut. (Bernard Gorceix, etc.), na col.

“Cahiers de l’Hermétisme” da Albin Michel, dirigida por A. Faivre e F. Tristan, que

já tinha publicado, entre outros livros, Alchimie (1978, vide supra), publicará em 1988,

Présence d’Hermés Trismégiste, de div. aut. (A. Faivre, etc.).

- Publicação de Paris et l’alchimie, de Bernard Roger, éd. Alta, Paris. Este

autor publicará em 1988, uma outra obra sobre alquimia (vide infra).

- Publicação de Rimbaud, la clef alchimique, de David Guerdon, nas edições

Robert Laffont.

- Publicação do nº. 10 da revista La Tourbe des Philosophes, “en hommage

aux 80 ans de M. Eugène Canseliet.

1981
– Publicação de Cours de Chymie (1757), de Nicolas Lemery, nas Éditions
d’Aujourd’hui.

- Publicação do Rituel alchimuque secret du grade de vrai Maçon Academicien

(1770) de Dom Pernety, nas ed. Rebis, Viareggio.

1982
– Publicação de Laboratoire alchimique de Atorène, nas edições Guy

Trédaniel/La Maisnie, Paris.

- Falecimento de E. Canseliet, em Savignies no mês de Abril, em virtude de


uma pneumonia.

- Publicação de L’art métallique des anciens (1910), de Jean Maveric, nas ed.
Phoenix, Genova.

326
- Publicação de Fulcanelli, une biographie impossible (1986, ed. Obelisco,

Barcelona), de L.M. Martinez Otero, nas éd. Arista, Plazac.

- Publicação de Alchimie, contes et légendes, de J. Rebotier e J.-M- Agasse, ed.

L’Originel, Paris.

- Publicação de Graal et Alchimie, de Paul Georges Sansonetti, nas ed. Berg

International, Paris; reimpressão 1993.

- Publicação do nº. 322 (Septembre-Octobre 1992), da revista Atlantis,

intitulada “Hommage au Maître Alchimiste Eugène Canseliet, F.C.H. (1899-1892).


- Publicação do nº. 17 da revista La Tourbe des Philosophes (4ª. Sem. 1981,
mas publicada em finais de 82), onde aparece um artigo/anúncio intitulado Du

matériel céramique pour la voie sèche et la voie humide, assinado por Pierre

d’Houches (pseudónimo de um “ceramista de Auvergne desde 1973), que pouco

tempo depois adoptará o nome de Solazaref.

- Saida, em Dezembro, do nº.1 da revista Le Petit Philosophe de la Nature, da

Associação Les Philosophes de la Nature (Malesherbes e, depois, La Garenne

Colombes), presidida por Jean Dubuis. Tratava-se de um boletim interno dos cerca de

1.000 membros da Associação, com muitos artigos sobre Espagíria e Alquimia, o qual

atingiu o nº. 127, em 1995 (vide infra).

1983
– Publicação na revista Le Fil d’Ariane Waulhain-St.-Paul, Bélgica), nº. 19,
de Explication de la teinture.. (1781), de Alexandre von Suchten

- Publicação de Traité sur la matière des Philosophes (s. XVII), nas ed.

Trédaniel/La Maisnie, Paris.

- Ao artigo/anúncio de Piere d’Houches, acima referido (1982), seguiram-se

outros cinco, na mesma revista, um (La tourbe des Philosophes, nº. 19, 2e.trim. 1982)

denominado Littera Custodium, e quatro (La Tourbe des Philosophes, nº.s 20, 21 e

22, de, respectivemente, 3º. E 4º. Trim de 82 e 4º. Trim de 83), intitulados De operandi
modo: Igne Aquaque.

327
- Publicação de L’Obédience conventuelle alchimique à l’aube du Xxe. Siècle,

de Solaref, ed. aut..

- Provável começo da “Filiação Solazaref” (segundo o próprio, em Les

Bouchers – vide infra).

1984

- Publicação de Introitus ad philosophorum lapidem de Solazaref, ed. aut., s.l.


- Publicação de Alchimie. Contribution à l’histoire de l’Art Alchimique, de

Jacques Van Lennep, Crédit Communal de Belgique, Bruxelas; reed. em 1985, na

Dervy Livres. Este é o catálogo da grande Exposição realizada em Bruxelas, de

Dezembro de 1984 a Março de 1985, sobre a Alquimia, a sua Arte e a sua prática.

- Publicação do 1º. número (premier cahier: octobre 1984), da revista Tempête

Chymique, face à l’Athanor, aujourd’hui: une série limitée de cahiers d’alchimie –

Une réponse traditionelle concrète aux questions de ce temps, da “Assemblée des

Philosophes sous l’obédience de l’Art Bref -“Filiação Solazaref “, com Director de

publicação, Dominique Vadot, Chefe de Redacção, Jeanne Descarmes. Editor Aux

Amoureux de Science, com direcção de correio, Librairie “La Légende Dorée”, Riom.

1985
– Publicação de Apocalypse: révélations alchimiques de Jean de

Clairefontaine, nas ed. Axis.

- Publicação de L’Assation Philosophique en Voie sèche de Solazaref, ed.


“Aux Amoureux de science”, Theilède, Combronde.
- Publicação de Touts les Rituels Alchimiques du Baron de Tschoudy (1768-

1770), nas ed. Arma Artis, col Bibliotheca Alchimica.

- Primeiro número da revista A.R.I.E.S. da Association pour la Recherche de

l’Information sur l’Ésotérisme (Meudon), dirigida por Antoine Faivre, a qual

publicou, entre outros artigos sobre estudos de alquimia, um número monográfico


sobre Paracelso (vide infra).

328
- Publicação do nº. 2 (deuxième cahier: Carême 1985) de Tempête Chymique,

da “Assemblée des Philosophes”/ “Filiation Solazaref, Riom.

- Publicação, em cassette, de uma conferência de Alain Serrière, Alchimie

Opérative et Alchimie Spirituelle, editada pela Associação Atlantis, Vincennes. A via

operativa indicada pelo autor é a “via do cinábrio” de Roger Caro.

- Publicação de La Vérité Interdite, éléments d’initiation à la connaissance

alchimique traditionelle¸premier opuscule: Les Prolégomènes, de Solazaref, nas

edições Aux Amoureux de Science, Teilhède, Combronde.

1986

- Publicação do deuxième opuscule: Alchimie, science et religion suivi de

conseils pour les navigants, de La vérité interdite, éléments d’initiation à la

connaissance alchimique traditionelle, de Solazaref, nas ed. “Aux Amoureux de

Science, Theilède, Combronde.


-Publicação de Alchimie comme Art hiératique de Henri Corbin, L’Herne,

Paris.

- Publicação de Introduction à la science hermétique, de Giuliano Kremmerz,

nas edições Axis Mundi.

- Publicação de Index général des termes spéciaux, des expressions et des


sentences propres à l’Alchimie, se rencontrant dans l’Oeuvre de Eugène Canseliet,

por Jean Laplace, nas ed. Suger, Paris.


- Publicação de Les origines de L’Alchimie dans l’Égypte gréco-romaine (ed.

inglesa, 1970), de Jack Lindsay, nas Éditions du Rocher.

- Publicação de Les Innonbrables pouvoirs de l’océan de Mercure de Petri

Murien, nas ed. Guy Tréadniel. O mesmo autor publicará, no mesmo editor, em 1989,

Cinnabaris ou le Mercure alchimique.

- Realização de dois estágios teórico-práticos de Espagíria e de Alquimia, em


Molières, sede da Associação Spagy-Nature, dirigida por Patrick Rivière. Esta

329
Associação continua, desde essa data até aos nossos dias, com o mesmo tipo de

estágios (com níveis diversos de desenvolvimento). Também põe à disposição dos seus

membros, matérias e utensílios para a Alquimia operativa (Athanor, pe.).

1987
- Publicação de Herbarius de Paracelso, na col. “Médicines Naturelles” da

Dervy Livres.

- Publicação de De la Pierre Philosophale de Jean Vauquelin des Yveteaux, de

De l’arbre de vie ou de l’arbre solaire, com comentários de Sylvain Maton, no Tomo I

da revista de História da Alquimia, Chrysopoiea, dirigida por Sylvain Matton e

publicada pela “Société d’Études pour l’Histoire de l’Alchimie”, com o apoio do

“Centre National des Lettres” . Comentários de Sylvain Matton. O tomo II desta


revista, publicado em 1988, inclui Commentaires sur l’épitaphe et les plaques de

Nicolas Flamel, também com apresentação de Sylvain Matton. A revista publicou ainda

mais dois Tomos, o III (1989) e o IV (1990-1991).

- Publicação do nº. 114 (4e. trim 1987) da revista L’Autre Monde - Nº. Spécial

Alchimie, com artigos de Patrick Rivière (“Alchimie opérative, alchimie spirituelle”),

Robert Amadou, Pierre Carnac, etc.

- Suspensão das actividades da Associação Les Philosophes de la Nature,

devido a desinteligências entre os seus dirigentes (de um lado, Jean Dubuis, do outro

Marc-Gérald Cibard). Desde essa altura, a Associação tem um Administrador Judicial.

- Publicação do troisième cahier: Carême 1987¸de Tempête Chymique, Face à

l’Athanor aujourd´hui, da Assemblée des Philosophes sous l’obédience d’Art Bref,

dirigida por Dominique Vadot e Jeanne Descarmes e editada por Aux Amoureux de

Science, Theilède, Combronde. Direcção de correio: Livraria “La Légende Dorée”,

Riom. Este foi o último “caderno” desta revista.

1988
– Publicação de Les Bûchers du Xxe. Siècle, de Solazaref, nas ed. “Aux

Amoureux de Science”, Theilède.

330
- Publicação de Pour la Rose Rouge et la Croix d’Or de Jean-Pierre Giudicelli
de Cressac Bachelerie, nas edições Axis Mundi, Paris.

- Publicação de Comment devient-on alchimiste (1897) de bF. Jollivet Castelot,

na Ed. Rosicrucienne, Paris; reed. Diffusion spirituelle, 1993.

- Publicação de Alchimie et Spagyrie, du grand Oeuvre à la Médicine de

Paracelse, de Patrick Rivière, nas Ed. de Neustrie, Caen, e, também, do mesmo autor,

na ed. Traditionelle, La Médicine de Paracelse.


- Publicação de À la découverte de l’alchimie, de Bernard Roger, autor que já

tinha publicado outra obra, em 1980 (vide supra).

- Publicação de Giordano Bruno et la tradition hermétique (trad. da ed. inglesa

de 1964), de Frances Yates, com “avant-propos” de Antoine Faivre.

- Publicação de La philosophie des alchimistes et l’alchimie de la philosophie –

Jâbir ibn Hayyân et les “Frères de la Pureté” , de Yves Marquet, na ed. Maisonneuve

& Larose.

1989
– Publicação de Traité d’alchimie: le magnum opus de Samuel Aun Weor, nas

Éditions Gnostiques, Paris.

- Publicação de L’Alchimie de Flamel (1772-3), de Chevalier Denis de

Molinier, com prefácio de Fabrice Bardeau, nas èditions d’Art Savary.


- Publicação de Alchimie et Mystique en terre d’Islam, de Pierre Lory, nas ed.

Verdier, Lagrasse.

- Publicação de La Pierre aqueuse de sagesse ou Aquarium des sages (1619), de

J.A. Siebmaacher, nas Éditions de La Table d’Émeraude, Paris.

- Publicação de Symboles Spirituels de l’Alchimie - catálogo da exposição do

Festival Internacional de Esoterismo -, realizado em Carcassonne em Novembro de

1988 na Bibliotheca Philosophica Hermetica, Amsterdam.

- Publicação de Du nettoyage des Écuries d’Augias, Tome II ou Le Combat

des Adeptes, de Solazaref, nas “Éditions aux Amoureux de Science”, Teilhède.


1990

331
– Começo da publicação de Somme Hermétique (1990-1991) de Solazaref, nas

ed. “Aux Amoureux de Science”: Tome III, De l’esprit universel Vol.I: Vitriolum,

Vol.II: Alkaest.
- Publicação de Toison d’or et alchimie de Antoine Faivre, nas edições Arché,

Milão.

- Publicação de Alchimie et imagination active de Marie-Luoize von Franz, no

ed. Jacqueline Renard.

- Publicação de La Voie du phénix: traité pratique de théurgie et d’alchimie

interne, Télétès, Paris.

- Publicação de Alchimie, Science et Mystique, de Patrick Rivière, com prefácio

de Serge Hutin, nas Ed. de Vecchi, Paris; reimpressão em 1992.

- Publicação de Lettres à un disciple, de René Schwaller de Lubicz, Diffusion

Scientifique, Paris.

1991
– Publicação de Somme Hermétique Tome IV, De natura metallorum, Vol. 1:

Petites opérations minérales et voies alchimiques (première partie), de Solazaref, nas

ed. “Aux Amoureux de Science”, Theilède. Publicação, ainda, do mesmo autor e da

mesma obra, do vol 1: Le feux du ciel de Somme Hermétique Tome VI: Ars brevis, na

mesma editora.
- Publicação de L’Immortalité alchimique, de Serge Hutin, nas éd.

Montorgueil, Paris.

- Publicação de La chevalerie amoureuse, troubadours, félibres et rose-croix

(un manuscrit inédit de Pierre Dujols), nas Éditions La Table d’Émeraude, Paris, com

apresentação e comentários de J.-F. Gibert.

- Publicação de Cosmologie et alchimie babyloniennes (1937, Bucareste), de

Mircea Eliade, nas ed. Gallimard.

1992
- Publicação da Deuxième partie de Petites opérations minérales & Voies

alchimiques (Somme Hermétique Tome IV – De Natura Metallorum), de Solazaref.

332
Publicação ainda, de Somme Hermétique Tome V – De Natura Vegetalorum, Volume

1 – Petites opérations végétales , première partie et deuxième partie, de Solazaref, na

mesma editora.
– Publicação de Le procédé de Monsieur d’Anvers (1722), por Fabrice

Bardeau, nas edições J.M. Savary, Carcassone.


- Publicação de La Chevalerie errante de André Coia-Gatie, nas edições La

Table d’Émeraude.

- Realização, em Fevereiro, de um Colóquio sobre Alquimia denominado 2.e

Forum de la Tradition Occidentale - Alchimie, organizado por Jacques d’Arés e pela

revista Atlantis, no edifício da Mairie de Vincennes, em Fevereiro de 1992. Decorreu

ao mesmo tempo, uma exposição de Alquimia operativa, organizada pelos

Compagnons du Feu (Jean Laplace, Bernard Renaud de la Faverie, etc.), onde se

podia ver diverso material de alquímico, entre o qual um Athanor.


- Publicação de Fulcanelli dévoilé de Geneviève Dubois, nas ed. Dervy, Paris.

- Publicação de L’entrée du labirynthe de Gilles Pasquier - ou Introduction à

l’Alchimie, suivie des Récréations hermétiques et des Scholies, deux manuscrits

d’alchimie du XIXe siècle -, editado nas edições Dervy.


- Publicação de Poelle Alchimique de Winthertur et le feu des sages. Étude

analogique du symbolisme hermétique par la pratique philosophique selon

l’enseignement de Fulcanelli et d’Eugène Canseliet, de Jean Laplace, no ed. J. M.

Savary, Carcassonne.
- Publicação de Quatre traités de Paracelse, nas Ed. Dervy.

- Publicação de Rationalité de l’Alchimie au XVIIe¸de Bernard Joly, seguida do

Manuscriptum ad Fredericum, de Pierre-Jean Fabre, na ed. Vrin.

1993
–Publicação de Philosophie de l’alchimie: Grand Oeuvre et modernité de

Françoise Bonardel, nas Presses Universitaires de France, Paris.

- Publicação de Milosz: l’étoile au front de Alexandra Charbonnier, nas ed.


Dervy.

333
- Publicação de Alchimie et Philosophie (actas do colóquio internacional de

Tours, 4-6 de Dezembro de 1991), por J.-C. Margolin e S. Matton, nas ed. Vrin.

- Publicação de La Table d’Émeraude d’Hermés Trismégiste suivi du


commentaire de l’Hortulain, na revista Le Fil d’Ariane, nº. 50, com introdução de

Emmanuel d’Hooghvorst.

- Publicação de La Tourbe des Philosophes, na colecção “Classiques de

l’Alchimie” das edições Dervy, Paris.


- Publicação de L’Étoile d’Hermés, fragments de philosophie hermétique, de

Mirko Sladek, na col “Biblithèque de l’Hermétisme”, nas ed. Albin Michel.

- Conferência de Solazaref, intitulada Sacred Metallurgy: Materials for the

Third Millenium, realizada no “Auditñrio Dag Hammarskjold, nas Nações Unidas,

Nova Iorque, em 13 de Maio de 1993. O título completo era (em françês): Metallurgie

sacrée: Apport de la vision Alchimique Centre-Européenne (Celte) en vue d’une


possible élaboration des matériaux du Troisième Millénaire. Esta conferência foi

publicada, em Junho do mesmo ano, nas Éditions Aux Amoureux de Science, Teilhède.

- Conferência de Jean Dubuis e estágio espagírico e alquímico, em Sintra

(Portugal), da Associação Les Philosophes de la Nature, em Agosto de 1993. Outro

estágio foi realizado, em Agosto de 1994, no mesmo lugar, pela mesma Associação.

1994
- Publicação dos nº. 1 e nº. 2 (respectivamente, 1º. e 2º. Trimestres de 1984) de

Escapade Alchimique – bulletin de liaison de la Filiation Solazaref.


-Publicação do “best-seller” brasileiro L’Alchimiste de Paulo Coelho, nas ed.

Anne Carrière.

- Publicação de L’Aura bleu du du Mercure alchimique de Petri Murien (que já

publicara, algo de semelhante, em 1986 e 1989), e Eric Saint-Clair, nas ed. Ramuel.

- Publicação do nº. 138 (Julho 1994) da revista L’Autre Monde, dossier Les

Transmutations ou comment changer la nature des choses, com artigos de diversos

autores, entre os quais Pierre Carnac, Robert Amadou e Richard Khaitzine.

334
- Exposição de Alquimia, em Florença, organizada pela Filiation Solazaref. A

Filiation Solazaref, realizou uma exposição de material alquímico e uma conferência

pelo próprio Solazaref, ambas em Mafra, Portugal.


- Anúncio, no Equinócio de Outono de 1994, do fim das actividades exteriores

da “Filiation Solazaref” e do próprio Solazaref. Nesse texto é feito um balanço das

actividades: “publicação de uma parte da Somme Hermétique”, “viagens, exposições

em toda a Europa e principalmente em Paris, Bruxelas, Ravena, Carcassonne,

Mafra, Florença, Tomar,…, assim como em Praga e na Transilvânia”, “restauração

parcial do Castelo de Serviat, demeure des philosophes de notre congrègation”, etc. .

1995
- Carta da Filiation Solazaref, denunciando uma dissidência, no seu seio, e

retirando a confiança nas Éditions “Aux Amoureux de Science” e, também a umas

recém criadas Éditions Janvier.


– Publicação de Philosopher par le feu. Anthologie de textes alchimiques

occidentaux de Françoise Bonardel, nas ed. Seuil, Paris.

- Publicação de La Pierre philosophale. Étude rationelle de l’alchimie de Albert


Cau, nas ed. Col du Feu, Paris.

- Publicação de Propos sur la Chrysopée, suivi du manuscrit de Pierre Dujols-

Fulcanelli traitant de la pratique de l’alchimie, de Jean-François Gibert, nas edições

Dervy.

- Publicação de La Chrysospagyrie, de François Rosselet, nas ed. Ramuel, com

prefácio de Max Leglise.

- Publicação de Bible, Science et Alchimie, de Roger Caro, com prefácio do

seu filho Daniel Caro, nas Éditions du Sphinx, Ganges.

- Publicação do nº. 35 da revista 3e. Millénaire, Paris, dedicado à Alquimia:

Alchimie: Grandir en l’Être; la Pierre philosophale; La transmutation en l’Homme;

l’art maieutique de Jésus et de Paul. Para além de um artigo de Albert Cau sobre a

335
Pedra Filosofal e a energia atómica (bem característico deste autor), e de um

interessantíssimo artigo de François Trojani, L’Alchimie une relecture du Monde,

saliência para um artigo de Jacques Trieli, La voie du cinabre: un grand Particulier

ou Voie de la Pierre Philosophale?, com preciosas indicações sobre as vias da

alquimia operativo-laboratorial.

- Publicação do nº. 19 da revista A.R.I.E.S., dirigida por Antoine Faivre,

intitulado “Paracelse et les siens”, contendo as actas do colñquio realizado em

Dezembro de 1994, na Sorbonne

1996
- Publicação de Hermés Trahi, de Patrick Géay, nas ed. Dervy

- Publicação de Fulcanelli, une identité révélée, de Frédéric Courjeaud, nas

edições Claire Vigne, Paris.

- Publicação de Mystères et secrets des forgerons de Régis Blanchet, na col. “Le

Jardin des Dragons”, nº. 17, das Éditions du Prieuré, Rouvray.

- Publicação de Alchimie, le grand secret ( trad. franc. da ed. italiana), de

Andrea Aromatico, na Gallimard.

- Publicação do nº. especial (598, de Dezembro de 1996) da revista Sciences et

Avenir, intitulado De l’Alchimie à la Chimie.

- Publicação de Qu’est-ce que l’alchimie? de Pierre Lazlo, nas éd. Hachette.

1997
– Publicação de Fulcanelli et le Cabaret du Chat Noir, de Richard Khaitzine, de

L’Hermétisme alchimique chez André Breton, de Richard Danier (com prefácio de

Patrick Rivière, nas edições Ramuel, Villeselve

- Publicação de La Pratique du Grand Oeuvre des philosophes por Rouillac


Piémontais, na colecção “Classiques de l’Alchimie”, dirigida por Geneviève Dubois,

nas Éditions Dervy, Paris. Nesta edição foram publicados, também, entre outras obras,

336
Le Psautier d’Hermophile seguido do Dictionnaire élémentaire à l’usage des jeunes
disciples d’Hermés, no mesmo ano.

- Publicação de Clefs secrètes des faiseurs d’or ou 100.000 ans d’alchimie, de

Lucien Martinet, nas Éditions Ramuel

- Publicação de La Sainte Science – L’oeuvre alchimique par la voie de la

sagesse, nº. 385 (Primavera de 1996), da revista “Atlantis”, Vinvennes, com artigos de

Fabrice Bardeau, Richard Khaitzine, etc.. O nº. 391 da mesma revista – Le vin – banale

et noble abstraction, apresenta em “exclusivo” Newton – un manuscrit alchimique

retrouvé à New York, de Vlaicu Ionescu e Fabrice Bardeau.

1998
– Publicação de Le Livre d’Or de l’Alchimie de Jean-Pascal Percherron, nas

Éditions Ramuel.
- - Começo da página na “internet” Contrepoints, com interessantes elementos

sobre Alquimia (livros, revistas, artigos, cursos, etc.). A iniciativa é de Archimed

Diffusion e Johan Dreue.

1999

- Publicação de Traduction alchimique du “Siphra di tzeniutha” de Moise, de


Roger Caro, nas Éditions du Sphinx.

- Publicação de L’Alchimie, antique science de demain, de Loic Tréhédel, nas

Éditions du Rocher, com prefácio de Rémi Chauvin.

- Publicação de Alchimie Kabbalistique, Spagyrie Végétale & Radiesthésie

Vibratoire, de Jean-Luc Roime, nas Éditions Col du Feu, Orcier.

- Publicação de Ces Hommes qui ont fait l’alchimie au Xxe. Siècle, de

Geneviève Dubois, por Geneviève Dubois éditions, Grenoble.

- Publicação do 1º. Número (Outubro) da revista trimestral, L’Alchimie, nas

Arcadis Éditions, Amiebns, dirigida por Pierre-Alexandre Nicolas e Karine Nicolas-

Alcalay, fundamentalmente dedicada à alquimia operativo-laboratorial. Os números


2 (Janeiro a Março) e 3 (Abril a Junho), sairam, com pontualidade, no ano 2000. De

337
destacar, nestes números, dossiers sobre alquimistas praticantes como Jean d’Ambre,
J.-P. Percheron e o português Rubellus Petrinus. De notar ainda a colaboração de

Patrick Rivière, Fabrice Bardeau e, também de Jean Deleuvre


- Realização do Coloquio sobre Eugène Canseliet, a 4 e 5 de Dezembro, na

sala da antiga Sociedade de Geografia (criada por Ferdinand de Lesseps…) e no

anfiteatro Louis Liard, na Sorbonne, respectivamente. Foram oradores, entre outros, a

filha de E. Canseliet, Béatrix, Henri Bodard, Bernard Renaud de la Faverie, Stanislas

Klossowski de Rola, François Trojani, Patrick Rivière, Fabrice Bardeau, Paolo

Lucarelli e Richard Khaitzine.

- Publicação de Alchimie – cantenaire de la naissance d’Eugène Canseliet, nº.

398 (3º. Trimestre de 1999) da revista Atlantis, con sede em Vincennes.

- Publicação de Finis Gloriae Mundi, atribuido a Fulcanelli, com prefácio de

Jacques d’Arés, e editado em Londres, por Liber Mirabilis.

2000
– Edição do CD-ROM, Fulcanelli – La Chronique d’un mystère annoncé, de

Richard Khaitzine, com a colacoração de Johan Dreue, na Archimed Diffusion,

Parmain.
- Publicação de Alchimie. La voie de amalgames ou voie de synthèse, de Jean-

Pascal Percheron, nas ed. L’Ignitiation, Morée.


- Publicação de Alchimie Science divine- L’Alchimie révélée par l’image.

L’Alchimie enfin réhabilitée, de Jean Deleuvre, nas Éditions Ramuel, Villeselve.


- Publicação de Les Nobles écrits de Pierre Dujols et de son frère Antoine de

Valois, na editora Mercure Dauphinois, de Grenoble.

- Publicação de La Génération & opération du grand oeuvre pour faire de l’or

(sec. XVII), na mesma ed. de Grenoble.

- Publicação de Discours de l’art alchymique de Jean D’Ambre (?)

338
- Publicação de Le Grand Oeuvre alchimique de Eyrenée Filalète et Basile

Valentin, de Rubellus Petrinus (trad. fr. da ed. portuguesa de 1997, Hugin ed.),

Arcadis éd. , Amiens.

- Publicação do CD-ROM, Boréal- Points Zero, ou les alchimistes de la

République, de Richard Khaitzine e Patrick Rivière, com a colaboração de Johan

Dreue, na Archimed Diffusion, Parmain.

339
ANEXO B

Fichas de trabalho para o estudo dos grupos

Elaborámos, para nossa orientação na exploração da informação sobre estes

grupos, uma “ficha-tipo”, inspirada em parte na que Michel Raoult utilizou no seu

trabalho de Tese414. A ficha apresenta os seguintes items:

1) – Nome do grupo

2) – Data e local da sua criação; foi registada legalmente?

3) – Fundador(es)

4) – Lider(es) do grupos (e períodos respectivos); suas biografias e

características

5) – Locais da sede e das eventuais delegações (em França e no estrangeiro)

6) – Símbolos: principal e secundários

7) – Condições de admissão na associação: idade mínima, exame de admissão,

jóia e cotização

8) – Linhagem iniciática: esotérica e alquímica

9) – Textos de referência

10) – Publicações: boletim, livros, cassettes, videos, etc.

11) – Tipo de ensino: por correspondência, oral individual ou em

grupo(reuniões, conferências)

12) – Tipo de organização: deveres e direitos dos membros, juramento;

hierarquia; acessibilidade do lider, etc.

414Michel Raoult, Les Druides, Les sociétés initiatiques celtiques contemporaines, Paris, Éd. Rocher,
1992, p. 398-399; esta edição é a versão mais reduzida da sua Tese de Doutoramento de 3º. Ciclo
apresentada em 1980, na Universidade de Rennes II.

340
13) – Estrutura iniciática: tem graus, ou níveis, existe núcleo interior?; método

de avaliação de conhecimentos e aptidões.

14) – Reuniões, cerimónias e iniciações: sua frequência, públicas ou privadas,

urbanas ou rurais, etc.

15) – Paramentos e jóias característicos.

16) – Tipo de linguagem dominante

17) – Dominante iniciática: artesanal, cavaleiresca/guerreira ou sacerdotal.

18) – Restrições ou incompatibilidades: de sexo, rácicas ou étnicas, de

orientação sexual, políticas ou filosóficas, religiosas, sociais, etc.

19) – Número de elementos activos: sua distribuição por regiões, países,

nacionalidades, idades, sexo, formação académica, profissão, etc.

20) – Têm ligações com outros grupos alquímicos, esotéricos, religiosos,

políticos, etc.

21) – Outras características:

1) NMR “gnósticos” e novos movimentos iniciáticos

2) “O “New Age” e a “Nova Ciência”; O CAOS E A IMAGINAÇÃO

3) As seitas

4) Tipologia dos novos movimentos esotéricos

341
ANEXO C415

Pequeno glossário alquímico

Água – Elemento alquímico frio e húmido; estado visível, líquido.

Ar – Elemento alquímico quente e húmido; estado invisível (oculto), gasoso.

Coagula – Coagulação, fase da Obra alquímica em que a matéria se recompõe e

restrutura.

Conjunctio – Conjunção das naturezas opostas e dos princípios alquímicos.

Elementos alquímicos – São os que foram propostos pela teoria grega “dos quatro

elementos” (e que Aristóteles adoptou): Água, Terra, Ar e Fogo. Não designam estas

matérias, mas sim estados, aparências e modalidades da matéria.

Enxofre – Princípio alquímico fixo, activo, masculino, “quente”, oposto ao Mercúrio.

Fogo – Elemento alquímico quente e seco; estado invisível (oculto), subtil.

Grande Obra alquímica (Magnum Opus) – Conjunto de operações que conduzirão,

segundo os alquimistas, à “espiritualização da matéria e a corporificação do espírito”.

Matéria prima – A “raíz dos metais” que é comum a todos eles.

Matéria primeira – Simboliza a unidade da matéria - en to pan (Um o Todo, ou o

Todo em Um) - e é representada pelo dragão ou pela serpente que morde a cauda

(uroboros).

Mercúrio – Princípio alquímico volátil, passivo, feminino, “frio”, oposto ao Enxofre.

Obra ao negro (Nigredo) – Primeira fase da Obra alquímica simbolicamente

equivalente à morte da Matéria.

415 Cf. Serge Hutin, Alchimie, Paris, P.U.F., 9ª ed. corrig,. 1995.

342
Obra ao branco (Albedo) – Segunda fase da Obra alquímica simbolicamente

equivalente à purificação da Matéria.

Obra ao rubro (Rubedo) – Terceira e última fase da Obra alquímica simbolicamente

equivalente à exaltação da Matéria.

Pedra dos Filósofos – A união dos princípios alquímicos, sem no entanto ter

conseguido a sua síntese perfeita.

Pedra Filosofal - União perfeita dos princípios alquímicos, obtida no final da Obra.

Princípios alquímicos – São o Enxofre, o Mercúrio e o Sal. Não designam os corpos

químicos com o mesmo nome, mas sim qualidades da matéria (ver cada um deles).

Quintaessência – O “quinto elemento” que está no centro da “cruz dos quatro

elementos” e realiza a sua mediação. Por vezes denominado Éter.

Rebis – “Coisa dupla”, hermafrodita (al)químico, masculino e feminino, fixo e volátil,

Enxofre e Mercúrio.

Sal – Princípio alquímico neutro, mediador entrre o Enxofre e o Mercúrio. Por vezes

denominado Arsénico.

Separatio - Separação dos princípios alquímicos.

Solve – Dissolução, fase da Obra alquímica em que a matéria se destrutura, se

decompõe nos seus elementos e princípios.

Terra – Elemento alquímico frio e seco; estado visível, sólido.

343
ANEXO D

DOCUMENTAÇÃO DIVERSA

SOBRE OS GRUPOS ALQUÍMICOS ESTUDADOS

344
SPAGY-NATURE

 Cartas de Patrick Rivière ao autor deste Trabalho. 1988-1990.

 Fascículo de instrução “Slove et Coagula”

345
FRÈRES AÎNÉES DE LA ROSE-CROIX (F.A.R.C.)

 Carta de Roger Caro ao autor deste Trabalho. 1989.

346
FILIATION SOLAZAREF

 Circulares diversas

 Boletim interno

 Imagens da “Filiação” em França, finais dos anos 80.

Nas fotos: Elementos da “Filiação” realizando operações alquímicas com forno

de via seca.

 “Peregrinação” a Portugal. Mafra, 1994.

Nas fotos: Solazaref e os membros da “étnia portuguesa”.

347
LES PHILOSOPHES DE LA NATURE

 Carta de Jean Dubuis ao autor deste Trabalho.

 Boletim interno dos LPN.

 Fascículo de instruções do LPN.

 Imagens do estágio dos LPN, em França. Toulouse, 1992.

Nas fotos: Membros da LPN realizando operações alquímicas e espagiricas.

 Imagens do estágio dos LPN, em Portugal. Várzea de Sintra, 1993.

Nas fotos: Jean Dubuis, membros franceses dos LPN e participantes portugueses

(incluindo o autor deste Trabalho)

348

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