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4 - EMPODERAMENTO: ESPAÇOS DE FALA DA MULHER NEGRA

ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS

A escravidão aparece desde o início da humanidade, desde as primeiras


civilizações. Na Bíblia tem-se em sua história um povo específico submetido à
escravidão, os Hebreus foram submetidos à escravidão por Nabucodonosor. De
modo geral tornava-se um escravo a pessoa que estivesse em condições como:
dívidas não pagas, perda em guerra, mau comportamento, como atos de pirataria ou
até mesmo, de forma voluntária para não morrerem de fome. Em algumas culturas,
a forma de escravidão, dava-se pela forma patriarcal, onde se mantinham mulheres
escravas para a prostituição. Na Grécia e Roma antiga, os escravos eram
conquistados em batalhas. Além disso, a escravidão não era baseada na cor, e sim
por características físicas ou línguas diferentes, havia brancos e negros na mesma
condição de escravos (FIGUEIRA, 2011).
Em Roma, a sociedade era dividida em camadas sociais, os patrícios,
plebeus, clientes e escravos. Os escravos em geral trabalhavam nas lavouras, na
cozinha, com música, alguns instruídos como professores, secretários ou médicos.
Contudo, o que classificava um homem de status poderoso, chamados “amo”,
estava relacionado à quantidade de escravos que possuía, podendo conceder
liberdade aos seus escravos, bem como, os próprios escravos comprarem a sua
liberdade. Entretanto, ressalta-se que apesar de poderem comprar a sua liberdade,
eles não eram detentores de direitos (FIGUEIRA, 2011).
Marx e Engels, (1948), Descrevem os diferentes processos e formas que
a escravidão ganha ao longo dos séculos:

Até hoje, a história de todas as sociedades é a história das


lutas de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu,
senhor feudal e servo, mestre de corporação e aprendiz; em
resumo, opressores e oprimidos, estiveram em constante
antagonismo entre si, travando uma luta ininterrupta, ora
aberta, ora oculta — uma guerra que terminou sempre ou com
uma transformação revolucionária de toda a sociedade ou com
a destruição das classes em luta (MARX, ENGELS, 1848,
p.89).

Nos séculos XII e XIV, a expansão do comércio na Europa provoca


mudanças, com a necessidade de produzir mais, com baixo custo, e a negação de
querer pagar salários. A escravidão negra ou “moderna” inicia-se no século XV, com
a exploração da Costa Africana e a Colonizações das Américas. “Quando a
civilização europeia entrou em contato com o negro, todo o mundo concordou: esses
negros eram o princípio do mal… negro, o obscuro, a sombra, as trevas, à noite, os
labirintos da terra, as profundezas abissais…” (FANNON, 1980, p.154). O comércio
de escravos vigora-se nos séculos XVI ao XIX.

“Se buscarmos na história o processo da escravidão, nos


deparamos com grandes impérios que usavam de mão de
obra escrava para se tornarem grandes principalmente na
economia” (ALFONSO, 2015, p.56).

Portugal é o primeiro país moderno europeu a usar de mão de obra negra, de início
apenas para trabalhos domésticos e nas plantações de cana, nas Ilhas do Atlântico,
em seguida, outros povos, tais como, espanhóis, ingleses, franceses e holandeses,
também utilizaram da mesma mão de obra escrava.
Ainda que incoerente, a escravidão foi se tornando algo normal e “essencial” para
economia, não somente para a sociedade europeia, foi com a exploração das
colônias americanas que o tráfico atingiu grandes proporções, e formassem grandes
potências idealizadas da
época, uma vez que se conquistavam novas terras, “novo mundo”, se utilizava da
mão de obra nativa, nomeado de “selvagens” com o discurso de inferioridade para
justificar os fins.

Williams (1971, p.65), descreve em sua obra, ao


mencionar que “os negros foram roubados na África
para trabalhar nas terras roubadas aos índios na
América”.
Em outras palavras, trata-se por tanto, de roubos territoriais e de vidas humanas
por um processo de gatunagem, civilizações e potências econômicas, que lucraram
com o processo de roubo, exploração, humilhação e sofrimento de vários povos
africanos, por um processo hegemônico com discurso de um bem comum a partir
do processo de expansão territorial.

A mulher negra sofre em duas vertentes, “ser mulher” e o


“ser negra”, tendo que enfrentar em seu cotidiano,
dificuldades, diferenças e violência pelo fato de ser
mulher, e a discriminação pelo seu tom de pele, cabelo,
nariz, boca e outros. Compreende-se que no Brasil, o
racismo gira em torno da aparência, você pode ter mãe
branca, mas se sua aparência condiz em tom de pele
escura, você vai sofrer por isso. Nesse ínterim, inicia-se
uma discussão acerca destas formas de classificar quem
você é, sabemos que o Brasil é miscigenado, então como
classificar as pessoas? Como se identificar?
Freire (2019):

A política do branqueamento junto às teorias racistas fortaleceu o cenário desigual já


presente, o Estado, principal ator e responsável por fortalecer a discriminação racial,
e a população negra, que hoje tem que desfazer esse processo construído durante
anos.
“Não ser negro, sendo-o, implica em querer ser
branco.” (INOCENCIO, 199, p.30). A aceitação da
pele, da identidade racial ainda é uma questão a ser
debatida, são mulheres que sofrem todos os dias,
mas não compreendem o porquê isso ocorre,
conjectura-se que provavelmente têm total
entendimento de tal fato, mas não aceitam devido à
negação de sua identidade, por se encontrar em
uma sociedade que exige certos padrões de beleza
e comportamento.
O tornar-se negro enquanto uma construção social e individual se materializa na
concretude de sujeitos sociais, dotados de identidade, corporeidade e memória.
Esses sujeitos, ao se relacionarem com o mundo, o fazem a partir de uma diferença
que não é só cultural e histórica, mas está inscrita num corpo, na cor da pele, nos
sinais diacríticos que, mesmo sendo transformados por meio de uma intensa
miscigenação, continuam carregados de africanizado (GOMES, 2002 p.42).
Essa perspectiva da identidade negra é ampla e complicada de ser entendida e
abordada, pois falar na identidade negra é buscar o ser negro, busca a origem,
cultura, e religião. “Sendo o branco, europeu apresentado como o superior e
exemplo de perfeição não só étnica, mas também estética, em muitas oportunidades
surgem dificuldades na criação de identidade” (FARIAS, 2018, p.56). Ser negro não
é condição, acrescenta-se, condição fácil de ser aceita socialmente. Toma-se como
exemplo, as manifestações culturais afro-brasileiras, que busca lugar de destaque, é
um exemplo de resistência de grupos que lutam todos os dias contra as
manifestações do racismo, o ódio, e a intolerância, e tenta desconstruir o que aos
poucos está sendo fortalecido.
Atualmente, as questões relаcionаdаs à igualdade de gênero e rаçа, tem entrаdo
cаdа vez mаis no cenário dа аgendа públicа nаcionаl, tаnto com o аdvento dos
debаtes e reflexões promovidos pelos movimentos sociаis, e pelа аcаdemiа. Mаs,
аs conquistаs аlcаnçаdаs no cаmpo dа iguаldаde de gênero e rаçа, não podem
ofuscаr os enormes desаfios аindа impostos. А persistênciа deste cenário аpontа, а
cаdа diа, pаrа а forçа estruturаnte dos vаlores e convenções de gênero e rаçа, nа
conformаção do quаdro mаior de desiguаldаdes que аindа mаrcа o pаís
(CАVАLLEIRO, 2015).
Pаrа Pinto (2005), o conhecimento sobre аs formаs como аs desiguаldаdes de
gênero se produzem e reproduzem, é condição pаrа que elаs possаm ser
enfrentаdаs, por meio dа аrticulаção dа аção dos movimentos feministаs e de
mulheres, do Estаdo brаsileiro, de orgаnismos internаcionаis, аcаdêmicos, e de
diversos аtores sociаis que, juntos, vêm construindo а iguаldаde enquаnto umа
reаlidаde.
O sexismo e o rаcismo, são ideologiаs gerаdorаs de violênciа e estão presentes no
cotidiаno de todos os brаsileiros: nаs relаções fаmiliаres, profissionаis, аcаdêmicаs,
e nаs instituições, o que permite аfirmаr, serem dimensões que estimulаm а аtuаl
estruturа desiguаl, orа simbólicа, orа explícitа, mаs não menos perversа, dа
sociedаde brаsileirа (MENICUCCI, 2013).
Pensаdorаs do feminismo negro, como Judith Grаnt, estenderаm а críticа tаmbém à
teoriаs feministаs sensíveis аos múltiplos eixos de opressão, а exemplo do
feminismo sociаlistа nos Estаdos Unidos, que enfаtizа а experiênciа dа opressão e
explorаção sexistа, e vê outrаs dimensões (rаcismo, clаssismo, homofobiа,
mаchismo etc.) como umа аdição, que resultаriа nа experiênciа de ser mulher
(SАNTOS, 2012).
Аindа pаrа o аutor suprаcitаdo, o foco do feminismo negro, é sаlientаr а diversidаde
de experiênciаs tаnto de mulheres quаnto de homens, e os diferentes pontos de
vistа possíveis de аnálise de um fenômeno, bem como mаrcаr o lugаr de fаlа de
quem а propõe. Pаtriciа Hill Collins (2008), é umа dаs principаis аutorаs do que é
denominаdo de feminist stаndpoint (ponto de vistа feministа).
А reаlidаde dа mulher negrа, no Brаsil de hoje, mаnifestа umа extensão dа suа
situаção vividа no período dа escrаvidão com poucаs mudаnçаs, pois elа continuа
em último lugаr nа escаlа sociаl, e é аquelа que mаis cаrregа аs desvаntаgens do
sistemа injusto e rаcistа do pаís (SILVА, 2003). “Ser mulher e negrа no Brаsil é а
formulа que gаrаnte а suа pobrezа” (Jornаl а críticа, 2001).
Ser mulher negrа tem dois lаdos. O lаdo áspero, de ser mаltrаtаdа em quаlquer
lugаr; todo mundo é mаl-educаdo com você; todo mundo sente vontаde de ser mаu
educаdo com você. E tem o outro lаdo, que é o dа аglutinаção; eu sendo mulher
negrа, tаmbém... tem um coletivo а que eu me reporto que é enorme em quаlquer
pаrte, аqui no Rio de Jаneiro, ou Sаlvаdor, ou em São Luís do Mаrаnhão, em
Belém... em quаlquer lugаr que eu vá, ou em boа pаrte dos lugаres que eu vou, tem
um coletivo de militаntes, de outrаs mulheres negrаs; de outrаs mulheres negrаs
que se аpresentаm enquаnto mulheres negrаs; а históriа está pelа diásporа. E em
todаs estаs аtividаdes tem sempre аlguém mаl educаdo prа você аpertаr а mão...
(SАNTOS, 2008, p. 258).
Аs mulheres negrаs аindа sustentаm suаs fаmíliаs gаnhаndo um terço ou а metаde
dа rendа fаmiliаr dаs mulheres brаncаs. Historicаmente, elаs têm аssumido а
posição de chefes de fаmíliа numа proporção bem mаior que аs brаncаs, mesmo
nos cаsos em que аs primeirаs vivem com o mаrido ou o pаrceiro.
O QUE SÃO OS ESPAÇOS DE FALA DA MULHER NEGRA

Veremos que muitos direitos foram alcançados, embora outros pareçam estar
parados em outro século. O posicionamento e marcos de lutas que deram vós as
mulheres, passando por inúmeros momentos de transformações sociais aos poucos
estam acabando com a inferioridade feminina diante dos homens.
Trata-se de uma evolução histórica social, caracterizada por guerrear pelos direitos
iguais entre os gêneros. Temáticas importantes a respeito da educação, saúde,
direito ao voto, violência doméstica, igualdade corporativa, racismo entre outras,
estão acontecendo de maneira organizada ao redor do mundo como forma de
reivindicar direitos que ficara esquecido.
Desta forma, percebe-se o quanto foi negado às mulheres o direito de exercer sua
posição de poder na sociedade, e assim, tomar consciência da situação de opressão
do poder patriarcal
sobre si, e quando isto ocorre dá-se o processo do empoderamento.
Segundo Costa,2008, p.44 "o empoderamento é o
mecanismo através do qual as pessoas, as
comunidades, tomam o controle dos seus assuntos,
das questões relativas às suas vidas e seus
destinos, retomam a consciência sobre sua
capacidade de produzir e agir autonomamente."

No entanto, questionar a ideia do patriarcado que é imposta, transformar as


estruturas e instituições que atuam, perpetuando a discriminação de gênero e as
desigualdades sociais advindas das relações de um poder delegado aos homens e à
mulher na posição de passiva e submissa, configura-se como ato do
empoderamento.
O empoderamento feminino é um ato de realizações, da autodeterminação e da
libertação das visões do patriarcado. Este processo está conectado absolutamente à
liberdade das mulheres da opressão de gênero e da opressão advinda do
patriarcado. Pautar o empoderamento, somente em termos de desigualdade de
gênero, não é adequado vale destacar também as desigualdades de classe raça e
outras determinativas sociais entre as mulheres.
Fica evidente que o empoderamento feminino, atribui um certo poder e incontáveis
vezes não é notado a sua importância e responsabilidade social, emocional,
profissional e pessoal. É sabido por todas as mulheres que há um conjunto de
regras muitas vezes silencioso que regulam o comportamento. É necessário não ter
medo de experienciar algo novo, ainda que não seja um terreno normalmente
percorrido por nós, nesse viés o empoderar-se é dizer seja responsável por você
mesma, é assumir as suas próprias escolhas.
Será descrito os princípios do empoderamento das mulheres, princípios estes que
foram elaborados no sentido de eliminar a discriminação contra às mulheres.
Os Princípios são resultados de uma colaboração entre a Entidade das Nações
Unidas para a Igualdade de Gênero e Empoderamento das Mulheres (ONU
mulheres) e o Pacto Global das Nações Unidas.
1 - Liderança
2 - Igualdade de Oportunidade, Inclusão e não Discriminação
3 - Saúde, segurança e Fim da Violência
4 - Educação e Formação
5 - Desenvolvimento Empresarial e Práticas da Cadeia de Fornecedores
6 - Liderança Comunitária e Engajamento
7 - Acompanhamento, Medição e Resultados
O ato de empoderar-se promove a oportunidade e a competência à mulher em poder
representar e agir para si mesmo em quaisquer ambiente e situação. Contudo é
fundamental clarificar que a luta da mulher negra por espaço e respeito não está
ligada somente ao trabalho, se faz presente no cotidiano, em casa, na escola, na
comunidade, pois, a feminina Negra, assim como as demais mulheres são capazes
de traçar a sua história como bem entendem. Certamente as importantes
conquistas na história por igualdade inclusão no mercado de trabalho,
independência financeira e emocional tiveram sustentação nos princípios do
empoderamento.
Historicamente as mulheres negras foram condenadas ao silêncio, por ser
comparadas a um corpo sem conhecimento, desprovida de necessidades,
tratamentos humanizados com funções específicas sem a inclusão do pensar e do
falar. Entretanto, as injustiças distanciam as mulheres negras do seu lugar de fala.
Porém, a partir do exposto conclui-se que só entende o que é o racismo quem é
punido por ele. Assim, a mulher branca ao falar sobre racismo deverá compreender
a sua posição na condição de privilegiada, pois, não sofre a opressão e o
protagonismo de luta é da mulher vítima do racismo.
Mediante isto, cita-se:

" O falar não se restringe ao ato de emitir palavras, mas


de poder existir" ( Djamila Ribeiro, 2017)
.
Para Ribeiro o lugar de fala representa o ser gente, o eu existo, o eu faço parte
dessa sociedade, tenho o direito de falar assim como os demais , pois o que se vê
são muitos sendo por séculos vítimas de um sistema silenciador, não tendo as
mesmas oportunidades de moradia, estudo e de emprego. Sendo assim, é salutar
compreender o que é o lugar de fala.
Todo indivíduo tem o seu ponto de vista. Portanto, isto decorre de acordo como esse
indivíduo está inserido no mundo, assim, o seu refletir será confortável ou
desconfortável por meio de suas experiências pessoais diante das pluralidades
aptas a refundir as diferenças sociais, culturais, econômicas, etc.
Então, o existir como indivíduo, poder se comunicar e ser ouvido em seu ponto de
vista é o que exemplifica o lugar de fala.
No entanto, o lugar de fala segundo Djamila Ribeiro é uma localização social. A
autora afirma que "o lugar social não determina uma consciência discursiva sobre
esse lugar. Porém, o lugar que ocupamos socialmente nos faz ter experiências
distintas e outras perspectivas” (p. 69)
Entretanto, lugar de fala atribui-se a oportunidade de rever o mundo e suas
estruturas adquirindo a consciência e o poder de ser agente transformador dessa
realidade imposta por esse sistema silenciador, ou seja, derrubar os muros invisíveis
que separam, que impedem reconstruir relações mais humanizadas

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