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FACULDADE DE DIREITO
LISBOA
2023
Lucca Moro Costa
Lisboa
2023
1
ÍNDICE
INTRODUÇÃO……………………………………………………………………3
BIOÉTICA…………………………………………………………………………4
A MORTE CLINICAMENTE ASSISTIDA……………………………………….6
EUTANÁSIA E A BIOÉTICA PRINCIPIALISTA………………………………..11
EUTANÁSIA E DIREITOS FUNDAMENTAIS………………………………….14
CONCLUSÃO……………………………………………………………………..16
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS……………………………………………..17
2
1 INTRODUÇÃO
O presente paper possui como escopo analisar como justificar o direito a uma morte
digna, mais especificamente referindo-se à eutanásia e ao suicídio assistido, como sendo, a
partir de um viés da bioética principialista de Tom Beauchamp e James Childress,
não-violadores de direitos fundamentais.
3
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. BIOÉTICA
A bioética pode ser definida como um campo de estudos que busca guiar a tomada de
decisões na esfera médica e biomédica e em suas intervenções nos sujeitos. O primeiro
pesquisador a utilizar a expressão “bioética” foi o Prof. Van Rensselaer Potter1, que
apresentou uma definição de bioética como sendo a “ética da terra”. Potter defendia a
existência da bioética como sendo uma ética interdisciplinar entre as áreas das ciências e das
humanidades2
1
Potter, V.R. (1970). Bioethics, the Science of Survival. Perspectives in Biology and Medicine 14(1), 127-153.
doi:10.1353/pbm.1970.0015.
2
idem 1
3
Reich WT. Encyclopedia of Bioethics. rev. ed. New York; MacMillan, 1995:XXI.
4
paciente e guiando o agir em questões e desafios morais. Atualmente, grandes grupos
hospitalares possuem um regramento e comitês bioéticos que buscam guiar e auxiliar os
médicos e pacientes na tomada de decisões éticas.
4
BEAUCHAMP, Tom L; CHILDRESS, James F. Princípios de Ética Biomédica. Loyola: 2013.
5
idem a 4
5
A beneficência difere da não-maleficência, na medida que impõe ao profissional o
dever de concretizar ações benéficas ao paciente, ao mesmo tempo em que respeita sua
autonomia. A beneficência impõe um dever positivo por parte dos profissionais de saúde em
promover condutas que efetivem o bem-estar do paciente. Alguns pesquisadores observam
que a beneficência pode gerar conflitos com a autonomia, na medida que a promoção do
bem-estar do paciente pode conflitar com princípios promotores da autonomia.
6
LUCIANO MAIA ALVES FERREIRA. “Eutanásia e suicídio assistido: uma análise normativa comparada” / 1º
ed. 2018. pág.39.
6
“eutanásia” remonta ao grego, na medida em que “eu” significa “bom”, enquanto “Thanatos”
é a personificação da morte na Mitologia grega.
7
Utiliza-se a expressão “eutanásia” entre aspas, na medida em que o significado da palavra origina do grego
para “boa morte”, “morte serena, sem sofrimento”. A utilização da palavra sem o uso das aspas contribuiria para
uma deturpação do real significado da expressão, já que o Estado alemão fez uso da ferramenta para a
perpetuação de um genocídio em pessoas com o intuito de “purificação” da raça ariana.
7
eram forçados a reportar pessoas com deficiências mentais e físicas de natureza grave e
incurável que estivessem sob seus cuidados. Apresentada ao povo alemão como uma política
pública não apenas de purificação racial mas também como sendo de certa forma “piedosa”,
foi abandonada em 1941. Todavia, estima-se que o número de mortos por conta dessa política
de sistematização de uma suposta “eutanásia” seja de aproximadamente 250.000 pessoas, as
quais eram mortas em câmaras de gás instaladas dentro de hospitais e centros de tratamentos
paliativos com gás de monóxido de carbono.
Na Europa, cuja experiência será abordada neste estudo, a Holanda, em 2002, foi o
primeiro país a permitir a morte clinicamente assistida, com a regulamentação da eutanásia e
do suicídio assistido. No mesmo, a Bélgica descriminalizou a prática da eutanásia em certos
casos. Desde então, Luxemburgo, Espanha e Áustria apresentaram legislação semelhante,
enquanto Suíça e Alemanha permitem o suicídio assistido por conta de omissão legal da
tipificação do crime de auxílio ao suicídio.
Passemos, neste momento, a uma análise dos conceitos bioéticos de suicídio assistido,
e eutanásia, os quais compõem, de modo basilar, a ideia de morte clinicamente assistida.
De acordo com o National Health Service 8 (NHS), sistema público de saúde do Reino
Unido, o suicídio assistido pode ser definido como “o ato de deliberadamente auxiliar outra
8
NATIONAL HEALTH SERVICE. Euthanasia and Assisted Suicide. Disponível em:
https://www.nhs.uk/conditions/euthanasia-and-assisted-suicide/
8
pessoa a tirar sua própria vida”. Já José Roberto Goldim9, um dos maiores especialistas
brasileiros em bioética e catedrático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dispõe
que o “o suicídio assistido ocorre quando uma pessoa, que não consegue concretizar sozinha
a sua intenção de morrer, solicita o auxílio de um outro indivíduo. A assistência ao suicídio
de outra pessoa pode ser feita por atos (prescrição de doses altas de medicação e indicação
de uso) ou, de forma mais passiva, através de persuasão e encorajamento. Em ambas as
formas, a pessoa que contribui para a ocorrência da morte da outra, compactua com a
intenção de morrer através da utilização de um agente causal.”.
Cumpre esclarecer que o conceito de suicídio assistido a ser aqui trabalhado envolve o
que é realizado no âmbito da morte clinicamente assistida, acompanhado por profissional da
saúde e realizado apenas mediante consentimento livre e informado de paciente acometido de
doença grave, incurável e que traz profundo sofrimento.
Definição mais adequada talvez possa ser encontrada no âmbito do Código de Ética da
Associação Médica Americana10, que define o suicídio medicamente assistido como: “aquele
que ocorre quando o médico facilita a morte do paciente ao providenciar os meios
necessários e/ou informações que permitam ao paciente realizar o ato de terminação da vida
(p. ex., o médico providencia pílulas soníferas e informações sobre a dose letal, ciente de que
o paciente poderá cometer suicídio).
Por outro lado, a eutanásia retira das mãos do paciente o ato de terminação da própria
vida e coloca a injeção do fármaco letal nas mãos do profissional de saúde. Luciano Maia
Alves Ferreira11, em sua obra “Eutanásia e Suicídio Assistido”, define a eutanásia como
aquele que “provoca também a morte antes da hora, porém de maneira suave e indolor, a
pedido de um paciente terminal e em sofrimento, sem perspectivas de melhora e justamente
por isso torna-se tão atrante para tantas pessoas.”
9
JOSÉ ROBERTO GOLDIM. Bioética: índice geral de textos, resumos, definições, normas e casos. Disponível
em: https://www.ufrgs.br/bioetica/suicass.htm
10
AMERICAN MEDICAL ASSOCIATION, Code of Medical Ethics, from
https://code-medical-ethics.ama-assn.org
11
LUCIANO MAIA ALVES FERREIRA, Eutanásia e suicídio assistido: uma análise normativa comparada/ 1º
ed. 2018.
9
A eutanásia aqui analisada e que é a implementada nos países europeus, consiste na
eutanásia voluntária e com fins humanitários, sendo um protocolo médico de assistência à
morte de paciente em condição de terminalidade, impossibilidade de cura e sofrimento
intenso. Subtrai-se, portanto, do objeto de estudo do presente paper qualquer ideia sobre
eutanásia involuntária, a qual é completamente incompatível com ideais de direitos humanos e
respeito à dignidade humana.
Atualmente, oito países europeus regulamentam o direito à morte digna, seja por meio
da eutanásia ou do suicídio assistido, na Europa Ocidental. Alemanha, Áustria, Bélgica,
Espanha, Holanda, Luxemburgo, Suíça e, mais recentemente, Portugal.
A Holanda foi o primeiro país europeu a regulamentar o direito à morte assistida por
meio da aprovação de medida legal que autorizou a prática do suicídio assistido e da
eutanásia. Em seguida, no mesmo ano, a Bélgica aprovou diploma legal que regulamenta a
eutanásia, se tornando o seguindo país a regulamentar o tema. Em 2009, Luxemburgo
aprovou leis regulamentadoras da eutanásia e do suicídio assistido. Após um longo período
sem avanços sobre o tema na Europa Ocidental, a Espanha legalizou a eutanásia e o suicídio
assistido em 2021, sendo seguido, mais recentemente, por Portugal, que aprovou a
12
AMERICAN MEDICAL ASSOCIATION, Code of Medical Ethics, from
https://code-medical-ethics.ama-assn.org
10
regulamentação da eutanásia apenas nos casos em que o paciente está fisicamente
impossibilitado de realizar o suicídio assistido.
11
saúde. Este argumento possui um fundo também de natureza moral e religiosa, especialmente
sobre as concepções modernas de sacralidade da vida humana. Todavia, utilizar apenas de
argumentos religiosos para embasar uma política estatal numa sociedade secular e
democrática não é cabível.
A partir dos argumentos suscitados pelos opositores, surge a questão objeto de estudo
deste paper: como justificar o direito a uma morte digna - eutanásia e/ou suicídio assistido -
com base na bioética principialista, sem agredir direitos fundamentais?
12
Primeiramente, retomando os conceitos já anteriormente abordados em capítulo
anterior, a bioética principialista é baseada em quatro eixos/princípios: autonomia,
beneficência, não-maleficência e justiça.
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psicológico e psiquiátrico a fim de garantir a autonomia da decisão, garantiria que a
não-maleficência fosse aplicada, garantindo a observância da vontade do doente.
Por fim, quanto ao princípio da justiça, o qual dispõe sobre a equidade e a adequada
distribuição de recursos, a eutanásia é possível de ser visualizada como justificável. É sabido
que manter uma pessoa em uma situação de terminalidade ou que sobrevive apenas com o
auxílio de suporte vital é um processo extremamente custoso do ponto de vista financeiro.
Cuidados paliativos e prolongados e de gerenciadores da dor não são financeiramente
acessíveis a todos, de modo que aqueles que conseguem ter acesso a esses são pessoas de
natureza mais afluente e que conseguem, por muitas vezes, ainda se manter conectados a
aparelhos e evitar o sofrimento prolongado e doloroso que acompanha uma situação como
essa. Enquanto isso, pessoas que não possuem condições financeiras para tanto não
conseguem ter acesso ao cuidado paliativo necessário e/ou aos medicamentos necessários para
pelo menos gerenciar a dor e torná-la um pouco menos insuportável. O que fazer com essas
pessoas que podem ficar anos condenadas a uma vida de sofrimento prolongado, doloroso e
irreversível enquanto aqueles que possuem condições para esses remédios conseguem levar
uma vida um pouco mais tranquila? Obviamente a resposta correta está em garantir que o
Estado forneça os tratamentos paliativos a todos os seus cidadãos, independentemente de sua
condição financeira, mas não seria relevante ao menos oferecer a todos, da mesma forma, a
possibilidade de antecipar o fim da vida de modo digno também?
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autodeterminar. Garantir que as pessoas possam dispor de seu próprio corpo e de sua própria
vida da maneira que melhor que acharem adequadas está de acordo com o referido princípio.
O sofrimento de estar numa situação de terminalidade ou de extrema dor é também uma
situação de violação da dignidade da pessoa humana, de modo que ao menos possuir a opção
de exercer o direito de dispor do próprio corpo e da própria vida de uma maneira digna é
efetivador do direito à autonomia e liberdade. O direito à privacidade também está
intimamente ligado à questão da autonomia, na medida em que exercer seu direito de
disposição do próprio corpo e da própria vida constitui também o direito à privacidade das
suas propriedades corporais, na medida em que apenas o paciente pode escolher o que fazer
com sua própria vida e/ou corpo, independemente das determinações do Estado ou dos
desejos de terceiros.
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3 CONCLUSÃO
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4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
World Medical Association. (n.d.). Medical Ethics Manual [Review of Medical Ethics
Manual]. Retrieved May 25, 2023, from
https://www.wma.net/wp-content/uploads/2016/11/Ethics_manual_3rd_Nov2015_en.pdf
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