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CURRÍCULO

CURRÍCULO escolar em uma perspectiva inclusiva


A inclusão requer mudanças de paradig-
mas educacionais. O cenário exige repen-
sar as estratégias de ensino e entender que
as salas de aula não são homogêneas, é pre-
ESCOLAR EM UMA

PERSPECTIVA
ciso compreender cada aluno na sua indivi-
dualidade e ter a certeza de que todos são
capazes de aprender.
Quando o assunto é o currículo escolar em uma perspecti-

INCLUSIVA
va inclusiva, dois procedimentos precisam estar articulados
para que a aprendizagem de todos os estudantes se efetive
com qualidade: o conhecimento teórico e a atuação prática
das pessoas envolvidas no processo de ensino.
Nesse sentido, esta obra tem o objetivo de contribuir com
a inclusão educacional, possibilitando o conhecimento das

MARISTELA C. METZ SASS


deficiências e dos transtornos de aprendizagem, bem como
sugerindo possíveis adaptações curriculares que facilitem a
MARISTELA C. METZ SASS
dinâmica de ensinar e de aprender na diversidade.

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6666-7

59517 9 788538 766667


Currículo escolar
em uma perspectiva
inclusiva

Maristela C. Metz Sass

IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: sukmaraga/ENVATO ELEMENTS

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
S264c

Sass, Maristela C. Metz


Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva / Maristela C. Metz
Sass. - 1. ed. - Curitiba[PR] : IESDE, 2020.
134 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6666-7

1. Educação - Currículos. 2. Educação inclusiva. 3. Ensino - Meios


auxiliares. I. Título.
CDD: 371.9044
20-65547
CDU: 376

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Maristela C. Metz Sass Especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica
pelo Instituto de Educação da América Latina (ISAL).
Especialista em Metodologia da Educação a Distância
e graduada em Pedagogia pela Faculdade Educacional
da Lapa (FAEL). Professora do ensino superior,
ministra as disciplinas de Prática Pedagógica, Estágio
Supervisionado em Pedagogia e Inclusão Educacional.
Psicopedagoga no ensino superior, com foco em
adequações curriculares para pessoas com deficiência.
Trabalha como professora nos anos iniciais do ensino
fundamental e com educação especial e inclusiva. Atua
na orientação de escolas para adequação curricular e
na formação de professores com práticas inclusivas.
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SUMÁRIO
1 Currículo escolar inclusivo  9
1.1 Estrutura do currículo escolar e seus aspectos inclusivos  9
1.2 A BNCC, o currículo e a educação inclusiva  15
1.3 Dimensões da acessibilidade educacional  20
1.4 Segregação, integração e inclusão  24
1.5 Ações colaborativas na escola inclusiva  28

2 Ensino e aprendizagem na educação inclusiva  33


2.1 Tríade da educação: currículo, planejamento e avaliação  33
2.2 Preparação e atuação do professor  39
2.3 Sala de aula e atendimentos especializados  43
2.4 Flexibilização e adaptação curricular  47
2.5 Relação professor/família  52

3 Adaptações curriculares para estudantes com deficiência  59


3.1 Quem são os estudantes com deficiência?  59
3.2 Adaptações curriculares para estudantes com deficiência
visual   62
3.3 Adaptações curriculares para estudantes com deficiência
auditiva   68
3.4 Adaptações curriculares para estudantes com deficiência
intelectual   74
3.5 Adaptações curriculares para estudantes com deficiência física   79

4 Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de


aprendizagem 86
4.1 Estudantes com transtornos específicos de aprendizagem   86
4.2 Adaptações curriculares para estudantes com dislexia   88
4.3 Adaptações curriculares para estudantes com discalculia   93
4.4 Adaptações curriculares para estudantes com disgrafia e
disortografia   98
4.5 Adaptações curriculares para estudantes com TDAH   101
5 Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista  109
5.1 Transtorno espectro autista   109
5.2 Autista na escola comum   113
5.3 Como adaptar o currículo para o TEA   117

6 Inclusão educacional: desafios e superações  121


6.1 Medos, incertezas e superações   121
6.2 Experiências de professores   125
6.3 Experiências de famílias   130

6 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


APRESENTAÇÃO
Quando o assunto é o currículo escolar em uma perspectiva inclusiva, dois
procedimentos precisam estar articulados para que a aprendizagem de todos
os estudantes se efetive com qualidade: o conhecimento teórico e a atuação
prática das pessoas envolvidas no processo de ensino.
Esta obra tem o objetivo de contribuir com a inclusão educacional,
possibilitando o conhecimento das deficiências e dos transtornos de
aprendizagem, bem como sugerindo possíveis adaptações curriculares que
facilitem a dinâmica de ensinar e de aprender na diversidade.
A inclusão requer mudanças de paradigmas educacionais. O cenário exige
repensar as estratégias de ensino e entender que as salas de aula não são
homogêneas, é preciso compreender cada aluno na sua individualidade e ter
a certeza de que todos são capazes de aprender.
No primeiro capítulo, trazemos o conceito de currículo escolar, os aspectos
que o tornam inclusivo, as reflexões sobre inclusão na Base Comum Curricular
(BNCC) e a aplicabilidade de um currículo inclusivo em todas as etapas de
ensino. Abordamos também as dimensões da acessibilidade, tendo em vista
que somente é possível incluir se a garantirmos.
No segundo capítulo, comentamos sobre a articulação harmoniosa que
se faz necessária entre currículo, planejamento e avaliação para a garantia da
aprendizagem, e o quanto são fundamentais as formações teórica e prática
do professor para que isso se concretize. Ressaltamos também a importância
do trabalho colaborativo entre a sala de aula comum, o atendimento
especializado e a família no processo educativo.
No terceiro capítulo, apresentamos conceitos relacionados às deficiências
física, visual e intelectual e sugerimos algumas reflexões e práticas adaptativas
para o estudante com deficiência em sala de aula, reforçando a necessidade
de conhecer cada uma dessas deficiências e de buscar estratégias de ensino
que atendam às especificidades dos estudantes.
No quarto capítulo, elencamos os transtornos específicos – dislexia,
discalculia, disgrafia e disortografia – e mostramos que os estudantes com
dificuldades de leitura, escrita e cálculos também precisam de adaptações
curriculares para aprender. Para tanto, trazemos algumas orientações de
trabalho em sala de aula com estudantes com transtorno do déficit de atenção
e hiperatividade (TDAH).
Informações sobre o transtorno espectro autista (TEA) se fazem presentes
no quinto capítulo, com o intuito de auxiliar na identificação dos sintomas,
preparar o ambiente educacional e promover práticas acessíveis para
estudantes autistas.
Embora a inclusão educacional gere medos e incertezas nas pessoas
envolvidas, a superação faz com que trabalhar com a diversidade seja
gratificante. O sexto capítulo traz relatos de professores que aprenderam
na prática estratégias diferenciadas de ensino que deram certo, famílias
que superaram seus medos e estudantes com histórias de sucesso escolar.
Essas histórias nos permitem aprender a olhar diferente, identificando as
potencialidades, e não apenas as dificuldades das pessoas.
Este livro busca, além de oferecer informação teórica e sugestões práticas,
inspirar você para que sejamos todos atores no processo de inclusão, sendo
observadores, pesquisadores e realizadores de práticas de ensino que
garantam a aprendizagem de todos os estudantes, independentemente de
suas características.

8 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


1
Currículo escolar inclusivo
Tratar de currículo escolar inclusivo não é tão difícil, não é mes-
mo? Mas para torná-lo realidade, muitas questões são merecedo-
ras de atenção e precisam ser compreendidas por aqueles que
desejam uma escola que atenda a todos os alunos, respeitando as
suas potencialidades e limitações. Não temos dúvida de que você
é uma dessas pessoas.
Ao estudar os conteúdos apresentados neste capítulo, teremos
a oportunidade de ampliar o conhecimento teórico e prático de
questões relacionadas com o currículo escolar e veremos quais
são os aspectos que devem ser considerados para que ele atenda
à diversidade.
Também conheceremos assuntos relevantes para a construção
de uma educação inclusiva, como: a acessibilidade em todas as
suas dimensões; a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), alicer-
ce da construção curricular e fortalecedora de aspectos inclusivos;
a diferenciação entre segregação, integração e inclusão; e a valori-
zação do trabalho cooperativo em uma escola inclusiva.

1.1 Estrutura do currículo escolar e


Vídeo seus aspectos inclusivos
No universo escolar, o currículo é comumente mencionado pelos
profissionais da educação, e muitas são as respostas do conhecimen-
to teórico e prático sobre o assunto. Para iniciar nosso estudo, com-
partilharemos algumas definições sobre currículo que presenciamos
ao longo da trajetória profissional. Você também poderá acrescentar
a essa reflexão o que já teve a oportunidade de escutar ou ler sobre
o assunto.

Em síntese, currículo é:

Currículo escolar inclusivo 9


• O caminho que devemos seguir para ensinar.
• Uma ferramenta de ensino indispensável.
• A chave da escola, não há como ensinar sem o currículo.
• O documento mais importante de uma instituição de ensino.

Mas você sabe exatamente o que é o currículo escolar? Que tal


ampliar o conhecimento sobre o assunto por meio dos conceitos teóri-
cos que serão apresentados? Assim, entenderemos como é possível a
construção de um currículo escolar inclusivo.

“Etimologicamente falando, o termo currículo deriva do verbo latino ‘currere’, que


significa ‘correr’, tendo por substantivos, ‘cursus’ (carreira, corrida)” (GOODSON, 1995,
p. 7, grifo nosso).

Ao interpretarmos essa definição, podemos entender que o


currículo é uma corrida do professor e dos estudantes. O docente pre-
cisa vencer os conteúdos programados que lhe foram apresentados
no início do período escolar, percorrer um trajeto predeterminado e
conseguir ultrapassar uma linha de chegada, ao término do ano letivo
ou ao término de um curso. Já os discentes devem aprender o que foi
proposto, todos no mesmo tempo, espaço e ritmo, considerando essa
concepção de currículo.

No entanto, como ficarão os estudantes que não acompanharem


esse ritmo? Aí está a resposta inicial do porquê se faz necessário um
currículo inclusivo. Aqueles alunos que não conseguirem seguir o ca-
minho apresentado e aprender a sequência de conteúdos da maneira
Desafio como foi ensinada no tempo determinado perdem a corrida, metafo-
Defina currículo escolar de ricamente falando. Em termos pedagógicos, são reprovados.
acordo com o seu conhecimento
prévio. Não se preocupe se está Você já vivenciou esse modo de pensar o currículo? Já ouviu de
correto, aprenderemos juntos. um amigo, parente ou professor que a pessoa reprovou porque não
Anote a sua definição para não
deu conta de aprender todos os conteúdos previstos? Infelizmente,
esquecer. Ao final deste capítulo,
você poderá comparar o seu ainda há espaço para esse pensamento no contexto educacional.
conhecimento inicial com o Muitos educadores se sentem aflitos porque não conseguiram cum-
conhecimento adquirido por
prir o currículo escolar e desmotivados porque não tiveram tempo
meio desta obra.
de ensinar aquele estudante que precisava de algo diferenciado,

10 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


pois faltou tempo, como dizem. Também é comum encontrarmos
alunos com vínculos negativos com a aprendizagem e a escola, pelo
fato de não terem aprendido todos os conteúdos previstos para o
ano/série no qual estavam matriculados.

Essa realidade tem razão de existir, pois se trata de uma cultu- Saiba mais
ra enraizada no sistema escolar, considerando que, por muitas dé- Ensinar na homogeneidade é
cadas, o currículo foi compreendido como uma ferramenta utilizada acreditar que os estudantes são
todos iguais e que aprendem
para controlar o professor: apresentava uma sequência de ensino com as mesmas estratégias
pré-elaborada e que deveria ser aprendida por todos os alunos. Se- de ensino, no mesmo tempo
e espaço, por meio de um
gundo Goodson (1995), a história do currículo tem relações com os
planejamento único.
momentos que a sociedade vive, estando ligada a fatores políticos e Ensinar na heterogeneidade é
à realidade educacional. Assim, pode ser que essa maneira de com- considerar a diversidade, que
preender o currículo como rol de disciplinas tenha sido necessária e os estudantes não são iguais,
que apresentam habilidades
alcançado os seus objetivos, à época. No entanto, com essa prática específicas inerentes à pessoa e
curricular, pensar em uma escola inclusiva é praticamente impossível, que também têm dificuldades
específicas, por isso, aprendem
pois não se considera a diversidade, as habilidades e as potencialida-
em ritmos diferenciados.
des; ensina-se de modo homogêneo.

Vamos analisar outra definição cuja contribuição para a construção


de um currículo escolar inclusivo é muito maior, pois tem uma dimen-
são mais ampla e não se limita apenas a um quadro de conteúdos a
serem cumpridos.
A concepção de currículo inclui [...] desde os aspectos básicos
que envolvem os fundamentos filosóficos e sociopolíticos da
educação até os marcos teóricos e referenciais técnicos e tec-
nológico que a concretizam na sala de aula. Relaciona princí-
pios e operacionalização, teoria e prática, planejamento e ação.
(BRASIL, 2003, p. 59)

Essa concepção de currículo já o torna mais amplo e dinâmico, não


tão engessado, como na primeira definição apresentada, não é mes-
mo? Ela faz referência a um conjunto de elementos que compõe o
currículo, como a teoria, a legislação, o planejamento, a prática, a ação
e o uso da tecnologia.

A articulação dos componentes teóricos e práticos é de fundamen-


tal importância na construção de um currículo inclusivo, pois é preciso
compreender as ações de maneira integrada. Ao montar um quebra-
-cabeça, por exemplo, a ideia é que tenhamos o todo, pois somente
com todas as partes encaixadas conseguiremos entender a imagem,

Currículo escolar inclusivo 11


sem perder nenhum detalhe. Mas o que acontece se faltar uma peça?
Ou se as peças estiverem soltas e não se encaixarem?

lemono/Shutterstock

alpha paperart/Shutterstock
Quando as peças não se Quando as peças se encaixam, o
encaixam, não é possível resultado aparece, sendo possível
visualizar o todo, compreender o visualizar o todo e entender a
sentido da mensagem, a intenção função de cada peça, bem como
da proposta. os seus objetivos comuns.

Assim é o currículo, uma espécie de quebra-cabeça que precisa ser


pensado, construído e compreendido na sua globalidade. Se cada par-
te for entendida isoladamente, o resultado da sua aplicação não terá a
mesma resposta. Para pensar em um em currículo inclusivo, é necessá-
rio pensar no conjunto de procedimentos e nos princípios da educação
inclusiva.

Em relação a esses princípios, há uma frase que escutamos muito


por aí, em vários documentos institucionais, e que, por essa razão,
merece destaque: “toda pessoa deve ter direito à educação”.

Pensando nisso, por que temos que falar em educação inclusiva?


Isso já não deveria estar consolidado? Deveria, porém, não está. Há a
necessidade de respaldo legal para garantir a inclusão educacional e,
ainda assim, na prática, há distorção das ações; o sistema educacional
diz ser inclusivo, porém há muito a ser feito.

A Constituição Federal, no artigo 205, por si só, garante a educação


inclusiva quando em seu texto há a seguinte afirmação: “A educação,
direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e in-
centivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desen-
volvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988).

Se educação é direito de todos, entendemos que não se permite


a exclusão de qualquer que seja o estudante, em qualquer etapa de
ensino, e que devem ser oferecidas todas as condições necessárias

12 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


para o desenvolvimento da pessoa para o exercício da cidadania. No
Importante
mesmo documento, artigo 208, anuncia-se: “atendimento educacional
Na metade da década de 1990,
especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede a expressão portadores de
regular de ensino” (BRASIL, 1988). deficiência foi substituída por
pessoas com deficiência, a qual
A maior legislação do país determina incluir os estudantes com defi- permanece até os dias atuais.
ciência na rede regular de ensino, ou seja, da educação infantil ao ensi-
no médio, englobando a educação de jovens e adultos, a qual também
está inserida nesse contexto. É preciso ter claro que não basta apenas
introduzir o estudante com deficiência na rede regular de ensino ou
apenas adequar a estrutura física para atender a esse público específi-
co. É necessário repensar a escola como um todo, quebrar paradigmas
no ato de ensinar, ser capaz de compreender os limites e as possibili-
dades de cada estudante e, principalmente, garantir a aprendizagem.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) fortalece o que pre-


coniza a Constituição, no capítulo IV, art. 54: “atendimento educacional
especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede
regular” (BRASIL, 1990). Já a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional (LDB), dentre as suas determinações, estabelece, no capítulo V,
art. 58, que a educação especial, como modalidade de educação esco-
lar, “deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino”
(BRASIL, 1996, p. 27).

Somente nessas três legislações apresentadas, o direito da pessoa


com deficiência de estudar preferencialmente na rede regular de en-
sino está garantido legalmente. Isso significa que nenhuma institui-
ção poderá recusar a matrícula de nenhum estudante, quer tenha
ou não deficiência, e que, caso persista na recusa, poderá responder
judicialmente, sendo aplicada reclusão de dois a cinco anos e multa
por descumprimento da lei, conforme previsto no artigo 98 da Lei n.
13.146/2015, do Estatuto da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015).

Outro princípio que devemos considerar é que toda pessoa tem a


capacidade de aprender. De acordo com Mantoan (2003, p. 36):
os alunos aprendem nos seus limites e se o ensino for, de fato,
de boa qualidade, o professor levará em conta esses limites e
explorará convenientemente as possibilidades de cada um. Não
se trata de uma aceitação passiva do desempenho escolar, e sim
de agirmos com realismo e coerência e admitirmos que as esco-
las existem para formar as novas gerações, e não apenas alguns
de seus futuros membros, os mais capacitados e privilegiados.

Currículo escolar inclusivo 13


Livro É claro que nem todos aprendem com as mesmas estratégias e no

O livro Estilos e estratégias


mesmo ritmo, é preciso conhecer cada estudante individualmente,
de aprendizagem explana descobrir qual a sua habilidade mais aflorada e, por meio dela, ensinar
a aprendizagem como
padrão pessoal desen-
conceitos que ainda não adquiriu. Devemos ter consciência de que um
volvido pelo indivíduo. único estilo de aula não servirá para todos os alunos, pois há uma di-
Os autores afirmam que
há diferentes formas
versidade presente na sala de aula.
de aprender, e essas
Você já observou como você aprende? Qual é a sua facilidade? Será
precisam ser compreen-
didas por quem ensina e que aprende lendo, ouvindo, escrevendo ou visualizando imagens?
por quem aprende. Vale
Você já pensou nisso? Procure observar o seu estilo de aprendizado.
a leitura!

VIDAL, L.; LOMÔNACO, J. F. B. Um documento de importante leitura para ampliar a teoria e a prá-
Joinville: Clube de Autores, 2007. tica sobre a inclusão, principalmente sobre as possibilidades de traba-
lhar com a diversidade, é a Declaração de Salamanca.
A maior participação de governos, de grupos de apoio, de gru-
pos comunitários e de pais e, especialmente, de organizações de
pessoas com deficiências nos esforços para melhorar o acesso,
ao ensino, da maioria das pessoas com necessidades especiais
que continuam marginalizadas. (BRASIL, 2005, p. 15)

Esse documento evidencia o direito de toda criança estar na es-


cola e ser acolhida, independentemente de suas condições físicas,
intelectuais, sociais, emocionais e linguísticas.

Outra questão importante é entender que cada estudante é úni-


co, logo, o processo de aprendizagem de cada um também é único.
Esse é mais um princípio da educação inclusiva. Quando entramos em
uma sala de aula, precisamos pensar que ali há muitas famílias dife-
rentes, experiências de vida diferenciadas, genes biológicos e culturas
distintos, por isso o olhar do professor também precisa ser diferente.
O convívio com a diversidade beneficia a todos; podemos dizer que
é um princípio compensador. Quando experimentamos as diferenças,
nos damos conta do quanto aprendemos, e é nesse cenário que está
a riqueza de saber conviver com o próximo, quando a dificuldade que
antes parecia existir se transforma em oportunidade.

Muitos são os marcos regulatórios para tornar a inclusão realida-


de. Além dos já mencionados, em 2008 o governo federal brasilei-
ro criou a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva de
Educação Inclusiva, garantindo a matrícula das pessoas com deficiên-
cia na escola regular e estabelecendo um novo modelo de educação
especial. Esse documento visa constituir políticas públicas promoto-

14 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


ras de uma educação de qualidade para todos os alunos. Em 2015, o
Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015) instituiu a Lei
Brasileira de Inclusão. Atividade 1

Vale a pena conhecer o documento na íntegra, especialmente o capí- Após a reflexão sobre o que é
currículo, responda: qual é a
tulo IV, no qual se encontra explícito o direito de a pessoa com deficiência diferença entre uma proposta de
ter acesso e permanência nas escolas em todos os níveis de ensino. A lei currículo inclusivo e de currículo
assegura condições de acesso, participação e aprendizagem, ressaltando que se limita a um documento
escrito, apresentando um rol de
a importância da formação dos professores e das medidas necessárias conteúdos a ser trabalhado?
para a consolidação de um currículo inclusivo.

1.2 A BNCC, o currículo e a educação inclusiva


Vídeo Você já ouviu falar na BNCC, não é mesmo? Sabe o que significa
essa sigla? Trata-se da Base Nacional Comum Curricular. Para en-
tender o que isso significa, vamos nos basear em um exemplo bem
corriqueiro. Imagine que você resolveu construir uma casa. Qual é a
primeira coisa a ser feita para que ela tenha uma boa estrutura e não
desabe com a chuva, com o vento ou com o passar dos dias? Será
que é possível construir a casa iniciando pelo teto? Com certeza, você
já sabe a resposta: é necessário conceber, primeiramente, a base, o
alicerce, correto?

A BNCC é como um alicerce para a educação, no qual estão determi-


nadas as aprendizagens essenciais comuns a todos os alunos, em todo
o território nacional, que poderá ser incrementada de acordo com cada
realidade por meio do currículo e da proposta pedagógica.
Referência nacional para a formulação dos currículos dos sis-
temas e das redes escolares dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios e das propostas pedagógicas das institui-
ções escolares, a BNCC integra a política nacional da Educação
Básica e vai contribuir para o alinhamento de outras políticas
e ações, em âmbito federal, estadual e municipal, referentes
à formação de professores, à avaliação, à elaboração de con-
teúdos educacionais e aos critérios para a oferta de infraes-
trutura adequada para o pleno desenvolvimento da educação.
(BRASIL, 2018, p. 6)

Observe que, na definição apresentada, objetiva-se o pleno de-


senvolvimento da educação. Isso significa uma educação que con-
tribua para uma sociedade mais justa e igualitária. Outro fator

Currículo escolar inclusivo 15


importante é que, com a BNCC, todas as escolas passam a ter uma
referência de aprendizagem obrigatória a ser utilizada na constru-
ção de seus currículos e nas suas propostas pedagógicas. É fato que
essa organização já havia sido feita no documento das Diretrizes
Curriculares Nacionais – DCN (BRASIL, 1996), porém, com a BNCC,
passa a enfatizar a obrigatoriedade de ensino dos conteúdos míni-
mos para cada etapa escolar.

Nesse sentido, a Base apresenta 10 competências que deverão


ser desenvolvidas da educação infantil até o ensino médio. Elas se-
rão trabalhadas com as crianças pequenas, na primeira etapa da
educação básica – educação infantil –, e aprimoradas ao longo do ensi-
no (fundamental e médio), à medida que a pessoa vai se desenvolven-
do, amadurecendo e progredindo física, intelectual e socialmente.
Figura 1
As dez competências da BNCC

1 Valorizar e utilizar os conhecimentos


historicamente construídos sobre o
mundo físico, social, cultural e digital.
6
Prestigiar a diversidade de saberes e
vivências culturais e apropriar-se de
conhecimentos e experiências.

2 7
Exercitar a curiosidade intelectual e
recorrer à abordagem própria das
ciências, incluindo a investigação, a Argumentar com base em fatos,
dados e informações confiáveis.
reflexão, a análise crítica, a imaginação
e a criatividade.

3 8
Reconhecer e fruir as diversas Conhecer-se, apreciar-se e cuidar
manifestações artísticas e culturais, de sua saúde física e emocional,
locais e mundiais, e participar de compreendendo-se na diversidade
práticas diversificadas da produção humana e reconhecendo as suas
artístico-cultural. emoções e as dos outros, com autocrítica
e capacidade para lidar com elas.

4
Utilizar diferentes linguagens – verbal

9
(oral ou visual-motora, como Libras,
e escrita), corporal, visual, sonora e Exercitar a empatia, o diálogo, a
digital –, bem como conhecimentos resolução de conflitos e a cooperação.
das linguagens artística, matemática e
científica.

5 10
Compreender, utilizar e criar Agir pessoal e coletivamente com
tecnologias digitais de informação autonomia, responsabilidade,
e comunicação de maneira crítica, flexibilidade, resiliência e determinação,
significativa, reflexiva e ética nas tomando decisões com base em
diversas práticas sociais (incluindo as princípios éticos, democráticos,
escolares). inclusivos, sustentáveis e solidários.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2018, p. 7-8.


16 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva
Você pode se perguntar: mas de que maneira a BNCC vai contribuir
com a educação inclusiva? A inclusão está presente em todo o docu-
mento, porém é necessário compreender o contexto. Ela não aborda
de maneira fragmentada a educação especial e a inclusão, afinal, en-
tende-se que, se há o desejo de incluir, é preciso incluir, de fato, não
é mesmo? Na própria definição da BNCC já se faz presente a inclusão,
quando o texto enfatiza se tratar de um documento aplicado a todos,
sem discriminação. Vamos observar exemplos pontuais para deixar
mais nítida essa explicação.

Leia com atenção a oitava competência: “Conhecer-se, apreciar-se


e cuidar de sua saúde física e emocional, compreendendo-se na diver-
sidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com
autocrítica e capacidade para lidar com elas” (BRASIL, 2018, p. 8). Essa é
uma habilidade que será trabalhada com todos os alunos, significando
que deverão aprender, desde muito pequenos, sobre a diversidade hu-
mana, a respeitar os outros, independentemente de suas limitações, a
ser capaz de entender o outro. Isso se aplica à inclusão da pessoa com
deficiência. Explorar isso com as crianças da educação infantil e com os
estudantes dos ensinos fundamental e médio é um grande passo para
promover a inclusão educacional naturalmente.

Ainda em diálogo com a BNCC, vamos entender a competência nove:


Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a
cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao
outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da
diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, iden-
tidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qual-
quer natureza. (BRASIL, 2018, p. 8)

Há palavras muito específicas nessa competência e necessárias


para garantir a inclusão educacional. Imagine se todas as crianças
aprenderem a cooperar, a respeitar, a compreender os direitos do ou-
tro e, ainda, perceberem que há pessoas com saberes, potencialidades
e culturas diferentes? Melhor do que entender isso é praticar, sem pre-
conceito, a riqueza da diversidade. Se isso se concretizar, talvez, nem
seja mais preciso tratar de inclusão educacional.

Em todas as competências da BNCC, que não são trabalhadas iso-


ladamente, e sim em conjunto, os profissionais da educação terão
oportunidades de abordar a inclusão, de desenvolver em si e nos seus
alunos atitudes inclusivas. Isso não acontece somente com as com-

Currículo escolar inclusivo 17


Leitura petências gerais, mas, também, com as competências específicas do
Sugerimos a leitura das documento.
seguintes competências
específicas da BNCC: A BNCC apresenta a oportunidade aos gestores e à equipe de cada
competência seis, do
componente curricular
escola de organizar os currículos de modo a dar conta de ensinar a
Geografia; competência todos os estudantes, considerando as suas especificidades. Antes do
um, de Arte; competência
cinco, de Linguagem; e
documento, o professor escolhia a sua disciplina, os conteúdos, e orga-
competência cinco, de nizava a sua aula. Agora, primeiro o docente verifica os componentes
Matemática. Observan-
do, também, os demais
curriculares (ensinos fundamental e médio) e os campos de experiên-
componentes específi- cia (educação infantil) e, com base neles, pensa no seu planejamento,
cos, notará a inclusão
presente.
no que vai ensinar, em quais serão as estratégias e as adaptações que

Disponível em: http://


terá de fazer.
basenacionalcomum.mec.gov.br/
E a relação com o currículo? Então, a BNCC é currículo? O que você
images/BNCC_EI_EF_110518_
versaofinal_site.pdf. Acesso em: pensa sobre isso? Precisamos esclarecer que a Base e o currículo não
20 jul. 2020.
são a mesma coisa. Imagine a BNCC como o centro e que, segundo
tudo o que está nesse centro, o qual é a base, serão desenvolvidas
outras ações, inclusive a construção do currículo. Tudo o que está no
centro servirá de embasamento e direcionamento para novas ações –
currículo, projeto pedagógico e adaptações –, tecendo uma teia mui-
to bem consolidada para garantir a qualidade do ensino a todos os
estudantes.

A BNCC estabelece o mínimo que a criança/estudante deve apren-


der em determinado ano escolar, mas isso não significa que não
possa ser ensinado mais, desde que se garanta, primeiro, o mínimo.
Atenção “Além disso, BNCC e currículos têm papéis complementares para as-
segurar as aprendizagens essenciais definidas para cada etapa da
A BNCC traz algumas alterações
nas terminologias. A educação Educação Básica, uma vez que tais aprendizagens só se materializam
infantil, que antes era uma mediante o conjunto de decisões que caracterizam o currículo em
área de conhecimento, passa
a ser chamada de campo de ação” (BRASIL, 2018, p. 14).
experiência, porque o intuito não Agora que você já sabe que a Base não é o currículo – ambos são
é apenas que a criança tenha o
conhecimento, mas sim que ela documentos complementares –, vamos pensar sobre quais elemen-
experimente esse conhecimento tos favorecem um currículo inclusivo, para que este não seja apenas
sabendo agir, utilizando-se dele.
compreendido como um mero documento escrito.
Nos ensinos fundamental e
médio, passa-se a tratar de •• Documento escrito: isoladamente, esse documento não passa
componentes curriculares, e de um fragmento do currículo, que se resume aos conteúdos a
não mais de conteúdos, porque
serem abordados. Porém, se construído em conjunto com pro-
componentes indicam uma
composição, algo maior, não fessores, gestores, alunos e sociedade, ganha vida e direciona o
isolado. que a escola quer ensinar e como será na prática.

18 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


•• Escola: precisa ter clareza de sua função, olhar além dos mu-
ros da instituição e pensar: afinal, que alunos queremos for-
mar? A escola necessita de padrões avaliativos para saber o
que mudar no currículo, o que acrescentar, o que não está
atendendo ao público específico. É por meio de um currículo
bem elaborado que a instituição é reconhecida positivamente
na sociedade.
•• Professor: ensinará o que está proposto no currículo, com es-
tratégias de ensino, planejando, analisando as necessidades
apresentadas pelos alunos, por meio da compreensão do con-
texto social, da realidade do público, colocando em prática o
que foi proposto no documento escrito e sendo capaz de se
espelhar nos estudantes para rever o currículo, considerando
a diversidade.
•• Estudante: cerne do ensino, é para ele que o currículo deve ser
pensado e praticado.
•• Sociedade: o estudante deve ser preparado para enfrentar situa-
ções sociais, e essa participação precisa acontecer de maneira crí-
tica, consciente e responsável. Entender as necessidades sociais e
culturais é indispensável na formação do indivíduo.
•• Legislação: o conhecimento das legislações que norteiam o siste-
ma de ensino é importante para a construção do currículo, pois é
necessário o respaldo legal para tornar realidade o que se almeja
de uma educação de qualidade para todos.

Ressaltamos que os elementos mencionados precisam estar


sempre conectados, quando fazemos elos, estabelecemos vínculos,
unimo-nos para alcançar um objetivo comum – nesse caso, uma
educação de qualidade a todos. Além disso, não devem ser consi-
derados únicos, pois muitas outras necessidades surgem durante a
construção de um currículo, tendo em vista que ele é dinâmico e que
sofre mudanças e progressões para atender à realidade. De acordo
com Guilherme (2019, p. 118), “o currículo deva propor adaptações
às necessidades culturais da comunidade e do indivíduo, levando em
consideração os diferentes lugares e a trajetória percorrida por seus
grupos, integrando a escola a outras ações educativas culturais”.

É preciso elaborar estratégias de adaptações possíveis para


atender às necessidades da realidade da escola, garantindo a to-
dos os alunos, com ou sem deficiência, a entrada e permanência,

Currículo escolar inclusivo 19


a aprendizagem e o sucesso escolar. A BNCC elenca os componen-
Glossário tes curriculares essenciais, isto é, o que não pode faltar nas etapas
sinergia: ação simultânea; de ensino, mas a inclusão educacional dependerá do conjunto de
esforço coletivo; cooperação.
elementos envolvidos, em sinergia, para a garantia dos direitos da
aprendizagem.

1.3 Dimensões da acessibilidade educacional


Vídeo Antes de iniciarmos o assunto, convidamos você a observar as fi-
guras a seguir e a refletir sobre quais dos meios ilustrados utilizaria
para garantir a acessibilidade. Você poderá escolher quantas figuras
desejar. Posteriormente, compreenderemos o que significa cada uma
delas.

Figura 2a Figura 2b
Julgamento Rampa de acesso

ClassicVector/Shutterstock
GoodStudio/Shutterstock

Figura 2c
Comunicação
Figura 2d
Leis e decretos
Macrovector/Shutterstock

SkyPics Studio/Shutterstock

Quais das figuras apresentadas você achou mais relevantes para


garantir a acessibilidade? Imaginamos que não deixou de escolher a

20 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


imagem da pessoa com deficiência física utilizando a rampa de acesso,
certo?

Você acertou na escolha, mas, na verdade, todas as ilustrações re-


presentam acessibilidade. Geralmente, acabamos a associando so-
mente com as barreiras arquitetônicas, isto é, as rampas, os banheiros
adaptados, as barras de acesso, as edificações e os mobiliários. O fato é
que não basta apenas tornar o ambiente acessível.

As quatro figuras representam a acessibilidade em suas dimensões.


A Figura 2a representa a acessibilidade atitudinal; a Figura 2b, a aces-
sibilidade arquitetônica; a Figura 2c, a acessibilidade comunicacional;
e a Figura 2d, a acessibilidade programática. Essas são apenas quatro
dimensões da acessibilidade, mas há outras. Veremos cada uma delas
mais adiante, mas, antes, vamos pensar um pouco sobre o conceito de
acessibilidade.

De acordo com a Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT


(2004, p. 20), entende-se por acessibilidade a “possibilidade e condi-
ção de alcance, percepção e entendimento para a utilização com se-
gurança e autonomia de edificações, espaço, mobiliário, equipamento
urbano e elementos”. Nesse conceito apresentado pela ABNT NBR
9050, é enfatizada mais a dimensão da acessibilidade arquitetônica,
porém, se desejamos um ambiente educacional verdadeiramente in-
clusivo, é necessário pensarmos de maneira mais ampla. Para expan-
dir esse entendimento, em primeiro lugar, precisamos compreender
que acessibilidade e inclusão não se separam; não há como garantir a
inclusão sem assegurar a acessibilidade em todas as suas dimensões.
Trata-se de um processo muito mais complexo do que apenas ade-
quar a estrutura física do ambiente.

De acordo com Sassaki (2009, p. 2), “a acessibilidade é uma quali-


dade, uma facilidade que desejamos ver e terem todos os contextos
e aspectos da atividade humana”. Devemos admitir que, de fato, a
acessibilidade é uma qualidade, porque tornar acessível não é apenas
realizar mudanças físicas, mas sim alterar comportamentos, e qualida-
de é a essência positiva de uma pessoa, a capacidade de compreender
o outro, de respeitar e de colaborar.

Tendo isso em vista, o autor apresenta as seis dimensões de


acessibilidade. São elas:

Currículo escolar inclusivo 21


arquitetônica (sem barreiras físicas), comunicacional (sem barrei-
ras na comunicação entre pessoas), metodológica (sem barreiras
nos métodos e técnicas de lazer, trabalho, educação etc.), instru-
mental (sem barreiras instrumentos, ferramentas, utensílios etc.),
programática (sem barreiras embutidas em políticas públicas,
legislações, normas etc.) e atitudinal (sem preconceitos, estereó-
tipos, estigmas e discriminações nos comportamentos da socieda-
de para pessoas que têm deficiência). (SASSAKI, 2009, p. 2)

A acessibilidade na dimensão arquitetônica está relacionada


com o espaço físico e à organização dele, para que não haja barreiras
dificultando o acesso de pessoas com deficiência física e mobilida-
de reduzida. Para essa garantia da acessibilidade arquitetônica, não
basta apenas pensar no interior da escola, mas também no acesso
a ela: a rua em frente à escola é acessível? Ela possibilita que uma
pessoa em cadeira de rodas circule sem dificuldades? A calçada está
rebaixada? Há sinalização? No interior da escola, é preciso observar
se há rampas de acesso devidamente sinalizadas, banheiros adap-
tados, corrimãos contínuos, bebedouros rebaixados, sinalização no
piso etc.
Leitura
A acessibilidade em uma dimensão atitudinal, como o próprio
Sugerimos a leitura da
nome sugere, depende apenas da atitude de cada pessoa. Se essa
NBR 9050 (ABNT, 2004),
documento que dimensão não acontecer, as demais estarão todas comprometidas.
estabelece critérios e
Estamos nos referindo à capacidade de conviver com o outro sem
parâmetros técnicos a
serem observados na preconceito e discriminação. Essa dimensão ocorre, primeiramente,
construção, instalação e
de modo individual, é o compromisso de cada um com o outro. Isso
adaptação de edificações,
mobiliários, espaços e está previsto nas competências da BNCC, conforme estudamos neste
equipamentos urbanos,
capítulo.
quanto às condições de
acessibilidade. Na escola, é muito importante o fortalecimento dessa dimen-
ABNT. Rio de Janeiro, 2004. são atitudinal, isto é, trabalhar, com o corpo docente e discente, a
família e a aceitação do diferente; ter atitudes simples do dia a dia
que promovam a inclusão, como o acolhimento e a valorização das
potencialidades.
Se todo mundo fosse igualzinho, o mundo não teria graça! Mas
só reconhecer que as pessoas são diferentes não basta. É preciso
respeitar as diferenças. E os versos de diversidade nos ensinam
isso, que não há um jeito único de ser: “assim ou assado, todos
são gente, tudo é humano”. (BELINKY, 1999, p. 20)

22 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Oferecer de maneira lúdica aos alunos a oportunidade de pensa-
Livro
rem sobre a diversidade e terem atitude diante dela é uma boa dica
O livro Diversidade pode
para que essa dimensão se consolide nas salas de aula. Atividades com ser utilizado, em qualquer
leituras também são muito viáveis. etapa do ensino, para
desencadear reflexões
A dimensão comunicacional diz respeito à eliminação de barreiras sobre essa temática.
Depois de realizada a lei-
na comunicação. Significa oferecer recursos que favoreçam a autono- tura, pode-se sugerir que
mia da pessoa que necessita. Um sujeito cego, por exemplo, precisa de os alunos escrevam ou
desenhem seus pontos
textos em braille, de audiodescrição, de recursos táteis e de softwares fortes e suas diferenças.
específicos (NVDA, Dosvox, Janz, Dolphin), que permitam a sua comu- BELINKY, T. São Paulo: Quinteto
nicação. Indivíduos surdos, por sua vez, dependem de um intérpre- Editorial, 1999.
te de Libras e de legendas. A  Lei Federal n. 13.146 (Lei Brasileira de
Inclusão – LBI), no inciso V, do artigo 3º, considera comunicação como: Glossário
forma de interação dos cidadãos que abrange, entre outras opções,
braille: sistema de escrita tátil
as línguas, inclusive a Língua Brasileira de Sinais (Libras), a visuali- utilizado por pessoas cegas ou
zação de textos, o Braille, o sistema de sinalização ou de comunica- com baixa visão.
ção tátil, os caracteres ampliados, os dispositivos multimídia, assim Libras: Língua Brasileira de
como a linguagem simples, escrita e oral, os sistemas auditivos e os Sinais.
meios de voz digitalizados e os modos, meios e formatos aumen-
tativos e alternativos de comunicação, incluindo as tecnologias da
informação e das comunicações. (BRASIL, 2015, p. 20)

Cabe salientar que as comunicações escrita e oral são consideradas,


também, acessibilidade comunicacional. Assim, podemos dizer que
significa não existir barreiras na comunicação, de maneira geral, tanto
escrita quanto verbal ou digital.

A acessibilidade metodológica é a dimensão que exige muita aten- Livro


ção no ato de ensinar. Podemos dizer que é uma acessibilidade pe- O currículo inclusivo se
efetiva na sala de aula
dagógica, referente às estratégias de ensino e aos materiais utilizados
quando o professor
pelos professores para atender à diversidade de estudantes em sala de articula teoria e prática e
consegue ministrar aulas
aula. Sassaki (2007), ao explicar a acessibilidade metodológica, enfatiza
diferentes, que permitam
a importância de aprender sobre e aplicar as inteligências múltiplas, de ao estudante aprender
por vários caminhos,
respeitar os estilos de aprendizagem e de conhecer teorias e técnicas
quer seja pela oralidade
de ensino. Quando o autor menciona inteligências múltiplas, quer dizer e escrita ou pelas ativida-
des sensoriais, musicais,
que os estudantes aprendem de maneira diferenciada, bem como suas
cognitivas, motoras, espa-
habilidades são diferenciadas. O professor precisa ter a capacidade de ciais. É o que aborda o li-
vro Inteligências múltiplas:
perceber a maior habilidade do estudante e, com base nela, facilitar o
a teoria na prática.
ensino e a aprendizagem.
GARDNER, H. Porto Alegre: Artmed,
Quando o assunto é acessibilidade instrumental, precisamos re- 1995.

fletir sobre as ferramentas de estudo utilizadas pelo estudante com de-

Currículo escolar inclusivo 23


Figura 3 ficiência, na escola ou fora dela. É preciso pensar no livro didático, nos
Soroban objetos de escrita e nos materiais disponibilizados para ele aprender.
Por exemplo, um aluno cego precisa de um instrumento cha-
mado soroban para aprender matemática.
T

A última, mas não menos importante, dimensão de


TTT
TTT
TTTTTTTTTTTTTTTTT

acessibilidade é a dimensão programática, a qual diz res-


peito a leis, decretos e documentos. Ela está presente em
toda a legislação que norteia o processo de acessibilidade
TTTT

e inclusão. Muitas vezes, não é percebida pelas pessoas,


porém, é de fundamental importância. De acordo com
O soroban é um ábaco adaptado para pessoas cegas,
com a finalidade de realizar cálculos. Guilherme (2019, p. 7):
melhorias nas condições de acessibilidade, incentivos a partici-
pação e efetivação dos processos de ensino e aprendizagem são
fatores decisivos para atingirmos a essência presente nas dis-
cussões fundamentais acerca dos grandes obstáculos e desafios
Atividade 2 da educação dos nossos tempos. Condições estas que trazem
em sua esteira os fundamentos e concepções que permeiam a
A acessibilidade vai muito além
do espaço físico, há outras educação especial sob a perspectiva inclusiva.
dimensões que precisam ser
As dimensões apresentadas não acontecem isoladamente, elas se
observadas e aplicadas quando
se deseja a construção de uma completam, quando o assunto é inclusão educacional. A acessibilidade
escola inclusiva. A dimensão da atitudinal pode ser compreendida, dentre todas, como a mais essen-
acessibilidade atitudinal deve
ser a primeira a ser considerada.
cial, pois, somente quando o ser humano for capaz de compreender a
Explique-a e cite um exemplo diversidade, a inclusão acontecerá. Na elaboração e execução de um
prático de como ela pode ser currículo inclusivo, é preciso ter esse olhar mais amplo para não se
estimulada nas instituições de
ensino. limitar à acessibilidade na dimensão arquitetônica, mas em todas as
suas dimensões.

1.4 Segregação, integração e inclusão


Vídeo Segregar, integrar e incluir. Afinal, o que é isso? Para compreender
o processo de inclusão educacional, é importante saber o que cada um
desses termos significa e entender a aplicabilidade de seus conceitos,
na prática, bem como o momento para tal.

Diferentes atitudes foram tomadas ao longo dos tempos em bus-


ca da inclusão das pessoas com deficiência no ensino regular. Observe
um exemplo real, que ajudará a compreender o porquê da abordagem
da sequência desses conceitos quando se trata de educação especial e
inclusiva.

24 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Imagine uma corrida de obstáculos, na qual barreiras devem ser
ultrapassadas para se chegar à vitória. Assim é o processo de inclusão
educacional: muitas barreiras precisaram ser atravessadas para se che-
gar ao cenário que temos hoje. Isso não significa que a corrida acabou,
novos desafios estão sendo apresentados para garantir uma educação
de qualidade a todos, e alguns paradigmas ainda precisam ser rompidos.

Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação Especial (BRASIL,


2001), a educação nem sempre foi oferecida a todas as pessoas; ape-
nas os grupos mais favorecidos tinham acesso, os grupos compostos
por pessoas ditas “normais”. Sendo o acesso um privilégio de poucos,
os sujeitos em maior desvantagem eram os com deficiência, por serem
considerados doentes e incapazes de aprender. Até mesmo a própria
família tinha a compreensão de que ter um filho com deficiência era
uma maldição, um castigo. Esse período foi caracterizado pela exclusão.

Posteriormente foram elaboradas ações de assistencialismo e cari-


dade para esse grupo de “excluídos”, entendido como marginalizado,
desfavorecido e que carecia de uma educação diferenciada. Essa ma-
neira de compreender a inserção da pessoa com deficiência no sistema
de ensino e o ser humano como um todo:
reforçava não só a segregação do indivíduo, mas também os pre-
conceitos as pessoas que fugiam do padrão da “normalidade”,
agravando-se pela irresponsabilidade dos sistemas de ensino
para com essa parcela da população, assim como pelas omissões
ou/e insuficiência de informações desse alunado nos cursos de
formação de professores. (BRASIL, 2001, p. 20)

Nessa ocasião, as pessoas com deficiência passaram por um


processo de segregação: não podiam frequentar o ensino comum,
eram separadas e atendidas em outras instituições, próprias para
atendimento a deficientes. Surgiram, desse modo, as escolas espe-
ciais, associações de atendimento a pessoas com deficiência, com
uma política mais assistencialista do que pedagógica. Enfatizou-se
a questão do preconceito com os que não se enquadravam nos pa-
drões de normalidade e não havia preocupação do sistema de ensino
em aperfeiçoar professores para trabalharem com esse público es-
pecífico. Historicamente, isso aconteceu até a metade do século XX,
e o discurso era que os estudantes com deficiência seriam melhor
atendidos nas escolas especiais do que nas regulares, pois teriam um
“currículo próprio”.

Currículo escolar inclusivo 25


Beyer (2006, p. 21) enfatiza que as escolas especiais eram espaços
segregadores, porque tinham que acolher os rejeitados, fracassados
e deficientes que não conseguiam acompanhar o currículo regular
de ensino, tornando-se, praticamente, um depósito cuja função era
“trabalhar com as crianças que o sistema regular não sabe ou não
quer lidar”.

Às pessoas com deficiência não era oferecido o direito de frequentar


as escolas comuns, sendo o acesso limitado às instituições especiais, já
que se acreditava que não tinham capacidade para acompanhar o en-
sino regular. Depois da exclusão e da segregação no sistema de ensi-
no, veio o período de integração. Conforme formos entendendo como
ocorre a integração da pessoa com deficiência na rede regular de ensi-
no, procure relacionar com a realidade atual.

De acordo com as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na


Educação Básica (BRASIL, 2001), o procedimento de integração iniciou
de modo parcial: aqueles estudantes que estavam nas escolas espe-
ciais, nas classes especiais, eram preparados para serem integrados
à classe comum de ensino, como uma educação paralela entre a edu-
cação especial e o ensino regular. Para que o estudante fosse incluído
totalmente, precisava dar conta de acompanhar o currículo que era
proposto para a escola comum. Com esse tipo de procedimento, os
níveis mais avançados de ensino não eram alcançados e a segregação
acabava por excluir a pessoa com deficiência.

Posteriormente, a partir da década de 1980, ocorreu o procedi-


mento de integração total do estudante com deficiência na rede
regular de ensino, em virtude das novas políticas educacionais que
enfatizavam o direito a uma educação para todos e, preferencialmen-
te, na rede regular de ensino.

Com a inserção desses estudantes nas escolas regulares, o cená-


rio era de alunos com deficiência nas salas de aula. Todavia, apenas
inseridos, e não incluídos, porque as estratégias dos professores para
ensinar permaneceram as mesmas, e quem precisava se adaptar era o
estudante. Nesse contexto, “a escola não muda sua rotina nem sua prá-
tica pedagógica e, sim, os alunos é quem tem de mudar para se adaptar
a sua realidade e as suas exigências” (REIS, 2013, p. 80).

Atualmente, essa proposta de integração é visível nas escolas. É


comum ouvirmos de professores a seguinte frase, quando visitamos

26 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


instituições que se dizem inclusivas: “aquele aluno é de inclusão, tem
muitas dificuldades para aprender”; ou “meus estudantes não apren-
dem porque há muitos alunos de inclusão juntos na sala de aula”; ou,
ainda, “esse aluno não é meu, é da sala de recurso”. Mantoan (2006, p. 42)
afirma que “quando há uma classe de inclusão, quando há uma esco-
la de inclusão, quando há uma professora de inclusão, quando há as
crianças de inclusão, não há inclusão”.

Surge, assim, uma pergunta que não deve se calar e que todos os
profissionais envolvidos com a educação precisam saber a resposta:
qual é a diferença entre uma escola que integra e uma escola que inclui
o estudante com deficiência?

A primeira apenas coloca o estudante com deficiência na sala de aula,


enquanto a segunda trabalha com o estudante os mesmos componen-
tes curriculares sugeridos para os demais, porém, utilizando estratégias
diferenciadas de ensino e avaliação. Isso significa que incluir não é deixar
Atividade 3
a pessoa com necessidades na sala de aula fazendo atividades diferen-
Como vimos, integrar é diferente
ciadas, incluir é possibilitar que ela tenha direito aos mesmos conteúdos, de incluir o estudante com
apresentados de outra forma. deficiência no ensino regular.
A situação hipotética descrita
A inclusão requer “uma nova visão das pessoas, uma mudança a seguir retrata a integração de
de mentalidade, de forma que todos sejam respeitados, indepen- um aluno com déficit intelectual,
na sala de aula. Leia o texto e,
dentemente de suas diferenças” (REIS, 2013, p. 80). Quando se trata
em seguida, apresente uma
de inclusão e se afirma que uma escola é inclusiva, é preciso respei- proposta para a inclusão desse
tar as diferenças e ensinar de maneira diferenciada aqueles que estudante.
necessitam – isso serve para todos os alunos. A professora estava ministrando
uma aula de Matemática cujo
De acordo com o exposto na Declaração de Salamanca (UNESCO, assunto era a composição da
1994, p. 11-12): dezena. Explicou o conteúdo oral-
mente, fez os alunos contarem
o princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em de 1 a 10 e não utilizou nenhum
todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível, outro recurso para ensinar. Paulo,
independentemente das dificuldades e das diferenças que que é estudante com deficiência
intelectual, ficou perdido na
apresentem. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as ne-
aula, e a professora entregou a
cessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários ele um desenho de uma árvore
estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom para pintar, enquanto os outros
nível de educação para todos, através de currículos adequados, iriam registrar o que ela ensinou.
de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, Se você estivesse presenciando
de utilização de recursos e de uma cooperação com as respec- essa integração, que sugestões
daria para a professora incluir o
tivas comunidades. É preciso, portanto, um conjunto de apoios
estudante Paulo?
e de serviços para satisfazer o conjunto de necessidades espe-
ciais dentro da escola.

Currículo escolar inclusivo 27


Considerar o ritmo dos estudantes e os estilos de aprendizagem,
flexibilizar e adaptar o currículo, valorizar as potencialidades, bem
como compreender as limitações e entender que a escola é direito de
todos significa a consolidação da inclusão educacional.

1.5 Ações colaborativas na escola inclusiva


Vídeo Muito já foi conquistado, mas é fato que ainda temos desafios
para chegar à qualidade desejável na educação inclusiva, e eles se-
rão superados se ampliarmos, cada vez mais, as ações colaborati-
vas. Devemos entender que, quando o atendimento educacional é
oferecido para pessoas com deficiência, o professor precisa da co-
laboração de todos os envolvidos com o estudante: Estado, família,
equipe escolar, professores especialistas, profissionais da área de
saúde. Todos trabalhando de maneira afinada.

Você já observou uma orquestra? Por que a melodia é tão per-


feita? A resposta é simples, mas o esforço é grande: é preciso
trabalhar em sinergia. Assim como em um concerto, para garan-
tir uma escola inclusiva, é preciso que haja essa sinergia entre os
envolvidos.

Vamos entender, do macro para o micro, quais são os atores


no trabalho colaborativo para garantir a educação inclusiva. Se
consultarmos a Constituição Federal, art. 205, encontraremos a se-
guinte afirmação: “a educação, direito de todos e dever do Estado
e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade” (BRASIL, 1988). Portanto, nesse artigo já se evidencia a
responsabilidade do Estado no sentido de promover políticas de
educação inclusiva, isto é, a garantia de acesso à educação públi-
ca, sem qualquer tipo de discriminação, e a garantia de qualidade,
além da disponibilização de recursos para a formação de professo-
res e para atender à educação na sua diversidade. Podemos dizer
que essas são as primeiras ações colaborativas, e elas partem de
um sistema maior, o Estado.

No que diz respeito à família, o parágrafo 6° da Declaração de


Salamanca (UNESCO, 1994) enfatiza que: “o sucesso delas [das es-
colas inclusivas] requer um esforço claro, não somente por parte

28 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


dos professores e dos profissionais na escola, mas também por
parte dos colegas, pais, famílias e voluntários”. Portanto, sinaliza
que os pais dos estudantes com deficiência, bem como os estu-
dantes que não têm deficiência, precisam participar, fomentando a
cultura de respeito ao diferente, contribuindo com ações que for-
taleçam a educação para todos, afinal, a família é a primeira insti-
tuição da qual a criança faz parte, por isso, precisa ser integrada no
processo pela escola.

Mantoan (2006) explica a necessidade de a escola ter como par-


ceira a família e a comunidade para elaborar e tornar real o seu
projeto escolar, pois, com essa aproximação, será possível oferecer
um ensino de qualidade. Fica claro, portanto, que cada um deve
fazer a sua parte: a família cumprir com os seus deveres e a esco-
la, como instituição parceira, aproximar as famílias, fortalecendo o
processo de inclusão.

Ações colaborativas entre os funcionários da escola, trabalhan-


do todos com a mesma filosofia, compreendendo a diversidade,
na teoria e na prática, excluindo o pensamento e a atitude de que
pessoas com deficiência não são capazes de aprender são muito
importantes para a garantia da inclusão. O trabalho colaborativo
entre os professores é de fundamental importância, porque, jun-
tos, poderão repensar práticas, desenvolver estratégias de ensino,
sugerir implementações na proposta pedagógica, entender as po-
tencialidade e dificuldades dos estudantes com deficiência ou com
outras dificuldades, adaptar e flexibilizar o currículo.

Para Peterossi (2005, p. 31): “essa possibilidade de trabalho


colaborativo se dá por meio do diálogo entre os professores. É
fundamental estarmos abertos ao diálogo, a construir diálogos,
reconhecendo nossas limitações para podermos aprender com o
outro, com os outros, nossos alunos, nossos companheiros, nos-
sos pares”.

Outra questão importante é o trabalho colaborativo entre o


professor de sala de aula e o professor da sala de recursos, de
apoio permanente ou de outros atendimentos especializados. Es-
ses profissionais precisam “falar a mesma língua”, pois de nada
adianta o professor especialista considerar as limitações do estu-

Currículo escolar inclusivo 29


dante e incentivá-lo, reforçando as suas habilidades, se o professor
da sala de aula não colaborar, não utilizar a mesma metodologia.
Os professores de atendimentos especializados devem colaborar
com o professor da sala de aula, ajudando no planejamento, adap-
tando materiais que servirão para todos os alunos, não somente
para os que têm deficiência, por meio do ensino colaborativo, o
qual:
visa apoiar as qualidades e necessidades de cada um e de
todos os alunos da escola. Enfatizando a necessidade de se
pensar na heterogeneidade do alunado como uma questão
normal do grupo/classe e por em macha um delineamento
educativo que permita aos docentes utilizar os diferentes ní-
veis instrumentais e atitudinais como recursos intrapessoais
e interpessoais que beneficiem todos os alunos. (SÁNCHEZ,
2005, p. 12)

Devemos salientar que ensinar de maneira colaborativa é ambos


terem a clareza dos objetivos a serem alcançados. Essa ação deixa
de ser cooperativa quando cada professor tem o seu planejamento
individualizado. Por isso, é preciso a interação das metas a serem
alcançadas. É necessário também considerar os profissionais de
saúde como colaboradores da educação inclusiva. Assim como o
professor, a escola, de modo geral, deve receber orientações da
psicóloga, da fonoaudióloga, do neurologista, da psicopedagoga,
do oftalmologista, enfim, de todos os profissionais que atendem o
estudante com deficiência. Esse compartilhamento de informações
contribui para a maior segurança da escola nas suas ações diante
da diversidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esperamos que os estudos deste capítulo tenham ampliado o seu co-
nhecimento prévio sobre o currículo e que você tenha percebido a exis-
tência de muitos elementos contribuintes para um currículo inclusivo. Não
é possível considerar uma definição isolada ou uma única prática. Traba-
lhar com a diversidade, construindo uma escola de qualidade, que ofereça
aprendizagem para todos os alunos, requer a formulação de pensamen-
tos e ações articulados, bem como a quebra de paradigmas educacionais
e de conhecimentos e atitudes por parte de todos os envolvidos no pro-
cesso. O assunto não se esgota aqui, há ainda muito o que aprender para
nos tornarmos agentes no processo de inclusão educacional.

30 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


REFERÊNCIAS
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Currículo escolar inclusivo 31


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GABARITO
1. A construção de um currículo é muito mais do que listar disciplinas, pois envolve a
participação de muitos elementos: família, professores, legislação, sociedade etc. O
currículo deve conter estratégias de ensino, adaptações e planejamento para ensinar
a todos os alunos.

2. Acessibilidade atitudinal é a capacidade de conviver com o outro, sem preconcei-


to e discriminação. Ela pode ser estimulada por meio de ações com os alunos, os
professores e a família, de palestras, de leituras e de dinâmicas de sensibilização. Um
exemplo seria, nas reuniões de pais, apresentar evidências de atitudes, em sala de
aula, que demonstram o trabalho colaborativo dos docentes e discentes, independen-
temente de suas dificuldades e diferenças. A convivência de todos os estudantes de
modo natural, sem discriminação no momento do ensino, é uma ótima maneira de
promover a acessibilidade atitudinal.

3. Para a integração do estudante, é preciso envolver outras estratégias de ensino, como


a utilização de material concreto, o desenho dos dez elementos e o uso de recursos
didáticos, por exemplo, o ábaco e o material dourado.

32 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


2
Ensino e aprendizagem
na educação inclusiva
Para que seja possível um ensino de qualidade e a aprendi-
zagem de todos os estudantes na perspectiva de uma educação
inclusiva, a harmonia é fundamental. Este capítulo possibilitará
compreender, tanto na teoria quanto na prática, a importância da
harmonia entre currículo, planejamento e avaliação; entre a sala
de aula comum, os atendimentos especializados e a família; e prin-
cipalmente entre os profissionais. Veremos que, para atender à
diversidade, a escola precisa mudar, considerar as especificidades
dos estudantes e propor soluções adequadas.

2.1 Tríade da educação: currículo,


Vídeo planejamento e avaliação
Quando pensamos sobre o que significa uma tríade, de imediato
a relacionamos à junção de três elementos que, quando articulados,
apresentam um conjunto maior. Por exemplo, na música, a represen-
tação de três sons forma um acorde; na área de gestão existe a tríade
dos Ps: pessoas, processos e produtos; na religião há a trindade: pai,
filho, espírito santo; ao estudar meio ambiente, deparamo-nos com a
tríade indivíduo, sociedade e espécie. E na escola? Com o objetivo de
promover o ensino e a aprendizagem de estudantes com deficiência
ou dificuldade de aprendizagem, será que existem tríades importantes
que precisam ser compreendidas e fortalecidas?

Com certeza, muitas tríades são relevantes no processo de ensino,


como: aluno, escola e família; ou ensinar, cuidar e educar; e muitas
outras que você certamente já encontrou em suas leituras. No entan-
to, destacamos uma tríade fundamental quando se deseja uma escola
inclusiva, a tríade: currículo, planejamento e avaliação.

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 33


A compreensão desses elementos articulados na teoria e na prática
– sem considerar um como mais relevante que o outro, pois ambos têm
seu grau de importância no processo – ajuda a responder a algumas
perguntas que chamam a atenção dos indivíduos envolvidos no ensino
escolar e preocupados com a aprendizagem dos alunos. São elas:

o que fazer quando o aluno não aprende?

de que forma ensinar a turma toda, tendo em vista tantas diferenças?

Para responder a essas perguntas, ou pelo menos tentar, porque


não há receitas prontas na educação, vamos compreender passo a
passo a tríade aqui apresentada, voltando nosso olhar para a apren-
dizagem de todos, pois é assim que devemos entender uma educa-
ção inclusiva.

O currículo deve ter como alicerce as competências elencadas na Base


Nacional Comum Curricular (BNCC), considerando a realidade. Ou seja, o
currículo que parece ideal para uma região, para uma instituição escolar,
ou para um público, não necessariamente será o ideal para todos.

Vamos tomar como exemplo o currículo para as escolas indígenas.


De acordo com Rezende (2007, p. 174):
o currículo da escola precisa ser um instrumento de valoriza-
Saiba mais ção dos saberes e processos próprios de produção e recriação
O material intitulado Os de cultura, tradições e línguas. Além disso, os educandos tam-
princípios e as particula- bém precisam ter contato com o conhecimento historicamente
ridades das escolas indí-
acumulado, para que tenham condições de acesso à sociedade
genas brasileiras é uma
leitura muito enriquece- comum na qual estão inseridos, pois o fato de estarem na comu-
dora para a compreensão nidade indígena, não os impede de terem acesso a tudo aquilo
e a valorização da cultura que lhes é de direito.
indígena e, também,
para o trabalho com a
Não se trata de pensar em um currículo apenas para atender à rea-
diversidade.
lidade, é preciso pensar sobre ela também. O conhecimento deve ser
Disponível em: https://labedu.org.
br/principios-particularidades- oferecido para todos, mas é preciso programar a sua dosagem, valori-
escolas-indigenas-brasileiras/. zar os saberes, a cultura, as tradições e a língua e considerar o que está
Acesso em: 22 jul. 2020.
determinado para cada ano de escolaridade.

34 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Imagine uma escola que acolhe muitos estudantes com dificulda- Livro
des cognitivas. No momento da construção do currículo, essa rea-
lidade precisa ser considerada. Isso não significa não oferecer os
conteúdos de direito de todos, mas sim pensar nas estratégias para
ensiná-los. Assim, o currículo deixa de se prender apenas ao dis-
curso e passa a valorizar as fases do desenvolvimento dos sujeitos,
sendo organizado de acordo com as estruturas cognitivas de seus
estudantes (SAVIANI, 2006).

Você deve estar se perguntando: qual é a função do planejamento A obra Saber escolar, currí-
nessa tríade? Vamos partir do pressuposto de que planejar faz parte culo e didática: problemas
da unidade conteúdo/
do dia a dia de todos nós. Planejamos uma construção, uma compra, método no processo peda-
uma refeição diferenciada, uma festa, um encontro com os amigos, gógico trata basicamente
de questões relativas à
enfim, planejamos, planejamos e planejamos e podemos afirmar que, conversão do conheci-
enquanto fazemos isso, estudamos, porque realizamos pesquisas, mento em saber escolar
e sua manifestação na
comparamos preços, definimos datas etc. elaboração de currículos
e na constituição tanto
Para planejar o ensino, é necessário estudar os conteúdos, a das disciplinas esco-
realidade e a forma de ensinar e planejar o processo de avaliação. lares quanto dos seus
respectivos programas,
O planejamento norteia todo o processo educacional; ele ocorre em relação a aspectos
no desenvolvimento do currículo e das aulas, na distribuição do do desenvolvimento do
processo pedagógico.
tempo escolar e na elaboração da avaliação. Para Mittler (2003, p.
SAVIANI, N. 5. ed. Campinas:
43), “ao planejar os professores devem estabelecer expectativas al- Autores Associados, 2006.
tas e criar oportunidades para todos os alunos aprenderem com
sucesso”.

Portanto, em relação às perguntas iniciais do capítulo – o que fazer


quando o aluno não aprende? Como faço para ensinar a turma toda
com tantas dificuldades? – a resposta é: planejar o ensino. Além disso,
devemos acreditar que todos são capazes de aprender e criar oportu-
nidades para que a aprendizagem se efetive. Isso significa pensar nos
espaços, na sensibilização, nas estratégias de ensino, nos materiais
necessários, na temporalidade, enfim, pensar nas dimensões da aces-
sibilidade. O professor deve ter muito claro o que, para quem e como
vai ensinar. Precisa, também, saber que o mesmo conteúdo pode ser
ensinado por meio de diversas estratégias, visto que os alunos são di-
ferentes e aprendem de maneiras distintas.

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 35


Na sala de aula
A seguir são apresentadas práticas realizadas em uma turma do 5º
ano do ensino fundamental, em uma aula sobre verbos, advérbios e a
aplicabilidade desses conceitos no texto. Considere que nessa sala de
aula há três alunos com déficit intelectual e um aluno com deficiência
visual (cego), todos com laudo.
1. Utilizando atividade motora para ensinar

O professor seleciona frases compostas por verbos e advérbios que


têm como sujeito o nome dos alunos. Após a leitura de cada frase, um
aluno é escolhido para realizar a ação, por meio de uma dramatização.
•• João anda vagarosamente pela sala.
•• Ana bate o lápis rapidamente na mesa de trabalho.
•• Jéssica caminha até a porta lentamente.

Posteriormente, o professor solicita que cada aluno realize a ação


novamente; porém, ao ditar a frase, não menciona os advérbios. Ao
invés de falar “João anda vagarosamente pela sala”, diz somente:
•• João anda pela sala.

Na sequência, pergunta se houve mudança na ação: andar na sala e


andar vagarosamente na sala têm diferença?
2. Utilizando a leitura para ensinar

O professor convida os estudantes a realizar a leitura e interpretar


as frases sugeridas anteriormente – para o aluno cego, elas são dis-
ponibilizadas em braille. Em seguida, sugere-se a leitura da frase com
o advérbio e, depois, sem o advérbio. Ao final, é proposta a leitura de
tabelas com os tipos de advérbios.
3. Utilizando a escrita para ensinar

O professor convida os estudantes a escrever as mesmas frases,


agora destacando os advérbios.
•• João anda vagarosamente pela sala.

Depois, o docente sugere que as reescrevam retirando o advérbio


e percebendo se houve modificação na interpretação da frase após a
alteração. O aluno cego realiza a atividade oralmente.

36 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


4. Utilizando objetos para ensinar

O professor sugere a brincadeira objeto/palavras/ação que funciona


da seguinte maneira: em uma caixa são colocados alguns objetos (por
exemplo, garfo, blusa, bolsa); em outra caixa, os advérbios de modo;
e, em uma terceira caixa, os verbos. Um dos estudantes é convidado a
tirar um objeto, um advérbio e um verbo e formar a frase oralmente. As
palavras também devem estar em braille para o estudante cego.

Objeto Advérbio Verbo

bolsa rapidamente comprar

Essa é uma aula que permite a participação de todos os estudantes,


independentemente de suas diferenças, pois aborda o mesmo conteú-
do, ensinado de várias maneiras. O material para o estudante com de-
ficiência visual deverá ser preparado pelo professor da sala de recursos
multifuncional.

Ensinar na diversidade exige pensar e executar o planejamento de


modo dinâmico, com foco na realidade. Conforme Mantoan (2003, p. 41):
ensinar a turma toda reafirma a necessidade de se promover
situações de aprendizagem que formem um tecido colorido de
conhecimento, cujos fios expressam diferentes possibilidades de
interpretação e de entendimento de um grupo de pessoas que
atua cooperativamente, em uma sala de aula.

Isso significa que o diálogo é fundamental na sala de aula, pois é


preciso procurar entender de que forma cada aluno, com sua experiên-
cia de vida e seus conhecimentos prévios, pode contribuir para ampliar
o conhecimento de todos no grupo, inclusive do professor, que deve
ensinar e aprender simultaneamente.

Na tríade currículo, planejamento e avaliação, com o objetivo de


ensinar todos os alunos e garantir a aprendizagem, podemos afirmar
que a avaliação ocupa um lugar de importante destaque – e não o úl-
timo, ou seja, o fim do processo. Ela precisa ser compreendida como
um princípio de aprendizagem para o estudante e professor, não se
limitando a testes utilizados de maneira igualitária para medir o co-
nhecimento da turma ou sendo usada como “instrumento fechado, um

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 37


ritual que acontece nas escolas com a finalidade de compor a nota dos
alunos” (METZ; PIENTA, 2011, p. 156).

Na educação inclusiva, a avaliação escolar deve ter a finalidade de


detectar avanços específicos, considerando limitações e habilidades in-
dividuais, como um instrumento para reorganizar o planejamento do
professor, com o objetivo de “ensinar melhor”.
A avaliação deverá ser assumida como um instrumento de com-
preensão do estágio de aprendizagem em que se encontra o
aluno, tendo em vista tomar decisões suficientes e satisfatórias
para que possam avançar no seu processo de ensino aprendiza-
gem. Se é importante aprender aquilo que se ensina na escola, a
função da avaliação será possibilitar ao educador condições de
compreensão do estágio em que o aluno se encontra, tendo em
vista poder trabalhar com ele para que saia do estado defasado
em que se encontra e possa avançar em termos dos conheci-
mentos necessários. (LUCKESI, 2002, p. 81)

Essa compreensão do nível de aprendizagem, em que se encontra


cada sujeito, aplica-se a todas as etapas e modalidades de ensino. So-
mente conhecendo de fato como o estudante está é que será possível
dizer o que ele aprendeu. Assim, é importante ter clareza desse gráfico
evolutivo do professor. A seguir, vemos alguns exemplos práticos de
progresso na aprendizagem.

Exemplo 1
Um estudante do 2º ano do ensino fundamental, com déficit cognitivo, iniciou o
ano letivo conhecendo parcialmente as letras do alfabeto e, ao final do ano, con-
seguiu aprender a ler e escrever palavras compostas por duas sílabas simples,
enquanto os demais estudantes da turma aprenderam a ler e escrever textos
completos. Isso não significa que esse aluno deva ser reprovado, pois é preciso
considerar o que ele conseguiu, seu progresso na aprendizagem, e não o que
ele teria que ter atingido. É necessário considerar seus limites de aprendizagem.
Exemplo 2
Um estudante da Educação de Jovens e Adultos (EJA) tem 68 anos e inicia a
primeira etapa da escolaridade com o desejo de aprender a escrever. Consegue,
após muito esforço, escrever o seu nome e o de seus netos em letras maiúsculas.
Esse aluno precisa ser avaliado pelo seu esforço, considerando suas dificuldades
de coordenação motora fina, comparando o que ele sabia anteriormente e o que
conseguiu aprender.

38 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


É esse o sentido da avaliação no processo de inclusão. Se o processo
avaliativo for compreendido apenas como instrumento de aprovação e
reprovação, alunos com deficiência ou dificuldades serão, certamente,
excluídos do sistema. Para Mantoan (2003, p. 25):
o acesso a todas as séries do ensino fundamental (obrigatório)
deve ser incondicionalmente garantido a todos. Para tanto, os cri-
térios de avaliação e de promoção, com base no aproveitamento
escolar e previstos na LDB de 1996 (art. 24), devem ser reorganiza-
dos, de forma a cumprir os princípios constitucionais da igualdade
de direito ao acesso e à permanência na escola básica, bem como
do acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da
criação artística, segundo a capacidade de cada um.

A autora reforça que, para ensinar a turma toda, é necessário acabar


com a visão de que a avaliação serve para classificar os alunos, perceben-
Atividade 1
do que eles possuem competências distintas. A avaliação deve ser instru-
Uma estudante do 4º ano do
mento para um ensino mais eficiente, e não para exclusão do estudante.
ensino fundamental ainda não
Dessa forma, a avaliação permite ao professor reestruturar sua prá- desenvolveu a competência para
produzir textos, pois tem uma
tica, pensar em estratégias diferenciadas e identificar em que momen- deficiência cognitiva, o que torna
to do seu planejamento ocorreram falhas que precisam ser ajustadas. o seu processo de alfabetização
Como afirmam Libâneo, Oliveira e Toschi (2012, p. 476): muito mais complexo. Ela está
aprendendo mais lentamente
a avaliação permite pôr em evidência as dificuldades surgidas que os demais. Na aula de
na prática diária, mediante a confrontação entre o planejamen- produção textual, a professora
to e o funcionamento real do trabalho. Visa ao melhoramento explora com imagens, palavras
e teatro a importância da
do trabalho escolar, pois, conhecendo a tempo as dificuldades,
preservação da natureza e pede
pode-se analisar suas causas e encontrar meios de superá-las. que os alunos produzam um
texto relacionado ao conteúdo.
Assim, a tríade currículo, planejamento e avaliação não deve se li-
No entanto, para a estudante,
mitar apenas a documentos; ela precisa ter vida, estar em movimento a professora pede que escreva
com atitudes práticas, pois somente unindo os três processos é possí- somente palavras relacionadas
ao tema. A professora agiu
vel entender que ensinar é um ato contínuo, um processo, e que apren- corretamente? Justifique.
der é cognitivo e, por isso, difere de uma pessoa para a outra.

2.2 Preparação e atuação do professor


Vídeo Grande parte dos profissionais da educação não se sente preparada
para trabalhar com inclusão. Mas, afinal, o que significa estar prepara-
do para trabalhar com a diversidade? Para desencadear essa reflexão,
apresentaremos uma lenda muito interessante, que nos permite pen-
sar a inclusão do ponto de vista de nossas atitudes pessoais.

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 39


Você conhece ou já ouviu falar em um pássaro chamado quero-quero? Se ainda
não, procure pesquisar e observar a natureza. Conheça a lenda desse pássaro aces-
sando o link a seguir. Essa história ajudará a compreender a preparação e a atuação do
professor.
Disponível em: http://www.portaldosanimais.com.br/curiosidades/lenda-do-passaro-quero-quero. Acesso em:11 jun. 2020.

Afinal, qual é a relação dessa lenda com o professor que trabalha


na e para a diversidade? A comparação da lenda do quero-quero com
a docência desencadeia algumas reflexões, como as descritas a seguir.
•• Trabalhar na docência exige que o professor reveja sua prática.
Ele não poderá apenas pensar na transmissão de conhecimento e
naquela aula mais fácil de conduzir; deve haver dinamismo e cria-
tividade. Ele precisa levar em consideração os estudantes, e não a
si mesmo, pois a comodidade de uma aula expositiva, que parece
servir para todos, não traz resultados numa perspectiva inclusiva.
•• O professor que trabalha com a diversidade, apesar das limita-
ções, não pode apenas ficar reclamando, lamentando-se porque
em sua sala de aula há alunos com deficiência, achando que não
é capaz de ensinar a todos os estudantes, desacreditando da ca-
pacidade de aprendizado deles. Ele precisa saber ouvir outros
professores e seus alunos e quebrar paradigmas. Repetir o que
sempre fazia não é a saída.
•• O professor precisa desejar fazer a diferença e, para isso, deve
querer duas vezes, isto é, querer tanto possuir o conhecimento
teórico quanto ter atitudes práticas.

De acordo com Sonza, Salton e Dall’agnol (2018, p. 70):


na realidade brasileira, os professores têm se deparado com
um número cada vez mais crescente de estudantes com neces-
sidades educacionais específicas em suas salas de aula. Nesse
sentido, alguns conflitos se destacam: a tendência da invisibili-
dade destes em sala de aula, a insegurança para intervenções
didático-pedagógicas, o sentimento de falta de formação para
organizar um planejamento capaz de atender a esses alunos,
entre outros. São conflitos unânimes numa parcela significativa
de professores.

Certamente, essa não é apenas uma realidade brasileira, pois, de


uma maneira geral, professores que atuam em diferentes etapas de

40 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


ensino estão vivendo essas incertezas. O fato é que não existe fórmula
pronta; é um processo de construção de saberes que o docente só vai
conseguir alcançar quando unir a teoria à prática. Há situações em que
a teoria explicará a prática e vice-versa.

Na sala de aula

Em uma situação real de sala de aula, você observa um estudante


com muita dificuldade para organizar seus desenhos na folha de papel.
Você vai buscar o que isso pode significar, e a teoria explica que pode
ser uma dificuldade relacionada à organização espacial. Você, então,
estuda sobre a importância da organização espacial nos anos iniciais.
Quando está novamente em sala de aula, nota que um estudante não
consegue organizar as letras na folha de papel. No mesmo momento,
confirma que esse pode ser mais um caso que diz respeito à organiza-
Curiosidade
ção espacial, pois a prática explica a teoria.
Diante de um estudante
que não está alfabetiza-
do, não basta o professor
saber sobre os níveis de
O professor precisa mergulhar em um processo de pesquisa e re- alfabetização; ele precisa
flexão, que depende muito da interação com o saber, o grupo de pro- saber quais atividades
são ideais para o nível
fessores, os estudantes com deficiência e o contexto educacional, pois que o estudante está
trabalhar individualmente dificulta o ensino na diversidade. “No ques- e, com base nesse
conhecimento teórico,
tionamento da própria prática, nas comparações, na análise das cir- aplicar essas atividades
cunstâncias e dos fatos que provocam perturbações e/ou respondem em sala de aula. Se o
estudante não consegue
pelo sucesso escolar, os professores vão definindo, pouco a pouco, as fazer a junção das sílabas
suas ‘teorias pedagógicas’” (MANTOAN, 2003, p. 44). bo + lo para formar a
palavra bolo, precisa de
Mantoan (2003) enfatiza que, para construir caminhos pedagógicos atividades de consciência
fonológica, que o ajudem
para a inclusão, é preciso que haja interação entre os próprios profes-
a perceber os sons das
sores. Assim, cada docente vai construindo seu próprio saber, que não sílabas. Um objeto que
ajudará muito a praticar é
se limita à reprodução do que vivenciou em cursos e palestras e nem
o sussurofone ou telefone
ao conhecimento teórico, mas ao saber-fazer, ao saber prático. A for- de tubo. Acesse o link
para ler uma reportagem
mação de grupos de estudos para discutir situações reais e experiên-
sobre essa ferramenta.
cias concretas do dia a dia, à luz de conhecimentos teóricos, fortalece a
Disponível em: https://noticias.
formação do professor para atuar com inclusão. r7.com/cidades/folha-vitoria/
sussurrofone-e-ferramenta-para-
Mas por que ainda nos deparamos com professores com vasto sa- estimular-e-facilitar-leitura-em-
ber teórico e que no momento de trabalhar com a diversidade ficam escola-de-viana-21112018. Acesso
em: 14 jun. 2020.
estagnados, não conseguem ensinar e, muitas vezes, até se recusam a

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 41


receber um estudante com deficiência ou dificuldades em sala de aula?
Livro O que os bloqueia?

Estamos tratando da atuação do professor diante da diversidade;


por isso, precisamos salientar alguns aspectos. O professor deve acre-
ditar em si mesmo, crer que é capaz de ensinar a todos os alunos, os
que têm ou não deficiência, rompendo os seus medos e suas insegu-
ranças diante da diversidade e tendo atitude, sendo capaz de mudar.

As coisas são diferentes,


Mittler (2000), citado por Rodrigues (2006), enfatiza que o sentimento
tudo depende do ponto de incompetência para trabalhar do docente do ensino regular, prin-
de vista. O livro O frio
pode ser quente? é indica-
cipalmente com estudantes com deficiência, está relacionado ao fato
do para ler para e com de os professores especialistas sempre realizarem esse atendimento,
os alunos, preparando-os
para a diversidade, além
o que fortalece uma sensação de incapacidade naqueles que não pos-
de auxiliar o professor no suem essa especialidade. Daí a necessidade do trabalho cooperativo
trabalho com a inclusão.
entre os profissionais, com o objetivo de ensinar a todos os alunos,
MASUR, J. 19. ed. São Paulo: Ática,
2015.
independentemente de suas dificuldades.

Para trabalhar na diversidade, o professor precisa ser observador


e não ter preconceitos. Observar cada estudante, não apenas na sua
dificuldade, mas na sua capacidade, é o primeiro passo para trabalhar
com inclusão. Tudo depende de como vemos a situação, do quanto es-
tamos dispostos a interpretá-la e do quanto queremos entender cada
aluno na sua especificidade.

Conhecer a realidade e compreendê-la faz com que o professor se


sinta seguro ao ministrar a aula. Ele consegue visualizar em que lugar
está e aonde quer chegar, bem como o que pode fazer para alcançar
o seu sucesso profissional e o sucesso escolar de seus alunos. Para
Pacheco (2007, p. 150):
os professores precisam conhecer o estado de desenvolvimento
dos alunos para encontrar as tarefas apropriadas. Isso significa
que eles precisam observar os alunos para saberem para o que
eles estão prontos. Recomenda-se que os professores envolvam
os alunos nos estabelecimentos de objetivos para as habilidades
sociais assim como para as tarefas cognitivas.

É no processo de observação que o professor vai reconhecer as fa-


cilidades e as dificuldades da turma, perceber os ritmos de aprendi-
zagem e, dessa forma, ser capaz de planejar. Com o mapeamento da
realidade, fica muito mais fácil escolher as melhores técnicas de ensino
e garantir que todos os estudantes progridam na aprendizagem, tanto
nos aspectos sociais quanto nos cognitivos.

42 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Pesquisas teóricas devem ser realizadas para que toda deficiência
ou dificuldade seja compreendida pelo professor, pois cada uma delas
tem características específicas. Se na sala de aula o professor tem um
aluno com Transtorno do Espectro Autista (TEA), por exemplo, é sua
obrigação conhecer sobre o transtorno para adequar sua prática peda-
gógica. Mantoan (2003) enfatiza que o compromisso com uma qualida-
de do ensino, que responda às características individuais dos alunos,
está na formação continuada do professor.

Fica claro que, para o docente estar bem preparado para ensinar
na diversidade e garantir a aprendizagem dos estudantes com os quais
trabalha, precisa constantemente estudar e aperfeiçoar a sua prática.
No entanto, essa atitude é pessoal e não pode ser obrigatória, pois não
surtiria os mesmos efeitos. Ser um professor inclusivo é acreditar em si
e no aluno, não ter preconceitos, observar a realidade e estudar muito
para entender a diversidade.

2.3 Sala de aula e atendimentos especializados


Vídeo A Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) assegura que todas as
crianças devem aprender juntas, não importando suas singularidades,
e a escola deve dar condições para que isso aconteça.

Sabemos que nem sempre é possível – na sala de aula comum, em


turmas diversificadas e com um número significativo de estudantes – o
professor sozinho dar conta de ensinar com qualidade todos os alu-
nos; seria utopia pensar nessa possibilidade. Usando uma metáfora
bem simples, imagine uma panela de pressão prestes a explodir, é as-
sim que o professor da sala de aula comum se sente quando não tem
apoio, principalmente para ensinar estudantes com deficiência.

A escola deve dar condições ao docente para atender à diversidade


e, quando se trata de estudantes da educação especial, a legislação ga-
rante a implantação de Atendimento Educacional Especializado (AEE);
essa garantia de AEE não é recente. Quando o assunto é inclusão edu-
cacional, marcos legais tornam esse serviço obrigatório.

A Constituição Federal de 1988, maior lei do país, traz no seu artigo


206, inciso I, a “igualdade de condições de acesso e permanência na
escola” e determina como dever do Estado a oferta do atendimento
educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 43


(BRASIL, 1988). Ainda, conforme previsto na LDB (BRASIL, 1996): “art.
4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado me-
diante a garantia de: [...] III – atendimento educacional especializado
gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmen-
te na rede regular de ensino” (BRASIL, 1996).

Mas, afinal, o que é esse Atendimento Educacional Especializado? Se-


gundo o texto da Política de Educação Especial, na perspectiva inclusiva
(BRASIL, 2008), esse é um serviço criado para atender ao público da educa-
ção especial durante o processo de inclusão, isto é, oferecer atendimento
aos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades em todas as etapas de ensino e modalidades.

O AEE não precisa ser realizado somente na sala de recursos multi-


funcionais, pode também acontecer na classe comum, com o trabalho
colaborativo dos dois professores, planejando atividades pedagógicas
que atendem às singularidades dos estudantes. As ações colaborativas,
com objetivos comuns, e a utilização de recursos tecnológicos, huma-
nos e materiais visam desenvolver o aluno de modo integral e promo-
ver acessibilidade e aprendizagem (BRASIL, 2018).

Segundo o documento, integram o AEE:


ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras) e ensino da língua
portuguesa como segunda língua, na modalidade escrita. Ensino
da língua portuguesa para estudantes surdos oralizados. Ensino
do Sistema Braille. Ensino das técnicas de cálculo no Soroban.
Ensino das técnicas de orientação e mobilidade. Ensino do uso
de recursos ópticos e não-ópticos para estudantes cegos ou com
baixa visão. Utilização de estratégias para o desenvolvimento
de processos mentais. Uso de tecnologia assistiva. Usabilidade
e funcionalidade da informática acessível. Uso da comunicação
alternativa e aumentativa (CAA). Uso de estratégias para enrique-
cimento curricular para estudantes com altas habilidades/super-
dotação. (BRASIL, 2018, p. 26)

É importante salientar que esse atendimento não deve acontecer


isoladamente, pois é um trabalho de parceria entre o professor do AEE
com o professor da sala de aula comum e precisa ter como objetivo
auxiliar o estudante na aprendizagem, bem como ajudar o docente da
sala comum nas estratégias de ensino. Os dois professores deverão
apoiar e ensinar o aluno, dando o equilíbrio necessário para superar
suas dificuldades. Assim, eles precisam se tornar apoio para o estu-

44 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


dante aprender e se desenvolver integralmente nos aspectos físicos,
cognitivos, emocionais e sociais. Essa parceria objetiva equilibrar o en-
sino e a aprendizagem, uma vez que um professor não é melhor ou
mais importante do que o outro; ambos são necessários no processo
de inclusão educacional.

O estudante deve ser retirado da sala de aula para participar do


atendimento especializado? Não. Retirar o aluno no período de aula
não é adequado, porque estará sendo negado a ele o direito do acesso
ao currículo para todos e, assim, essa atitude seria considerada uma
exclusão educacional. O AEE ocorre em períodos específicos por sema-
na, no contraturno escolar, portanto, não substitui o ensino na sala de
aula comum. O que pode ocorrer é o estudante participar no contra-
turno de uma sala de recurso multifuncional ou ter em sua sala de aula
o professor especialista colaborando com o docente da turma – um
exemplo desse apoio é o intérprete de Libras.

As salas de recursos multifuncionais permitem o atendimento de di-


versos alunos, com diferentes necessidades. Isso é possível porque há o
cronograma de atendimento, organizado para o público que participará
em horários e dias diferenciados. Uma mesma sala de recursos pode
atender a alunos com deficiência, déficit de atenção, hiperatividade ou
altas habilidades. Assim, é necessário organizar o espaço e o material
de acordo com o público que será atendido em cada momento – por
exemplo, se o atendimento for para alunos surdos, é preciso pensar no
professor especialista em deficiência auditiva, que domine Libras, e no
material que será utilizado (ALVES, 2006).

Mas será que todo professor pode atuar na sala de recursos? Sim,
desde que atenda aos seguintes requisitos:
ter curso de graduação, pós-graduação e ou formação conti-
nuada que o habilite para atuar em áreas da educação especial
para o atendimento às necessidades educacionais especiais dos
alunos. A formação docente, de acordo com sua área especifica,
deve desenvolver conhecimentos acerca de: Comunicação Au-
mentativa e Alternativa, Sistema Braille, Orientação e Mobilida-
de, Soroban, Ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, Ensino
de Língua Portuguesa para Surdos, Atividades de Vida Diária, Ati-
vidades Cognitivas, Aprofundamento e Enriquecimento Curricu-
lar, Estimulação Precoce, entre outros. (ALVES, 2006, p. 17)

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 45


Em ambas as situações, no atendimento educacional especializado
e no colaborativo na sala de aula, o diálogo entre os professores é mui-
to importante, porque o planejamento deve ocorrer em conjunto, a fim
de identificar as barreiras que impedem a aprendizagem e de pensar
nas estratégias que serão utilizadas para romper essas barreiras. Além
disso, os dois professores não devem trabalhar sozinhos; eles precisam
contar com o apoio de toda a gestão escolar, sendo esse trabalho pre-
visto no projeto político-pedagógico (PPP) da escola.

De acordo com a Política de Educação Especial, na perspectiva inclu-


siva (BRASIL, 2008), o atendimento educacional especializado, quando
ofertado na educação infantil, tem por finalidade oferecer os serviços
de educação precoce, ou seja, incentivar o desenvolvimento da criança.
No ensino fundamental, auxilia no enfrentamento das dificuldades de
aprendizagem. Já na educação de jovens e adultos (EJA), objetiva am-
pliar a oportunidade de escolarização, auxilia na inserção do estudante
no mercado de trabalho e o ajuda a superar suas dificuldades.

O trabalho realizado na sala de recurso deve contar com uma va-


riedade de materiais para incentivar os estudantes e ensinar o que
ainda gera dificuldade, o que os impede de não ter um desempenho
satisfatório na sala de aula comum. Entre esses materiais, Alves (2006)
destaca os jogos pedagógicos, os quais podem ser comprados ou cons-
truídos com sucatas pelos próprios alunos. Esses jogos precisam ser
adaptados de acordo com a necessidade do estudante, por exemplo:
jogos com imagens em alto relevo para os alunos cegos; Libras para os
surdos; livros e materiais escritos em fonte maior ou audiolivros para
aqueles com baixa visão;
recursos específicos como reglete, punção, soroban, guia de
assinatura, material para desenho adaptado, lupa manual, cal-
culadora sonora, caderno de pauta ampliada, caneta ponta po-
rosa, engrossadores de lápis e pincéis, suporte para livro (plano
inclinado), tesoura adaptada, softwares, brinquedos e miniatu-
ras para o desenvolvimento da linguagem, reconhecimento de
formas e atividades de vida diária, e outros materiais relativos ao
desenvolvimento do processo educacional. (ALVES, 2006, p. 20)

Na sala de recursos, o estudante terá atendimento diferenciado,


como um complemento do que precisa aprender para o sucesso es-
colar. O PPP da escola deverá prever ações de acompanhamento da
articulação entre o professor da sala comum e o professor do AEE e

46 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


oferecer condições para que ambos possam ter espaço no seu horário
de trabalho para trocar ideias e planejar a melhor forma de atender
aos seus alunos.

É importante salientar que AEE não é um reforço escolar, não é


o espaço em que se retoma o que foi ensinado na sala de aula. O
AEE trabalha as habilidades dos estudantes e busca, por meio de
recursos acessíveis, ensinar o que ainda não foi aprendido. Ademais,
a consolidação do entrelaçamento da sala comum com os atendi-
mentos especializados depende do envolvimento e do empenho de
todos os profissionais.

2.4 Flexibilização e adaptação curricular


Vídeo Vamos pensar um pouco sobre as diretrizes da educação inclusiva?
De acordo com Oliveira (2008, p. 129):
a construção de sistemas educacionais inclusivos, obrigatória e
consequentemente, exige mudanças substanciais no interior das
escolas, pressupõe um movimento intenso de transformação da
escola e de suas práticas pedagógicas, com o objetivo de atender
adequadamente a toda a diversidade presente em seu interior.

O que temos aqui é uma afirmação de que, para a construção de sis-


temas inclusivos, a mudança é algo necessário nas escolas. Não se trata
apenas de uma mudança física, como colocar um caixote de madeira
para dar apoio a uma criança que não consegue alcançar o bebedouro
de água; estamos tratando de mudanças de atitude, implementação de
práticas que atendam à diversidade e alterações na maneira de pensar
e praticar o currículo.

Nesse sentido, a flexibilização e a adaptação curricular são ações


necessárias para que a mudança na aplicabilidade do currículo acon-
teça e permita a aprendizagem de todos os estudantes. Esses termos
parecem criar um jogo de palavras que busca dizer a mesma coisa, pois
os dois procedimentos são complementares, mas “a ideia é que a flexi-
bilização/adaptação seja uma prerrogativa para a celebração das dife-
renças em sala de aula” (FERNANDES, 2006, p. 27).

Para exemplificar, imagine a seguinte situação: você é convidado pelo


seu chefe para um jantar, porém, antes de se sentar à mesa, é orienta-
do que, mesmo sendo servido um delicioso vinho tinto, deveria apenas
tomar água, e você adora vinho. Além disso, deveria seguir as regras,

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 47


utilizando adequadamente o garfo na mão esquerda e a faca na mão
direita, do início ao fim da refeição, no entanto, você não tem essa ha-
bilidade. Também não deveria gesticular de modo algum com as mãos,
mas a verdade é que você praticamente conversa com as mãos. Ainda,
se encontrasse uma azeitona na refeição, discretamente deveria tirar o
caroço da boca com a ponta do garfo e colocá-lo na beira do prato. Você
se sentiria à vontade nesse jantar, motivado e feliz com o convite e an-
sioso pelo próximo? Provavelmente não. Entretanto, se as regras não
fossem tão rígidas, mas sim mais flexíveis, o momento seria aproveitado
com maior intensidade e haveria o desejo de retornar ao local.

Flexibilizar o currículo é praticamente isso, isto é, torná-lo suave,


elástico e fácil de manejar. Significa romper a cultura tradicional da es-
cola, que enfatiza o trabalho com a homogeneidade, e garantir o direito
à diferença no currículo, para que ele se torne confortável para todos
os estudantes.

É importante lembrar que currículo não é apenas um rol de con-


teúdos que devem ser ensinados; ele refere-se a procedimentos, es-
tratégias, avaliação, relações pessoais, cultura e realidade, enfim, é um
documento consideravelmente amplo, que necessita de flexibilização
para atender à diversidade. A seguir, apresentamos exemplos práticos
de flexibilização curricular.

Exemplo 1
O professor tem na sala de aula um estudante com Transtorno de Déficit de Atenção
e Hiperatividade (TDAH). Esse aluno é muito inteligente e não apresenta dificulda-
des de compreensão; o que o torna diferente do restante da turma é sua agitação
motora. Ficar muito tempo sentado em uma mesa de estudos, para ele, é um gran-
de sacrifício e atrapalha seu aprendizado. Pensando em um currículo menos rígido
e tradicional, o professor conversa com o estudante e orienta que, se necessário,
durante a aula, poderia sair alguns minutos da sala e dar uma volta no pátio, desde
que não demasiadamente. Dessa forma, o docente consegue melhores rendimen-
tos do estudante na aprendizagem. O professor também explica ao restante da
turma a necessidade de sua atitude, sem discriminar o aluno com TDAH, com a
intenção de trabalhar o conceito e a prática da inclusão na sala de aula.

Flexibilização curricular relaciona-se às características individuais


dos estudantes e convida todos a participar do processo educacional,
a ser protagonistas e a se identificar com o currículo. Quando a flexibi-

48 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


lização curricular está presente na sala de aula, não há engessamento
na prática pedagógica, na verdade, há mais opções na ação e na criati-
vidade, no conhecimento e na autonomia dos envolvidos.

Flexibilizar é movimentar algo no currículo. Essa movimentação vai


permitir que o aluno tenha conforto para aprender, por meio de mu-
danças nos modos de ensinar na prática da sala de aula, nas atividades
sugeridas, nos jogos etc. Segundo Carvalho (2009, p. 67), a flexibilidade
permite a “remoção das barreiras de aprendizagem. Traduz-se pela ca-
pacidade do professor de modificar planos e atividades à medida que
as reações dos alunos vão oferecendo novas pistas”. A flexibilização
curricular é importante para todos os estudantes, não apenas para os
que têm deficiência.

Exemplo 2
O professor, atuante na educação de jovens e adultos (EJA), combina com seus
alunos que na terça-feira todos devem ler um texto, na íntegra e fluentemente,
e, portanto, não podem faltar à aula. Muitos alunos estão iniciando o processo de
alfabetização e, quando chegam à sala de aula no dia estipulado, nota-se em seus
semblantes a preocupação, desmotivação e certeza de um possível fracasso na
atividade. O professor distribui os textos e, quando chama o primeiro aluno para
ler, este se dirige à frente da sala, tremendo de preocupação. O docente solicita,
então, que, antes de começar a ler, esse estudante convide mais dois colegas da
turma para lhe fazer companhia. O texto é dividido em três partes, uma para cada
um deles, e é permitido que primeiro seja feita a leitura silenciosa e, depois, a em
voz alta. Essa flexibilização na atividade faz com que todos os alunos se sintam
mais confortáveis e animados para estudar.

E a adaptação curricular? Como ela se aplica no ensino e aprendi-


zagem dos alunos? Para compreendê-la, primeiramente precisamos
retomar a questão do currículo. Os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN), uma coleção de documentos que norteia as atividades que serão
realizadas na sala de aula, entende o currículo como
ferramenta básica da escolarização; busca dimensionar o sentido
e o alcance que se pretende dar às adaptações curriculares como
estratégias e critérios de atuação docente; e admite decisões que
oportunizam adequar a ação educativa escolar às maneiras pe-
culiares de os alunos aprenderem, considerando que o processo
de ensino-aprendizagem pressupõe atender à diversificação de
necessidades dos alunos na escola. (BRASIL, 1998)

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 49


Nesse sentido, as adaptações curriculares são utilizadas para
atender às necessidades dos alunos, ou seja, a ação docente oportu-
niza a aprendizagem considerando a diversidade, consciente do que
cada estudante precisa, em sua individualidade, para progredir em
nível de conhecimento.

O mesmo documento enfatiza que a adaptação precisa considerar


o que, como e quando o estudante deve aprender; quais formas de or-
ganização dos processos de ensino serão mais eficazes para o processo
de aprendizagem; e como e quando avaliar o estudante.

As adaptações curriculares, segundo o Ministério da Educação


(MEC), podem ser classificadas como de pequeno ou de grande porte.
A denominação pequeno porte é “porque sua implementação encontra-
-se no âmbito de responsabilidade e de ação exclusivos do professor,
não exigindo autorização, nem dependendo de ação de qualquer ou-
tra instância superior, nas áreas política, administrativa, e/ou técnica”
(BRASIL, 2000b, p. 8).

O que isso significa? Significa que os procedimentos na sala de aula


permitem a inclusão, como: mudanças no método de ensino, na avalia-
ção, nos objetivos que se deseja atingir, nos materiais que utilizará, na
temporalidade, na organização do espaço da sala de aula e na elabora-
ção e execução do seu planejamento.

Já as adaptações chamadas de grande porte “compreendem ações que


são da competência e atribuição das instâncias político-administrativas
superiores, já que exigem modificações que envolvem ações de natureza
política, administrativa, financeira, burocrática, etc.” (BRASIL, 2000a, p. 9).

Alguns exemplos de adaptação de grande porte são:


a criação de condições físicas, ambientais e materiais para o
aluno, em sua unidade escolar: a adaptação do ambiente físico
escolar; a aquisição do mobiliário específico necessário; a aquisi-
ção dos equipamentos e recursos materiais específicos; a adap-
tação de materiais de uso comum em sala de aula; a capacitação
continuada dos professores e demais profissionais da educação;
a efetivação de ações que garantam a inter-disciplinaridade e a
transetorialidade. (BRASIL, 2000a, p. 14)

É importante lembrar que algumas adaptações significativas de con-


teúdo são também consideradas de grande porte e, por isso, não po-
dem ser decididas apenas pelo professor. Por exemplo, um aluno do

50 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


5º ano possui um laudo de discalculia e esse transtorno o impede de
aprender um assunto mais complexo de Matemática. A adaptação desse
conteúdo requer um estudo detalhado, que envolve Secretaria de Edu-
cação, família e escola. Por isso, é preciso saber diferenciar as adapta-
ções de pequeno porte das de grande porte para saber aplicá-las. Para
exemplificar, se na sala de aula há um estudante com deficiência física,
que faz uso de cadeira de rodas, organizar o espaço para que ele pos-
sa circular sem barreiras é atitude do professor (adaptação de pequeno
porte); já adaptar a estrutura física da escola, com banheiros adequados
e rampas de acesso, depende da administração da escola, do colegiado e
da Associação de Pais e Funcionários (adaptação de grande porte).

Voltando ao contexto escolar, é importante o professor saber que Saiba mais


adaptar não significa apenas propor atividades diversificadas, pois A zona de desenvolvimento
existem critérios para se fazer uma adaptação curricular, os quais pre- proximal é caracterizada pela
cisam ser considerados. É comum, nas salas de aula que possuem es- distância entre o nível de
desenvolvimento real e o nível
tudantes com deficiência, o professor ministrar um conteúdo e o aluno de desenvolvimento potencial.
com deficiência realizar outra atividade, que não tem relação alguma “A Zona de Desenvolvimento
Proximal define aquelas funções
com o tema que está sendo ensinado. Esse procedimento não pode
que ainda não amadureceram,
ser entendido como adaptação curricular, visto que, para aplicá-la, é mas que estão em processo de
preciso um diagnóstico, ou seja, identificar o que o estudante sabe e o maturação, funções que amadu-
recerão, mas que estão, presente-
que ele precisa aprender, conhecendo suas facilidades e dificuldades. A
mente, em estado embrionário”
adaptação deve ser sustentada pela avaliação diagnóstica do estudan- (VYGOTSKY, 1984, p. 97).
te e pela noção da zona de desenvolvimento proximal.

O conhecimento do que o estudante sabe e do quanto falta para ele


aprender aquilo proposto no currículo permite que o professor faça
uma adaptação adequada, isto é, nem muito fácil e nem muito difícil,
mas na dosagem certa. É possível estabelecer parâmetros sobre o que
o aluno precisa aprender sobre determinado assunto em uma semana,
em um mês e em um semestre, e pode ser que não seja o mesmo que
os demais estudantes irão aprender, porque podem estar em etapas
do desenvolvimento diferenciadas.

Outra questão muito importante é a adaptação curricular de ma-


neira adequada. Se o professor está ministrando, por exemplo, uma
aula de Matemática sobre divisão e na sala tem um estudante com de-
ficiência intelectual, que ainda não compreende o processo, o docente
deverá trabalhar com esse aluno o mesmo conteúdo, porém, utilizando
números menores e material concreto, como palitos e/ou um ábaco –
nada impede que todos da turma utilizem esse material. Isso é adaptar

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 51


pensando na inclusão. O que não pode acontecer é o estudante, que
não sabe a divisão, desenvolver outra atividade, como: pintar um dese-
nho, recortar figuras etc.
Atividade 2 O desafio é construir e pôr em prática no ambiente escolar uma
Quando observamos as coisas à pedagogia que consiga ser comum e válida para todos os alu-
nossa volta, as chances de co- nos da classe escolar, porém capaz de atender os alunos cujas
metermos erros diminuem signi- situações pessoais e características de aprendizagem requei-
ficativamente. Por exemplo: se
ram uma pedagogia diferenciada. Tudo isto sem demarcações,
você está dirigindo e observa um
buraco na pista, pode desviá-lo; preconceitos ou atitudes nutridoras dos indesejados estigmas.
se uma criança vai colocar uma (BEYER, 2006, p. 76)
pedrinha na boca, um adulto
pode impedir. Da mesma forma, No processo de flexibilização e adaptação curricular, a avaliação,
quando se trata de ensinar na muitas vezes, também precisa ser flexibilizada ou adaptada, tornan-
diversidade, o ideal é que o
do-se inclusiva. Ao planejá-la, é preciso considerar o que o professor
professor observe o quanto o
aluno sabe e o que ele precisa conseguiu ensinar e sempre se perguntar: fiz uma avaliação na me-
aprender. De que maneira essa dida certa para o estudante? Desse modo, a avaliação deve ser o fio
atitude do professor favorece sua
condutor das próximas ações do professor, ajudando-o a rever sua
prática na adaptação curricular?
prática pedagógica.

2.5 Relação professor/família


Vídeo Não são poucos os estudantes com deficiência ou dificuldades de
estudo nas salas de aula comuns, o que nos leva ao caminho para a
inclusão educacional. No entanto, quando se pretende intensificar o
trabalho de parceria entre professor e família, e vice-versa, precisamos
lidar com duas realidades distintas: o professor reclama que não há
participação dos pais no processo de ensino, alegando que eles são
ausentes, não ajudam nas tarefas de casa e superprotegem seus filhos,
porque eles têm deficiência ou dificuldades. Do outro lado, as famílias
reclamam do professor, pois, segundo elas, esse não compreende a
dificuldade de seu filho, não está aberto para o diálogo e manda muitas
tarefas para casa, as quais nem mesmo os pais sabem fazer.

E agora? Como resolver a situação? Quem está certo ou errado? Para


pensar sobre as respostas para esses questionamentos, vamos refletir
um pouco sobre o que é ser professor. Conforme Gadotti (2003, p. 3):
ser professor hoje é viver intensamente o seu tempo com cons-
ciência e sensibilidade. Não se pode imaginar um futuro para
a humanidade sem educadores. Os educadores, numa visão
emancipadora, não só transformam a informação em conheci-
mento e em consciência crítica, mas também formam pessoas.

52 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Em sua obra, o autor acrescenta que o professor não pode faltar na
sociedade, pois é ele quem constrói sentido para a vida das pessoas,
buscando um mundo mais justo para todos. É o docente que faz fluir
o saber, organiza a aprendizagem e enfatiza que, para ensinar, são ne-
cessárias principalmente duas coisas:
a) gostar de aprender, ter prazer em ensinar, como um jardinei-
ro que cuida com emoção do seu jardim, de sua roça; b) amar
o aprendente (criança, adolescente, adulto, idoso). Só aprende-
mos quando aquilo que aprendemos é “significativo” (Piaget)
para nós e nos envolvemos profundamente no que aprende-
mos. O que aprendemos deve fazer parte do nosso projeto de
vida. É preciso gostar de ser professor (autoestima) para ensi-
nar. (GADOTTI, 2003, p. 9)

Sendo assim, é possível concluir que ser professor é ser responsá-


vel pela escolarização de todos os estudantes para os quais ministra
aulas. Se fizéssemos uma busca em documentos e fontes que falam
sobre o que é ser professor, não encontraríamos nada que se referisse
a ensinar àqueles que aprendem com facilidade, a ter autonomia para
escolher seus estudantes ou a poder excluir um aluno por sua família
não colaborar ou não participar do processo de ensino.

Desse modo, as justificativas em relação ao aluno não aprender por-


que a família não participa não se fundamentam. Quando se escolhe a
profissão docente, é preciso se envolver, gostar de ensinar, aprender
sempre, conquistar todos os alunos com os quais convive e buscar for-
talecer os laços com as famílias. Mas como podemos estabelecer essa
relação com os familiares?
Quantos professores podem lembrar-se de qualquer atenção
que foi dada a eles para trabalhar com os pais durante o curso
universitário? Quantos tiveram oportunidade para frequentar
capacitações e cursos sobre as necessidades de pais e famílias
e como eles poderiam trabalhar juntos? (MITTLER, 2003, p. 207)

Pode ser que esse seja um motivo pelo qual projetos efetivos da
participação de pais na escola não se concretizam, mas não é o único.
Diante da necessidade, o professor precisa buscar a formação conti-
nuada e aprender a olhar para o outro lado, entender o dia a dia das
famílias que têm filhos com deficiência e aprender a se colocar no lu-
gar do próximo, compreendendo suas limitações e angústias. Essas
famílias, muitas vezes, culpam-se por seus filhos terem nascido dife-

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 53


rentes e, por esse motivo, os protegem demais e fazem de tudo para
defendê-los.

De acordo com Silva, Gaiato e Reveles (2012, p. 45), “o acolhimento


e a orientação para as famílias são fundamentais para que elas deixem
de lado crenças errôneas, e não se desgastem com culpas desnecessá-
rias e sem propósitos. Cuidar dos familiares, especialmente das mães,
é tão importante quanto cuidar das próprias crianças”.

Tendo isso em vista, é fundamental que o professor conheça a rea-


lidade, a história e o diagnóstico dos alunos. Além disso, que ele seja
sensível, no sentido de buscar a colaboração da família com ações de
parceria e não com cobranças intensas, pois, quando os responsáveis
percebem o interesse do professor em ensinar seus filhos, indepen-
dentemente de suas dificuldades, eles viram parceiros do docente no
processo de ensino. Para isso, os professores precisam trabalhar com
a prática da aproximação.

É necessário que a escola tenha atitudes de aproximação, como as


elencadas por Lentsck (2013, p. 25):
1. Parabenizar os pais pelas realizações positivas de seus filhos;
2. Eleger um grupo de pais para representantes de turmas;
3. Envolver os pais em atividades como contação de histórias e
gincanas;
4. Promover atividades desportivas envolvendo a participação dos
pais;
5. Realizar palestras e discussões com os pais sobre questões sociais
e culturais presentes no cotidiano escolar como: (saúde, drogas,
nutrição, adolescência, qualidade de vida, etc.), estabelecendo par-
cerias com profissionais especialistas na área que se proponham
em realizar um trabalho em prol da comunidade escolar.

A família também tem um papel importante no processo de ensino.


Basta recordar o que a Constituição Federal menciona no seu artigo
205: “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da ci-
dadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988). Portanto, é
obrigação dos familiares participar do desenvolvimento da criança, o
que envolve, também, o processo de ensino, que irá ajudá-la no desen-
volvimento de seus aspectos sociais, psicológicos e cognitivos.

54 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


A família precisa assumir suas responsabilidades e colocar-se no
lugar do professor que trabalha com os estudantes na sala de aula,
pois há situações em que ele precisa de respostas associadas à reali-
dade familiar. A colaboração dos pais ou responsáveis, com informa-
ções sobre o desenvolvimento da criança, auxiliará os professores a
compreender melhor o aluno e a pensar em práticas mais eficazes
para que ele aprenda, as quais podem ir muito além da sala de aula.

É com a família que um indivíduo tem suas primeiras experiências,


fortalece sua educação e apreende seus primeiros conhecimentos. A
escola é a segunda instituição da qual a criança participa, sendo o
local de valorização e ampliação de conhecimentos. Dessa forma, se
as duas instituições tiverem objetivos comuns, o maior beneficiado
será, certamente, o estudante. Para Tiba (2006, p. 183), “quando a es-
cola, o pai e a mãe falam a mesma língua e têm valores semelhantes,
a criança aprende sem conflitos e não quer jogar a escola os pais e
vice-versa”.

Lentsck (2013, p. 17) apresenta algumas atitudes que os pais podem


ter para participar da escola:
1. Procure a escola quando notar que seu filho(a) apresenta alguma
dificuldade, converse com os professores, gestores e pedagogos;
2. Elogie os progressos que ocorrem, chame atenção quando ne-
cessário, sem ofender;
3. Valorize a pessoa e a função do professor, diretor e demais
funcionários;
4. Visite escola, observe sua organização, converse com gestor, pro-
fessores, pedagogos e os funcionários;
5. Reforce a importância do uso do uniforme, se a escola assim o
exige;
6. Pergunte ao filho(a) o que ele aprendeu e como isso é importante Atividade 3
na vida; Vimos a importância da relação
7. Programe um horário e um local arejado com boa iluminação entre o professor e a família no
para realizar as atividades de casa e acompanhá-lo, mesmo que processo de aprendizagem dos
alunos. Porém, muitas vezes,
você não tenha conhecimento do conteúdo que o aluno esteja
nos perguntamos: por que pais
estudando, mas a preocupação e motivação em estar próximo e professores ainda não conse-
já é um meio de sentir-se seguro e ajudar a sanar a dificuldade; guem se entender? De acordo
8. Não deixe para preocupar-se somente no final do ano, monitore com o que estudamos neste
o boletim escolar de seu filho(a) se o resultado está satisfatório, capítulo, quais são as atitudes
elogie, se não estiver bom, converse com ele(a), questione a ges- que os professores podem ter
para melhorar o relacionamento
tão escolar, pedagogo e professores e define juntos estratégias
com as famílias? Elenque, no
de ação para reverter a situação e saber como sua participação mínimo, três sugestões.
poderá auxiliar no aprendizado.

Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 55


Tanto a escola quanto a família são fundamentais para o suces-
so escolar de qualquer pessoa, no entanto, é necessária uma inte-
gração das duas instituições. Se não houver harmonia entre elas, o
estudante é prejudicado, ficando confuso e dividido – isso porque
existem relações pessoais envolvidas e, ao mesmo tempo que ele
gosta da sua família, também gosta do professor. Em uma escola
que preza pela inclusão, intensificar a parceria com a família é pri-
mordial para um ensino e uma aprendizagem de qualidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme vimos neste capítulo, a garantia de ensino e aprendizagem
para todos os estudantes contribui significativamente para o processo de
inclusão educacional. Mas para que isso se torne realidade e não fique
apenas na teoria, é preciso que exista firmeza e envolvimento de todas as
pessoas que estão inseridas no contexto educacional. Esperamos ter con-
tribuído para a compreensão da importância do professor diante da inclu-
são, dos compromissos que ele deve ter e das relações que precisa manter
entre os processos de ensino e a família; afinal, ações isoladas que fortale-
cem apenas o trabalho individual, não favorecem a inclusão educacional.

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56 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


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Ensino e aprendizagem na educação inclusiva 57


GABARITO
1. Sim, pois Ana participou da aula com os demais alunos e somente na atividade escrita
seu comando foi diferenciado. Assim, a aluna não foi excluída da aula porque não foi
convidada a fazer outra atividade que não estava relacionada ao conteúdo trabalhado.

2. Observando o aluno, o professor poderá reconhecer suas potencialidades e seu ritmo,


o que ajudará no seu planejamento, favorecendo uma adaptação na medida certa,
nem muito fácil e nem muito difícil.

3. Sugestões:

• colocar-se no lugar dos pais que têm filhos com deficiência, procurando compreen-
der suas aflições;
• acolher e orientar as famílias, para que confiem no seu trabalho como professor;
• aproximar-se das famílias, conhecendo sua realidade, e parabenizar os pais pelas
conquistas dos filhos;
• envolver os pais nas atividades de sala de aula, convidando-os a participar.

58 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


3
Adaptações curriculares para
estudantes com deficiência
Para que possamos incluir os estudantes com deficiência na
escola comum, é necessário conhecer sobre as deficiências e
aprender as possibilidades de práticas de ensino. Neste capítulo,
teremos a oportunidade de ampliar o conhecimento sobre a de-
ficiência auditiva, visual, intelectual e física, bem como aprender
sobre as adaptações curriculares, as quais são necessárias para in-
cluir esse público e para garantir uma aprendizagem de qualidade.

3.1 Quem são os estudantes com deficiência?


Vídeo É necessário sabermos quem são os estudantes com deficiên-
cia para que possamos concretizar a ideia de currículo inclusivo.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015), no artigo
art. 27, afirma que:
a educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegu-
rados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e apren-
dizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo
desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas,
sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, in-
teresses e necessidades de aprendizagem.

Mas como cumprir o que está no estatuto se não conhecermos as


características físicas, sensoriais, sociais e intelectuais de cada estudan-
te e se não entendermos as necessidades individuais?

Falar sobre as deficiências, conhecer e entender suas peculiarida-


des, é importante. Esta já deveria ser uma prática natural de todos os
professores na proposta de uma educação inclusiva: considerar o ser
humano como único, com habilidades e dificuldades.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 59


Não há sentido algum em propor uma educação para todos se desco-
nhecemos o que compõe esse todo. Considere, por exemplo, uma prá-
tica de sala de aula, a utilização de jogos para ensinar. Se na sala de aula
há um estudante com baixa visão, o docente não precisa compreender
a dificuldade de visão do aluno? O quanto ele enxerga e como ele enxer-
ga? Com base nesse conhecimento, o professor não deve adaptar o jogo
para garantir que o estudante participe de uma forma inclusiva?

Sim, obviamente, se há o compromisso de uma educação para


todos que inclui, e não apenas integra o estudante com deficiência
na sala de aula, conhecer e entender a deficiência é fundamental no
ensino.

Leitura Assim, convidamos você a aprender o que é deficiência, quem são


A Lei Brasileira de os estudantes com deficiência e quais as terminologias adequadas
Inclusão da Pessoa com para nos referirmos a esse público, para não causar constrangimentos
Deficiência (Estatuto da
Pessoa com Deficiência) e construirmos uma relação amigável.
tem o objetivo de “asse-
gurar e [...] promover, em De acordo com o Estatuto da Pessoa com Deficiência: “considera-se
condições de igualdade, pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo
o exercício dos direitos
e das liberdades funda- de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação
mentais por pessoa com com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efe-
deficiência, visando à sua
inclusão social e cidada- tiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”
nia” (BRASIL, 2015, p. 8). (BRASIL, 2015, p. 8).
Disponível em: https://www2.
Diante do exposto, entendemos que a pessoa com deficiência tem
senado.leg.br/bdsf/bitstream/
handle/id/513623/001042393.pdf. alguma limitação e depara-se com barreiras que a impedem de partici-
Acesso em: 16 jul. 2020.
par plenamente da sociedade. A escola, parte da sociedade, quando se
propõe a praticar a inclusão, precisa entender quais são essas barreiras

Saiba mais e buscar alternativas de acessibilidade. “Dessa forma, não é o aluno


que se amolda ou se adapta à escola, mas é ela que, consciente de sua
A Síndrome de Down é
uma alteração gené- função, coloca-se à disposição do aluno, tornando-se um espaço inclu-
tica que aumenta os
sivo” (BRASIL, 2001, p. 29).
cromossomos do par 21,
de dois para três, por isso Conhecer as terminologias corretas, para fazer referência a uma
é também chamada de
trissomia do cromossomo pessoa com deficiência, é uma atitude de conhecimento e respeito.
21. Esta é a síndrome Você sabe qual é a forma correta de falar? Será que é deficiente ou
genética mais comum na
população. portador de deficiência? Portador de necessidades especiais ou pessoa
Para mais informações sobre a com deficiência? Já ficou confuso com essas terminologias?
Síndrome de Down, acesse: http://
www.movimentodown.org.br/ A terminologia correta é: pessoa com deficiência (PcD). Esse termo
sindrome-de-down/o-que-e/. está presente na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Defi-
Acesso em: 27 jul. 2020.
ciência, da Organização das Nações Unidas (ONU). Não é errado dizer

60 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


estudantes ou alunos com deficiência, mas não devemos utilizar:
deficientes, portadores de deficiência ou pessoas com necessidades 1
1
especiais. Quando falamos, por exemplo, “Marta é deficiente”, parece Nome fictício.
que na Marta tem algo errado, falta alguma coisa nela, não é mesmo?

Isso acontece porque a palavra deficiente é utilizada como característica,


de forma isolada, salientando-se apenas uma das características do indi-
víduo e desconsiderando que a pessoa tem muitas outras características.

Ao utilizarmos o termo portador de deficiência, precisamos pensar


no que significa a palavra portador. Portador é quem carrega, porta al-
guma coisa. Então, a pessoa carrega sua deficiência e pode deixar de
carregá-la no momento que desejar? Seria como se portássemos uma
bolsa e, de repente, a deixássemos de lado. O fato é que a pessoa não Atenção
porta, não carrega sua deficiência, ela tem deficiência.
A Lei n. 12.764 reconheceu que
Utilizar a terminologia pessoas com necessidades especiais é adequado? os autistas são pessoas com de-
ficiência. Agora, a Lei n. 13.861
Todas as pessoas podem, em algum momento da vida, ter uma necessida- (BRASIL, 2019) determina a
de especial. Por exemplo, quebrar uma perna e precisar utilizar o andador inclusão de questões sobre
por um determinado período da sua vida. Podemos ter a necessidade de “especificidades inerentes ao
transtorno do espectro autista”,
aumentar nossa renda familiar ou adquirir algo para nossa casa. como pessoa deficiente.
Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,1998), a
expressão necessidades educacionais especiais, no ambiente escolar,
está mais vinculada às dificuldades de aprendizagem, do que à defi- Vídeo
ciência. Também precisamos considerar que todos nós temos necessi- O vídeo Festa nas Nuvens,
da série Dharmalog
dades educacionais, pois não sabemos todos os conteúdos, conceitos e para Crianças (Party
disciplinas. Cabe salientar que, no momento, a terminologia adequada Cloudy), é uma animação
da Pixar Animation
é pessoa com deficiência, porém, é preciso considerar natural a evolução Studios, de 2009. Esse
nas concepções, o que poderá gerar mudanças futuramente. curta-metragem conta a
história de cegonhas que
Quantas vezes você já ouviu falar algo como “aquele menino é sur- entregam bebês criados
pelas nuvens. Uma das
do-mudo”? Saiba que essa é a maneira mais antiga e errada de se re-
nuvens, a mais cinzenta,
ferir a uma pessoa surda, porque nem todo surdo é mudo, ele só é cria bebês mais agressi-
vos e a cegonha não quer
mudo, se tiver problemas nas cordas vocais. O surdo não fala porque
mais entregá-los, porque
não conhece os sons. Portanto, o termo apropriado para  deficientes são difíceis. Mas, quando
percebe a tristeza da nu-
auditivos que não desenvolveram a fala é, apenas, surdo.
vem, a cegonha muda de
ideia e decidem se aliar.
Para saber quais estudantes podem ser considerados com deficiên-
cia, é importante considerar a legislação brasileira. Os tipos de deficiên- Disponível em: https://
www.youtube.com/
cia estão elencados no Decreto n. 5.296/2004 e são elas: física, auditiva, watch?v=pktG7AJRL8k. Acesso em:
visual, mental (atualmente intelectual, função cognitiva) e múltipla. 16 jul. 2020.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 61


Tão importante quanto conhecer as deficiências, é compreender
que, mesmo tendo limitações, os estudantes com deficiência podem
Atividade 1 aprender, pois possuem inúmeras habilidades, as quais devem ser con-

Por que é importante o professor sideradas pelo professor. A missão do professor é ensinar a todos, pois
conhecer cada estudante e ter na sala de aula se deparará com a diversidade; para alguns estudantes,
conhecimento sobre as defi- a aprendizagem é algo fácil, para outros, exige um pouco mais de em-
ciências, no momento de propor
adaptações curriculares? penho do professor, porém, com o trabalho em equipe, o conhecimen-
to e a prática, a aprendizagem se efetivará para todos.

3.2 Adaptações curriculares para


Vídeo estudantes com deficiência visual
A fim de tratarmos das adaptações curriculares para estudantes com
deficiência visual, convidamos você a conhecer a história de um aluno do
1º ano do ensino fundamental, de uma turma com 22 alunos.

Exemplo 1
No primeiro dia de aula, a professora recebe seus alunos na porta da sala solicitan-
do que cada um deles observe o crachá e sente-se na cadeira na qual havia fixado
um pedaço de papel, com a mesma forma e cor do crachá recebido na entrada.
Um estudante cego fica estagnado na porta, sem saber o que fazer, enquanto os
demais alunos o apressam para que entre de uma vez na sala, pois dizem que ele
está atrapalhando. Somente depois das reclamações dos alunos, tumulto e gritos, a
professora percebeu que o estudante era cego e ela não tinha sido informada ante-
riormente pela escola, nem pela família. Ela nota que a proposta inicial de atividade
não foi adaptada para esse aluno, gerando desconforto entre os estudantes. Na sua
opinião, se a professora soubesse sobre o estudante cego, de que forma poderia ter
adaptado a atividade? Reflita sobre isso.

No exemplo apresentado, que retrata um momento de sala de aula,


podemos perceber a importância das adaptações curriculares para aten-
der às necessidades individuais dos estudantes. Quando não há conhe-
cimento e planejamento prévio diante da diversidade, caminha-se na
contramão de um processo educacional que inclui todas as pessoas.

Cabe salientar que as práticas sem conhecimento da realidade,


além de não colaborarem com a proposta de currículo inclusivo, po-
dem agravar a situação, pois contribuem para que o aluno se sinta
desmotivado e incapaz de pertencer ao grupo. Segundo Paulo (2007),
não é viável marcar os estudantes como problemáticos, porque essa

62 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


prática dificulta a inserção dele no grupo. O ideal é trabalhar a inclusão
com todo grupo do qual o estudante participa, promovendo atividades
de sensibilização e conhecimento da diversidade.

No caso do estudante do Exemplo 1, o não sucesso da prática do-


cente não pode ser atribuído somente à professora, mas também à fa-
mília e à escola. A escola, porque não procurou conhecer a realidade do
estudante e a família, pois não informou à professora das dificuldades
do filho, o que pode ocorrer visto que muitas famílias têm vergonha de
ter um filho com deficiência e acabam silenciando sobre essa questão
quando o ingressam na escola.
Filme
Se a professora tivesse conhecimento prévio da realidade do es-
tudante e da deficiência dele, poderia, no lugar de utilizar contorno
de formas e cores nos crachás, ter utilizado as formas em alto relevo,
possibilitando que o estudante encontrasse sua carteira fazendo o uso
do tato. Também poderia ter organizado o espaço da sala de aula, de
maneira que ele não encontrasse obstáculos físicos ao se dirigir à sua
carteira, e preparado a turma para receber o aluno.

Assim, como pensar em um currículo inclusivo que atenda à diver-


sidade e, ao mesmo tempo, não exclua o estudante com deficiência Muitas vezes, os pais de
crianças com deficiência
ou dificuldades do grupo? Considerando os estudantes com deficiência não aceitam a realidade,
visual, como isso é possível na prática? sentem-se envergonhados
e culpados pela deficiência
Vamos seguir dois caminhos paralelos para responder a essas ques- dos filhos. Com essa
não aceitação, acabam
tões: aprender sobre deficiência visual e conhecer práticas possíveis de omitindo informações que
inclusão do estudante com deficiência visual. ajudariam os profissionais
a trabalharem com a crian-
Sobre a deficiência visual relacionamos dois grupos: baixa visão e ça. O filme A Cor do Paraíso
quebra esse paradigma e
cegueira. Quem são os estudantes com baixa visão?
mostra o quanto o pai de
A baixa visão corresponde àquelas pessoas que apresentam o um garoto cego aprende,
quando aceita a deficiência
comprometimento do funcionamento visual em ambos os olhos,
do filho.
mesmo após tratamento e/ou correção, considerando-se tam-
Direção: MajidMajidi. Irã: Europa
bém, quando a medida do campo visual em ambos os olhos for
Filmes, 2000.
igual ou menor a um certo valor. (BRASIL, 2014, p. 44)

Estudantes com baixa visão geralmente fazem uso de recursos óp- Saiba mais
ticos, como lupas, óculos bifocais e telescópios, os quais favorecem a Os Recursos ópticos “possi-
visualização de objetos, materiais escritos e, até mesmo, pessoas. Isso bilitam a ampliação de imagem
e a visualização de objetos,
porque, dependendo do grau de dificuldade, um aluno com baixa vi- favorecendo o uso da visão
são, quando olha para uma pessoa, apenas identifica vultos e não os residual para longe e para perto”
detalhes, por exemplo, olhos, boca, nariz, cor da roupa. (DOMINGUES, 2010, p. 11).

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 63


Por esse motivo, é fundamental que o professor conheça as
possibilidades de trabalho do aluno, compreenda o quanto este en-
xerga e como, para poder adaptar os materiais e estimular a utilização
plena do seu potencial de visão.
Saiba mais
Na sala de aula, para atender aos estudantes com baixa visão, são
Os recursos não ópticos são necessárias mudanças no ambiente, cuidados com a iluminação, orga-
as “mudanças relacionadas
ao ambiente, ao mobiliário, à nização do mobiliário, ampliação de material, materiais em relevo, apli-
iluminação e aos recursos para cativos no computador. Esses recursos são chamados de não ópticos.
leitura e escrita, como contrastes
e ampliações, usados de modo É na escola, principalmente quando a criança inicia o processo de
complementar ou não aos alfabetização (leitura e escrita), que as dificuldades visuais começam a
auxílios ópticos” (DOMINGUES,
ser percebidas pelos professores, notando a dificuldade do aluno para
2010, p. 12).
ler e escrever.

Após diagnóstico de baixa visão, o primeiro procedimento é conhe-


cer o grau de dificuldade do estudante para poder fazer as adaptações
necessárias, ou seja, definir o tipo e o tamanho de letra, a distância do
material a ser visualizado, o contraste de luz e o local em que o aluno
deverá se sentar na sala de aula. Cabe salientar que “duas pessoas com
o mesmo grau de acuidade visual podem apresentar um desempenho
visual diferente uma da outra” (DOMINGUES, 2010, p. 11). É necessário
considerarmos as características individuais no processo de adaptação
curricular, adotando procedimentos diferenciados para cada um dos
Importante estudantes com baixa visão. O trabalho colaborativo, com o oftalmolo-
É importante atentar para gista, reeducador visual e a família, é de extrema importância.
os indícios de baixa visão Assim como a pessoas com baixa visão são diferentes entre si e,
(DOMINGUES, 2010):
mesmo apresentando o mesmo diagnóstico, precisam de adaptações
• Olhos vermelhos lacrimejando,
e recursos diferenciados, com as pessoas cegas também é assim. Estas
após esforço ocular; piscar
continuamente; movimentar vivem experiências diferentes umas das outras, afinal, suas histórias
constantemente os olhos. da perda de visão não são idênticas, há crianças que nascem cegas,
• Dificuldade para enxergar a outras perdem a visão em uma determinada etapa da vida e, ainda, há
lousa; aproximar os olhos do
aquelas que ficam cegas na vida adulta.
caderno ao escrever e ler.
A cegueira, ou perda total da visão, pode ser adquirida, ou con-
• Dores de cabeça; sensibilidade à
luz; náuseas. gênita (desde o nascimento). O indivíduo que nasce com o sen-
tido da visão, perdendo-o mais tarde, guarda memórias visuais,
• Tropeçar constantemente; consegue se lembrar das imagens, luzes e cores que conheceu, e
esbarrar em pessoas e objetos;
isso é muito útil para sua readaptação. Quem nasce sem a capa-
esquivar-se de brincadeiras e
jogos; dispersar a atenção. cidade da visão, por outro lado, jamais pode formar uma memó-
ria visual, possuir lembranças visuais. (GIL, 2000, p. 8)

64 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


É pertinente que, ao receber um estudante com deficiência visual,
o professor procure informações junto à família para saber quando
a deficiência aconteceu e como a família lidou com o isso. Se a crian-
ça nasceu com o sentido da visão e perdeu posteriormente, ela terá
memórias guardadas de imagens, de luzes e de cores, essas serão
muito úteis no processo de ensino. Já as crianças que nasceram ce-
gas ou perderam a visão ainda muito pequenas têm ausência de
imagens visuais e, por isso, as experiências corporais precisam ser
muito mais intensificadas, para que construam imagens do mundo
ao seu redor.
Curiosidade
Em relação às adaptações curriculares em sala de aula, quando
o professor recebe um estudante com deficiência visual, ele precisa Inventado pelo francês
Louis Braille, o braille é
pensar na organização do espaço físico – a distância entre as carteiras um sistema de escrita
deve permitir a locomoção do estudante –, para isso, não devem existir e leitura tátil para as
pessoas cegas. O sistema
barreiras físicas na sala de aula, como carteiras muito próximas, mesas conta com um arranjo de
e cestos de lixo no meio do caminho, brinquedos espalhados e difícil seis pontos em relevo,
dispostos na vertical,
acesso à lousa. em duas colunas de três
pontos cada, no que se
Quando o estudante tem baixa visão, sugere-se que o professor convencionou chamar de
utilize o giz branco para escrever na lousa e lembre do tamanho da cela braille. A diferente
disposição desses seis
letra. Também é importante verificar, com base no laudo do estu- pontos pode represen-
dante, qual é a melhor posição para ele se sentar e a iluminação tar tanto letras quanto
algarismos e sinais de
adequada. Estudantes com baixa visão tendem a ter a postura in- pontuação. A leitura é
clinada para tentar fazer leituras ou escrever, logo, o ideal é que feita da esquerda para a
direita, com uma ou as
a mesa dele seja mais alta que a convencional e a prancheta seja duas mãos ao mesmo
inclinada. tempo.

Quanto à leitura e à escrita, há recursos que facilitam o


desempenho do aluno com baixa visão, como
aumentar o tamanho e o contraste dos
materiais, utilizando cores fortes, por
exemplo: cadernos com pautas pre-
tas e largas, lápis com grafite mais
grosso, folhas de papel maiores,
caneta preta ou azul, ampliação da
fonte da letra nos materiais escritos,
espaçamentos maiores entre as pa-
ck

lavras, tipo de fonte simples e jogos


ersto
hu t t

adaptados em tamanho maior. Para


Lorelyn Medina/S

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 65


o estudante cego, o material deverá ser previamente adaptado, sendo
transcrito em braille.

Adaptações atitudinais, por parte do professor, fazem a diferença


no ensino de estudantes com deficiência visual. Sempre que o docen-
te desejar a participação do estudante com deficiência visual, deverá
chamá-lo pelo nome, não apontar para o aluno ou dizer: “você aí, res-
ponda à questão”. Intensificar o diálogo na sala de aula, quando escre-
ver na lousa, ler o que está registrando, quando chegar uma visita na
sala, apresentar a pessoa e informar oralmente sobre tudo o que está
acontecendo na sala, é essencial. Por exemplo: “Agora, vou passar nas
carteiras para verificar os cadernos, vou começar pelos alunos que se
4 sentam na fila do lado direito. Ricardo
4
está chorando porque caiu no
Nome fictício. intervalo e machucou o joelho, mas não foi grave”.

Esse diálogo e essas explicações orais demonstram respeito com


o estudante que tem deficiência visual. No exemplo mencionado, ele
apenas escutou o choro, e, com certeza, ficou ansioso para saber o que
estava acontecendo. Quando a professora explica para todos oralmen-
te, acalma o estudante com deficiência visual.

Além disso, sempre que o professor for trabalhar com imagens, de-
verá descrevê-las ou adaptá-las em alto relevo, para que o estudante
possa interagir por meio do tato. Vejamos um exemplo a seguir.

Exemplo 2
A professora que ministra aula no 2º ano do ensino fundamental resolve contar
para seus alunos a história O macaco vermelho, de autoria de Mario Vale.
O texto conta a história de um macaco que resolve viver na cidade grande, mas um
balde de tinta o transforma num animal raro e ele é preso pelo dono de um circo,
tornando-se sua atração principal.
Na sala de aula há um estudante cego, por isso, a professora adapta o material,
colando barbante ao redor das imagens do livro, para que o aluno compreendesse
a história. Ela coloca vendas nos olhos dos alunos que não têm problemas visuais e
oportuniza a vivência de serem privados da visão, utilizando o tato para identifica-
rem as imagens contornadas com barbante. Também, busca saber, anteriormente,
com a família, a qual objeto o aluno cego associa a cor vermelha e descobre que
é com o morango, então, associa a atividade à experiência prévia do aluno. Assim,
consegue incluir todos os alunos em sua aula.

A adaptação que a professora fez para contar a história do macaco


vermelho possibilitou a aprendizagem do estudante com deficiência

66 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


visual no grupo, sem ter que elaborar um planejamento diferenciado.
Ela fez uma adaptação adequada, porque é pelo tato, audição, olfato
e paladar que os estudantes cegos aprendem com maior facilidade e,
por esse motivo, utilizar brinquedos, materiais com texturas diferentes,
odores e sons é sugerido (BRASIL, 2014).

Mas será que as adaptações realizadas pela professora favorece-


ram apenas o estudante cego? Com certeza não, todos os estudantes
foram beneficiados com as adaptações, aprenderam utilizando a audi-
ção, a visão e o tato, e experimentaram como é se colocar no lugar do
outro, sendo sensibilizados para conviverem na diversidade.

As Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) podem auxiliar


muito no ensino de pessoas com deficiência visual. Nos computado-
res, as opções de acessibilidade poderão definir o tamanho da fonte,
a resolução da tela e a lente de aumento. A ampliação temporária dos
textos do Word pode ser feita por meio do zoom e a lente de aumento
é também um recurso disponível no ambiente Windows.

Outras formas de acessibilidade são oferecidas por softwares es-


pecíficos e o uso desses recursos, com síntese de voz, torna-se uma
alternativa bastante útil para estudantes com deficiência visual. Entre
os programas de síntese de voz, Domingues (2010) cita os seguintes:

• Sistema Dosvox: é um programa gratuito que oferece edição de texto, leitor de docu-
mentos, formatação de texto em tinta e braille, jogos, calculadora, programas sonoros,
ampliador e leitor simplificado de telas.
• Deltatalk: é um programa desenvolvido pela empresa Micropower e permite a intera-
ção com o computador por meio da voz.
• Non Visual Desktop Access (NVDA): é um leitor de tela livre e gratuito para o
Windows.
• Virtual Vision: permite a utilização do ambiente Windows, os aplicativos Office, nave-
gação pela internet e o uso de programas de comunicação.
• Jaws: permite operar no ambiente Windows e em seus aplicativos.
• Orca: é um leitor de tela livre que permite acesso ao ambiente Linux e suas ferramentas.

Outra questão de relevância, na inclusão de estudantes com defi-


ciência visual, são as avaliações. De nada adianta propor adaptações
curriculares ao ensinar e, no momento da avaliação, oferecer, de

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 67


maneira padronizada, o mesmo instrumento para todos os alunos,
desconsiderando as especificidades.

Atividade 2 Alguns cuidados são necessários ao elaborar uma avaliação, para


um estudante cego ou com baixa visão. Tornam-se inviáveis comandos
Kamilon/Shutterstock

avaliativos, como: observe a imagem e descreva, pinte o desenho com


a cor vermelha, ache a diferença, relacione a primeira coluna com a
segunda. Esse último comando, especialmente, é difícil para um estu-
dante com deficiência visual e se a prova for realizada no computador,
o sistema de voz fará a leitura das colunas em sequência, o que dificul-
A professora da educação infantil
propõe uma atividade relacio- tará a compreensão. Os comandos devem ser mais objetivos, sem per-
nada à discriminação visual para derem a qualidade do conteúdo. Uma alternativa é optar pela avaliação
a turma. Porém, na sala há uma
oral e contínua ao longo do processo.
criança cega e é preciso adaptar
a atividade para que esta possa Incluir estudantes com deficiência visual, nas salas de aula comuns,
participar junto ao grupo. No
exercício original, o comando é exige do professor pensar nas adaptações curriculares de acordo com
ligar cada fruta à sua respectiva o grupo e não de modo isolado para o estudante com deficiência. A
sombra. Sugira uma maneira de proposta de atividade deve envolver todos os alunos e o tema – o as-
adaptar essa atividade.
sunto a ser ensinado – deve ser comum a todos os estudantes.

3.3 Adaptações curriculares para


Vídeo estudantes com deficiência auditiva
Para desencadear o estudo das adaptações curriculares para es-
tudantes com deficiência auditiva, as palavras de Sacristán e Gómez
(1998) parecem muito bem-vindas. Os autores comparam a escolarida-
de dos alunos com o percurso que precisam fazer; e o currículo, com o
recheio, para que possam realizar esse percurso.

Vamos imaginar um bolo, cujo recheio pode ser diferenciado de-


pendendo do gosto das pessoas, dos ingredientes disponíveis e, até
mesmo, da individualidade de cada um. Uma pessoa alérgica a amen-
doim, por exemplo, não ficará confortável comendo um bolo cujo re-
cheio contenha amendoim, não é mesmo?

Assim é que devemos compreender um currículo adaptado: modi-


fica-se o recheio, inserem-se elementos e utilizam-se mais recursos no
momento de ensinar, considerando a necessidade de cada aluno.

A ideia de currículo adaptado não pode estar voltada para alunos que
não conseguem acompanhar a aprendizagem, mas sim para garantir a
acessibilidade daqueles que precisam de modificações curriculares, para

68 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


aprender na coletividade. Entre os alunos que precisam de diferencial no
ensino, estão também os estudantes com deficiência auditiva.

Compreende-se por deficiência auditiva, conforme o parágrafo úni-


co do Decreto n. 5.626 (BRASIL, 2005),“a perda bilateral, parcial ou to-
tal, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma
nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz” e no artigo 2º
do mesmo documento, “considera-se pessoa surda aquela que, por
ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de
experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso
da Língua Brasileira de Sinais – Libras”.

A pessoa pode ter uma perda auditiva leve, moderada ou profunda.


Saiba mais
Quando a perda auditiva é leve, ela tem uma incapacidade de ouvir
sons suaves, como o canto dos pássaros. Ambientes com muitos ruídos Em 2002, a Lei n. 10.436
reconheceu a Língua Brasileira
impedem que a pessoa compreenda os sons da fala, por isso, adapta-
de Sinais (Libras) como língua
ções simples no ambiente de sala de aula são suficientes para atender oficial das pessoas surdas, no
a esse público. Brasil. De acordo com a própria
legislação, Libras é uma “forma
Quando a pessoa tem deficiência moderada e severa, precisa de de comunicação e expressão,
aparelho ou prótese auditiva e, em alguns casos, necessita fazer uso em que o sistema linguístico de
natureza visual-motora, com
da Libras. Quando a perda auditiva é considerada profunda, torna-se estrutura gramatical própria,
necessário o uso de técnicas de leitura labial e língua de sinais para se constituem um sistema linguísti-
co de transmissão de ideias e
comunicar.
fatos, oriundos de comunidades
Salientamos que as terminologias leve, profunda e moderada são ne- de pessoas surdas do Brasil”
(BRASIL, 2002).
cessárias para conhecimento do grau de dificuldade do estudante, nas
adaptações necessárias, mas não são terminologias que utilizamos no
dia a dia para nos referirmos a uma pessoa com deficiência auditiva. Não
devemos nos referir a uma pessoa dizendo que ela tem uma deficiência
auditiva leve. O correto é dizer que ela tem uma deficiência auditiva e, caso Saiba mais
tenha comprometimentos auditivos mais profundos, que ela é surda. Há O implante coclear é
uma espécie de ouvido
pessoas com surdez profunda que não fazem o uso da Libras e optam
biônico implantado na
pelo implante coclear. orelha, com a função de
estimular diretamente o
O objetivo de promover adaptações curriculares para os estudan- nervo auditivo, por meio
tes com deficiência auditiva não é mudar o currículo, mas adaptá-lo de eletrodos, levando si-
nais para o cérebro. Para
de forma segura para que favoreça a aprendizagem desse público mais informações, acesse
junto aos demais estudantes que participam do processo de ensino, o link a seguir.

tendo ou não deficiência auditiva. Significa planejar aulas que per- Disponível em: https://www.
direitodeouvir.com.br/blog/
mitam a aprendizagem de todos os estudantes inseridos na turma, implante-coclear. Acesso em: 16
de acordo com a acessibilidade pedagógica prevista na Política Na- jul. 2020.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 69


cional de Educação Especial, na perspectiva de educação inclusiva
(HONORA; FRIZANCO, 2008).

Quando a perda auditiva é de leve à moderada, basta o professor


mudar a postura ao ministrar a aula, falando mais devagar, olhando
para o estudante, sem ficar andando pela sala enquanto fala, utilizando
imagens visuais. Contudo, quando o estudante é surdo, as adaptações
precisam ser mais significativas.

Como garantir a inclusão do estudante surdo na sala de aula co-


mum? Como lidar com a insegurança dos professores, muitas vezes re-
tratada no próprio discurso? Primeiramente, é preciso que o professor
se disponha a conhecer o aluno, a compreender qual o grau da perda
auditiva e a entender como acontece a sua comunicação – se o alu-
no faz leitura labial, utiliza algum aparelho de amplificação sonora, faz
uso de Libras, o que ele já sabe, o que precisa aprender e como pode
aprender com mais facilidade. O professor não precisa buscar essas
respostas sozinho, ele pode contar com a família, com profissionais es-
pecializados da sala de recurso, com professores que ministraram au-
las anteriormente para o aluno e com a equipe pedagógica da escola.

Algumas atitudes contribuem para a relação com o estudante sur-


Atenção
do. Por exemplo, sempre que for conversar com ele, sinalize com um
Não é necessário, nem eficiente, gesto ou toque em seu braço, porém, se for tocá-lo, sinalize anteci-
gritar com os surdos. A voz deve
ser em tom natural, articulando padamente para que ele não se assuste. Olhar nos olhos durante a
bem as palavras e deixando a conversa também é uma maneira de demonstrar que a conversa não
boca à vista durante a conversa,
acabou, mas, se por acaso não conseguir estabelecer a comunicação,
para facilitar a leitura labial.
utilize mímicas ou a escrita.

E a aula? Como deve ser conduzida para que o estudante surdo con-
siga compreender o conteúdo, estando inserido no grupo? Basta apenas
a presença do professor intérprete de Libras? Para Lacerda (2014), o pro-
fessor intérprete educacional é de fundamental importância nas salas
Saiba mais de aula em que há estudantes surdos, pois esse profissional fará o elo
A profissão de intérprete de de comunicação entre o professor da turma e o aluno surdo, e, também,
Libras foi reconhecida em 2010, entre o aluno surdo com os demais alunos da sala de aula e toda a equi-
pela Lei n. 12.319, que regula-
pe escolar. Quando não há o intérprete, o aluno surdo é prejudicado,
menta o exercício da profissão,
exigindo, desse profissional, desmotivado e, muitas vezes, até desiste de estudar.
a capacidade de realizar a
Na Educação de Jovens e Adultos (EJA), é comum encontrarmos es-
tradução e a interpretação da
língua portuguesa para a Libras tudantes surdos e com outras deficiências que desistiram de estudar
e vice-versa (BRASIL, 2010). quando estavam no início dos anos iniciais, por falta de adaptações

70 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


curriculares e de acessibilidade, e retomaram seus estudos na moda-
lidade EJA. “Desse modo percebemos a grande importância que tem
a atuação desse profissional no ensino regular, onde [...] exercerá o
papel de mediador de comunicação” (LACERDA, 2014, p. 34).

É preciso enfatizar que o intérprete de Libras não é responsável por


elaborar a aula, ele não está na sala para ministrar aula ou substituir
o professor, apenas facilita a comunicação, considerando a dificuldade
do estudante surdo com a oralidade.

Nesse contexto, a aula propriamente dita é responsabilidade do


professor da sala regular, que é quem vai ensinar e garantir que o
estudante com deficiência auditiva aprenda os conteúdos previstos,
para o ano de escolaridade na qual ele está inserido. É importante
considerar que há estudantes surdos que não dominam a Libras e
surdos que a família optou pela oralização, eles também participam
do ensino regular.

Mas como adaptar o currículo para que o estudante surdo apren-


da? Realizar uma adaptação curricular significa pensar na complexi-
dade do conteúdo, nos objetivos das atividades, na temporalidade
e na avaliação (BRASIL, 2000). Complexibilidade do conteúdo não
significa deixar o conteúdo mais fácil, mas ensinar passo a passo,
por etapas e essa atitude favorece não somente o aluno surdo, mas
todos da turma. Veja um exemplo a seguir:

Exemplo 3
O professor está ensinando adição para os estudantes do 2º ano do ensino funda-
mental e escreve na lousa a seguinte operação: 28 + 11 = 39.
Que tal construir esse conceito passo a passo?
Passo 1: entregar objetos com duas cores diferentes para que sejam juntados e
somados – Exemplo: 28 bolinhas azuis + 11 bolinhas vermelhas (quantidade).
Passo 2: sentenças: o que significa 28 e 11? Utilizar o ábaco como recurso:
• Duas dezenas e oito unidades: 20 + 8 = 28.
• Uma dezena e uma unidade: 10+ 1 = 11.
Passo 3: reprodução da operação na lousa.

Conforme já comentado anteriormente, adaptar os objetivos da


atividade não significa propor outra atividade para o estudante sur-
do, diferente daquela que os demais alunos estão realizando, mas

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 71


sim inserir recursos que possibilitem considerar o nível de aprendi-
zagem do estudante.

Se um professor da EJA faz a leitura de uma fábula para os alunos,


com o objetivo que eles recontem a história por meio da produção de
texto e na turma há um estudante surdo, que ainda não está alfabeti-
zado, o professor procede da seguinte forma: ao realizar a leitura, faz
o uso de imagens do início, do meio e do fim da fábula, e, após ler cada
momento do texto, fixa no quadro as cenas. Assim, todos os alunos re-
cebem a informação de forma oral e visual, técnica que contribui muito
para a compreensão do estudante surdo e dos demais estudantes. No
momento do registro, os estudantes que sabem escrever elaboram o
texto escrito e o estudante surdo, que ainda não consolidou o processo
de escrita, representa o início, o meio e o fim da fábula com desenhos
e em Libras. Em seguida, o professor pede que os estudantes dramati-
zem a história.

A temporalidade é outra questão muito importante a ser consi-


derada na adaptação curricular dos alunos surdos e com outras defi-
ciências, pois há que se considerar o ritmo dos alunos e o quanto eles
sabem sobre cada assunto. Um aluno que chega no 2º ano do ensino
fundamental alfabetizado não pode ser comparado com um aluno que
conhece apenas algumas letras do alfabeto. É claro que o aluno alfabe-
tizado conseguirá produzir textos escritos em um tempo menor do que
aquele não alfabetizado.

Considerando que o aluno com deficiência auditiva, principalmente


o aluno surdo, tem um déficit na linguagem, é preciso entender que
ele vai aprender, por exemplo, a ler e escrever em um tempo maior
que o estudante ouvinte. Isso não significa que ele não aprende ou
está atrasado em relação aos demais alunos, ele apenas tem um ritmo
diferente, assim como muitos outros alunos, que não têm dificuldades
auditivas, também realizam atividades em ritmos diferentes.

No que diz respeito à alfabetização, ensinar ao estudante surdo o


som das letras não tem muito sentido, é preciso trabalhar com o signifi-
cado das palavras. Fazer com que o aluno copie mecanicamente textos
e palavras da lousa também não surte efeitos positivos, sugerimos tra-
balhar o texto impresso e, antes da apresentação do texto, expor as re-
ferências relevantes, como o contexto histórico, o enredo e os autores.
Isso pode ser feito com a utilização da língua de sinais ou outros recur-
sos visuais, entre eles, dramatização, imagens, jogos visuais e pintura.

72 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


E como fica a adaptação nas avaliações dos alunos surdos? Será que
são necessárias? Sim, as adaptações nas avaliações são necessárias,
até porque a forma como a língua portuguesa é compreendida pelos
estudantes surdos é diferenciada da forma dos ouvintes, o que torna
necessário considerar os aspectos estruturais da língua de sinais.

O Ministério da Educação (BRASIL, 2000) sugere que a avaliação con-


sidere o momento do percurso que o estudante está e que o professor
faça as seguintes avaliações ao construir os enunciados: a mensagem
tem coerência lógica, apresentando um enredo com princípio, meio e
fim? Há uma estrutura de frase menos complexa, que tenha mais pa-
lavras significativas e menos verbos, advérbios e pronomes, por exem-
plo? Os enunciados são objetivos e não tão extensos?

Acrescentar imagens nas avaliações também facilita a compreensão


do estudante surdo. Por exemplo, se o comando avaliativo é formar
frases com um grupo de palavras, apresente o desenho das palavras.
Evite questões de múltipla escolha, pois estas não avaliam a escrita.

Outra questão importante é a correção das avaliações, principal-


mente de Língua Portuguesa – é preciso respeitar as marcas da escrita
do aluno surdo. Veja o exemplo a seguir.

Exemplo 4
Observe os dois textos transcritos a seguir: um texto construído por um aluno ou-
vinte e outro por um aluno surdo, ambos alunos do 2º ano do ensino fundamental.
A proposta era escrever um pequeno texto respondendo três perguntas:
• Qual é o nome do seu cachorro e do que ele gosta?
• Como é o cachorro?
• O que você sente por ele?
Texto do aluno ouvinte
Meu cachorro
O nome do meu cachorro é Bidu, ele gosta muito de correr na grama e brincar
comigo com a bola.
Bidu é um cachorro muito inteligente, quando nós vamos sair ele vai para debaixo
do sofá e não tem o que o faça sair.
Eu amo o Bidu, é o meu melhor amigo.
Texto do aluno surdo
Meu cachorro Rex gosta de latir portão.
Rex branco pequeno amigo.
Eu amo o Rex.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 73


Você acha que o aluno surdo fez adequadamente a atividade pro-
posta? Sim, pois ele respondeu às perguntas que direcionavam o texto,
porém, a estrutura textual traz as marcas da comunicação do aluno
surdo. Isso vai amenizando à medida que o estudante é estimulado e
progride na escolaridade. A professora não deve descontar nota devido
à estruturação da escrita, mas sim considerar a interpretação e a men-
sagem que o estudante apresentou.
Atividade 3
A temporalidade no momento das avaliações também é um ele-
Libras é a língua natural do estu-
dante surdo, porém, ele também mento importante. Considerar a qualidade, não a quantidade, ou
precisa saber a língua oficial do seja, diminuir o número de alternativas na avaliação, é um exemplo
país, isto é, a língua portuguesa.
Por isso, no momento de redigir de adaptação.
um texto, o estudante surdo Os estudantes com deficiência auditiva podem aprender normal-
apresenta muitas dificuldades.
Comente como você, na condi- mente os conhecimentos trabalhados com os demais alunos, basta
ção de professor(a), deve olhar que o professor busque compreendê-los, bem como as peculiarida-
a escrita do estudante surdo ao
des da deficiência e se aperfeiçoe para utilizar os recursos necessá-
avaliar e corrigir o texto dele.
rios ao ensinar.

3.4 Adaptações curriculares para estudantes


Vídeo com deficiência intelectual
Em algum momento você ouviu dizer que todas as crianças são ca-
pazes de aprender? Quem descobriu isso foi Vygotsky (1989), psicólo-
go, pensador e pioneiro do desenvolvimento intelectual das crianças.
Ele ainda acrescentou que as mais sérias deficiências podem ser com-
pensadas com um ensino apropriado.

Esse pensamento precisa ser levado muito a sério por professores


que têm em suas salas de aula alunos com deficiência intelectual, pois
Saiba mais
ensinar um aluno com deficiência intelectual exige do professor muito
Após a aprovação da De-
claração de Montreal so- conhecimento, motivação e paciência, além disso, é preciso acredi-
bre Deficiência Intelectual,
tar que esse aluno pode aprender.
em 6 de outubro de 2004,
o termo adequado deixou Por que conhecimento, motivação e paciência? Porque estudan-
de ser deficiência mental
e passou a ser deficiência tes com deficiência intelectual demoram mais para aprender e, mui-
intelectual. tas vezes, o professor pensa que não conseguirá ensinar e acaba
Para mais informações, acesse: ficando desmotivado ou, até, desistindo do aluno. Não há uma me-
http://www.educadores.diaadia.
pr.gov.br/arquivos/File/pdf/ dicação que faça com que ele aprenda no mesmo instante em que
declaracao_montreal.pdf. Acesso os demais estudantes da mesma idade ou ano de escolaridade, visto
em: 27 jul. 2020.
que não se trata de uma doença. Honora e Frizanco (2008, p. 103)

74 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


explicam que “a deficiência intelectual não é considerada uma doen-
ça ou um transtorno psiquiátrico, e sim um ou mais fatores que
causam prejuízo das funções cognitivas que acompanham o desen-
volvimento diferente do cérebro”.

O cérebro de uma criança com deficiência intelectual tem mais di-


ficuldade para raciocinar, compreender conceitos, interpretar e, até
mesmo, adaptar-se aos ambientes. Isso acontece porque a cognição
está abaixo da média de uma criança que tem a mesma idade. Uma
criança com idade cronológica de 8 anos, por exemplo, quando possui
uma deficiência intelectual, pode se comportar como uma criança de 5
anos. A diferença da idade mental prejudica, inclusive, o relacionamen-
to com outras crianças.

Para diagnosticar uma criança com deficiência intelectual, é


necessária uma equipe de profissionais, aliada a informações da famí-
lia, que poderá dizer como foi o desenvolvimento da criança, desde o
nascimento: como foi o parto e o desenvolvimento psicomotor? Engati-
nhou, sentou e andou na idade certa? Quando começou a se alimentar
sozinha, controlar a urina e as fezes?

Profissionais da área de psicologia podem aplicar testes de inteli-


gência para avaliar o estudante, esclarecendo o seu nível de compro-
metimento. No entanto, o resultado não pode ser utilizado para rotular
o aluno e sim para entender como ele pode aprender.

Para Honora e Frizanco (2008), as causas de uma deficiência


intelectual podem ser de origem genética, quando um dos pais tem a
deficiência ou devida a anomalias no cromossomo, como é o caso da
Síndrome de Down.

Também podem ser consideradas causas de deficiência intelectual


as doenças cerebrais graves e as infecções do bebê antes do nascimen-
to (rubéola, sífilis, toxoplasmose, intoxicação por chumbo, mercúrio,
radiações, desnutrição materna e medicamentos); durante o parto (oxi-
genação do cérebro insuficiente, icterícia grave no bebê, prematurida-
de, incompatibilidade sanguínea e traumas no parto); ou nos primeiros
anos de vida (acidente que gera traumatismo craniano, desidratação
grave, desnutrição grave e intoxicação). Fatores ambientais também
podem contribuir com a deficiência intelectual, por exemplo, a criança
ficar fechada por longo período em um quarto sem receber estímulos
e relações afetivas.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 75


E na escola, como ensinar estudantes com deficiência intelectual?
Se ele não conseguir dar as respostas que você quer, é problema
do aluno ou da atividade? Para ensinar, é preciso lembrar que o es-
tudante com deficiência intelectual tem dificuldade na abstração,
assim, experimentar situações reais e utilizar as habilidades senso-
riais favorece significativamente a aprendizagem, pois é por meio
dessas habilidades e dos sentidos (audição, visão, tato, olfato e pala-
dar) que a aprendizagem se inicia.

Aquela aula padrão, na qual se aprende lendo e escrevendo no ca-


derno, não surte efeitos positivos, é necessário utilizar diferentes tipos
de linguagem, atribuir o máximo de significado ao que será ensinado e
permitir a experimentação, como demonstra o Exemplo 5.

Exemplo 5
Em uma aula de Ciências, a professora do 3º ano do ensino fundamental se propõe
a ensinar os estados físicos da água. Se a aula for ministrada apenas com o texto
impresso, a leitura no livro didático, a explicação oral da professora e, quem sabe,
algumas imagens, o estudante com deficiência intelectual não aprenderá os con-
ceitos e talvez muitos outros estudantes não compreendam. Contudo, se a profes-
sora contextualizar o assunto, perguntar para as crianças se sabem explicar como
se forma o gelo e o vapor, relacionar com experiências do dia a dia, levar para a sala
de aula a água nos três estados (líquido, sólido e gasoso), apresentar aos alunos
e permitir que experimentem tomar a água, tocar o gelo e sentir o vapor saindo
de uma xícara de chá, a aprendizagem se consolida. Nesse caso, a professora faria
uma adaptação dos objetos que utilizaria para ministrar a aula, além dos textos e
da oralidade, inserindo a experimentação e o objeto concreto.

Sassaki (1997) apresenta algumas sugestões de adaptações que o


professor deve fazer na sala de aula para favorecer a aprendizagem
do estudante com deficiência intelectual, são elas: trabalhar em duplas
e pequenos grupos, contar histórias para ensinar conceitos abstratos,
simplificar o material didático, colocar o estudante sentado nas primei-
ras carteiras, estimular habilidades interpessoais, fazer adaptações de
conteúdo e avaliar o aluno pelo seu progresso individual.

Quando os alunos trabalham em dupla ou em pequenos grupos,


eles aprendem muito mais. Há situações em que a professora ensina
o conteúdo e o estudante não aprende, mas quando um colega ensina
ou quando participa da aprendizagem do colega, acaba compreenden-
do o assunto.

76 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Temas abstratos tornam-se mais fáceis de entender quando são re-
lacionados a histórias, a situações reais do dia a dia ou são pro-
blematizados envolvendo os próprios alunos. Por exemplo, ao
ensinar uma situação problema que envolva o sistema monetário,
por que não montar, na sala de aula, um mercadinho com emba-
lagens vazias de produtos para os alunos comprarem, utilizando
réplicas de dinheiro? Ao trabalhar um texto instrucional (receita),
por que não fazer essa receita com os alunos? Com base nessas
experiências, eles aprenderão quantidades, fração e noção tem-
poral de forma divertida.

Simplificar o material didático para um estudante com deficiência


intelectual não significa retirar conteúdos ou torná-los mais fáceis,
significa tornar o mesmo conteúdo mais simples. Aprender a tabua-
da até o nove escrevendo e estudando, por exemplo, não é simples.
Mas aprender a tabuada de um número por vez, por meio de jogos,
música e brincadeira, é mais simples e os efeitos na aprendizagem
são melhores.

Adaptar o conteúdo significa considerar o nível do estudante e per-


mitir que aprenda o que os demais estão aprendendo, com respeito às
suas limitações. Sobre esta questão, veja o Exemplo 6:

Exemplo 6
Um estudante com deficiência intelectual frequenta o 4º ano, mas ainda não con-
segue produzir textos. A professora prepara uma aula para trabalhar o texto descri-
tivo com seus alunos. Leva a turma para um passeio nos arredores da escola e pede
que observem o entorno. Ao voltarem para a sala, sugere aos alunos a produção
textual, e, sabendo que não conseguiria ainda produzir um texto, solicita ao aluno
com deficiência uma lista de palavras. Depois que os textos dos demais alunos são
escritos, corrigidos e colocados em exposição, a professora inclui o texto do aluno
especial, como fechamento dos demais, explicando que as palavras escritas por ele
estão em todos os textos escritos pela turma.

O Exemplo 6 mostra a segurança da professora em trabalhar no en-


sino regular com um estudante com deficiência intelectual. Ela propõe
uma aula dinâmica que permite a observação de algo real e a partici-
pação de todos os alunos. No momento da atividade, considera o nível
de escrita do estudante com deficiência intelectual e adapta o comando
para que ele possa participar. Além disso, valoriza a produção do aluno,
respeitando sua capacidade de escrita.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 77


Isso comprova que não há inclusão sem um planejamento bem ela-
borado. Para fazer adaptações curriculares, é preciso organização da
prática pedagógica, uma tomada de consciência da necessidade dos
alunos e de suas potencialidades.

O estudante com deficiência intelectual precisa muito da repetição,


pois o cérebro faz conexões quando o conteúdo é reforçado. Cabe sa-
lientar que não se trata de repetir da mesma forma, mecanicamente,
até a exaustão, a repetição deve ser feita de maneiras diferenciadas
e com recursos diferenciados. É preciso ensinar o mesmo assunto de
vários modos, desenvolvendo a habilidade de atenção.

Na educação infantil, por exemplo, o conceito de dentro e fora pode


ser trabalhado utilizando os seguintes métodos:
•• Com o corpo: explicar aos alunos que eles estão dentro da sala
de aula, pedir que saiam da sala e, então, explicar que estão
fora dela.
•• Com a audição e o corpo: entregar uma caixa vazia para cada
estudante e propor a brincadeira: “quando eu falar dentro, vocês
entram na caixa, quando eu falar fora, vocês saem da caixa”.
•• Com música, corpo e audição: colocar um bambolê em frente
a cada estudante e explicar que eles devem dançar dentro do
bambolê. Quando a música parar, deverão ficar fora do bambolê,
quando voltar a tocar, ficarão dentro do bambolê.
•• Com o corpo e a audição: entregar um prato de papelão para
cada aluno e pedir que façam um bolinho, com massa de mode-
lar. Quando a professora falar dentro, os alunos colocam o boli-
nho no prato, quando ela falar fora, colocam na carteira.

Em relação à avaliação, é importante o professor considerar o pro-


gresso do estudante com deficiência intelectual. Uma opção é fazer um
portfólio do aluno, em que são guardadas suas produções, para que
possa comparar com as anteriores ao término de cada mês, semestre e
ano. Nas avaliações escritas, é importante elaborar questões objetivas
e, se possível, com imagens, desse modo, o estudante terá maior com-
preensão do comando da questão.

É necessário compreender que não existe normalidade, todos os


estudantes são diferentes e cabe ao professor facilitar a aprendizagem,
promovendo um ensino acessível.

78 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


3.5 Adaptações curriculares para
Vídeo estudantes com deficiência física
São necessárias adaptações curriculares para estudantes com de-
ficiência física? Comumente, a preocupação dos professores é com a
acessibilidade física, isto é, se o espaço da escola está adaptado para
receber o aluno com esta deficiência. Há rampas de acesso? Banheiros
adaptados? As portas são acessíveis?

Mas será que a adaptação curricular também está entre as preo-


cupações? Será que apenas a acessibilidade arquitetônica é suficiente
para garantir a aprendizagem do estudante com deficiência física?

É fato que modificações no ambiente físico, nos materiais e equi-


pamentos utilizados para promover a acessibilidade são fundamentais
para o estudante com deficiência física, porém, se o professor insistir em
um currículo tradicional, não flexível, provavelmente não terá sucesso
ao ensinar esse público, porque algumas adaptações são necessárias,
dependendo do tipo e do nível do comprometimento do aluno.

Vamos iniciar aprendendo sobre a deficiência física, as barreiras


que dificultam a aprendizagem desses alunos e quais as possibilidades
de adaptações curriculares no contexto educacional, para garantir a
aprendizagem. No Decreto Federal n. 5.296/04, artigo 5º, a deficiência
física é definida como uma “alteração completa ou parcial de um ou
mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento
da função física” (BRASIL, 2004). O mesmo documento apresenta a de-
ficiência física sob a forma de
paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia,
tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, os-
tomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral,
nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida,
exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificul-
dades para o desempenho de funções. (BRASIL, 2004)

Um estudante com deficiência física pode ter limitações na mobi-


lidade e coordenação motora global, também poderá ter alterações
na fala, tudo depende do nível de comprometimento da deficiência.
Isso pode acontecer devido a causas genéticas, ou seja, as pessoas já
nascem com um gene que pode desencadear algum tipo de deficiên-

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 79


cia ou por doenças que causam a deficiência física, como a paralisia
cerebral (PC), a esclerose múltipla, a artrite, a poliomielite, a distrofia
muscular, entre outras doenças. Os acidentes também podem ser con-
siderados causas de deficiências físicas.

Sobre esta questão, veja o Quadro 1 a seguir:


Quadro 1
Deficiências Físicas (D.F)

D.F Definição
Comprometimento motor total abaixo da cintura, cuja causa
Paraplegia
geralmente é uma lesão na medula espinhal.

Comprometimento motor total, em um dos lados do corpo,


Hemiplegia
pode ser direito ou esquerdo.

Ausência de movimentos em apenas um membro do corpo,


Monoplegia
pode ser em um braço ou em uma perna.

Ausência de movimentos em dois membros do corpo, como os


Diplegia
dois braços ou as duas pernas.

Ausência de movimentos em quatro membros do corpo, bra-


Tetraplegia
ços e pernas.

Hemiparesia Comprometimento motor parcial, em um dos lados do corpo.

Paraparesia Comprometimento motor parcial abaixo da cintura.

Amputações Retirada total ou parcial de um ou mais membros do corpo.

Fonte: Elaborado pela autora com base em Honora e Frizanco, 2008.

No Quadro 1 ainda poderíamos acrescentar o nanismo, que é uma


deficiência no crescimento, conhecido por causar baixa estatura, se
comparado com a média da população, de causa genética; a ostomia,
uma intervenção cirúrgica que permite o uso de dispositivo, geralmen-
te uma bolsa, utilizado para eliminar dejetos do organismo; e a PC,
inserida na categoria das deficiências físicas, segundo os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) Adaptações Curriculares (BRASIL, 1998).

A paralisia cerebral, de acordo com Honora e Frizanco (2008), é de-


corrente de uma lesão no sistema nervoso central, nos primeiros es-
tágios do desenvolvimento. Essa lesão causa comprometimento nos
movimentos, na postura e no tônus muscular da criança, no entanto,
esses sintomas não se agravam e não progridem com a idade. Nos pri-
meiros meses de vida, a criança parece normal, mas com o passar do
tempo, os distúrbios motores começam a aparecer, podendo vir acom-
panhados de alterações de comunicação, cognição, percepção, com-
portamento, funções sensoriais e crises convulsivas.

80 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Você já teve a oportunidade de conhecer uma criança com PC? Será Curiosidade
que todo estudante com paralisia cerebral tem também déficit intelec- No Brasil, segundo a
tual (DI)? Associação Brasileira de
Paralisia Cerebral (ABPC),
Isso é um mito, muitas vezes, quem tem PC não tem nenhum com- a maior incidência de
PC, é em decorrência da
prometimento cognitivo, apenas limitações físicas e, dependendo da anoxia perinatal, falta de
região do cérebro afetada, apresenta descoordenação motora, arrasta oxigênio para o bebê por
um trabalho de parto
os pés quando anda, não tem boa postura, apresenta movimentos in- anormal ou prolongado.
voluntários e dificuldade na comunicação. Na escola, geralmente, esse Disponível em https://
estudante não consegue ficar muito tempo sentado e escreve de forma paralisiacerebral.org.br/. Acesso em:
27 jul. 2020.
desordenada, fora dos padrões convencionais. Essas peculiaridades fa-
zem com que sofram discriminações, por falta de conhecimento das
Atenção
pessoas e dos professores, no ambiente escolar.
O artigo 3º, inciso IX, da Lei
Conhecer os estudantes com deficiência física, compreendendo n. 13.146/2015 – Estatuto
suas limitações, favorece adequações necessárias no espaço físico e da Pessoa com Deficiência,
prevê o conceito de “pessoa com
no currículo escolar, porque todos os alunos necessitam participar das mobilidade reduzida: aquela
aulas e das atividades pedagógicas realizadas na escola. que tenha, por qualquer motivo,
dificuldade de movimentação,
No que se refere à acessibilidade arquitetônica, estamos falando do permanente ou temporário,
direito de ir e vir, um direito constitucional de todas as pessoas. Mas gerando redução efetiva da
mobilidade, da flexibilidade,
como garantir esse direito, no ambiente escolar, para uma pessoa que
da coordenação motora ou da
tem deficiência física ou mobilidade reduzida? percepção, incluindo idoso,
gestante, lactante, pessoa com
A primeira atitude a ser tomada é a eliminação de barreiras físicas,
criança de colo, obeso” (BRASIL,
ou seja, “qualquer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o acesso, 2015). Mobilidade reduzida não
a liberdade de movimento, a circulação com segurança e a possibili- se enquadra como deficiência
física.
dade de as pessoas se comunicarem ou terem acesso à informação”
(BRASIL, 2004, p. 61).
Leitura
E na sala de aula, o que um estudante com deficiência física pre-
Acessibilidade a edificações,
cisa para aprender com qualidade? As mesas precisam possibilitar a mobiliário, espaços e
aproximação da cadeira de rodas e, se o estudante tem dificuldades equipamentos urbanos
são parâmetros técnicos
de coordenação motora, sugere-se colocar canaletas de madeira ou de que proporcionam
PVC cortado ao meio, em toda a volta da carteira, para evitar que os lá- maior acessibilidade no
ambiente, para garantir
pis caiam no chão (BRASIL, 2006b). As cadeiras podem ser giratórias, a a autonomia do maior
fim de facilitar o movimento do estudante e é importante disponibilizar número possível de
pessoas. Verifique a nor-
descansos para os pés. ma relacionada a esses
parâmetros, conforme a
A mesa e a lousa devem estar na altura adequada para aproxima- ABNT NBR 9050.
ção do estudante em cadeira de rodas e dos estudantes com baixa Disponível em: https://pt.slideshare.
estatura. A organização da sala de aula deve possibilitar a circulação net/AlineNaue1/nbr-9050-
atualizada. Acesso em: 20 jul. 2020.
do estudante com deficiência física, ou seja, não ter obstáculos pelo

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 81


trajeto que ele deve fazer diariamente. Se utilizar bengala ou muleta,
organizar o local para que fiquem próximas ao estudante.

Adaptações nos materiais de estudo também são necessárias


para atender às necessidades de estudantes com deficiência fí-
sica, pois alguns podem ter problemas na coordenação motora
das mãos e, nesses casos, segurar um lápis é uma tarefa bastante
complicada, assim como folhear um livro, segurar um talher, abo-
toar a camisa e amarrar um cadarço. Nessas situações, é possível
aumentar o calibre do lápis, enrolando fita crepe ou espuma, ou,
ainda, encaixar uma bola de borracha atrás do lápis. Providenciar
suporte para os livros ou entregar folhas separadas também são
estratégias de adaptação. Colocar clipes entre as páginas dos livros
e cadernos ajuda a manipulação. A escrita também pode ser rea-
lizada no computador com teclados especiais. Além disso, quando
a deficiência atinge membros superiores, utiliza-se o capacete com
ponteiras, equipamento com uma haste fixada na cabeça, para fa-
cilitar a digitação.

Quando falamos em material escolar adaptado, adaptação arqui-


tetônica, mobiliário adaptado e informática acessível para estudantes
com deficiência física, e quando propomos a participação de pessoas
com outras deficiências, estamos falando de tecnologias assistivas.
Tecnologia Assistiva é uma área do conhecimento, de característi-
ca interdisciplinar que engloba produtos, recursos, metodologias,
estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcio-
nalidade, relacionada à atividade e participação, de pessoas com
deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua
autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social.
(BRASIL, 2009)

Vamos pensar em um estudante com muita dificuldade em utili-


zar o mouse do computador: há a possibilidade de acionar o mouse
com os pés, as mãos e o movimento de coxas, dependendo da defi-
ciência da pessoa. Também, existe o mouse ocular, o qual pode ser
controlado pelos movimentos faciais realizados pela boca e pelos
olhos, não precisamente pelas mãos.

Mas e a prática de sala de aula, como conduzir um estudante


com deficiência física? Observe a situação a seguir.

82 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Exemplo 7
Um aluno do 3º ano do ensino fundamental apresenta dificuldades motoras
nos membros superiores, por isso, escreve utilizando um adaptador no lápis.
A professora escreve um texto na lousa e sugere que os alunos o copiem na íntegra.
O objetivo é verificar a coordenação viso-motora, a atenção e a habilidade de es-
crita. Para o aluno com dificuldades motoras, a professora entrega o mesmo texto
impresso, porém, faltando o último parágrafo, o qual ele deverá copiar.

No Exemplo 7, é possível notar a adaptação realizada pela professora,


para incluir na aula o estudante com deficiência. Ela não mudou o objetivo
da atividade, apenas adaptou-a para o aluno. Considerando que, em virtu-
de de sua dificuldade, o estudante levaria muito mais tempo que os demais
alunos para realizar a atividade, fez uma adaptação na temporalidade.

A professora tem em sua sala de aula um estudante com paralisia cerebral. Ele consegue
compreender todos os conteúdos ensinados, porém, apresenta muitas dificuldades na
escrita e não consegue falar, o que dificulta a percepção do quanto aprendeu. A pro-
fessora utiliza com esse aluno a comunicação alternativa: por meio de um tabuleiro
contendo símbolos gráficos, desenhos, letras, números e sentenças, ela sugere que o
estudante aponte, fazendo-se entender.

Todos os procedimentos, técnicas e metodologias diferenciadas, di-


recionados aos estudantes com deficiência física, contribuem para a
interação e para a comunicação. O importante é que o professor esteja
atento às necessidades peculiares dos alunos e planeje as ações de
ensino, tendo em vista que são vários os tipos de deficiência física com
os quais poderá se deparar no contexto educacional e cada uma delas
implica ações diferenciadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer do capítulo, oferecemos o conhecimento teórico e aborda-
mos as possibilidades práticas para ensinar estudantes com deficiência. Por
meio desse estudo, concluímos que promover adaptações curriculares não
significa individualizar o atendimento do estudante com deficiência, ou seja,
oferecer a ele um currículo especial e diferente, mas sim permitir que tenha
oportunidade de aprender como os demais alunos, por meio de adaptações
nas atividades, recursos e técnicas de ensino. As adaptações curriculares exi-
gem um trabalho de equipe, do conhecimento, da atitude e do planejamento
organizado pelo professor.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 83


REFERÊNCIAS
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Legislativo, Brasília, DF, 3 dez. 2004. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
Ato2004-2006/2004/Decreto/D5296.htm. Acesso em: 17 jul. 2020.
BRASIL. Decreto n. 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Diário Oficial da União, Poder
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BRASIL. Lei 10.436., de 24 de abril de 2002. Língua Brasileira de Sinais. Diário Oficial da
União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 25 abr. 2002. Disponível em: http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm. Acesso em: 17 jul. 2020.
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Brasília, DF, 28dez. 2012. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/lei/l12764.htm. Acesso em: 17 jul. 2020.
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Brasília, DF, 7 jul. 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
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a construção de escolas inclusivas. 2. ed. coordenação geral SEESP/MEC. Brasília: MEC,
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BRASIL. Ministério da Educação. Saberes e práticas da inclusão: desenvolvendo competências
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HONORA. M; FRIZANCO, M. Ciranda da inclusão: esclarecendo as deficiências. São Paulo:
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LACERDA, C. B. F.  Intérprete de Libras: em atuação na educação infantil e no ensino
fundamental. 6. ed. Porto Alegre: Medição, 2014.

84 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


OMS. Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual. Trad. de Dr. Jorge Márcio Pereira
de Andrade. Montreal, Canadá, out. 2004. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.
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SACRISTÁN, J. G; GÓMES, P.  Compreender e transformar a escola. 4. ed. Porto Alegre:
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SASSAKI, R, K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
VYGOTSKY, L. S. Trabalhos completos. Fundamentos da defectologia. v. 5. Havana: Editorial
Pueblo Y Educación, 1989.

GABARITO
1. O conhecimento sobre esses aspectos é importante, porque vai possibilitar com-
preender o estudante com deficiência e entender as suas necessidades, para, assim,
elaborar um planejamento com adaptações curriculares. Além disso, conhecendo as
possibilidades de adaptações para cada tipo de deficiência, poderá garantir a aprendi-
zagem de todos os estudantes.

2. É necessário propor adaptações que envolvam o tato, utilizando, por exemplo, contor-
no em relevo nas formas, objetos concretos e frutas vazadas. Uma sugestão é preen-
cher as formas com materiais de diferentes texturas: algodão, lixa, raspas de lápis,
bolinhas de papel etc.

3. O professor deve compreender que, na escrita do estudante surdo, há marcas da comuni-


cação desse aluno (Libras), por isso, não são utilizados todos os elementos da língua por-
tuguesa. É preciso valorizar o conteúdo, não a forma como a mensagem foi estruturada.

Adaptações curriculares para estudantes com deficiência 85


4
Adaptações curriculares para
estudantes com transtornos
específicos de aprendizagem
Na diversidade da sala de aula, há estudantes que apresentam
dificuldades de leitura, de escrita e com cálculos, isto é, têm trans-
tornos específicos de aprendizagem. Neste capítulo, aprendere-
mos como identificar esses alunos e quais atitudes e adaptações
curriculares podem ser realizadas para ajudá-los no contexto edu-
cacional e na vida pessoal.

4.1 Estudantes com transtornos


Vídeo específicos de aprendizagem
Para compreendermos o que são transtornos específicos de apren-
dizagem, partiremos do pressuposto de que aprender não é algo tão
simples assim, pois trata-se de um processo contínuo, dinâmico, que
envolve afetividade, motivação e cognição, além de ser individual.

Não é raro encontrarmos, no cenário escolar, estudantes que apre-


sentem dificuldades ou transtornos de aprendizagem que os impeçam
de aprender com maior precisão determinados conteúdos ensinados
nas salas de aula.

Quando falamos sobre dificuldades e transtornos de aprendizagem,


é importante saber que ambos os conceitos possuem diferenças, en-
tre elas a temporalidade: enquanto as dificuldades de aprendizagem
são passageiras, os transtornos são permanentes. Sobre esta questão,
acompanhe o exemplo a seguir:

86 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Exemplo 1
Um estudante do 1º ano do ensino fundamental tinha bom desempenho na escola
até o segundo semestre do ano letivo, quando perdeu seu pai em um acidente
de trânsito. O acontecimento afetou o desempenho escolar do aluno, que chorava
durante as aulas, não prestava atenção e deixou de fazer as tarefas sugeridas pela
professora. Provavelmente o acidente do pai afetou o aspecto emocional do estu-
dante, interferindo na sua aprendizagem. No entanto, com a ajuda de psicólogos,
familiares, professores e amigos, esse sentimento de tristeza e perda pôde ser ame-
nizado e o estudante conseguiu retomar o bom desempenho escolar.

O exemplo apresentado diz respeito a uma dificuldade de aprendi-


zagem que pode ser desencadeada não apenas por questões emocio-
nais, mas também físicas, por problemas familiares, por alimentação
inadequada, entre outros fatores.

Diferentemente das dificuldades de aprendizagem, os transtornos


de aprendizagem envolvem questões neurológicas e acompanham o
estudante ao longo da vida, podendo prejudicar a trajetória escolar se
não forem compreendidos pelos professores e até mesmo interferir na
atuação profissional na vida adulta. Tratam-se de alterações cerebrais,
ou seja, o cérebro da pessoa com transtorno específico funciona de
modo diferente, faz conexões diferenciadas em relação a um cérebro
normal; no entanto, isso não significa que ela não seja capaz de apren-
der ou menos inteligente, apenas precisa de adaptações curriculares.

Para que o currículo atenda a esse público específico, não pode


se limitar a conteúdos e planos de ensino, deve ser “organizador do
percurso formativo de um grupo de indivíduos, trazendo em sua cons-
trução conhecimentos, saberes, conteúdos e métodos acadêmicos con-
siderados os mais adequados para aquele percurso” (AGNOL; SALTON;
SOUZA, 2018, p. 51).

Segundo o DSM-5 (APA, 2014), os transtornos específicos de apren-


dizagem são transtornos do neurodesenvolvimento relacionados a
aspectos biológicos, não podendo ser associados a doença cerebral,
traumatismo, comprometimento visual ou auditivo, falta de oportuni-
dade de aprender ou comprometimento na inteligência. Eles são classi-
ficados da seguinte forma: transtorno com prejuízo na leitura (dislexia),
transtorno com prejuízo na escrita (disortografia e disgrafia) e prejuízo
na matemática (discalculia).

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 87


O DSM-5 (APA, 2014) utilizou alguns critérios para identificar de
Saiba mais
maneira mais ampla os transtornos específicos de aprendizagem.
Os transtornos do neurodesen-
volvimento surgem antes de
No que se refere ao transtorno com prejuízo na leitura, foram iden-
a criança ingressar na escola. tificadas pessoas que leem palavras em voz alta de modo incorreto,
São condições que se iniciam lentamente e com esforço demasiado, muitas vezes tentando adivi-
na infância e têm impacto
importante no funcionamento nhar as palavras quando estão lendo. Também apresentam muita
pessoal, social, acadêmico ou dificuldade para soletrar e compreender o sentido do texto.
profissional.
As pessoas que apresentam transtorno com prejuízo na escrita
têm dificuldade com ortografia, não conseguem organizar a escrita
e omitem, ocultam e substituem letras e sílabas. Isso faz com que
não apresentem clareza.
Livro
Quando o prejuízo é matemático, as dificuldades são com nú-
meros, raciocínios que envolvam situações numéricas, operações
matemáticas, contagem e situações-problema.

No manual DSM-5 (APA, 2014), o transtorno do déficit de atenção


e hiperatividade (TDAH) é também classificado como um transtorno
do neurodesenvolvimento, pois muitas crianças com TDAH apresen-
tam dificuldades de escrita e cálculo por causa falta de atenção,
distração e agitação motora, precisando, assim, de adaptações cur-
A obra Transtornos do riculares para terem bom desempenho escolar.
neurodesenvolvimento
traz orientações aos A identificação dos estudantes com transtornos específicos
profissionais da educação
sobre o conhecimento de de aprendizagem nas salas de aula e a avaliação diagnóstica são
patologias e sugestões de extrema importância para um planejamento diferenciado que
de como fazer adapta-
ções curriculares para os ajude na aprendizagem. Essa avaliação deve ser feita por uma
promover a inclusão equipe de profissionais composta por pedagogos, psicólogos, neu-
educacional.
rologistas, fonoaudiólogos e psicopedagogos, que irão coletar da-
FREITAS, E. Rio de Janeiro: Wak,
2019. dos, investigar a história de vida do estudante e realizar testes.
Uma investigação adequada requer tempo e trabalho conjunto dos
profissionais, incluindo a família e a escola.

4.2 Adaptações curriculares para


Vídeo estudantes com dislexia
O excerto a seguir, do livro João, preste atenção!, de autoria de
Patrícia Secco, ajudará na compreensão prática do que é ser um es-
tudante com dislexia.

88 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Livro
Não sei por que, mas as letras faziam uma confusão tão grande na minha cabeça que
eu preferia nem olhar para elas! E, se eu tinha de ler em voz alta, então, era horrível...
Eu morria de vergonha. Tinha certeza de que meus amigos estavam todos olhando
para mim, achando que eu era burro. (SECCO, 2006, p. 5)

O fragmento do livro nos mostra os sentimentos que um estudante O protagonista do livro


com dislexia tem ao se deparar com um texto escrito. Apesar de ter um João, preste atenção! não
está tendo bom desem-
desenvolvimento intelectual adequado, ele apresenta muitas dificulda- penho na escola, apre-
des na aprendizagem da leitura, estendendo-se para a dificuldade de sentando dificuldades na
leitura, na escrita e ma
interpretação e escrita, o que gera um sofrimento psicológico e pode interpretação. Porém,
afetar a saúde do estudante de uma forma geral, com episódios de quando os professores
compreendem que João
ansiedade, dores musculares ao escrever e cansaço visual e mental na tem dislexia e fazem um
tentativa de leitura. trabalho conjunto com
a família, ele começa a
Quando falamos em dislexia, estamos tratando de um transtorno superar suas dificuldades.

específico de aprendizagem. Para Zorzi (2008), o indivíduo disléxico SECCO, P. E. São Paulo:
tem um déficit nas habilidades de linguagem, especificamente na lei- Melhoramentos, 2006.

tura, o que faz com que ele tenha dificuldades para compreender as
estruturas sonoras das palavras e fazer a correspondência dos fone-
mas às letras, tornando a aprendizagem da leitura algo que demanda
tempo e muito esforço.

Por mais que o estudante com dislexia se esforce, é importante


compreender que a sua aquisição da leitura sempre será mais lenta
em relação ao outros estudantes. É inviável e prejudicial fazer compa-
rações de ritmos de leitura entre os estudantes na sala de aula, pois
esse procedimento gera desmotivação naqueles que têm dificuldades.

A dislexia está relacionada ao funcionamento do cérebro. Conforme


Moura (2013, p. 14), “os disléxicos recebem informações em uma área
diferente do cérebro, portanto o cérebro de um disléxico é normal”.
Mas, se o cérebro é normal, por que ele não aprende? Que tal com-
preender como funciona o cérebro de um disléxico?

Imagine um estudante que não tem dislexia lendo um texto. Ele


utiliza três áreas do cérebro: a primeira identifica as letras, a segun-
da entende o significado do que foi lido e a terceira processa toda a
informação. No estudante com diagnóstico de dislexia, esse trajeto
das informações no momento de ler é diferente: as duas primeiras
áreas do cérebro, a que identifica as letras e a que compreende

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 89


o significado, são menos ativas, e a
terceira acaba tendo que trabalhar
muito mais, gerando lentidão no
ato de ler, compreender e registrar.
Não significa que o cérebro é defi-
ck
sto
er ciente, ele apenas trabalha de modo
tt
hu

diferente. Essa demora do estudante


o/S
a Castagn

no processamento das informações


ncesc

muitas vezes faz com que ele seja vis-


Fra

to como preguiçoso e desinteressado,


la
ar

C
mas isso apenas reforça a importância de
o professor estar informado para motivar o
aluno e tornar a aprendizagem acessível.

No ambiente escolar, a dislexia é facilmente percebida, porque,


ao estar em contato com grupos de alunos, o disléxico não consegue
acompanhar o ritmo de aprendizagem e precisa de atendimento dife-
renciado para aprender e de adaptações curriculares adequadas.
Saiba mais
Como identificar e propor adaptações curriculares que facilitem
Quando um estudante
tem dislexia, as letras e os a aprendizagem dos estudantes com dislexia? O professor precisa
símbolos parecem dançar ­observar seus alunos.
na folha de papel, influen-
ciando a compreensão. Segundo o Instituto ABCD (2015), alguns sinais aparecem durante
Você pode experimentar
como é a leitura de uma a escolaridade. Na educação infantil, a criança insiste em utilizar a
pessoa com dislexia no fala infantilizada, demora para formar frases completas, troca fo-
site a seguir.
nemas ao falar, demora para ampliar o vocabulário, tem dificulda-
Disponível em: https://www.
fasdapsicanalise.com.br/como-e- des para perceber as rimas, demora para aprender cores, formas,
ler-com-dislexia-experimente-e-
números e para escrever o próprio nome e tem dificuldade de or-
perceba-melhor/. Acesso em: 25
ago. 2020. ganizar uma história com sequência lógica. Ela também apresenta
dificuldades de coordenação motora, na montagem de quebra-ca-
Atenção beças e desinteresse por livros impressos.
Estudantes com dislexia Nos anos iniciais, o estudante é lento para copiar, demora para so-
devem frequentar a escola
letrar palavras, inverte os números (9/6), demora para sequenciar os
comum, contar com adaptações
curriculares e acompanhamento sons e tem dificuldades para aprender a tabuada e a letra manuscrita.
de profissionais – psicólogo,
fonoaudiólogo e psicopedagogo Nos anos finais, não gosta de ler em voz alta, tenta adivinhar as pa-
– que auxiliarão no trabalho lavras, é desorganizado na escrita, tem dificuldade com horas e calen-
do professor, bem como com o
dário, deixa as tarefas incompletas devido à falta de tempo, apresenta
atendimento especializado.
dificuldades para interpretar textos e situações-problema.

90 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Após identificar os sintomas, o professor precisa buscar ajuda de uma
equipe multidisciplinar, que confirmará ou não o transtorno específico.

As adaptações para estudantes com dislexia durante a escolarida-


de devem ser nas estratégias de ensino, na avaliação e na atitude do
professor. Esse profissional precisa entender o transtorno e conversar
com o estudante, perguntar se ele deseja que os demais alunos saibam
como ele aprende, pois, se for da vontade dele, será necessário elabo-
rar uma aula sobre dislexia para toda a turma.

Respeitar os limites de leitura, valorizar o progresso e integrar o es-


tudante aos demais alunos é fundamental para ajudá-lo a conviver com
o transtorno, que não tem cura, mas pode ser amenizado com inter-
venções pedagógicas adequadas.

O professor deve trazer o estudante para perto dele quando for


dar instruções, utilizar uma linguagem clara e direta e olhar nos olhos
do aluno para ter certeza de que ele compreendeu o conteúdo. De-
ve-se evitar pedir para ele ler em público, mas, se for necessário, é
preciso ajudá-lo a se preparar com antecedência.

As atividades devem ser propostas para a turma toda, u


­ tilizando-se
estratégias que favorecerão especialmente o estudante disléxico. Ao
apresentar um texto escrito no quadro, uma estratégia a ser usada é
também entregá-lo impresso para os estudantes, solicitando que ele
destaquem palavras importantes no texto. O estudante disléxico parti-
rá desse grupo de palavras destacadas para compreender a mensagem
do texto, conforme o exemplo a seguir.

Exemplo 2
Você sabia que a baleia não é um peixe? Isso mesmo, a baleia é um mamífero. Dife-
rentemente dos peixes, elas produzem leite para seus filhotes. Outra característica é
que a baleia respira pelos pulmões, e os peixes, pelas brânquias.

As palavras destacadas no texto poderão ser registradas em forma


de fluxograma, assim o estudante disléxico não perderá a sequência
lógica do texto.

Permitir a utilização de gravadores de voz (celular) auxilia muito


o disléxico a rever o conteúdo que muitas vezes não consegue com-
preender durante a aula. Ensinar a fazer síntese dos textos, resumir o
que é importante e utilizar esquemas é facilitar a aprendizagem de um
estudante com dislexia.

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 91


Quando os textos forem muito extensos, sugere-se que sejam en-
Atividade 1 tregues impressos ao estudante, e, quando forem solicitadas produ-
Um estudante do 4º ano do ções escritas, que não sejam tão extensas, permitindo que também
ensino fundamental apresenta possam ser orais ou representadas com desenhos.
muita dificuldade de leitura e,
quando é convidado a ler em voz Se o estudante estiver na fase de alfabetização, recomenda-se
alta um texto de uma folha, fica trabalhar com uma metodologia que priorize a compreensão das
muito ansioso e não consegue
pronunciar corretamente as
partes para chegar ao todo. O disléxico tem muitas dificuldades com
palavras. Os colegas, por sua vez, a compreensão do todo, por isso precisa compreender letras, síla-
não têm paciência para esperar bas, palavras, frases e textos. Habilidades de espaço, tempo, latera-
ele realizar a leitura e ficam
lidade e coordenação motora também são importantes durante o
rindo da sua dificuldade. Esse
aluno apresenta qual transtorno processo de alfabetização.
específico de aprendizagem?
A utilização de alguns objetos facilita a vida dos estudantes com dis-
Cite uma adaptação que a pro-
fessora poderá fazer em sala de lexia, por exemplo: réguas vazadas, que têm uma abertura que permite
aula para ajudá-lo no momento ler o texto linha por linha, e o relógio de parede com ponteiro verme-
da leitura.
lho indicando a hora e preto indicando os minutos. Quanto ao uso do
computador, há fontes adequadas para a leitura de pessoas disléxicas,
Filme incluindo opções gratuitas, como a Open Dyslexic.
No momento da avaliação do conhecimento em sala de aula,
­Borba e Braggio (2016), em publicação da Associação Brasileira de
Dislexia, sugerem que o professor leia a prova em voz alta. Se utilizar
prova impressa, deve priorizar o uso da mesma fonte e o mesmo
tamanho de letra em todo o documento. Além disso, é preferível
realizar avaliações orais e que não privilegiem a memorização de
nomes, datas, fórmulas, regras gramaticais, espécies e definições.
É importante permitir a utilização da tabuada e da calculadora
Como estrelas na terra:
toda criança é especial quando as avaliações forem na área de matemática, assim como do di-
conta a história de um cionário na área de português. A questão de tempo também faz muita
menino com dislexia que,
devido à sua d­ ificuldade
diferença no momento da avaliação, pois o estudante disléxico é lento
de ler, escrever e com- e acaba sendo prejudicado quando precisa realizar avaliações no mes-
preender o que é ensina-
mo tempo que os demais estudantes.
do, sofre punições. O lon-
ga-metragem demonstra Adaptar a avaliação deixando as questões mais objetivas e curtas,
a importância de que pais
e professores tenham inserindo imagens e permitindo que algumas questões possam ser
conhecimento sobre esse respondidas oralmente é o adequado. Uma avaliação cuja metade das
transtorno para que não
julguem estudantes com questões corresponda à interpretação de um texto escrito, por exem-
dislexia como preguiço- plo, pode ser realizada na forma oral para o estudante disléxico, pois o
sos, desinteressados e
bagunceiros.
objetivo não é verificar se ele sabe escrever, mas sim interpretar.

Direção: Aamir Khan; Amole Gupte. O aluno com dislexia precisa se sentir amparado e confiante de que
Índia: Ásia Mundi, 2007. sua dificuldade não impedirá o seu sucesso escolar.

92 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


4.3 Adaptações curriculares para
Vídeo estudantes com discalculia
Quando ensinamos uma criança da educação infantil a fazer contagem
até 10 com objetos de materiais diversificados, ela aprende. Quando per-
guntamos a idade para um estudante do 1º ano do ensino fundamental,
ele logo diz e representa o número nos dedos. Quando explicamos para
um estudante do 2º ano o que representa o numeral 17 (10 + 7 = uma
dezena e 7 unidades), ele rapidamente compreende, principalmente se
utilizamos material concreto. Ao trabalhamos o sistema monetário na
educação de jovens e adultos (EJA) relacionando a aprendizagem de con-
tar cédulas e diminuir gastos com as experiências de vida dos estudantes,
conseguimos sucesso no ensino. Entretanto, as situações elencadas não
são tão simples assim quando o indivíduo tem discalculia.

A palavra discalculia “vem do grego (dis, má) e do latim (calculare, contar), forman-
do assim o ‘malcontar’” (OLIVEIRA, 2019b, p. 5).

A discalculia interfere no desempenho do indivíduo, dificultando a


realização de operações aritméticas, pois causa um c­ omprometimento
nas habilidades que envolvem números. Com base nas duas definições
apresentadas, pode-se perceber que é na disciplina de Matemática
que o estudante terá as maiores dificuldades. Ele não consegue com-
preender questões que muitas vezes consideramos fáceis, como fazer
contagem, relacionar quantidades, organizar uma sequência numérica,
entender ordem, espaço, tempo, distância, bem como resolver situa-
ções-problema e operações simples.

Observe, a seguir, o depoimento da mãe de um estudante com o


transtorno.

Acho que ele tem problema na cabeça. Está com 9 anos e pedi para ir comprar pães
para o café. Dei para ele uma nota de R$ 5,00. A compra deu R$ 3,00, ele voltou com
uma nota de R$ 2,00 e os pães para casa. Falei para ele ficar com o troco, só pedi
que me desse a nota que eu dava duas moedas de R$ 1,00 para que colocasse no
cofrinho que ele tem. Ele chorou e não entendeu que a nota de R$ 2,00 correspondia
ao mesmo valor de duas moedas de R$ 1,00, dizia que eu queria enganar ele.

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 93


Não ser capaz de compreender situações que envolvem números
não significa que o estudante tem uma deficiência, ele apenas tem uma
desordem neurológica.

Considerando a importância da utilização de conceitos matemáticos


no dia a dia da vida de qualquer pessoa, precisamos ter a clareza, como
professores, de que o estudante com discalculia precisa de ajuda. No
entanto, ajudar alguém somente é possível quando entendemos o pro-
blema. Vejamos a seguir alguns sinais de discalculia que podem ser
observados na sala de aula e na vida cotidiana de uma pessoa.

Ensino Vida
Etapa

Educação
infantil fundamental adulta

• Organizar os brinquedos
• Estimar custos.
de maneira lógica. • Entender valores.
• Fazer compras.
• Escrever os números na
Dificuldades

• Fazer contagem e
• Ter controle financeiro.
entender o significado de ordem correta.
• Compreender o tempo.
contar. • Compreender frações e
• Fazer cálculos mentais.
• Reconhecer conceitos de medidas.
• Entender gráficos e
maior, menor, alto, baixo. • Acompanhar a

Fireofheart/Shutterstock
planilhas.
• Relacionar o número à pontuação de um jogo.
• Estimar velocidade e
quantidade.
julgar distâncias.
• Escrever os números
sem invertê-los.

Fonte: Elaborado com base em Oliveira, 2019a, p. 10.

Além de saber identificar os sinais de discalculia, é importante co-


nhecer os modos como o transtorno se apresenta, pois essas informa-
ções são facilitadoras na organização do planejamento do professor
para realizar um ensino inclusivo.

Johnson e Myklebust (1983) explicam os seis tipos de discalculia.


O estudante com discalculia gráfica consegue compreender con-
ceitos e símbolos, mas tem muita dificuldade para escrevê-los. Por
isso, no momento de uma avaliação escrita de matemática, ele fica
completamente desorientado e, muitas vezes, acaba entregando a
avaliação em branco.

94 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Estudantes com discalculia ideognóstica têm grande dificuldade
com as operações mentais, o que faz com que compreender os con-
ceitos matemáticos seja muito trabalhoso. Essa dificuldade afeta até
mesmo a socialização, pois a pessoa não compreende conceitos bási-
cos do dia a dia.

No caso de um diagnóstico de discalculia léxica, a dificuldade está


na leitura e no reconhecimento de símbolos matemáticos, como ao ler
as horas e o calendário. Na discalculia operacional, a dificuldade está
na manipulação em realizar cálculos e operações matemáticas.

Na discalculia practognóstica, colocar em prática os conceitos


matemáticos para resolver situações do dia a dia é muito complica-
do. Por exemplo, se a pessoa vai ao supermercado com uma cédula
de R$ 50,00, não consegue fazer uma estimativa do que pode com-
prar com esse valor.

Ao ser diagnosticado com a discalculia verbal, a dificuldade será


em compreender os conceitos matemáticos quando são apresentados
oralmente. Aqueles desafios matemáticos ou problemas matemáticos
cujo enunciado a professora dita geram angústia no estudante, que
não consegue resolvê-los se não forem apresentados de maneira es-
crita ou concreta.

Após o diagnóstico de discalculia, que é feito por uma equipe multi-


disciplinar, é importante que sejam realizadas adaptações curriculares
para facilitar a aprendizagem e ajudar o estudante a resolver os proble-
mas do seu dia a dia, pois a matemática está presente em praticamente
todas as ações. A habilidade de trabalhar com os números precisa ser
ensinada com estratégias diferenciadas e, se necessário for, respeitan-
do as limitações de cada aprendiz. Veja um exemplo a seguir:

Karla tem 6 laranjas e gostaria de distribuí-las entre duas amigas. Quantas laranjas
Karla poderá entregar para cada amiga?
Essa situação-problema pode ser facilmente resolvida por um estudante com discal-
culia se for apresentada da seguinte forma:
• Solicite que o estudante distribua as laranjas, interligando-as às amigas.
Valentyn Volkov/
Shutterstock

amiga 1 amiga 2
(Continua)

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 95


E se o estudante tiver uma discalculia practognóstica, como é possível facilitar a
aprendizagem, já que ele não consegue fazer relações de valores? Por que não en-
sinar a utilizar a calculadora? Certamente esse instrumento de cálculo poderá fazer
parte do dia a dia e facilitar a vida quando ele for fazer compras, por exemplo.
No caso de um estudante com discalculia gráfica, a utilização do papel quadriculado
e de maior tempo para resolver as atividades facilitará o registro. Ensinar matemáti-
ca utilizando jogos também poderá auxiliar os estudantes com discalculia, que, por
meio da ludicidade e de modo prazeroso, vão construindo conceitos g­ radativamente,
tendo a oportunidade de refletir, escrever e resolver situações-problema e com-
preender os conceitos matemáticos.

Na sala de aula

Você já presenciou uma aula em que a professora coloca uma se-


quência de números no quadro e o aluno os recita mecanicamente?

Essa metodologia de ensino não é adequada, podendo ser substituí-


da pelo jogo. O estudante joga o dado com numerais até 6 e deve per-
correr no tabuleiro a quantidade de casas correspondente ao numeral
que tirou no dado. Ganha o jogo quem terminar antes o percurso. Essa
adaptação será bem aceita não apenas pelos alunos com discalculia,
mas também por todos os outros.

curiosity/Shutterstock

Depois, é possível incentivar o registro da sequência numérica, a


identificação dos números pares e ímpares, o sucessor e o antecessor
de cada numeral.

96 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Colocar imagens nas atividades para que o estudante relacione
quantidades ao numeral também é uma ótima estratégia de ensino,
pois, além de desenvolver conceitos matemáticos, trabalha habilida-
des psicomotoras.
LexiClaus/Shutterstock

A utilização de materiais concretos é fundamental no ensino da ma-


temática para alunos com discalculia. Materiais de contagem, utilização
de ábaco, material dourado, tangram, réplicas de dinheiro, entre ou-
tros, são muito favoráveis.

Nas avaliações e nas atividades de sala de aula, o professor pode-


rá permitir o uso de calculadora e tabuada, adotar o uso de caderno
quadriculado, elaborar situações-problema que permitam o uso de
materiais concretos ou imagens e, também, que tenham relação com a
vida real. Dependendo do conteúdo e do tipo de discalculia, opte pela
avaliação na forma oral. Estenda o tempo de resolução de atividades
e avaliação, priorizando a qualidade e não a quantidade de exercícios.

A tecnologia favorece a aprendizagem de todos os estudantes. Uti-


lizar o computador como ferramenta de ensino, quando possível, trará

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 97


resultados positivos, pois os alunos estarão em contato com recursos
visuais que ajudarão a desenvolver habilidades matemáticas.

É importante salientar que estudantes que sofrem com o transtorno


específico da discalculia não odeiam a matemática – eles não gostam
porque não conseguem fazer. A partir do momento em que tiverem
consciência sobre sua própria dificuldade, em que forem compreen-
didos pelos professores e estes utilizarem estratégias diferenciadas
de ensino e adaptações curriculares adequadas, os estudantes ficarão
motivados para aprender e as dificuldades serão minimizadas.

4.4 Adaptações curriculares para estudantes


Vídeo com disgrafia e disortografia
Disgrafia e disortografia são transtornos específicos relacionados à
escrita, que fazem com que o indivíduo apresente dificuldades para
expressar ideias e conhecimentos por meio dos signos gráficos.

Quando tratamos de escrita, é preciso considerar a importância da


letra legível, pois escrevemos para alguém ler. Sendo assim, a escrita
precisa ser adequada para facilitar a compreensão do leitor. Mas será
que todas as pessoas têm facilidade de ter uma letra adequada e legível?

Indivíduos com disgrafia não têm essa habilidade para escrever: o


simples ato de segurar o lápis corretamente e colocar nele a força neces-
sária é algo difícil; ou a escrita tem traços muito fracos ou traços muito
fortes; ou a letra sai muito pequena ou muito grande.

Outros sintomas são sentir a necessidade de se apoiar sobre


a mesa, aproximar a folha dos olhos no momento de escrever,
apoiar a cabeça com a mão que não está
escrevendo, virar a folha na mesa,
ou seja, a postura para escrever é
inadequada.

Na produção de um texto, a dificul-


dade é ainda maior, pois o estudante
com disgrafia não organiza adequada-
mente a escrita no papel; escreve as
k
Veja/Shutterstoc

letras muito juntas ou incompletas;


mistura letras maiúsculas e mi-

98 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


núsculas, letra cursiva e de imprensa; confunde letras; omite e troca
letras nas palavras; escreve muito rápido ou devagar; e tem cansaço
físico ao escrever.

O aluno com disgrafia geralmente é rotulado como preguiçoso,


aquele que tem letra feia. Porém, ter letra feia significa ter disgrafia?
É preciso cuidado no momento da avaliação diagnóstica, pois a letra,
com o passar do tempo, com as intervenções adequadas e com a matu-
ridade da criança, vai melhorando e chega a alcançar uma estética per-
feita, legível. Já na disgrafia isso não acontece e, embora sejam feitas
intervenções adequadas, o que se alcança é uma melhora, mas a es-
crita irregular continua até a vida adulta. Por esse motivo, avaliar uma
criança com disgrafia exige um período significativo de observação.

De acordo com Goméz e Terán (2009, p. 163),

“será disgráfica toda criança cuja escrita seja defeituosa, quando não tem algum
déficit neurológico ou intelectual importante que justifique”.

A disgrafia não é o único transtorno específico que prejudica a


escrita. A disortografia é mais um deles. Diferente da letra ilegível, a
­disortografia consiste na dificuldade de escrever sem erros ortográ-
ficos, o estudante constrói textos muito abaixo do esperado e o vo-
cabulário é restrito. Conforme Pereira (2009, p. 9), “as dificuldades
centram-se na organização, estruturação e composição dos textos es-
critos; a construção frásica é pobre e geralmente curta, observa-se a
presença de múltiplos erros ortográficos”.
Atividade 2

Características da disortografia Escrever é uma habilidade muito


importante, pois nos permite
• Troca de ch por x: chapéu/xapéu. organizar ideias, comunicar e
registrar conhecimentos, bem
• Troca de s por z: casa/caza.
como compartilhar com outras
• Troca de x por c: trouxe/trouce. pessoas o que escrevemos. No
entanto, há estudantes que
• Omissão de letras: beijo/bejo. não possuem essa habilidade,
• Fragmentação de palavras: enrolar/ em rolar. normalmente porque têm
disgrafia ou disortografia.
• Substituição: bode/dobe; dia/tia. Explique de que forma podemos
• Inversão: blusa/bulsa. diferenciar os dois transtornos de
aprendizagem.

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 99


É necessário observar os transtornos de disgrafia e disortografia e
refletir sobre eles no contexto escolar. Frequentemente, a criança que
apresenta um dos transtornos se mostra desmotivada a escrever, e o
professor precisa estar preparado para entender esses sintomas e en-
corajar o estudante por meio de intervenções e adaptações curricula-
res adequadas. A seguir, apresentamos no Quadro 1 algumas possíveis
Quadro 1 atitudes e adaptações em sala de aula.
Adaptações em sala de aula

Disgrafia Disortografia
•• Incentivar a aprendizagem de habilidades de digita- •• Evitar o uso de canetas vermelhas na correção dos
ção. cadernos e provas.
•• Permitir que o estudante receba ajuda de um escriba •• Manter-se calmo diante dos erros ortográficos e gra-
(colega que poderá ajudar nos registros). maticais.
•• Oferecer atividades digitalizadas. •• Usar material multissensorial para estimular os senti-
•• Permitir o uso de abreviaturas em alguns escritos. dos, especialmente o tato e a audição.
•• Quebrar a escrita em fases e ensinar os alunos a fazer •• Proporcionar exercícios de trava-língua a fim de pro-
o mesmo. mover a consciência fonológica da criança com dificul-
•• Permitir que o aluno use letra cursiva ou de forma, dade em leitura, escrita e ortografia.
optando pelo que for mais legível. •• Trabalhar a ortografia com jogos.
•• Permitir que o aluno utilize o instrumento de escrita •• Orientar a produção escrita.
que é mais confortável para ele. •• Reescrever textos em parceria com o estudante, aju-
•• Considerar se o uso de software de reconhecimento dando-o a perceber o erro.
de voz poderá ser útil. •• Trabalhar a consciência fonológica, a percepção das
•• Reduzir as tarefas de cópia. letras, palavras e sílabas.
•• Fornecer estrutura extra e prazos intermitentes para •• Estimular a percepção visual.
tarefas de longo prazo. •• Não dar muita ênfase à escrita correta no momento
•• Remover “nitidez” ou “ortografia” (ou ambos) dos cri- da avaliação, procurando considerar a dificuldade e
térios avaliativos. o esforço.
•• Ampliar o tempo das avaliações e priorizar a oralidade
e as questões de múltipla escolha.

Fonte: Oliveira, 2019 a, 2019b.

Além das adaptações que podem ser feitas na sala de aula, os mo-
mentos individualizados de ensino são muito importantes, porque
tornam possível utilizar técnicas que vão ao encontro da necessidade
específica do estudante. Por exemplo, se ele está com muita dificulda-
de em segurar o lápis (disgrafia), poderá fazer exercícios de fortaleci-
mento de braço, mãos e dedos e praticar a escrita com um adaptador.
A utilização do adaptador em sala de aula poderá constranger o es-
tudante pelo fato de somente ele utilizar o recurso; sendo assim, é
possível trabalhar no atendimento especializado de modo individual
e também orientar a família para que o adaptador seja usado nas
tarefas de casa.

100 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Estudantes com disgrafia e disortografia precisam ser com-
preendidos pelos professores. Muitos profissionais não
aceitam a dificuldade, acham que o estudante não
tem interesse e que, por isso, não aprende a es-
crever corretamente, reprovando esse pú-
blico por falta de conhecimento. No
entanto, é função da escola respeitar
essa diversidade, buscar de forma di-
nâmica estratégias diferenciadas de
ensino, oportunizar o sucesso escolar para to- lidiasilva/Shutterstock
dos os indivíduos que nela estão inseridos.
Adaptador de lápis para
pessoas com disgrafia.

4.5 Adaptações curriculares para


Vídeo estudantes com TDAH
O transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) não é
tão raro. Estima-se que de 3 a 5% das crianças em várias regiões do
mundo apresentem o transtorno, o que significa dizer que em cada
sala de aula é possível existir uma criança com TDAH, segundo estatís-
ticas da Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA, 2020).

O que acontece é que, devido à falta de conhecimento e avaliação


diagnóstica, muitos professores que atuam na educação infantil e nos
anos iniciais do ensino fundamental, ao se depararem com estudantes
que apresentam o transtorno, descrevem esses alunos como bagun-
ceiros, desorganizados, sem interesse em aprender.

Para a compreensão do que é um estudante com transtorno do


déficit de atenção e hiperatividade, três relatos serão apresentados,
sendo eles: os de uma professora que atua no 3º ano do ensino funda-
mental, descrevendo como é o estudante em sala de aula; da mãe do
estudante; e do próprio estudante. Os relatos são reais, coletados para
compor a avaliação multidisciplinar de um estudante com hipótese de
ter o transtorno.

1. Relato da professora
Todos os dias é assim, quando estou explicando o conteúdo, ele fica na mesa
de trabalho batendo os pés no chão e, quando para de bater os pés, começa
a bater o lápis na mesa, depois de alguns minutos pede para ir ao banheiro.
(Continua)

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 101


Quando volta, circula na sala, bate no ombro dos colegas, derruba objetos dos
colegas no chão. Está sempre preocupado com os barulhos externos, não conse-
gue prestar atenção no que estou falando e interfere na aula relatando fatos que
aconteceram, fala sem parar, parece que não consegue controlar a ansiedade
e, muitas vezes, ofende os colegas com as palavras. No momento de realizar a
atividade escrita, faz tudo muito rápido, nunca consegue concluir e, se for exi-
gido um pouco mais, chora. Deixar sem participar do recreio, levar ele para a
diretoria, chamar os pais na escola, de nada adianta, pois no dia seguinte ele já
se esqueceu das punições e torna a fazer tudo novamente. Seus materiais esco-
lares nunca estão completos, perde lápis, esquece caderno, uma criança muito
desorganizada. Por outro lado, é uma criança muito afetuosa comigo e com os
colegas, é muito inteligente, consegue demonstrar o que aprendeu na oralidade
com muita precisão. Muitas vezes estou explicando e ele fica circulando na sala,
quando pergunto o que expliquei, ele sabe a resposta.

2. Relato da mãe do estudante


Em casa, ele não consegue se sentar à mesa para se alimentar, anda com o prato
pela casa, abre a geladeira diversas vezes no dia, apenas abre e não pega nada.
Na hora do banho, não sabe o momento de sair, é necessário bater na porta e
até desligar a energia para que saia. Raramente sabe onde estão seus pertences,
como materiais escolares, roupas e brinquedos, e sempre está atrasado para os
compromissos. Quando o levo para cortar o cabelo, fica se mexendo na cadeira,
vira a cabeça de um lado para o outro, dificultando o trabalho do profissional, o
que faz com que seu corte de cabelo acabe sempre de péssima qualidade. Na
igreja, não tem como levá-lo: deita no banco, mexe-se o tempo todo e não tem
paciência. Na casa de amigos, circula por toda a casa, pergunta sobre tudo e in-
terrompe as conversas dos adultos. O que não entendo é que consegue ficar ho-
ras jogando no celular e assiste a um filme até o final, quando é do seu interesse.

3. Relato do aluno
Um dia desses, eu não conseguia ficar sentado na sala de aula, não aguentava
mais ouvir a professora explicar o texto, minhas pernas não me obedeciam, fi-
cavam balançando o tempo todo e me deu um aperto no peito. Então pedi para
ir ao banheiro, a professora deixou, ainda bem. Voltei para a sala e me sentei.
Passada uma meia hora, pedi para tomar água, a professora deixou. Quando
voltei para a sala de aula, a atividade era fazer uma leitura silenciosa de um texto
de duas folhas, pensei que iria enlouquecer fazendo a leitura e sabia que a pro-
fessora não iria me deixar sair novamente da sala, então joguei uma borracha
embaixo da mesa da professora e fui rastejando buscar. Ela imediatamente me
mandou sair da sala de aula e ir falar com a diretora. Que alívio!

Com base nos três relatos apresentados, é possível perceber como é


um estudante com transtorno do déficit de atenção e hiperatividade. Ele

102 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


apresenta os sintomas de agitação, impulsividade e falta de atenção em Livro
vários espaços e em diferentes situações.
O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento definido por
níveis prejudiciais de desatenção, desorganização e/ou hiperativi-
dade-impulsividade. Desatenção e desorganização envolvem inca-
pacidade de permanecer em uma tarefa, aparência de não ouvir
e perda de materiais em níveis inconsistentes com a idade ou o
nível de desenvolvimento. Hiperatividade-impulsividade implicam
atividade excessiva, inquietação, incapacidade de permanecer
sentado, intromissão em atividades de outros e incapacidade de
aguardar – sintomas que são excessivos para a idade ou o nível de No livro Mentes Inquietas,
desenvolvimento. (APA, 2014, p. 32) a autora explica como
identificar o transtorno
É importante salientar que, nas atividades de interesse, o estudante do déficit de atenção e
hiperatividade (TDAH),
com déficit de atenção e hiperatividade consegue manter a atenção e qual é o direcionamento
conter a agitação motora, ficando longo tempo nelas e concluindo-as. para diagnóstico e o tra-
balho a ser realizado para
Se gosta muito de desenhar, é capaz de ficar um tempo significativo rea- ajudar essas pessoas na
lizando a tarefa do início ao fim sem apresentar inquietação. Isso está vida pessoal, escolar e
profissional.
presente no relato da mãe do estudante com TDAH, ao informar que,
SILVA, A. B. B. Rio de Janeiro:
quando está no celular ou assistindo a um filme que o interesse, seu filho Globo, 2014.
fica tranquilo e com boa concentração. É mito achar que um estudante
não consegue manter a atenção em momento algum – tudo depende
da estimulação. O que o indivíduo com TDAH apresenta é dificuldade de
manter a atenção voluntariamente.

Silva (2014) explica que o transtorno também pode se manifestar de vá-


rias formas. Um estudante pode ter apenas desatenção, o chamado trans-
torno do déficit de atenção (TDA); em outros casos, há presença somente
de hiperatividade e impulsividade; e, em outros ainda, os sintomas acon-
tecem simultaneamente: falta de atenção, hiperatividade e impulsividade.

Para diagnosticar o TDAH, o estudante precisa passar por uma avalia-


ção que envolve a família, a escola e os profissionais – pedagogos, pro- Saiba mais
fessores, psicopedagogos, psicólogos, neurologistas e fonoaudiólogos. É comum ocorrer uma
associação de transtornos do
Essa equipe de profissionais coletará informações e realizará testes e
neurodesenvolvimento em um
exames para concluir se o estudante tem ou não o transtorno. mesmo indivíduo. Uma pessoa
com TDAH, por exemplo, pode
De que forma o professor pode agir e propor adaptações curriculares
ter comorbidades como dislexia,
para facilitar a aprendizagem de estudantes com TDAH? discalculia ou disgrafia.

A sala de aula é desafiadora tanto para o professor que tem um aluno


com TDAH quanto para o próprio estudante, que precisa ficar parado,
pois concentrar-se e fazer silêncio requer um empenho que vai além das

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 103


suas possibilidades. Esta é a primeira situação que o professor precisa
entender: os estudantes com TDAH geralmente querem aprender, mas
seus déficits neurológicos os impedem, principalmente quando se utiliza
uma metodologia tradicional na escola, exigindo silêncio o tempo todo
em aulas expositivas, nas quais o professor fala e o aluno escuta, e não
se aplicam o trabalho em grupo e a ludicidade no ensino.

Algumas atitudes do professor podem auxiliar a aprendizagem do


estudante com TDAH:

Construa uma relação afetiva com o estudante, deixe claro


que sabe de suas dificuldades e que, juntos, tornarão o es-
paço de sala de aula agradável e de aprendizagem. Não o
considere um aluno bagunceiro, indisciplinado ou doente,
mas sim alguém que precisa de ajuda porque aprende de
modo diferente.
O estudante com TDAH deve sentar-se no meio da sala de
aula, distante de portas e janelas e próximo ao professor.
Evite muitos estímulos visuais na sala de aula. O ideal é
que os cartazes existentes no espaço sejam referentes
ao conteúdo que está sendo estudado e sempre substi-
tuídos para não gerar poluição visual.
Evite atividades muito longas.
Utilize o sistema de agenda, certificando-se de que o es-
tudante registrou o que é necessário. É muito comum
estudantes com TDAH chegarem em casa e não saberem
explicar qual é a tarefa que devem fazer para o dia seguinte
porque não ouviram a professora explicá-la e não a regis-
traram adequadamente na agenda.
Quando estiver explicando um conteúdo, procure retomá-
-lo explicando-o de outras maneiras. Isso ajudará muito o
aluno com TDAH a focar no que está sendo ensinado.
Combine com o estudante se e quando poderá sair da sala
para se acalmar; o diálogo é importante.
Planeje com antecedência cada aula que será ministrada,
pensando no estudante com TDAH.

104 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Oliveira (2019a) enfatiza que jogos com regras ajudam muito o
estudante a desenvolver a habilidade de saber lidar com frustrações,
ganhar e perder, esperar a vez, aprender a ouvir, além de estimular
o raciocínio. Uma ideia interessante é elaborar brincadeiras de re-
presentação utilizando o espelho, pois assim o estudante poderá ver
sua própria imagem, como se comporta. Atividades corporais rela-
cionadas ao controle de respiração e saber ouvir são relaxantes e
ajudam o estudante a se acalmar, diminuindo a ansiedade. As cons-
truções criativas, utilizando lápis coloridos, colagem, argila, massa
de modelar, martelo, pregos e sucatas ajudam a liberar energia, tra-
balhando o controle da hiperatividade.

As sugestões aqui apresentadas não devem ser propostas apenas


para o estudante com TDAH, mas sim ao grupo todo, pensando no es-
tudante com TDAH. Os estudantes com transtorno do déficit de aten-
ção e hiperatividade não conseguem ficar em uma atividade de longa
duração pela qual não tenham interesse, por isso, o professor precisa
adaptar a atividade para incluí-lo.

Sobre esta questão, acompanhe o exemplo a seguir:

Exemplo 3
A professora do 4º ano preparou um filme com duração de duas horas para os
alunos assistirem. No momento de preparar a aula, pensou no seu aluno com
diagnóstico de TDAH e, conhecendo o estudante e a teoria sobre o transtorno, teve
certeza de que o estudante iria atrapalhar a aula, pois não conseguiria ficar em
silêncio assistindo ao filme. Pensou em mudar a estratégia, mas gostaria muito
de trabalhar o conteúdo com base do contexto do filme, que era ótimo. Pensou
em sugerir que o estudante fosse para a sala dos professores no momento do fil-
me, assim não atrapalharia os demais alunos, mas não achou a atitude correta, e, Atividade 3
considerando que o estudante com TDAH tinha habilidades para o desenho, modi- Quando há um estudante com
ficou o planejamento. Fragmentou o filme em dois dias: no primeiro dia, passou a transtorno do déficit de atenção
metade do filme e fez algumas pausas durante a exibição para que os estudantes e hiperatividade (TDAH) em
sala de aula, o ensino-apren-
registrassem as cenas, construindo com desenhos uma história em quadrinhos. dizagem se torna um desafio
No segundo dia, concluiu a exibição do filme, e os estudantes finalizaram suas tanto para o professor quanto
produções. Além disso, a professora decidiu passar o filme no primeiro horário da para o estudante. Para que
aula, considerando que o estudante com TDAH ficava mais concentrado no início ambos consigam trabalhar em
das atividades escolares diárias. Assim, a estratégia atingiu os resultados esperados harmonia, é imprescindível
que o professor tenha algumas
com todos os estudantes da turma.
práticas atitudinais. Relacione
três atitudes que o professor
poderá adotar em sala de aula
Considerando o exemplo apresentado, é possível perceber o quanto
com estudantes TDAH.
é importante o professor conhecer o estudante e os principais aspec-

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 105


tos do TDAH para poder realizar adaptações curriculares adequadas.
É importante também chamar atenção para o assunto, utilizar recursos
que motivem a aprendizagem, além de atividades mais curtas e objetivas.

É fato que os estudantes com TDAH têm dificuldades para se concen-


trar, e esse fator pode trazer prejuízos na aprendizagem de conceitos
matemáticos. Para aprender esses conceitos, é necessário desenvolver
muitas habilidades, e a atenção é uma delas. Assim, é comum, por fal-
ta de atenção, estudantes com TDAH inverterem números, copiarem
errado do quadro, não conseguirem chegar a respostas corretas de si-
tuações-problema por trocarem sinais nas operações. Na leitura e na
escrita, leem rápido demais, trocam letras e não compreendem o texto
devido à falta de fluência, ou têm dificuldades para aprender a ler por falta
Saiba mais
de atenção auditiva e visual.
O mapa mental é uma forma
de estruturar e organizar o co- O professor precisa ampliar a quantidade de exemplos sobre a apli-
nhecimento. Ele funciona como cação do conteúdo, deixar que o aluno fale e se expresse sem medo
um diagrama que parte de uma
palavra-chave e, a partir dela, de ser ridicularizado, além de propor projetos para fortalecer a apren-
novas palavras vão surgindo, dizagem. Destacar as palavras-chave do que está sendo ensinado, aju-
ampliando o conhecimento de dando a construir um mapa mental com palavras e desenhos, é uma
maneira clara e objetiva.
excelente estratégia de ensino e aprendizagem para alunos com TDAH.

Não corte árvores

Não faça Separe o lixo


sujeira

ECOLOGIA Economize
Doe coisas combustível
desnecessárias

Economize Use os materiais Reduza o


água corretos consumo de
energia

Good_Stock/Shutterstock

Nas avaliações, sugerimos as seguintes adaptações curriculares


para estudantes com transtorno do déficit de atenção e hiperatividade:
evitar enunciados longos, não utilizar frente e verso da folha, ampliar o
tempo para realização, aceitar respostas orais, permitir o uso de com-
putador e a leitura em voz alta, caso seja necessário.

106 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esperamos que as informações apresentadas neste capítulo tenham
consolidado o conhecimento de que estudantes com transtornos especí-
ficos de aprendizagem não apresentam déficits intelectuais, mas sim pro-
blemas neurológicos, o que faz com que suas conexões cerebrais atuem
de modo diferenciado. Isso não os torna menos inteligentes, e, como
vimos, as adaptações curriculares e as estratégias de ensino coletivas e
individuais podem contribuir significativamente para o desempenho satis-
fatório desses alunos tanto na vida escolar quanto na pessoal.

REFERÊNCIAS
ABDA - Associação Brasileira do Déficit de Atenção. Disponível em https://tdah.org.br/
sobre-tdah/o-que-e-tdah/. Acesso em: 20 ago. 2020.
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DSM-5-1-pdf.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020.
BORBA, A. L.; BRAGGIO, M. A. Como interagir com o disléxico em sala de aula. Associação
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interagir-com-o-dislexico-em-sala-de-aula/. Acesso em: 26 ago. 2020.
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pais e professores. Belém: Cultural Brasil, 2009.
INSTITUTO ABCD. Todos entendem: conversando com os pais sobre como lidar com a
dislexia e outros transtornos específicos de aprendizagem. 2015. Disponível em: https://
www.institutoabcd.org.br/todos-entendem/. Acesso em: 26 ago. 2020.
JOHNSON, D. J.; MYKLEBUST, H. R. Distúrbios de aprendizagem: princípios e práticas
educacionais. São Paulo: Pioneira, 1983.
MOURA, S. P. P. T. de. A dislexia e os desafios pedagógicos. 2013. Monografia (Especialização
em Orientação Educacional e Pedagógica) - AVM Faculdade Integrada, Universidade
Cândido Mendes, Niterói, 2013. Disponível em: http://www.avm.edu.br/docpdf/
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PEREIRA, R. S. Dislexia e Disortografia. Programa de Intervenção e Reeducação. Montijo:
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ZORZI, J. L. Guia prático para ajudar crianças com dificuldades de aprendizagem: dislexia e
outros distúrbios – um manual de boas e saudáveis atitudes. Pinhais: Melo, 2008.

Adaptações curriculares para estudantes com transtornos específicos de aprendizagem 107


GABARITO
1. O estudante tem dislexia. Como adaptação, a professora pode solicitar que ele leia
apenas algumas palavras ou um parágrafo do texto, bem como treinar com o aluno
antes de solicitar a leitura em voz alta.

2. Disgrafia diz respeito à incapacidade de escrever com letra adequada, legível. Disor-
tografia está relacionada à escrita irregular, com erros ortográficos, trocas, omissões
e substituição de letras.

3. Entre as práticas indicadas neste capítulo, temos: construir uma relação afetiva com o
estudante; colocar ele sentado no meio da sala de aula, distante de portas e janelas;
evitar muitos estímulos visuais; combinar quando ele poderá sair da sala; e evitar ati-
vidades muito longas.

108 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


5
Adaptações curriculares
para estudantes com
transtorno espectro autista
Neste capítulo, traremos informações sobre o transtorno
espectro autista (TEA) bem como as características presentes na
socialização, na comunicação e no comportamento do estudante
que tem esse transtorno.
Além disso, apresentaremos possibilidades de trabalho com
TEA nas salas de aula comuns, enfatizando a necessidade das
adaptações curriculares e atitudes dos professores para garantir a
inclusão e a aprendizagem desse público.

5.1 Transtorno espectro autista


Vídeo No contexto escolar é muito comum encontrarmos professores
preocupados com a aprendizagem, a socialização e o comportamen-
to dos estudantes. Diariamente, profissionais da educação convivem
com estudantes que adquirem informações de maneiras diferencia-
das, que interagem com professores e colegas de uma forma menos
intensa e que exigem mais habilidades do professor para conduzir o
processo de ensino – entre eles, os alunos com transtorno do espec-
tro autista (TEA).

Primeiramente, vamos entender o que é este transtorno e quais


são suas particularidades. Caracterizado por alterações na comunica-
ção, na interação social e no comportamento, o autismo é classificado
como um transtorno global do desenvolvimento, também chamado de
transtorno do espectro autista (TEA).

Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista 109


Não é raro encontrarmos em sala de aula estudantes autistas.
Curiosidade
Segundo a Organização das Nações Unidas (ESPECIALISTAS..., 2015),
A palavra espectro foi utilizada
na nomeação do transtorno mundialmente, aproximadamente 70 milhões de pessoas apre-
devido à sua complexidade. sentam esse transtorno. Isso corresponde a 1% da população, um
Uma pessoa com autismo não número significativo de pessoas que precisam ter as mesmas opor-
é igual à outra; elas apresentam
características diferenciadas que tunidades que as demais na sociedade.
podem ir de um grau mais leve
A causa do transtorno ainda não é bem definida pelos pesquisa-
a um grau mais pesado. Há au-
tistas que se isolam do mundo, dores; estudos têm sido feitos e os fatores genéticos continuam pre-
uns que demonstram muitas valecendo como os mais importantes. Porém, o que se tem certeza
dificuldades com a socialização,
e outros, ainda, que apresentam
é que quanto mais cedo o diagnóstico for realizado, maiores são as
sinais quase não perceptíveis. chances de a criança se desenvolver em socialização, comunicação
e comportamento.

Fechar o diagnóstico é uma tarefa que exige o trabalho de diferentes


profissionais e da família, pois o transtorno é muito complexo, o que
dificulta a investigação. Quando o grau do autismo é mais grave, o diag-
nóstico fica mais fácil de ser realizado. No entanto, há pessoas que apre-
sentam graus muito leves, tornando a investigação mais prolongada.

Curiosidade Silva (2012) explica que os sintomas do autismo se manifestam


antes dos três anos de idade. Por esse motivo, é muito importante
Há pessoas adultas que têm
o transtorno e nunca foram acompanhar os marcos do desenvolvimento da criança e, caso seja
diagnosticadas, tampouco observado que algo não vai bem – por exemplo, dificuldade em in-
tratadas, pois na família e na
teragir com outras crianças, não responder quando é chamado pelo
escola eram vistas apenas como
esquisitas, nerds e com muitas nome, ter interesse obstinado por um único brinquedo (dinossau-
dificuldades de socialização e ros, carros etc.), não reagir bem a mudanças de rotina, não olhar nos
comunicação.
olhos quando conversa –, o ideal é procurar ajuda clínica.

Na tríade de sintomas apresentados pela criança autista


– disfunção social, da linguagem e comportamental –, a socialização
é considerada a base dos sintomas. O que é alegria para uma criança
Atividade 1
normal – por exemplo, muitos colegas na festinha de aniversário,
O indivíduo com TEA apresenta brincadeiras em grupo, brincar de pega-pega na escola, jogo de fu-
dificuldades em três áreas:
tebol com os amigos, brincar de boneca e casinha –, para os autistas,
comunicação, socialização e
comportamento. Uma das áreas não tem relevância. Eles se sentem bem se ficarem sozinhos, isola-
citada é considerada a base dos, apenas observando, pois não sabem interagir, não desenvolve-
dos sintomas. Qual? Cite três
exemplos práticos. ram essa habilidade e, portanto, a falta de contato social não gera
desconforto a eles.

Os autistas apresentam dificuldades relacionadas à linguagem ver-


bal e não verbal. Uma das dificuldades na linguagem, facilmente per-

110 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


cebível, é o fato de eles evitarem o contato visual; ou seja, não olham
Saiba mais
nos olhos das pessoas com quem estão tentando estabelecer uma co-
Linguagem verbal é a escrita
municação. Ao falarem, terminam cada frase como se estivessem fa-
ou falada (e-mails, textos, livros,
zendo uma pergunta ou repetem a pergunta, ao invés de respondê-la. conversas, discussões). Lingua-
Às vezes, falam repetitivamente diálogos que ouviram no programa de gem não verbal é composta
de um conjunto de símbolos
televisão, em uma história ou na fala de outra pessoa, mas eles sim- com os quais nos deparamos
plesmente repetem, sem a intenção de se comunicar. no dia a dia (placas de trânsito,
imagens, cores, gestos, posturas
Algumas crianças autistas falam na terceira pessoa. Nesse caso, se corporais e expressões faciais)
a criança está com sede e quer um copo de água, ela não diz “eu que- (SILVA, 2012).
2
ro um copo de água”, ela fala “Bruno quer água”. Elas têm muitas
dificuldades para entender piadas, brincadeiras e diálogos com duplo 2
sentido, pois avaliam a fala de modo literal; então, dizer para um au- Nome fictício.
tista, por exemplo, “está debaixo do seu nariz”, quando ele não está
enxergando o brinquedo ao seu lado, não o fará entender que o objeto
está próximo. Eles também não conseguem compreender expressões
verbais, gestos e diferentes tons de voz que as pessoas utilizam para
se comunicar.

Em relação ao comportamento, esse difere-se de um autista para o


outro. Há autistas que fazem movimentos repetitivos, como balançar
o corpo, pular, fazer caretas, sempre da mesma maneira; outros têm
acessos de riso constantemente, são muito agitados, movimentam-se
o tempo todo e não obedecem a ordens. Quando há mudança de roti-
na ou muitas opções de escolhas, eles ficam aflitos. Além disso, ruídos
muito altos e aromas intensos podem desencadear, em alguns autis-
tas, crises de nervos e agitação motora.

É comum vermos estudantes autistas brigando na escola. Mas será que


todos os autistas são agressivos? A verdade é que alguns são, mas não por-
que desejam ser. Os déficits de comunicação próprios do autismo os deixam
assim: eles podem se jogar no chão e gritar, parecendo que o problema é falta
de educação, quando, na verdade, a causa está na sua sensibilidade alterada.

Saiba mais
Sinais de desordem sensorial:
⋅ sensibilidade à luz;
⋅ sensibilidade a sons altos (o autista geralmente coloca a mão nos ouvidos e pode
gritar ou chorar);
⋅ sensibilidade à textura de alguns alimentos e tecidos (roupas), e as etiquetas tam-
bém podem incomodar;
⋅ resistência ao toque;
⋅ resistência a cortar o cabelo ou escovar os dentes;
⋅ falta de reação a estímulos ou extrema reação (quente, frio, dor etc.).

Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista 111


Em relação à adaptação sensorial, Goldstein (2012) explica que essa
dificuldade interfere no comportamento do autista, sendo preciso
compreender cada criança individualmente para assim planejar estra-
tégias que irão ajudá-la no dia a dia, pois a resposta a uma determinada
sensação varia de uma pessoa para a outra.

No caso de uma criança autista que apresenta sensibilidade em rela-


ção ao sentido (tato), alguns cuidados são necessários para que sua vida
diária seja melhor, como observar se a roupa da criança não está torcida,
se a numeração do tênis está adequada, se as vestimentas utilizadas estão
compatíveis com o clima, qual é o tipo de tecido que a deixa mais confor-
tável, se as etiquetas das roupas não estão incomodando-a, entre outros.

As pessoas que convivem com autistas, seja na família ou na escola,


precisam estar atentas quando acontece uma crise de raiva ou agita-
ção, pois é um sinal de que algo está acontecendo e que eles não estão
conseguindo se comunicar e tampouco resolver.

A hora da refeição é outro aspecto que precisa ser observado em


uma criança com TEA. É necessário respeitar suas preferências gustati-
vas, visto que os autistas, muitas vezes, apresentam seletividade alimen-
tar, escolhendo o que comer pela consistência, pela cor ou pelo paladar.

Há crianças com TEA que só comem alimentos crocantes (sucrilhos,


amendoim, salgadinhos, torradas), outras que comem somente ali-
mentos pastosos (mingau, purê de batata, pudim) e, ainda, aquelas que
comem alimentos apenas de uma cor – para este tipo, muitas vezes são
utilizados corantes nas comidas, o que pode comprometer a saúde da
criança. Além disso, alguns autistas só ingerem líquidos, sendo neces-
sário transformar os alimentos para a forma líquida com o auxílio de
trituradores, processadores etc.

O importante é não forçar a criança a comer e, aos poucos, começar


a inserir os diferentes alimentos, com acompanhamento do profissio-
nal nutricionista para auxiliar na elaboração dos cardápios.

No que diz respeito à sensibilidade auditiva, Goldstein (2012) apre-


senta algumas dicas: se barulhos incomodam a criança, para cortar o
cabelo, por exemplo, é preferível levá-la em horários menos movimen-
tados e pedir que cortem com a tesoura, e não com a máquina, e que
dispensem o secador; se for passear em algum local que tenha mais
barulho, utilizar o fone de ouvido; se estiver em algum lugar e o barulho
incomodar, o correto é retirar a criança do ambiente.

112 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


No caso de sensibilidade olfativa, alguns aromas podem ser mui- Lei
to desagradáveis para os autistas e outros podem ser calmantes; as- A Lei Berenice Piana,
sim, é necessário observar suas reações para identificá-la. Às vezes, n. 12.764/2012, deter-
mi-na que, para efeitos le-
o cheiro do shampoo, do perfume ou até mesmo de uma fritura é -gais, a pessoa com TEA é
muito forte, o que pode deixar o autista irritado. considerada pessoa com
deficiência, assegurando
O autismo não é uma doença e não tem cura; é um transtor- assim a condição de
igualdade, inclusão social
no neurológico que não depende de classe social ou etnia para e cidadania.
que se desenvolva. Ele também não é visível fisicamente, é iden-
Disponível em: http://www.
tificado por meio do comportamento da criança. Além disso, as planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2011-2014/2012/lei/l12764.
pessoas com TEA têm os mesmos direitos legais das pessoas com
htm. Acesso em: 17 ago. 2020.
deficiência.

5.2 Autista na escola comum


Vídeo Quando um estudante com TEA é matriculado na escola comum, as
perguntas dos professores são quase sempre as mesmas: ele tem que
estudar na escola comum? Não seria melhor uma escola especial? Será
que ele consegue aprender junto a tantas crianças? Será que eu vou
conseguir ensinar?

São compreensíveis esses questionamentos, pois a inclusão de uma


pessoa com TEA na sala de aula comum é um desafio para o professor,
uma vez que ele precisa de informações específicas sobre o transtorno
Atividade 2 para poder ensinar e, mais do que isso, poder ajudar esse estu-
dante na socialização, na comunicação e no comportamento.
Vamos supor que uma professo-
ra resolveu fazer uma atividade Ao acolher e ensinar o aluno autista, a escola está atenden-
diferente com os estudantes da
educação infantil para estimular do aos princípios constitucionais, visto que está oferecendo
a psicomotricidade; ela, então, educação para todos os alunos independentemente de suas
levou para a sala de aula balões diferenças.
coloridos. Na atividade, as crian-
ças deviam brincar livremente e, Considerando os diferentes níveis do transtorno, é fato que
ao som de um apito, estourar os
quando esse é mais grave, as dificuldades de socialização, co-
balões. Porém, quando os balões
foram estourados, uma criança municação e comportamento são mais acentuadas. Nesse ce-
autista entrou em desespero, nário, ensinar o autista na sala de aula não é tarefa fácil para
colocou as mãos no ouvido e
um único professor; assim, a Lei n. 12.764/2012, parágrafo 3º,
começou a gritar sem parar.
Explique por que ela teve essa enfatiza que “em casos de comprovada necessidade, a pessoa
reação e aponte de que forma a com transtorno do espectro autista incluída nas classes co-
atividade poderia ser adaptada
pensando no aluno com TEA. muns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá
direito a acompanhante especializado” (BRASIL, 2012).

Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista 113


O acompanhante ou tutor é um professor especializado que ficará
em período integral na sala de aula, auxiliando o professor regente. Esse
acompanhante vai realizar um suporte mais individualizado para o es-
tudante autista nas questões pedagógicas e, se necessário, no que diz
respeito à alimentação e higiene.

É importante o trabalho articulado do professor regente da turma


com o professor acompanhante no momento do planejamento, visto
que o estudante autista não deve fazer atividades descontextualizadas
do conteúdo trabalhado com os demais alunos.

Um exemplo de atuação prática do tutor é na realização de uma ativi-


dade em que o professor regente solicita a tarefa de modo verbal. Inicial-
mente, o professor tutor deverá deixar que o aluno autista tente fazê-la
sem intervenção. Caso observe que ele vai fazer de maneira inadequada,
porque não compreendeu, o tutor explica novamente de uma outra for-
ma, podendo utilizar diferentes recursos, como imagens, materiais con-
cretos e histórias. Todavia, esse acompanhante não deve fazer a tarefa
pelo aluno, muito menos propor outra atividade descontextualizada da
que o professor regente sugeriu para a turma.

É comum que, diante de uma proposta de atividade que exige a so-


cialização, o estudante com TEA se recuse a participar. O professor tutor
pode ser o colaborador nessa situação, conversando com esse aluno,
encorajando-o a se envolver ou participando com ele.

O atendimento educacional especializado (AEE) oferecido no contra-


turno escolar, por meio das salas de recursos multifuncionais, também é
direito do estudante com TEA, bem como de todos os que têm deficiência.
O professor da sala de recurso irá trabalhar um plano individualizado com
o estudante, com o apoio de softwares, equipamentos tecnológicos e uma
variedade de recursos para auxiliar na aprendizagem e nas dificuldades.

No atendimento individualizado é possível fazer um plano de traba-


lho que atenda especificamente às dificuldades do estudante. Não se
trata de um reforço escolar, mas sim de ensinar, utilizando outros mate-
riais e recursos, o que ele não conseguiu aprender no grupo.

Vamos tomar como exemplo o ensino da leitura, uma habilidade


complexa que, muitas vezes, na sala de aula com o grupo, o autista não
consegue desenvolver, pois precisa de um atendimento individualizado
a fim de aprender primeiramente outras habilidades necessárias para só
então depois compreender a leitura.

114 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Gomes (2015) afirma que, antes de iniciar o processo de leitura,
o estudante precisa aprender a ficar sentado na carteira, conseguir
executar e realizar tarefas simples e finalizá-las, fazer emparelha-
mento entre palavras impressas (perceber, por exemplo, que escre-
ver a palavra bola é diferente de escrever bolo) e nomear figuras e
vogais. A autora salienta que o ensino da leitura na educação de
jovens e adultos deve apresentar mais propostas funcionais do que
acadêmicas, sempre pensando que a aprendizagem ajudará na au-
tonomia, comunicação e interação social do aluno. Os temas para
ensinar devem partir do interesse do estudante e condizer com a
sua idade.

Na sala de recursos pode ser utilizado um material específico


para atender à dificuldade do aluno com TEA. O professor do AEE
também será um orientador da família e do professor da sala de
aula comum, porque terá contato com os demais profissionais que
atendem ao estudante autista (terapeuta ocupacional, fonoaudiólo-
go, psicólogo e psicopedagogo) para que juntos atinjam os objetivos
satisfatórios de aprendizagem e desenvolvimento do estudante.

A organização da sala de aula para a inclusão do estudante com


TEA deve ser bem pensada. Não pode haver mudanças repentinas
de posição de móveis e nem da rotina escolar, pois isso geraria um
problema para o aluno autista, que reage muito melhor quando
sabe como será o seu dia. O professor pode colocar pistas visuais
para ajudar o estudante a entender a sequência das atividades des-
de o momento de sua chegada até o momento da saída da escola.
As regras de convivência devem ser muito claras e, se possível, apre-
sentadas em um quadro com imagens para todos os estudantes.

As imagens são recursos sugeridos para ajudar o estudante com


TEA a se comunicar. Trata-se da comunicação alternativa, uma vez
que a criança na educação infantil e nos anos iniciais pode apontar
para a imagem quando quer alguma coisa, como ir ao banheiro. As-
sim, o docente pode confeccionar o material físico ou digital.

Para a inclusão do autista, é importante a preparação


da escola e da turma antes de o estudante começar a
participar das aulas. É fundamental que haja uma con-
versa coletiva, que deve ser pautada em dois princípios
básicos:
k
toc
ers
utt
Sh
to/
cfo
iati
adr

Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista 115


deve girar estritamente em torno da diferença do aluno
relativa ao incidente a ser discutido e [...] sem-
pre deve incluir alguma outra diferença desse
aluno que possa implicar na admiração de
seus colegas, como, por exemplo, alguma
habilidade extraordinária que ele apresente,
seja na área musical, seja em relação a memó-

kco
tsrett
ria, desenho etc. (BRASIL, 2003, p. 26)

uhS/ue.e
Sempre que os alunos fizerem pergun-

ehpargotohP
tas a respeito da inclusão do estudante
autista, o professor deverá responder li-
Filme mitando-se ao que foi perguntado e ficar
atento às intenções das perguntas, observando se essas não têm
caráter discriminatório – muitas vezes, por falta de conhecimento e
sensibilização, os autistas sofrem rejeição no contexto escolar.

Incentivar as amizades em sala de aula e o respeito à diversidade e


ensinar aos estudantes que todos fazem parte do grupo e têm igual im-
portância são atitudes fundamentais para que a inclusão do estudante
com TEA seja uma experiência bem-sucedida.

O filme Uma viagem Goldstein (2012) argumenta que a inclusão do estudante autista
inesperada é baseado em deve envolver a escola como um todo. Desse modo, os funcionários
fatos e conta a história de
irmãos gêmeos autistas devem receber informações sobre as características do transtorno
discriminados pelo pai e compreender que: ao falar com a criança, é importante gesticu-
e pelo sistema escolar.
Com o apoio incansável lar; mesmo que ela não estabeleça o contato visual, é necessário
da mãe, os meninos continuar falando; se o autista não olhar nos olhos da pessoa não é
conseguem superar as
dificuldades. porque não está interessado no assunto, mas sim uma dificuldade
Disponível em: https:// que ele tem.
pedagogiaaopedaletra.com/filme-
uma-viagem-inesperada-missao-
Na hora do lanche, muitas vezes, o autista se mostra desorganiza-
especial-com-zac-efron/. Acesso do e/ou recusa a alimentação. Por isso, é preciso que as pessoas que
em: 17 ago. 2020.
trabalham no refeitório da escola compreendam que ele seleciona ali-
mentos e que pode ter dificuldades motoras para segurar o talher, po-
Atividade 3 dendo acontecer de derramar o alimento na mesa ou no chão. Ainda,
A comunicação é uma das difi- se o local possui muito barulho e movimento, é sugerido encontrar um
culdades que a criança com TEA
lugar mais calmo para o estudante com TEA.
apresenta. Quais são os recursos
que o professor poderá utilizar Além disso, a formação continuada dos professores é essencial para
para se comunicar melhor com o
aluno autista?
a compreensão das características do transtorno e a prática de um en-
sino inclusivo.

116 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


5.3 Como adaptar o currículo para o TEA
Vídeo O currículo escolar para um estudante com TEA é exatamente
o mesmo desenvolvido para os demais estudantes. O que precisa
ser compreendido é que para um autista aprender são necessárias
adaptações na forma de ensinar. Essa diferenciação nas estratégias de
ensino começa com a aceitação do professor e dos estudantes da sala
de aula, uma vez que, se o vínculo for estabelecido, tudo fica mais fácil.

As aulas apenas com explicações verbais não funcionam com os


autistas, já que na tríade dos sintomas a comunicação é uma das
suas dificuldades. Portanto, sugerimos a utilização de imagens e o
uso de poucas palavras, de maneira clara e concreta, indo direto ao
ponto. Optar por um material concreto permite a compreensão da
atividade pelo estudante; além disso, o professor deve ser paciente,
pois repetir o que foi ensinado é necessário.

Ademais, não é porque o estudante é autista que pode fazer o


que desejar em sala de aula. Horários e limites devem estar claros e
fazer parte da rotina escolar; ainda, é muito importante organizar o
tempo e exigir perseverança na conclusão das tarefas.

Cunha (2013, p. 27) sugere algumas alternativas pedagógicas


para os docentes que têm em sala de aula alunos com TEA: “não se
alterar e não valorizar as reações excessivas; redirecionar a aten-
ção e ação do aluno; falar baixo, manter o mesmo tom de voz e
contato visual; corrigir ensinando e não reprimindo, disciplinar as
atividades”.

Durante o processo de ensino, o professor poderá deparar-se


com situações em que o estudante autista tem crises de choro ou de
raiva, desencadeadas muitas vezes pela mudança da rotina. Isto é,
se todos os dias ele chega na escola e o professor o espera na porta
da sala, o dia em que ele não fizer isso o problema será gerado. Por
isso, é necessário conhecer o estudante e ir, aos poucos, trabalhan-
do o entendimento dessas situações.

Caso seja necessária a mudança de rotina, Goldstein (2012)


apresenta algumas dicas que podem contribuir com o professor
em sala de aula, descritas a seguir.

Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista 117


•• Utilizar calendários e figuras, bem como histórias sociais, para
que a criança entenda a mudança. As histórias sociais fornecem
explicações do que vai ocorrer e antecipam comportamentos
adequados para determinadas situações e ambientes.
•• Antecipar o que vai acontecer, explicando o passo a passo.
•• Combinar com a criança uma figura que representará o momen-
to de mudança.

No momento de ensinar é preciso fazer adaptações. Mas como


fazer isso?

Exemplo
A professora prepara uma atividade para os alunos do 1º ano, em que cada um
irá até a frente da sala, escutará o numeral mencionado pela professora e, na
sequência, deverá representar com desenhos no quadro a respectiva quantidade
(exemplo: número 3 → representação: ***). Um aluno autista se recusa a ir até a
lousa, então, a professora sugere uma atividade na carteira com o mesmo objetivo,
em que o estudante deverá representar a quantidade com material concreto.

No exemplo mencionado, a professora não excluiu o estudante com


TEA da atividade, mas também não o forçou a se levantar, visto que isso
desencadearia uma situação de estresse. Além disso, ela não deixou ele
sem fazer nada ou realizando outra atividade que não fosse relacionada
ao tema da aula; ela adaptou a atividade e ofereceu material concreto.

Em uma aula de leitura de palavras, na qual todos os alunos deveriam


ler as palavras impressas em uma folha de papel em voz alta individual-
mente, o estudante com TEA, com acentuada dificuldade na comunicação,
não conseguiria realizar a atividade da mesma forma. Uma opção seria a
professora pedir a ele que apontasse para as palavras lidas por ela, assim
poderia saber se ele as reconhecia.
rstock ov/Shutte

Outra adaptação que traz resultados positivos ao ensinar um


estudante autista é descobrir o que ele gosta de fazer e, com base
Sergey Novik

em seus interesses, ensinar os conteúdos do currículo. Se o aluno


com TEA gosta muito de desenhar, é possível iniciar o assunto
partindo do desenho. Por exemplo: se em uma aula de Ciên-
cias o conteúdo é animais carnívoros e herbívoros, por
que não começar a aula sugerindo aos alunos que de-
senhem os animais em uma folha de papel? Depois, o

118 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


docente poderá explicar o conteúdo por meio da classificação dos animais
desenhados pelos alunos.

Cunha (2013) enfatiza que quando sugerimos algo que o estudante


gosta de fazer, ele fica motivado e a sua aprendizagem se torna mais fá-
cil. É a atenção que ajuda a dar as respostas aos estímulos apresentados,
por isso, quando o aluno mantém o foco, vários processos cognitivos são
estimulados.

Para que o estudante consiga manter o foco na atividade proposta


pelo professor, a sala de aula não pode ter muitos estímulos que possam
distraí-lo. O ideal é que não haja muitos cartazes nas paredes ou objetos
expostos em prateleiras abertas; os poucos cartazes devem estar relacio-
nados ao assunto que está sendo trabalhado e os materiais devem ficar
guardados em armários fechados.

O processo único de avaliação não funciona em turmas heterogêneas,


é preciso o acompanhamento da aprendizagem do estudante, e isso não
pode ser possível com um único instrumento. A diversificação de instru-
mentos avaliativos permite ao professor identificar a aprendizagem em
diferentes áreas do conhecimento e os progressos dos alunos de uma
forma global, e não específica, do conteúdo. No que se refere aos estu-
dantes autistas, além dos conteúdos curriculares, é necessário considerar
o progresso individual no que diz respeito à socialização, à comunicação e
ao comportamento, identificando quais foram os ganhos que o aluno teve
nesses aspectos em relação ao nível em que se encontrava.

Sendo assim, a aprendizagem do estudante autista exige do professor,


mais do que nunca, a capacidade de estabelecer vínculos afetivos e de
entender que é necessário aprender um jeito diferente de ensinar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esperamos que o conteúdo deste capítulo tenha ajudado na com-
preensão do transtorno espectro autista (TEA) e de suas características.
Como vimos, o autista deve ser inserido na escola comum, com direito
a professor auxiliar quando for necessário. O atendimento educacional
especializado (AEE) também é responsável por dar o suporte educacional,
contribuindo com o trabalho do professor regente da sala de aula.
O estudante com TEA aprende de um jeito diferente e, por esse moti-
vo, o diferencial deverá acontecer por meio das adaptações curriculares e
da capacitação dos professores.

Adaptações curriculares para estudantes com transtorno espectro autista 119


REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n. 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Diário Oficial da União, Poder Legislativo,
Brasília, DF, 28 dez. 2012. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/lei/l12764.htm. Acesso em: 17 ago. 2020.
BRASIL. Saberes e práticas da inclusão: autismo 2. ed. Brasília: MEC; SEESP, 2003. Disponível
em: http://livros01.livrosgratis.com.br/me000436.pdf. Acesso em: 21 ago. 2020.
CUNHA, E. Autismo na escola: um jeito diferente de aprender, um jeito diferente de ensinar
– ideias e práticas pedagógicas. 2. ed. Rio de Janeiro: Wak, 2013.
ESPECIALISTAS da ONU em direitos humanos pedem fim da discriminação contra pessoas
com autismo. ONU Brasil, 2015. Disponível em: https://nacoesunidas.org/especialistas-em-
direitos-humanos-da-onu-pedem-fim-da-discriminacao-contra-pessoas-com-autismo/.
Acesso em: 20 ago. 2020.
GOLDSTEIN, A. O autismo sob o olhar da terapia ocupacional: um guia de orientação para
pais. 5. ed. São Paulo: Casa do Novo Autor, 2012.
GOMES, C. G. S. Ensino de leitura para pessoas com autismo. 1. ed. Curitiba: Appris, 2015.
SILVA, A. B. B. Mundo singular: entenda o autismo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

GABARITO
1. A área considerada a base dos sintomas é a socialização. Como exemplos práticos, po-
demos citar: a criança fica isolada, não gosta de festas, não participa das brincadeiras
com os colegas, entre outros.

2. O aluno reagiu assim porque os autistas têm desordens sensoriais, isto é, são sensí-
veis a barulhos, luzes e texturas. Uma opção seria realizar a atividade com bolas feitas
de papel, no lugar de balões de ar.

3. Poderá utilizar imagens, quadros e dicas visuais que permitam ao aluno apontar, di-
zendo o que quer e demonstrando suas emoções e seus sentimentos.

120 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


6
Inclusão educacional:
desafios e superações
Quando o assunto é inclusão educacional, é comum que medos
e incertezas se façam presentes no dia a dia de professores, pais e
dos próprios estudantes que têm alguma deficiência ou dificulda-
de de aprendizagem. Neste capítulo, você terá a oportunidade de
compreender a razão da presença desses sentimentos e conhecer
relatos de superação de professores e famílias que convivem com
pessoas com deficiência e com transtornos de aprendizagem.

6.1 Medos, incertezas e superações


Vídeo Embora a inclusão seja abordada diariamente na sociedade nos últi-
mos tempos, o assunto ainda gera medos e incertezas nas pessoas que
convivem diariamente com essa realidade. Podemos citar três grupos
que certamente sabem o que é a inclusão educacional na prática: fa-
mílias de estudantes com deficiência ou dificuldades de aprendizagem,
professores e o próprio estudante.

Toda família espera que os filhos não tenham deficiência ou dificul-


dades de aprendizagem, desde o nascimento os pais já fazem planos
de como será o futuro da criança, imaginam a fisionomia, habilidades,
interesses. Será que vai ser igual ao pai e gostar de fazer cálculos? Será
que vai ser parecido com a mãe, que adora ler livros? Será que vai ter
muitos amigos, será festeiro? Na escola, com certeza será um ótimo
aluno, porque vamos dar apoio para ser um grande profissional quan-
do ficar adulto.

Porém, nem sempre as coisas são como imaginadas ou planejadas.


Quando a família se depara com um filho com deficiência ou que apre-

Inclusão educacional: desafios e superações 121


senta muitas dificuldades na escola, leva um choque, os sonhos são
desfeitos, o primeiro sentimento é o de culpa, sente-se responsável
pela deficiência ou dificuldade do filho. A mãe é a pessoa que mais
sofre, pois fica se perguntando o que fez de errado durante o período
gestacional, que pode ter causado a deficiência na criança. Muitas hi-
póteses surgem: será que foram os remédios que precisei tomar? Ou a
alimentação não foi correta? Será que não me cuidei adequadamente?
Encontrar uma resposta parece ser uma forma de amenizar a situação:
É comum os pais expressarem sentimento de culpa. Há uma
necessidade de saber por que aconteceu com eles e uma
preocupação de que eles mesmos foram os causadores do
problema. Culpam-se por atos passados ou presentes, pelos
quais estão sendo agora castigados. A sensação de culpa, de
castigo, é maior quando existe um fato que a pessoa julga er-
rado e/ou é visto pela sociedade como condenável. (PETEAN;
PINA-NETO, 1998, p. 294)

A partir disso, é longo o percurso da família para aceitar o que acon-


teceu. A revolta, o desânimo, a frustração e os sentimentos de medo
e de incerteza sobre como ajudar a criança se fazem presentes, afi-
nal, terá que viver uma experiência inesperada, para a qual não estava
preparada. Nesse contexto, o trabalho com as famílias é o primeiro
passo para se caminhar rumo à inclusão educacional.

Paula e Costa (2007) enfatizam que a inclusão deve acontecer pri-


meiramente na família, pois essa é a primeira instituição da qual a
criança faz parte, assim, cabe a ela aceitar e compreender o aluno.
Os pais, familiares e a própria pessoa com deficiência são os prin-
cipais agentes da inclusão, portanto, fica muito mais difícil garantir
um processo inclusivo quando a família não acredita e nem está dis-
posta a colaborar.

Para que a inclusão seja possível, as famílias precisam de apoio


de amigos e especialistas para enfrentar seus medos, trabalhar seus
sentimentos e incertezas e conhecer a deficiência e as dificuldades
de seus filhos com olhos voltados para as possibilidades. É preci-
so aprender a valorizar o que a criança consegue fazer e ajudá-la a
prosseguir com os avanços.

A escola precisa acolher essas famílias, compreendendo que muitas


atitudes dos pais – como deixar as crianças fazerem o que querem, ou
exigirem muito dos professores, ou, ainda, o contrário, não participa-

122 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


rem da escola ou serem irresponsáveis – estão relacionadas ao medo
de não conseguirem dar conta da dificuldade do filho. Os pais estão
frágeis e precisam ser compreendidos. De acordo com Silva (2012,
p. 95): “é comum que os pais caiam na armadilha de apontar apenas os
comportamentos problemáticos das crianças. Ao fazerem isso, podem
perder de vista as habilidades e os pontos fortes que elas possuem”.

Para os professores, a situação também não é fácil, muitos docen- Leitura


tes já ouviram falar sobre as deficiências, e sobre os transtornos de A reportagem da revista
aprendizagem. Alguns já estudaram sobre o assunto, já fizeram uma Nova Escola, intitulada
Turma heterogênea:
especialização em educação especial, porém, quando são convidados a cada um é um. E agora?,
conviver e ensinar na diversidade, o cenário não é o mesmo. com autoria de Beatriz
Santomauro, apresenta
Por esse motivo, os professores precisam participar de uma forma- estratégias utilizadas
por professores para
ção continuada que articule a teoria e a prática, que ensine o saber e ensinar todos os alunos,
o fazer na sala de aula e, principalmente, consolide o que significa ser o que nos permite refletir
sobre a diversidade e as
professor na atualidade. Ser professor não é mais ministrar aulas em características de cada
salas homogêneas, os estudantes são diferentes e, para aprender, pre- estudante.

cisam de estratégias diferenciadas. Disponível em: https://novaescola.


org.br/conteudo/1954/turma-
Mantoan (2003, p. 33) elenca o que precisa ser mudado na escola heterogenea-cada-um-e-um-e-
agora. Acesso em: 25 ago. 2020.
para que aconteça a inclusão, e não apenas a integração do aluno.
Reorganizar pedagogicamente as escolas, abrindo espaços para
que a cooperação, o diálogo, a solidariedade, a criatividade e o
espírito crítico sejam exercitados nas escolas, por professores,
administradores, funcionários e alunos, porque são habilidades
mínimas para o exercício da verdadeira cidadania. Garantir aos
alunos tempo e liberdade para aprender, bem como um ensino
que não segrega e que reprova a repetência. Formar, aprimorar
continuamente e valorizar o professor, para que tenha condições
e estímulo para ensinar a turma toda, sem exclusões e exceções.

A visão da autora nos permite compreender que, para uma in-


clusão de qualidade, muitos fatores são necessários, mas é o en- Atividade 1
sino, especificamente, que fará a grande diferença. Ele precisa ser
Uma sala de aula, em qualquer
pautado nas potencialidades, na colaboração e na compreensão das etapa de ensino, é constituída de
especificidades humanas. vários alunos, com características
diferentes, e, para garantir uma
Também é importante pensarmos nos estudantes que têm defi- inclusão com qualidade a todos,
ciências ou dificuldades, será que eles não sentem medos e incertezas? é necessário considerar muitos
fatores, entre eles, o ensino. Para
Certamente, porque todos os alunos, ao ingressarem na escola, ficam ensinar na diversidade, o que
ansiosos, eles têm a imagem do ambiente escolar que lhes foi passada você considera importante na
pelos pais, amigos e vizinhos, e nem sempre ela é positiva. atitude e na prática do professor?

Inclusão educacional: desafios e superações 123


Ao ingressar na escola comum, o estudante com deficiência ou difi-
culdades na aprendizagem pode ter muitos problemas, caso a escola e
o professor não estejam preparados. Pode ficar ansioso e desmotiva-
do, acreditando que não é capaz de aprender como os demais estudan-
tes e, ainda, sofrer bullying, devido a não aceitação do grupo ao qual
passará a pertencer ao longo do ano letivo.

Não podemos esquecer que não é o aluno que precisa se adaptar


à escola, e sim a escola ao aluno, para tanto, cabe a ela pensar em es-
tratégias que permitam que o estudante seja naturalmente incluído.
O fato é que nem sempre os professores têm consciência da forma
como deverão proceder e organizar o ensino, esquecem de entender
as características individuais de cada aluno e as características que os
diferem um dos outros. Não é fácil, mas é possível quando se aprende
a observar reações, atitudes e potencialidades.

O relato que segue nos permite refletir sobre os medos e incerte-


zas que a pessoa com deficiência enfrenta para ter sucesso escolar e
profissional. Muitas vezes, o despreparo de profissionais contribui para
que a inclusão não aconteça com qualidade.

Relato 1 – Estudante com baixa visão


Eu não nasci assim, mas fui perdendo a visão gradativamente, e isso só foi descoberto
quando já havia repetido inúmeras vezes os anos iniciais do ensino fundamental. Eu mes-
mo não percebi que estava perdendo a visão. Tenho baixa visão em ambos os olhos, meu
diagnóstico é atrofia no nervo óptico, por isso minha porcentagem visual é de 10%: não
defino imagens e cores, apenas enxergo vultos e preciso contar com descrições e o tato
para imaginar formas, silhuetas e colorações. Até que o diagnóstico fosse confirmado,
frequentei, com história de fracasso escolar, as salas de aula comuns. Sofri muito, não
fui compreendido, fui rotulado de preguiçoso, desatento, desinteressado. Depois que os
professores souberam da minha dificuldade, começou um período intenso de tentativas
de inclusão, fui tratado pelos professores como o coitadinho de quem nada exigiam, e eu
nada aprendia. As adaptações ficavam apenas no discurso, as estratégias de ensino eram
tradicionais, ou seja, predominava a escrita na lousa e no caderno. Os textos escritos eram
fornecidos com fonte ampliada, o que me ajudava muito, mas o ensino não era adaptado,
muitos conceitos não aprendi por falta de utilização do material concreto.
Minha única opção foi abandonar os estudos, ou melhor, fui excluído e me dediquei à
prática esportiva. Mais tarde, ainda jovem, voltei para escola na modalidade de educação
de jovens e adultos e, por meio do trabalho colaborativo da professora da sala de aula
e do atendimento especializado, consegui concluir o ensino médio. Fiz graduação em
Pedagogia, estou fazendo a segunda graduação em Educação Física, utilizo a tecnologia
como ferramenta de estudos. Tenho um emprego na área de estudos e sou atleta.

124 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


Esse relato nos permite observar a importância do conhecimento
do professor para identificar as dificuldades dos alunos, afinal, muitos
são rotulados por não serem compreendidos.

O atendimento educacional especializado oferecido por meio das


salas de recurso não pode ser confundido com reforço escolar, é um
espaço que organiza recursos pedagógicos e de acessibilidades para
atender a estudantes com deficiência, considerando suas necessida-
des. Não se trata de um trabalho fragmentado, mas em parceria com a
sala de aula comum e com as famílias.

Buscar a aproximação, o diálogo, acreditar no aluno, valorizar o que


ele sabe fazer bem, como promover atividades no grupo de conscienti-
zação da diversidade, são ações muito importantes que farão a diferen-
ça no ensino e na aprendizagem de todos os alunos.

Na sala de aula
Um livro interessante para o trabalho da valorização da diversidade
na sala de aula é Flicts, do cartunista Ziraldo. O texto tem como perso-
nagens as cores e apresenta a história de uma cor que não consegue se
encaixar em lugar nenhum por ser diferente. Nem mesmo na caixa de
lápis de cor ela é aceita, e por ser excluída, fica muito triste, à procura
de um lugar que possa ser compreendida.

Depois de trabalhar a história, o professor poderá propor que os


alunos desenhem ou produzam textos, mostrando de que forma pode-
riam fazer Flicts feliz.

6.2 Experiências de professores


Vídeo Quando a inclusão de um estudante com deficiência ou dificulda-
des de aprendizagem é realizada corretamente, com apoio da família,
do professor do atendimento educacional especializado e de outros
profissionais que atendem ao estudante, ela deixa de ser uma expe-
riência de medo e incerteza e passa a ser uma experiência de sucesso.

É fato que mudanças geram medos e incertezas, quantas vezes, ao


nos depararmos com uma situação que nunca havíamos experimen-

Inclusão educacional: desafios e superações 125


tado, ficamos com medo? Quem viajou de avião pela primeira vez e
não sentiu medo? Quem nunca viajou, mas sente certa insegurança?
Quando participamos de uma prova de vestibular ou de um concurso,
não ficamos com medo de errar? Quantas pessoas acabam errando
questões que sabem ou não conseguem fazer a prova no tempo esti-
pulado por ansiedade e preocupação?

O medo é uma sensação que todo ser humano tem, surge quando
estamos muito preocupados com alguma situação ou porque estamos
diante do novo, da mudança.

Na educação não é diferente, quando um professor se depara com


um aluno com deficiência ou transtorno específico de aprendizagem, a
primeira reação é a rejeição. Isso não significa rejeição ao aluno, e sim
rejeição ao novo, ao desafio para o qual foi convidado a participar. Con-
forme Mantoan (2003, p. 76), “a maioria dos professores tem uma visão
funcional do ensino e tudo que ameaça romper o esquema de trabalho
prático que aprenderam a aplicar em suas salas de aula é inicialmente
rejeitado”.

No momento em que o professor enfrenta seus medos e incertezas


e mostra-se disposto a aprender com a atuação prática, ou seja, passa a
ressignificar sua forma de ensinar pautada em elementos reais, em ex-
periências e necessidades concretas que se apresentam no seu dia a dia
de docência, ele se transforma em um professor inclusivo, que ensina
na diversidade e é capaz de conhecer as especificidades de cada aluno.

O relato da professora, a seguir, nos ajuda a compreender a impor-


tância de trabalhar a inclusão com todos os alunos da sala de aula, pois
eles precisam encontrar a beleza na diversidade.

Relato 2 – Professora do atendimento especializado (sala de recurso mul-


tifuncional) sobre a inclusão de um estudante com TEA
Eu atendia um estudante autista na sala de recursos e observava que ele tinha muito in-
teresse pelas atividades propostas, principalmente pelos desafios. No recreio, ele brincava
com os demais colegas da escola, interagia muito bem, mas, na sala de aula comum, era
totalmente diferente, os alunos da sua turma o rejeitavam, ele gostava dos seus colegas,
mas eles o deixavam de lado. A professora reclamava por ele não participar das aulas,
sentia dificuldades em conduzir um ensino que atendesse às necessidades de todos os
estudantes.
(Continua)

126 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


O que fazer para que a turma o incluísse no grupo? Muitas foram as conversas e ten-
tativas com os colegas da turma, mas nada parecia resolver. Muitas vezes, o aluno
especial havia me pedido para assistir ao filme Titanic com os colegas, então resolvi
selecionar algumas cenas e, com autorização dos pais e planejamento prévio com a
professora da classe, levamos o filme para assistirem com a proposta de produção
textual.
Ele realizou a atividade proposta, apresentou um pequeno texto sobre o Titanic e
falou baixinho que gostaria de ensinar seus colegas de turma a fazerem o navio.
Disponibilizamos papelão e cola para todos e ele foi o professor naquele dia ines-
quecível: desenhou no quadro, explicou passo a passo como fazer o navio, e todos
juntos construíram com base em suas orientações o Titanic. O trabalho foi escolhi-
do para uma exposição realizada pela Secretaria Municipal de Educação e todos os
alunos do 5º ano foram participar. Não consigo descrever a alegria que senti com
os resultados! Finalmente ele poderia dizer que foi incluído em sala de aula, e não
apenas integrado. O que fiz de diferente, que estratégia usei? Apenas confiei no
aluno, deixei que ele falasse e mostrasse o que sabia fazer. Fiz com que se sentisse
importante na escola e que a professora e seus colegas percebessem seu potencial.

Nesse depoimento, podemos observar que a prática realizada


não se encontra em livros teóricos sobre inclusão educacional, ela
nasce da realidade vivida pela professora, que descobriu que tra-
balhar com o centro de interesse do aluno com TEA surte muitos
resultados positivos. Na ocasião, contribuiu para a socialização e
para incentivar o estudante a falar, organizar o pensamento e re-
gistrar um texto na forma escrita. A professora da sala de recursos
realizou um trabalho colaborativo com a professora da classe co-
mum, mostrando que é possível incluir com qualidade.

Silva (2012), em relação ao transtorno espectro autista, enfatiza


que não podemos perder de vista as potencialidades e os limites
da criança. Não existe uma fórmula para trabalhar a inclusão, tudo
depende do tempo, da persistência, da dedicação, das palavras de
incentivo e dos elogios.

No segundo relato transcrito a seguir, a professora recebeu


em sua sala de aula um estudante com déficit intelectual e mostra
como é possível ensinar na diversidade.

Inclusão educacional: desafios e superações 127


Relato 3 – Professora sobre a inclusão de um estudante com deficiência
intelectual
Nos primeiros dias, foi muito difícil interagirmos, pois ele procurava fugir das atividades
pedagógicas, demonstrava insegurança e dificuldade de se colocar em situações de “faz
de conta”, até mesmo quando lhe era proposta uma situação problema. Por exemplo: “Eu
tinha cinco balas e comi três”. Ele dizia: “Mas eu não tenho cinco balas, na minha casa não
tem balas”. Ficava irritado e o ensino não era possível.
Como sempre acreditei que o professor deve ser um bom observador, fui analisando suas
atitudes. Foi aí que percebi que toda vez que eu o colocava em frente ao computador,
imediatamente ele procurava imagens de trator e ficava comentando em voz alta sobre
a melhor marca, qual ele já tinha, qual iria comprar, sua utilidade e potência. Também
falava que, ao chegar em casa, iria arar, colher feijão, soja, milho...
Da maneira tão prazerosa como falava, parecia que, ao chegar em casa, iria mesmo rea-
lizar todas aquelas tarefas, pois morava na área rural. Percebi, então, que ele estava me
mostrando como dominava aquele assunto, que para mim era totalmente desconhecido.
Fiquei fascinada pelo seu interesse pelos assuntos relacionados à agricultura, especial-
mente sobre tratores, e resolvi trazer o tema para nossa prática pedagógica.
Em parceria com a família, que sempre esteve à disposição, sem medir esforços, forne-
cendo dados, materiais e motivando o aluno para o melhor desempenho de sua aprendi-
zagem, conseguimos panfletos de comércio agrícola, levei um trator de brinquedo para a
sala, confeccionamos os saquinhos de grãos (trazidos do plantio da lavoura de sua casa)
e iniciamos nosso trabalho.
Seguindo as orientações da psicopedagoga, fui fazendo as devidas adaptações, tendo o
trator como o principal recurso didático. Assim conseguimos trabalhar situações-proble-
ma, valor posicional, sequência numérica, operações, produção de frases, textos, bilhetes,
diálogos e interpretação. Também trouxe para a sala de aula alguns livros infantis sobre
trator, o que também foi muito positivo, pois veio ilustrar o que ele já havia relatado e
com uma linguagem bem conhecida. Foi impressionante a mudança do aluno na sala de
recurso e em sala de aula, adquiriu mais segurança, conversava com todos, questionava,
opinava e melhorou significativamente sua aprendizagem.
Hoje sou uma professora imensamente feliz porque tive o privilégio de contribuir com
a aprendizagem desse aluno relatado e de todos da sala de aula, cresci muito como ser
humano e profissional.

Estudantes com deficiência intelectual são capazes de aprender


como qualquer outra criança. Um ponto positivo é que eles acabam
forçando a escola a rever suas práticas tradicionais para atender às
suas diferenças, porque as práticas convencionais não funcionam
com esses alunos, que entendem o conhecimento ensinado pelo
professor de acordo com suas capacidades (CARNEIRO, 2007).

128 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


No relato da professora, é possível perceber que ela conseguiu en-
sinar porque observou o interesse do aluno e, partindo disso, com o
apoio da família, conseguiu estabelecer uma sequência didática inte-
ressante e concreta que permitiu a aprendizagem do estudante. Não
enfatizou atividades mecânicas, mas sim aprendizagens significativas.

O próximo relato apresentado diz respeito à alfabetização de um


jovem de 20 anos de idade. É um desafio para os professores alfabeti-
zar estudantes da educação de jovens e adultos, e, com a presença da
dislexia, esse desafio fica ainda maior.

Relato 4 – Professora de alfabetização na educação de jovens e adultos


Quando aquele jovem, com 20 anos de idade, me procurou trazendo em suas mãos um
laudo de dislexia e disse: “Professora, arrumei um trabalho e preciso fazer a carteira de
motorista para permanecer trabalhando, não consigo passar na prova teórica, tenho mui-
tas dificuldades de leitura e escrita, você pode me ensinar a ler e escrever?
Sem pensar duas vezes, respondi que sim, que podia ensiná-lo fazendo algumas aulas
de reforço, para que pudesse passar na prova teórica. Mal sabia eu que o jovem que ali
estava não conseguia compreender nem mesmo o som das letras, quanto mais realizar
a leitura de um texto.
Não demonstrei a ele nenhum espanto, apenas conversei, dizendo que teríamos que
iniciar do básico, começando com a consciência fonológica. Elaborei muitos exercícios
de percepção de sons de letras iniciais, finais, rimas, consciência de som e de sílabas.
Para não trabalhar essas habilidades de formas mecânica e isolada, associei às placas de
trânsito, que correspondia à necessidade apresentada por ele no momento.
Fiz perguntas como: quais palavras começam com a mesma sílaba da palavra PARE?
Quais palavras terminam com a mesma sílaba da palavra PARE. Qual é o som de cada le-
tra? Quantas sílabas compõem a palavra? O que significa a palavra PARE? Como se aplica
em uma frase?
Todo o processo de alfabetização foi conduzido por meio da leitura das placas de trânsito. O Atividade 2
estudante conseguiu aprender a ler e escrever, porém as marcas da dislexia ainda permane- Ser professor na atualidade
cem: falta de fluência na leitura, aglomeração de palavras, ocultação de letras, entre outras. gera medos e incertezas, e,
quando o professor se depara
Para alguém que sequer conhecia as letras, foi um avanço surpreendente, que me fez com estudantes com deficiência
acreditar que fazemos a diferença na vida de pessoas quando acreditamos no potencial ou transtornos de aprendiza-
delas. O sonho desse jovem foi realizado. gem, esses sentimentos são
ainda maiores. Explique por
que o medo e a incerteza fazem
O processo de alfabetização de jovens e adultos precisa ser signifi- parte do processo de inclusão
cativo, partindo da necessidade do estudante. O simples ato de juntar educacional. Será que os
medos dos professores são em
letras e formar palavras não é suficiente, é preciso colocar o estudante relação aos alunos ou à situação
em contato com textos reais, que circulam na sociedade. apresentada?

Inclusão educacional: desafios e superações 129


6.3 Experiências de famílias
Vídeo Assim como as instituições escolares precisam se adaptar, romper
paradigmas, mudar a forma de ensinar para atender com qualidade
a estudantes com deficiência e com transtornos de aprendizagem, as
famílias também precisam se reestruturar psicologicamente para en-
frentar a realidade.

Normalmente, com a chegada de uma criança com deficiência, a


família passa por uma desestruturação inicial, movimenta-se à pro-
cura de diagnósticos que respondam suas dúvidas e especialistas
que orientem o melhor tratamento, na esperança da cura.

Ao conviver com a criança, aceitar suas limitações e entender


suas dificuldades, a família passa a valorizar suas capacidades, e
aquela criança que antes gerava medo e incerteza, se torna o que
de melhor poderia ter acontecido, pois os pais compreendem que
seus filhos são capazes de ter grandes conquistas. As narrativas
das mães sobre suas experiências são importantes para conhecer-
mos esse contexto.

Relato 5 – Mãe de estudante com deficiência intelectual


Quando minha filha nasceu, era perfeita. Nasceu de parto normal, sem nenhuma compli-
cação, era uma menina grande, saudável, linda, toda perfeitinha. Aos 5 meses de idade,
sem nenhum motivo aparente, teve uma convulsão. Morávamos na área rural do muni-
cípio e demorou muito até chegarmos ao pronto socorro. Ela ficou mais de uma hora de-
sacordada. Esse desmaio foi pontual, e achamos que nada tinha causado nela. A surpresa
veio quando começou a frequentar a escola: repetiu duas vezes o segundo ano e não
conseguia compreender a leitura e a escrita, além das dificuldades nos cálculos. Eu, sendo
professora na escola, só conseguia pensar que as professoras não estavam ensinando,
então pedi para que no ano seguinte pudesse assumir a turma do 2º ano, na tentativa
de ensinar minha filha e os demais alunos a ler e escrever. Todos conseguiram naquele
ano, menos ela. Foi aí que consegui enxergar o problema, pois até então parecia que eu
estava com os olhos vendados. Procurei ajuda de especialistas, que diagnosticaram uma
deficiência intelectual. Me recusei a enxergar a realidade e não autorizei ela a frequentar
atendimentos especializados, comecei a ensiná-la em casa. Não tive resultados satisfa-
tórios e somente quando acreditei no trabalho colaborativo de vários profissionais é que
minha filha começou a ler. Hoje ela está alfabetizada, mesmo ainda tendo limitações que
compreendo perfeitamente. Me arrependo por demorar tanto a aceitar ajuda, mas nunca
é tarde para ser feliz.

130 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


No Relato 5, podemos observar a insegurança da mãe em aceitar
a dificuldade da filha, que fica evidente na busca por culpados e na
demora para procurar ajuda de especialistas. No entanto, quanto
mais cedo a deficiência de uma pessoa for identificada, melhores
serão os resultados das estratégias de ensino aplicadas. Observe o
relato a seguir.

Relato 6 – Mãe de estudante com transtorno espectro autista


Lembro-me da angústia de perceber que algo estranho acompanhava o desenvolvimen-
to do nosso filho. A insegurança em comentar e não ser compreendida também era pre-
sença constante, já que ele era saudável e, desde cedo, muito inteligente.
Quando tinha que cortar as unhas, pentear o cabelo, ele chorava muito, mostrava o quan-
to aquilo o incomodava, era como sentisse muita dor, mal-estar e sentia até náuseas. Por
essas e outras, as incertezas e o sentimento de impotência passaram a fazer parte dos
nossos dias, até que, enfim, o diagnóstico chegou.
E agora? Ele é autista. Nunca imaginei que isso poderia acontecer conosco. Quem vai nos
ajudar nessa missão? Não sei explicar como isso aconteceu, mas depois do luto, do medo,
da insegurança, veio uma coragem tão grande que nos fez (eu e meu esposo) passar
noites em claro pesquisando, aprendendo, buscando com outras famílias e profissionais
saber como cuidar e ensinar nosso filho.
Quando foi para a escola, as preocupações aumentaram. Um dia, nem sei por que, resolvi
passar no meio da tarde para vê-lo na escola. Quando cheguei lá, fui informada de que
ele estava trancado no banheiro, apavorado e não deixava a professora entrar. Fui até a
porta do banheiro, falei com ele, o tranquilizei, pedi para me deixar entrar. Ao abrir a
porta, vi que estava em apuros com os procedimentos de higiene e quando me viu, só
falou: “Mãe!!!”. Ele ainda não falava nessa época.
Aquele “mãe”, acompanhado de um forte abraço que transmitia a mensagem: “que bom
que você apareceu aqui!”. Eu, com a voz embargada, falei:
“Fica tranquilo, meu amor, estou aqui para te ajudar, está tudo bem”, enrolei ele no meu
casaco e viemos para casa, coloquei ele no banho e chorei. Eu me emocionava com os seus
abraços e olhares e tive a certeza de que sou a mãe que ele precisava ter, de que fui escolhida.
A partir desse dia, passei a informar mais a escola sobre as características específicas do
meu filho, que só uma mãe sabe contar. Fui estudar para ser pedagoga, hoje sou formada
e atuo profissionalmente com crianças que têm dificuldades.

Silva (2012) enfatiza que profundas transformações precisam ocorrer


no ambiente doméstico quando se tem uma criança autista. A família pre-
cisa encontrar o ponto de equilíbrio, porque existe uma vida que depende
das pessoas do convívio. É necessária uma boa dinâmica familiar para que
a criança com TEA consiga chegar à vida adulta com maior autonomia.

Inclusão educacional: desafios e superações 131


Silva (2012) orienta que as famílias de crianças autistas se infor-
mem, incentivem a criança a se cuidar sozinha, atribuam tarefas a ela,
participem da escola, dividam responsabilidades dentro de casa, con-
versem com outros pais de filhos autistas, criem estratégias, trabalhem
em conjunto com a escola e busquem ajuda especializada.

Sobre trabalhar em conjunto, se a escola não convidar, os pais


Atividade 3
precisam mostrar a vontade de participar. De acordo com a autora,
Nos relatos apresentados no
“faça uma aliança com a escola e os professores” (SILVA, 2012, p. 101).
decorrer do capítulo, é possível
perceber a importância do É importante não desistir de oferecer ajuda aos professores, para
trabalho colaborativo entre que conheçam melhor a criança, e incentivar para que façam práticas
professor da sala de aula comum
e professor do atendimento es- diferenciadas.
pecializado para a aprendizagem A visão de Silva (2012) nos permite compreender que, para uma
do estudante com dificuldades.
De que forma o professor da sala inclusão de qualidade, muitos fatores são necessários, mas é o ensi-
de recursos pode auxiliar o pro- no que fará a grande diferença, por isso precisa ser pautado nas po-
fessor da sala de aula comum?
tencialidades, na colaboração e na compreensão das especificidades
Mencione exemplos.
humanas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esperamos que este livro tenha ampliado o seu conhecimento teórico
sobre a inclusão educacional e que os relatos apresentados neste capítu-
lo tenham sido sensibilizadores para a certeza de que a inclusão é possível
quando há conhecimento e disposição de todos. As pessoas envolvidas
no processo de inclusão passam por medos e incertezas que são comuns
e aprendem a superar e a encontrar a beleza na diversidade.

REFERÊNCIAS
CARNEIRO, M. A. O acesso de alunos com deficiência às escolas e classes comuns: possibilidades
e limitações. Petrópolis: Vozes, 2007.
MANTOAN, M. T. E. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna,
2003.
PAULA, A. R. de; COSTA, C. M. A hora e a vez da família em uma sociedade inclusiva. Brasília:
Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2007. Disponível em: https://
www.construirnoticias.com.br/a-hora-e-a-vez-da-familia-em-uma-sociedade-inclusiva/.
Acesso em: 26 ago. 2020.
PETEAN, E. B. L.; PINA-NETO, J. M. Investigações em aconselhamento genético: impacto
da primeira notícia – a reação dos pais à deficiência. Medicina, Ribeirão Preto, n. 2, v. 31,
p. 288-295, 1998. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/rmrp/article/view/7675/9213.
Acesso em: 26 ago. 2020.
SILVA, A. B. B. Mundo singular: entenda o autismo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

132 Currículo escolar em uma perspectiva inclusiva


GABARITO
1. Resposta individual. Para ensinar na diversidade, é necessário compreender as espe-
cificidades dos alunos, ensiná-los a acreditar nas potencialidades e aplicar estratégias
de ensino diferenciadas, por meio de um trabalho colaborativo. O professor precisa
se aperfeiçoar continuamente.

2. O medo é um sentimento comum que temos quando nos deparamos com situações
novas e somos convidados a enfrentar desafios. No processo de inclusão, não significa
que o professor tem medo do estudante, mas, sim, medo de não conseguir enfrentar
a realidade, de ter que mudar as estratégias de ensino e principalmente medo de não
garantir a aprendizagem do aluno.

3. O professor da sala de recursos atende ao estudante individualmente e consegue


perceber melhor seus interesses e suas capacidades. Ele pode compartilhar essa des-
coberta com o professor da sala de aula comum, ajudando na elaboração de estra-
tégias de ensino. Um exemplo é uma professora da sala de recursos dar dicas para
a professora da sala de aula comum de como manter a atenção do aluno ou uma
conversa entre as duas professoras sobre como poderia ser realizada a avaliação de
um estudante com deficiência.

Inclusão educacional: desafios e superações 133


CURRÍCULO

CURRÍCULO escolar em uma perspectiva inclusiva


ESCOLAR EM UMA

PERSPECTIVA
INCLUSIVA
MARISTELA C. METZ SASS
MARISTELA C. METZ SASS

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6666-7

59517 9 788538 766667

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