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INTRODUÇÃO
Ao observarmos a língua portuguesa em suas várias formas de manifestação, é
possível verificar situações em que elementos gramaticais apresentam um emprego
diverso daquele prescrito pelas orientações da gramática normativa, não de maneira
aleatória, mas assinalando certa regularidade nos seus usos.
O presente trabalho propõe-se o estudo das orações adjetivas do português
no âmbito do ensino/aprendizagem em uma perspectiva funcional, ou seja, a língua é
analisada como uma estrutura sujeita a pressões oriundas das situações
comunicativas e como resultado da interação discursiva. Temos, como foco principal,
as orações adjetivas observadas dentro do contexto ensino/aprendizagem.
Procuramos identificar e analisar como os alunos, em geral, classificam tais orações e
as possíveis dificuldades resultantes das interpretações efetuadas por eles, ao
definirem o sentido das orações adjetivas classificando-as como restritivas ou
explicativas. Para a realização desta investigação, buscamos teóricos como Neves
(2001), Taylor (1989), Hopper & Traugott (1993), Votre, Cezario & Martelotta (2004)
e Furtado da Cunha, Oliveira & Martelotta (2003), como suporte de nossas considerações e
análises.
Dessa forma, pretendemos estudar as orações adjetivas do português, superando a
abordagem tradicional destas e analisar como o referido conteúdo gramatical é apresentado e
trabalhado no processo ensino/aprendizagem de língua portuguesa em algumas instituições
de ensino público e privado, na cidade de Niterói-RJ .
Ao longo do trabalho, alguns questionamentos estão presentes: os alunos apresentam
dificuldades quando são solicitados a classificar os dois tipos de orações? Os professores
consideram tal conteúdo gramatical relevante? Em algum momento de sua prática docente,
os professores teriam considerado a utilização ou a discussão a respeito de orações adjetivas
não prototípicas em sala de aula? E os alunos? Como classificariam orações adjetivas não
prototípicas?
Postulamos como uma das hipóteses para a nossa pesquisa que o sentido explicativo, o
qual veicula informação subsidiária, seja a opção mais recorrente nas classificações efetuadas
1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Com o propósito de construir significados a partir dos elementos advindos da coleta de
dados de nossa pesquisa, estabeleceram-se contatos em cinco instituições de ensino
diferentes, localizadas na cidade de Niterói-RJ. Foram selecionados os colégios São Vicente de
Paulo, Colégio Nossa Senhora da Assunção, Colégio Salesiano Santa Rosa de Niterói e Instituto
Abel, pertencentes à rede particular de ensino, e o IEPIC – Instituto de Educação Professor
Ismael Coutinho, pertencente à rede pública de ensino. A pesquisa, na rede pública de ensino,
foi restrita a uma instituição apenas, em virtude de longo período de greve nas instituições da
rede pública, disponibilidade de horários do coordenador para nos receber e autorização da
escola para exposição de nossa pesquisa. A escolha por tais instituições se deu,
principalmente, em virtude de tais estabelecimentos serem bastante tradicionais e
representativos na cidade de Niterói-RJ.
Em cada uma dessas instituições, o contato se deu por meio de uma breve entrevista
junto aos docentes de língua portuguesa, níveis fundamental e médio. Foi solicitado aos
docentes o preenchimento de um questionário. Foi entrevistado um total de doze professores
da rede privada e cinco professores da rede pública.
Alunos da rede particular de ensino foram contatados para o preenchimento de duas
folhas de exercícios distintas sobre classificação de orações adjetivas. Na primeira etapa da
pesquisa, denominada pesquisa piloto, analisamos os exercícios de dez alunos da rede
particular. Na segunda etapa da pesquisa, analisamos os exercícios de noventa alunos da rede
2. PESQUISA DE CAMPO
Conseguimos coletar um total de dezessete questionários preenchidos por professores,
somando-se os pertencentes à primeira etapa e à segunda etapa da pesquisa. Abaixo
apresentamos as respostas levantadas.
Dentre os dezessete professores entrevistados, oito responderam que os alunos, em
geral, têm dificuldades em diferenciar a oração adjetiva restritiva da adjetiva explicativa. Ao
serem questionados sobre as prováveis razões de os alunos apresentarem tais dificuldades na
diferenciação das orações, expuseram os seguintes argumentos:
os exemplos de orações adjetivas não se apresentam de maneira clara nos materiais
utilizados (5 menções).
os alunos demonstram pouco interesse no aprendizado (4 menções).
a definição de oração adjetiva apresentada pelo material é imprecisa (2 menções).
os alunos confundem a oração coordenada explicativa com a subordinada adjetiva
explicativa (1 menção).
os alunos “não percebem a intenção expressiva do texto” (1 menção).
os alunos “não entendem bem o conceito de restrição” (1 menção).
os alunos apresentam dificuldades para identificar classes de palavras (2 menções).
A questão da vinculação entre semântica e sintaxe, crucial para o entendimento de que
as estruturas linguísticas são sujeitas a pressões provenientes de situações comunicativas, não
foi apontada como uma possível causa das dificuldades encontradas pelos alunos na distinção
dos dois tipos de orações.
Dentre os dezessete professores entrevistados, nove responderam que, em geral, os
alunos conseguem distinguir a oração adjetiva restritiva da explicativa com facilidade. A
facilidade apresentada pelos alunos na distinção das orações adjetivas, para esses professores,
foi assim especificada:
o fato de o estudo de tais orações estar vinculado à interpretação de textos (7
menções).
a definição de oração adjetiva apresentada pelo material didático é bastante clara ( 4
menções ).
os exemplos apresentados pelo material didático são muito básicos (4 menções).
os alunos demonstram interesse no aprendizado ( 1 menção).
3. ANÁLISES
Um grupo de dez alunos, pertencentes ao ensino médio, preencheu, inicialmente, uma
folha de exercícios, constituída por quatro diferentes fragmentos de textos retirados de
crônicas publicadas em jornais de grande circulação. Foi solicitado aos alunos que
sublinhassem as orações adjetivas restritivas e explicativas dos referidos fragmentos,
nomeando-as. Abaixo, reproduzimos os fragmentos de textos sublinhados pelos alunos com as
respectivas análises iniciais.
(1)“Sinto um misto de revolta e inveja quando ouço alguém dizer que está sem nada
para ler. Com a cabeceira entulhada de livros que só terminarei de ler com 217 anos, se a luz
for suficientemente forte, e já convencido de que nunca cumprirei meu modesto projeto de
(3)“[...] São as boas surpresas dessa cidade que às vezes é a mais violenta e às vezes a
mais cordial do mundo; que é capaz de matar por bala perdida, mas também de reunir 2
milhões de pessoas no réveillon de Copacabana sem conflito [...]”. (Zuenir Ventura, O GLOBO,
Opinião).
4. C O M E N T Á R I O S
Observamos que em fragmentos de textos mais longos, em que a posição da oração
adjetiva restritiva dentro do período ocorre ao final do enunciado, como constatado nos
fragmentos 1 e 4, principalmente, houve dificuldades por parte dos alunos na identificação do
sentido de restrição. Nesses exemplos, muitos alunos optaram por classificar as orações como
adjetivas explicativas.
A dificuldade apresentada na distinção dos dois tipos de orações adjetivas foi
constatada nos quatro fragmentos de textos analisados. Observamos tendência em se optar
pela classificação de adjetivas explicativas em lugar de adjetivas restritivas. Apesar de o
número de alunos participantes na pesquisa ser reduzido, a identificação do sentido
explicativo para as orações apresentadas foi bastante recorrente. Segundo a abordagem
CONCLUSÃO
No que tange às adjetivas prototípicas, verificamos que as adjetivas explicativas são
mais sensíveis a fatores de natureza pragmático-comunicativa. As explicativas veiculam
informação subsidiária, tornam compreensível, esclarecem uma informação. Podemos
constatar sua ocorrência maior, por exemplo, em textos de manifestação de opinião ou de
convencimento.
Por outro lado, quando há a preponderância do padrão mais regular e informativo, há
tendência ao modelo restritivo. Percebe-se, no modelo restritivo, um estreitamento do
vínculo de sentido e a proximidade linear entre a oração núcleo e a estrutura adjetiva,
REFERÊNCIAS
Monika Benttenmüller Amorim é mestre em Letras pela Universidade Federal Fluminense e cursa o
Doutorado em Letras na Universidade Federal Fluminense. Atualmente é professora de português
nos ensinos fundamental II e médio no Instituto GayLussac, em Niterói. Dentre suas publicações
mais recentes estão Aspectos discursivos de orações adjetivas não prototípicas em textos do século
XV e sincronia atual e Orações adjetivas explicativas iniciadas por “.Que + comentário” e “.O que +
comentário”. monikaamorim@yahoo.com.br